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MIEGI - FEUP | Materiais 2020/2021

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Compósitos
Introdução aos compósitos de matriz polimérica reforçada com fibras

Os compósitos são materiais que apresentam atualmente um grande


desenvolvimento em termos de investigação e evolução tecnológica. Devido à
combinação de uma elevada resistência mecânica, baixa densidade (ou seja, elevada
resistência específica) e elevada rigidez, um dos setores onde mais se aplicam
compósitos é nos transportes. São também usados em materiais de desporto e na
produção de energia.
Os compósitos consistem na mistura de vários materiais que, em conjunto,
atingem elevadas resistência e rigidez e moderada ductilidade. Resultam, então, da
combinação entre uma matriz – material base – e um reforço – material que serve para
melhorar as propriedades mecânicas, que pode consistir em partículas ou fibras; podem
ainda existir compósitos estruturais.
As fibras são rígidas e resistentes, mas apresentam baixa ductilidade. Um
compósito reforçado com fibras apresenta uma melhor tenacidade e a sua resistência é
igual à das fibras.
Existem essencialmente três tipos de fibras: fibras de carbono, fibras de vidro e fibras
aramídicas.
As fibras de carbono, sendo as mais caras, são muito rígidas, leves e têm uma
elevada condutividade térmica. Assim, são usadas em aplicações que requerem
elevadas resistência e rigidez. A matriz usada é usualmente de epóxido e as fibras são
produzidas principalmente a partir de fibras poliacrilonitrilo.
As fibras de vidro são as mais utilizadas, essencialmente em aplicações mais
modestas, por serem mais baratas e melhores isolantes. A matriz é um poliéster
insaturado.
As fibras E-glass são as mais comuns, são bons isolantes térmicos, têm boa resistência
mecânica e rigidez e propriedades elétricas e ambientais favoráveis.
As fibras C-glass têm maior resistência à corrosão, mas menor resistência mecânica.
As fibras aramídicas (KEVLAR) são obtidas à base de poliamidas aromáticas.
Têm moléculas orientadas na direção da fibra, mas as ligações fracas de hidrogénio
conferem más propriedades na direção transversal das fibras. Além de estas
apresentarem uma excelente resistência química, mecânica e à fadiga, assim como boa
capacidade de amortecimento de vibrações, estas fibras distinguem-se pela excelente
resistência ao impacto. São muito resistentes e rígidas. No entanto, não têm capacidade
de deformação, são pouco tenazes. Deste modo, as fibras são aliadas às matrizes
poliméricas, ficando assim o compósito com elevada resistência e tenacidade.
Os compósitos são, na generalidade, anisotrópicos, isto é, as suas
propriedades variam consoante a direção em que são medidas. A resistência de um
compósito no sentido das fibras é muito superior à resistência transversal, sendo
necessário cautela no momento do carregamento. Para contrariar este defeito, múltiplas
camadas são empilhadas com direções diferentes, de modo a ocorrer uniformização
das propriedades mecânicas.
Em termos de matrizes, os compósitos reforçados com fibras podem ser de
matriz polimérica, metálica ou cerâmica.
As matrizes poliméricas, as mais usadas, podem ser termoplástica ou
termoendurecível. As matrizes termoplásticas podem apresentar maior ductilidade que
as termoendurecíveis, sendo que a maior parte tem boa resistência à absorção de
humidade, com a exceção das poliamidas. No entanto, as suas propriedades dependem
da temperatura e velocidade de deformação. As matrizes termoendurecíveis são mais
resistentes e rígidas, mas mais frágeis e caras. Estes polímeros não podem ser
reutilizados, uma vez que as suas reações são irreversíveis.

Ana Margarida Neves | Catarina Santos


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Os processos usados no fabrico de compósitos de matriz de


termoendurecíveis são a impregnação de resina líquida (wet lay-up; enrolamento
filamentar; pultrusão; RTM e RIM), a consolidação de pré-pregs (processo realizado no
trabalho experimental deste relatório, será abordado posteriormente) e a consolidação
de compostos de moldação. Quanto aos compósitos de matriz de termoplásticos, os
processos de fabrico são a injeção e a moldação por compressão (e, recentemente, o
fabrico aditivo).
O objetivo final é garantir que as fibras estão bem impregnadas, uniformemente
distribuídas e corretamente alinhadas, não deixando de ter em conta o fator custo.

Materiais usados

De modo a analisar as propriedades mecânicas dos compósitos, utilizou-se


nesta atividade experimental o SEAL Texipreg HS 160 RM, um pré-impregnado
reforçado com fibras de carbono (60%) de alta resistência e unidirecionais, com matriz
de resina epóxida (40%).
A resina (epóxido) é um termoendurecível, ou mais especificamente, um adesivo
estrutural, que permite distribuir os esforços por grandes áreas e criar juntas mais
resistentes. Em geral, esta resina é combinada com fibras de carbono e é muito utilizada
em compósitos, sendo uma das suas vantagens não libertar voláteis durante a cura. As
fibras de carbono são geralmente produzidas a partir da decomposição de fibras de
poliacrilonitrilo. Inicialmente, há um aquecimento da fibra sob tensão, de modo a
fortalecer as ligações covalentes entre as moléculas e, de seguida, a fibra é aquecida
até uma temperatura entre 1000 e 1500ºC para eliminar oxigénio, azoto e hidrogénio
presentes. Estas fibras são bons condutores térmicos, tendo um coeficiente de
expansão reduzido, baixa densidade, rigidez e resistência mecânica muito elevadas.

As principais propriedades apresentam-se de seguida:

Fração volúmica (fibras de carbono) 60%


Fração mássica (fibras de carbono) 62%
Tensão de rotura (fibras de carbono) 3400 MPa
Tensão de rotura (resina) 45 MPa
Módulo de Young (fibras de carbono) 228 GPa
Módulo de Young (resina) 5.6 GPa
x

Tabela 1 – Principais propriedades do material

As suas principais aplicações são na área automóvel, aeroespacial, ferroviária e


biomedicina. São também utilizados em artigos desportivos, na robótica, rolos de
impressão, tanques de combustível para gás natural, máquinas-ferramentas, barcos, e
construção de casas.

Descrição da fabricação do compósito

No caso dos termoendurecíveis, a fabricação da matriz polimérica envolve


três processos: impregnação de resina líquida, consolidação de compostos de
moldação e consolidação de pré-pregs. Este último pode ser realizado por 3 técnicas
distintas: autoclave, saco de vácuo, e prensa de pratos quentes.
O pré-preg, um semi-produto, é um material muito sensível à contaminação.
Assim, aquando do seu manuseamento, deve-se ser portador de equipamento de

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proteção. Também o local terá de estar higienizado – em geral, esta técnica é


realizada numa sala denominada “sala limpa” que reúne todas as condições
necessárias para o processo.
O rolo de pré-preg é guardado num congelador, a -18ºC, sendo que para o
seu manuseamento é necessário deixá-lo atingir a temperatura ambiente.
De seguida, procede-se ao seu corte e à sobreposição de camadas após a
remoção da película plástica que as reveste (proteção). Assim que sobrepostas na
direção pretendida – neste caso querem-se todas as fibras na mesma direção
(ângulo de 0o, uma vez que se quer estudar o comportamento do compósito
reforçado com fibras unidirecionais) – é necessário utilizar uma pistola de ar quente
para amolecer a resina e garantir a aderência entra as sucessivas camadas. É vital
evitar o aprisionamento de ar entre folhas de pré-preg, daí se realizar a primeira
aplicação de pressão, neste caso, manual. Assim sendo, tal é realizado a um certo
número de folhas, aproximadamente 6, de forma a obter a espessura final desejada
(1,1 mm).
As camadas são colocadas entre chapas metálicas e dentro de um quadro
metálico, para não permitir que a resina vaze, e aplica-se um agente desmoldante,
de forma a evitar que ocorra uma reação química entre o epóxido e o metal.
Inicia-se a segunda aplicação de pressão (controlada com o manuseamento
de uma válvula, cujo objetivo é retirar bolhas de ar que causam defeitos) através da
colocação deste conjunto na prensa de pratos quentes, aplicando-se uma
temperatura entre 125oC e 140oC para curar a resina e endurecer o material, durante
aproximadamente 1 hora, obtendo-se no final uma placa de compósito. Esta é
retirada do molde quando se deixa arrefecer à temperatura ambiente e obtém-se um
material duro, rígido e resistente quando solicitado na direção das fibras, como será
comprovado pelos ensais de tração que se seguem. Na direção normal, as
propriedades mecânicas são fracas. São, então, cortados dois provetes: um com as
fibras direcionadas de forma transversal e o outro com as fibras distribuídas
longitudinalmente.

Previsão das propriedades mecânicas pela regra das misturas

É possível prever as propriedades dos materiais compósitos, com base na


regra das misturas, ou seja, através da combinação das propriedades dos seus
constituintes, tendo em conta a fração volúmica dos mesmos.

𝐸𝑐 = 𝑉𝑓 𝐸𝑓 + (1 − 𝑉𝑓 )𝐸𝑚

𝜎𝑐 = 𝑉𝑓 𝜎𝑓 + (1 − 𝑉𝑓 )𝜎𝑚

A partir das propriedades dadas para a fibra de carbono e para a resina


(epóxido), e usando as equações acima referidas, procedeu-se ao cálculo das
propriedades mecânicas teóricas do compósito.

E (GPa) 𝜎 (MPa)
Fibra de carbono 228 3400
Resina 5.6 45
Compósito 139.04 2058

Tabela 2 – Propriedades mecânicas obtidas pela Regra das Misturas

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Os valores obtidos pela regra das misturas apenas se aplicam para a situação
em que a solicitação ocorre na direção longitudinal das fibras, uma vez que a nível
transversal as propriedades mecânicas vão corresponder às da resina.

Curva de tração do compósito no sentido longitudinal e transversal

Com o objetivo de comparar o comportamento do compósito dependendo da


direção sobre a qual é solicitado, procedeu-se à realização de dois ensaios de tração:
um no sentido longitudinal das fibras e outro no sentido transversal. Isto permitirá
comprovar a anisotropia do compósito, pelas diferenças verificadas no comportamento
mecânico do compósito quando sujeito a solicitações em diferentes direções.

Gráfico 1 – Curvas de tração de um compósito sujeito a


solicitações longitudinais e transversais às fibras

Propriedades mecânicas (rigidez e resistência) e comentários

Através da análise das curvas de tração acima apresentadas, calcularam-se os


valores das propriedades mecânicas indicadas na seguinte tabela:

E (GPa) 𝜎 (MPa)
Longitudinal 114.8 2062.29
Transversal 5.60 42.18

Tabela 3 – Propriedades mecânicas de um compósito sujeito a


solicitações longitudinais e transversais às fibras

Analisando as curvas de tração acima apresentadas, é clara a verificação do


carácter anisotrópico dos compósitos. Isto é, as propriedades mecânicas do
compósito quando é solicitado na direção das fibras são completamente diferentes às
propriedades do mesmo quando solicitado na direção transversal à das fibras.
Quando o provete é sujeito a esforços transversais às fibras, apenas a resina
(epóxido) oferece resistência. Esta resistência é bastante baixa quando comparada à
das fibras, havendo uma rotura do material mais fácil e rápida. Assim, quando
sujeitamos o compósito a esforços transversais, a presença de fibras é insignificante,
apresentando o compósito as propriedades mecânicas modestas da resina epóxido ao
invés das excelentes propriedades que as fibras concedem.

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Quando o provete é sujeito a esforços longitudinais às fibras, estas


conseguem absorver e distribuir as tensões, daí a elevada resistência mecânica e
rigidez do compósito. Como o compósito ser reforçado com fibras, a sua tenacidade
aumenta, o que permite uma diminuição da velocidade de propagação de fendas e de
rotura do material, através do rompimento individual das fibras.

Procedendo agora a uma comparação entre os valores teóricos e os valores


experimentais:
- na direção transversal, os valores das propriedades mecânicas do compósito
são muito semelhantes às da resina (epóxido), sendo indiferente a presença das fibras.
- na direção longitudinal, conclui-se que a regra das misturas é um bom
instrumento para a previsão das propriedades mecânicas de um compósito, uma vez
que os pares de valores são muito semelhantes entre si. No entanto, verifica-se uma
ligeira diferença no valor do módulo de Young, que se deve à existência de tensões
residuais que provocam uma diminuição da rigidez do compósito.

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