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Homens do Xá
O Golpe Norte-Americano no Irã e as Raízes
do Terror no Oriente Médio
STEPHEN KINZER
Tradução
Pedro Jorgensen Jr.
GRÉCIA RÚSSIA CAZAQUISTÃO CAZAQUISTÃO QUIRGUÍZIA
Mar Negro
GEÓRGIA
UZBEQUISTÃO
ARMÊNIA CHINA
REP. DO AZERBAIJÃO
TURQUIA TAJIQUISTÃO
TURCOMENISTÃO
Mar Cáspio
Azerbaijão
Go
PAQUISTÃO
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BAHRAIN
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ARÁBIA SAUDITA
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OMAN Mar da Arábia
elho
SUDÃO
Escala de milhas
ERITRÉIA 0 100 200 300 400
IÊMEN
ETIÓPIA
CAPÍTULO 1
Boa-noite,
Mr. Roosevelt
O coronel fez o que lhe foi ordenado. Ao chegar à sua primeira para-
da, porém, foi surpreendido por uma situação bastante incomum. Apesar
do avançado da hora, o chefe do Estado-Maior, general Taqi Riahi, não
estava em casa. Ninguém mais estava. Nem um único empregado ou zela-
dor pôde ser encontrado.
O coronel Nasiri deveria ter desconfiado de que havia algo errado,
mas não desconfiou. Apenas entrou novamente em seu carro blindado e
ondenou ao motorista que rumasse para o objetivo principal, a casa do
primeiro-ministro Mossadegh. Com ele viajavam as esperanças de duas
agências de Inteligência de elite.
O coronel Nasiri não executaria uma ação tão temerária por sua pró-
pria conta. O decreto que trazia consigo era de legalidade duvidosa, uma
vez que no Irã democrático o primeiro-ministro só podia ser nomeado ou
demitido com autorização do Parlamento. Mas o trabalho desta noite era a
culminação de um planejamento de meses da Agência Central de
Inteligência dos Estados Unidos e do Serviço Secreto de Inteligência bri-
tânico. O golpe que estavam executando fora ordenado pelo presidente
Dwight Eisenhower e pelo primeiro-ministro Winston Churchill.
Em 1953, os Estados Unidos ainda eram uma novidade para os irania-
nos, muitos dos quais os viam como amigos, como defensores da frágil
democracia que havia meio século eles tentavam construir. Era a Grã-
Bretanha, não os Estados Unidos, que viam como o opressor colonialista
que os explorava.
Desde os primeiros anos do século XX, uma empresa britânica cujo
principal proprietário era o próprio governo de Sua Majestade usufruía o
monopólio fantasticamente lucrativo da produção e comercialização do
petróleo do Irã. Enquanto a maioria dos iranianos vivia na pobreza, a
riqueza que fluía do subsolo do país jogava um papel decisivo na manu-
tenção da Grã-Bretanha no pináculo do poder mundial. Esta injustiça era
motivo de um profundo rancor por parte dos iranianos. Até que finalmen-
te, em 1951, eles apelaram a Mossadegh, que, mais do que qualquer outro
líder político, personificava o ódio de toda a nação contra a Anglo-Iranian
Oil Company (AIOC). Mossadegh prometeu expulsar a Anglo-Iranian do
Irã, reaver as vastas reservas de petróleo do país e libertar o Irã da submis-
são ao poder estrangeiro.
O primeiro-ministro Mossadegh cumpriu suas promessas com sincero
entusiasmo. Para delírio de seu povo, ele nacionalizou a Anglo-Iranian, o
mais lucrativo negócio britânico em todo o mundo. Pouco depois, os ira-
BOA-NOITE, MR. ROOSEVELT 19
Lembrei-me do que o meu pai escreveu sobre sua chegada à África com o seu
próprio pai, T. R., em 1909, na viagem do African Game Trials*. “Era uma
grande aventura, e o mundo inteiro era novo!” Eu me senti como ele deve ter
se sentido naquele momento. Na subida da montanha, todo o meu corpo for-
migava de excitação, minha felicidade era total … Em 19 de julho de 1953,
nos deparamos com um funcionário singularmente negligente, além de bron-
co e semi-analfabeto, do serviço de alfândega e imigração em Khanequin.
Naquele tempo os passaportes americanos traziam, ao contrário de agora,
uma curta descrição de algum traço notável do seu portador. Incentivado e
ajudado por mim, o guarda copiou escrupulosamente o meu nome como “Mr.
Scar on Right Forehead”, o que me pareceu um bom presságio.
*Theodore Roosevelt, 26º. presidente dos Estados Unidos (1901-1909), era um conhecido caçador e
naturalista. Em 1908, ele fez um longo safári na África com seu filho Kermit, que relatou em um
livro com este título. (N. T.)
22 TODOS OS HOMENS DO XÁ
caminhar até ser interceptado pelo Chrysler ou Buick onde estavam seus
agentes, em geral hiperativos e excitados pela adrenalina da operação.
Eles planejavam suas táticas diárias passeando pelos arredores montanho-
sos da cidade.
Em suas conversas com o xá, Roosevelt disse que tinha à disposição
“cerca de um milhão de dólares” e vários “organizadores profissionais
extremamente competentes”, capazes de “distribuir panfletos, organizar
manifestações e vigiar a oposição — nós dizemos e eles fazem”. Des-
creveu a Operação Ajax segundo suas “quatro linhas de ataque”. Primeiro,
uma campanha nas mesquitas, na imprensa e nas ruas cuidaria de minar a
popularidade de Mossadegh. Segundo, comandantes militares monarquis-
tas levariam até ele o decreto de sua destituição. Terceiro, as ruas seriam
tomadas por grupos de manifestantes. Quarto, o general Zahedi faria uma
aparição triunfal e aceitaria a indicação do xá para o cargo de primeiro-
ministro.
Era um plano atraente, mas não totalmente convincente, e Mohamed
Reza continuou a hesitar. Assumiu um estado de espírito que Roosevelt
chamou de “irresolução obstinada”. Mas como era “impossível seguir
adiante sem o xá”, conforme mensagem aos seus superiores da CIA,
Roosevelt continuou aumentando a pressão. Era inevitável que a resistên-
cia do xá fosse finalmente quebrada. Ele concordou em assinar os firmans,
como eram chamados os decretos reais, com a condição de que pudesse
sair imediatamente de Teerã para algum lugar mais seguro.
O xá Mohamed Reza nunca se notabilizara por sua coragem, razão
pela qual essa última demonstração de prudência não surpreendeu
Roosevelt. Ambos concluíram que o lugar mais seguro para o xá se escon-
der era um pavilhão de caça da família real nas proximidades de Ramsar,
no litoral do mar Cáspio. Perto dali havia uma pista de pouso, o que, para
o xá, era bastante tranqüilizador.
“Se por algum terrível acaso as coisas derem errado”, disse ele indeli-
cadamente a Roosevelt, “eu e a imperatriz iremos de avião direto para
Bagdá.”
Os dois se encontraram pela última vez na madrugada de 9 de agosto.
Antes de se despedir, Roosevelt achou correto agradecer ao xá a decisão
de cooperar, apesar da relutância. Era um momento histórico, o que reco-
mendava alguma coisa fora do comum. Descobriu, então, uma forma
magnífica de enfeitar sua mensagem.
28 TODOS OS HOMENS DO XÁ
They call you lady luck, but there is room for doubt;
At times you have a very un-ladylike way of running out.
You’re on this date with me, the pickings have been lush,
And yet before the evening is over you might give me the brush.
You might forget your manners, you might refuse to stay
And so the best that I can do is pray:
Luck, be a lady tonight *.