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30 anos da Odebrecht em Angola: entre premiações e denúncias | Observatório da África 16/07/14 00:26

Observatório da África

ANÁLISE DA ÁFRICA CONTEMPORÂNEA – GRUPO DE ESTUDOS AFRICANOS – IREL/UNB


BRASIL – ÁFRICA, ECONOMIA

30 anos da Odebrecht em Angola: entre


premiações e denúncias
PUBLICADO POR DANIELE LARA MARTINS ⋅ 11 DE JULHO DE 2014 ⋅ DEIXE UM
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ARQUIVADO EM ANGOLA, BRASIL, EMPRESA BRASILEIRA, ODEBRECHT, TRABALHO
ESCRAVO
A multinacional brasileira Odebrecht está em Angola oficialmente desde 1984, quando assinou,
depois de três anos de negociação, o contrato para da construção da Hidrelétrica de Capanda, sua
primeira operação na África. As negociações foram feitas junto a URSS, em uma missão brasileira
enviada a Moscou, com o objetivo de incentivar as relações comerciais entre Brasil e URSS, não
por acaso, dois grandes apoiadores do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola),
partido que assumiu o governo após a independência do país. Hoje, 30 anos depois, a empresa é a
maior empregadora privada de Angola e tem o nome marcado por premiações de
responsabilidade social e as recentes denúncias de trabalho escravo.

O grupo Odebrecht, que recebeu prêmios como “Melhor Programa de Responsabilidade Social”,
pelo Sirius Deloitte 2012, e “Empresa Modelo em Sustentabilidade”, pela revista Exame Angola,
foi no mês passado denunciado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por manter 500
trabalhadores brasileiros em condições análogas à escravidão na construção de uma usina em
Angola. A ação, que pede R$ 500 milhões à empresa por danos coletivos aos trabalhadores, foi
iniciada após uma reportagem da BBC revelar, em dezembro de 2013, condições de trabalho
degradantes na obra.

Os operários teriam sido submetidos a maus tratos na construção da Usina Biocom – primeira
unidade de produção de açúcar, etanol e eletricidade do país africano –, entre 2011 e 2012. Além
das péssimas condições de higiene no alojamento e nos refeitórios, os trabalhadores afirmaram
que não podiam deixar o alojamento e tinham os seus passaportes retidos pelos superiores logo
após o desembarque no país. A investigação foi feita em três empresas do Grupo Odebrecht: a
Construtora Norberto Odebrecht (CNO), a Olex Importação e Exportação e a Odebrecht
Agroindustrial (antiga ETH Bioenergia). O grupo negou as denúncias da BBC e está preparando a
sua defesa.

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A denúncia de trabalho escravo envolvendo a empresa é grave. Há muito tempo tem-se falado
sobre os abusos que as multinacionais de várias partes do mundo estão cometendo na África,
tanto em questões trabalhistas, quanto ambientais. A Odebrecht, assim como Petrobras, Banco do
Brasil, Vale do Rio Doce, Votorantim, Companhia Siderúrgica Nacional, Camargo Corrêa e
Gerdau, recebe altíssimos empréstimos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES). Entre
2006 e 2012, foram US$ 3,2 bilhões (R$ 6,4 bilhões) oferecidos em empréstimos a companhias
brasileiras em Angola. Dos 65 empreendimentos financiados, 49% deles executados pelo grupo
Odebrecht.

História da Odebrecht em Angola

Angola passou por várias transformações nos últimos cinquenta anos. Enfrentou 13 anos de
guerra colonial na tentativa de se livrar do domínio português; conquistou a independência
depois da queda do salazarismo; e passou por 27 anos de guerra civil numa disputa interna pelo
poder através de uma sangrenta guerra armada que deixou 1,5 milhão de mortos, 40 mil
deslocados, além de uma herança de destruição social, política e de infraestrutura no seu
território. No entanto, na primeira década dos anos 2000, foi o país que mais cresceu no mundo e
virou alvo da ambição de investidores e exportadores estrangeiros.

Desde o fim da escravidão, por quase um século o Brasil deixou de lado suas relações com a África
e optou por manter os laços com a Europa. Entretanto, a aliança com um Portugal enfraquecido
pela Revolução dos Cravos, em 1974, acabou perdendo força, de modo que o Brasil acabou
pendendo para a defesa da libertação das colônias africanas. Sobretudo com o interesse no
petróleo que elas poderiam oferecer. No caso específico de Angola, petróleo, diamante e outros
importantes produtos minerais, além um elevado potencial agrícola e hidrelétrico em uma extensa
encosta litorânea.

Até os anos 70, não existia uma política externa para os países africanos. Houve, neste período, um
esforço da diplomacia brasileira em convencer o governo de que era interessante apoiar a
libertação desses países. Em uma polêmica ação do Itamaraty, o Brasil foi o primeiro país a
reconhecer Angola como nação e a legitimidade do MPLA (Movimento Popular de Libertação de
Angola), apoiado pela China, pela URSS e por Cuba. Consequência direta dessa ação? A simpatia
do MPLA, partido que assumiu o governo angolano, e uma situação propícia para a entrada de
investidores brasileiros no país.

A Odebrecht vinha acumulando uma sólida experiência em grandes empreendimentos, e o Brasil,


considerando a sua participação no processo de independência de Angola, tinha portas abertas no
país. O cenário não poderia ser mais propício. Surgiu, neste contexto, a Hidrelétrica de Capanda.
O Projeto do Complexo Hidrelétrico de Capanda era ambicioso, e essencial para a reconstrução de
uma Angola devastada pela Guerra Colonial e pelos sucessivos conflitos armados entre os
partidos que disputavam o poder. O objetivo era a construção de uma barragem de 110 metros de
altura para gerar 520 MW de energia – o maior complexo hidrelétrico da África. O orçamento
inicial era de US$ 650 milhões e representava na época o maior acordo comercial envolvendo uma
empresa brasileira no exterior e claro, um dos mais importantes contratos da Odebrecht.

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Foram três anos de longas negociações até que o acordo para a realização da obra fosse assinado, o
que ocorreu em 1984. Entre as maiores dificuldades estava a distância geográfica entre as três
cidades envolvidas neste processo: Rio de Janeiro (onde se situava a base operacional brasileira do
empreendimento), Moscou e Luanda. A cargo da URSS ficariam o financiamento, projeto e
montagem da usina, e o Brasil seria responsável pelas obras de engenharia e provimento de bens e
serviços necessários para a construção. O Banco do Brasil também financiou parte da obra, em
troca de um contrato onde o governo angolano assumia o compromisso de entregar à Petrobrás a
quantidade de petróleo correspondente ao valor do financiamento.

A Hidrelétrica de Capanda levou 17 anos para ser construída desde o início das obras, em 1987.
Por causa da guerra civil, as obras sofreram dois períodos de paralisação: o primeiro de novembro
de 1992 a julho de 1997, quando o estaleiro foi completamente abandonado e a infraestrutura e
equipamentos destruídos, e o segundo entre janeiro de 1999 e janeiro de 2000, quando alguns
trabalhadores foram mantidos no local e o exército angolano ofereceu proteção para que maiores
perdas não ocorressem. O início do enchimento do reservatório ocorreu em 2002 e a inauguração
em 10 de janeiro de 2004, quando a hidrelétrica passou a fornecer energia para Luanda.

A Odebrecht entrou no mercado africano através de Angola, e foi a primeira empresa brasileira a
se instalar efetivamente no país. Tornou-se, a partir de Capanda, uma das maiores empresas da
construção civil responsável por inúmeras obras públicas. Em Angola, ela tem os seus mais
diversificados negócios, atuando também nos segmentos de diamantífero, agronegócio e
imobiliário.

Em sua página na internet, a Odebrecht afirma que “o compromisso da Organização vai além das
obras, ao incluir ações sociais importantes para a geração de oportunidades de trabalho e renda
para a população além de contribuir diretamente na formação dos quadros nacionais”. Que
continuem as investigações.

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