A NOITE DE CRUZ E SOUSA
Escondia mais do que a noite.
Joao Antonio
Olhos do sonho
(Janeiro de 1897)
Certa noite soturna, solitdria,
vi uns olhos estranhos que surgiam
do fundo horror da terra funerdria
onde vis6es sonémbulas dormiam...
5. Nunca tais olhos divisei acaso
com meus olhos mortais, alucinados...
Nunca da terra neste leito raso
outros olhos eu vi transfigurados.
A luz que os revestiae alimentava
10. _ tinhao fulgor das ardentias vagas,
um dem6nio noctambulo espiava
de deniro deles como de igneas plagas.
Eos olhos caminhavam pela treva
maravilhosos e fosforescentes...
15. Enquanto eu ia como um ser que leva
pesadelos fantdsticos, trementes...
Na treva s6 os olhos, muito abertos,
165seguiam para mim com majestade,
um sentimento de cruéis desertos
20. me apunhalava com atrocidade.
S6 os othos eu via, s6 0s othos
nas cavernas da treva destacando:
farbis de augiirio nos ferais escolhos,
sempre, tenazes, para mim olhando...
25. Sempre tenazes para mim, tenazes,
sem pavor e sem medo, resolutos,
olhos de tigres e chacais vorazes
no instante dos assaltos mais astutos.
$6 0s olhos eu via! —o corpo todo
30. se confundia com o negror em volta...
O alucinagées fundas do lodo
carnal, surgindo em tenebrosa escolta!
E os olhos me seguiam sem descanso,
numa perseguicdo de atras voragens,
35. nos narcotismos dos venenos mansos,
como dois mudos e sinistros pajens.
Enessa noite, em todo meu percurso,
nas voltas vagas, véés e vacilantes
do meu caminho, esses dois olhos de urso
40. Id estavam tenazes e constantes.
Ld estavam eles, fixamente eles,
quietos, trangitilos, calmos e medonhos...
Ah! quem jamais penetraré naqueles
olhos estranhos dos eternos sonhos!"
Este poema de Cruz e Sousa aparece, em linhas gerais, como 0
relato de uma visdo no Amago da noite. Desde logo, nao se pode deixar
de atribuir um sentido forte ao termo, Pois 0 poeta dé enorme énfase 20
ato de ver e aos olhos, sem fazer qualquer referéncia 4 realidade banal
de todo dia, ou mesmo a uma realidade determinada, como se tivesse
alijado a experiéncia real e o tempo comum, para se internar numa pai-
166
ciate
wala
una
ato g
ine
ty Bp
th
ae