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SALMO 41 - SERMÃO AO POVO - AGOSTINHO DE HIPONA

1 6 Uma vez que estamos celebrando a solenidade dos mártires, e tendo em vista a glória
da paixão de Cristo, imperador dos mártires, que não se poupou enviando os soldados
sozinhos à peleja, mas foi primeiro a lutar e vencer para estimular os combatentes pelo
exemplo, ajudá-los com a presença de sua majestade e coroá-los de acordo com a
promessa, ouçamos as referências deste salmo a sua paixão. Amiúde rememoramos e não
nos coramos de repetir o que vos é útil reter, isto é, que nosso Senhor Jesus Cristo às
vezes fala por si mesmo, a saber, por si enquanto nossa Cabeça, e outras vezes, fala em
lugar do corpo, que somos nós e sua Igreja. Tal acontece, porém, como se as palavras
saíssem da boca de um só homem, a fim de entendermos integrarem-se Cabeça e corpo
numa unidade, sendo mutuamente inseparáveis, à semelhança da união, da qual se disse:
“Serão dois numa só carne” (Gn 2,24; Ef 5,31). Se, portanto, reconhecemos serem dois
numa só carne, reconheçamos igualmente dois numa só voz. Em primeiro lugar, sirva-nos
de exórdio o que cantamos, em resposta ao leitor, embora se encontre no meio do salmo:
“Amaldiçoam-me os inimigos: Quando há de morrer e de extinguir-se o seu nome?” É nosso
Senhor Jesus Cristo quem fala, mas notai se aqui não se incluem também os membros.
Assim foi dito a respeito de nosso Senhor, quando andava na terra, revestido da carne
mortal. Os judeus viram que a multidão aceitava sua autoridade e que os milagres
revelavam sua divindade e majestade. Pois, ao verificarem tudo isso os judeus, aos quais o
Senhor aplicou a parábola dos que disseram: “Este é o herdeiro, vamos! Matemo-lo e
apoderemo-nos da sua herança” (Mt 21,38), retomaram para si mesmos e entre si a palavra
de Caifás: “Vedes que grande multidão o segue e todo mundo vai atrás dele. Se o
deixarmos assim, virão os romanos, destruirão o nosso lugar santo e a nação. É de vosso
interesse que um só homem morra pelo povo e não pereça a nação toda”. O evangelista
explica-nos as palavras do pontífice que não sabia o que dizia: “Não dizia isto por si mesmo,
mas sendo sumo sacerdote profetizou que Jesus iria morrer pela nação” (Jo 11,48.51). No
entanto, vendo que o povo ia atrás dele, disseram: “Quando há de morrer e de extinguir-se
o seu nome?” Queriam dizer: Quando o matarmos, seu nome se extinguirá sobre a terra, e
morto, já não poderá seduzir os outros. Diante desta morte entenderão os homens que era
a um homem que seguiam e que não deviam depositar nele a esperança de salvação.
Abandonariam seu nome, que há de se extinguir. Morreu; e seu nome não se extinguiu, mas
se disseminou. Morreu, mas como o grão de trigo que, morto, logo brotou para a messe (cf
Jo 12,25). Por conseguinte, ao ser glorificado nosso Senhor Jesus Cristo, começaram os
homens muito mais e em maior número a crer nele; começaram seus membros a ouvir o
que ouvia a Cabeça. Já estando, portanto, nosso Senhor Jesus Cristo estabelecido no céu,
mas ainda conosco em labuta na terra, continuam a dizer seus inimigos: “Quando há de
morrer e de extinguir-se o seu nome?” Por este motivo o diabo excitou perseguições na
Igreja para perder o nome de Cristo. A não ser que penseis, irmãos, que os pagãos, quando
se enfureciam contra os cristãos, não se propunham apagar o nome de Cristo da terra. Os
mártires foram mortos a fim de que Cristo morresse, não enquanto Cabeça, mas em seu
corpo. O sangue derramado dos santos serviu para aumentar a Igreja, e a morte dos
mártires foi uma semeadura. “Preciosa na presença do Senhor é a morte de seus justos” (Sl
115,15). Os cristãos se multiplicaram cada vez mais, e não se cumpriu o que os inimigos
imprecaram: “Quando há de morrer e de extinguir-se o seu nome?” Ainda agora isto se diz.
Os pagãos se assentam, calculam os anos,1 ouvem a seus fanáticos, que prenunciam: Virá

1
A cidade de Deus, XVIII, 53,34.
o tempo em que não haverá mais cristãos, e em que os ídolos serão adorados, como antes;
eles ainda dizem: “Quando há de morrer e de extinguir-se o seu nome?” Fostes vencidos
duas vezes; entendei ao menos da terceira: Cristo morreu, seu nome não se extinguirá. Os
mártires morreram, a Igreja aumentou ainda mais, o nome de Cristo se divulga entre todas
as gentes. Quem predisse sua morte e sua ressurreição, quem predisse a morte e a coroa
de seus mártires, foi o mesmo que fez predições a respeito de sua futura Igreja. Se disse a
verdade por duas vezes, da terceira mentiu? É em vão, portanto, o que acreditais contra
ele; é melhor acreditar nele, para entenderdes o “necessitado e o pobre, porque ele se fez
pobre, embora fosse rico, para vos enriquecer com a sua pobreza” (2Cor 8,9). Agora,
porém, é desprezado porque se fez pobre, e se diz: Era uma vez um homem. Por que era?
Porque morreu, foi crucificado; adorais um homem, tendes esperança em um homem,
adorais um morto. Tu te enganas. Procura entender o necessitado e o pobre, para te
tornares rico por sua pobreza. O que quer dizer: Entende o necessitado e o pobre?
Recebas o Cristo necessitado e pobre, que diz em outro salmo: “Quanto a mim sou
desvalido e pobre, mas o Senhor cuidará de mim” (Sl 39,18). O que significa entender o
necessitado e o pobre? “Aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e
assemelhando-se aos homens, e sendo exteriormente reconhecido como homem” (Fl 2,7).
Rico junto do Pai, pobre entre nós; rico no céu, pobre na terra; Deus rico, homem pobre. De
fato, perturba-te ver um homem, contemplar a carne, olhar a morte e desprezar a cruz? Isto
te perturba? Lembra-te do necessitado e do pobre. Que sentido tem isso? Entende que ali
onde a ti se revela a fraqueza, esconde-se a divindade. É rico porque o é em si; pobre,
porque tu o eras. No entanto, sua pobreza se torna a nossa riqueza, assim como sua
fraqueza é nossa fortaleza, sua loucura é nossa sabedoria, sua mortalidade nossa
imortalidade (cf 1Cor 1,30). Observa em que consiste sua pobreza; não a meças segundo a
pobreza dos outros. Aquele que se fez pobre veio enriquecer os pobres. Por isso, abre o
seio da fé; recebe o pobre para não permaneceres pobre.

2 2 “Feliz quem entende o necessitado e o pobre; no dia do infortúnio o Senhor o livrará”.


Virão os dias maus; queiras ou não. Aproxima-se o dia do juízo, mau dia, se não te
lembraste do necessitado e do pobre. Será manifesto no fim o que agora não queres
acreditar. Mas não poderás fugir ao se tornar ele manifesto, porque não acreditas enquanto
está oculto. És convidado a acreditar no que não vês, para não te envergonhares quando o
vires. Entende o necessitado e o pobre, isto é, Cristo. Compreende que nele estão ocultas
riquezas, apesar de o veres como pobre. Nele estão escondidos todos os tesouros da
sabedoria e da ciência (cf Cl 2,3). Daí vem que ele, enquanto Deus, te livrará no dia mau;
pelo fato de ser homem, o que havia de humano nele ressuscitou, e em estado melhor foi
levado ao céu. Ele, contudo, que é Deus e quis ser uma só e mesma pessoa também na
natureza humana e com ela, não podia diminuir nem aumentar, morrer nem ressurgir.
Morreu devido à fraqueza humana, pois Deus não morre. Não te admires de que o Verbo de
Deus não morra, visto que não morre a alma do mártir. Não acabamos de ouvir o próprio
Senhor dizer: “Não temais os que matam o corpo, mas não podem matar a alma” (Mt
10,28)? Por conseguinte, ao morrerem os mártires, suas almas não morreram; então ao
morrer o Cristo, o Verbo haveria de morrer? Efetivamente, o Verbo é muito maior do que a
alma humana, porque a alma humana foi criada por Deus, e se foi criada por Deus foi feita
pelo Verbo, uma vez que por ele tudo foi feito (cf Jo 1,3). Não morre, portanto, o Verbo,
assim como não morre a alma feita pelo Verbo. Mas, como dizemos com razão: O homem
morreu, embora sua alma não morra, assim dizemos com certeza: Cristo morreu, apesar de
que a divindade não morre. Por que morreu? Porque necessitado e pobre. Não te
impressione sua morte, afastando-te de contemplar a divindade. “Feliz quem entende o
necessitado e o pobre”. Olha os pobres, carentes, famintos, sedentos, peregrinos, nus,
doentes, encarcerados; entende tais pobres, porque se os entenderes, hás de entender
aquele que disse: “Tive fome, tive sede, estive nu, fui peregrino, doente, prisioneiro” (cf Mt
25,35-36). Então, no dia do infortúnio o Senhor te livrará.

3 3 Vê qual a tua felicidade: “O Senhor o conserve”. O profeta deseja o bem para o homem
que entende o necessitado e o pobre. Este voto é uma promessa; esperem confiantes os
que assim agem. “O Senhor o conserve e o vivifique”. O que significa: “o conserve e o
vivifique”? A que pertence o voto: “o vivifique”? À vida futura. É vivificado aquilo que estava
morto. Acaso pode o morto entender o necessitado e o pobre? Mas é prometida aquela
vivificação, da qual fala o Apóstolo: “O corpo está morto pelo pecado, mas o espírito é vida,
pela justiça. E se o Espírito daquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos habita em vós,
aquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos dará vida também a vossos corpos mortais,
mediante o seu Espírito que habita em vós” (Rm 8,10.11). Este é o reviver prometido àquele
que se lembra do necessitado e do pobre. Mas, conforme diz o Apóstolo a Timóteo:
“Contém a promessa da vida presente e da futura” (1Tm 4,8), não pensem os que
entendem o necessitado e o pobre que hão de ser recebidos no céu, mas serão
negligenciados na terra, e por isso esperam apenas os bens eternos no futuro. Quanto ao
presente, julgam que Deus se descuida em relação aos seus santos e fiéis. Daí dizer o que
mais devemos desejar: “O Senhor o conserve e vivifique”, referindo-se a esta vida: “Faça-o
feliz na terra”. Ergue, pois, os olhos a essas promessas, com fé de um cristão. Deus não te
abandona na terra, só prometendo alguma coisa para o céu. Muitos maus cristãos, que
inspecionam os cálculos astronômicos, e pesquisam e observam as estações e os dias,
quando nós ou alguns cristãos bons ou até melhores começarem a censurá-los por agirem
assim, respondem: Estas coisas são necessárias no tempo. Somos cristãos por causa da
vida eterna. Acreditamos em Cristo, a fim de que nos conceda a vida eterna, pois esta vida
temporal que vivemos, não entra em seus cuidados. Ademais, para dizê-lo brevemente,
cultuam a Deus por causa da vida eterna, e ao diabo em vista da vida presente. O próprio
Cristo lhe responde: Não podeis servir a dois senhores (cf Mt 6,24). Se cultuas a um por
causa do que esperas obter no céu, e a outro devido ao que esperas na terra, como não
será muito melhor adorar a um só, aquele que fez o céu e a terra? Descuidar-se-ia de sua
imagem na terra aquele que cuidou de criar a terra? Por conseguinte: “O Senhor conserve e
vivifique” aquele que entende o necessitado e o pobre. Além disso, embora vivifique
eternamente, “faça-o feliz na terra”.

4 “E não o entregue às mãos de seu inimigo”. O inimigo é o diabo. Ninguém pense num
homem inimigo, ao ouvir tais palavras. Provavelmente já pensava em seu vizinho, naquele
com o qual tem um litígio no foro, naquele que procura roubar-lhe a propriedade, naquele
que quer coagi-lo a vender-lhe sua casa. Não penses nestas coisas; mas pensa naquele
inimigo, do qual diz o Senhor: “Um inimigo é que fez isto” (Mt 13,28). É ele quem insinua
que se lhe preste culto por causa dos bens terrenos, porque não consegue destruir o nome
cristão. Vê-se vencido pela fama e pelos louvores de Cristo, vê que os mártires depois de
mortos são coroados e dele triunfam. Começou a tornar-se-lhe impossível persuadir os
homens de que Cristo nada é. E como dificilmente engana agora, quando blasfema contra
Cristo, esforça-se por enganar louvando-o. Anteriormente, o que dizia? A quem adorais? A
um judeu morto, crucificado, que nada vale, que não pôde evitar a morte. Logo que viu o
gênero humano acorrer a este nome, e viu que em nome do crucificado os templos eram
derrubados, os ídolos eram quebrados, os sacrifícios extintos, e os homens verificarem que
tudo isso fora predito pelos profetas, enchendo-se de admiração e fechando o coração às
blasfêmias contra Cristo, ele cobriu-se de louvores a Cristo, e começou a afastar da fé por
outros recursos. Diz: A lei cristã é grande, poderosa, divina, inefável; mas quem pode
cumpri-la? Em nome de nosso Salvador pisai o leão e o dragão (cf Sl 90,13). O leão fremia,
censurando abertamente, o dragão arma insídias astutamente, louvando. Os hesitantes
venham à fé. Não digam: Quem pode cumprir esta lei? Se presumirem das próprias forças,
não cumprirão. Creiam, presumindo da graça de Deus, venham presumindo, venham para
serem ajudados, não para serem julgados. Todos os fiéis vivem no nome de Cristo, cada
qual cumprindo os preceitos de Cristo em seu respectivo estado, sejam casados, sejam
solteiros ou virgens. Vivam quanto o Senhor lhes der viver. Não presumam de suas forças,
mas saibam que nele é que se devem gloriar. O que tens que não tenhas recebido? Se,
porém, recebeste, por que te glorias como se não tivesses recebido (cf 1Cor 4,7)? Não me
digas: Quem pode cumpri-lo? Cumpre em mim aquele que sendo rico veio até o pobre;
pobre efetivamente junto do pobre, mas tendo em plenitude aproximou-se do indigente.
Pensando nessas coisas, porque entende o necessitado e o pobre, e não despreza a
pobreza de Cristo, entende as riquezas de Cristo, torna-se feliz na terra; e não será
entregue às mãos do inimigo que procura persuadi-lo a adorar a Deus por causa dos bens
celestes e ao diabo por causa dos terrenos. “E não o entregue às mãos de seu inimigo”.

5 4 “O Senhor o assistirá”. Mas onde? Acaso no céu, talvez na vida eterna, de sorte que o
diabo há de ser cultuado por causa da indigência terrena, das necessidades da vida atual?
De forma alguma. Tens a promessa da vida presente e da futura (cf 1Tm 4,8). Aquele que
veio à terra por tua causa, criou o céu e a terra. Enfim, presta atenção ao que ele diz: “O
Senhor o assistirá no leito de dor”. Leito de dor é a fraqueza da carne. Não digas: Não
posso conter, carregar, frear a minha carne. Auxilia-te no intuito de que o consiga. O Senhor
te assistirá em teu leito de dor. O catre te carregava; não eras tu quem o carregavas, mas
jazias como paralítico sobre ele. Apresenta-se aquele que te ordenará: “Toma o teu leito, e
vai para tua casa” (Mc 2,11). O Senhor o assistirá no leito de dor. Então o salmista se volta
para o Senhor, de certo modo, para lhe perguntar: Por que é que, apesar do auxílio do
Senhor, sofremos tantos males nesta vida, tantos escândalos, tantos trabalhos, tanta
iniquietação da parte da carne e do mundo? Volta-se para Deus, e nos expõe como que um
conselho medicinal: “Refizeste-lhe a cama em sua enfermidade”. O que significa:
“Refizeste-lhe a cama em sua enfermidade”? Por cama entende-se algo de terreno. Toda
alma fraca nesta vida procura para si algum objeto terreno em que possa repousar, porque
dificilmente pode de modo contínuo manter a intensidade do labor e a mente dirigida para
Deus. Busca para si na terra alguma coisa onde possa descansar e deitar-se de certo modo
para um repouso, como são os objetos a que mesmo os inocentes têm afeição. Não se fala
aqui das concupiscências más, porque são muitos os que procuram distração nos teatros,
muitos que a procuram no circo, no anfiteatro, muitos descansam no jogo, muitos nas
bebedeiras, muitos nos adultérios, muitos nas rapinas, muitos no dolo e nas insídias da
fraude. Em tudo isso os homens procuram lazer. Qual o sentido da palavra lazer? Ocasião
de deleite. Mas removamos tudo isso, e pensemos como age um homem honesto. Ele
descansa em casa, com a família, a mulher, seus filhos, com pobreza, em sua casinha, na
vinha plantada com as suas próprias mãos, em algum edifício construído com seus
esforços. Os homens honestos se recreiam com tais coisas. No entanto, como Deus não
quer que amemos senão a vida eterna, mistura amarguras nestes inocentes deleites. Temos
assim tribulações, mas ele refaz-nos a cama em nossa enfermidade. “Refizeste-lhe a cama
em sua enfermidade”. Por isso, não se queixe alguém quando passa por tribulações no
meio destas coisas que possui honestamente. Está aprendendo a amar as coisas melhores
no meio das tribulações amargas das coisas inferiores, para que o viajor a caminho da
pátria, não ame o albergue em vez de sua casa. “Refizeste-lhe a cama em sua
enfermidade”.

6 5 Mas qual o motivo disso tudo? Porque o Senhor castiga todo o filho a que acolhe (cf Hb
12,6). Mas por que é assim? Porque foi dito ao homem depois do pecado: “Com o suor de
teu rosto comerás teu pão” (Gn 3,19). Por conseguinte o homem há de reconhecer que
sofre por causa de seus pecados, nesta correção em que toda nossa cama é refeita,
durante nossa enfermidade; converta-se e repita o seguinte: “Eu disse: Compadece-te de
mim, Senhor. Cura a minha alma, porque pequei contra ti”. Ó Senhor, exercita-me por meio
das tribulações; achas que deves castigar todo filho que acolhes, pois não poupaste nem o
Unigênito. Verdadeiramente, ele foi castigado embora não tivesse pecado; ao contrário, eu
digo: “Compadece-te de mim, cura a minha alma, porque pequei contra ti”. Se sofreu o corte
aquele que não tinha ferida infeccionada, se não recusou aquele que é o nosso remédio a
cauterização medicinal, devemos suportar com impaciência a mão do médico que cauteriza
e corta, isto é, que nos exercita através das tribulações e nos cura de nosso pecado?
Entreguemo-nos inteiramente à mão do médico; ele não erra, cortando o que está são em
vez do pútrido. Conhece o que examina, conhece a doença, porque foi ele próprio que criou
a natureza. Distingue o que ele criou daquilo que nossa ambição acrescentou. Sabe que
deu um preceito ao homem com saúde, para que não adoecesse. Ele disse no paraíso:
Pode comer disto, daquilo não (cf Gn 2,16.17). O homem com saúde não escutou a ordem
do médico, a fim de não cair. Ouça o doente para se curar. “Eu disse: Compadece-te de
mim, Senhor, cura a minha alma, porque pequei contra ti”. Em minhas ações, em meus
pecados, não acuso a fortuna. Não digo: Aconteceu-me por acaso. Não digo: Vênus me fez
adúltero, Marte me fez ladrão, Saturno me fez avaro. “Eu disse: Compadece-te de mim,
Senhor, cura a minha alma, porque pequei contra ti”. Acaso aconteceu isto a Cristo? Não é
ele nossa Cabeça, sem pecado? Terá pago o que não roubou (cf Sl 68,5)? Será ele o único
livre no meio dos mortos (cf Sl 87,6)? Livre entre os mortos, porque não tem pecado, e
“quem comete o pecado, é escravo do pecado” (Jo 8,34). Talvez o disse ele mesmo? É
preferível dizer que foi ele em lugar de seus membros, porque a voz dos membros é sua
voz, uma vez que a voz de nossa Cabeça é nossa voz. Pois, estávamos nele quando
declarou: “A minha alma está triste até a morte” (Mt 26,38). Viera para morrer, por isso não
temia a morte. Nem recusava a morte aquele que tinha o poder de dar a sua vida e poder
de novamente retomá-la (cf Jo 10,18). Mas, os membros falavam por meio da Cabeça, e a
Cabeça falava em lugar dos membros. Encontramos, portanto, nele a nossa voz: “Cura a
minha alma, porque pequei contra ti”. Estávamos nele, quando rezou: “Meu Deus, meu
Deus, por que me desamparaste?” (Mt 27,46). No mesmo salmo, que começa por este
versículo, encontra-se em seguida: “As vozes de meus delitos” (Sl 21,2). Que delitos havia
nele, a não ser que consideremos que o nosso velho homem foi simultaneamente com ele
crucificado, para que fosse destruído este corpo de pecado, e assim não servíssemos mais
ao pecado (cf Rm 6,6)? A ele e nele digamos: Eu disse: “Compadece-te de mim, Senhor;
cura a minha alma, porque pequei contra ti”.

7 6 “Amaldiçoam-me os inimigos: Quando há de morrer e de extinguir-se o seu nome?” Já


citamos este versículo, e por ele começamos; para podermos explicar os outros, não vamos
repetir o que em sermão tão recente se gravou em vossos ouvidos e em vossos corações.
8 7 “Vinham visitar-me para ver”. Sofre a Igreja o mesmo que Cristo sofreu; padecem os
membros como a Cabeça. Será o servo maior do que o seu Senhor, e o discípulo do que o
mestre? “Se eles me perseguiram, também vos perseguirão. Se chamaram Beelzebu ao
chefe da casa, quanto mais chamarão assim aos seus familiares!” (Mt 10,24; Jo 15,20).
Vinham visitar-me para ver. Judas achava-se junto de nossa Cabeça, aproximou-se dela
para ver, isto é, para investigar. Não procurava motivo de crer, mas meios de o entregar. Eis
que ele se aproximava para ver, e em nossa Cabeça foinos proposto um exemplo. Como
agiram aqueles membros, depois da ascensão de nossa Cabeça? Não o declara o apóstolo
Paulo: “Por causa dos intrusos, esses falsos irmãos se infiltraram para espiar a nossa
liberdade” (Gl 2,4)? Esses também, portanto, entravam para ver, pois são hipócritas,
fingidos, que se aproximam com caridade simulada, observando cada movimento, cada
palavra dos santos, e suspeitando haver ciladas em toda a parte. E o que lhes acontece?
Vede como continua o salmo: “Seu coração proferia palavras vãs”, isto é, falam com amor
fingido. São vãs as suas palavras; não são verdadeiras, mas infundadas. Como captam o
que pode servir de acusação, o que diz o salmo? “Amontoaram para si iniquidades”. Pois,
os inimigos ao inventarem calúnias, julgam-se importantes, por terem o que acusar.
“Amontoaram para si iniquidades”. Diz o salmista: “para si”, não para mim. Como Judas
prejudicou a si mesmo, não a Cristo, assim também os fingidos dentro na igreja atingem a si
mesmos, não a nós. Deles foi dito em outra passagem: “E a iniquidade mentiu a si mesma”
(Sl 26,12). “Amontoaram para si iniquidades”. E como entraram para ver, “saíam e falavam”.
Aquele que entrou para verificar, foi para fora e pôs-se a falar. Seria muito melhor ficar
dentro e falar a verdade! Não iria para fora, onde se falam mentiras. É traidor e perseguidor,
vai para fora e fala. Se pertences ao corpo de Cristo, vem para dentro, adere à Cabeça. Se
és trigo, suporta o joio. Suporta a palha, se és trigo (Mt 13,30). Tolera os maus peixes
dentro da rede, se és um bom peixe. Por que voaste ante do tempo da ventilação? Por que
antes do tempo da messe arrancaste o trigo contigo? Por que motivo antes de chegares à
praia, rompeste a rede? “Saíam e falavam”.

9 8 “Todos os meus inimigos juntos murmuravam contra mim”. Contra mim todos juntos;
quanto melhor seria se estivessem comigo? O que significa: contra mim juntos? Um só é o
seu plano, uma só conspiração. Cristo, por isso, se dirige a eles: Estais concordes contra
mim; concordai comigo. Por que estais contra mim? Por que não ficais comigo? Se me
tivésseis sempre, não vos dividiríeis, provocando cismas. Pois, diz o Apóstolo: “Eu vos
exorto, irmãos: guardai a concórdia uns com os outros, de sorte que não haja divisões entre
vós (1Cor 1,10). Todos os meus inimigos juntos murmuravam contra mim e auguravam-me
desgraças”. Ou antes, contra si, porque “amontoaram para si inquidades”; mas igualmente
contra mim, porque são ponderáveis segundo suas intenções. Pelo fato de nada
conseguirem, nem por isso nada quiseram fazer. Pois, também o diabo desejou exterminar
a Cristo, e Judas quis matá-lo. No entanto, Cristo morreu, ressuscitou, e nós fomos
vivificados; ao diabo, contudo, e a Judas é atribuída a paga de sua má vontade, e não a de
nossa salvação. No intuito de saberdes que da intenção de alguém depende o prêmio ou o
castigo, tratemos do caso daqueles homens que desejaram a outrem um bem (e tal bem
que também nós o desejaríamos) e no entanto foram denominados malévolos. Injuriaram os
judeus, que viam corporalmente mas eram cegos espiritualmente, a determinado cego, que
recebera a luz dos olhos e no coração; assim se dirigiu aquele que já estava vendo aos
mencionados judeus: “Por acaso quereis tornar-vos seus discípulos?” E eles, diz o
evangelho, “injuriaram-no e disseram: Tu, sim, sejas seu discípulo” (Jo 9,27.28).
Aconteça-nos a todos nós o que eles disseram, amaldiçoando. A maldição nomeada aqui
não deriva de uma palavra má, e sim de um erro malévolo dos que a proferiam. O
evangelista atende à intenção com que falaram e não o que disseram aqueles que ele
afirmou terem a maldiçoado. “Auguraram-me desgraças”. Quais as desgraças contra Cristo,
contra os mártires? Tudo isso Deus fez reverter em bem.

10 9 “Contra mim pronunciaram sentença iníqua”. Qual sentença iníqua? Observai como
sentenciaram contra a própria Cabeça: “Matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança” (Mt
21,38). Estultos! De que modo a herança será vossa? Seria porque o matastes? Eis que o
matastes e a herança não será vossa. “Porventura aquele que dorme, não poderá
reerguer-se?” Quando exultastes por havê-lo matado, ele adormeceu; pois diz ele em outro
salmo: “Adormeci”. Se quisesse, nem teria adormecido. “Adormeci, porque tenho o poder de
entregar a minha vida e poder de retomá-la. Adormeci, caí em sono profundo, e despertei”
(Jo 10,18; Sl 3,6). Enfureçam-se, portanto, os judeus, a terra seja entregue às mãos do
ímpio (cf Jó 9,24), a carne esteja nas mãos dos perseguidores, suspendam-no no madeiro,
transpassem-no com os cravos, seja atravessado pela lança: “Porventura aquele que
dorme, não poderá reerguer-se?” Por que dormiu? Porque Adão era figura do futuro Adão
(Rm 5,14); e Adão dormiu, quando Eva foi tirada de seu lado (Gn 2,21). Adão era figura de
Cristo. Eva era figura da Igreja; por isso foi chamada mãe dos vivos. Quando é que Eva foi
criada? Quando Adão dormia. Quando brotaram do lado de Cristo os sacramentos da
Igreja? Quando Cristo adormeceu na cruz. “Porventura aquele que dorme, não poderá
reerguer-se?”

11 10 Qual o motivo por que adormeceu? Por causa daquele que entrou para ver, e
amontoou para si iniquidades. “Até o amigo em que eu confiava, que comia do meu pão,
levantou o calcanhar contra mim”. Levantou o pé contra mim, querendo conculcar-me.
Quem é este amigo? Judas. Teria Cristo confiado nele, porque disse: “em que eu confiava?”
Ele não o conhecia desde o início? Não sabia o que havia de ser, antes de seu nascimento?
Não havia dito a todos os discípulos: “Não vos escolhi, eu, aos Doze? No entanto, um de
vós é um demônio” (Jo 6,71). Como, então, confiou nele, a não ser porque ele mesmo está
em seus membros, e o Senhor transferiu para si aquela confiança que muitos fiéis haviam
depositado em Judas? Ao verem muitos dos que acreditavam em Cristo Judas andar entre
os doze discípulos, confiavam nele. Era tal qual os demais. Cristo, porém, estava em seus
membros que nele confiavam, como está naqueles que estão famintos e sedentos. Como
disse: “Tive fome”, também falou: “confiei”. Por conseguinte, se lhe perguntamos: Senhor,
quando foi que confiaste? da mesma forma com que foi interrogado: Senhor, quando foi que
te vimos com fome? Assim como ali nos disse: “Cada vez que o fizestes a um desses meus
irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40), igualmente aqui pode responder:
Cada vez que confiou um desses pequeninos que são meus, fui eu que confiei. Em quem
confiou? “Até o amigo em que eu confiava, que comia do meu pão”. Como mostrou ele na
paixão a realização destas palavras proféticas? Designou Judas por meio do bocado de pão
(cf Jo 13,26), para se manifestar que foi dito a respeito dele: “Que comia do meu pão”. E
ainda, quando Judas veio para entregá-lo, este deu-lhe um beijo (Mt 26,49), para se lhe
atribuir a palavra do Salmo: “Até o amigo”.

12 11 “Tu, porém, tem piedade de mim”. Relaciona-se com a condição de servo, com a
condição de necessitado e de pobre. Feliz quem entende o necessitado e o pobre. “Tu,
porém, tem piedade de mim, ergue-me e dar-lhes-ei a merecida retribuição”. Notai quando
foi dito e que já se realizou. Os judeus mataram a Cristo, para não perderem o lugar santo
(cf Jo 11,48). Mas, depois que ele foi morto, eles perderam o lugar. Foram expulsos do
reino, e dispersados. Depois que ressuscitou, retribui-lhes com tribulações, para aviso,
ainda não para condenação. Os judeus foram expulsos daquela cidade, onde o povo
enfureceu-se, como um leão rapaz e rugidor, exclamando: “Crucifica-o, crucifica-o” (Lc
23,21; Jo 19,6); agora os cristãos a possuem e nenhum judeu nela habita. A Igreja de Cristo
foi plantada no lugar de onde foram arrancados os espinhos da sinagoga. Efetivamente, o
fogo acendeu-se, como em espinhos (cf Sl 117,12); o Senhor, porém, era como um lenho
verde. Ele mesmo o declarou, quando algumas mulheres se lamentavam por causa de
Cristo, que ia morrer: “Não choreis por mim; chorai, antes por vós mesmas e por vossos
filhos” (Lc 23,28). Constitui uma predição deste acontecimento a palavra: “Ergue-me e
dar-lhes-ei a merecida retribuição. Porque se assim se faz com o lenho verde, o que
acontecerá com o seco” (Lc 23,31)? Como pode o lenho verde ser consumido por um fogo
que estava queimando espinhos? Eles, pois, se consumiram como espinhos no fogo. O
fogo consumiu os espinhos, e se for levado ao lenho verde, dificilmente pegará, porque a
resina do lenho resiste à chama lenta e fraca, suficiente contudo para queimar os espinhos.
“Ergue-me e dar-lhes-ei a merecida retribuição”. Todavia, irmãos, não deveis pensar que o
Filho é menos poderoso do que o Pai, porque disse: “Ergue-me e dar-lhes-ei a merecida
retribuição”, como se ele não pudesse ressuscitar a si mesmo. Ressuscitou aquilo que
podia morrer, isto é, a carne morreu, a carne foi ressuscitada. Para evitar que penseis ter
Deus o Pai de Cristo, podido ressuscitar o Cristo, isto é, a carne de seu Filho, e o próprio
Cristo, que é o Verbo de Deus igual ao Pai, não tinha poder para ressuscitar sua carne, ouvi
a palavra do evangelho: “Destruí este templo, e em três dias eu o levantarei” (Jo 2,19.21). O
evangelista, porém, para que não duvidássemos também acrescentou: “Ele falava do
templo do seu corpo. Ergue-me e dar-lhes-ei a merecida retribuição”.

13 12 “Nisto reconheci quanto me sois favorável, em que meu inimigo não triunfará sobre
mim”. Os judeus se regozijaram ao ver Cristo crucificado, e pensavam que se realizara seu
plano de prejudicá-lo. Viram o fruto de sua crueldade: Cristo pendendo da cruz. Sacudiram
a cabeça, dizendo: “Se é Filho de Deus, desça da cruz” (Mt 27,39.40). Podia descer, mas
não desceu. Não fazia demonstração de poder, mas ensinava a paciência. Se ele descesse
da cruz quando os judeus assim lhe falavam, pareceria ceder aos que o insultavam, e
acreditar-se-ia que, vencido pelos opróbrios não os pudera tolerar. Permaneceu na cruz
enquanto eles o insultavam, ficou firme enquanto eles vacilavam. Eles meneavam a cabeça
porque não aderiam à verdadeira Cabeça. De fato, ele nos ensinou a paciência. Não fez
demonstração de maior força, pois não quis agir conforme a provocação dos judeus. É
efeito de maior poder ressuscitar do sepulcro do que descer da cruz. “Meu inimigo não
triunfará sobre mim”. Naquela ocasião eles se alegraram. Cristo ressuscitou, Cristo foi
glorificado. Eles veem agora que em seu nome o gênero humano se converte. Agora
insultem, agora meneiem a cabeça; antes, firmem a cabeça; ou se meneiam, que a
meneiem de espanto e admiração. Pois, agora dizem: Por acaso será dele que falaram
Moisés e os profetas? Pois, dele foi dito: “Como um cordeiro conduzido ao matadouro,
como uma ovelha que permanece muda na presença dos seus tosquiadores ele não abriu a
boca. Por suas feridas fomos curados” (Is 53,7.5). Verificamos que este crucificado arrasta
após si o gênero humano; foi inutilmente que nossos pais disseram: “Matemo-lo; todo
mundo vai atrás dele” (cf Jo 12,19). Talvez não fosse, se ele não tivesse sido morto. “Nisto
reconheci quanto me sois favorável, em que meu inimigo não triunfará sobre mim”.
14 13.14 “Devido a minha inocência me sustentaste”. Verdadeiramente, possuía a
inocência: integridade sem pecado, pagamento sem débito, flagelo imerecido. “Devido a
minha inocência me sustentaste e me firmaste em tua presença para sempre”. Firmaste-me
para sempre, enfraqueceste-me, por algum tempo; firmaste em tua presença, enfraqueceste
diante dos homens. O que fazer, então? A ele louvor, a ele glória: “Bendito seja o Senhor,
Deus de Israel”. Ele é, pois, o Deus de Israel, o nosso Deus, o Deus de Jacó, o Deus do
filho menor, o Deus do povo menor. Ninguém diga: Ele falou dos judeus, portanto eu não
sou Israel ou antes, os judeus é que não constituem Israel. O filho mais velho é o povo mais
antigo, que foi reprovado; o filho menor é o povo amado. “O mais velho servirá o menor”
(Gn 25,23): esta palavra agora se realizou. Agora, irmãos, os judeus nos servem, são como
escravos que nos carregam os códices, para estudarmos na escola. Ouvi em que ponto os
judeus nos servem, e com razão. Caim, o irmão mais velho que matou o menor, ficou
marcado com um sinal para não ser morto, isto é, para que aquele povo subsista (cf Gn
4,15). Deles, dos judeus, são os profetas e a lei. Por ela e pelos profetas Cristo foi
anunciado. Ao tratarmos com pagãos e lhes mostramos que agora se realiza na Igreja de
Cristo o que foi anteriormente predito do nome de Cristo, da Cabeça e do corpo de Cristo, a
fim de que eles não pensem que inventamos aquelas predições, e que consignamos os
fatos já sucedidos como se fossem futuros, apresentamos os códices dos judeus.
Efetivamente, os judeus são nossos inimigos. As letras do inimigo convencem nosso
adversário. O Senhor tudo distribuiu, tudo dispôs em prol de nossa salvação. Predisse
anteriormente, cumpriu no presente, e o que ainda não realizou, há de realizar. Por isso,
seguremos o bom pagador, para acreditarmos no devedor, porque dará o que ainda não
deu, da mesma forma que deu o que ainda não havia dado. Se alguém quiser experimentar
onde estão escritas as promessas, leia Moisés e os profetas. Se algum inimigo replicar: Vós
inventastes vossas profecias, apresentem-se os códices dos judeus, porque o mais velho
servirá o menor. Leiam-se ali as profecias, agora cumpridas, e digamos todos: “Bendito seja
o Senhor, Deus de Israel, pelos séculos dos séculos”. E dirá todo o povo: “Assim seja,
assim seja”.

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