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ARCANOS

Conta a lenda que os Deuses, preocupados em eternizar e proteger, da destruição


durante a longa IDADE NEGRA, a Sabedoria dos Céus, confabularam entre si e concluíram
que só através do vício, e não da virtude, poderiam perpetuá-la.
Assim, parte da Sabedoria contida na Linguagem Simbólica dos Arcanos, foi
simplificada no Taro e no Baralho, os quais, um serve para “ler a sorte..., e o outro serve de
fonte de “lucro e perda”, até que o Ser Humano desperte para a verdadeira sorte e fortuna”
existente no simbolismo de suas figuras.
A palavra ARCANO, deriva do latim “Arcanus”, que quer dizer “segredo oculto”, mistério.
E a palavra grega “Arcon”, quer dizer “santuário”.
A palavra ARCANO, partida: ARCA-NO, faz lembrar a “Arca de Noé”; e “Arca ou Barca” é a
mesma coisa, assim como “Noé ou Eon”, também.
Assim como temos a linguagem humana, temos, também a linguagem simbólica. Assim
como temos a linguagem universal, temos, também, a linguagem sideral. Da forma das
constelações, é que se tirou o alfabeto hebráico, e este está em correspondência com os
Arcanos.
Os primitivos egípcios iniciados dominavam perfeitamente a Linguagem dos Arcanos
que era, naquele tempo, bem mais dificultosa de se estudar, e totalmente secreta, pois só os
que possuem uma orientação puramente iniciática, tinham conhecimento de seu significado.
Com o decorrer do tempo, por razões que só à Lei cabe decidir, houve
necessidade de se traduzir os Arcanos para uma linguagem de símbolos mais acessível ao
homem comum. Atribui-se esse gigantesco Trabalho a Hermes, o Trismegisto, nome esse que
quer dizer “três vezes grande”, “três vezes mago”. Reproduziu Ele em Lâminas ou figuras, o
que antes eram painéis decorados de motivos em hieróglifos: o Livro do Mural.
Os neófitos desfilavam diante dos painéis que resumiam a “Doutrina Secreta...” dos
Hierofantes, tendo ao seu lado os Guardiões desses mistérios que lhes forneciam, aos poucos,
as explicações necessárias para a sua Iniciação.
Reproduziu então Hermés, em figuras, os painéis do Livro do Mural, dividindo-os
em duas séries denominadas de “22 ARCANOS MAIORES” e “56 ARCANOS MENORES”.
Neles está contida toda a Cosmogênese (mistérios dos Céus) e toda Antropogênese (mistérios
da Terra)..., razão porque diz-se que cada lâmina ou figura pode e deve ser interpretada sob a
triplicidade dos três mundos: o Mundo Divino, o Mundo Humano e o Mundo Inferior ou infernal...
Acompanhando a evolução dos temos, a Sabedoria dos Deuses criou e permitiu
que os Arcanos fossem transformados no TARO e no BARALHO. Ficou então os 22 Arcanos
Maiores como sendo o TARO propriamente dito, e os 56 Arcanos Menores, como sendo o
BARALHO. Entretanto, os atuais Baralhos já não têm a autenticidade dos primeiros. Os
verdadeiros Baralhos, dizem, são provenientes de Veneza e foram levados para lá pelos
Boêmios... (originários dos primitivos ciganos).
Muito mistério e beleza envolvem a origem dos Arcanos, porém é assunto para ser
pesquisado diretamente nas Fontes de Sabedoria deixadas pelo nosso augusto Mestre, o
Professor José Henrique de Souza. Damos apenas alguns pormenores a fim de que o leitor que
for primário neste assunto, possa se orientar melhor.
Segundo ensinamentos de nosso Colégio, até o Século XVIII o Tarô foi tido como
restos de uma época de trevas “(Idade Média). Em 1781, porém Court de Gebelin, em seu livro
“Mundo Primitivo”, sacudiu os homens da época para a riqueza maravilhosa da Sabedoria
egípcia contida no jogo de cartas”.
Um fabricante de cabeleiras postiças chamado Aliette, o qual tomou o nome de
Etteila (forma anagramática de seu nome), interessou-se pelo assunto, porém sob a forma
apenas de cartomancia, vulgarizando assim o Taro neste aspecto.
A palavra Taro, usando-se a permuta das letras, dá “rota”, “tora”, “ator” etc. ROTA,
pode significar a Rota ou a Roda da Evolução; Tora ou Torah, que em linguagem semítica, quer

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dizer, Lei; e ATOR, além de significar “aquele que representa, que vive, que vive uma
personagem”, é o nome também de um “cadinho” ou recipiente próprio dos alquimistas.
O vocábulo TARO pertence à linguagem celta, e designava, antigamente, a capital
da Cidade “TAT DE ANANDA”, a “cidade dos mistérios...”, cujas ruínas ficam próximas da cidade
de Dublin.
O Arcano é a manifestação da Divindade em ordem alfabética, e todas as vezes que a
Vontade Divina se manifesta na face da Terra, obedece ao simbolismo expresso pelos
arcanos.
Todos os Arcanos estão contidos no Ser Humano, porém só os Arcanos Maiores, os
relacionados com a parte Espiritual do homem, serão abordados em cada número de nossa
revista Aquarius (o texto acima e os seguintes, referentes aos Arcanos Maiores, foram
extraídos da revista Aquarius acima citada). À medida que eles forem sendo publicados e
estudados “sucintamente” (pois uma análise mais profunda só é permissível em nosso colégio
iniciático com o instrutor encarregado), daremos as denominações de cada um.

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ARCANO 1

Corresponde à letra ALEPH do alfabeto hebráico


Nome segundo a interpretação vulgar: o PELOTIQUEIRO
Nome segundo Cagliostro: VONTADE
Nome segundo São Germano: PRINCÍPIO ATIVO
Nome segundo o Anjo da Palavra: DEUS EM MOVIMENTO
COMEÇO DAS COISAS
O MAGO CRIADOR
O PRESTIDITADOR

O Arcano UM, genericamente, nos dá a idéia de UNIDADE, bem como o princípio que
determina esta UNIDADE. Hieroglificamente, ele é representado pelo TOURO, animal que
simboliza o princípio criador e fecundador.
No aspecto da Vida-Energia, podemos relacionar este Arcano, no MUNDO DIVINO,
com o SOL ESPIRITUAL; no MUNDO HUMANO, com o SOL PSÍQUICO, que é o que vemos
nascer no Oriente e se pôr no Ocidente; e no MUNDO INTERIOR OU INFERNAL, com o SOL
FÍSICO, que é o que vibra no Interior da Terra.
No aspecto do SOL FÍSICO, podemos relacionar o Arcano I com o Centro de Força ou
Chacra psíquico existente no Homem, e que é o Chacra Raiz ou Cóccix. Os ocultistas
expressam esse Chacra da seguinte forma: um círculo dividido em quatro partes: duas partes
de coloração semelhante a de um tijolo, e duas de cor amarelo.Os iogues orientais
representam este Chacra com quatro pétalas e um elemento branco no centro. O nome em
sânscrito desse Chacra é Muladhara, e em português, é o Centro de Força raiz, Este Chacra
tem por fim “alimentar” a região sacra das criaturas humanas. Nele se encontra em estado de
latência, uma energia universal denominada pelos ocultistas, de KUNDALÍNE. Esta energia
estabelece a relação entre as consciências universais e as consciências humanas. Foi o
despertar dessa energia que fez com que o Padre Antonio Vieira sentisse o célebre “estalo”.
Em determinada região do Globo Terrestre, só pode entrar quem possuir essa energia em
funcionamento no corpo físico. Estamos falando nesse assunto, a fim de vibrar em nós esta
energia que é a base da vida espiritual. A Eletricidade que conhecemos, é uma manifestação
grosseira dessa energia.
Pelos objetos que o ser da figura aponta, segura, e tem à sua frente, vê-se que ele é
um MAGO CRIADOR, ou seja, é um Ser que sabe manipular as divinas forças da natureza. A
posição dele, como o corpo inclinado para a direita, juntamente com a posição dos braços,
forma o símbolo da letra hebraica “ALEPH” (Deus).
A roupa dele possui as cores das três “Qualidades de Matéria” da criação: o Amarelo
que representa O Espírito; o Azul, que representa a Alma; e o Vermelho, que representa o
Físico.
O chapéu que ele usa tem a forma de oito, número que expressa o máximo de
perfeição que o ser humano pode alcançar na Terra. A forma do oito lembra a ampulheta, que
é o instrumento de “medir o tempo”, símbolo da “paciente espera” do Criador para que o
homem se faça realmente à Sua semelhança, ou seja, atinja o 8º Princípio que é o mesmo
Princípio Crístico, aquele que Jeoshua (o Jesus bíblico) alcançou.
O símbolo do Infinito, que é o mesmo oito “deitado”..., alegoriza a Vida Una, A Suprema
Unidade, Aquilo, Deus, Brahma, Tat, a Subjetividade Absoluta, e esta se revela através das
faculdades superiores do MAGO CRIADOR, do Supremo Artista.
Em outras palavras: a Essência Única manifestando-se pelos OLHOS do Supremo
Artista, como LUZ; pelos OUVIDOS, como SOM, NOME; pela BOCA, como SENTENÇA, LEIS;
pelas NARINAS, como HÁLITO, VIDA, reflexo da VONTADE; pelos BRAÇOS, como
REALIZAÇÃO.
O chapéu do ser do Arcano I pode também ser associado às asas da borboleta, que é o
símbolo dos GÊMEOS ESPIRITUAIS, os Pai-Mãe Cósmicos.
Os objetos que se acham sobre a mesa simbolizam os elementos com os quais a
Divindade vai se expandir no desenvolvimento dos demais Arcanos.

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A Moeda ou Disco que ele aponta, a Bagueta que ele segura, a Espada e a Taça sobre
a mesa, tem cada uma delas o seu significado, e estes quatro elementos juntos podem ser
analisados assim:
Se correlacionados com a 4 Hierarquias Criadoras que já se manifestaram fisicamente
na face da Terra, teremos: a Espada = a Hierarquia dos Assuras, seres nos quais predomina o
atributo OUSAR (persistência no querer). A Bagueta = a Hierarquia dos Agnisvatas, seres nos
quais predomina o atributo QUERER. A Taça = a Hierarquia dos Barishades, seres nos quais
predomina o atributo Saber. A Moeda= Hierarquia dos Jivas, seres nos quais predomina o
atributo CALAR (saber silenciar).
Se correlacionarmos estes mesmos instrumentos com os 4 mistérios ou segredos da
esfinge, teremos: a Espada = a Águia; a Bagueta = o Leão; a Taça = o Anjo ou a Mulher; a
Moeda = o Touro.
Se fizermos com o “jogo de cartas”, temos: a Espada = Espada; a Bagueta = Paus; a
Taça = Copas e a Moeda = Ouro.
Analisando estes objetos isoladamente, temos: a Espada, como símbolo da Justiça, do
Rigor, da Magia, da Realização, do Poder Temporal, do Poder Material. A Bagueta como
símbolo do comando, da Superioridade, o veículo que conduz a Divindade do Céu para a
Terra. É o instrumento que tem por fim fazer com que a “subjetividade” se torne “objetividade”,
isto é, transformar as energias subjetivas em objetivas. A Taça como símbolo do Sacrifício, da
Renúncia, da Sabedoria, da Inspiração, da Essência Única guardada como Sabedoria. É o
poder Espiritual, o Poder Inspirador. A Moeda ou Disco, com a Cruz no centro, simboliza o
Terceiro Trono, ou seja, o “Mundo das Realizações, das coisas objetivas, do Progresso e da
Riqueza Espiritual.
O Loto que “brota” do chão representa o Trono que se vai construir com o decorrer da
Evolução, e onde a Divindade se assentará para reinar na Terra, no Mundo Material, no Mundo
objetivo. Pode também o Loto expressar os primeiros resultados do Discípulo, na senda da
Iniciação,até alcançar a categoria de Mago Criador.
A Bagueta que ele segura para cima mostra o poder de atrair a Divindade do Céu para
a Terra; ele é um “manipulador”; com a Bagueta, ele atrai as energias do “alto” (Fohat),
trazendo-as para o “casamento” com as forças de “baixo” (Kundaline).
A Mesa em que se assentam todos esses objetos, expressa o quaternário da Terra, o
Mundo Humano, o “campo” onde se opera a magia da evolução, ou seja, o Laboratório da
perfeição das formas, onde há a transformação dos acontecimentos evolucionais. Quem diz
“quaternário da Terra”, diz “o quatro à terra pertence...”, expressão do nosso Mestre. Ele diz,
também “um trono ou cadeira, em sentido contrário, é um quatro...; uma perna cruzada é um
quatro”. Sem muito esforço, podemos também associar a expressão “quaternário da Terra”,
com as 4 fases lunares, 4 marés, as 4 estações do ano, os 4 ciclos em que é repartida a Vida
Universal, as 4 etapas da vida do ser humano, os 4 temperamentos do homem, os 4 tempos
respiratórios, os 4 reinos da natureza etc.
O MAGO CRIADOR representa, portanto o MUNDO DIVINO. A intelectualidade, a
Criação genial.

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ARCANO 2

Corresponde à letra BETH do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: A PAPISA – A SACERDOTISA
Nome segundo Cagliostro: SABEDORIA
Nome segundo São Germano:PRINCÍPIO PASSIVO
Nome do Anjo da Palavra: DEUS EM ASPECTO FEMININO OU PASSIVO – O
PODER ATIVADOR DO ETERNO

Tudo que existe no universo tem dois pólos: POSITIVO e NEGATIVO. Toda
manifestação no mundo da “multiplicidade das formas”, começa pela LEI DA POLARIDADE.
Hermes, - O Trismegisto, (*) no seu trabalho denominado “Polaridade”, diz: “Tudo é
duplo, o igual e o desigual são a mesma coisa; tudo tem dois pólos; tudo tem o seu oposto; os
opostos são idênticos em natureza, mas diferentes em grau; os extremos se tocam; todas as
verdades são meio-verdades; todos os paradoxos podem ser reconciliados”.
E o excelso Frá-Diávolo diz: “A essência Única se manifesta em seu duplo aspecto de
Luz e Fogo, em tudo e em todos penetrando”.
É necessário, para melhor entendimento do Arcano 2, uma ligeira explicação sobre os
MUNDOS DIVINO, HUMANO E INFERIOR, já que esse Arcano está relacionado com eles. O
que se cria no Mundo das Idéias (MUNDO DIVINO), não possui interferência de elementos
antagônicos, obstaculizantes, de reações contrárias. No Mundo das Relações Humanas
(MUNDO HUMANO), estes planos encontram desde logo obstáculos, e se nesses obstáculos
se degradam, contrariam as Leis Divinas e Naturais, e transformam-se no MAL CONSCIENTE.
A OBRA idealizada pelo Eterno (Deus, Consciência Uma, Absoluto etc), tem sofrido
inúmeras modificações na sua prossecução na Face da Terra (MUNDO HUMANO), até que
possa conquistar de novo o Ritmo Legal (ou Harmonia). Isso só ocorrerá com o progresso
Espiritual da Humanidade, daí as tradições mais sublimes falarem na “queda de determinadas
Hierarquias”. Dentro do Sistema de Evolução em que vivemos, já houve grandes modificações
dos planos elaborados no Mundo das Idéias (MUNDO DIVINO), modificações estas
provocadas por algumas Hierarquias que, “em má hora...”, ou seja, em época inoportuna, em
momento crucial mas de vital importância, sonegaram a Missão ou Trabalho que deveriam
Realizar no MUNDO HUMANO, por ora ainda considerado como “mundo grosseiro”.
Sempre que acontece um desvio do eixo evolucional traçado pela Lei, esta mesma Lei
exige dos responsáveis por esse desvio, um rápido Trabalho “recuperativo” e “retrospectivo”,
espécie de “reprodução em miniatura” do Grande Trabalho Universal. Isto nos faz lembrar da
peça de teatro iniciática, “Tim-Tim por Tim-Tim”, levada a efeito no Teatro São João, na Bahia,
em 1899, assim como, também nos recorda a “vida-síntese” de nosso Mestre...
Uma espécie de “código” é adotado pela Lei para a “recuperação” de uma “tentativa
fracassada”: são as REALIZAÇÕES DAS IDEIAS CONTIDAS NOS ARCANOS. Quando a
nossa Obra REALIZA determinado Arcano, podemos dizer que “a Obra realizou o Arcano
número tal”. Assim também pode ocorrer com o discípulo. Isto quer dizer que a Obra ou o
discípulo, se for o caso, realizou alguma coisa em HARMONIA com as Leis Divinas (MUNDO
DIVINO).
Expliquemos melhor: quando o corpo humano é ferido mais seriamente, são destruídos
vários tecidos. Então, a natureza, em sua sabedoria, volve ao período pré-natal para
reconstituir os tecidos destruídos. Assim acontece com o discípulo ou com o ou com o Ser de
Hierarquia elevada quando se desvia do caminho traçado. Em futura encarnação, ele passa à
condição de um ser humano comum, a fim de recuperar aos poucos (Tim-Tim por Tim-Tim), os
direitos divinos ou a Hierarquia Superior, que perdeu.
Esse trabalho de recuperação, seja de Indivíduos, seja de Hierarquias, de Nações, de
Sistemas de Evolução, de Universos etc., é denominado pelas tradições, de REDENÇÃO,
SUBLIMAÇÃO, SALVAÇÃO etc. Salvar, redimir, espiritualizar o Mundo, é EQUILIBRA-LO, é
EUBIOTIZÁ-LO dentro dos moldes ou planos das Leis Universais (MUNDO DIVINO).

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O Trabalho dos Deuses, no MUNDO HUMANO, tem sido o de recuperar o MAL, ou
seja, fazê-lo vibrar e agir como o MAL NO BEM..., como diz o nosso Mestre, a fim de que a
Evolução se processe normalmente.
O trabalho maravilhoso de nossa Obra, no seu aspecto metafísico, é semelhante ao de
um alquimista, pois é o de TRANSFORMAR demônios em Deuses, personalidades em
Individualidades etc.
Mais ou menos exposto o que diferencia o MUNDO DIVINO do MUNDO HUMANO e do
MUNDO INFERIOR, passemos ao significado do simbolismo figurativo do Arcano 2, e em
seguida, a relação deles com os três mundos já citados:
O Arcano 2 representa a PAPISA, que é a RAINHA CELESTE. Tem o sentido
PASSIVO; expressa, pois, o outro pólo da Criação: o NEGATIVO, o que plasma as Idéias, por
isso se apresenta como a idéia da MÃE.
De modo sintético, podemos dizer que este Arcano encerra as Idéias que se seguem:
Conhecimentos sacerdotais e intuitivos; Metafísica intuitiva; Fé racional (gnose); Poder intuitivo
e de prever o futuro; O Espírito penetrando o Mistério; O Verbo ou A Palavra Criadora; o
Pensamento ou ato do qual nascem todas as Idéias.
Nos alfabetos semitas, principalmente no hebreu, o Arcano 2 é expresso pela lâmina
que corresponde ao BETH, palavra que equivale à letra “B” do nosso alfabeto. A palavra
BETH se origina de um símbolo hieróglifo que está relacionado à casa, “Tabernáculo do
Espírito”; e à Boca, o órgão pelo qual se manifesta a palavra, que é, por sua vez, a
Manifestação das Idéias. A Idéia de “boca” relaciona-se com todos os conceitos que
expressam “núcleo”, “segredo”, “mistério”, “ciência”, etc. Como a palavra (o som) é
elaborada “interiormente”, traduz-se como Mansão Inviolável de Homens-Deuses. É esta a
razão de se encontrar na história do Cristianismo, principalmente no Velho Testamento,
passagens que se referem a BETHEL, lugar onde se manifestou o PRINCÍPIO UNIVERSAL ,
que os homens cultuam como sendo a “causa das causas”.
É nos santuários que se manifesta a Divindade. É nos Santuários que se adquire o
Conhecimento das coisas Secretas, A Verdade. Por isso o Arcano 2 apresenta uma Mulher,
uma verdadeira Rainha, com o símbolo da Lua crescente no alto da coroa ou da cabeça,
sentada num trono real, e adornada com símbolos da realeza “velada”, “encoberta”...
Expressa, com isso, o Conhecimento Real, que não pode ser vulgarizado! No colo ela traz
um livro semi-aberto, representando o Conhecimento dos Mistérios, o Segredo da Iniciação,
que deve ser dado com critério, aos que verdadeiramente, sentem por ele, inclinação. Esta
“chave de Conhecimento” está simbolizada, também, na Chave que a Papisa segura, na
mão esquerda.
A Rainha está ladeada por duas colunas: uma verde e outra vermelha. Ambas
simbolizam o que na Maçonaria é denominado de Jakim e Bohaz, ou seja, os pólos
POSITIVO e NEGATIVO. É este eterno dualismo, que nós encontramos como fundamento
de infinitas religiões, que ainda hoje são cultuadas.
A PAPISA ou RAINHA CELESTE, representando o Poder de Criação, o Poder
Plasmador, o Pólo Negativo ou Passivo, é a Matéria fecundada pelo Espírito Divino, que a
transforma em seres organizados nos mundos das multiplicidades de formas.
Os eternos antípodas (Bem e Mal, Luz e Sombra (ou Trevas), Positivo e Negativo),
expressam sempre o poder do ESPÍRITO se manifestando na MATÉRIA, fazendo com que
os seres se tornem conscientes e ativos. Surge, então, uma terceira coisa: O FILHO.
A coroa circular da PAPISA, já na sua forma geométrica, simboliza o aspecto feminino
ou PASSIVO, e sendo constituída de dois andares, nos faz lembrar o SEGUNDO TRONO,
“O Reino dos Céus”, de onde provém o Conhecimento Sagrado. O chão onde se assenta o
trono, é quadriculado, podendo simbolizar o “jogo de xadrez que é a vida” na face da Terra, e
onde todas as pedras (percalços, glórias e derrotas, o Carma etc.), são “movimentadas” a fim
de que a Evolução se processe.
A Majestosa figura da PAPISA, RAINHA ou MÃE CELESTIAL, é aquela que DEU VIDA
E FORMA ao SEGUNDO TRONO. Aquela que é o espelho onde se reflete a silhueta
majestosa do ETERNO. Ela representa a própria Árvore da Vida ou a Árvore de Kuma-Mara,

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por isso “movimenta”, “plasma”, “dá forma”, à VONTADE DO ETERNO. Deus pensa e a Mãe
Celestial “gera” o Seu Pensamento.

Vejamos agora o simbolismo do Arcano 2 com os três Mundos, já mais ou menos


explicado:

NO MUNDO DIVINO

O Arcano 2, no MUNDO DIVINO, é expresso pela DIVINA MÃE, a Taça da Suprema


Essência Divina. É a Essência Única que se manifesta em seu duplo aspecto: LUZ e FOGO
(Fohat e Kundalini), em tudo e em todos penetrando, transformando, velando e libertando.
É a Rainha Celeste com o privilegiado nome de Deusa VENUS, irmã-esposa do Deus
MERCÚRIO. Deste mágico consórcio nasceram os EONS sagrados que ligam as Estrelas
aos seres humanos, transformando-os em jóias faiscantes de luz (Eus-Superiores), a
Consciência do Absoluto, que compreende os três termos de toda a manifestação: o
passado, o presente, e o futuro.
ISIS + WARA, o Varão Celeste, formam a palavra ISWARA, o Andrógino Perfeito, O
Luzeiro, como Pai e Mãe de um Sistema de Evolução. É a Estrela única entronizada no Seio
do Universo. Os fragmentos desta Suprema Estrela são como átomos divinos projetados no
espaço e que constituem os nossos Espíritos, a nossa Consciência Imortal, o nosso Princípio
Superior.
As tradições do Ocidente alegorizam estes “átomos divinos” (a Consciência Superior),
como a Pomba do Espírito Santo, que deve pairar sobre as criaturas humanas.
Realizar a Eucaristia, é o ato que tem por finalidade fazer com que a Imaculada Pomba
do Espírito Santo deixe o seu Ovo-Germem da Manifestação da Vida, em nosso coração,
simbolizando, assim, a penetração daquele “átomo divino” no nosso ser, permitindo, desta
forma, a união da Alma com o Espírito, ou seja, a ILUMINAÇÃO.

NO MUNDO HUMANO

No MUNDO HUMANO, este Arcano é representado por HEVE (Eva), como reflexo de
ADAM (Adão). É o binário, como reflexo da Unidade; a ciência divina dando origem à
intelectualidade, à percepção das coisas visíveis e invisíveis. É a mulher, modelo do homem, e
que com ele deve realizar igual destino, uma missão, um ideal. A MÃE DIVINA aqui, se
manifesta como Poder Gerador, poder de adquirir e transformar as coisas do Céu e torná-las
práticas e úteis à vida humana. É o aspecto duplo da Divindade que se manifesta com o poder
de fazer com que os homens ou os discípulos, possam alcançar a Consciência Superior. É o
poder que ATIVA a Vontade Eterna do Supremo Arquiteto do Universo.

NO MUNDO INFERNAL

No MUNDO INERNAL ou INFERIOR (de in-fera ou reinos inferiores da natureza), age


como reflexo da Natura Naturante e Natura Naturada, como dizem os Alquimistas. É a
Natureza com possibilidade de formar seres e de tirar de si mesma, as formas. É a divina
MÃE TERRENA que a tudo e a todos dá vida, transformando em outras formas de vida, as
formas que já cumpriram sua missão, para que não sejam apanhadas pela “paralisação dos
tempos”. É a energia que MANTÉM A VIDA nos Reinos da Natureza e nos Reinos
Elementais. Seu sangue, são as águas que correm no seio da Terra, e sua Vida é o Fogo
existente no seu interior.

“O discípulo evolui por seus próprios méritos, e a si mesmo transformando, transforma o


mundo.”
HENRIQUE JOSÉ DE SOUZA

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ARCANO 3

Corresponde à letra Ghimel do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: A IMPERATRIZ
Nome segundo Cagliostro: ATIVIDADE
Nome segundo São Germano: PRINCÍPIO NEUTRO
Nome segundo o Anjo da Palavra: DEUS EM ASPECTO FEMININO OU NEGATIVO
COMO SENHOR DA RONDA

Disse Pitágoras: “O número 3 reina em toda parte e a Mônada é o seu princípio.” Tudo
tem origem na Grande Unidade. Esta, deslocando-se, vai formando a multiplicidade das
coisas.
No Arcano número UM, vimos o MÁGICO, o Pelotiqueiro, como sendo a Unidade
fundamental de todas as coisas e que se nos impõe ao espírito de modo inteligível e
subjetivo. Com a nossa mente finita não podemos representar o que é ilimitado, infinito,
indeterminado, o Deus em Movimento, o Começo das Coisas, a não ser evocando as
imagens de uma Noite de insondável profundeza, um Oceano sem Praias, um Espaço sem
Limites etc.
No Arcano número DOIS, procuramos perceber o sentido do domínio de Ísis, a Deusa
do Ministério, a Papisa e a Suprema Sacerdotisa, porém o nosso pensamento, em vão, alçou
vôo às sublimes alturas da Cosmogonia, só percebendo, naqueles altíssimos planos, uma
espécie de caos mental, perante o qual ficamos estarrecidos e levados ao mutismo.
No Arcano TRÊS, vamos nos libertar desta subjetividade, porque este terceiro
ARCANO representa a Inteligência ativa.
A denominação vulgar é a Imperatriz, que se representa por uma soberana
resplandecente de claridade, simbolizando a Inteligência criadora. Esta soberana expressa o
princípio ou as leis que regem as formas, as imagens e as idéias. Os cristãos qualificavam-
na como a Virgem Imaculada; os gregos, como Vênus-Urânia, nascida, radiosamente, das
sombrias ondas do Oceano sem Praias. Como Rainha do Céu, paira nas mais sublimes
alturas do idealismo e acima de todas as contingências objetivas. Mas, como está indicando
a figura heráldica, o pé pousa sobre um crescente Lunar, de pontas para baixo, para dominar
o Mundo sublunar, o Mundo material etc.
Para os povos de Israel, a lâmina TRÊS tinha o seu simbolismo no GHIMEL, o qual se
deriva de um ideograma primitivo, apresentado por um laço de camelo em forma de pescoço.
Camelo, no entendimento daqueles povos, era o nome dado à corda, cabo trançado de
grande espessura, e não a designação de animal que hoje conhecemos. Daí o provérbio: “é
mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha, do que um rico entrar no reino do
céu”.
Com efeito, o Ghimel liga-se ao sentido de garganta, mas, também, à idéia de mão,
força na mão, pulso forte etc. Como a garganta das humanas criaturas, está em relação com
a formação da palavra. Contudo, este conceito ainda se liga à idéia do desenvolvimento
material das coisas espirituais. É na garganta onde se forma a palavra. A idéia se corporifica
na garganta e se manifesta pela Boca (Arcano DOIS).
Assim, podemos ligar o Ghimel ao conceito de geração, porque é pela GERAÇÃO que
os Seres espirituais, Arcanjos etc, tomam nome e forma. Portanto, o Ghimel – ARCANO 3 –
tem o sentido do desenvolvimento material das forças espirituais.
A geração é o mistério ou processo pelo qual o Divino se faz humano. Daí a idéia de
AVATARAS , se se trata de Consciências Superiores, e de ENCARNAÇÕES, se se trata de
almas em evolução (plano emocional).
A idéia essencial do Ghimel é o Filho, a objetivação do que foi ideado pelos dois
primeiros Arcanos. Na tradição egípcia, dizia-se que era o equilíbrio entre Osíris (o Pai) e Ísis
(a Mãe), cujo desígnio era Hórus (o Filho), a Terceira Divindade daquela teogonia, o Deus
consciente, ativo e realizador.

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Temos, assim, as 3 idéias ligadas a esta terceira lâmina, representada por uma mulher
coroada de 12 estrelas, tendo na mão esquerda um cetro com o símbolo de Vênus.
Isto merece um esclarecimento, porque a Vênus-Urânia não é propriamente uma
divindade feminina, mas a expressão da harmonia dos contrários. Exprime, no mundo visível,
aquele que surge da ação do pólo positivo sobre o negativo.
A idéia pura não pode se manifestar se não através da matéria, onde toma nome e
forma. As duas juntas (idéia e matéria), agindo harmonicamente animam os universos
viventes. Por isso, preso pela mão direita da Imperatriz há uma Águia, com o fundo purpúreo.
Esta Águia simboliza a ânima Solar (Alma do Sol), lembrando as energias cósmicas
que se convertem em vida, enquanto que o cetro, na mão esquerda da Soberana, com um
globo encimado por uma cruz na parte superior, tem um sentido muito mais profundo.
Nos Templos egípcios, encontrava-se, pintado nas paredes, um Sol radioso com raios
infinitos e, nas extremidades destes, haviam pequenas cruzes. Estas cruzes davam a idéia
de atividade.
À Imperatriz, para exprimir a imutabilidade das coisas libertas de todas alterações,
mostra-se de frente, numa atitude marcada por uma certa rigidez hierárquica. No entanto,
uma sorridente serenidade anima-lhe o rosto, graciosamente emoldurado por uma leve
cabeleira dourada. Delicada coroa pousa-lhe a cabeça e em torno da qual gravitam 12
estrelas (9 visíveis) que fazem lembrar os 12 signos do Zodíaco, os 12 apóstolos em torno
de Cristo. Ela possui asas porque sua origem é celeste e procede de um plano constituído de
energias muito mais sutis do que o terreno. O lírio simboliza o encanto exercido pela pureza,
pela doçura e pela beleza, elementos de atração para induzir as humanas criaturas a realizar
a geração.
Vejamos o simbolismo do Arcano 3 com os três mundos:

No MUNDO DIVINO, é expresso pelo Poder Supremo de Deus, equilibrado pela


inteligência eternamente ativa, e pela Sabedoria Absoluta.
No MUNDO HUMANO, como equilíbrio de “Adam-Heve”, é a humanidade realizando a
lei da evolução. De modo sintético tem o sentido de germinação, incubação, fecundidade,
geração, iniciativa, desenvolvimento da intelectualidade etc.
No MUNDO INFERIOR, como equilíbrio da natureza ativa e da natureza passiva, é o
poder criador da substância plástica, surgindo Orbes, os Sistemas que povoam o infinito. É a
natureza em elaboração, a germinação dos atos que devem nascer da vontade.

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ARCANO 4

Nome vulgar: O IMPERADOR


Nome segundo Cagliostro: REALIZAÇÃO
Nome segundo São Germano: EVOLUÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: OS DOIS ASPECTOS MACHO- FÊMEA DO
SENHOR DA RONDA. PODER TEMPORAL
E ESPIRITUAL

Este Arcano Quatro corresponde à letra Daleth do alfabeto hebraico e à letra D latina.
Os ocultistas classificam este Arcano com o título de O IMPERADOR.
O número quatro dá sempre a idéia de realização. Na lâmina quatro, vemos o
Imperador sentado num trono, expresso pela Pedra Cúbica, a famosa Pedra dos Maçons.
Fazendo uma pequena recapitulação dos Arcanos anteriores, verificamos: que o
Arcano UM é o criador Espiritual, a Vontade, o princípio ativo; o Arcano DOIS, é o princípio
plasmador, ativador da vontade, a sabedoria divina; o TRÊS, a geração, a atividade, a
regência da forma; e o QUATRO, a realização, o construtor físico, o poder governante.
Este Arcano corresponde a todas as idéias e noções que se ligam a uma criação ativa,
realizada por um ser criado. É um ser criador, criado por outro Ser muito mais excelso.
De acordo com esse conceito, trata-se de um ser criado, antropogenicamente, por outro
ser de natureza cosmogênica, isto é, Deus criando os homens. O Adam-Kadmon, criando o
Adam-Heve ou o Adão e Eva.
O número quatro é, realmente, aquele que, no Mundo Físico, constrói. Logo o quatro é
um número estável. É a Obra que desafia o destruidor dos tempos.
São Jerônimo, prefaciando a Bíblia, referiu-se a essa misteriosa ciência dos números –
de Pitágoras e Apolônio de Tiana – dando-lhe seu valor real.
O símbolo hieroglífico deste Arcano – O Imperador – são seios, mas no sentido de
alimento, derivando daí a idéia de manutenção. Analisando o símbolo do Imperador, num
aspecto mais profundo, vamos encontrar a origem dos Andróginos Perfeitos, aqueles que
trazem em si as duas polaridades. Representa, também, um governo duplo, isto é, o
Governo Espiritual e Temporal. Na Índia dá uma expressão análoga: o Brahmatmã, ser da
mais alta hierarquia espiritual, Chefe dos Dwijas e de todos os iniciados, o qual tem como
emblema, duas chaves cruzadas sobre a tiara, representando os três mundos. Por isso se
diz que Ele é o Senhor dos Céus, da Terra e dos Infernos. As tradições transHimalaianas
falam do Rei do Mundo, o qual possuía como representante na face da Terra, os Budas
Vivos.
De quando em vez, o rei do Mudo fazia sua vilegiatura (digamos assim) na face da
Terra, onde era visto num carro puxado pelos elefantes brancos. O nome de Sua Majestade
era Rigdem Jyepo – o Rei dos Jivas.
Jiva é a Hierarquia humana que está desenvolvendo a inteligência concreta ou mental
discursivo.
Passemos agora, à análise deste Arcano nos três Mundos ou Planos.

Mundo Divino: O Poder da Vontade, a materialização constante da virtude divina no


homem, progressão hierárquica em que se manifesta a vida.
Mundo Humano: como reflexo de Adam é o supremo realizador, o Poder de realizar ou
construir as coisas do mundo intermediário, a Ordem Administrativa, a Direção, o Comando.
Representa as quatro Consciências de afirmação e negação, discussão e solução na sua
tarefa de concretização das coisas. O Poder da Vontade do Imperador manifesta-se neste
mundo em forma de Lei, através de quatro Entidades ou quatro Consciências, ou ainda, de
quatro seres. Cada um desses seres está encarregado dum setor da Realização Universal.
O primeiro é conhecido pelas tradições com o excelso nome de Manu (o doador da Vida), o

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segundo de Yama (o Deus dos Mortos), o terceiro de Rajah-Karmã ou Karuna (a Justiça
Universal) e o quarto é Astaroth (o impulsionador da inteligência, ou melhor, o Coordenador
dos esforços humanos).
Mundo da Forma ou Inferior: no mundo inferior (o mundo da natureza) e como reflexo
da Natureza ativa, é o fluido criador Universal ou simplesmente fluxo criador. A realização
das coisas materiais, a cristalização do esforço e a obtenção do Poder material.

Descrição da Lâmina Quatro


O Imperador tem como trono a pedra cúbica, ornamentada por uma águia negra. As
suas pernas cruzam-se sob um triângulo desenhado pela cabeça e os braços.
Por que se assenta sobre uma pedra cúbica? Se o Imperador é, com efeito, o Príncipe
deste mundo material, logo, reina sobre o concreto, o que está corporificado, encarnado,
humanizado. Daí, notamos o contraste entre o Império inferior (material) e o celeste domínio
da Imperatriz (Arcano três), exercendo-se diretamente sobre as almas e os espíritos puros.
O Imperador corresponde ao Demiurgo dos Platônicos e ao Grande Arquiteto da
Franco-maçonaria. Os seres organizam-se e desenvolvem-se sob seu impulso; Ele é para os
demais seres o Deus interno, ou seja, o princípio de fixação de crescimento e de ação. É, por
assim dizer, o espírito individual, a manifestação objetiva do espírito ou da consciência
universal. É uno em sua essência criadora, mas, subdivide-se na multiplicidade de criaturas.
De modo que o Imperador se infunde em todos os seres vivos. Ele é a grande chama e as
demais criaturas humanas são as suas centelhas.
Com muita razão dizem as tradições: “Deus se dividiu para realizar o supremo sacrifício
da criação”.
O Imperador corresponde, ao mesmo tempo, no macrocosmo (o grande universo) e no
microcosmo (o pequeno universo), ao que é imutável, eis porque se assenta na pedra cúbica
que é o símbolo da estabilidade.
Seu trono cúbico é o único que não pode ser derrubado, resultando sua estabilidade da
forma geométrica atribuída pelos alquimistas à Pedra Filosofal. Essa pedra misteriosa é
objeto da pesquisa dos sábios, pois se relaciona com a perfeição realizável pelos indivíduos.
Estes devem procurar conformar-se com o tipo da espécie, figurado pela Pedra Cúbica dos
Maçons, bloco retangularmente talhado sob controle do esquadro (norma em latim), fazendo
assim com que o ideal outro não seja do que o homem estritamente normal.
O globo do mundo, que o Imperador segura na mão esquerda, é uma insígnia do
domínio universal. Esse globo é, aliás, o símbolo, não do universo físico, mas da Alma do
Mundo, entidade graças à qual se operam todos os milagres da natureza e da arte. Na mão
direita, segura o Imperador um cetro maciço, que não deixa de ter analogia com a funda de
Hércules.
O cetro não expressa a arma brutal e mortífera, mas, sim, o símbolo do soberano poder
iniciático ou mágico. O crescente lunar colocado junto do punho promete um irresistível
domínio sobre tudo quanto é mutável, móvel, caprichoso ou lunático, segundo o Hermetismo.
O que é fixo e mutável exerce uma ação determinante sobre toda substância não
organizada, cujo estado permanece vago ou flutuante.
Na parte superior do cetro, há uma flor-de-lis. A flor-de-lis é um emblema de realeza
quer no aspecto humano, quer no divino.
O Imperador empunhando um cetro, não quer dizer que seja um déspota, impondo
arbitrariamente sua vontade; seu reino nada tem de brutal, pois que ele se inspira num
sublime ideal de vontade e justiça.
Esse ideograma cujo ouro da espiritualidade se destaca sobre o azul celeste, tem
alguma semelhança com o lírio, emblema da pureza que é a flor da Imperatriz; mas à virtude
passiva feminina, ele opõe a ação expansiva masculina. Compete à energia do masculino
realizar o ideal feminino purificando o ardor da fogueira infernal do egoísmo, gerador da
individualidade.
A iniciação ensina a descer cada um em si mesmo a fim de dominar o fogo interior que,
avivado pela arte, cessa de ir queimando obscuramente e sobe, transformado em chama
celeste, depois de liberta-se das fumaças opacas das paixões.

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O cetro ornamentado com a flor-de-lis mostra o Imperador inspirando-se nas sublimes
inspirações da Imperatriz, pois que é, sobre a terra, o realizador da idéia divina. Seu domínio
é legítimo e sagrado, embora ele opere com todas as forças vivas, por mais maculadas que
elas se achem em sua impura fonte. A energia laboriosa que constrói todas as coisas, age à
maneira de um Deus oculto, dissimulado a todos os olhares, tal como os protegidos de
Plutão que se tornam invisíveis sob o capacete do Soberano das Profundezas. A viseira
desse capacete de invisibilidade tem quatro triângulos que se relacionam com a realização
demiúrgica pelo quaternário dos Elementos. Se o Imperador reina soberano sobre a Matéria,
é que ele age sobre sua geração, nascida do casamento do fogo e da Água, combinados
com o Ar e a Terra, como indica a cruz da cosmogenese aqui figurada.
A fixidez que constrói a matéria age sobre esta sem sofrer por meio de reação a
influência dos materiais postos em ação. É preciso que assim seja no interesse do trabalho
construtivo que se realiza na execução de um plano traçado. À necessidade de se afastar
toda intervenção perturbadora obriga o Imperador a não renunciar nunca à proteção de sua
couraça que, no entanto, não o torna insensível, pois que ele traz à altura do peito, a imagem
do Sol e Lua, a fim de indicar que a Razão e a Imaginação iluminam o desenvolvimento de
toda a atividade sadia. O Espírito ou a Consciência que se individualiza para agir, permanece
acessível ao poderoso e divino fulgor solar, assim como às doces claridades lunares do puro
sentimento.
Por oposição a Imperatriz, que se apresenta de frente, o Imperador é desenhado de
perfil. Seus traços são enérgicos; seus olhos profundos abrigam-se sob espessas
sobrancelhas, negras como a barba. O colar imperial é uma trança que também representa a
justiça. É um emblema de ordem rigorosa, de coordenação e de encadeamento metódico, e
ao mesmo tempo de solidez. Semelhante laço não se rompe, nem se desfaz; os
compromissos tomados pelo Imperador têm de ser executados, tal como as decisões lógicas
e motivadas da Justiça. O vermelho que domina, nas vestes do Imperador, relaciona-se com
o fogo estimulador que ele governa e dirige a fim de animar e vivificar. Esse papel vivificador
justifica o verde que aparece nas mangas do costume imperial. Aos braços que agem
provocando as manifestações da vida,convém, com efeito, a cor da folhagem. Aos pés do
dispensador da energia abre-se a tulipa que se anuncia no Mágico (Arcano Um), em estado
de botão. Essa flor terá ultrapassado sua fase de desabrochamento quando a Temperança
impedir-lhe de fenecer.
O Arcano não poderia ser representado de maneira mais adequada na esfera celeste
do que por Hércules, revestido com a pele de Leão de Nemeia – armado com a sua funda e
munido de um ramo carregado de maçãs de ouro do Jardim das Hespérides. Esses são os
frutos do saber iniciático. São conquistados com muita luta e recompensam os heróis que
cumprem os doze trabalhos, os adeptos devotados à Grande Obra.
Ora, o Imperador não é outro senão o operário que se eleva ao supremo grau, porque
Ele sabe trabalhar executando o plano do Grande Arquiteto do Universo, cujo emblema é um
olho no centro de radioso triângulo.

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ARCANO 5

Nome vulgar: O PAPA


Nome segundo Cagliostro: INSPIRAÇÃO
Nome segundo São Germano: PUREZA
Nome segundo o Anjo da Palavra: O PODER ELIGIOSO SEPARADO DO TEMPORAL

À quinta lâmina do Taro corresponde ao 5 dos algarismos arábicos. Nas línguas


semitas equivale ao HÉ, que dá a idéia de Vida e respiração, isto é, a Vida expressa por
Hálito vivificador e sustentador dos Mundos e das formas viventes. É o fluxo de vida
espiritual, amimando todos os planos da Natureza, quer sejam considerados orgânicos ou
inorgânicos, desde o átomo até o ser mais sutil.
O Hálito é o viático através do qual a Vida Una se manifesta.
Diz a tradição: “quando exala o sopro, que sai das narinas de Brahma, do Eterno e do
Supremo Arquiteto, formam-se os Universos, mas quando Ele inala este sopro, os Universos
desaparecem no seio da Divindade.
Este Arcano expressa o pulsar rítmico da natureza. No mundo humano é a inteligência
ligada ao domínio do Hálito, por conseguinte, da Respiração, do Pranaiama etc.
A realização interna desse Arcano, pelo discípulo, possibilita-lhe a compreensão das
cousas abstratas, da metafísica e das Leis de natureza subjetiva. O neófito amplia
grandemente a consciência psíquica. Equilibra, perfeitamente, a ação da super-emoção com
a supra-inteligência, dando ao humano ser a capacidade de assimilar a Sabedoria
transcendental e divina. Aumenta-lhe o poder de radiação volitiva. A humana criatura fica
sabendo sentir e querer as coisas de maneira decisiva e positiva. O fato de saber cumprir o
dever, como se fora um código de moral, passa a ser um elemento integrante da
personalidade, da vida.
Expressa, ainda, o conteúdo das formas ou seja da essência que as anima. É, por
assim dizer, a Quinta Essência Divina concebível por nossa Mente, embora seja
imperceptível. É pois, o dom com que os Homens dominarão qualquer dimensão.
Cagliostro dava a esse Arcano o sentido de Inspiração, o poder inspirador, a
capacidade de iniciar as criaturas. São Germano considerava-o como o paradigma da
pureza. O Livro de nome Anjo da Palavra dignifica-o com o sábio conceito de O Poder
Religioso separado do Poder Temporal.
Os Regentes dos movimentos Religiosos, os sacerdotes, assim como o Papa, deviam
ter uma formação iniciática, a fim de serem os Conselheiros Espirituais dos Reis,
Governadores e Estadistas. De modo que estes, se fossem bem formados iniciaticamente,
não cometeriam atos prejudiciais à evolução física e psíquica dos povos.
Analisando este Arcano sob o ponto de vista prático, verificamos que seu sentido
objetivo está perfeitamente na função sacerdotal. A função sacerdotal, sempre foi ligada
diretamente ao Poder Espiritual. Esta função, no Rigor da Palavra, não deve ter um sentido
religioso, senão objetivo. Na ciência Sagrada, os Sacerdotes tinham como escopo condensar
a energia espiritual. Por isso cabe a esta casta a delicada missão de iniciar as humanas
criaturas. Infelizmente esta, nos dias de hoje, está bastante desviada do eixo verdadeiro.
Vimos, no Arcano anterior, que o Imperador dirige e orienta as forças objetivas, a vida
material etc., enquanto que o Papa o faz com as forças subjetivas, invisíveis ou espirituais.
Se o Imperador cogita da manutenção da vida física dos povos, o Papa do mesmo modo
atende à vida psíquica, anímica ou emocional dos mesmos. O primeiro deve cuidar do
desenvolvimento da Consciência física da humanidade (cultura, arte, agricultura, indústria,
comércio), enquanto que o segundo deve trabalhar no sentido de fixar nas criaturas a
Consciência Psíquica (o desenvolvimento da emoção e inteligência superiores).
Com justa razão a língua portuguesa qualifica o Sumo-Sacerdote com o nome de
Pontífice, no sentido de ponte, ou seja a suprema ligação entre o Universo e os Deuses,
entre os Deuses e os Homens, entre o Céu e a Terra.

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De modo que os Sacerdotes, através da liturgia, devem proporcionar ambiência própria
para que haja, nas humanas criaturas, a manifestação da Consciência Espiritual. No antigo
Egito, os Sacerdotes eram denominados Hierofantes. Procuravam fazer despertar na
coletividade a Consciência Superior.
Neste Arcano 5, vamos encontrar o Hierofante entre duas Colunas ou os dois Ministros.
O que fica à direita representa a liberdade e o da esquerda a trama do destino.
O Hierofante do centro, simboliza Jivamukta, aquele que se libertou dos liames que o
prendiam ao Mundo das Causas e dos efeitos, porque passou a agir sem se ligar às suas
ações. É a humana criatura caminhando para a liberdade Absoluta.
O Papa, o Hierofante ou Jivamukta são os que dominaram o Hálito Divino e,
consequentemente, todas as dimensões. Aqueles que conquistaram a libertação espiritual.
São possuidores de dons, com os quais poderão orientar os homens através dos três
caminhos: da Ação, da Pureza e do Conhecimento, (Karma, Bakti e Jnana Ioga). O
desenvolvimento progressivo da Vontade pelo trabalho, ação, peregrinação etc., da
Inteligência pela instrução e conhecimento das Leis Divinas e da Emoção pela educação da
sensibilidade em todos os aspectos. Os caminhos da Ação e do Conhecimento,
naturalmente, farão surgir o da Pureza, como uma conseqüência do trabalho dos dois
anteriores.
O sábio e cabalista Oswald Wirth apresentou esta lâmina com o seguinte sentido: “O
Pontífice de rosto jovial e ameno, faces rosadas, é, por certo, pleno de indulgência para com
as fraquezas humanas. Compreende tudo, pois que nada escapa ao olhar sereno daqueles
olhos azuis sombreados por espessas sobrancelhas brancas. Uma curta barba branca,
cuidadosamente aparada, indica aliás, a idade em que as paixões serenadas deixam à
inteligência toda a lucidez, a fim de permitir-lhe resolver, sem hesitação, os mais complexos
problemas.”
Compete ao Papa responder às angustiosas perguntas dos crentes. Dogmatizando, ele
fixa as crenças e formula o ensino religioso, que visa às duas categorias de fiéis
representadas pelas duas personagens ajoelhadas perante o trono papal. Uma estende os
braços e ergue a cabeça, como que a dizer: “eu compreendi” o outro inclina a fronte sobre as
mãos unidas e aceita o dogma com humildade, convencido de sua incompetência em
matéria espiritual. O primeiro é ativo no domínio da fé, preocupa-se com o que é crível e não
aceita cegamente a doutrina ensinada. Não ousa, porém, romper com a crença geral e se
esforça por adaptá-la às luzes de seu espírito. Assim desdobra-se uma larga fé, da qual
devia poder aproveitar-se a autoridade dogmática, a fim de ampliar aos poucos o ensino
tradicional.
Os que governam as Igrejas temem, infelizmente, os crentes ávidos de luz, preferindo
as ovelhas submissas, dispostas a se inclinarem passivamente. Por isso sofre a fé, pois que
fica paralisada do seu lado direito, lado ativo e vivificante, representado por um dos dois
degraus da cátedra do conhecimento supremo. Apoiado apenas no degrau esquerdo, o
ensino claudica. Sentado entre duas Colunas e dirigindo-se a ouvintes de mentalidades
opostas, o Papa é chamado a conciliar um quaternário de antagonismos conjugados.
Mantendo o justo meio entre a tradição da direita (teólogo racional) e as exigências da
esquerda (sentimento das almas piedosas), o Soberano Pontífice adapta a ciência religiosa
às necessidades dos humildes crentes.
É preciso também tornar acessíveis aos simples as mais altas verdades, daí sua
posição central em relação ao Quatro (direita e esquerda, alto e baixo) ele representa a Rosa
desabrochada no meio da Cruz, flor idêntica a Estrela flamígera dos Maçons, que é o
Pentagrama.
O Papa deve entrar em comunhão com todos aqueles que pensam e sentem
religiosamente, a fim de atrair sobre ele a luz do Espírito Santo, porque a divina bondade
reparte generosamente esta luz entre as inteligências que buscam o Verdadeiro e as almas
acessíveis aos impulsos de um amor desinteressado. Aquele que formula o ensinamento
supremo torna-se receptivo torna-se receptivo às claridades difusas do ambiente, e, pelo fato
de concentrá-las, transforma-se em farol radioso, urbi et orbi. É quando se ilumina a Igreja
intelectual e moralmente, à maneira da estrela dos sábios que refulge no centro do Templo

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maçônico. O número cinco é, aliás, o do Homem, visto como o mediador entre o Deus e o
Universo. Uma figura humana que se inscreve no Pentagrama, porque a cabeça domina os
quatro membros, tal como o espírito comanda o quaternário dos elementos.
O Papa usa luvas brancas, a fim de indicar que suas mãos permanecem puras e jamais
se maculam ao contacto dos negócios temporais. Elas estão marcadas cada uma com uma
cruz azul, cor da alma e da fidelidade, porque a ação do Soberano Pontífice é
exclusivamente espiritual, mas é exercida sobre três planos, como sugerem as três traves da
Cruz Pontifical. Podemos também interpretar as luvas como se fossem um elemento protetor
e revelador das verdades inscritas na palma das mãos. A cruz simboliza os quatro princípios
inferiores, a matéria, a personalidade, enquanto que as mãos fechadas estão protegendo o
futuro, as revelações, as verdades que estão gravadas nas suas linhas.
Se na tiara se reflete a suprema autoridade do Papa, o cetro do seu poder espiritual é
uma cruz de tríplices braços. Do ternário engendra-se aqui um setenário formado pelas
terminações arredondadas, dos braços e do cume da cruz. Ora, sete é número da harmonia,
também o das causas que regem o Mundo; estas correspondem às influências planetárias
ou às sete notas da escala humana. Ao Papa pertence governar, opondo-se às outras
tendências inatas do homem, a fim de equilibrarem-se as mesmas harmonicamente, para
que nenhuma degenere em vícios.

DISCERNIMENTO

Razão Imaginação

Energia Ativa Sentimento

Generosidade Restrição

Esta cruz pontifical lembra, também, a árvore sephirotal.


As três tiaras simbolizam os três planos superiores ou os três mundos divinos
(Tronos Divinos). Nenhuma figura da esfera celeste poderia ser diretamente assimilada ao
Papa, mas Ele recorda o Grão Sacerdote de Júpiter-Amon, o Deus de cabeça de carneiro.
Acreditamos, pois, em poder fazer compreender o Arcano 5 ao Carneiro Zodiacal, que
assinala o equinócio da primavera, signo do fogo e da exaltação do Sol.
O fogo referido é o da Vida e da Inteligência, o antigo Agni, que baixava do céu para
acender-se no centro da cruz védica.

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ARCANO 6

Nome vulgar: O AMOROSO


Nome segundo Cagliostro: PROVA
Nome segundo São Germano: SIMILITUDE
Nome segundo o Anjo da Palavra: A UNIÃO E DESUNIÂO DOS DOIS PODERES OU
PONTE QUE SEPARA UM MUNDO DO OUTRO. O MUNDO DAS ÁGUAS

A lâmina 6 é denominada exotéricamente de O Amoroso.


No alfabeto hebraico, está relacionado com o Vau ou Vaf. Expressa a determinação
dos atos como liberdade, escolha, sentimento. É a atmosfera volitiva, o voto formulado e o
desejo.
O Arcano 6 é o “Vau” – O Namorado, (Touro). É simbolizado por um jovem que se acha
indeciso entre dois caminhos, representados pelas duas mulheres que o ladeiam – o
Caminho do bem e o do mal.
O Amaor Universal e o humano, a razão e a paixão, a vontade e a vaidade, o bom
senso e a presunção. Nesta lâmina apresenta-se um homem que hesita entre dois caminhos
ou dois amores. Indeciso, pela bifurcação, não sabe se acompanha a mulher graciosa ou a
criatura simples que talvez seja a sua verdadeira companheira. Permanece como que à
espera de uma inspiração superior que é alegorizada pela ígnea seta de Eros, que, como
vemos, procura mostrar-lhe o Caminho Verdadeiro – a mulher simples e maternal, e, não a
outra que é apenas um emblema da luxúria, da ilusão e da matéria.
Este Arcano expressa a prova em todos os planos da Natureza.

Mundo Divino:
O Arcano seis representa o equilíbrio perfeito.
A vontade expressa na Terra como inteligência, como fruto que deve guiar, mostrar o
que é real, dar a verdadeira Razão.

Mundo Humano:
É a Lei que se manifesta como organização, reunião, comunhão, decisão e afirmação.

Mundo infernal:
Formação de uma nova Natureza. É o emblema do ouvido e do olho.
São os órgãos por meio dos quais temos conhecimento do mundo objetivo. Expressa o
órgão sintético que nos põe em contato com o meio externo. As parcas gregas teciam,
fiavam e cortavam o fio da trama da vida. Tomando por base os emblemas desse arcano,
teremos a certeza da Idéia de que do bem surgirá o bem e que do mal medrará a semente
ruim.
Se tomarmos um objetivo, este nos dará a impressão agradável, ligando-nos ao mesmo
tempo com o que vai formar pouco a pouco a Consciência no homem.
A Vontade emitida por nossa Consciência Superior, com o voto formado no mundo
objetivo, nos vai permitir gerar o apego à vida (Tanha).
Há três formas de apego: físico, emotivo e mental.
O apego nesses três ângulos constitui as escandas ou tendências que dão origem ao
caráter do Homem. Budha foi um dos primeiros a investigar esse aspecto da Vida. Esse
apego desenvolve cada vez mais os sentidos e vai originando a consciência física, através
dessas impressões, isto é, faz com que o Homem aumente seu amor à vida, quer seja numa
sensação agradável, quer seja desagradável, prazer ou dor etc.
O verdadeiro sábio é o que não se preocupa nem com o prazer nem com a dor, para
isso procura o caminho da liberdade,
No Taro de Cagliostro este arcano é denominado de prova, no de São Germano, de
Similitude (semelhança), enquanto que no Livro do Anjo da Palavra está escrito com o
seguinte sentido: União e desunião dos três poderes ou a ponte que separa um mundo do
outro, o Mundo das Águas, etc.

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Consoante o sentido dado a esse Arcano pelo Venerável Cagliostro, está muito bem
condensado na palavra prova.
No aspecto iniciático, o que é prova? Quando se inicia a ascensão dos discípulos na
escala evolucional, começa a se criar uma série de circunstâncias em torno de suas vidas,
de modo que os discípulos vão sendo experimentados em seus vários ângulos.
Com as experiências surgidas através das ditas provas vão se enriquecendo as Almas
humanas, até se transformarem em Espírito. Enquanto os discípulos não passam por tais
provas, constituem uma grande interrogação para os seus Mestres. O apego, como
dissemos, apresenta três naturezas: física, emotiva e mental, logo, as provas ou
experimentações a que somos submetidos são também de três naturezas. Elas se
processam no consciente, no subconsciente e no supra-consciente. Muitas vezes duvidamos
do que vemos com os olhos físicos, do que sentimos e do que surge na nossa imaginação.
A Iniciação se processa em torno da Vida psicológica dos discípulos, agindo, por
conseguinte no campo emocional e mental dos mesmos.
A alegoria do arcano 6 ilustra exatamente o mecanismo do ato voluntário da
personalidade consciente, figurada pelo Enamorado que é o Homem ou Desejo de Cláudio
Saint Martin.
A Personalidade consciente recebe as impressões do mundo físico, graças à sua
sensibilidade, depois reage. Ora, como, não se trata de atos inconscientes ou automáticos
(reflexos), há deliberação, escolha antes da execução do ato decidido. A determinação é
aguardada por Cupido que reúne acima de nós toda energia volitiva da qual podemos dispor.
Ele lança a seta com mais ou menos força, segundo vislumbre o sinal, ou melhor, desde que
queiramos decididamente. Mas se dispersarmos inconsideradamente nossa vontade,
contrariando o que nos ensina o Arcano 5, não serão poderosas as nossas volições.
A Natureza do Homem, sob certo aspecto, é dupla ou dual: uma superior, divina, e a
outra inferior, animal.
Um discípulo deseja adquirir conhecimento eubiótico, visando à Iniciação; é uma alta
força – desejo – uma aspiração da alma em prol de seu aperfeiçoamento, e que, partindo do
Mental Superior, invoca em seu auxílio o patrimônio da Vontade que, se por um lado
desprende força – potência – na ação ativa para a realização da obra, por outro ganha
sobejamente, dinamizando-se com sopitar as baixas forças, desejos, atraindo-as com a força
resistência que ele oferece, até despojá-las de toda energia que as animava – energia que
“in totum” absorve e assimila. Pelo que aí está, a um desejo se opõe outro.
Ao discípulo cabe ter sempre em vista o seguinte: a natureza emocional, devidamente
dirigida e governada, é um dos mais poderosos meios de influência psíquica que o Homem
dispõe. É de grande importância a ação da Lei do “ritmo” (Hermés) e da condensação
(“ibdem”) no domínio das emoções lunares. Pelo emprego da Vontade, pode o homem
neutralizar o ritmo emocional, colocar-se no ponto de equilíbrio entre os dois extremos.
O ideal da eficiência emotiva ou domínio das emoções traz muito dos princípios
essenciais das antigas escolas chamadas epicurismo e estoicismo.
Considerações importantes: Nunca esqueçamos que todos os nossos esforços com
objetivo positivo encontram resistência oposta por um obstáculo, o “demônio” de que falam
as religiões. Toda voz de desânimo, todo impulso de fraqueza, de covardia, desejo de não
fazer os exercícios de meditação etc., são de origem do que é contra nós em nós
(subconsciente). E devemos desde logo denunciar aos nossos próprios olhos tais fraquezas,
e, desprezando-as, cumprir o nosso dever, com o júbilo de quem cumpre uma grande
obrigação que na verdade o é.
Repelir a desmoralização do maligno. Opor-lhe a nossa resolução e, com dignidade e
confiança em nós mesmos prosseguir.
Toda experiência é, por si mesma, proveitosa, quando acertadamente compreendida e,
às vezes convém mesmo sofrer as dores que ela nos acarreta, para que nos sirva de lição
para o futuro (consciente).

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ARCANO 7

Nome vulgar: O CARRO


Nome segundo Cagliostro: VITÓRIA
Nome segundo São Germano: A ESFINGE
Nome segundo o Anjo da Palavra: SUBLIMAÇÃO DA QUEDA.
VITÓRIA DO 2º MUNDO.
A INFLUÊNCIA DOS AVATARAS.

O Arcano Sete, que corresponde, no alfabeto hebraico, à letra ZAIN, em alguns tarôs, é
denominado de Vitória e noutros, o Carro.
É expresso, como vêem, por um Carro puxado por duas Esfinges: Uma preta (à
esquerda) e outra branca (à direita). À frente, de pé, no comando do Carro está um jovem
Rei envergando sua armadura e empunhando um cetro na dextra. Pendentes do pálio, 4
sanefas de cor azul, com 12 estrelas douradas. Na parte da frente do referido Carro, estão
aplicadas asas ligadas a um círculo, encimando duas serpentes erguidas em forma de
parênteses, em cujo centro há uma chama.
Este Arcano dá lugar a várias interpretações, mas, dentro das possibilidades, vamos
procurar a que esteja mais consentânea com a História de nossa Obra.
O Carro simboliza o Viático da evolução da Mônada, através das grandes e pequenas
etapas ou ciclos: por conseguinte, de todos aqueles que conquistaram o Sétimo Princípio – o
Princípio Crístico.
No Arcano Seis, vimos o jovem hesitante entre duas mulheres de tipos diferentes: uma
mundana e outra nobre. Se ele não pendesse para nenhuma delas, símbolo dos dois
aspectos emocionais, poderia tomar o Carro da Evolução, de vez que não foi atingido pela
Seta de Cupido, conquistando a Vitória do Sétimo Princípio.
Passemos a analisar o Arcano, tal como está desenhado, no quadro colorido. Usando
uma Chave absolutamente oculta, vemos que esse Arcano alegoriza os Mistérios do
Segundo Trono ou Mundo Celeste. Vemos nele, ainda, os poderes celestiais agindo nos
mundos da matéria.
O Carro representa os Sistemas, os Globos, os Mundos e tudo o que está em evolução.
Arrastado por duas Esfinges, como foi dito: a preta representa o 5º e a branca, o 6º Luzeiro.
Este assunto expressa a Lei de Polaridade agindo através dos Luzeiros.
O pálio simboliza a abóbada celeste, no qual se relaciona, se refletem as 12
constelações denominadas de Signos do Zodíaco, a Mãe Divina com seus 12 Mensageiros,
os 12 Profetas ou Iocanans etc.
A propósito, as tradições orientais fazem referência a certo Livro sagrado e misterioso
que, em determinadas transformações cíclicas, se transporta de um lado para outro. Quando
o Rei do Mundo aparecia na Terra, também, teve seu carro puxado por elefantes brancos, e
esse famoso Livro voava, pousando sobre seu carro à guisa de Pálio...
Quando alguém, originariamente ligado à nossa Obra, foi subterraneamente à cidade
Jina de Caijah, no dia 9 de setembro de 1942, o Carro, que o conduziu àquele Santo Lugar,
teve como pálio o citado Livro. Seu nome é Kâmapa.
Kama na língua sânscrita quer dizer Desejo, emoção, corpo emocional, etc. Mapa em
nossa língua tem o sentido de carta geográfica, relação, lista, catálogo etc. Juntando essas
palavras de idiomas diferentes como se fora a fusão do Oriente com o Ocidente, temos o
primeiro nome Kâmapa. Sem forçarmos a interpretação, podemos dar-lhe a seguinte
acepção:
Kâmapa é o Livro Sagrado onde estão sendo catalogadas, ou escritas em letras de
Fogo, as experiências boas ou más, das vestes emocionais dos 5º e 6º Luzeiros. Nele
também, estão desenhados os mapas dos ciclos, Cadeias, Planos e Globos do nosso
Sistema de Evolução.
Kâmapa é, portanto, o Livro da História, resenha do preparo da humanidade do 5º
Sistema, no plano mais denso da matéria.

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O Jovem expressa o Sétimo senhor, ligado ao Oitavo ou seja ao Eterno, Maitréia, o
Senhor dos Três Mundos etc.
As esfinges preta e branca ou azul e amarela, vermelha e verde são as almas humanas
(princípios emocionais) dos referidos 5º e 6º Luzeiros, respectivamente. A da esquerda está
alegorizada pela cor preta, a da direita pela cor branca. A da esquerda está alegorizada pela
cor preta devido à queda da hierarquia dos Assuras no final do 3º Sistema, prejudicando,
assim, o advento do 4º. A Lei atrelou-as ao Carro, de modo que a esfinge branca pudesse
redimir, no aspecto emocional, a sua parelha.
Todo esse trabalho de redenção foi levado a efeito pela chama inscrita na figura
desenhada na frente do Carro, sob os pés do jovem Rei.
Esta chama, emanada pela Boca do Eterno, veio se cristalizar no seio da Terra, através
dos eletrizantes fios de Sua Barba.
Contemplam a referida chama e erguem-se em direção ao jovem Rei duas serpentes
ou Gêmeos, guardiães do Fogo. Acima estão as asas, unidas pelo círculo, simbolizando a
Pomba do Espírito Santo.
Todo o trabalho do Eterno. Realizado através do 6º Luzeiro, a fim de redimir a parte
emocional ou humana do 5º Luzeiro, está sintetizado na Ordem do Santo Graal, que se
bifurcará, no futuro, em Templários e Tributários.
O jovem Rei, usa, também, dragonas em forma de crescente lunar, com fisionomia
humana. Estas dragonas representam na parte superior, a alma universal ou Consciência
Celestial dos referidos Luzeiros, enquanto que, conforme já dissemos, a parte emocional dos
mesmos é antípoda. É o mesmo que os Espíritos, expressos pelas dragonas, estão voltados
para o Céu, para a Lei, enquanto que os Corpos humanizados, a parte emocional, estão na
Terra puxando o Carro do Sétimo – do Eterno.
Carro de Osíris é como expressão da Vitória da Vontade sobre a matéria grosseira,
onde a Vontade se plasma para formar os seres e os Sete Mundos ou Planos. Segundo
Cagliostro, este Arcano possui a denominação de Vitória. Conforme o Anjo da Palavra, este
Arcano tem o sentido de Sublimação da Queda – Vitória do 2º Trono – a Influência dos
Avataras. Para que a Obra conquiste a Vitória de Deus, ou do 2º Trono, ela precisa realizar,
na face da Terra, como algo semelhante ao 2º Trono, ela precisa naturalmente atingir justas
conquistas correspondentes aos Poderes Celestes. Quais são os poderes celestes? –
Vamos usar a chave numérica, a fim de obter a resposta: Os cabalistas consideram, como
Supremo Poder Criador, a expressão representada pelo Olho com 12 pestanas, doze mais
um igual a 13. Num plano mais abaixo, encontramos as 7 Grandes Hierarquias que, no seu
conjunto, formam a Hierarquia do Raio Divino. Estas 7 Hierarquias têm ação dupla, isto é,
polarizam-se para a criação do Mundo Manifestado. Logo, elas possuem valor duplo, uma
face voltada para a Terra e outra voltada para o Céu.
Com esta duplicidade, as hierarquias têm o valor igual a 14 (7 x 2).
Dando ao número 14 o seu valor hierárquico verificamos que, agindo em 7 planos
diferentes, representam um produto igual a 98 (14 x 7).
Acrescentando a este produto o valor numérico do Supremo Criador, vamos encontrar,
então, o número 111 (98 + 13). O número 111 é padronímico como símbolo de uma unidade
Divina. Exemplo: Um Sistema de Evolução possui 7 vezes o número 111 = 777. A Grande
Fraternidade Branca é constituída de 7 setores, possuindo cada Setor 111 Dirigentes; uma
Mônada em cada sub-raça encarna 111 vezes. Numa Raça-Mãe ela precisa ter o valor de
777 encarnações.
Finalmente. A Obra para atingir a Vitória, semelhante ao 2º Trono, terá que reunir um
grupo de 777 almas, ou seja, 7 Grupos de 111, como vitória do 2º Trono. Ela sofre influência
avatárica e esse número 777 possui a direção de 111 formas duais ou 222 seres, mais os
Gêmeos Espirituais, ou os Andróginos em separado (777 + 222 + 2 = 1001).
Este número – 1001 (almas) – corresponde a Esfinge branca e de 1002, em diante à
Esfinge preta).

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ARCANO 8

Nome vulgar: A JUSTIÇA


Nome segundo Cagliostro: A JUSTIÇA
Nome segundo São Germano: A LIBERTAÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: LUTA DA CEGUEIRA
CONTRA A ILUMINAÇÃO.
LUSBEL CONTRA AKBEL

A Lâmina 8, o HETH, é representada por um campo lavrado. Os cabalistas ligam-na à


letra Heth, que na nossa linguagem não há nenhuma que a ela corresponda, embora possa
ser representada pelo CH áspero, dos alemães, à idéia de esforço, trabalho, posto que os
homens só podem conquistar o pão de cada dia com o suor do rosto.
Como foi dito, o Heth expressa a idéia de trabalho e esforço para um equilíbrio com o
trabalho destrutivo da Natureza. As forças naturais têm a tendência de arruinar o trabalho
dos homens. A natureza, em face do Homem, parece ter o papel de criar, a cada momento
obstáculos. Ela age, pois, como um Poder transformador. O homem que quer manter seu
trabalho, está sempre lutando com a Natureza, porque ela está sempre contra ele. O homem
luta; e a natureza, como um obstáculo, arruína sua obra, seu esforço, etc. São as fortes
chuvas, as pragas, o sol causticante, as geadas, enfim, vários fatores surgem para dificultar
o trabalho humano.
Da luta do homem para conservar o fruto do seu esforço, e da luta da natureza no seu
afã de a tudo transformar, nasce o equilíbrio que os cabalistas representam pelo Arcano 8, o
Heth.
Esta lâmina nos dá a idéia do equilíbrio entre as Forças Criadoras do Homem e as
Forças Transformadoras da Natureza, o que está muito bem simbolizado pela Justiça – uma
mulher sentada num trono, com uma espada do lado esquerdo, e segurando uma balança do
lado direito. Esta lâmina é muito curiosa porque nos mostra bem a idéia fundamental do
equilíbrio entre as forças da criação e as da destruição.
A VIDA É A VIDA. Devemos vivê-la na sua integridade real, no entrechoque das suas
exigências, e na multiplicidade dos seus interesses.
Do equilíbrio entre o esforço do homem e os obstáculos naturais da vida, forma-se o
destino de cada um. Para manter-se essa balança em equilíbrio, pratica-se ações boas e
más. As boas denominamo-las de bem, e as más, de mal. Isso nada mais é do que uma
reação do meio em que vivemos. Podemos ser corretos, bondosos, honestos, ou então
deixarmo-nos dominar pelo egoísmo, não nos preocupando em esmagar os outros para
sobrevivermos.
Gozamos ou sofremos a vida de inteiro e perfeito acordo com o grau dos nossos
próprios acertos ou erros. A Lei é assim; uma só para todos. Cabe-nos conhecê-la para bem
aplicá-la.
Do desequilíbrio nasce o sofrimento, o castigo, a infelicidade e a desgraça. Convém
observar o sentido da palavra castigo, como lei de retribuição justa e perfeita, de acordo com
os atos praticados. É a justiça natural, muito bem simbolizada pela Balança, e pela Espada.
A Balança, para medir os erros; e a Espada, para castigar ou justiçar. Se o Homem pratica o
bem, recebe como prêmio o fruto de seu esforço; se pratica o mal, recebe o merecido
castigo. É a justiça que se manifesta; e por isso dizemos muitas vezes, esquecidos dos erros
cometidos, que “Deus nos abandonou”, que “não somos mais filhos de Deus” etc., quando,
apenas, este sofrimento, este castigo, é o resultado das nossas ações, sentimentos e
pensamentos.
Quase sempre sofremos sem saber por que (amnésia). Ora, temos uma consciência
elástica, uma consciência que procura justificar as nossas ações. Aí dizemos: “fiz isto, mas
não foi por mal”, “fiz aquilo, mas não por querer”. Procuramos, enfim, nos convencer que
agimos bem, embora no íntimo saibamos do erro cometido. Aquele que não entrever esse
“colóquio consigo mesmo”, parece-nos, já perdeu qualquer vestígio de espiritualidade.

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Nosso Eu Superior sempre nos procura conduzir pelo Caminho da Justiça, a fim de nos
poupar sofrimentos desnecessários, para que não tenhamos de passar por provações. O Eu
Superior é bom conselheiro, mas infelizmente, nós não gostamos de conselheiros, e vamos
sempre fazendo o que nos ditam os nossos desejos inferiores.
Desse nosso procedimento decorrem todas as misérias e amarguras que mais tarde
nos vamos queixar. Neste caso rezamos, fazemos promessas a quantos santos e santas
existem, como se fosse um contrato comercial com a Divindade: “você me dá isso que eu lhe
dou aquilo”...
Essa idéia de justiça retribuitiva da Lei de Carma ou de causa e efeito, é representada
pelo Arcano Oito, A JUSTIÇA. É sem dúvida a Justiça não dependente dos homens, mas
sim aquela Justiça a que se referiu o Padre Vieira num dos seus sermões: “temos a Justiça
dos homens, mas não a se Deus”.

Interpretação dessa lâmina nos três mundos:

NO MUNDO DIVINO – (segundo os cabalistas): O Arcano Oito expressa a Lei Universal.


NO MUNDO HUMANO - é a JUSTIÇA.
NO MUNDO INFERIOR – são as forças compensadoras da natureza.

Os antigos representavam a Justiça por uma Mulher, e há uma razão oculta e profana
para tal.
Como Princípio Universal, a JUSTIÇA é uma força feminina – SHAKTI, tal como dizem
os orientais. Sobre o aspecto oculto, isto poderia ser encarado de outro modo.
As mulheres têm a faculdade natural de desenvolver determinadas energias universais,
as quais estão ligadas a um Princípio Cósmico.
Possuem o poder de ativar a Vontade do Eterno, de plasmar a vida e a Consciência
Universal.
As mães já nascem com o potencial dos filhos que vão oferecer a Divindade, a fim de
seus veículos serem habitados ou dirigidos por Consciências Superiores. As mulheres,
cabalisticamente, possuem o valor 10, ou seja, o valor da Roda da Fortuna, o YOD.
Se, fisicamente, geram os corpos físicos das humanas criaturas, assim também
psiquicamente, concorrem para fixar a Consciência nos Homens.
Representam as diletas filhas da Mãe Divina, e como tal plasmadoras das formas ou
expressões físicas do que fora ideado no Mundo Subjetivo.
Os antigos sempre escolhiam um grupo de mulheres privilegiadas pela sua pureza,
para as funções de Sacerdotisas ou de Hierofantes, as quais guardavam o Fogo Sagrado,
possuindo também funções ocultas e espirituais: as de Vestais dos romanos.
Estas mulheres, com o tempo, acabavam se transformando em verdadeiros veículos de
Inteligência Cósmica. São as famosas pitonisas, primorosos oráculos. Na Grécia, Egito,
Pérsia, havia uma organização, um grupo de pitonisas, que eram capazes de saber coisas
que os demais mortais não tinham conhecimentos.
Viam elas o futuro das criaturas. Estas pitonisas, junto da trípode, e respirando energias
trescalantes provindas do fundo de uma gruta, entravam num estado particular (êxtase), e
diziam-se possuídas de um poder celeste que na Grécia era o Deus Apolo.
Os Oráculos de Delfos são famosos. Creso, certa vez, resolveu tirar a limpo essa
questão de oráculos. Reuniu um grupo de homens, mandando-os para os lugares onde havia
os principais oráculos do mundo, para que, num dia previamente marcado, eles dissessem o
que ele estava pensando naquele momento. O mensageiro que chegou a Delfos ficou
surpreso quando a pitonisa, na hora marcada, disse: “Eu que sei quantos grãos de areia
existem no fundo do mar, eu que conheço e posso lhe dizer que, nesta hora, estou sentindo
um cheiro estranho de pele de tartaruga e carneiro cozido, tudo isso tapado de bronze e
envolto em bronze”
O mensageiro de Creso, quando ouviu aquilo, pensou: “esta mulher é louca”.
Quando o grupo regressou e entregou a Creso as respostas, este ficou abismado
diante do que dissera a Pitonisa de Delfos, porque, realmente, na hora aprazada, ele pegara

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um pedaço de tartaruga e carneiro, pusera numa panela de cobre e a tapara, depois de
colocar tudo no fogo.
Desde esse dia, Creso ficou absolutamente certo da arte oracular.
Os oráculos tinham a capacidade de ver as coisas, como, aliás, a história está repleta.
A Grécia foi salva de todas as suas crises pelo Oráculo de Delfos, e Roma, mais uma
vez, foi salva pelas pitonisas e pelos oráculos.
Certa vez os Gauleses invadiram Roma inesperadamente. O Senado reunido, ordenou
que se abrissem os Livros Sibilinos, onde encontraram uma fórmula para evocar os raios
celestes. De posse da referida fórmula, o chefe das Vestais fez cair sobre o exército gaulês
tantos raios, que o fez fugir apavorado.
A JUSTIÇA, segundo a concepção de nossa Escola Iniciática, outra coisa não é senão
as matemáticas em ação, em aplicação, como muito bem disse Berthault Gras, citado por
Lacuria, em “As Harmonias de Ser Reveladas pelos Números”.
A ciência real dedutiva, ensina a realizar a ordem; põe cada coisa em seu lugar,
assegurando assim a estabilidade e o equilíbrio.
Pode-se, ainda, ligar o Arcano Oito à idéia de sabedoria conservadora, administrativa e
governamental.
Agora sabeis, então, que é a verdadeira sabedoria espiritual que faz a pessoa viver
constantemente em alegria, procurar só o lado bom e belo das coisas, e receber tudo com
espírito magnético construtivo.
É ela que dá tempo ao tempo...

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ARCANO 9

Nome vulgar: O ERMITÃO


Nome segundo Cagliostro: PRUDÊNCIA
Nome segundo São Germano: PROTEÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: A SABEDORIA E A SANTIDADE COMO
REDENÇÃO DA TERRA (VITÓRIA DOS JIVAS)

O Arcano Nove corresponde, no alfabeto hebraico, à letra TETH ou ao nosso T e ao


número nove. Esse Arcano é simbolizado pelo Ermitão. É um ancião vestido com um burel,
amparado num bastão de sete nós, trazendo na mão direita, encoberto pelas dobras da
túnica, uma lâmpada acesa.
Significando o que nós chamamos de Adepto, o Homem Perfeito, o Iluminado ou em
outras palavras o que se torna Justo e Perfeito.
O Bastão do viandante era a representação simbólica e alegórica da Coluna Vertebral.
Há uma razão para esse simbolismo, como veremos adiante.
Todos os místicos do oriente, como encontramos nos Tantras, que tratam das forças
que agem nas criaturas videntes e no cosmos, estudam determinados métodos para que o
homem possa despertar, em si, esses poderes naturais.
E a medula tem aí um papel importantíssimo, porque, dizem, por ela passam as três
correntes da vida universal. Essas 3 correntes de Vida Universal passam uma pelo lado
direito da coluna vertebral, outra pelo lado esquerdo e a terceira pelo centro. A energia que
corre pelo lado direito chama-se Píngala. É uma energia solar, positiva, que se caracteriza
pelo poder da vontade, da ação, da atividade, enquanto que a força que corre pelo lado
esquerdo, denominada Ida, é Lunar, negativa, e se caracteriza pela emoção, sentimento etc.
Dessas duas correntes, uma é ativa, o mental, a inteligência, ao passo que a outra é
puramente sensorial, emotiva, psíquica. É uma energia que permite ao homem a
possibilidade de sentir e dar forma à imaginação.
Essas duas energias estão em atividade em quase todas as criaturas, ainda que de
modo desarmônico, ora predominando a energia positiva, ora a negativa, que se as conhece
pela respiração, porque da ação destas duas forças sobre o Homem, dizem, decorre o seu
respirar.
Assim, ora nós respiramos pela narina esquerda, ora pela direita. Quando o ar flui
igualmente pelas duas narinas dá-se o nome de Sushumna. O homem sábio, no dizer dos
ióguis, guia a sua ação segundo a respiração se faça pela direita ou pela esquerda, porque
dizem eles, quando corre igualmente, pelas duas narinas, o homem deve abster-se de toda a
ação, visto que será infrutífera.
Num diálogo entre Shiva e sua Shakti, reproduzido de um livro de mistérios orientais,
há uma referência a este assunto, quando diz Aquele: “o Asceta, quando está respirando
igualmente pelas duas narinas, deve pensar em Brahma, procurar se ligar com o Eterno,
meditando naquele Mântran clássico, para a identificação com o Eu Universal, que é: TAT
TWAN ASI (Eu sou Ele). Palavras místicas que tem um sentido particular, quando são
enunciadas com uma certa entonação.
Nessa ocasião é que o homem está apto a pensar na Divindade, e meditar sobre o
mistério do Seu Eu, mas não para trabalhar no Mundo, porque tudo quanto fizer será
infrutífero.
Ora, se assim é, e isso está ligado a medula, que tem uma armação óssea, que é a
coluna vertical, e esta medula tem 7 pontos obturados que não permitem a circulação
daquelas forças, é claro que o bastão de sete nós seria apenas para mobilizar a medula com
os sete pontos denominados nadis. Enquanto o homem não tiver o canal central
completamente livre, a terceira energia que é de natureza puramente espiritual, não poderá
entrar em função. Quando o homem por um processo complicado desperta uma energia que
está adormecida numa região localizada no osso sacro, a energia chamada de Kundaline
Shakti, essa energia ígnea sobe pelo interior da medula e vai rompendo, um a um, estes sete
nós, atingindo a glândula pineal, o terceiro Olho, que se encontra sempre expresso nos

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Deuses-Orientais por um símbolo que se crava na sua fronte. Este Órgão, então, torna-se
ativo.
Abre-se o Olho do Espírito. Para as criaturas que lograram despertar essa força, não há
passado nem futuro. Tudo é um eterno presente. Possuem o Olho do conhecimento.
No Egito, encontramos o mesmo símbolo expresso por uma serpente de ouro que
ornava a coroa dos Faraós. É, por assim dizer, o Olho perfeito que tudo vê e tudo sabe,
porque os antigos sempre ligaram a idéia de perfeição espiritual à idéia do conhecimento. É
o que chamamos de intuição ou iluminação perfeita.
Portanto, não é de estranhar que fosse representado no bordão do Peregrino o
emblema do órgão pelo qual se manifestam os Poderes Superiores da Natureza.
O Ermitão, como Adepto, como Homem perfeito, se apóia nestes poderes; daí, mais
tarde, aproveitaram este bastão, já um pouco modificado, para emblema dos pastores e
bispos, por terem o mesmo sentido de condutores de povos.
Quando a terceira força está ativada, o homem entra num estado espiritual que os
orientais chamam de Samadhi, ou êxtase espiritual. A respiração fica suspensa. O Corpo se
mantém apenas pelo poder interno que o sustém. Por isso os Ióguis podem ficar sem
respirar; o corpo fica com uma rigidez cadavérica; ficam como mortos. E nesse estado
permanecem durante anos e meses. Há alguns que determinam o tempo em que ficarão
nesse estado, findo o qual despertam e o corpo volta às funções normais. Pelo poder que
eles possuem, conseguem concentrar a vida no coração, porque, dizem os tratados místicos,
a vida reside na ponta do coração a que denominamos a Cidade de Deus – Brahmã-Pura. A
vida aí cintila como se fosse um diamante, de um brilho deslumbrante, tão pequeno como a
cabeça de um alfinete. Isso pode parecer fantasia, mas quem tem uma idéia clara sobre o
assunto, porque o investigou, sabe que assim é.
Uma criatura exercitada, olhando para um indivíduo que esteja nos seus últimos
instantes de vida, pode ver se efetivamente ele já morreu ou não. Se ele vir um ponto do
tamanho da cabeça de um alfinete, de um brilho intensíssimo, ele sabe que a vida ainda não
o abandonou. Quando se trata de um Ser que já despertou aquela força denominada de
Kundaline, o brilho se torna mais intenso, porque a cidade de Brahma está inundada por
essa força interior.
As tradições místicas de todos os povos sempre procuraram uma idéia mais completa
destas 3 forças. E, assim, no caduceu de Mercúrio, símbolo da medicina, porque era
emblema do Deus dos antigos mistérios gregos, vemos duas serpentes enroladas, uma
branca e uma negra. Isso, porque o médico, para combater a enfermidade, devia realmente
ser iniciado na ciência da vida, Ayur-Veda, devia ser senhor das três forças.
Via-se, primitivamente, na sua parte superior, dos bastões, um crânio humano, o qual
depois foi substituído por uma Taça, na qual bebiam as serpentes para indicar que estas
energias residem no cérebro e quando estão em atividade, em pleno funcionamento, o
homem é um iluminado; é capaz de perceber as causas mais secretas da natureza, porque
tem seus olhos abertos.
Assim, o Ermitão não podia deixar de ter como símbolo um bastão de sete nós, porque
ele é o Adepto perfeito. A luz interior que ele possui é simbolizada pela luz da lanterna
encoberta pelo manto. Do conhecimento transcendente e do domínio perfeito sobre a sua
natureza, nasce a consciência plena do iluminado perfeito, que lhe dá a visibilidade interna
que os antigos traduziam numa única palavra: PRUDÊNCIA, mas a Prudência do sábio. A
prudência de quem conhece as coisas e os efeitos que elas produzem. Daí, ele ser prudente
nos seus atos. Ser comedido nas suas ações. É a prudência nascida da experiência.
O conhecimento perfeito nos dá idéia de abrigo e, por isso, no alfabeto hebraico, é
também o TETH simbolizado por teto da casa. O teto ou abrigo, a proteção, o lugar para
onde se encaminham aqueles que estão em perigo ou que querem fugir das tempestades.
Assim, também o Homem Perfeito pode construir para si um abrigo inviolável.
Portanto, o TETH, o Adepto, o Ermitão, o Iluminado, são emblemas da Vitória espiritual
sobre o que é material. É o Senhor dos Três Mundos. É o Hermés-Trimegisto das tradições
antigas. Hermes, três vezes grande, Senhor dos Mistérios dos Três Mundos. Ele conhece os
segredos dos céus, da terra e dos infernos. Daí o nome de 3 vezes grande.

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Ele é o emblema do Homem Celeste em atividade na Terra. Ele é três vezes essa
atividade nos 3 Mundos. Ele é o vencedor dos 3 Aspectos da natureza.
Senhor de todas as coisas, tudo isso com a idéia de Prudência, no sentido mais
filosófico.

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ARCANO 10

Nome vulgar: A RODA DA FORTUNA


Nome segundo Cagliostro: FORTUNA
Nome segundo São Germano: SUBLIMAÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: O CRIADOR NA CRIATURA.
A INFLUÊNCIA DE DEUS.

A lâmina dez, expressa por uma Roda, simboliza os ciclos evolucionais. Subindo por
um lado da Roda e descendo por outro, encontramos duas figuras muito interessantes
ERMANUBIS e TIFON e em cima da mesma há o emblema da Esfinge. Seu nome
tradicional é “A Roda da Fortuna” e o sentido que encerra é tão exuberante que se fôssemos
desenvolvê-lo como merece, poderíamos ter compêndios de ciências mágicas. Entre os
antigos chineses, persas e outros povos da Ásia Menor e, mesmo, entre as civilizações pré-
colombianas, encontramos algumas referências ao interessante símbolo da Roda. Como
uma das tradições mais profundas da antiga filosofia mística, expressava-se pela Roda não
só o destino, senão o círculo vicioso em que todos nós vivemos e no qual estamos presos
pela Lei regida pelos: nascimentos, mortes e renascimentos. A Roda dos renascimentos e
mortes gira incessantemente nos três Mundos da Ilusão, impulsionada por aquelas duas
forças, representadas por Ermanubis e Tifon e sob a vigilância duma terceira – no alto da
lâmina simbolizada pela Esfinge.
Ermanubis é o DEUS bom, o AGAT dos gregos; o bom GÊNIO que ampara o homem,
dando-lhe uma boa inspiração e levando-o a escolher o caminho do bem. O homem,
geralmente, prefere eleger o caminho que nasce de seus desejos. Parece ser bom, para as
humanas criaturas, aquele caminho que lhes possa satisfazer os desejos e dar-lhes prazer.
A inspiração interior, que leva às sublimes regiões do espírito, é representada pelo pólo
positivo ou superior, por ERMANUBIS.
Tifon expressa o poder obstaculizante: as paixões desencadeadas, de tudo que é
efêmero e material. É o pólo negativo da evolução. O homem é levado, portanto, por estes
dois impulsos: pelos impulsos bestiais (Tifon) e pela inspiração interior (Ermanubis). Quer
praticando o bem, quer praticando o mal, o homem está sempre sujeito a Roda dos
renascimentos. Se pratica o bem, colhe a alegria e paz e, se pratica o mal, colhe a dor, a
tristeza, a tormenta e o sofrimento de toda ordem. Estes opostos são transitórios, porque
filhos são da ilusão. Acima dessa polaridade, apresentada na lâmina 10, há o emblema da
Esfinge com a sua quádrupla expressão: Cabeça de Anjo, flanco de Touro, asa de Águia e
garra de Leão. Essa simbologia da Esfinge é notável porque representa o universo vivente. A
esfinge é, sem dúvida, um símbolo que expressa, sinteticamente, os valores de quatro
Rondas ou Cadeias. As asas da Águia alegorizam a primeira Cadeia (a Hierarquia dos
Assuras). As garras do Leão representam a segunda Cadeia (a Hierarquia dos Agnisvatas),
a cabeça de Anjo, a terceira Cadeia (Hierarquia dos Barishads) e o flanco de Touro, a quarta
Cadeia (a Hierarquia dos Jivas). A Esfinge simboliza, pois, a Unidade, o Andrógino, que se
torna múltiplo através da polaridade, expressa por Ermanubis e Tifon.
Os hebreus ligavam a idéia de bem e mal às nossas ações, sentimentos ou
pensamentos ao IOD, décima letra do alfabeto hebraico a qual corresponde em nossa língua
a letra “J”. O IOD possuía como símbolo hieroglífico um dedo indicador. O dedo indicador aí
aparece como que mostrando aos homens seu destino. Os antigos consideravam o dedo
indicador como uma representação simbólica da autoridade julgadora. Autoridade esta que
se traduz pelo gesto tão comum a todos nós, quando usamos este símbolo para impor nossa
vontade a outrem. Nós, humanas criaturas, geralmente estendemos este dedo indicador
quando precisamos ameaçar e obrigar os outros a fazerem o que queremos de modo um
tanto imperioso. Decorre daí que os quiromantes ligam a esse dedo o signo de Júpiter,
atribuindo-lhe a idéia de posição de comando e de julgamento de um poder imperante.
Convém observar, também, que o dedo indicador que expressa estas idéias tem uma
configuração característica, e as suas falanges possuem determinadas dimensões, ligadas à
matemática oculta. É, sem dúvida, aquela famosa mão que apareceu no Banquete de

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Baltazar, traçando na parede: Mene – Tecel – Phares: pesado, medido e contado, ou seja, “o
destino viu que praticaste o mal e, portanto, o teu fim será desastroso”. Poderemos também
traduzir esta frase com as seguintes palavras: “Contados estão os teus dias, porque as tuas
ações foram pesadas e medidas”.
Os tarôs vulgarizados dão a este arcano o sentido de sorte, ambição, predisposição
para as descobertas e invenções. O IOD está relacionado com o órgão gerador masculino,
razão pela qual é conceituado como o gérmem da vida ou gérmem vital. O arcano 10
representa o principio da Vida, ou seja, a gênese individual ou ainda a semente espiritual da
individualidade que provoca um perpétuo vir a ser. É, pois, o princípio gerador que dá seu
impulso à existência individual. É a Roda da Fortuna, também denominada de Roda dos
Renascimentos, que poderá ser vencida por aqueles que decifrarem os mistérios da Esfinge.
Consoante a orientação que nos legou o Supremo Dirigente da Sociedade Brasileira de
Eubiose, observamos que seu intuito principal foi o de propiciar aos seus discípulos
adquirirem o Poder de “Krya-Shakti”, o dom de criar possuído pelos Homens superiores, ou
seja, a capacidade de criar pelo poder do Pensamento.
Quando ingressamos nas primeiras séries da S.B.E. aprendemos a mentalizar o Globo
Azul com a palavra PAX em amarelo. Com o decorrer do curso vamos praticando as iogas
correspondentes a cada grau.
Qual o efeito prático dessas iogas? Propiciar aos discípulos o desenvolvimento do
Poder de “Kriya-Shakti”.
A princípio, vamos tecendo os nossos veículos superiores com a energia gerada pela
ação dos nossos pensamentos, estimulando os órgãos, nos quais pensamos com uma forma
geométrica, cor característica, som e número.
A tecitura desses veículos superiores nos permite sair fora da Lei expressa pela Roda
dos Renascimentos, deste Arcano 10.
O Adepto, Iluminado ou Super-Homem tem a finalidade precípua de criar, pelo Poder
de “Krya-Shakti”, a alma espiritual dos seus discípulos ou daqueles que ele salvou na sua
atividade espiritual.
Durante determinado ciclo, a alma espiritual vai absorvendo a alma humana, até que
haja a metástase da primeira pela segunda.
A alma humana está simbolizada por Tifon e a espiritual por Ermanubis, que quando
bem sintonizadas, se transformam na Esfinge ou no andrógino divino. Quando as almas
gêmeas se harmonizam e se fundem no andrógino perfeito, há o fenômeno da Suprema
Eucaristia. Esta harmonização é feita através de vários ciclos de vida a que se denomina de
encarnações.
Num ciclo – de uma Raça Mãe – a Mônada Humana poderá encarnar 777 vezes ou
conquistar um potencial equivalente a 777 encarnações. Sendo que encarnação deve ser
tomado como um período de 70, 80 e 100 anos nos quais se adquirem determinadas
experiências.
Quando o discípulo supera, pelos processos adotados na iniciação, estes ciclos de vida
denominados de encarnações, passará então a realizar avataras em almas previamente
preparadas. Assim os seres mortais passarão a ser imortais.

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ARCANO 11

Nome vulgar: A FORÇA


Nome segundo Cagliostro: FORÇA
Nome segundo São Germano: PODER CONCENTRADO
Nome segundo o Anjo da Palavra: VISÃO DEÍFICA.
ANIQUILAMENTO MATERIAL.

A energia suprema, à qual nenhuma brutalidade resiste, apresenta-se no Taro sob o


aspecto de uma rainha loura e graciosa, que, sem esforço aparente, doma um leão furioso
cujas queixadas ela mantém abertas. Esta concepção de Força, como virtude cardeal,
afasta-se das configurações banais de um Hércules apoiado sobre a sua clave e revestido
com a pele do leão de Neméia.
Não é o vigor físico que o Arcano XI glorifica; trata-se de um poder feminino, bem mais
irresistível em sua doçura e sua sutileza do que todas as explosões da cólera e da força
bruta. A fera, encarnação das fugas indisciplinadas e das paixões veementes, é esse Leão
devorante do Zodíaco, cujo regresso anual assinala a época em que o Sol, tornando-se
ardente, resseca e mata a vegetação. É vencido pela Virgem (Imperatriz, Arc III) cujas
colheitas ele amadureceu. Não é um animal nocivo apesar da sua ferocidade. Entregue a si
mesmo, toma, devora e destrói com uma fúria egoísta; não faz o mesmo quando domado,
porque, tal como a Esfinge negra do Carro (Arc. VII), presta imensos serviços a quem sabe
dominá-lo. Não há, pois, motivo para matar o animal, mesmo em nossa personalidade, à
maneira dos ascetas. O Sábio respeita todas as energias, mesmo sendo perigosas, pois que
estima que elas existem para que sejam captadas e judiciosamente utilizadas.
Guilgamés, o herói caldeu, evita abafar o leão que aperta contra o peito, depois de tê-lo
aturdido com o auxílio de uma arma constituída por um saco de pele cheio de areia. Este
iniciado não desdenha o que é inferior; estima como sendo sagrado até os menos nobres
instintos, porque são o estimulante necessário a toda ação. O domínio vital exige que as
forças que tendem para o mal sejam consumidas, transmutadas em energia salutares. O que
é vil não deve ser destruído, mas enobrecido pela transformação, à maneira do chumbo, que
deve-se saber elevar à categoria do ouro. Esta regra é aplicável em todos os terrenos. É vão
exigir do comum dos homens a virtude, o desinteresse, o austero cumprimento do dever. O
egoísmo, sob todas as formas, permanece o Príncipe deste nosso mundo; o Sábio assim
aceita, e conta com o Diabo, a fim de obrigá-lo a colaborar, malgrado seu, na Grande Obra.
Assim o ensina o Arcano XI.
A Maga que realiza o programa da iniciação masculina ou doriana, denomina-se
Inteligência. É a Fada à qual devemos as conquistas da ciência e os progressos da
civilização; mas as maravilhas que ela opera ocultamente são mais admiráveis ainda do que
as que contatamos. Está ativa em cada organismo. Sem ela as células inconscientes não
poderiam concorrer a salvação comum. Ela repercute na alma de toda coletividade – porque
a vida só é individual de modo relativo: sendo complexo o ser que vemos como o mais
simples.
Toda vida seja a de um indivíduo tomado isoladamente ou de uma não, baseia-se
sobre a associação de divergências que se ignoram, e solicitam no entanto uma conciliação
no interesse superior. Essa conciliação indispensável, é, em toda parte, a obra do poder
misterioso, representado no Taro pela Força. Sem a irresistível intervenção da real
domadora, na qual se reúnem a Imperatriz (Arc. III) e a Justiça (Arc. VIII), os egoísmos
liberados se oporiam a qualquer vida coletiva; isto porque, esta última possui uma alma
orgânica, na qual reside uma força superior a das mesquinhas solicitações. Quando os
cidadãos só pensam neles mesmos, a nação deveria desmoronar-se, se ela resiste ao
embate dos apetites individuais, é puro milagre da alma nacional, simbolizada no Taro pela
Mulher vitoriosa do Animal rapace.
A rainha, que domina tranquilamente as energias em revolta, está vestida com as cores da
Papisa (Arc II): vestido azul e manto vermelho, porque sua ação é misteriosa, assim como a

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da Natureza-Ísis. Mas o azul da Força é o claro azul da Imperatriz (Arc. III). O verde aparece
em suas mangas, assim como na da Justiça (Arc VIII), associando-se ao amarelo. Porque a
domadora do leão inspira-se na idealidade mais alta (Arc III), e rege a vitalidade (verde) por
intermédio da luz coagulada (amarela), em conformidade com as leis da ordem universal
(Arc. VIII). É de notar que 3 + 8 = 11, o número que se reduz a 2, por redução iniciática. O
número 11 aparece, aliás, como ponto capital em Iniciação, sobretudo em seus múltiplos 22,
33 e 77, do mesmo modo que em sua decomposição em 5 e 6, algarismos que reconduzem
ao Pentagrama e ao Signo de Salomão, ou seja, às Estrelas do Microcosmo e do
Macrocosmo. A reunião dessas duas estrelas constitui o pentácolo da Força mágica,
exercida pelo espírito humano (Pentagrama), tornando-se centro de ação da alma universal
(Hexagrama). Nosso domínio afirma-se no domínio limitado do Microcosmo, que é
englobado no Macrocosmo do qual emanamos (Arc. I), e ao serviço do qual se dispensam
nossos esforços (Arc. XI). Análogo ao do Pelotiqueiro (Arc. I), o toucado da Força toma a
forma de um oito deitado, signo expressivo de um movimento contínuo, adotado pelos
matemáticos como símbolo do infinito. O retorno desse símbolo ao fim da fileira ativa dos
onze primeiros arcanos, assinala o infinito ao mesmo tempo como fonte e como termo da
atividade doriana consciente e baseada no querer. O chapéu do Pelotiqueiro é mais simples
do que o da Força, não comporta nem coroa, nem pluma brilhante, porque o poder espiritual
(coroa) só se adquire exercendo-o, e o saber prático é inato. O Pelotiqueiro tem capacidade
de adquirir tudo, mas não dispõe de todo o seu poder virtual, senão depois de se ter instruído
e disciplinado no curso de sua carreira de Iniciação da ordem masculina ou doriana.
O Arcano XI assinala nesse ponto o ideal que é possível atingir. O homem sábio pode
dispor de uma força imensa, se pensa judiciosamente e se o seu particular querer se
identifica com a Vontade Suprema. Ele domará a violência pela doçura. Nenhuma
brutalidade lhe resistirá, desde que saiba ele exercer o poder mágico ao qual deve aspirar o
verdadeiro Adepto. Domemos em nós mesmos o leão das paixões dominadoras e dos
instintos egoístas, se aspiramos à Força realmente forte e superior a todas as forças!

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ARCANO 12

Nome vulgar:O ENFORCADO


Nome segundo Cagliostro:SACRIFÍCIO
Nome segundo São Germano: PERDA DO EQUILÍBRIO
Nome segundo o Anjo da Palavra: COMPROMETIMENTO DA DIVINDADE

Com base na cultura e no desenvolvimento das energias que o indivíduo tira de si


mesmo, a Iniciação ativa, dita masculina ou doriana, se relaciona ao Taro aos onze primeiros
arcanos. Parte do Arcano 1 para atingir o 11. O Iniciado, estimulado por uma nobre a
legítima ambição pessoal, finalmente mostra-se digno da suprema força mágica. Realiza
então o ideal do Mago, é o senhor absoluto de si mesmo, e dominador. Chega-se a pensar
ser impossível ir mais longe, e no entanto, o Taro não para no Arcano 11, mas com o 12
aborda um domínio inteiramente diverso, que é o da Iniciação passiva ou mística, dita
feminina ou ioniana. A partir daí a personalidade renuncia à exaltação das próprias energias;
longe de comportar-se como centro de ação autônoma, apaga-se para aurir docilmente as
influências externas. O Mago tem fé em si mesmo, em sua inteligência, em sua vontade.
Sente-se soberano e aspira conquistar o seu reino. O Místico se persuada de que nada é
senão uma casca vazia, impotente em si mesma. Sua renúncia passiva coloca-se à
disposição do que nele age. Entrega-se de pés e braços amarrados, qual O Enforcado que,
no Taro, parece ser o mesmo personagem do Pelotiqueiro (Arcano 1). No arcano 12, volta,
com efeito, o mancebo louro e esbelto do Arcano 1; mas que contraste entre o Pelotiqueiro
hábil demais em seus dedos, e o supliciado... Este último só tem de livre a perna direita que
ele dobra atrás da esquerda, a fim de formar uma cruz acima do triângulo invertido
desenhado pelos braços e a cabeça.
O conjunto da figura lembra assim o signo alquímico da Realização da Grande Obra:
inversão do ideograma do Enxofre: ao qual se relaciona a silhueta do Imperador

(Arcano 4). A oposição assim posta em luz é a do Fogo e da Água sublimada. O ardor
sulfuroso é o Arqueu do indivíduo, o princípio de sua exaltação e de sua soberania
(Dorismo). A água exteriorizada representa a substância anímica purificada, na qual se
refletem as virtudes do alto. O Enforcado é inativo e impotente quanto ao corpo, porque sua
alma desvencilhou-se para envolver o organismo físico de uma atmosfera sutil, onde se
retratam as radiações espirituais mais puras. Ao contrário daquele, O IMPERADOR é
concentrado em si mesmo; absorvido sobre o centro de sua individualidade, praticando
assim, a descida em si mesmo – a dos iniciados. A entrada em si conduz à realização da
Grande Obra pela via seca do Dorismo: , ao passo que a saída de si mesmo para lá
conduz pela via úmida do lonismo: .Em vez de pisar o solo, onde se apóiam os mortais,
o Enforcado faz a sua doutrina, à qual adere tanto, a ponto de ali mergulhar. Não é mais,
propriamente falando, um ser terrestre, porque lhe escapa a realidade material: vive no
sonho de sua idealidade, sustentado por uma misteriosa potência, formada por duas árvores
esgalhadas que reúne uma trave de madeira seca. Essa trave é amarela para indicar que a
sua substância é a de luz condensada, ou seja, do pensamento fixo em sistema. È a doutrina
que O Enforcado a faz como a sua, à qual adere a ponto de ali suspender toda a sua
pessoa. Trata-se de uma concepção religiosa muito elevada, por demais sublime para que o
comum dos mortais possa atingir. É um ideal por demais elevado para ser, praticamente,
realizado. É a Religião das almas de elite, tradição superior aos ensinamentos das igrejas e
dos credos que se adaptam na terra à humana fraqueza. O Enforcado ali se agarrou, não
como um crente instintivo ou cego, mas como um sábio que discerniu a vaidade das
ambições individuais, e compreendeu a fecundidade do sacrifício heróico, visando ao
esquecimento total de si mesmo. Ao contrário do misticismo vulgar, esse esquecimento é
impelido até à exclusão de toda preocupação de salvação individual, porque a dedicação
pura não espera nenhum benefício sob forma de recompensa. Não é, aliás, a conquista do
céu que O Enforcado ambiciona – sua cabeça está dirigida para a terra. Isto quer dizer que

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suas preocupações são terrenas e que ele se devota ao bem alheio; à redenção dos pobres
humanos, vítimas de sua ignorância e de suas paixões egoístas.
As duas árvores, entre as quais se balança O Enforcado, correspondem às colunas
Jakim e Bohaz (da Maçonaria) que se erguem à direita e à esquerda de todo o Iniciado.
Representam o conjunto das aspirações sentimentais que tendem a arrancar o homem da
grosseira materialidade. A casca azul que se muda gradualmente em verde, indica a partida
a uma contemplação serena, uma piedade fiel aos usos culturais, a uma vitalização
progressiva, visando a desembaraçar-se da prática do culto, o lado moral e realmente
vivificante da religião. A seiva ardente, que fez crescer as duas árvores, vai colorir em
púrpura as 12 cicatrizes deixadas pelos galhos cortados. Se a espiritualidade ativante
(púrpura) se manifesta assim duodenária, é porque ela anima a universalidade do domínio
religioso, a face do sol que percorre os 12 signos do Zodíaco. A Religião do O Enforcado
nada tem de estreita; ela ultrapassa as confissões particulares, para visar ao catolicismo
integral, tal como ele surge do puro sentimento religioso, comum a todas as épocas e a todos
os povos. O vermelho e o branco na túnica do O Enforcado (arcano 12), tal como o vermelho
e o verde do O Amoroso (arcano 6), são alternados. A atividade do vermelho parece em
contradição com a passividade do personagem, que no entanto não poderia ser de todo
passivo, que precisa ser ativo para afastar as influências nocivas e procurar as boas. Quanto
ao branco, relaciona-se à pureza da alma e à imaginação indispensável à concepção de
idéias justas, e à cultura de sentimentos generosos. Sobre as abas da veste, dois crescentes
se vêem: um vermelho e o outro branco: estão em oposição. Lembram os crescentes
análogos que protegem os ombros do O Triunfador (arcano 7). Aqui, porém, comandam, não
aos braços, mas às pernas, quer dizer aos membros que, de certo modo, estão aéreos. Este,
com efeito, não anda, pois que está pendurado pelo calcanhar esquerdo e bate o ar com a
perna direita. Nessas condições, a lua vermelha do crescente da esquerda se relaciona ao
sentimento de humildade do místico, cuja abnegação é ativa. E o crescente branco, da
direita, se relaciona às faculdades intuitivas que têm missão de recolher, sem deformá-las,
as impressões imaginativas, depois de interpretá-las corretamente.
Dos botões da túnica, dois são vermelhos e quatro brancos. Esse detalhe não é
significante, pois que o 2 se liga À Papiza (Arcano 2), portanto está relacionado à Fé, que no
místico é ativa, ao passo que o 4 indica O Imperador (Arcano 4), que é o Senhor da Vontade.
E esta Vontade deve ser pura e desinteressada em iniciação feminina ou ioniana, pois que o
adepto renuncia por si mesmo a querê-la e sobretudo em usá-la para si mesmo; ele só quer
o que é da vontade do Poder misterioso do qual ele se fez um servidor. Onde o Mago
pretende comandar, o Místico só aspira a obedecer. Sua confiança traduz-se em
despreocupação serena, daí o rosto calmo e sorridente de O Enforcado, estranho supliciado
cujos braços atados sustentam sacos, dos quais derramam-se moedas de ouro e prata. São
os tesouros espirituais acumulados pelo adepto que com eles se enriqueceu
intelectualmente. Sem apego à coisa alguma, atira ele generosamente o ouro das idéias
justas que pôde reunir, e os conhecimentos preciosos que se esforçou por adquirir (Ouro,
Espírito, Razão). Não é menos pródigo o seu afeto, os seus bons sentimentos e os seus
desejos benéficos simbolizados pelas moedas de prata que se espalham à sua direita (prata,
alma, sensibilidade). Os heróis mitológicos mais em concordância com o arcano 12, parece-
nos ser Perseu, porque o filho de Júpiter, o animador celeste, e de Danaé, a alma
aprisionada em sua torre de arame corporal, é uma personificação do pensamento ativo que
se transporta ao longe, invisível, para vencer a mentira e a calúnia. Medusa, de quem Perseu
corta a cabeça, é o erro e a maledicência paralisando o espírito, de onde o poder petrificante
atribuído ao olhar da terrível Gorgona. Seu vencedor teve que tomar o bronquel-espelho de
sua irmã Minerva, o capacete da invisibilidade de Plutão, obra de Vulcano, e as sandálias
aladas de Mercúrio. Assim armado, logrou transportar-se à distância para exercer
invisivelmente uma ação de ordem oculta e telepática. Depois de haver triunfado, liberta
Andrômeda, a alma aprisionada no rochedo da matéria, negro recife emergindo das
espumas das ondas agitadas, no temível oceano da vida elementar. O personagem que
realiza esses altos feitos, pouco parece assemelhar-se a O Enforcado imobilizado; mas não
devemos enganar-mos sobre a aparente inatividade do supliciado do arcano 12. Se ele é

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corporalmente impotente, nem por isso deixa de dispor de um maior poder oculto ou
espiritual. Não agindo muscularmente, exerce no entanto uma irresistível influência psíquica,
graças à energia sutil que dele emana: seu pensamento, suas aspirações e seus
sentimentos fazem-se sentir ao longe, à maneira das intervenções de Perseu.

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ARCANO 13

Nome vulgar: A MORTE


Nome segundo Cagliostro: TANSFORMAÇÃO
Nome segundo São Germano: MODIFICAÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: COMPROMETIMENTO DO HOMEM (A
REDENÇÃO DO SEXO PELA ENCARNAÇÃO,
PROVAS ETC.)

As composições do Taro levam sua designação traçada em todas as letras: Papisa,


Imperatriz etc, Somente o Arcano 13 permanece intencionalmente mudo, como se
repugnasse, aos fazedores de imagens da Idade Média, dar um nome ao esqueleto armado
de foice cuja colheita se compõe de seres humanos. Teriam visto apenas a Morte, no
universal destruidor das formas perecíveis? Considerando a Vida como única existente,
parece que não acreditavam nem na Morte, nem no que se chama de Nada. Aquilo que é
muda de aspecto, mas nunca se destrói; tudo permanece, modificando-se indefinidamente
sob a ação do grande transformador ao qual os indivíduos devem a sua origem. Dissolvendo
as formas gastas que se tornaram incapazes de responder à sua destinação, esse agente
intervém como renovador, pois que libera as energias destinadas a entrar em novas
combinações vitais. Devemos nossa efêmera existência ao que chamamos a Morte. Ela nos
permite renascer, e só pode conduzir-nos a um renascimento.
Há correspondência exata no Taro entre os primeiros termos do 2º ternário e do 5º,
representados pelos Arcanos 4 e 13. Ora, 4 (Imperador) simboliza o Enxofre dos Alquimistas,
quer dizer, o Fogo interior, princípio ativo da vida individual. Este queima as reservas que se
esgotam, e daí a diminuição gradual de seu ardor e sua extinção final, naquilo que nós
denominamos Morte (Arcano 13). Em realidade, nada se extingue; mas liberta as energias
abatidas sob o peso da matéria cada vez mais inerte. Longe de matar, a Morte vivifica,
desassociando aquilo que não mais pode viver. Sem sua intervenção tudo feneceria, de tal
modo que a vida não mais se distinguiria, finalmente, da imagem que o vulgo tem da Morte.
É, pois, a justo título, que o Arcano 13 se relaciona com o gerador ativo da Vida Universal,
Vida Permanente, da qual a Temperança (Arcano 14) simboliza o dinamismo circulatório; ao
passo que o Diabo (Arcano 15) manifesta a acumulação estática.
O profano deve morrer para renascer a vida superior que confere a Iniciação. Se ele
não morre quanto ao seu estado de Imperfeição, veda a si mesmo qualquer progresso
iniciático. Saber morrer é, pois, o grande segredo do Iniciado, pois que, morrendo, liberta-se
do que é inferior, a fim de elevar-se, sublimando-se. O verdadeiro sábio esforça-se em
morrer constantemente a fim de melhor viver. Isto não implica em nenhuma prática de
ascetismo estéril, mas ele quer conquistar sua autonomia intelectual, e para isso rompe com
preconceitos que lhe são caros, morrendo assim a sua habitual maneira de pensar. Para dar
nascimento à liberdade de pensamento, é preciso libertar-se, morrendo para tudo que se
opõe à estreita imparcialidade do julgamento. Tal morte voluntária é exigida do Maçon para
que possa dizer-se nascido-livre, ao bater à porta do Templo. O simbolismo permanece
infelizmente letra-morta, pois a maioria não tem a menor idéia do que significa sua passagem
pela cova fúnebre, dita Gabinete de Reflexão.
Na Alquimia, o sujeito destinado a fornecer a matéria da Pedra Filosofal, ou seja, o
profano admitido à iniciação, é também, condenado à morte. Aprisionado em um ambiente
hermeticamente fechado, isolado assim de qualquer influência vivificante exterior, o sujeito
morre e apodrece. É então que aparece a cor negra, simbolizada pelo Corvo de Saturno, que
é de bom augúrio, no início das operações da Grande Obra. “Se tu não vês em primeiro lugar
esse negrume, antes de qualquer cor determinada, fica sabendo que falhaste na Obra e que
é preciso recomeçar”. De acordo com todos os filósofos herméticos, Nicolas Flamel convida
assim o futuro adepto a retirar-se do mundo e a morrer às suas frivolidades, a fim de entrar
no caminho das transmutações progressivas de si mesmo, que conduzem à verdadeira
iniciação. Esta comporta, em realidade, duas mortes sucessivas. A primeira implica em uma
incubação análoga a que sofre o pinto no ovo cuja casca acaba quebrando. O místico deve

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envolver-se a si mesmo nas trevas do Ovo filosófico, para conquistar a luz e a liberdade. É
preciso morrer numa prisão obscura para renascer numa vida de independência e de
claridade. A nova vida conquistada não é uma existência de triunfante repouso; impõe
incessantes trabalhos, mas fecundos e gloriosos, cuja recompensa é a segunda morte. Não
contente em libertar-se de seus mais grosseiros invólucros, o adepto morre dessa vez mais
profundamente do que no início de sua Iniciação, pois morre para si mesmo, para a sua
própria personalidade, para o seu egoísmo radical. Sua renúncia não é porém a do asceta
que se torna indiferente à sua sorte e a dos outros. Como adepto duas vezes morto
desdenhará os humanos, quando só ressuscita a fim de somente por eles viver? Se ele se
uniu ao Grande Ser que em nós se particulariza, é para partilhar o seu infinito amor. O que
distingue o sábio ideal é que ele sabe amar com fervor, até ao total esquecimento de si
mesmo. Aquele que atinge esse generoso desinteresse dispõe de um imenso poder e possui
a Pedra Filosofal, mas só uma dupla morte iniciática pode conduzi-lo à apoteose.
Contrariamente ao uso corrente, o Ceifeiro do Taro corta à esquerda. Graças a essa
anomalia, o esqueleto e a foice desenham um Mem, hebraico. O cabo da foice é encarnado,
porque a Morte dispõe do fogo que devora as forças ressecadas, palha na qual a seiva vital
não mais circula. É de notar que os ossos do esqueleto não são brancos, mas rosa-carne,
tom característico do que é humano, sensível e compassivo. A Fatalidade dissolvente não
teria então toda a fatalidade que lhe atribuem? A foice, que restitui os corpos ao solo ávido
de assimilá-los, parece poupar cabeças, mãos e pés. As cabeças conservam sua expressão,
como se permanecessem vivas. A da direita traz uma coroa real, símbolo da realeza da
inteligência e do querer que ninguém abdica ao morrer, Os traços do rosto (lado esquerdo)
nada perdeu de seu encanto feminino, porque as feições não perecem e a alma ama além
do túmulo. As mãos que surgem da terra, prontas para a ação, anunciam que a Obra não
será interrompida, e os pés, que aparecem em meio aos brotos verdes, se oferecem para o
avanço das idéias em marcha. O desaparecimento dos indivíduos não prejudica a tarefa que
eles cumprem: nada cessa, tudo prossegue!
Shiva retoma a Vishnu a vida doada por Brahmã, não para destruí-la, e sim para
rejuvenescê-la. Assim, Saturno poda a árvore da vida a fim de aumentar o vigor de sua
seiva, tal como um gênio renovador talha a humanidade no interesse de sua persistência e
de sua fecundidade. O iniciado reconhece no rebarbativo Ceifeiro o indispensável agente do
progresso, por isso não receia a sua aproximação. Para viver iniciaticamente consintamos
em morrer. A Morte é a suprema Libertadora. O sábio encaminha-se para a sepultura sem
lamentar o passado; aceita a serena velhice, feliz em beneficiar-se do relaxamento dos laços
que retêm o espírito aprisionado na matéria. A serenidade das paixões dá ao intelecto uma
liberdade mais completa, podendo traduzir-se em lucidez genial ou em clarividência
profética. Os privilégios do Domínio são, aliás, reservados ao velho que soube permanecer
jovem pelo coração, porque o poder do mestre (guiando ou dominando a mente do discípulo)
baseia-se na simpatia. O velho sabe amar com abnegação; dispõe da Força, fonte de toda
força e possui enfim a Pedra Filosofal, capaz de realizar os milagres da Coisa Única. Feliz
quem não sofre nenhuma atração inferior, que nem por isso deixa de possuir um generoso
ardor! Sendo Cristão, a realização pessoal cumpriu-se nele, sendo Maçon, pode dizer-se
Filho da Putrefação. Nada no Céu relaciona-se à Morte. O Dragão do Pólo ali figura no
entanto, como inimigo da vida, ou pelo menos das animadas formas transitórias. É o
insaciável que absorve tudo quanto viveu, nele dissolve-se o que deve retornar ao caos
antes de tomar novo aspecto. Hércules (Arcano 4) encontrou esse monstro no Jardim da
Hespérides onde defendia as maçãs de ouro. Mas o terrível réptil, que só afasta os profanos
não dignos de se aproximarem do tesouro iniciático: recua ante o iniciado morto e
ressuscitado.

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ARCANO 14

Nome vulgar: A TEMPERANÇA


Nome segundo Cagliostro: INICIATIVA
Nome segundo São Germano: VOLTA DO EQUILÍBRIO
Nome segundo o Anjo da Palavra: EQUILÍBRIO PELO ESFORÇO.
TRANSFORMAÇÃO, SUPERAÇÃO,MESTÁSTASE.

Se a Iniciação ensina a morrer, não é para preconizar o aniquilamento. O que com toda
certeza, não existe, é o Nada! A ele aspirar corresponde ao mais falso ideal que se possa
conceber, porque nada se destrói, tudo se transforma. Longe de suprir a vida, a morte realiza
seu período de rejuvenescimento. Ela dissolve o CONTEÚDO para libertar o CONTIDO, que
pode ser representado como um líquido incessantemente transportado de um recipiente
perecível para um outro, sem que jamais se perca uma só gota.
A Lâmina 14 do Taro mostra-nos esse fluido vital derramado de uma urna de prata
numa outra de ouro pela TEMPERANÇA, que se torna o anjo da Vida Universal.
As ânforas de metal precioso não correspondem a grosseiros invólucros corporais, elas
aludem à dupla atmosfera psíquica, cujo organismo material é apenas a veste terrena. Nessas
ambiências concêntricas, uma, a mais próxima, é solar e ativa (Ouro, consciência, razão); ela
dirige o indivíduo de um modo imediato e alimenta sua energia voluntária. A outra estende-se
além da primeira; é lunar e sensitiva (Prata). Seu domínio é mais misterioso; é o da
sentimentalidade, das impressões vagas, da imaginação e do inconsciente de ordem superior.
Essa esfera etérea capta vibrações da vida comum aos indivíduos de uma mesma espécie,
vida permanente, que é o reservatório onde aurimos a vitalidade que individualizamos. O que
se concentrou na urna de prata derrama-se na urna de ouro, onde a condensação se completa
em vista da manutenção da vida física.
O mistério das duas urnas domina toda a taumaturgia terapêutica, cujos milagres se
realizam com o auxílio do fluido universal. Os estreantes na arte de curar dispõem, o mais das
vezes, de uma urna de ouro transbordante. Eles transmitem então a outrem seu fluido pessoal
e praticam o magnetismo curativo, comandando as correntes vitais. Se a urna de prata não
lhes é revelada, eles permanecem aprendizes-curandeiros, incapazes de ação contínua e mais
largamente eficaz. O verdadeiro milagre que está ao alcance de toda alma pura,
profundamente generosa, depende da extensão de nossa esfera sentimental. Compadecemo-
nos de todo o nosso Ser dos sofrimentos alheios, depois exteriorizemos nosso afeto, a fim de
constituirmos um ambiente de amor tão vasto quanto possível. Assim, beneficiaremos ao meio
refringente anímico, próprio a recolher as mais etéreas ondas vibratórias, por meio das quais
se pratica a verdadeira medicina dos Santos e dos Sábios.
O Gênio da Temperança é andrógino ou mais exatamente ginandro; o Diabo (arcano
15) é, também, bissexuado. Ao passo que a Morte (arcano 13) é assexuado. Se assim é, o
conjunto do 5º ternário do Taro (13, 14 e 15) se relaciona à vida coletiva não individualizada, ao
fluido universal assexuado, embora suscetível de polarizações sexuais.
Assim como a Imperatriz (arcano 3), a justiça (arcano 8) e o Anjo do julgamento (arcano
20), a Temperança é loura, ela aproxima-se, além do mais, desses três personagens pela cor
das suas vestes: vestido de baixo vermelho, manto azul com forro verde. O vermelho denota a
atividade espiritual interna, o azul a serenidade anímica e o verde a tendência à vitalização
O Gênio da Temperança é alado como a Imperatriz (arcano 3), porque é análogo à
Rainha do Céu; mas ele não se confina, como ela o faz, nas alturas de um inacessível ideal e
prefere abaixar-se até aos vivos, que a ele devem poder viver física e espiritualmente. Limita-
se no entanto, em entreter a vida, sem fazê-la nascer como Pelotiqueiro, nem a intensificá-la
como faz o Imperador. A seiva angélica do líquido vital reanima a flor pronta a fanar-se; rega ou
condensa sobre ela o rocio matinal, a fim de que se possa resistir aos ardores do dia. No
quaternário das virtudes cardiais, a força desdobra uma atividade devoradora, que consumiria
a umidade vital (úmido radical dos hermetistas) sem a intervenção refrescante da Temperança.
Esta restitui uma nova seiva ao vegetal acabrunhado pelo calor maturante do leão, ao qual se

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opõe no zodíaco o aquário, ou seja, o Anjo de São Mateus ou o Homem associado ao Touro,
ao Leão e à Águia na visão de Ezequiel.
O Aquário representa o papel de INDRA, o deus das chuvas fertilizantes, que no
panteão caldeu corresponde a EA, o mestre do Oceano sobreceleste, onde se difunde a
suprema Sabedoria. Esta é repartida nos humanos pelo veículo da água que cai das alturas.
Daí o característico sagrado das águas lustrais e seu papel nas purificações iniciáticas.
Inspiraram-se os Cristãos nos antigos mistérios ao fazerem com que os batizandos
mergulhassem na onda batismal, a fim de emergirem lavados de toda mancha moral e
regenerados, ou seja, nascidos à vida cristã, depois da morte pela submersão à existência
pagã.
Em alquimia, o sujeito, denegrido, logo morto e putrefato, é submetido à ABLUÇÃO.
Esta operação utiliza as chuvas sucessivas provenientes da condensação dos vapores, que se
escapam do cadáver sob a ação de um fogo interior moderado, alternadamente ativado depois
diminuído. Dessas chuvas sucessivas resulta a lavagem progressiva da matéria, que, do negro,
passa a cinzento e finalmente ao branco. Ora, a brancura assinala o sucesso da primeira parte
da Grande Obra. Só a realiza o Adepto, purificando a Alma de tudo quanto comumente a
perturba. Se, após a renúncia efetiva de si mesmo, ele liberta-se de todo desejo equívoco,
pode aproximar-se de um ideal de candura de intenções que torna possível a ação miraculosa.

A arte de curar com o auxílio de forças misteriosas baseia-se especialmente sobre a


pureza de alma do curador. Que este se santifique por sua abnegação e sua dedicação a
outrem, e assim há de operar verdadeiros milagres; mas deve, para isso, desprender-se de si
mesmo até à indiferença e passar pela provação do frio, que apaga do coração do homem toda
paixão mesquinha.
É permitido reconhecer o Arcanjo Rafael no Gênio da Temperança, que tem na testa o
signo solar, já assinalado no barrete da justiça (arcano 8) e sob cujo aspecto se apresentará o
Anjo do Julgamento (arcano 20). Esse ideograma é sempre um índice de discernimento, seja
aplicado à razão coordenadora das energias construtivas (arcano 8), à distribuição lúcida das
forças vitais (arcano 14) ou à ação esclarecida do Espírito regenerador que sopra aonde quer
(arcano 20). Não olvidemos que o arcano 14, sintetiza o segundo setenário do Taro, cujo
centro ocupa. Ora, desde que os três setenários, cada um em seu conjunto, se relacionam ao
Espírito, à Alma e ao Corpo, o segundo é anímico – seu termo sintético (arcano 14) alude pois
aos mistérios da Alma universal, mistérios que é preciso penetrar para praticar a alta Medicina
dos Iniciados.
Quando os arcanos do Taro são colocados sobre duas filas, o Ermitão (arcano 9), que
personifica a Prudência, torna-se o companheiro de fila da Temperança (arcano 14). Esta
transporta no passivo aquilo que o filósofo solitário manifesta no ativo. Homem de experiência
e de estudo, nosso sábio alheia-se às sugestões que dominam as pessoas; ele busca a
verdade sem pressa, limitando o campo de suas explorações, a fim de manter-se no estreito
limite do humano saber. Sua reserva traduz-se pela Temperança em moderação, virtude
positiva que repugna às extravagâncias e aos exageros. Trata-se antes da vida prática, do que
mesmo das especulações abstratas. O adepto que se banhou no fluido derramado pelo Anjo
solar não mais pode ser agitado pela febre que sacode ao comum dos homens. Morto às
ambições mesquinhas, às paixões egoístas, indiferente às misérias que o ameaçam, vive
calmo na bela serenidade de uma doce sabedoria, indulgente às alheias fraquezas.

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ARCANO 15

Nome vulgar: O DIABO


Nome segundo Cagliostro: DESTINO
Nome segundo São Germano: COMPREENSÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: A LUZ MANIFESTADA NAS DUAS FORÇAS
( Divina e terrena, ou “Solve et Coagula”, Fohat e Kundaline).

Vista em sua essência comum a todos os seres, a vida universal circula sem
interrupção, sempre idêntica a si mesma, passando com indiferença de um recipiente para
outro. Se coisa alguma viesse perturbar a regularidade desse tranqüilo correr, a vida teria
permanecido conforme o ideal paradisíaco; mas a Serpente interveio, e, sob sua
inspiração, cada ser quis apossar-se do bem comum, para compensar a vida em torno do
seu eu, para o seu próprio benefício. Houve assim a revolta contra a ordem universal das
coisas. Turbilhões particulares nasceram no seio da circulação geral, perturbada pelo
egoísmo, que personifica o Diabo. Esse adversário (Satan, em hebraico) é o Príncipe do
Mundo (mas legítimo e por vontade divina, o Diabo é apenas usurpador e de seu jugo nos
devemos libertar), que sem ele, não lograria existir, pois que ele se acha na base de toda
diferenciação. É ele ainda que impele o átomo a se constituir à custa da substância
uniformemente etérea. É o diferenciador, o inimigo da unidade; opõe os mundos ao Mundo
e joga os seres uns contra os outros. Tendo-os incitado a quererem se tornar semelhante a
Deus, sugere-lhes o instinto de tudo quererem para si mesmos, como se fossem o centro
em torno do qual tudo deve gravitar.
O Diabo nos aparece no taro sob o aspecto do Baphomet dos Templários, bode pela
cabeça e pelas pernas, mulher pelos seios e pelos braços. Esse monstruoso ídolo deriva
do Bode de Mendes e do Grande Pan andrógino dos Gnósticos. Tal como a Esfinge grega
que reúne nela os quatro Elementos, dos quais o Diabo é o princípio anímico.
Suas pernas pretas correspondem à Terra e aos espíritos das profundidades obscuras
que representam os Gnomos da Idade média e os Anounnaki temidos pelos Caldeus. As
Ondinas, animadoras da Água, são lembradas pelas escamas verdes que cobrem os
flancos do monstro, cujas asas azuis são as mesmas das Sílfides, potestades do Ar.
Quanto à cabeça vermelha, simboliza a fogueira onde comprazem as Salamandras, gênios
do Fogo.
Os Ocultistas estão persuadidos da existência dos Espíritos elementais. A Magia
ensina subjugá-los, sem dissimular os perigos das relações que se podem estabelecer
entre eles e o homem. O menos que se pode dizer é que eles se mostram servidores
exigentes para aqueles que os dominam, reduzindo à pior servidão o pretenso Mago,
ambicioso por submetê-los ao poder de suas conjurações falaciosas.
Atento em governar-se modestamente a si mesmo, reprimindo suas tendências
inferiores, o sábio abandona o domínio do invisível aos feiticeiros e aos falsos adeptos,
pretensiosos ocultistas que se enfeitam com títulos denunciadores de sua pueril vaidade.
Comandemos apenas o nosso corpo e não pactuemos com nenhuma arte diabólica
prometedora de pequenos benefícios. Deixemos que os Gnomos guardem ciumentamente
os tesouros ocultos e recorramos à geologia para descobrir as jazidas metálicas. Não nos
fiemos nas Salamandras para tomarem conta de nossa cozinha, nem nas Ondinas para
regarem nosso jardim, e, se aguardamos um vento propício para embarcar, não nos
ponhamos a assobiar para as Sílfides, segundo o hábito dos marujos de outrora.
Em taumaturgia, o interesse é de rigor, porque se a Natureza se deixa adivinhar, é de
preferência pelas almas simples que entram em comunhão com ela candidamente e sem
malícia. Gosta a Natureza de beneficiar com seus segredos aos “pobres de espírito”,
totalmente incapazes de imaginarem uma teoria sábia baseada sobre os resultados que
eles obtêm. Longe de se atribuírem um poder pessoal, esses modestos taumaturgos se
consideram como humildes instrumentos a serviço de poderes superiores. Exercem um
sacerdócio e se distinguem por seus sentimentos de caridade. Que ostentem as plumas

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multicolores do padre-médico pele vermelha ou as vestes fantasistas do fetichista africano,
se são honestos e sinceros, esses filhos da Natureza que só por ela foram instruídos, são
respeitáveis confrades do adepto digno que recusa solidarizar-se com os magos
charlatães.
O adepto sério não ignora que o Diabo é o grande agente mágico, graças ao qual se
efetuam os milagres, a menos que os mesmos não sejam de ordem puramente espiritual;
porque, enquanto o espírito puro age diretamente sobre o espírito, o Diabo não tem por
onde intervir. Mas desde que o corpo entra em causa, nada pode ser feito sem o Diabo. A
ele devemos nossa existência material, porque se o desejo de ser e o instinto de
conservação, que dele provém, não nos houvesse dominado desde o nosso nascimento,
não poderíamos ter-nos agarrado à vida com o egoísmo exclusivo, característico da
primeira infância.
O Diabo toma posse de nós quando chegamos ao mundo, e assim deve ser. Mas essa
posse não é definitiva, porque somos destinados a nos libertar progressivamente da tirania
de nossos instintos inatos. Enquanto estamos ligados ao nosso organismo animal, nos é
impossível fazer abstração do espírito que rege nosso corpo. Tal como o cavaleiro cuida de
sua montaria, devemos zelar pelo animal que, sob nós, reclama seus direitos. O Diabo não
é tão feio quanto parece; é o nosso indispensável associado na vida deste mundo em que
nos achamos. Saibamos tratá-lo equitativamente, não como inimigo sistemático e
irreconciliável, mas como inferior, cujos serviços são preciosos. Não nos esqueçamos de
que o Diabo nos faz viver materialmente. Ele nos arma para as necessidades desta
existência de perpétua luta, daí os impulsos que em si não são maus, mas entre os quais
deve ser mantida a harmonia, se não quisermos tombar sob o jugo dos pecados capitais
que partilham entre eles os departamentos ministeriais por assim dizer, do governo
infernal. Moderemo-nos em todas as coisas, e deste modo nos oporemos às discordâncias,
que, somente elas, tornam-se diabólicas. Reprimamos nosso orgulho, a fim de que se
traduza em dignidade, nessa nobre altivez que inspira o horror de todo o aviltamento.
Dominemos a cólera, para transmutá-la em coragem, em ativa energia. Não nos
abandonemos à preguiça, mas tenhamos o necessário repouso para reparar as forças
gastas. Nem receemos repousar preventivamente em vista de um esforço a ser feito. Os
artistas e os poetas podem ser proveitosamente preguiçosos. Evitemos a gulodice; é
degradante viver para comer, mas, para viver com boa saúde, escolhamos os alimentos e
apreciemos suas qualidades gustativas. Repilamos o nojento demônio da inveja, que nos
faz sofrer pelo bem alheio, mas antes oponhamo-nos, no interesse comum, aos ganhos e
aquisições ilícitas e aos abusos dos poderosos. Não caiamos na avareza, mas sejamos
previdentes, praticando a economia e sem desdenhar o honesto amor ao ganho, eficaz
estimulante do trabalho. Quanto à luxúria, pela qual se exerce mais poderosamente o
domínio do Diabo, é preciso opor-lhe o respeito religioso do augusto mistério da união dos
sexos. Não profanemos mais aquilo que é sagrado.
Se o exercício do poder mágico impõe a castidade, é porque o instinto genésico tem
um papel capital no jogo das influências ocultas. O macho que deseja a fêmea exalta-se a
fim de libertar uma eletricidade fisiológica, própria a exercer sua ação, desde que as
condições propícias encontrem-se manifestadas. A jovem, certa de si mesma, que brinca
de “cão e gato” com o namorado, pode sucumbir no momento que menos espera. É assim
a vítima do sortilégio natural ao qual se desafiou, brincando com uma força pérfida.
Dominada por uma misteriosa embriaguez, perde momentaneamente a cabeça, e o ato, ao
qual decidira não consentir, realiza-se. Os sedutores praticam uma magia elementar, tanto
mais eficaz por ser instintiva. Têm o talento de fazer intervir o Diabo sem nenhuma
invocação consciente. O instinto basta, assim como em muitos outros atos da vida em que
reações similares se produzem: os feiticeiros são legiões que fazem feitiçaria como M.
Jourdain fazia prosa.
Tende uma vontade firme e agireis sobre o Diabo sem a menor dificuldade; o
pentagrama branco que decora a fronte do Baphomet a isto vos convida. Tudo é
hierarquizado na Natureza, onde as forças inconscientes se submetem à direção do que
lhes é superior. Mas é perigoso atribuir-lhe uma superioridade fictícia para exercer um

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comando injustificado: o Esperto não se engana e se encarrega de mistificar cruelmente os
presunçosos que tem boa opinião exagerada de si mesmo. Ele exige, para obedecer, que
o pentagrama seja de uma alvura perfeita, em outras palavras, que a vontade seja pura,
não manchada de egoísmo e que sejam legítimas as ordens dadas. É porque, em última
análise, o Diabo está a serviço de Deus e não se deixa empregar a torto e a direito. Se ele
provoca perturbação, nunca é a título definitivo, sua desordem está na ordem e reverte à
ordem, porque o Diabo está submetido à lei universal cuja Justiça (arcano 8) assegura a
aplicação; ora, o arcano 8 domina o 15 quando os 22 arcanos estão dispostos em duas
fileiras.
Nada faz melhor compreender o tríplice pentagrama que o esquema do principal
personagem do arcano 15. Ali a energia inteligente humana, representada pelo pequeno
pentagrama central branco, só está encerrada no pentagrama caído preto, figurando na
cabeça do bode com seus chifres, suas orelhas e barbas, a fim de exteriorizar por sua
ação o grande pentagrama, símbolo do poder mágico benéfico, do qual sabe dispor o
homem que consegue dominar em si o animal. A centelha divina que vive em nós deve
vencer o instinto grosseiro e dessa vitória resulta uma “glória”, ou seja, uma ambiência,
uma auréola (aura), instrumento do nosso poder oculto.
A tensão vibratória desse aura depende da veemência do fogo infernal que arde em
nós (cabeça vermelha do Baphomet, pentagrama negro do esquema). Sem ardor diabólico,
permanecemos frios e impotentes, é preciso termos “o diabo no corpo” para influenciar
outrem e agir fora de nós mesmos.
Essa ação se exerce pelos membros do grande fantasma fluídico e mais especialmente
por seus braços, que por alguma razão são tatuados com essas palavras COAGULA,
SOLVE.
O processo mágico consiste, com efeito, em coagular a Luz astral, ou seja, a atmosfera
fosforescente que envolve o planeta, graças à ação do fogo central.
Os vivos agitam-se no seio dessa claridade difusa que lhes aclara a instintividade.
Tomando de empréstimo o braço esquerdo de Baphomet, podemos atrair a vitalidade
ambiente vaporizada invisivelmente e condensá-la em nevoeiro mais ou menos compacto
em sua fluidez. É a coagulação que se opera em benefício do pólo genital, como indica o
símbolo hindu da união dos sexos, que o Diabo ergue com a mão esquerda.
O fluido coagulado carrega o operador à maneira de uma pilha elétrica; mas nenhum
efeito se produz enquanto não há descarga, ou seja, solução. Aí intervém o braço.
Portador do facho incendiário do Baphonet, imagem das deflagrações veementes que são
a temer. Para evitar a explosão que perturba e ameaça desencadear a loucura, convém
captar a corrente que determina o fluir gradual do fluido acumulado. Um hábil magnetizador
utiliza essa fonte pondo em prática a fórmula: COAGULA, SOLVE.
Utiliza alternadamente o diabrete vermelho e a diabinha verde, que uma corda prende
ao anel de ouro fixado no altar cúbico sobre o qual se ergue o Baphomet.
O pequeno sátiro e a pequena faunesa representam as polarizações positiva e negativa
do fluido universal neutro, ou melhor, andrógino, como o indica o signo do hermafroditismo
(meia luz, sol, cruz) que caracteriza a sexualidade do grande Pan. Este se desdobra,
segundo os sexos, em um filho e uma filha, que fazem ambos o signo do esoterismo,
recurvando os dois últimos dedos da mão que estendem. O diabrete da direita ergue
também a mão esquerda, tocando de leve a coxa direita de Satan-Panthée a fim de tirar-
lhe o fluído positivo, que transmite à diabinha da esquerda pelo laço que os prende. Essa
faunesa verde toca da direita o tamanco esquerdo paterno, a fim de restituir o fluido
recebido em excesso. Esse contato estabelece o circuito da escravidão mágica cujos
agentes são, de um lado, o orgulho e o erotismo do macho sob todas as formas, e, do
outro, a lascividade feminina.
O pedestal do ídolo templário não é, como o trono do Imperador (arcano 4), um cubo
perfeito de ouro puro. Seu formato achatado lembra o signo do Tártaro dos Alquimistas,
substância que merece ser posta em prática, como a pedra bruta dos Maçons, embora seja
apenas uma crosta inconsistente. A cor azul indica uma matéria áurea resultante da tensão
de dois dinamismos similares mas opostos, representados pela base e pela tampa do

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pedestal. A cor vermelha das três partes de baixo e de sua exata contraparte do alto
denota uma atividade ígnea, como se a polarização inferior provocada pelo fogo central
fizesse apelo a uma equivalente acumulação de eletricidade atmosférica. O altar do Sabat
é constituído segundo as leis ocultistas sobre as quais teríamos interesse quanto a
informes mais precisos.
Os chifres e as patas retorcidas do Bode dos feiticeiros são dourados, porque o que
emana do Diabo é precioso. Da Cabra Amaltéa, que amamentou Júpiter, provinha a
famosa Cornucópia da Abundância, que dava às ninfas tudo quanto elas desejavam.
Aquele que possuísse um chifre do Diabo, dele também tiraria tudo quanto quisesse. E que
outras serão as virtudes do leite sugado nas mamas da mulher do Baphomet? Não o diz a
tradição; mas a cabra jupteriana, que acompanhada de seus dois cabritos figura no céu
sobre as costas do Cocheiro, acha-se em exata correspondência com o ternário do arcano
15. O Cocheiro celeste segura o chicote e as rédeas que permitem conduzir a animalidade,
é Pan, o protetor dos seres submetidos à vida instintiva.
A décima quinta letra do alfabeto semítico é o Samek, cuja forma é circular em
caligrafia hebraica usual. Alguns estudiosos pensam reconhecer nessa letra o Oroboro, a
Serpente Cosmogônica que morde a própria cauda; outros pensam ser o tentador, causa
da queda adâmica. Não se justificam essas similitudes, ou melhor, não se justificariam, se
o Taro não fosse tão velho como os caracteres alfabéticos. O Samek primitivo é, com
efeito, uma tríplice cruz, como a que empunha o Papa no arcano V. Se se quisesse
explorar a ironia do simbolismo, poder-se-ia sugerir que só o receio do Diabo confere ao
governo da Igreja o cetro de seu poder executivo. Digamos, concluindo, que, de um modo
geral, ninguém reina sobre a Terra sem fazer aliança com o Príncipe desse mundo.

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ARCANO 16

Nome vulgar: A CASA DE DEUS


Nome segundo Cagliostro: RUÍNA
Nome segundo São Germano: RUÍNA DO TRONO
Nome segundo o Anjo da Palavra: A SÚPLICA DE DEUS.
O ECO DA SUA VOZ.

A Torre do Arcano 16 é o primeiro edifício que se encontra no Taro, onde construções


análogas somente tornam a aparecer sob a Lua (arcano 18). Ora, arcanos 16, 17 e 18
constituem o 6º ternário que corresponde ao corpo do Adão terrestre, ou seja, ao organismo
construído da individualidade humana ou ao da humanidade vista em seu conjunto.
Temos no arcano 16 o primeiro termo desse ternário, o que se pode chamar o espírito
corporizante, e no arcano 18, o último termo dessa mesma tríade o resultado da
corporização efetuada. Como coisa alguma se corporiza sem que ali haja primeiro
condensação elétrica ou fluídica, sob uma influência restritiva e particularizante que foi
convencionada atribuir ao Diabo, este (se torna o pai espiritual do mínimo átomo, tanto como
do mais incomensurável sistema cósmico, porque, na raiz de um como outro, concebe-se um
desencadeado turbilhão em volta de um centro de atração necessariamente egoísta e
açambarcado. Tanto em pequeno quanto em grande, tudo se concretiza a favor de um
obscuro instinto de individualização que se manifesta sob a aparência de uma revolta contra
a ordem universal das coisas, e daí a lenda de Lúcifer e a da “queda original”, que devem
ser revistas, porque Deus não é o velho Apsou dos Caldeus, o abismo sem fundo, o Infinito
adormecido em sua infinidade, da qual se recusa a sair para criar.
Nós renunciamos a essa desocupada divindade, embora seja ela metafisicamente
conseqüente consigo mesma, para adorar a Causa criadora que procede por diferenciação e
não se zanga com a insubordinação materializante, indispensável à realização de seu plano.
Não introduzamos na unidade necessária um dualismo ilógico. Tudo permanece Um e nosso
Deus Único assume sozinho a última responsabilidade daquilo que é. Vedado nos é
blasfemar contra a sua criação que é boa e perfeita no seu ideal, cuja realização prossegue;
a Grande Obra está ainda sendo executada e não deverá ser julgada enquanto terminada
não estiver. A beleza de um edifício só se manifesta depois que são retirados os tapumes
que permitiram a construção. Só podemos admirar o nosso imperfeito mundo e fazer-lhe
justiça, se pudermos conceber a perfeição para a qual ele colima.
Desde que tudo se constrói, peçamos aos construtores o segredo de tal arte. Eles nos
conduzirão junto de duas colinas erguidas diante do Templo que edificam, à glória do Grande
Arquiteto do Universo. A primeira dessas colunas, a da direita, tem um nome hebraico cuja
inicial é um “Jod” e que significa: ele estabelece, ele funda. Essa coluna é consagrada ao
fogo interno que anima os seres, para que ajam por si mesmo tomando todas as iniciativas,
começando pela de existir. É, pois, o poder criador individualizado, que é representado sob
um aspecto fálico nos monumentos que os antigos gostavam de erguer nas alturas.
O arcano 16 nos apresenta a imagem de uma dessas torres na Casa de Deus –
designação típica, porque se trata menos de um templo, morada de Deus, do que de um
edifício; de um corpo identificado abusivamente com Deus.
Esta identificação é a conseqüência da queda original, que obscurece o espírito
descido na matéria a fim de elaborar esta última. A decadência é consecutiva à encarnação,
que não é forçosamente o resultado de uma falta primordial. O pecado de Adão é muito
relativo e só existe em relação aos cegos humanos, que gemem por se verem condenados
ao trabalho, sem compreender que se divinizam associando-se de boa vontade à obra eterna
da criação.
Mas essa transitória cegueira está em conformidade com o divino programa. No
interesse do trabalho transmutatório que nos incumbe, temos que esquecer Deus a fim de
nos identificar com a matéria. Deus assim o ordena quando nós encarnamos; não quer que
fiquemos distraídos de nossa tarefa inicial pela nostalgia do Céu. De início a criança é um
puro animal. Constrói seu organismo preocupando-se apenas consigo mesmo, com o mais

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absoluto e inconsciente egoísmo. Ergue-se o seu edifício corporal no espírito que animava
os construtores da Torre de Babel, construção da qual o arcano 16 apresenta uma imagem
simbolicamente correta [a Torre compunha-se de 7 cubos superpostos, porque a criação
está submetida à lei setenária. Sete notas existem na escala da harmonia universal,
harmonia esta que repercute no homem, pequeno mundo (microcosmo). O edifício sagrado
da Babilônia prestava homenagem ao macrocosmo, ao passo que o microcosmo é o único
de que se trata no edifício caído do arcano 16]. Os tijolos que o compõem são em conjunto
cor de carne, para indicar que se trata de uma construção viva, dotada de sensibilidade. É
realmente, em tamanho grande, a sociedade humana e, em miniatura, o corpo individual de
cada um de nós, quer dizer, um conjunto de células nascidas umas das outras, para se
juntarem em órgãos, assim como as pedras de um edifício que fossem capazes de se formar
e de se unirem por elas mesmas, obedecendo a misteriosas atrações. Os tijolos dos
materiais da Torre que ornam as aberturas são de um vermelho vivo, como se a atividade
devesse dominar naquilo que exige mais resistência e solidez. Essas aberturas são em
número de quatro: uma porta e três janelas, duas das quais iluminam o andar médio da
morada do espírito, e a terceira, o quarto superior, achando-se o rés do chão suficientemente
aclarado pela porta que fica aberta. Essa parte inferior, acessível sem esforço, corresponde
às noções banais que se impõe à constatação passiva. Do primeiro andar, a vista é mais
ampla e a observação, pela janela da esquerda, torna-se então consciente: é a ciência que
se constitui pela acumulação dos frutos da experiência. Pela janela da direita penetra a luz
do raciocínio, que coordena as noções adquiridas tirando das mesmas uma filosofia. Mas é
possível ir mais alto para atingir o santuário iluminado apenas por uma janela, a da fé ou da
especulação abstrata, ambiciosa de síntese. Ainda não é tudo A Torre termina em um
terraço ornamentado de ouro, de onde se contempla o Céu. Uma dupla arquitrave composta
de duas bases, a primeira de pedras verdes e a outra de tijolos vermelhos, sustentam a
cumeeira da Casa de Deus. O verde venusiano alude à sensibilidade mística e o vermelho
aos generosos ardores que conduzem à visão beatífica e às contemplações transcendentais.
Há perigo em subir alto demais, disto nos avisa o raio partido do Sol, que decapita a
Torre. O Sol simboliza aqui a Razão que governa os homens e se opõe às suas
extravagâncias. Quando buscamos uma coisa quimérica, é fatal a catástrofe, provocada por
culpa nossa, mas determinada pela ação da luz que ilumina as inteligências. O que não é
razoável condena-se a si mesmo. Tanto pior para o ambicioso que tudo faz para ascender
muito alto, sem pensar que os cumes atraem os raios.
Os dois personagens do arcano 16 sofrem o castigo de sua presunção: são
precipitados ao mesmo tempo que os materiais desprendidos da Torre. O primeiro é um rei,
que permanece coroado em sua queda; simboliza o espírito imortal para quem foi construída
a Casa de Deus. A silhueta que ele desenha ao cair lembra o “Ayn”, 16ª, letra do alfabeto
sagrado; mas cabe aqui a nota já feita à propósito do “Samek”. O “Ayn” primitivo era um
círculo, do qual deriva, por uma série de alterações reveladas pela epigrafia semita, o caráter
atual do hebreu quadrado.
O Senhor da Torre traz uma roupagem de cores discordantes, às quais é difícil dar uma
significação; domina o azul em sinal de idealidade; associa-se ao vermelho, atribuindo a
atividade ao braço direito, ao passo que o verde assinala a região do coração, sensível ao
encanto feminino. Se finalmente a perna esquerda é amarela, em oposição com a direita,
que é azul, isto pode indicar uma caminhada partilhada entre a piedade, a fidelidade (azul) e
a inveja cobiçando os bens materiais (amarelo). O segundo personagem está vestido de
vermelho, porque ele é o Arquiteto da Torre, o construtor do corpo que morre com ele; por
isso recebe sobre a nuca um choque mortal. Esse construtor do organismo se identifica com
sua obra que é transitória; mas, se desaparece, não deixa por isto de agir segundo uma
durável tradição, porque cada indivíduo se constrói, não segundo a sua fantasia, mas
segundo o plano permanente da espécie. Este persiste graças à arquitetura vital que lhe é
própria. Quando um germe se desdobra, a organização progressiva efetua-se inspirando-se
primeiro no tipo geral do gênero, depois nas particularidades da raça, no estilo ancestral e
enfim no caráter individual. Somos assim corporalmente construídos por um agente
demiurgo, o arquiteto de nossa torre carnal, que se põe a serviço de nossa realeza espiritual.

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Falta mencionar as esferas multicores que a explosão da Casa de Deus parece haver
projetado em seu ambiente; são as energias acumuladas pela vida, condensações que o
vermelho designa como sulfurosas ou ígneas, o verde como vitalizadas passivamente na
ordem mercurial e o amarelo como mortas à maneira da palha, transmutações de ovos
astrais salinos. Essas formas fantasmagóricas, das quais a vida ativa retirou-se, são ruínas
que permanecem como testemunhas do passado. Somos cercados dessas larvas que
podemos animar, se tal quisermos fazer a exemplo dos imprudentes que se deixam
vampirizar astralmente. Desventurado é o ocultista vaidoso que imagina estar sendo servido
por invisíveis entidades! Seus servos equívocos vivem às suas expensas e o escravizam na
mesma medida em que eles os escraviza. Pertence a eles tal como eles lhe pertence. Há
pois duas alienações de sua parte: está alienado no próprio sentido da palavra, e ainda se
expõe a perder o juízo, desgraça da qual é ameaçado pelo arcano 16.
O sentido nefasto da casa de Deus encontra seu correspondente celeste no Escorpião,
constelação que precipita a queda do Sol para as regiões astrais e representa na mitologia o
papel de um pérfido envenenador. Esse veneno animal não deixa por isso de ser o suporte
de “Ophiucus”, o Serpentário, manejador do fluido curador, pois que ergue a serpente de
Esculápio, que recusa arrastar-se na lama terrena, alusão ao grande agente mágico, ou seja,
o fluído vital sublimado por sua libertação das egoístas cadeias humanas. Quando dispomos
em favor de outrem de nosso dinamismo fisiológico, praticamos a antiga medicina sagrada.
Elevamos então por cima do escorpião da instintividade a Serpente geradora de toda energia
animal.
Em seu conjunto, o arcano 16 relaciona-se ao princípio determinativo de toda
materialização e à tendência que leva a materializar-se. Essa tendência vai tornando
espessas as formas que servem de veículo ao espírito. Assim nascem os dogmas
autoritários, crostas opacas, que nasceram e aprisionam a verdade viva. Daí também a
capacidade humana, fonte de todos os despotismos, inclusive dessa exploração intensiva de
terra e das forças humanas, tão patente em nossa época. Como não compreender que o
desdém sistemático de toda moderação nos conduz a um terrível cataclismo social?
Oxalá humilhe-se nosso orgulho perante a Sabedoria do Taro!
A Casa de Deus é substituída em certos Tarôs pelo inferno, figurado por um monstro
com focinho de porco, que devora os danados que o Diabo atrai tocando a chamada.

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ARCANO 17

Nome vulgar: AS ESTRELAS


Nome segundo Cagliostro: ESPERANÇA
Nome segundo São Germano: O CANDELABRO CELESTE
Nome segundo o Anjo da Palavra: AS SETE TROMBETAS, COMO VOZ DO LOGOS
CRIADOR

Em nossa sede de existência e de autonomia individuais, nos afastamos da vida


universal do Grande Ser do qual continuamos a fazer parte. Nele vivemos, mas não da vida
que Lhe é própria, já que nos contentamos com a nossa vida estreita, limitada ao domínio de
nossas sensações. O que estas nos revelam é ínfimo em comparação ao insondável
desconhecido que nos envolve. Estamos mergulhados numa noite profunda, mas quando
dirigimos os olhos ao céu, vemos ali o cintilar das Estrelas.
Essas luzes do alto nos encorajam e os fazem sentir que não estamos abandonados,
pois que os deuses, chamados primitivamente “os luzentes”, velam sobre nós. Eles nos
dirigem, com vistas ao cumprimento do nosso destino, porque temos uma tarefa em nossa
vida limitada, não as encarnando ninguém sem que o seu programa, em suas grandes
linhas, esteja já traçado, sem que um objeto haja sido conferido ao terrestre viajor.
Uma misteriosa “carta de prego” aponta as etapas essenciais da nossa peregrinação,
como se o tribunal de “Anounnaki” houvesse demarcado nossos passos ao fixar nosso
destino.
Se executássemos fielmente nosso programa, a vida seria para nós o que ela deve ser.
Nós a complicamos por nossa indocilidade, que nos vale as duras provas das quais nos
queixamos, pois que em princípio, a vida não é cruel, mas o seu fito não é o nosso bel-
prazer; ela tem a sua tarefa e pede que cumpramos a nossa. É uma deusa doce e bela,
como a jovem nua do arcano 17, que, ajoelhada à margem de um lago, ali derrama o
conteúdo de uma urna de ouro, da qual flui um líquido fervente, vivificador da água
estagnada. A essa ânfora segura com a mão direita, corresponde outra que a mão esquerda
inclina, para derramar na terra árida uma água fertilizadora. O segundo recipiente é de prata;
tal como o primeiro é inesgotável. O constante regar alimenta a vegetação representada por
um ramo de acácia e uma rosa desabrochada.
Mimosa do deserto, a acácia resiste à seca; seu persistente vigor manifesta uma vida
que se nega a fenecer, e por isto se torna um emblema de esperança na imortalidade. Na
lenda do Hiram, essa planta faz com que se descubra a sepultura do Mestre, detentor da
tradição perdida. Corresponde ainda ao ramo de ouro das antigas iniciações. Conhecer a
acácia, é possuir as noções iniciáticas que conduzem à descoberta do segredo do Domínio.
A fim de assimilar-se esse segredo, o adepto deve fazer reviver em si mesmo a
Sabedoria morta. Para isto, deve imitar Ísis; que percorreu a terra toda em busca dos
pedaços esparsos do corpo de seu esposo. Esses vestígios preciosos são escolhidos pelo
pensador que sabe discernir a verdade oculta sob o montão de superstições que o passado
nos lega. O cadáver espiritual de um Deus, que outrora iluminou o mundo, subsiste, repartido
entre as multidões ignorantes, sob formas de crenças persistentes, a despeito de sua
oposição às ortodoxias admitidas. Longe de desdenhar esses restos desfigurados, restos de
uma sapiência perdida, o Iniciado os ajunta piedosamente, a fim de reconstituir em seu
conjunto o corpo da doutrina morta. Restabelecida em sua síntese, essa doutrina tornou-se
revivificável, tal com Hiram ou Osíris. Mas, sem a acácia reveladora, como saber onde cavar
o solo?
A discreta verdura, que, no Oriente, adorna as sepulturas abandonadas, contrasta com
a rosa que desabrocha alegre em nossos jardins. Símbolo de tudo quanto embeleza a vida
terrestre, essa flor de amor e de beleza reflete-se no lago, reservatório dos fluídos vitais. A
borboleta da Psique pousou sobre a corola perfumada pelos sentimentos delicados que uma
inteligência trabalhada sabe livrar dos grosseiros liames. A rosa do arcano 17 é a dos
cavaleiros do espírito, flor que será colocada sobre a cruz cuja madeira é fornecida pela

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acácia. Então a fé cessará de ser cega, o sentimentalismo religioso e a meditação filosófica
se harmonizarão para a satisfação das almas desejosas de crer com discernimento
Mas a aurora da compensação reservada aos Iniciados ainda não dissipa as trevas da
intelectualidade humana, embora possamos ver empalidecerem as estrelas do nosso céu
noturno ante o fulgor de uma delas, Lúcifer, o Portador da Luz, antigamente denominado
Vênus, a estrela da manhã. Esse astro é a grande estrela do arcano 17, que projeta seus
fogos verdes entre seus raios de ouro. A cor de Vênus alia-se assim à octoada de Isthar, por
excelência a deusa dos Caldeus. Estes divinizavam as estrelas, tanto assim que, em sua
escrita primitiva o ideagrama que representava uma estrela, lia-se: deus. Esse sinal foi
mantido pelos Assírios como determinativo dos nomes divinos aos quais precede, mas a
estrela de oito raios permaneceu como o emblema de “Ishtar”, divindade popular que atrai a
si a mais fervorosa devoção dos mortais. E como poderia ser de outro modo, se os humanos
julgavam dever a vida à meiga e generosa “Ishtar”? Feiticeira, ela inspira às almas o desejo
de tomarem corpo. Suas seduções nos levam à encarnação a fim de gozarmos os encantos
da existência terrestre, aceitando afrontar as provocações que ela impõe, pois, “Ishtar” exige
de seus fiéis a coragem de viver; quer que enfrentem com ânimo forte a luta pela vida. Suas
recompensas vão para aqueles que as merecem, aos enérgicos, não aos indolentes ávidos
de gozo sem trabalho.
Ela dispensa a cada um as alegrias que ele é capaz de apreciar; ao vulgar, os
passageiros prazeres animais, e aos seres mais refinados as satisfações duráveis, mais
elevadas. O eleito de “Ishtar” diviniza-se, elevando-se acima da matéria a fim de amar
divinamente. Notemos que “Ishtar” é dupla: guerreira pela manhã e langorosa à noite.
Matinal, desperta os dorminhocos, sacode o torpor dos espíritos e incita à revolta luciferiana
contra a tirania dos dogmas reinantes. No declínio do dia, o astro de “Ishtar” reaparece na
púrpura do poente. Sua luz é então de uma suave brancura que o homem fatigado
contempla com gratidão. Nessa hora os poetas vêem nela não mais a fogosa amante, mas
sim a casta guardiã de um paraíso vedado que domina o mar do ocidente, cuja brisa ali
acaricia as árvores carregadas de pedras preciosas; “Ishtar” torna-se então “Sidouri”. A
jovem do arcano 17 parece ser, ela também, uma encarnação da grande divindade feminina
adorada por nossos ancestrais. É a personificação da vida terrestre no que ela possui de
sedutor e de atrativos: é a natureza amável, clemente e bela, mãe eternamente jovem que se
torna a terna amante dos viventes.
Esta vida terrestre que amamos mais que tudo, apesar da escravidão material que ela
nos impõe, nos deixa mergulhados numa noite que seria completa sem as luzes do
firmamento. As estrelas simbolizam a obscura claridade da qual se beneficiam os humildes
em suas aspirações espirituais. Os filhos da natureza voltam-se para o ideal com uma
espontaneidade piedosa, que os conforta no cumprimento da tarefa terrena. Santificando as
coisas da vida, eles a divinizam. Devemos apreciar a sã beleza dessa concepção religiosa,
mais verdadeira em sua simplicidade do que os nossos sistemas ambiciosos, complicados
de uma inquietante metafísica.
As estrelas do arcano 17 são oito, o que nos conduz ao arcano 8 (a Justiça), ou seja, a
Inteligência coordenadora das ações e reações naturais. Mas aqui o oito retorna à unidade
da grande estrela, um setenário de astros mais modestos, dos quais 4 dispostos em
quadrado, são amarelos, e os outros três, azuis. O conjunto se relaciona às influências que
nossa personalidade sofre sob a influência dos corpos celestes; mas os fabricantes de
imagens da Idade Média não se embaraçaram com as noções atualmente clássicas em
astrologia. O setenário que eles atribuem à Vênus não é necessariamente o dos planetas
dos quais trata o horóscopo.
Vênus está em exaltação na parte do céu onde os Peixes são vizinhos de Andrômeda e
do quadrado de Pégaso. As estrelas fixas desse quadrado, unidas ao brilhante ternário de
Andrômeda, constituem assim um setenário ishtariano que merece ser tomado aqui em
consideração.
Feita a abstração de interpretações astrológicas por demais sábias, inspiremo-nos
apenas das sugestões imediatas do simbolismo e vejamos primeiro duas estrelas apenas: a
maior e a menor. Este brilho no centro da composição, sob a grande estrela e bem acima da

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loura cabeça da moça nua, na qual é permitido ver Eva, personificando a humanidade
encarnada. Esse astro minúsculo e próximo representa a estrela particular de cada
personalidade, porque nós temos cada um a nossa estrela, que é o receptáculo através do
qual as influências siderais se filtra a fim de se concentrar em nós.
Essa estrela pessoal é azul, assim como os dois astros maiores, colocados um pouco
mais altos, à direita e à esquerda. São os condensadores das influências que se exercem na
alma, que eles iluminam misteriosamente, a estrela azul da direita recolhendo o que pertence
à consciência e à razão (Sol), e a esquerda às intuições do sentimento e da imaginação
(Lua).
As estrelas amarelas partilham-se nas inclinações atribuídas a Mercúrio, Marte, Júpiter
e Saturno; mas a predominância de Vênus permanece tão marcada no arcano 17 quanto o é
na quiromancia, onde o Monte de Vênus é muito mais importante como volume do que os
outros.
Assim como os Peixes do Zodíaco nadam no oceano celeste de Ea, o deus caldeu da
suprema Sabedoria, esses habitantes dos espaços estrelares são tão menos estranhos ao
arcano 17, quanto lhes é contígua a constelação Andrômeda. Ora, essa princesa, filha de
Cefeu e de Cassiopéia, foi aprisionada nua no rochedo batido pelas ondas, onde um monstro
marinho a teria devorado, sem a intervenção de Perseu. Trata-se da alma vivente, ligada à
matéria, assim sendo, da Eva juvenil do Taro, cuja mãe, rainha da Etiópia, segundo a
mitologia, é em realidade a Natura naturante, figurada Perseu – arcano 2. Seu pai, o rei
negro, que reina sobre o abismo insondável do infinito, torna-se o Louco, cujo domínio
escapa à humana razão. Perseu que desposa Andômeda, corresponde à alma espiritual
(Neshamah),que na sua união com a vida da alma corporal (Nephesh Haiah), rapta esta
através dos ares da espiritualidade.
O arcano 17 ocupa o meio da segunda carreira do Taro, onde marca, tal como o arcano
6 que lhe é superposto, a passagem de uma fase da Iniciação para outra. Ora se o
Enamorado, no domínio ativo, passa da teoria à prática, a alma do místico, guiada pelas
Estrelas, alcança o discernimento teórico depois de ter entrado praticamente em relação com
o não eu.
De 12 a 16, o esquecimento de si mesmo não é apenas ensinado, mas imposto na
realização prática. Chegando ao 17, o adepto não tem mais que escolher deliberadamente
entre os dois caminhos, como o jovem Hércules do arcano 6, porque ele é predestinado: os
astros traçam-lhe um destino ao qual não cogita de fugir, pois que docilmente se abandona
às influências celestes que devem conduzi-lo à iluminação mística.
Esta é a recompensa das obras realizadas pelo impulso do coração e não resultado de
uma idéia metódica, tal como se impõe ao Iniciado doriano, cujos atos se inspiram de um
saber já adquirido. O Barqueiro (arcano 1) aprende teoricamente (arcanos 2,3,4, e 5) depois
passa pela prova moral (arcano 6), antes de aplicar sua ciência (arcanos 7, 8, 9 e 10) para
atingir à plenitude de seu poder (arcano 11). Ao contrário do Dorismo, baseado sobre a
posse consciente do eu e o desdobramento integral da personalidade, o Ionismo procede da
renúncia total do eu. O enforcado (arcano 12) leva o sacrifício até ao aniquilamento da
iniciativa individual (arcano 13), a fim de comungar com o que lhes é exterior (arcanos 14, 15
e 16); chega assim ao 17, que representa o estado de receptividade dos filhos da Natureza,
a simplicidade de alma e de espírito, sem a qual ninguém é admitido no Reino de Deus. A
iluminação mística, cujas etapas são marcadas pelos arcanos 18, 19, 20 e 21, esclarece
essa santa ignorância que se não perturba por nenhuma noção de vaidosa sapiência. O céu
instruirá a jovem rapariga nua, porque ela é virgem de qualquer ensinamento humano.
Os mistérios do arcano 17 são os do sono e da noite. Quando dormimos, evade-se a
nossa alma espiritual, liberta-se do corpo que repousa abandonado ao funcionamento
automático de seus órgãos.
Quais são, nas horas noturnas, as atividades do eu liberto? Não vivemos nós em parte
dupla, encarnados, depois periodicamente emancipados dos liames da carne? Haverá uma
necessidade mais imperiosa do que a do sono? Não podemos viver sem dormir. Assim nos
partilhamos entre duas existências, das quais uma nos é desconhecida. Cada manhã
voltamos de uma viagem cujas peripécias ignoramos. Quando muito resta-nos um eco, sob

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a forma de sonho, quando nosso cérebro anota imagens, testemunhas de inconsciente
atividade noturna. Não damos atenção a essas reminiscências, reveladoras pelo menos, no
entanto, de emoções provocadas por perturbações funcionais. O que um doente havia
sonhado guiava outrora o diagnóstico do médico; nos templos de Esculápio, onde os
suplicantes vinham dormir, gostava o deus de mostrar em sonho aos interessados o
remédio que podia curá-los. Hoje em dia, os “sujets” adormecidos se mostram mais
particularmente lúcidos quanto aos cuidados médicos que lhes são necessários.
O sono é pois uma fonte de informação que não deve ser desdenhada. Graças a ele
afasta-se a cortina do mistério, para autorizar alguns furtivos olhares que elucidam de algum
modo os demasiadamente vagos pressentimentos que fazem adivinhar um outro mundo. Os
sonhos foram os primeiros iniciadores da humanidade.
O que se passa, quando, cerramos à noite os olhos a tudo quanto nos cerca, partimos
para o desconhecido? Vamos nos comparar ao mergulhador, que, terminado seu trabalho,
retorna à superfície, onde se despoja de seu escafandro. Que contraste entre o fundo da
água, onde a vista do escafandro só alcança uma ínfima distância, e o vasto horizonte
luminoso que se avista logo que respira o ar livre. Suponhamos porém que toda lembrança
do alto se apague para mergulhar aquele que volta, novamente, ao seu penoso labor na
profundeza das águas. Assim nos representaremos nas nossas semitrevas em estado de
vigília, comparadas à luminosa emancipação que o sono nos proporciona. Não se embriaga
o nosso espírito, nem se cansa como o nosso corpo; enquanto este repousa, nossa
inteligência permanece incorporeamente ativa. Daí resulta que a noite traz conselho, em
virtude da clarividência adquirida pelo adormecido liberto do véu obscuro através do qual se
exerce sua atividade terrestre. Quando adormecemos preocupados com uma resolução a
tomar, ou um problema a resolver, acontece muitas vezes que ao despertar encontramos
uma determinação precisa, uma resposta da nossa pequena estrela azul que soube
interrogar suas irmãs maiores.

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ARCANO 18

Corresponde à letra TZAD do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: A LUA
Nome segundo Cagliostro: DECEPÇÃO
Nome segundo São Germano: RETARDAMENTO
Nome segundo o Anjo da Palavra: DUAS FACES QUE SE CONFUNDEM. AS LUTAS
CÍCLICAS ENTRE AKBEL E LUSBEL.

A fim de exibir os esplendores do céu, a Noite mergulha a terra nas trevas, porque as
coisas do alto só se revelam aos nossos olhos com prejuízo das coisas de baixo. Aspiramos
no entanto em unir o celeste ao terrestre por uma contemplação simultânea, tornada
possível, quando a Lua esparge sua pálida claridade. Esse astro que se associa às estrelas,
sem amortecer-lhes totalmente o brilho, só pela metade ilumina os objetos que prateia com a
sua incerta luz emprestada. A Lua não permite distinguir as cores; ela tinge de cinza
prateada ou de tons azulados as coisas, deixando aqui e ali o negro opaco das sombras da
noite.
Como, observando os efeitos do luar, não pensar na imaginação, cujo modo iluminativo
traduz-se de maneira análoga em nosso intelecto? O visionário imaginativo vê as coisas sob
um dia falso. Fascinado por Hécate, afasta-se do cintilar poético das estrelas, para
concentrar sua atenção sobre os contrastes do caprichoso claro-escuro lunar... Em
metafísica, são forjadas teorias errôneas, baseadas sobre as oposições irreais, efeitos
ilusórios de um jogo de ótica mental: do bem e do mal, do Ser e do Nada, faz entidades
objetivas e cai na armadilha de um dualismo fatal a toda apreciação sã da realidade. Vítima
dos contrastes aparentes, imagina a matéria densa, sólida, pesada e indestrutível, quando
ela se resume, em última análise, a ínfimos turbilhões de uma indestrutível substância
elétrica. Os erros capitais do espírito humano derivam da imaginação que não se pode
impedir de objetivar o subjetivo. Ora, como essa faculdade feminina desperta antes da razão
masculina, nós primeiro imaginamos, depois então procuramos raciocinar e assim nos
esforçamos em construir logicamente por meio de representações equívocas. Não é
brilhante, o resultado.
Precisamos no entanto conquistar a plena luz, explorando a nossos riscos e perigos o
imenso espaço que a Lua só parcialmente e de modo muito imperfeito ilumina. O campo que
se nos apresenta é um terreno acidentado, onde são inevitáveis os passos em falso.
Esperemos freqüentes tombos, atentando nas armadilhas dissimuladas.
Felizmente que outros nos procederam nessa perigosa exploração. Seus passos
traçaram uma senda onde ficaram gotas de sangue. Essa pista dolorosa conduz à meta
aquele que persevere a despeito dos obstáculos e das ameaças. O temerário que ali penetra
logo encontra um charco onde coacham as rãs. O ruído atrai o viajor curioso de contemplar a
Lua; avança sobre o solo que se torna cada vez mais úmido, até o momento em que seus
pés submergem. Receoso, recua para alcançar uma pequena elevação de onde admira em
segurança o jogo da luz noturna na superfície da água estagnada.
Faz aqui alusão aos produtos da imaginação; essa atração ameaça parar a nossa
caminhada retendo-nos no campo das concepções inconsistentes; por isso é melhor apreciar
o encanto das ficções permanecendo em terreno sólido. O que os poetas imaginam lhes é
sugerido por uma misteriosa realidade, porque, por mais poderosa que seja a fantasia, não
podem eles criar “ex nihilo”. Nada é radicalmente fictício, uma mui sutil matéria primária,
análoga a dos Alquimistas, é posta em ação pelo espírito que inventa. Mitos, fábulas e
contos populares procedem de verdade demasiadamente profundas para serem expostas
em linguagem direta; assim deleita-se nessas leituras o pensador quando descobre o
esoterismo sob os véus de uma aparência ingênua e grosseira. Rejeitar as superstições, à
maneira dos pretensos “espíritos fortes”, é uma fraqueza, porque a credulidade nunca é
inteiramente cega; uma instintiva lucidez faz com que ela se prenda a poderosas verdades,
difusas demais porém para que os raciocinadores possam captá-las.

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Em vez de se desviar desdenhoso do charco da fé instintiva, o sábio procura penetrar-
lhe o mistério. Mesmo em pleno dia, ele nada perceberia do que se agita no charco, mas à
claridade da Lua, distingue um imenso caranguejo emergindo imóvel da água. Esse
crustáceo devora tudo quanto é corrompido. Graças a ele o poço não deixa escapar nenhum
vapor malsão. Seria funesto deixar permanecerem mortas crenças que levam às práticas
repreensíveis; o feroz caranguejo a isto se opõe. Se caminha para trás, é porque seu
domínio é o passado, não o porvir ao qual foge. O que ele assimila forma-lhe um casco
petrificado, mas temporário, pois que o animal o atira fora quando se torna por demais
pesado. Possa ele ensinar às crenças corporificadas a se renovarem quando chega o tempo!
O caranguejo do Taro é vermelho, não por estar cozido, mas ao contrário, em razão do
fogo interno que faz com que ele despenda uma incessante energia ativa a fim de realizar
sua missão salutar. Convém lembrar aqui a analogia dos contrários que, na dupla fila do
Taro, superpõe o arcano 5 ao arcano 18. O Papa – arcano 5 – recolhe as crenças a fim de
sintetizá-las sob a forma de dogmas positivos, ao passo que o Caranguejo – arcano 18 –
procede por seleção negativa, devorando o que se decompõe e não mais permanece de pé
diante do bom senso dos crentes. O crustáceo respeita o que tem razão de ser, mas não
mantém escola e não dá ares de doutor.
Os astrólogos ali reconhecem o Câncer, domicílio da Lua. Quando, em seu circuito
anual, o Sol atinge essa divisão do Zodíaco, começa a declinar como se de repente se
tivesse convertido de suas ambições ascensionais. O período do Câncer favorece por
analogia a volta sobre si mesmo, o exame de consciência, e a conversão do pecador, como
se, nas águas turvas da alma se agitasse então um caranguejo purificador. A esse animal os
egípcios substituíam o escorpião zodiacal, símbolo da regeneração moral e psíquica. Junto à
cloaca onde reina o Câncer, dois cães vigiam a estrada que é astronomicamente a do Sol.
São os ladradores da Canícula, o Grande e o Pequeno Cão da esfera celeste. Eles ladram à
Lua para impedir que ela ultrapasse os limites dos trópicos, porque esse astro fantasista
afasta-se constantemente da linha da elíptica traçada pela imutável marcha do Sol.
Os cães tornam-se Cérberos prepostos à defesa das religiões interditadas onde se
perde a imaginação. Seus latidos redobram quando se aproxima o audacioso que prossegue
em sua peregrinação. Velam em manter o que é admitido, não só no que concerne à fé e ao
sentimento, como também em matéria de instituições sociais ou políticas. O pequeno
cachorro branco da esquerda rosna com raiva contra os ímpios, que se recusam a crer o que
é admitido por verdadeiro. Ele se levanta sobre as patas, porque sente-se a serviço de
interesses espirituais. O grande cão preto da direita permanece deitado, em razão de seu
positivismo que o prende à terra. Ansioso pela boa ordem e pelos direitos intangíveis da
prosperidade, uiva contra os revolucionários que inspiram projetos subversíveis. Aquele que,
com passo firme, avança desdenhoso entre os dois cães, impõe-lhes receio, e não é atacado
por eles.
Eis, porém duas maciças fortalezas, duas torres quadradas desiguais em sua forma, da
torre redonda do arcano 16. Os muros da cor de carne fazem delas edifícios vivos e a cúpula
dourada, erguida sobre base vermelha, as assimila aos seres inteligentes, capazes de agir
com discernimento. São corpos, ou melhor corporações, colocadas como sentinela para
avisar ao imprudente dos perigos que o ameaçam, se, depois de passar pelos cães,
pretende lançar-se na estepe pérfida onde a Lua o atrai.
Da torre da direita, que está iluminada, vem os avisos prudentes sobre a triste sorte das
vítimas de Hécate, expostas à perda do equilíbrio mental, da razão, da saúde moral, e
mesmo da vida.
O obscuro corpo de guarda da esquerda não é mais tranqüilizador; ali se ouvem
ameaças místicas sobre a impiedade de ceder a uma tentadora curiosidade que compromete
a salvação da alma. Pensemos no paraíso perdido e não almejemos o fruto da árvore de
uma ciência maldita!
Se uma irresistível atração do mistério impele o predestinado que não atende à voz das
duas torres, nada mais o deterá. Chamado a passar pelas terríveis provas da Iniciação,
entrará no negror de uma espessa floresta, onde há de sentir o perpassar de fantasmas,
depois de galgar uma subida de onde sua vista descortinará ao longe uma planície prateada.

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Mas um precipício o aguarda; ali cai num charco do qual se ergue dolorido, para ir alcançar
mais adiante um regato purificador. É um rio de rápida correnteza, que é obrigado a
atravessar a nado, pois tem que alcançar a margem oposta que é árida e ardente. Naquela
ocasião deve ele errar até que a aurora lhe permita reconhecer-se entre as dunas, por trás
das quais se erguerá o dia.
O arcano 18 representa a Lua por meio de um disco de prata, sobre o qual se destaca
um perfil de rosto feminino de traços inchados. Desse disco partem dois longos raios
amarelos, entre os quais aparecem curtos reflexos (vermelho). Isto significa que a
imaginação, faculdade lunar, favorece o visionarismo objetivando as formas-pensamento;
mas pouco ajuda a compreender e a captar a essência eterna das coisas. Embora seja
Hécate enganadora, temos que passar por sua escola para aprender a não mais nos
iludirmos com as suas ilusões. As gotas derramadas, vermelhas, verdes e amarelas, que a
Lua parece atrair, correspondem aos globos da mesma cor do arcano 16, mas as
emanações terrestres vão ao satélite que toma sem dar nada. A luz fria do astro noturno
tende a reabsorver a vitalidade dada pelo Sol, e daí a recomendação popular de nunca
dormir alguém exposto aos raios da Lua.
Um antigo Taro põe em cena um harpista que, ao luar, canta para uma bela jovem
seminua, debruçada à sua janela, para soltar a cabeleira; uma porta solidamente trancada
protege a moçoila contra as investidas de seu apaixonado.

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ARCANO 19

Corresponde à letra COPH do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: O SOL
Nome segundo Cagliostro: FELICIDADE
Nome segundo São Germano: PACIFICAÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: A REALEZA
EQUILÍBRIO DO ANDRÓGINO NO
APRISIONAMENTO DA LIBERTAÇÀO
(LIBERDADE CONDICIONAL)

As vicissitudes que nos vêm da Lua são as provações indispensáveis que nos
conduzem à claridade solar. Nós só chegaremos à luz após haver o definhamento das trevas
e estamos nos debatendo através do erro. É necessário que nos enganemos dolorosamente
a fim de aprender, às nossas custas, a arte de discernir o falso do verdadeiro e nos
orientemos na direção do ponto no horizonte de onde jorra a luz. As provações da vida
terrestre não visam a outro objetivo que não a nossa instrução; tiremos proveito dessas
lições e a iniciação será nossa recompensa.
Para se chegar lá, as purificações tradicionais se impõem. Elas visam a tornar
transparentes nossas aparências opacas, a fim de que a verdadeira luz de nosso mundo,
aquela proveniente do Sol, possa nos penetrar. Dentro de sua irradiação esse astro é de
uma fixação imutável. Todos os dias, identicamente à sua própria natureza, ele brilha para
todos com imparcialidade. Se alguns aproveitam melhor que outros de seus benfazejos
raios, é porque eles souberam desviar-se dos obstáculos que se interpuseram entre eles e a
pura luz que aclara os espíritos.
Não se trata mais de uma claridade falsa, como a Lua, que empresta enganosos
contornos às coisas e não permite que se distingam os objetos com toda a clareza. O Sol
revela a realidade das coisas e as mostra como verdadeiramente são, despojadas dos véus
de toda ilusão. Diante dele a neblina se dissipa e os fantasmas se esvanecem. É assim, com
esse sentido, que a alma encarnada encontra nele a redenção prometida. Ela então é
condenada à luta no seio da matéria, com um objetivo, por ela mesma traçado, até que torna
possível a união do espírito aprisionado na carne com a espiritualidade universal.
Podemos considerar agora o arcano 19, cujo simbolismo está límpido.
O par juvenil, que se coloca carinhosamente abraçado no centro de um gramado
circular, repleto de flores, representa a alma individual unida ao espírito, o sentimento
esposando a razão; são o corpo e a harmonia se realizando em maior escala, dentro do
conjunto da humanidade regenerada.
Quando os homens forem possuidores da razão, quando a luz redentora do Sol dos
espíritos livrar os auras de seus erros, nessa hora, eles retornarão ao paraíso não aquele do
penoso inocente e primitivo abandono, mas o Éden laborioso da civilização real, onde reina a
paz completa do auxílio mútuo que alivia todas as tarefas.
Este ideal não será atingido de uma só vez, como por meio de um milagre ou de uma
proclamação. Sua realização deve ser perseguida e acessada individualmente. Que cada um
de nós comece a regenerar a si próprio, antes de sonhar com a regeneração social e
humanitária. Tanto que se as pedras não forem talhadas em ângulo reto, nenhum muro sólido
poderá ser construído. Sendo assim, antes de se edificar o grande Templo onde comungarão
todos os seres humanos, falta-nos eregir as muralhas contra a ferocidade restante, brutal e
rebelde com a fraternidade. A elite representada pelos jovens do Sol não pode se fraternizar
senão ao abrigo de uma muralha construída, composta, segundo o Arcano 19, de duas fiadas
medianas de tijolos azuis, colocadas em três outras fiadas cujos tijolos são alternadamente
vermelhos e amarelos. Essas cores atribuem a coesão social à idealidade sentimental (azul), à
religião construtiva que se traduz numa moral prática aplicada aos atos da vida. Ela pertence
ao sentimento de conciliar o antagonismo entre o vermelho e o amarelo, em acalmar os
conflitos da energia ativa (trabalho - amarelo) e do saber adquirido ou das riquezas
amareladas[capital – amarelo]. O espírito de fraternidade, que é o cimento de toda construção

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humanitária, somente se pode preparar com concessões recíprocas sobre as quais se
fundamenta uma civilização necessariamente legal e conciliatória; a força e a inteligência aí
não conseguem empregar as suas únicas tendências.
Pode o Taro reconduzir à Sabedoria desorientados que conseguiram uma idade de
riqueza conquistada pela violência! Os ódios cegantes mantidos pelos fanáticos da luta das
classes não fazem mais do que agravar a miséria humana. Só o espírito solar de inteligência e
de fraternidade realizará a felicidade terrestre pela cooperação harmoniosa dos antagonismos
sociais; conciliação com o discernimento da compreensão recíproca. Porém os argumentos
que não se endereçam pela inteligência não possuem o dom de comover as almas para a
aproximação até a fusão. O que religa é religioso e parte do coração muito mais do que do
cérebro, donde a importância das fiadas azuis na muralha da civilização. Elas se referem à
religião do Sol professada pelos sábios, que, insatisfeitos da existência friamente aclarada,
penetram-se do calor generoso, estimulante de atos de uma constante beleza moral.
A fortuna da qual gozam nem poderia lhes deixar encantados, pois são eles que a
criam. Longe de toda a beatitude egoísta, eles admiram nos artistas a obra de Deus e a eles
se associam por toda sua existência, na vibração de tudo que é capaz de vibrar neles ou com
eles. Discernindo o Belo, eles conduzem a luz redentora ao seio da confusão tumultuosa
nascida do choque cego das paixões humanas. Participando da Grande Obra de Redenção
Universal, eles contribuem para reerguer o homem de sua queda original (arcano 16) e
trabalhando para reintegrá-lo em sua dignidade de ente divino.
Os jovens se confraternizam sob o Sol correspondem do mesmo modo a Gêmeos cuja
constelação zodiacal nos traz os mais longos dias (no hemisfério norte). É verdade que
“Castor” e “Polux” são do mesmo sexo, mas neste caso um rapaz e uma donzela os
representam no Taro. O simbolismo não é afetado, pois o novo Adão e a nova Eva do Arcano
19 permanecem fortes se acomodando à lira que é o principal atributo dos filhos de Leda,
procedente do mesmo ovo que sua irmã Helena.
Quanto à lira, sua falta é de se lamentar, pois são pelos acordes da harmonia
conseguida por um poderoso artista que as pedras se animam e se unem umas às outras,
como na hora da construção das muralhas de Tebas, a cidade santa, pelos efeitos dos
encantamentos de Anfior. A parede da muralha da cidade da paz se reconstruirá por si só, com
a ajuda das matérias animadas, obedientes às solicitações musicais da Grande Arte, cuja
magia revela o Homem-Obreiro adormecido no interior do Homem-Matéria. Pedras viventes,
os homens se organizam pelos acordes da lira para se unirem harmoniosamente: dessa união
nasce o edifício sagrado da civilização definitiva do conjunto humano.
Trabalhando sobre a substância humana, efetiva matéria primordial da Grande Obra, os
Jovens da Luz transmutam chumbo vil das bases instintivas no puro ouro moral e intelectual.
De um ignorante totalmente egoísta, eles se esforçam para fazer um sábio ansioso por entrar
em harmonia com a vida, a fim de viver a beleza. Artistas amorosos da Arte, eles trabalham
com alegria, felizes de produzir. Eles reconquistaram o Paraíso, porque amam o trabalho
divino, para o qual eles são livremente associados a fim de contribuir para o desmantelamento
do caos humano, de conformidade às intenções criativas. Nós retornaremos ao Éden perdido
desde que aceitemos nossa tarefa de criaturas condenadas ao trabalho, não por punição, mas
por necessidade de evolução, porque nós não podemos nos reerguer da decadência animal se
não houver consentimento em trabalharmos com toda a nossa vontade, por gosto e por amor.
De escravos constrangidos ou posteriormente de mercenários, nos transformaremos em
Livres-Artistas, Livres-Construtores ou Franco-Macons realizadores do plano do Supremo
Arquiteto, pela nossa compreensão da inelutável lei da vida, que é aquela do Trabalho.
O Taro de Carlos IV e de outros posteriores, apresenta sob o Sol uma graciosa moça
de pé ou sentada, que segura uma roca (de fiar) e parece fiar aos homens um destino menos
sombrio que aquele com o qual as Parcas nos presenteiam. Outras variantes apresentam a
figura de um cavaleiro apocalíptico lançando-se através de chamas, sob o abrigo do
estandarte desfraldado de fé solar.

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ARCANO 20

Corresponde à letra RESH do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: O JULGAMENTO
Nome segundo Cagliostro: JULGAMENTO
Nome segundo São Germano: RESSURREIÇÃO
Nome segundo o Anjo da Palavra: O ESPÍRITO RESSUSCITA NA CARNE. CÍCLICO
APELO AOS VASOS DE ELEIÇÃO.

O Cabalista Oswaldo Wirth, em seu livro “Le Tarot dês Imagiers du Moyen-Áge”, assim
se expressa sobre esta 20ª Lâmina do Taro:
“Por mais resplandecente que seja a luz solar, ela pára na superfície das coisas, sem
chegar a revelar-nos a essência íntima que encerra e que nossos sentidos não apreendem.”
Ora, as obras de pura beleza, quer produzidas pela Natureza, ou pela Arte, traduzem em sua
forma exterior um esoterismo, ou espírito interior oculto, que à inteligência humana incumbe
discernir. Intervém, então, o Julgamento, a fim de distinguir o espiritual do material, o sentido
profano do significado de forma expressiva, o Verbo vivo da letra morta. Tudo é símbolo,
porque tudo procede da idéia geradora que se prende a concepções transcendentes.
Penetremos na profundidade das coisas, onde dormita um pensamento que aguarda que o
nosso espírito o desperte e o assimile. O gracioso conto de “A Bela Adormecida no Bosque”
desenvolve esse tema, que serve igualmente de inspiração ao quadro do último julgamento,
tal como foi traçado pelos autores do TARO.
Longe de qualquer idílio, ei-nos transportados ao vale de Josafá, que um anjo
apocalíptico faz estremecer com os estrondos que despertam os mortos. Estes ressuscitam,
não em corpo, mas em espírito, pois que ressurreição geral não é a carne, a menos que
esse termo seja compreendido alegoricamente, para significar aquilo que é capaz de reviver.
O passado só merece reviver em sua espiritualidade, embora esta permaneça
incompreensível às gerações presentes. Preciosas verdades dormem na sepultura do olvido;
estão mortas para os séculos que as ignoram. Mas, coisa alguma se perde no domínio do
espírito; uma memória fiel guarda em segredo aquilo que os antigos sábios ensinaram, a fim
de que os homens sejam instruídos nessas coisas do dia da universal compreensão.
Então, a Humanidade conhecerá o reino do Espírito Santo, que realizará sua unidade
religiosa baseada sobre o esoterismo comum a todas as religiões. Estas se opõem uma às
outras apenas na parte externa (culto e dogmatismo), letra morta da qual convém fazer
abstração em benefício do espírito vivificador, único universal. A Sabedoria Universal visa
aos espíritos esclarecidos, que se abrem a tudo quanto seja profundamente religioso. É a
religião da família piedosa que, de mãos postas, ouve, sem temer e sem temor, a sentença
suprema que o Anjo do Julgamento pronuncia.
O Ternário humano que ressuscita representa a humanidade regenerada, Pai e Mãe
estão frente ao Filho, no qual se reconhece o principal personagem do TARO, o mancebo
louro já encontrado em seus sucessivos papéis de Mago Criador (arcano 1), do Amoroso
(arcano 6), do Triunfador (arcano 7) e do Enforcado (arcano 12). É o assunto da Grande
Obra, o Iniciável sofrendo provações iniciáticas para conquistar o Adeptado.
A fim de possuir em espírito e verdade esse supremo grau, é preciso morrer duas
vezes e nascer três vezes. Renunciando a vida profana, o Iniciado morre e renasce uma
primeira vez. Ingressa, então, na carreira iniciática como numa nova vida, que inaugura seu
segundo nascimento. Mas, sendo embora superior à multidão profana, essa vida dos
Iniciados do primeiro e segundo grau ainda não realiza o ideal definitivo. O bom Operário
trabalha com uma inteligente docilidade sob uma direção que está fora do seu alcance, pois
que não foi ainda admitido no conselho dos Mestres. Executa fielmente instruções cuja
sabedoria aprecia, sem julgar-se capaz de reformulá-las.
A construção do Templo humanitário vai assim prosseguindo, gerações após gerações,
segundo luzes que não são simplesmente as do dia em que vivemos. O futuro não se
improvisa arbitrariamente; é sólido somente quando realiza velhas aspirações, dando corpos

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aos fervorosos desejos daqueles que, durante séculos e sem desanimar, sonharam o
melhor.
Os antepassados construtores de uma Humanidade melhor são representados no
TARO pelos progenitores do Jovem ressuscitado do Arcano 20. Colocado à direita, o Pai
encarna toda a filosofia construtiva do passado, tudo quanto a razão humana concebeu de
profundo e de sábio, concernindo a Grande Arte que é a Vida vivida em plena inteligência de
suas leis. À esquerda, a Mãe corresponde ao coração, ao sentimento religioso de amor que
as almas realmente piedosas sempre abrigaram.
Herdeiro de seus pais, o Filho recolhe o que lhe vem da direita e da esquerda, a fim de
agir como fiel executor testamentário do passado que permanece vivo. Ele se afirma Senhor
na medida em que a eterna Tradição construtiva, o legendário HIRAM dos Maçons, encontra
nele seu intérprete.
Será possível que um corpo possa mudar de espírito? Podemos morrer para nós
mesmos, a ponto de abandonar nosso organismo, a fim de que um espírito mais elevado do
que o nosso tome posse dele? Essas perguntas encerram o formidável problema do Espírito,
sopro animador infinitamente múltiplo em suas manifestações, mas UNO em sua essência.
Aproximando-se da Unidade, nosso espírito, permanecendo embora idêntico a si mesmo,
transfigura-se para deificar-se em proporção da nobreza à qual se eleva.
Tal o ideal proposto pela iniciação: divinizar-se aproximando-se, tanto quanto a
natureza humana o permita, da perfeição divina. “Sede perfeitos como vosso PAI CELESTE
é perfeito”. Não se pode falar melhor do que falou o Evangelho. Todo o problema iniciático
implica uma espiritualização progressiva cada vez mais completa, mas nunca aspirando a
fugir das obrigações do trabalho terrestre. O Iniciador morre, não para desertar do campo de
batalha, mas a fim de poder mais eficazmente contribuir na luta em favor do bem.
Se ele escapa à população brutal, a fim de planar à maneira dos aviadores, é em vista
de dirigir seguramente aqueles que se arriscariam a combater num ponto de vista por demais
limitado. Mas, a Iniciação prefere as imagens pacíficas. A vitória a conquistar é a do espírito,
que, por um trabalho inteligente e sem violência cruel, vence os obstáculos que lhe opõe a
matéria. Esta não é para ser tratada como inimiga que se deva destruir, mas sim, como uma
substância a ser trabalhada; ela aprisiona o espírito, não para retê-lo indefinidamente, mas
para obrigá-lo ao esforço libertador.
Enquanto permanecemos concentrados sobre nós mesmos, confinados na estreiteza
de nossa vida individual, não participamos da Grande Vida verdadeira, e nos comportamos
como mortos isolados no túmulo corporal. Despertemos, e, de pé no nosso sepulcro aberto,
aspiremos o sopro do Espírito Universal; vivamos, desde esta vida, a Vida Eterna!
O Anjo despertador dos espíritos desdobra no TARO asas verdes, porque seu domínio
é o da vida espiritual (o verde, na Igreja, cor do Espírito Santo). Sua túnica azul, bordada de
branco, significa a pura idealidade celeste, inspiradora de uma incessante ação, como o
indicam os braços vermelhos do anunciador do Julgamento.
O vermelho é também a cor da bandeirola que prende a trombeta de ouro do
mensageiro do despertar. Uma cruz de ouro partilha o campo em quatro quadrados que
atribuem à suprema espiritualidade o poder realizador de uma quádrupla Pedra Filosofal.
Uma alternativa de púrpura e de ouro caracteriza, alias, as emanações do Anjo do
Julgamento, cuja dourada cabeleira irradia-se sob uma coifa hemisférica de um vermelho
vivo, semelhante à forma do chapéu do Mago Criador (arcano 1). Trata-se aqui, da fogueira,
na qual se condensa em estado vivo o pensamento inspirador que exterioriza o ouro das
verdades imutáveis. Os cabelos do Anjo correspondem aos princípios transcendentes, dos
quais brotam noções inacessíveis à inteligência humana, noções figuradas pela glória
luminosa encerrada no círculo das nuvens de onde partem raios vermelhos e dourados.
Nossa vista intelectual imobiliza-se ante essa nuvem circular, na qual o abstrato se
concretiza a nosso favor, a fim de manifestar-se sob a forma de projeções inspiradoras, das
quais algumas se traduzem, para nossa inteligência, em idéias geniais (raios de ouro), ao
passo que outras (raios vermelhos) impelem às grandes e belas ações.
Línguas de fogo, análogas às de Pentecostes, precedem permanentes raios
inspiradores. Esses flamejamentos são vermelhos, verdes e amarelos, pois eles outorgam

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individualmente os dons de espírito aos heróis da ação generosa (vermelho), às almas
ternas que se devotam ao serviço da Vida (verde) e aos instrutores encarregados de
distribuir os tesouros do puro saber (ouro).
Na fronte do Anjo, brilha o signo solar, marca de discernimento já encontrado como de
iluminação da Justiça (Arcano 8) e da Temperança (arcano 14). Esta tríplice aparição do
ideograma do verbo coordenador relaciona-se em primeiro lugar à coordenação do caos
físico, no seio do qual a lei de equilíbrio (Arcano 8) realiza a estabilidade relativa, que se
preste à constituição dos organismos. A Luz construtiva é, em seguida, inerente às
manifestações vitais, porque a vida não se derrama cegamente: ela se expande com
intenção, em vista de um fito determinado, do qual aparece a iluminação do Gênio das duas
urnas (Arcano 14). Mas, a ordem e a claridade, não menos, se impõem no domínio espiritual,
onde a luz plena somente brilha graças à entrada em comunhão do intelecto individual com a
inteligência coletiva do gênero humano (Arcano 20).
A fim de descobrir a constelação que apresenta maior afinidade com o Arcano 20,
convém contemplar o Cisne de Leda como o equivalente pagão da Pomba de Espírito Santo.
A espiritualidade sobre-humana, figurada pelo Senhor do Olimpo, se metamorfoseia num
grande pássaro branco para fecundar uma mortal, que há de gerar os Gêmeos e sua irmã
Helena, ou seja, a Fraternidade (Arcano 19) e a Beleza (Arcano 17). Júpiter personifica,
ainda, o Fogo celeste e animador, que se casa às chuvas fertilizantes que derrama, o
Aquário (EA, INDRA, JÚPITER CHUVOSO), e com a qual a Terra é saciada sob o signo dos
Peixes (Arcano 17). Ora, o Cisne Celeste anuncia a primavera, o despertar da vegetação,
cuja ressurreição anual, está conforme o simbolismo do arcano 20. Deve-se notar, também,
que o Cisne abre suas asas sobre a Via Láctea, caminho das almas atraídas pelo Palácio de
Júpiter, onde elas gozarão da Imortalidade.

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ARCANO 21

Corresponde à letra SHIN do alfabeto hebraico.


Nome vulgar: O LOUCO
Nome segundo Cagliostro: EXPIAÇÃO
Nome segundo São Germano: LOUCURA EXPIATÓRIA
Nome segundo o Anjo da Palavra: DESLUMBRAMENTO PELA VOLTA AO DIVINO.
FIM DA EVOLUÇÃO.
NEM UM NEM OUTRO.
REDENÇÃO DE LUSBEL.

Em alguns TAROS, mais antigos esta Lâmina dos Vinte e dois Arcanos Maiores é
representada por um ZERO, porque o LOUCO é o personagem que não conta, dada à sua
inexistência intelectual e moral. Inconsciente e irresponsável, ele se arrasta na vida como um
ser passivo, que não sabe para onde caminha, deixando-se levar por impulsos irracionais. A
si mesmo não se pertence; assim não se pertencendo é um possuído; é um alienado em
toda a expressão do termo. Sua roupa é multicor, a fim de indicar as múltiplas e incoerentes
influências. O turbante, onde se acumulam maluquices, é vermelho, verde, branco e
amarelo, mas o vermelho é alaranjado, cor de fogo destruidor que sugere idéias perigosas.
É do mesmo tom o cajado que o LOUCO segura na mão direita, e com o qual se
embaraça inutilmente, pois ele não faz bengala para caminhar, nem ponto de apoio, e muito
menos utiliza à maneira do Ermitão (Arcano 9) para sondar o terreno no qual avança. Olhos
perdidos nas nuvens, o insensato segue a sua estrada ao acaso de seus impulsos, sem
indagar aonde vai. Com a mão esquerda, o LOUCO mantém sobre o ombro direito uma
espécie de rede grosseira, a qual encerra o seu tesouro de tolices – extravagante idealidade
revelada pela cor azul do segundo cajado. Às vezes, meio rasgadas e pendentes, mostram o
que deviam ocultar; absurda exibição que faz pensar no que sucedeu a MOISÉS, desejoso
de contemplar JAVEH face a face. Como o infalível nos escapa, o indiscreto teve que se
contentar com o espetáculo da criação, que corresponde ao avesso da DIVINDADE.
Devemos ter a prudência de não ultrapassar o domínio limitado da razão. O INFINITO não é
da nossa competência e quando tentamos abordá-lo, fatalmente nos falha o raciocínio.
Tenhamos, pois, cautela em não seguir o LOUCO que, mordido no calcanhar esquerdo
por um lince branco (animal lunar), é impelido a caminhar sem repouso, pois que a marcha
desse JUDEU errante não tem meta nem objetivo. O lince, cuja vista é penetrante, impele o
inconsciente viandante para um obelisco derrubado, atrás do qual o espreita um crocodilo,
pronto a devorar aquilo que deve retornar ao caos, ou seja, a substância primordial de onde
surgiu o mundo coordenado. Símbolo da lucidez consciente e do remorso que se apega às
faltas cometidas, o lince seguraria um ser capaz de discernimento; mas, longe de fazer parar
o LOUCO, a mordida apressa o seu caminhar para um inevitável destino.
Não se deduz, porém, que o insensato não possa recobrar a razão, porque uma tulipa
de um vermelho púrpura, sugestivo da espiritualidade que age, pende a seus pés uma corola
que não está murcha. Se a flor não está morta, é sinal de que o espírito não abandona
inteiramente os irresponsáveis, que são inocentes. Além disso, o LOUCO tem um precioso
cinto de ouro, que contrasta com a miséria de sua vestimenta.
O cinto compõe-se de placas, sem dúvida em número de doze, por analogia com o
zodíaco, pois encerrra o corpo de um personagem cosmogênico de extrema importância. O
LOUCO representa, com efeito, tudo quanto fica além do domínio inteligível, assim, pois, o
INFINITO exterior ao FINITO, o ABSOLUTO envolvendo o RELATIVO.
Ele é APSOU, o abismo sem fundo, o ancestral dos DEUSES, que estes relegam fora
do Mundo, quando resolveram criar para eles um império.
Porque APSOU comprazia-se em sua infinitude, nela ele repousa com delícias e
recusava-se a abandoná-la. Jamais criaria qualquer coisa, se a sua união com a substância
primordial, não diferenciada, não o houvesse tornado PAI inconscientemente do primeiro
divino par.

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Esses primeiros nascidos, agarrando-se um ao outro, puseram-se a dançar em roda, ou
seja, a evoluir circularmente no éter, ali determinando o movimento gerador de todas as
coisas. Evitemos, porém, todo antropoformismo para imaginar o filho e a filha de APSOU,
pois que suas formas nebulosas ligam-se à dos ofídios, e, sem dúvida, mais especialmente à
de OUROBOROS, a serpente que morde a própria cauda, à qual a faixa do LOUCO faz
patente alusão. O Círculo formado pela faixa pode, aliás, relacionar-se mais simplesmente
ao ALUM dos Alquimistas, cujo sinal é um zero exatamente circular – 0. Ora, o ALUM é o sal
princípio de outros sais, o substratum imaterial de toda materialidade. É o pretenso NADA
que enche o vasto primordial do qual provém, substância pacífica que o LOUCO personifica.
Esse insensato previne contra a divagação que espreita o espírito logo que ele
pretende ultrapassar os limites do REAL, dos quais I e XXI, ALEPF E SHIN assinalam o
começo e o fim, pois que o XXII, o THAU, é a síntese dos 21 Arcanos anteriores. O Arcano
21 (sem número) relaciona-se àquilo que não conta, ao fantasma irreal que nós evocamos
sob o nome de NADA, por oposição ao TODO-UM, fora do qual nenhuma existência é
concebível. O sábio não pode ser vítima das palavras; longe de objetivar exteriormente a
negação verbal do SER, ele busca em si mesmo o LOUCO, tomando consciência do vazio
da estreita personalidade humana, que tanto lugar ocupa em nossas pobres preocupações.
Aprendemos que nada somos e o TARO nos terá assim confiado seu último segredo!
A Constelação que melhor responde ao simbolismo do XXI Arcano do TARO, é a de
Cefeu, Rei da Etiópia, marido de Cassiopéia (Arc. II, a Papisa) e Pai de Andrômeda, a
rapariga nua do Arcano XVII. Esse monarca africano é negro, cor que atribuímos ao LOUCO,
embora os fazedores de imagens jamais o tenham pintado de preto, assim como também
não enegreceram a Papisa, guardiã das trevas que pairam sobre o abismo onde se perde a
inteligência. Filha de um Pai negro e de uma Mãe que, a rigor, poderia ser branca, a
Andrômeda do Arcano XVII devia ser pelo menos morena e não loura.
Mas, essas aproximações astronômicas, que não nos são fáceis, não estavam ao
alcance dos autores do TARO, cuja obra ficou a aperfeiçoar em pontos diversos. Na esfera
celeste, Cefeu coloca os pés sobre a extremidade da cauda e a parte trazeira da Pequena-
Ursa, que assim não pode mordê-lo, ao contrário do lince que se agarra aos calcanhares do
LOUCO.

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ARCANO 22

Nome vulgar: O MUNDO


Nome segundo Cagliostro: RECOMPENSA
Nome segundo São Germano: VITÓRIA DA MÔNADA
Nome segundo o Anjo da Palavra: LAURENTA OU VITÓRIA DOS QUATRO
ANIMAIS DA ESFINGE

Jeroglificamente, o THAU expressa o SEIO, da mesma forma igual que a Letra


DALEFH (Arc. IV). Porém, mais especificamente, é o signo dos Signos, pois une os
caracteres de DALETH e a força de resistência e de proteção de TETH (Arc. IX), a idéia de
perfeição, que é a essência de seu símbolo.
No primitivo Alfabeto Hebraico, a Letra THAU se representava por uma CRUZ. É uma
Letra Dupla, representada astronomicamente pelo SOL.
No centro de uma eclipse, aparece uma jovem desnuda. Em cada mão, sustém uma
bagueta. Mantém as pernas cruzadas, tal como o faz o Enforcado do Arcano XII. Em cada
canto da lâmina, aparecem sucessivamente os quatro animais citados pelos Evangelistas e
os quatro Elementos da Esfinge: – o Anjo, o Leão, o Touro e a Águia. Este símbolo
representa o Macrocosmo e o Microcosmo, ou Deus e a CRIAÇÃO ou a LEI DO
ABSOLUTO.
Os três Setenários em que se divide o TARO MAIOR, assim podem ser enumerados:

1º Setenário – O ESPÍRITO do ABSOLUTO ou DEUS.


2º Setenário - A ALMA do ABSOLUTO e ou HOMEM.
3º Setenário – O CORPO do ABSOLUTO ou o UNIVERSO.
Sendo este Arcano a súmula dos três setenários anteriores ele é representado pelo
OROBOROS (a serpente mordendo a própria cauda), que expressa a realização da LEI
DIVINA nos planos do SER. Os quatro animais sagrados do Evangelho, ou as quatro figuras
da Esfinge, que nela encontramos, representam as quatro HIERARQUIAS CRIADORAS.
Esta lâmina simboliza o conteúdo de tudo quanto se manifestou em nosso Sistema.
Seus atributos assim se enumeram:
Vigésima Segunda Letra do Alfabeto Hebraico: THAU.
Jeroglifo Primitivo: SEIO
Valor Numérico: 400
Regência: Planeta SOL
A análise dos 22 Arcanos Maiores da linguagem hierática de TOTH HERMÉS é,
realmente, a síntese de todas as idéias de ordem oculta que vimos expondo. Esta lâmina
engloba todos os pontos que aqui foram longamente tratados. A figura da Lâmina tem um
significado profundo, porque expressa o famoso quaternário dos Antigos Mistérios, os
mundos, os homens e os seres que se acham aquém do homem. Tudo isso é constituído de
quatro elementos que expressam não só as forças, senão, também, inteligência.
O primeiro elemento é denominado o FOGO CRIADOR; é a expressão das
inteligências vivas que animam todos os seres. O Segundo, podemos identificar como o AR,
não a combinação de oxigênio que constitui este elemento vital que é, para o Homem, a
essência da própria vida, mas aquela Energia Universal que dá às criaturas a capacidade de
discernir, ligando, portanto, a constituição da inteligência ao cérebro físico, que é o seu
veículo mais grosseiro. O terceiro identifica-se com a ÁGUA, que se relaciona com todas as
sensações que os nossos sentidos conseguem registrar e nos prendem ao Mundo Exterior
que nos rodeia. Finalmente, o quarto, que é aspecto objetivo, e, serve de revestimento aos
demais. Este quaternário, na antiguidade, foi expresso pelo Animal Sagrado, pela Esfinge, a
qual até hoje vem desafiando a argúcia dos investigadores. É o grande enigma de todos os
tempos. Ela expressa o Mistério do Homem e do seu destino e, por isso é sempre o
emblema de todas as potestades que em seu conjunto formam o Homem. A Esfinge é um
misto andrógino, representa o Homem e a Mulher.

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Por isso, tem traços imberbes e seios que representam a Maternidade: Homem e
Mulher, o Hermafrodita.
Nesse quaternário, esses quatro símbolos estão em torno de uma Mulher nua, a
Verdade sem Véus, símbolo de SOFIA, aquela que, de certo modo, representa o
conhecimento puro, espiritual, com a Coroa de Louros na cabeça, porque de fato ela é a
LAURENTA, a LAUREADA, guardada por esse quaternário poderoso, os mesmos quatro
símbolos da visão de EZEQUIEL, os quatro santos animais sustentando um TRONO.
Nos baralhos de jogar, encontramos esse quaternário nos naipes: Taças ou Copas,
Espadas (as Espadas de dois Gumes), Paus (varinha ou bagueta dos Antigos Magos) e
Ouros. São quatro símbolos que encerram uma infinidade de conhecimentos de ordem
oculta e que dificilmente podem ser traduzidos em palavras num curto espaço de tempo.
Mas, vamos sintetizar estas idéias: Copas ou Taças, em todas as épocas, sempre se ligaram
ao Amor e ao Sentimento, desde o de aspecto mais elevado, as nobres emoções, até às
mais baixas paixões que se agitam no íntimo de cada ser vivente. É a emoção e o
sentimento em todas as suas nuances. Desde o Amor egoísta até o Amor altruísta e, até
mesmo, a esse Amor excelso, elevado, que concebe o Universo inteiro como a manifestação
da VIDA ÚNICA. Foi este Amor que levou Omar Khayam a entoar seus cânticos, tão mal
compreendidos, quando se refere a embriagues do Amor.
O Amor está sempre ligado à TAÇA, porque na verdade, Ela é o símbolo do
sentimento-razão. Por isso até mesmo no Cristianismo, nós encontramos o símbolo da
TAÇA, que é mais antigo do que o próprio cristianismo, mas que com ele se identificou. E a
TAÇA DO SANTO GRAAL, que recolheu o sangue vivo do CRISTO, quando no Gólgota.
Essa TAÇA é feita de uma única esmeralda, e é muito anterior ao cristianismo. Está ligada a
vinda de todos os AVATARAS, a todas as manifestações da DIVINDADE. Depois da
Tragédia do Gólgota, esta TAÇA cumpriu um ciclo na Face da Terra e depois desapareceu.
Wagner no seu Magistral PARSIFAL, trata deste sacrossanto emblema.
Outro símbolo é a LANÇA, que também aparece na Epopéia de Wagner, brandida pela
mão potente de SIGFRIED. É o poder, não no sentido da Força bruta, senão de ordem
elevada.
É o símbolo que, na mão do Mago, faz brotar do Nada os Universos; expressa a força
espiritual.
O terceiro símbolo é a ESPADA. A Espada do conhecimento. A Espada de dois
Gumes. É o conhecimento que pode ser utilizado tanto para o Bem como para o Mal. A dupla
inteligência do HOMEM, a qual tem dois aspectos bem definidos: aquela inteligência que se
liga à parte emocional do Homem, e que é arrastada pelo veículo grosseiro, e uma outra,
mais sutil, que se banha na Luz do Espírito que paira sobre o Homem e que, como um farol,
procura iluminar o caminho a percorrer.
Segundo as tradições antigas, esses quatro poderes constituem a RODA DA VIDA. É a
CRUZ MUNDANAL, a CRUZ DO MUNDO. Por isso, encontramos os velhos cruzeiros
espalhados entre todos os povos da antiguidade.
Correspondem, estes quatro símbolos, à Vida-Morte, Inteligência, Poder e Amor. Esta é
a idéia essencial que nós podemos ligar a esse símbolo. A Verdade Única, representada
pela LAUREADA, se encontra, no centro, cercada por estes quatro símbolos.
Assim, o Arcano 22 – THAU, LAURENTA – representa a cobertura geral dos Arcanos
Maiores; final do Ciclo. Conclusão da Cadeia Terrena para outra etapa a seguir. Por
conseguinte, a VITÓRIA completa da MÔNADA durante um Grande Ciclo Evolucional.

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