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| s E Meer in 4 = ee Quimica aan ; cc Sek ae eV a Tec Melo Ber Talo) 3° Edigdo | estes PMN iaceuceeRseal-ir4iog i s I peel eR Ree te Rae an a tee 1 4 LT Nia OUNSSO Cee wel MULE Re eee eee OTe ered Tire ran ae e | Vat 6/40) aC hee) Wy, fa ele eek tee ane een a i} ee eee eee er ee Goo ee ena eae ten ey 0 dever do seu compromisso com a nova sociedade. © 1997, Editora U Fone: (0_55) 3332-0217 Fax: (0_55) 3332-0343 Editora@unijul.che.br Hittp://Aww.unijui.tche.br/unijui/editora/ Primeira edigao: 1997 Segunda edigéo: 2000 Terceira edicao: 2003 Capa: Computacao Gréfiea ~ CESPE/UnB rial e Administrativa: da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuf;Iiui, RS, Brasil) Catalogacao na Fonte Biblioteca Central Unijut $337e Santos, Wildson Luiz Pereira dos Educago em quimica : compromisso com a cida~ dania / Wildson Luiz Pereira dos Santos e Roseli Pacheco Schnetzler. ~ 3.ed. Ijui : Ed. Unijui, 2003, ~ 144 p. - - (Colegdo educacdo em quimica) ISBN 85:85866-81-0 1.Educago 2.Ensino 3.Quimica 4,Cidadania 5.Ci dadio 6.CTS 7.Ciéncia 8.Tecnologia 9.Sociedade LSchnetaler, Roseli Pacheco Il. Titulo Ill Série. CDU: 37.54 37:54:342.716 CONSELHO EDITORIAL Alice Casimiro Lopes ~ UFRJ - RJ = UFGO ~ Gods ary Mortimer —UFMG Gomes ~ UERJ ~ RJ UNUUE- RS zi ~ FURG ~ RS 's ~ PUCRS UNIJUE - RS UNICAMP - SP B COMITE DE REDACAO. = Presi Otavio Aloisio Mak Lenir Basso Zanon Mario Osorio M 1 | licamos este livro é meméria de Le de Souza Parente e Paulo Freire, que muito nos ensinaram a acreditar na educacdo. 4 sempre a aprender, “Aquele que ensina es é cotidianamente agraciado com o cont reatestecedor dos jovens, é obrigado por dever do oficio a se atualizar, é contaminado pela esperanca, € desafiado a ter fé € jama's pode esquecer, pela natural confiabilidade da juventude, que a boa vontade é o estado de espirito mais essencial & transformacao do mundo.” Leticia T. S. Parente, 1991 “A pritica educativa & uma pritica politica, que coloca ao educador uma ruptura, uma opcéo, 0 seja, voeé educa com vistas a um certo ideal E 0 sonho de sociedade que voce tem Paulo Freire, 1994 Sumario = SS APRESENTACAO: Um convite para ajudar a construir a cidadania 9 INTRODUCAO, 13 CAPITULO 1 EDUCACAO E CIDADANIA 21 Conceito de cidadania 23 Cidadania, democracia e educagao 26 Educacao e formagao da cidadania 29 Educagao para a cidadania e valores éticos 34 CAPITULO 2 ENSINO DE QUIMICA - E A FORMACAO DO CIDADAO 43 A formacao da cidadania como dispositivo legal e como fungio social do ensino médio 45 ‘A importancia do ensino de quimica para formar o cidadao . 47 Os educadores quimicos brasileiros ea proposta de educacao por meio da quimica 50 © movimento mundial de CTS e a formagao da cidadania . 54 CAPITULO 3 - A FORMACAO DO CIDADAO E 0 ENSINO DE CTS - CIENCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE Significado do ensino de CTS Objetivos do ensino de CTS Contetdos propostos nos cursos de CTS Abordagem dos temas sociais de CTS .. Estratégias de ensino de CTS Avaliagdo nos cursos de CTS Recomendacées para implementagao de cursos de CTS CAPITULO 4 ELEMENTOS CURRICULARES DE PROPOSTAS DE ENSINO DE QUIMICA PARA FORMAR O CIDADAO Objetivos Conteido Procedimentos de ensino O ensino de quimica atual e a formacao da cidadania CAPITULO 5 ENSINO DE QUIMICA PARA A CIDADANIA: Um Novo Paradigma Educacional Dos principios gerais para a elaboracao de propostas de ensino de quimica para formar 0 cidadao Das condicdes para implementagao do ensino de quimica para formar o cidadao Da contextualizacdo social do conteiido na formacao da cidadania Do ensino de quimica para formar o cidadao como um novo paradigma educacional REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS. 57 59 68 73 77 83 86 87 91 93 7 i 15 17 119 121 123 127 133 Apresentagao: Um Convite para Ajudar a Construir a Cidadania Apresentar um livro é algo muito complexo. Afinal &, usualmente, este 0 primeiro contato que os leitares e as leitoras tm com a obra, logo aqui estao linhas que podem ser decis- vas. Esta responsabilidade aumenta, quando o fazemos de li- vros de outros, pois temos que no s6 sensibilizar os futuros erlocutores que se iniciarao com 0 novo texto, mas, ¢ prin palmente, temos que honrar a confianca do autor ou edilora que nos convidou para a tarefa Allias, acredito que quando se apresenta o livro se teste munha 0 autor ou os autores, até porque aquele {o livro) é to imagem e semelhanca deste ou destes. A obra criada r © criador. Assim minha misao ficou duplicada ou melhor triplicada, pois devo falar de uma autora, de um autor e da obra que uma e outro gestaram. Nao é por acaso que a sabedoria do povo diz que nos perpetuamos quando plantamos uma arvore, geramos filhos e escrevemos livros. Um lisro escrito a dois, como (© que aqui apresento, tem caracteristicas dessa produgao inte lectual fecunda que nos faz eternos. O Wildson e a Roseli con- seguem transcendentalizar-se neste texto, e isso por si s6 seria um motivo para aquelas e aqueles que fazem Educacao em nos- so pais se abeberar nestas paginas sumerentas. 9 _ Todos temos uma resposta, quase inquestionével, aquele que € 0 nosso interrogante capital: Por que ensinar? Para fazer de nossos alunos e alunas homens e mulheres que sejam cida- dos e cidadas mais criticos. Quando temos aceitado esta res- posta, surge o complexo e arduo como fazer essa migrac&o para uma cidadania critica, Neste livro nao temos a receita, mas pistas que nos apontam direcdes através de uma tessitura de argumentos que nos desafiam a buscar uma Educacéo ainda mais critica ___ Em meu livro Para que(m) é util o ensino?(Chassot, 1995) digo que a busca de um ensino de Quimica que contribua para a alfabetizagao da cidada e do cidadao, proposta maior do nosso trabalho como educadoras e educadores, esté ratificada na sin- tese final elaborada por Wildson L. P. Santos em sua disserta- go de mestrado. Wildson ouviu, na ocasiao, educadores quimi- cos brasileiros que opinaram sobre o ensino de Quimica para formar 0 cidadao. A dissertagao originou esse livro, A sintese feita entéo e aqui reapresentada faz uma adequada e conve- niente convergéncia para as discussées de uma proposta, onde no cabe um conhecimento quimico desencarnado, como se a Quimica fosse pura (na acepeao de boa e maravilhosa, como costuma, as vezes, ser pintada) e neutra. A transmisséo desses conhecimentos deve ser encharcada na realidade, e isto ndo significa o reducionismo que virou um modismo Quimica do cotidiano (as vezes, apenas de utilitarismo), mas ensinar a Qui- mica dentro de uma concepcao que destaque o papel social da mesma, através de uma contextualizagao social, politica, filosé- fica, historica, econémica e (também) religiosa, Recentemente (julho de 1997) participei de um evento onde estavam varios colegas que se envolvem na formacao de professores e professoras, dizia, entao, “de minha satisfacdo or participar ce um momento de embate intelectual, onde a Educagéo Quimica brasileira poderia ser personalizada por este icone que & a Professora Doutora Roseli Pacheco Schnetzler”. Repito, aqui e agora, a minha reconhecida home- 10 nagem ao que a Roseli fez, faz e fara pela Educacao. Nada do que eu quisesse dizer sobre a co-autora desse livro me parece t&0 significative como o reconhecimento que professores ¢ pro fessoras de Quimica do Brasil tem aquela que € uma das instituidoras da area de Educagao Quimica no Brasil, ¢ isso ¢ bastante para dizer quanto leitores ¢ leitoras vao (re}encontrar neste livro a autora apreciada de outros textos, particularmente de artigos da revista Quimica Nova na Escola que ela ajuda a ceitar ‘Ao trazer estas duas referencias do Wildson e da Roseli, anteriores a este texto, busco enfatizar que nao temios aqui uma obra de estreantes, mas a frulificacdo de sementes que ha muito vem sendo espargidas num continuado fazer Educagao por meio da Quimica Quando em Educagéo em Quimica: compromisso com a cidadania somos levados a entender como o ensino de Q mica para a cidada e 0 cidadao deve estar centrado na inter- relacéo de dois componentes basicos: a informacdo quimica ¢ ‘© contexto social, pois para 0 cidadao ou a cidada participar da sociedade precisa nao sé compreender a Quimica, mas enter der a sociedade em que esté inserido Quando, com entusiasmo, convido a cada um e a cada uma a fazer parcetia com 0 Wildson e a Roseli na construcao da cidadania, nao posso furtar-me nesta apresentacao de fazer uma homenagem reconhecida a Editora Unijui, pela fantastica se- meaduta de livros que tem feito na busca de transformar a Edur cago brasileira. Quando uma Editora como a Unijui acrescen’ ta mais um livro em seu catélogo se iniciam, sonhadoramente, novas esperancas. J ponho-me a imaginar - e aqui viilico 0 significado desse verbo - cada uma e cada um dos que dialoga- yo com o autor e a autora deste livro numa das mais fantasticas realizagées concebidas pela mente humana: binémio fecundo escrita-leitura. Este didlogo seré mais pleno medida que con: tribuir para as sonhadas transformagdes na Educacao. nn Eaq que se lé por primeiro - esta apresentagao - € o que da por terminada a etapa do escrever um livro. E um mo: mento de quase éxtase: o livro esta escrito. Agora, 0 binémio antes referido passara a existir na leitura, que se espera, havera de se tornar mais fértil nas respostas as muitas interrogacées que estao nesse livro. Que cada uma e cada um tenha um go muito construtivo. Porto Alegre, no alvorecer da primavera de 1997 Attico Chassot Introdugao —E “Devemos ensinar que 0 cidadéo poss: com 0 mundo.” (Attico In para pe A presenga da quimica no dia-a-dia das pessoas é mais do que suficiente para justificar a necessidade de o cidadao ser in formado sobre quimica. Todavia, 0 ensino atual de nossas esco las esta muito distante do que o cidadao necessita con para exercer a sua cidadania. As diversas investigacoes volvidas nas duas Ultimas décadas acerca do ensino de nas escolas tém evidenciado o que foi constatado por nds, em entes trabalhos: o tratamento do conhecimento quimi tem enfatizado que a Quimica da escola nao tem nada a ver com a quimica da vida (Schnetzler, 1980) e “os objetivos, con tetido e estratégias do ensino de quimica atual estao dissociados das necessidades requeridas para um curso voltado para a for mago da cidadania” (Santos, 1992, p. 116). E assim que tary bem consideramos valida a hipdtese de Chassot: “o ensino qu se faz, na grande maioria das escolas, ¢ - literalmente - init sto é, mesmo se nao existisse, muito pouco (ou nada), seria ilerente.” (Chassot, 1995, p. 29). 13 Apesar de constatarmos tal situagio, acreditamos na pos sibilidade de transformé-la, pois se a escola tem a funcao de reproduzir a ideologia dominante, mantendo o status quo, como afirmam os estruturalistas marxistas, ela, por outro lado, consti- tui também um espaco contraditorio de contra-hegemonia. A nosso ver, nao se trata de retomar a discussao ideolagica do papel da escola, to amplamente discutido no meio académico nos anos oitenta, mas, sim, recuperar a funcao social da escola de formar cidados, como tem sido defendido pelos educa- dores, Na busca do sonho utdpico de educar para a cidadania, propusemo-nos neste livro apresentar contribuicées que pos- sam orientar aqueles que ainda lutam para transformar o ensino inutil de quimica em um ensino comprometido com a (re)construcdo de uma nova sociedade. Sonhamos, assim, como. © Prof. Chassot, “em fazer com que as professoras e os profes- sores de quimica aproveitem esta ciéncia para fazer Educagao. (Chassot, 1995, p. 15) Com tal intuito, realizamos duas investigagées: a primeira constou de anélise de contetido de entrevistas semi-estruturadas itas a educadores quimicos brasileiros, visando interpretar as suas opinides sobre como entendem e configuram propostas para a implementacao do citado ensino e a segunda se consti- tuiu em reviso de literatura sobre 0 movimento mundial de ensino de Ciencia, Tecnologia e Sociedade, CTS. Tais invest gacées foram objeto da Dissertagéo de Mestrado! O Ensino de Quimica para formar o cidadao: principais caracteristicas e condigées para a sua implantagéo na escola secundaria bra- sileira (Santos, 1992). Julgando que as informagées contidas nesse trabalho académico contribuem significativamente para 0 fazer pedagogico do dia-a-dia de sala de aula dos professores de quimica, resolve mos adap%s-lo e publicévlo na forma de livro. Dissertagio elaborada por Wildson Luiz Pereira dos Santos sob a orientago da Prof*. Dr! Rose Pacheco Schnetzler A primeira investigacao teve o objetivo de levantar carac~ teristicas do ensino de quimica para format o cidadao, enfocando teflexdes sobre os componentes curriculares e sobre o ensino atual. Considerando que, desde a década de cingtienta, tém-se desenvolvido no Brasil diversos projetos visando a melhoria do ‘ensino de ciéncias, incluindo-se ai o ensino de quimica (Barra e Lorenz, 1986; Krasilchik, 1980, 1987), 0 que veio a formar uma comunidade académica, caracterizada por Krasilchik (1987) como educadores em ciéncia e que, no caso, denominaremos ‘educadores quimicos, resolvemos levantar as caracteristicas do ensino de quimica para a cidadania, entrevistando educadores quimicos brasileiros?, os quais constituem, hoje, uma comu dade cientifica consolidada que vern defendendo a formacao da cidadania como objetivo basico do ensino médio de quimica A influéneia da comunidade no meio académico tem sido evidenciada pela publicac&o de artigos especificos sobre o ensi- no de quimica, pela elaboracdo de projetos curriculares inova dores, pela formagao de nitcleos de pés-graduacao, pela ree zagao de Encontros Nacionais ¢ Regionais de Ensino de Qui cae pela sua atuacdo na Divisio de Ensino de Quimica da So- ciedade Brasileira de Quimica, SBQ. Os trabalhos produzidos pela referida comunidade tém ressaltado a importancia do ensino médio de quimica em aten- der as necessidades sociais relativas a esse campo de conheci- mento, 0 que se relaciona com ensino para a cidadania, Nes- se sentido, julgamos ser fundamental sistematizar as principais proposigées de tal comunidade a respeito do que se constitui o ensino de quimica para formar o cidadao. Para tanto, propuse- mos realizar a anélise de contetxlo de entrevistas a educadores quimicos bra: 15 A anélise de contetdo & um proceso analitico que se aplica a discursos. Ela é constituida por um conjunto de técnicas miltiplas, as quais visam interpretar o conteido das informa: Ges obtidas. Para essa investigagio, foram selecionados doze educa dores quimicos, por meio de critérios objetivos. A anélise do Curriculo dos entrevistados evidencia que a clientela delimitada era constituida por pessoas com formacao académica tanto em Quimica, como em Educacao, com efetiva atuagao na area de educagao quimica e com larga experiéncia no magistério, n> ensino superior, no ensino médio e em cursos de formacao de professores. Os principais resultados da andlise de contetido das entre- vistas foram incorporados no capitulo quatro, no qual desenvol- vemos as proposi¢ées que caracterizam 0 ensino de quimica para formar o cidadio A segunda investigacao teve como objetivo caracterizar 0 movimento de ensino de CTS, enfocando, em particular, os projetos de ensino de quimica e visando, a partir d subsidios que facilitem a elaboragao de materiais di objetivem o desenvolvimento da cidadania extrair icos que O movimento mundial de ensino de CTS teve a sua ort gem no inicio da década de setenta. Desde entao se tem defen- dido a sua incluso no ensino de ciéncias de diversos paises (Fensham, 1981 e 1988; Hofsteinet al., 1988; Knamiller, 1984; McConnell, 1982; Solomon, 1993; Solomon e Aikenhead, 1994; Wessen, 1985; Zoller et al,, 1991b). A origem desse movimento pode ser explicada pelas conseqiiéncias decorren- tes do impacto da ciéncia e da tecnologia na sociedade moder- na (Hart e Robottom, 1990; Layton, In: Solomon e Aikenhead, 1994; Lowe, 1985; McKavanagh e Maher, 1982: Roby, 1981), © que, de certa forma, justfica 0 fato de o movimento ter surgi. do em varios paises em uma mesma época 16 Tal explicagao para o referido ensino evidencia que o mesmo apresenta um carater interdisciplinar, manifestando a preocupacao central com os aspectos sociais relativos as aplica- ‘cées da ciéncia e tecnologia, 0 que se vincula diretamente formagao da cidadania, Essa vinculagéo é explicitada na citagao a seguir de Pogge ¢ Yager (1987), referente ao relatério do “Projeto Sintese”, desenvolvido no inicio da década de oitenta, por meio de consulta a varios educadores em ciéncia, o qual resultou em importantes recomendacées para o ensino de cién- cias, incorporadas a varios projetos e pesquisas de ensino de CTS (Hofstein et al., 1988; McConnel, 1982; Rubba, 1989; Waks e Barchi, 1992; Wallace, 1986; Wessen, 1985; Zoller, 1990): “O ensino de ciéncias deve apresentar informagoes que prepa rem os cidadaos para tratar responsavelmente as questdes sociais relativas 4 ciéncia." (Pogge e Yager, 1987, p. 221) [tra- dugio e grifo nossos| ‘Uma segunda justificativa para 0 surgimento do movimento de CTS relaciona-se & mudanga de visdo sobre a natureza da ciéncia e do seu papel na sociedade (Lowe, 1985; Mckavanagh fe Maher, 1982; Roby, 1981; Solomon e Aikenhead, 1994; Ziman, 1985). Tais mudangas decorreram de novos estudos sobre a filosofia e a historia da ciéncia, tendo tido uma impor- tante influéncia nesse sentido a obra de Kuhn (1989), conforme menciona Lowe (1985) A evidéncia da importancia do ensino de CTS é manifes- tada pela grande repercussdo de seu movimento mundial, que tem sido reportada por varios autores, por meio de indicadores, como a realizagdo de congressos internacionais e conferéncias especificas sobre CTS, ocorridos em varios paises; a recomen- dag&o da inclusdo nos curriculos de ciéncia de tal abordagem, feita por entidades educacionais e varias conferéncias de ensi 1no} o desenvolvimento de dissertacées e de trabalhos de pesqui 17 sa sobre a abordagem de tal tematica; a elaboracao, difusio avaliacao de propostas curriculares desse ensino em diversos s (Aikenhead, 1990; Fensham, 1988; Hofsteinet al., 1988; , 1984; Solomon, 1993; Solomon e Aikenhead, 1994; Zoller et al., 19916) Outros indicadores da repercusséo do movimento de CTS no ensino de ciéncias podem ser verificados, também, pelos resultados de algumas pesquisas. Fensham (1988) descreve a investigacao realizada, em 1983, que constata a presenca de algum movimento de CTS nos sistemas educacionais de trinta e quatro paises. Bybee e Mau (1986), em investigagao junto a educadores em ciéncia de quarenta e um paises, também iden- tificaram que ha nas escolas algum ensino de temas relaciona- dos com CTS. Alem disso, nos periédicos internacionais que tratam do ensino de ciéncias é encontrado um grande ntimero de artigos especificos sobre CTS*, bem como referéncias de vasta literatu- ra a esse respeito, incluindo-se revistas e livros especializados (Aikenhead, 1990). Finalmente, outra evidéncia da importancia do ensino de CTS ¢ manifestada pelos resultados de varias pesquisas desen- volvidas com o objetivo de captar a concepgio de alunos e do piiblico em geral sobre as interacées entre ciéncia, tecnologia e sociedade, as quais constataram que tanto o piblico em geral quanto os estudantes néo possuem uma compreensio satisfatéria dos aspectos fundamentais da ciéncia e tecnologia que fazem parte da sua vida diaria (Aikenhead, 1987, 1988; Collins e Bodmer, 1986; Fleming, 1986a, 1986b, 1987; Layton et al., 1986; Millar e Wynne, 1988; Rubba, 1989) Todas essas consideracées justificam a importancia do ensino de quimica para a cidadania e demonstram que uma * Na revisdo da literatura internacional sobre o ensino de CTS, desenvolvide na Dissertacdo de Mestrado, foram encontradas quase duas centenas de igos sobre o referido ensino 18 revisio da literatura sobre o ensino de CTS podera vir a subsidiar a elaboracao de materiais didaticos de ensino de quimica, Considerando, ainda, que o objetivo geral para a educa- ‘cao basica @ o preparo para o exercicio consciente da cidada nia, entendemos que novas propostas curriculares precisam ser desenvolvidas dentro de tal concepeao, para que possam garan tir 0 alcance do citado objetivo. No entanto, desde que a elabo- rago de propostas de ensino implica a adocao de prin filos6ficos que as orientem, torna-se imprescindivel realizar in- vestigacdes que fornecam subsidios para o alcance daquele ob- jetivo basico para o ensino de quimica. Foi, neste sentido, que desenvolvemos as duas citadas pesquisas. Tais investigacdes foram realizadas, entdo, na busca de respostas aos seguintes questionamentos: O que significa e como seria 0 ensino de quimica para formar o cidadao? Quais so as condigdes necessarias para a sua implementagao no Brasil? Sera esse ensino vidvel no contexto nacional? Serao viaveis e com- pativeis ao contexto brasileiro as proposigSes encontradas na literatura internacional sobre CTS? Consideramos que a adogao de dois referenciais para 0 levantamento de subsidios para a elaboracdo de propostas curriculares de ensino de quimica para formar 0 cidadao reflete uma posicao critica de, ao mesmo tempo, contextualizar ¢ valo tizar 0 trabalho dos educadores quimicos brasileiros que ha dé- cadas estao estudando e propondo medidas de inovacao para 0 mica brasileiro, bem como refletir e considerar as proposicées j4 desenvolvidas e aplicadas em varios paises, Iniciamos 0 lio, delineando consideragées filoséticas ¢ sociolégicas em torno do coneeito de cidadania e da sua relagao com a educacao. Tais consideragées esbogam pontos teérices fundamentais para maior compreensao e interpretagao das pro- posigdes desenvolvidas nos caj 19 No segundo capitulo, discorremos sobre a importancia do ensino de quimica para formar o cidadao na educacao basi. tulo apresentamos a revisio da literatura sobre © movimento mundial de CTS e no quarto capitulo apre- sentamos as proposigées que caracterizam 0S componentes curriculares do ensino de quimica para formar 0 cidadao lo, fazemos a caracterizagao do ensino mica para formar o cidadao, estabelecendo os principios Gerais para a elaboracdo de propostas curriculares para o refe- Tido ensino, bem como as condigdes para a sua implementagéo. Esperamos com o presente trabalho contribuir para a di- tarefa de transformar o ensino médio de quimica, de modo que venha a cumprir a sua fungo basica de auxiliar a consolida- so da cidadania dos individuos, colaborando, assim, para a construcao de uma sociedade demoeratica que tenha a partici- Pago efetiva de seus membros, por meio da garantia de seus direitos e do compromisso de seus deveres Educacao Cidadania Educacao e Cidadania Ao se falar em educagao e cidadania, é necessario rever o conceito de cidadania para se estabelecer relacdes com a edu- cacao. Refletindo-se sobre tal vinculagaa, pode-se extrair impli- cacées para o ensino de quimica. Conceito de Cidadania O conceito de cidadao teve origem na Grécia antiga. Se gundo Aristoteles, “Um cidadéo no sentido absoluto nao se define por nenhum Dessa conceituacao, destaca-se a participagdo como ca racteristica basica da cidadania, podendo-se dizer que cidadao o homem participante (Canivez, 1991; Demo, 1988; Marshall, 1967), es, Politique, trad. Tricot, Vrin, 1982, Lill, eap.1, eitado por 1991, p. 176, 23, Acerca da participacao, Demo (1988) afirma “Dizemos que par rocesso, no sentido leg ante vira-ser, sempre se fazendo. Assim, participagao é em oa ‘autopromogao e existe enquanto conquista proces- “A partir dessa nocdo, coloca-se a outra, dé _ A . tra, de que participagio no pode ser entendida como dadiva, como concesséo, como algo jd preexistente.” (p. 18) [grifo nosso}, Ao se considerar a participacao como proceso de autopromocio, verifica-se que ela é desenvolvida pelo indivi- duo, ou seja, @ conquistada e, logo, nao pode ser transmitida, nem concedida. Assim, pode-se afirmar que cidadania também € conquista (Covre, 1986; Demo, 1988). Outra consideracéo importante sobre a participacao refe- Te-se a sua relagéo com a comunidade, ou sej questao da Participacao comunitaria. Partindo do conceit caracteristica essencialmente humana, Demo (1988) afirma que a condicao basica para a formacao comunitéria esté na sua iden- tidade cultural, nos seus valores e simbolos cultivados. Nesse sentido, a motivagdo & Participacao comunitaria ocorre 4 medi- da que ha uma identificagdo cultural, donde se pode concluir que a condicao essencial para a Participacao comunitaria est em seus membros se sentirem como pertencentes 20 grupo, “A comunidade somente reconheceré com: 10 seu aquele projeto que, mesmo tendo vindo de fora, é capaz de revestir-se de tragos culturais do grupo. E preciso encontrar o eco reconhecido de algo que é seu, de algo que se encaixa na historia vivida, de algo que aparece nas determinag6, el leterminacdes do potencialidade & nosso]. Além da participaco, a conceituagao de cidadania englo- ba dois outros elementos, quais sejam, os direitos e os deveres (Canivez, 1991; Covre, 1991; Marshall, 1967). Quanto aos direitos, eles sao, modernamente, garantidos pelo Estado constitucional, sendo fundamentados nos humanos. Esses, por sua vez, possuem um relativismo conforme demonstram a etnologia ¢ a sociologia, ca que 0 seu estabelecimento depende da cultura para a qual se dirige, no sendo possivel a adogao de procedimentos objetivos para a definigao de seu cardter universal Sobre os deveres, pode-se destacar a caracterizacao de que eles se relacionam ao compromisso comunitario de coope- Tago e co-responsabilidade (Demo, 1988} Apesar do relativismo cultural dos direitos humanos, Canivez (1991) destaca que é preciso reconhecer a universali- dade de certos princfpios éticos, cuja validade no se limita a0 dominio de determinada cultura. Afirmando que os direitos hu- manos sio direitos naturais, pois fundamentam-se no princi- pio da preservacao da vida, da liberdade e da consciéncia da natureza racional do homem, a referida autora extrai desse tl ‘mo principio as seguintes consideragoes: “Essa consci@ncia é consciéncia moral: & a consciéncia de um dever, 0 de respeitar no outro como em si mesmo a liberdade © a dignidade do ser racional. Isto quer dizer que o individuo reco- nhece seu dever imprescritivel de submeter seus interesses pu es, apenas naturais etc,, & lei da ra- © obriga a nao querer nada que no 25 uerkdo por todos os outros indviduos sem que sso resuitem contradicdes e um acréscimo de violencia na comunidade.” (Canivee, 1991, p. 88) [grfo do autor) A partir dai, Canivez (1991) reafirma que, apesar de nao ser demonstravel, os direitos humanos so fundamentados em Principios éticos universais, podendo ser representados pela Declaracdo Universal de 1948, aprovada pela Organizagao das Nagoes Unidas. O fundamento de tais direitos é o respeito in- condicional 8 pessoa humana. Outro fundamento basico dos direitos do cidadao esta no prinefpio da igualdade (Canivez, 1991; Covre, 1991; Demo, 1988; Marshall, 1967). Tal principio implica existéncia do Esta- do de direito, o qual é inerente as democracias. Sendo assim, percebe-se que o conceito de cidadania esta diretamente vincu- lado ao conceito de democracia, como se pode depreender da discussio do item a segulr. Cidadania, Democracia e Educagao ituigdo, ¢ tal € a razao pela qual a dei cidadao ¢, (Aristoteles* ‘gio que demos do bretudo, a de cidad’o em uma democracia,” fo nossol, Embora existam diferentes concepgdes em torno do con- ceito de democracia, todas incluem a participagao como um. elemento comum. Aristételes identificou a democracia como o F Aisén, Politique, tad, Toot, iin, 1982, Lil, eapat, Canivez, 1991, p. 177. aera eee 26 Estado no qual a multidao governa, enquanto Rousseau a consi derou como sendo o Estado no qual a maioria do povo gover- na. Em ambos 0s casos, esta presente a caracterizagao da par- ticipacéo dos cidadsios no governo em que a forma como se ds esta participacao diferencia os tipos de democracia. Na democracia ateniense, os cidadaos participavam dire- tamente das assembléias nas quais se tomavam as principais decisdes referentes ao Estado, portanto, aquela democracia era direta e nao representativa. Nas democracias modernas, hi a participacdo dos cidadaos no processo de escolha dos / \\ MEIO ARTIFICIALMENTE MEIO SOCIAL CONSTRUIDO TECNOLOGIA |¢>} SOCIEDADE 3 Batraido de Hofstein et 1988, p. 358 (tradugdo nossa} 60 Por sua vez, Roby (1981) considera que os cursos de CTS visam trazer para os estudantes conhecimentos que os levem a participar da sociedade moderna, no sentido da busca de alter- nativas de aplicagées de ciéncia e tecnologia, dentro da visio de bem-estar social. Diante do impacto atual da tecnologia, torna-se necessaria a integrago harménica do desenvolvimen’ to técnico-cientifico com o meio ambiente ¢ com as necessida- des vitais da humanidade. ‘Solomon (1988) aborda, separadamente, os trés compo- nentes de CTS, esclarecendo o significado que cada um tem nessa proposta de ensino. Assim, quanto a ciéncia, afirma que 08 cursos de CTS devem ensinar 0 carater provisério ¢ incerto das teorias cientificas, Com tal compreensao, os alunos pode: yao avaliar as aplicagdes da ciéncia, levando em conta as opini- es controvertidas dos especialistas. Ao contrario, com uma visso de ciéncia verdadeira e acabada, os alunos terao dificul dade de aceitar a possibilidade de duas ou mais alternativas para © problema em questo, Quanto a tecnologia, Solomon (1988) afirma que ela deve ser apresentada como aplicacao das diferentes formas de co- nhecimento para atender as necessidades sociais. Dessa forma, © aluno compreendera as pressdes das inovacées tecnolégicas na sociedade, caracterizando a tecnologia como um processo de producdo social e reconhecendo a dependéncia da socieda- de para com os produtos tecnologicos gerados. Finalmente, sobre sociedade, a citada autora considera ‘que se deve levar os alunos a perceberem o poder de influéncia que eles tem como cidadaos, Assim, eles seriam estimulados a patticipar democraticamente da sociedade por meio da expres- s80 de suas opinides. Deve-se ainda levé-los a compreender como a sociedade pode atuar no poder legislativo. A autora considera também fundamental a reflexao sobre os problemas éticos relacionados com a sociedade (Solomon, 1988) Holman (1988), no editorial do International Journal of Science Education, que teve como tema central “Ensino de 61 Ciencia-Tecnologia-Sociedade", destaca que esse ensino nao atende exclusivamente aos interesses de uma educagao cientifi ca, mas, sobretudo, nesse ensino “deve existir uma énfase na cidadania, ao preparar estudantes para o seu papel em uma sociedade democ (Holman, 1988, p. 343) ltradugao e grifo nossos). Tal consideracao vincula o ensino de CTS aos direitos do cidadao e & sua participacao na sociedade democré- tica, vinculagao essa que é também apontada pela maioria dos autores de artigos de CTS revisados Pode-se depreender também o significado do ensino de CTS por meio da sua comparagao com 0 ensino tradicional de cléncias. Neste sentido, os quadros 1 a 4 sao iteis para explicitar © significado do ensino em questao. Se QUADRO 1 -Aspectos enfatizados no ensino cidssicode cinclae no ensino de CTS Fnsino de OTS le comreende. ¥ Bxtraido de Zoller e Watson, 1974, p. 110 [tradugao nossa 62 QUADRO 2 - Ensino de ciéncla fradicionale o ensino de CTS" ‘Uma abordagem tradicional da ciéncia ‘em relagao a unidade metais ‘Uma abordagem de CTS em relagio A unidade motais Classticagéo e propriedades dos metals e nao-met 1. Diversidade e fungbes de materiais ios de uso. problemas de desper desuso). Produgao de mater as propriedades e apl metals maleabilidade, dureza, densidad ductibiidade ete Visio histérica da descoberta dos rmetaiseligas metdicas, bem como dos efeitos sobre a tecnologia e a sociedade Estudo das propriedadesfisicas e ‘uimicas e das aplcagSes de metais selecionados, e.g. chumbo, feo, cobre 4. Pesquisa sobre meta processos, 0s qual estimulado 0 desenvolvimento de novas tecntogias. 4, Estrutura atOmica © propriedades ¢ uso. Principais conquistas que ocorreram nas pesquisas com metai, ‘especialmente na campo de ligas metalicas, e novas melas que esta senda pesquisados atualmente para extragdo de meta ipretagles atuals sobre metais 8 ligas metaicas e a busca de ‘novos conhecimentos. 9 Extraido de MeKavarach 0 Maher, 1982, p. 71 [tradugao nossa 63 Verifica-se nos quadros 1 ¢ 2 a diferenca fundamental entre CTS eo ensino classico, sendo caracterizado o ensino de CTS pela organiza¢ao conceitual centrada em temas sociais, pelo desenvolvimento de atitudes de julgamento, por uma con- cepsao de ciéncia voltada para o interesse social, visando com- preender as implicagées sociais do conhecimento cientifico. Por outro lado, 0 ensino cldssico é caracterizado pela organizagio curricular centrada no contetido: especifico de ciéncias, com uma concepgao de ciéncia universal, que possui valor por si mesma e nao pelas suas aplicacées sociais. Ainda dentro dessa caracterizago de CTS, os quadros 3 ¢ 4 apresentam os seus principais aspectos, quais sejam, o estu- do da natureza da ciéncia, da tecnologia e da sociedade e de suas inter-relagdes, de modo que o aluno compreenda a interdependéncia de tais componentes, sob uma perspectiva social. Todas essas consideragées evidenciam que os cursos de CTS se organizam segundo uma abordagem interd ensino de ciéncias, cuja organizacio difere signi mente dos cursos convencionais de ciéncias centrados exclusivamente ‘na transmissao de conceitos cientificos. linar de Tal diferenca pode ser sintetizada pela caracterizagao apre- sentada por Barrentine (1986) a respeito do ensino através da ciéncia e do ensino para a ciéncia. O ensino através da cién- cia, no qual se enquadta o ensino de CTS, refere-se & prepara- «0 de cidadaos, a partir do conhecimento mais amplo da cién- cia e de suas implicagdes para com a vida do individuo. Ja 0 ensino para a ciéncia refere-se & formagao do especialista em ciéncia, por meio do dominio do conhecimento cientifico geral, necessario para a sua atua¢ao profissional. Pode-se destacar, ainda, que, apesar da caracterizagao apresentada por Mckavanagh e Maher (1982), nem todos as 64 QUADRO 3 - Nove aspectos da abordagem de CTS Esclarecimentos Cidncia & uma busca de conhecimentos dentro de uma perspectva social Tecnologia envolve 0 uso do conhecimento ico € de outros conhecimentos para resolver sas prdticos. A humanidade sempre teve tecnologia A sociedad & uma sectos de CTS: 1. Natureza da Ciéncia 2. Natureza da Tecnologia 3, Natureza da igo humana na qual ‘A produgdo de novos conhecimentos tem estimulado mudangas teonol6gicas, ‘tecnologia disponivel a um grupo humana Elta da Tecnologia sobte a Sociedade Eeito da Sociedade sobre a Giéncia aves de investentos e outas pressbes, a sociedade influencia a diregdo da pesquisa cienttica, 0s desenvolvimentas de teoras cientiicas podem das passoas e as Eteto da Ciencia sobre @ Sociedade twenciar 0 pensamen Presses dos 6rgaos piblicas e de empresas privadas podem ifluenciar a diregdo da solugao do problema e, em conseqUéncia, promover mudangas Eta da Sociedade sobre a Tecnologia da Tecnologia dade dos recursos teenolagicns 4 ov amplard os progressos cientiticos. ranagh e Maher, 1982, p. 72 [traduéo nossa] 65 QUADRO 4~ Os nove aspectos da abordagem de CTS & 0s exemplos correspondentes para atelevisdo® Aspectos de CTS 1. Natureza da Giéncia_ | 4. Durante muitos anos a pesquisa tem fornecido ‘muitasinformagdes ¢ apenas uma pequena proporgao desta tem sido iti na tecnologia da isda moderna 2. Natureza da 2, Aelevisdo resutou, em parte, de um projeto de Tecnologia desejo de resolver problemas tecnicos de transmissao de imagens a longa distancia ‘3. Natureza da ‘3. Aelevisio permite a projegao de diferentes Sociedade culturas e valores. 4. Efeito da Ciencia 4 A compreenséo das propriedades fisicas e sobre a Tecnologia ‘uimicas dos condutores ndo-metalicos proporciona a produgdo de circuitos de televiséo ansistorizados, 5. feito da Tecnologia levisdo tem afetado muito a sociedade, sobie a Sociedade especiaimente o modelo de interagdes hummanas, or meio da apresentacao de noticias, espartes € tiversées. 6. Eteto da Sociedade | 6. Indstias governamentas e privadas tém sobve aCiéncia investido extensivamente em pesquisas do estado sélid, as quals beneficiam a pradugdo de levisares, 7. feito da Giéncia 7. O conhecimento das pessoas sobre 0 ‘sobre a Sociedade funcionamento do seu corpo tem aumentado por meio de programas de televisdo. ‘8. Addemanda de consumo pela televisdo tem estimulado a busca de aparelhos melhores, menores e mais baratos. 8. Efeito da Teonologia [8 0 uso de circuitofechado de sobre a Gi 8 Efeito da Sociedade sobre a Tecnolagia iso e controle ia de play-back facilta 0 avango da compreen do comportamento human, © Extraido de McKavanagh Maher, 1982, p, 72 [tradugio nossal 66 propostas de ensino que vém sendo denominadas CTS esto centradas nos nove aspectos descritos nos quadros 3 e 4. Isso tem levado ao estabelecimento de varias classificagdes dos cur sos de CTS, conforme o foco central que é enfatizado (Aikenhead, 1990; Fensham, 1988; Gaskell, 1982; Lowe, 1985; Rosenthal, 1989). Apesar das classificagoes, @ preciso esclarecer que sd sio denominados cursos de CTS aqueles cujo contetido inter-relay one os diferentes componentes relativos a ciéncia, tecnologia ¢ sociedade, ainda que se possa reconhecer que hé cursos dessa natureza que se preocupam mais com a motivago do aluno do que coma formacao do cidadio. Nesse sentido, afirma Holman (1988): “Para alguns, a principal importancia de CTS é como um meio de assegurar justia social: para eles 0 aspecto chave ¢ fornecer 20s estudantes meios para considerarjulgamentos concernentes a temas relativos & sociedade. Outros enfatizam a importancia de CTS para tornar a ciéncia mais acessivel para os estuxlantes de todas as habilidades e aptiddes, uma abordagem adotada por exemplo, pelos projetos Salters na Inglaterra. Ao relacio- nar a ciéncia aos seus aspectos sociais ¢ tecnolagicos, argu- menta-se que @ cigncia ficaria mais significativa para aqueles que t2m pouco interesse por esta materia.” (Holman, 1988, p. 343} [tradugao nossa) Considerando 0 objetivo de formagao do cidadao. pode-se destacar que os cursos que mais se enquadram em tal perspeetiva so 0s que dio maior énfase aos aspects sociais da ciencia e da tecnologia. Por isso, vale ressaltar, a seguir, as prin- ipais caracteristicas, quanto aos objetivos, contetido, estra- tégias de ensino e avaliacdo dos cursos de CTS que apresentam um foco de abordagem nos aspectos sociais’voltados para a cidadania 67 Objetivos do Ensino de CTS Em termos gerais, 0 objetivo mais freqientemente apon tado por inimeros pesquisadores para os cursos com preocu ago central na formagio da cidadania refere-se ao desenvol vimento da capacidade de tomada de decisdo (Solomon e Aikenhead, 1994). Essa relaciona-se & solugao de problemas da vida real que envolvem aspectos sociais, tecnologicos, econd- micos e politicos, o que significa preparar o individuo para par ticipar ativamente na sociedade democratica, Sobre tal objetivo, Zoller (1982) considera essencial que o curriculo de ciéncias do ensino secundario seja planejado de forma a assegurar o desenvolvimento daquela capacidade de tomada de decisdo. Destaca 0 citado autor que desenvolver essa capacidade significa preparar o individuo a participar ativa- mente na sociedade democratica, na busca de solugao de pro- blemas que envolvam aspectos sociais, tecnolégicos, econmi- cos ¢ politicos. Neste sentido, afirma que ensino com 0 obje- tivo de desenvolver a tomada de decisdo é significativo em ter- mos de: a) facilitar decisdes sensiveis e razoaveis em um mundo conflitante; “b) fazer com que a sociedade atue de modo produtivo em to- dos os niveis - esperanclorse um minimo de atrito soci “@) melhorar a perspectiva da sobrevivéncia, tanto da pessoa, quanto da sociedade; “d) ausiliar as pessoas a compreenderem, estimarem e aval rem as decisées dos outros.” (Zoller, 1982, p. 12) |tradugao nossal. Ainda com relacao ao objetivo em questéo, Heikkinem (1987) explicita as diferengas que existem entre a solucdo de um problema escolar e a tomada de decisdo frente a proble- ‘mas da vida real, as quais so apresentadas no quadro 5. 68 ‘QUADROS - Comparagao entre a solugao de problema escol a lomada de decisaotrente 2 problemas da vida real Solugao de problema escolar Tomada de decisdo de problema a vida teal As diferencas apresentadas no quadro 5 podem ser ca- racterizadas pela objetivacao presente na solucdo de problema académico e pela subjelivagio presente na solucao de proble- mas da vida real, isto é, para o primeiro tipo de solugdo, basta a informacao; para o segundo, é necessario o julgamento de valor. ‘Alem do objetivo relativo capacidade de tomada de de- cisdo, um segundo propésito dos cursos de CTS refere-se a compreenséo da natureza da ciéncia e do seu papel na socieda- de, 0 que implica a necessidade de 0 aluno adquirir conhect- mentos basicos sobre filosofia e historia da ciéncia, para com- preender as potencialidades ¢ limitagdes do conhecimento cientifico. A justficativa para a recomendacao do ultimo objetivo decorre das conclusdes de inimeras pesquisas que demonstra 1 Bstraido de Zoller e Watson, 1974, p. 110 ltraduedo nossa 69 ram que tanto os alunos, como o piiblico em geral, tém apre- sentado uma falsa concepcao da natureza e das limitagdes da ciéncia, bem como do seu papel na sociedade (Aikenhead, 1987, 1988; Fleming, 1986b; Lederman e O'Maller, 1990; Millar e Wynne, 1988) Esses dois objetivos basicos sio encontrados nos artigos que especificam os propésitos gerais e especificos dos cursos de CTS que enfatizam a consolidacao da cidadania, como se pode depreender da citacdo a seguir “1. Preparar o individuo para agir de mado inteligente em uma sociedade do futuro. Formar um cidadao capaz e disposto a ser um agente da mudanga social. (..) “3, Ajudar 0 aluno a desenvolver a adaptabilidade e a flexibil dade, . “4. Preparar os estudantes para a filiago e participago nos sistemas politicos e sécio-econdmicos. “5, Desenvolver a capacidade do aluno para efetuar uma ava- liagao tecnologica. (..) “6. Formar uma pessoa que tome decisio, que avalie o papel das decisdes humanas na determinagao da sobrevivencia e da vida da sociedade futura; (..) “7. Desenvolver habilidades de resolver problemas complexos da vida real. (..) “8. Aumentar o conhecimento dos estudantes em relagdo a0 seu meio ambiente e desenvolver neles a capacidade de de- enderem do seu préprio pensamento, quando aplicarem. © que aprenderam em situagbes ndo-familiares, “9, Desenvolver a capacidade discriminatéria para decidir que informatio e conhecimento so relevantes para resolver ‘amente alqum problema especifico no campo sécio- tecnolégico, 10. Capacitar os estudantes a compreenderem o poder ¢ a fragilidade de alguma teoria com respeito a sua capacida- de de explicar e predizer (..) verdades "bem estabelecidas' e valores ‘aceltos universal mente’ vante e esteja de pleno acordo com seus interesses, ne cessidades e aspiragées.” (Zoller e Watson, 1974, p. 112- Por sua vez, 0 desenvolvimento da capacidade de toma da de decisdo, bem como a aquisicao de conhecimentos bast cos de ciéncia, constituem, também, os objetivos fundamentais dos projetos de ensino de quimica elaborados segundo a abor- dagem de CTS. Thier ¢ Hill (1988) apontam que o objetivo central do projeto americano, CEPUP, Programa de Ensino de Quimica para Entendimento Piblico é o de desenvolver nos alunos uma maior conscientizacao, conhecimento ¢ interpreta go acerca dos produtos quimicos e como eles interagem nas nossas vidas, pois @ essencial que ‘As pessoas aprendam a fazer questdes pertinentes e a obter ‘evidencias para usé-las como fundamento para a tomada de decisso. ‘As pessoas compreendam os limites associados as evi dencias cientificas. 3 {As pessoas compreendam a natureza da investigagao cien tfica a fim de participarem da formulacao vas relacionadas & quimica.” (Thier e Hil, 1988, p. 429) Itraducao nossal. 7 Quanto ao Projeto de Quimica da Escola de Ciéncia da Academia Australiana, Bayliss e Watts (1980) indicam os se- Quintes objetivos gerais: “1. Incentivar a aprendizagem da quimica, apresentada como um ramo do conhecimento digno de estudo, como parte de uma preparagao para a vida 2 Levar os estudantes a compreenderem © papel da ciéncia ha sociedade em que vivem e sua importancia na 30 da devida perspectiva do conflito atual entre tecnologia e o limite da preservacao, Além disso, levar os estudantes a compreenderem aspectos econdmicos que in- fluenciam 0 desenvolvimento das industrias e 0 uso de pro- ccessos e materiais alternativos "3. Capacitar os estudantes a compreenderem que a quimica 1ndo representa apenas materialismo, que ela & produto do trabalho e imaginacéo de muitos homens e que a his da descoberta e do pensamento da quimica esta int ligada a histaria social da humanidade “4. Levar os estudantes a compreenderem a relago da com outros ramos da ciéncia natural, tals como, a biclogia, a geologia ea fsicae, também, o seu lugar como uma base ica para a tecnologia “S, Incentivar 0 uso da abordagem experimental para a soluco de problemas; desenvolver 0 reconhecimento da necessida- de de possuir evidencias antes de fazer julgamentos e de senvolver a capacidade de aceitar evidéncias contrarias &s crengas estabelecidas "6. Dar aos estudantes a idéia de que, além dos fatos ¢ leis da Quimica existentes, ha areas de divides, onde os cientistas podem divergir quanto as questées de interpretagao e, por- tanto, realgar que a quimica é uma ciéncia viva e ainda de- tentora de um desenvolvimento répido e apresentar o desa- fio de problemas insoliveis aqueles que possivelmente in- rao em curso de quimica no nivel de terceiro grau. (Bayliss e Watts, 1980, p. 32-33) [traducdo nossa. 72 | Com projeto americano CHEMCOM, Quimica dade, tem como objetivos: ajudar os mica desempenha em se conseguir, most certo niimero de principios da preender mui de que nicagao € ue vao farcpatoa™ (We tal 1986, . 18) Depreende-se dos objetivos acima mencionados a preo- ccupacao central com a formacao da cidadania, podendo-se apon. tar que 0 ensino para 0 cidadao, via CTS. centra-se no de volvimento da capacidade de tomada de deciséo por meio de uma abordagem que inter-relacione ciéncia, tecnologia ¢ soc dade, concebendo a primeira como um processo soci co e nao-dogmatico. ‘Com relagao a tais objetivos, sio apresentadas, a seguir. consideragées relativas aos contetidos propostos nos cursos de CTS, com maior destaque aqueles que, dirigidos ao ensino de quimica, propiciem alcance dos objetivos acima mencio- nados. Contetidos Propostos nos Cursos de CTS Aikenhead (1990), discorrendo sobre varios trabalhos aue descrevem o contetido dos cursos de CTS, sumariou o referido contetido nos seguintes itens: 73 4) interagao entre ciéncia, tecnologia e sociedade; processos tecnolégicos; ) temas sociais relativos a ciéncia e tecnologia; iv) aspectos filoséficos e histéricos da ciéncia; ¥) aspectos sociais de interesse da comunidade cientifica; ¥i) inter-relagao entre os aspectos enumerados, Percebe-se, assim, que o conteido basico dos cursos de CTS esta centrado em aspectos correlacionados da ciéncia, tecnologia e sociedade, implicando a inclusao do tratamento de temas sociais. Todavia, € preciso destacar que a caracterizagao dos cursos de CTS nao se dé apenas pela inclusao dos referidos temas, mas por uma abordagem que explicite o contetido acima descrito, A incluso dos temas sociais 6 recomendada por todos os artigos revisados, sendo justificada pelo fato de eles evidencia- em as inter-relagdes dos aspectos da ciéncia, tecnologia e so- ciedade e propiciarem condicdes para o desenvolvimento de atitudes de tomada de decisdo dos alunos. Encontramos na literatura uma grande vatiedade de lstas de temas, das quais se pode destacar as duas citadas a seguir Segundo Towse (1986), na Conferéncia Internacional sobre “Ciencia e Educagao Tecnolégica e as Futuras Necessidades Humanas’, realizada em 1985, os temas sociais mais aborda- dos em cursos de CTS foram agrupados nas sequintes oito areas: 1) Satide; 2) Alimentagao e Agricultura; 3) Recursos Energéticos; 4) Terra, Agua e Recursos Minerais; 74 5) Industria e Tecnologia; 6) Ambiente; 7) Transferéncia de Informacao ¢ Tecnologia 8) Etica e Responsabilidade Social. Bybee (1987), por sua vez, extraiu uma relagao de temas sociais de quatro pesquisas que desenvolveu sobre o ensino de CTS, por meio de consulta a alunos, professores, grupos inter nacionais de educadores em ciéncia, cientistas e engenheiros. A relacao & composta pelos temas: 1) Qualidade do Ar ¢ Atmosfera; 2) Fome Mundial e Fontes de Alimentos: 3) Guerra Tecnolégica; 4) Crescimento Populacional, 5) Recursos Hidricos; 6) Falta de Energia; 7) Substancias Perigosas; 8) Saiide Humana e Doenga; 9) Uso da Terra; 10) Reatores Nucleares; 11) Animais e Plantas em extingao; 12) Recursos Minerais Com relacao aos temas sociais abordados nos projetos de quimica com caracteristicas de CTS, tem-se: a) CHEMCOM, Quimica na Comunidade: fornecimento das necessidades de Agua; conservacao dos recursos q| petréleo: construir ou queimar?; compreensao dos al

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