Você está na página 1de 34
Tom Maia Sérgio Buarque de Hollanda VALE DO PARAIBA velhas fazendas COMPANHIA EDITORA NACIONAL EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SAO PAULO vase paras Hi rovces wes fomos procurados por um ‘amigo, Eduardo Ayrosa, que nos proporcionou ‘0 ensejo de travar conhecimento com Tom Maia, ‘natural de Guaratingueté, ¢ sua mulher, a fol- ‘clorista Thereza Regina de Camargo Maia. ‘José Carlos de Ferreira Maia (Tom Maia) € ‘promotor piiblico no Estado de Sao Paulo, Usan- ‘do seus momentos de lazer (fins de semana, feria~ ‘dos, férias, e principalmente, periodos de licenga ‘no Ministério Pablico) percorreu todos os muni- ipios do Vale do Paraiba paulista, em mimero ‘de 31, durante 8 meses, de Bananal a Santa Isabel, ‘de Cunha a Monteiro Lobato. Gravou, em desenhos a bico-de-pena, com muita sensibilidade, 0 que persiste das sedes das PREFACIO antigas fazendas, quer em excelentes vistas pano- amicas, quer em magnificos pormenores. ‘Com Iouvivel pacigncia executou quase 200 desenhos, fazendo 0 levantamento de 159 fazendas. {Em seus desenhos fixou sedes, senzalas, rodas- «agua e outros pormenores que mais tangiam as fibras de sua sensibilidade artistica. Levantou a planta baixa de todas as sedes ‘que Ihe foi permitido visitar interiormente. “Trés desses desenhos obtiveram, em conjunto, © primeiro prémio no Saldo da Paisagem Paulista, fem 1974, tendo sido outorgado a Tom Maia, em Conseqiiéncia, o Trofeu Associagio Paulista de Belas Artes. Tom Mai realizou mostras individuais © par- i ticipou de outras, coletivas, no interior € na Capital, obtendo, no periodo de um ano, dois primeiros prémios ¢ uma menglo honrosa, ‘Tom Maia é um artista nato: no tem qualquer curso ou orientagio especializada. Comecou a desenhar ¢ foi-se aperfeigoando num processo dé autodidatismo que nao é incomum entre nos, mas que, sem diivida, & um proceso _penoso que nem sempre leva a bom termo, Tom Maia teve @ felicidade de ser bem suce- dido. Nao desejo estender-me insistindo na exce- léncia de seus desenhos que se auto-recomendam ‘a quem tenha a oportunidade de os admirar, Silo esses desenhos, de casas construidas em taipa de pildo e pau-a-pique, que datam do periodo colonial ou do Império, que tivemos ocasido de examinar com admiragio, juntamente com Antd- rio Brito da Cunha e Thomaz Aquino de Queiroz. Sem diivida esses desenhos poderiam ser enfei- xados num livro, para o qual um texto adequado deveria ser escrito. Foi decidido consultar Sérgio Buarque de Hollanda, emérito historiador, sobre sua dispo- sigdo de escrever, rapidamente, esse texto. Sérgio € sobejamente conhecido e poderia dispensar apre- sentagao. Mas, para relembrar apenas alguns dados de seu excelente curriculo, seja-nos per- mitido dizer que nasceu na cidade de Sto Paulo, cursando o primério na Escola Caetano de Campos eo secundirio no Gindsio de Sio Bento, Em nivel superior, formou-se na Faculdade de Direito 0 Rio de Janeiro, em 1925. Cedo ingressou Sérgio Buarque de Hollanda na vida literdtia brasileira, publicando artigos, ensaios, estudos sociolégicos e de critica, Salien- tou-se no movimento modernista de Sdo Paulo, com inicio em 1922 Em missdo jornalistica percorreu virios paises da Europa, demorando-se especialmente na Ale- mana, Seu primeiro livro — Ratzes do Brasil’ —, hoje em 3+ edigdo, foi publicado pela primeira vez em 1936. Foi professor de Cultura Luso-Brasileira ¢ de Historia da América, na Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da Universidade do Distrito Federal (Rio de Janeiro), entBo recém-fundada. Foi chefe da Secglo de Publicagdes do Ins- tituto Nacional do Livro, diretor da Divisto de Consulta da Biblioteca Nacional, diretor do Museu Paulista, professor de Histéria Econémica do Brasil, na Escola de Sociologia © Politica de Silo Paulo, sendo chamado em 1950 a lecionar Historia da Civilizagdo Brasileira na Faculdade de Filosofia, Ciéncias ¢ Letras da Universidade de Sio Paulo, Efetivou-se nessa cétedra, mais tarde, apés concurso piblico. ‘Aos Estados Unidos viajou em 1941, a convite da Divisio de Cultura do Departamento de Estado. Traduziu livros, escreveu outros, seja de cri- tica, seja de Hist6ria, ou de outros campos. Dedicado & pesquisa e ao ensino em nivel superior, nilo olvidou Sérgio, todavia, o nivel secundario. Alguns de seus trabalhos de pesquisa, sobre “Os primérdios da expansio paulista no fim do séeulo xvre comego do século xvit", “Indios e mamelucos nna expanso paulista”, encontram-se publicados quer como livro, quer como artigo, em revistas especializadas. Participou, em 1949, de trés comités da UNESCO, realizando conferéneias na Sorbonne. Participou, também, em diversas épocas, de semindrios iater- nacionais, e realizou cursos nos Estados Unidos, na Italia, na Belgica. Seu livro Raizes do Brasil foi publicado na Itilia em 1954 € no México em. 1956. Este notavel historiador e insigne escritor, ccujo perfil foi apenas esborado, concordou em escrever 0 texto que deveria preceder aos desenhos de Tom Maia no livro: Vale do Paralba — Vethas Fazendas, que a Editora da Universidade de Sio Paulo ¢ a Companhia Editora Nacional resolve- ram co-editar © texto de Sérgio dé-nos uma sintese da historia do Vale do Paraiba, no periodo de fas- tigio — que durou meio século, de 1836 a 1886 — do café na regio. ‘Comegam, realmente, em 1820, a surgir por toda 2 regio “residéncias senhoriais” que marcam ‘© apogeu do café. “Segundo Tom Maia, que fixou em belos desenhos muitas dessas vivendas, uma das mais antigas, senfo a mais antiga, se a sede da fazenda Pau-d’Alho, situada em Séo 12 José do Barreiro, e ora em curso de restauracdo para nela instaurar-se o Museu Nacional do Café”, diz Sérgio Buarque de Hollanda. D. Pedro I jantou nessa fazenda em 17 de agosto de 1822, Nao houvesse outros motivos, esse bastaria para a preservacio, para a posteri- dade, dessa fazenda Pau-d’Alho. Muita coisa nos ensina Sérgio em seu texto de leitura agradavel. Muita coisa sentimos diante dos belos desenhos de Tom Maia. Dificil seria reunir texto © desenhos que tio bem se harmonizassem. Por esse motivo, ao accitar a honra de prefaciar este magnifico livro, senti-me muito feliz, pois sabia que me tornava participe da feitura de algo de que nos orgulha- remos indefinidamente. Cumprimento 0s autores, desejando-Ihes 0 merecido éxito; os editores, por mais esta feliz iniciativa, ¢, finalmente, felicito 0 piblico, 0 maior beneficidrio deste empreendimento, Sa0 Paulo, abrit de 1975. Manto Guimardes FERRI Iz VALE DO PARAIBA velhas fazendas Segundo a explicagdo mais pacifica entre ‘tupindlogos de todos os tempos, “Paraiba’” quer =aareeireen ‘cont is? Sem querer discutir 0 valor de qualquer desses alvi- {res — dois, pelo menos, pertencem a Capistrano de Abreu — nenhum é indiscutivel por volta de 1601, © ano da bandeira de André de Leto Fumo a0 Sabarabugu, que motivou a mais antiga descrigo conhecida das mesmas terras. ‘A descrigio, devida a um flamengo chamado Guitherme Glimmer, vem na Histéria Natural do Brasil de Marcgrave, que se imprimiu pri- ‘meiramente em 1648. Por ela ficamos sabendo Por the faltarem condigSes que a expediglo, depois de largar a vila'de Si0 - transpondo o Tieté, se encaminhou para 0 coto- “velo que’ forma 6 Paraiba, antes de seu curso médio, chegando presumivelmente 38 proximi- dades do desaguadouro do Jaguari, em frente 4 atual So José dos Campos, apés mais de dez dias de marcha. Nese ponto embarcou em canoas para descer o Paraiba, ¢ sé deixou 0 io ao cabo de 15 ou 16 dias, num lugar onde ‘a navegagio comega a fazer-se dificultosa, mais ‘ou menos onde hoje fica a cidade de Cachoeira, para se dirigir 4 garganta do Embad, que di aacesso ais Minas Gerais pelo Passa Vinte. ‘Ao rio dé o roteiro de Glimmer © nome de IS pa Sorobis, embora no se ignorasse na época © topdnimo Paraiba, e nfo deixa davidas quanto a sua verdadeira identidade ao sugerir que ddespeja as fguas no Oceano, entre 0 Cabo Frio ¢ a capitania do Espirito Santo. Sorobi_ ov Sorubim € nome de peixe, ainda em nossos dias usual (Pseudoplatystoma — Corruscans, ‘Agass,), € isso j serve para desfazer a teoria dde que suas figuas mal se prestavam is pescarias © préprio Glimmer informa, lids, ‘expressa~ mente, que 0 rio ¢ abundantissimo em pescado grande. pequeno: fam majoribus quam mino- ius. Sobre a alegagio de que viviam em suas tmargens indios indomaveis, cabe dizer que nao era exata em 1601, ainda que 0 fosse sete ou oito fanos antes, pois hi noticia de que em 1593 0 gentio de Moji ou Bouji havia desbaratado (08 homens de Antanio de Macedo e Domingos Luis Grou, levando 0 capitdo Jorge Correia ‘a mover-Ihes crua guerra. E de crer que, nos anos subseqiientes © até a vinda daque- -tivessem apartado enfim a ameag: as bandas ¢ que tanto sobressaltava a popu- ago paulistana. © certo € que todo o longo estirdo entre as verientes da Mantiqueira ¢ a Serra do Paranapiacaba se viu desinfestado aqueles anos dos Tupi inimigos, indios de ‘guerra, mas também indios de lavoura, cobi- ‘gados dos traficantes de pecas. ‘mas'tribos mais trativeis, embora assustadicas, de Guaiand, Puri, Guaramomi ou Guarulhos, que no se afeigoavam a vida sedentéria © & Jayoura. Quando por ali andou Glimmer, jé © gentio contririo fora dizimado: nfo achou © vijante viva alma, nem sinal de terra lavrada, ainda que avistase tapers 20 desampara Ape nas As vezes das brenhas, indieavam a presenga de 'S6 depois de vencida f serra ocidental (Mantiqueira) ¢ caminhados ‘ainda alguns dias, sera dado aos expedicionérios deparar com as primeiras aldcias indigenas fartas de mantimento, de que todos se valeriio. Completada naquelas partes a faixa de seg ranga ao redor da vila de Sio Paulo, é plausivel 1 idéia de povod-las, dando-thes alguma apa- réncia de governo civil, tanto mais quanto ja corria a crenga, amplamente confirmada um sfoulo depois, de que naquela diregdo estariam jazidas preciosas, Para comesar, © povoamento seguiria a linha tracada pelo Tieté, rio acima, © alcangaria em seguida o Paraiba, Com efeito, . : documentadas 16 petigdes ou concessies de ‘sesmarias ‘nia area: em média, quatro por anc. Seen ae ‘onde se levan- taro” pelourinho-em 1611: rocas de feijéo branco, de algodio, cana, mandioca, milho, carazais, bananais ou pacovais, pouca coisa de trigo, que sc dé melhor nas proximidades da vila de Sio Paulo e mais para 0 este. E é ‘tudo quanto resulta da ‘documentagao conhecida sobre o lugar. A-via-natural-da-expansio-da, “mer, adiante do Guaipacaré, justamente aqui principia © caminho terrestre, por onde se vai em trés* dias a0 Embai, no umbral das minas de ouro. Rapidaments, porém, as antigas sesmarias de Mojie seu termo s6 deixam ver taperas ou feitais, que assim se chamam as touceiras de samambaias, proprias de solos exauridos, ¢ aos moradores, tomados do mesmo cansaco, falta fm geral © fnimo para empresas novas. , até pouco ‘onde, em ripida sucesso, em verdade rapidis- sima para a €poca ¢ para a aspereza daqucles lugares, se-vilo-semeando- niicleos. de povos- menjo. A viva sedugdo exercida em dado mo- mento por toda a drea, j@ livre da barreira indigena, ou a preocupaciio dos governos em “Greqao dos pelourinhos que a simbolizam. Sur- a, = ae ee a margem do rio Paraiba, ao morte'de:Jacare, L ‘e estabelecem ali, em um altiplano que escapava “Gs enchentesidovrio, uma aldeia que se chamou primeiramente Nossa Senhora do Desterro, de- pois Residéncia de Paraiba do Sul ¢, sucessi- vamente, ainda, Residéncia de Sio José, aldeia de Sio José, vila de Sio José do Paraiba, até receber, com os foros da cidade, 0 nome que ainda guarda de S¥0°Joxé- dos Campos. ‘morador antigo da vila de Sio Paulo, com sitio de lavoura em Santo André, no caminho do mar. ‘Em=1628—= recebe: sesmarias, com-dois de seus filhos, entre ‘na “tapera do gentio”. Nao'se dé pressa em ir explorar a rea doada, continuando por algum tempo ainda em Sao Paulo, onde ¢ vereador no ano de 1632 ¢, no de 1636, provedor da Misericérdia. ‘De 1636 é, também, a provisio do capitio-mor “da Itanhaém, determinando que cle penetre ‘0 sertdo taubateano, com o fito de dar aumento "as terras da condessa de Vimieiro, descendente ‘¢ herdeira dos primeiros donatarios da capi- tania. De 1639 ¢ a ordem da mesma donataria para que se destine uma légua a0 rocio da vila ‘que ali se fizer, ¢ se diligencie sobre a distribuigdo de chdos aos que acudam ao local. Finalmente fem 1645, uma decisio de Duarte Correia. Vas- ‘queanes, que governa interinamente o Rio de Janeiro, na auséncia de Salvador de Sa, leva a0 “devassamento da bacia do Paraiba_em. busca de minas:de-ouro, por_um neto homdnimo. de ‘Tacques Felix, 0 verdadeiro povoador, trés anos ‘mais tarde, da vila de So Francisco das Chagas de Taubaté. A esse ciclo de exploragdes, onde 7 se inserevem os trabalhos de Jacques Felix, também parece prender-se a origem de Guara- tingueté, Com efeito, a missio de erguer ali © pelourinho, por ordem do capitio Dionisio da Costa, foi atribuida a um dos componentes da leva de paulistanos que, em 1646, cuidara de explorar toda a regido. A empresa de ocupaio dessa rea parece interromper-se por algum tempo em 1653, depois do estabelecimento da vila de Nossa Senhora da Conceigiio do Paraiba, que € a Jacarei de hoje. Diversamente do que Sucede com Taubaté e Guaratingucté, esse esta- belecimento parece escapar, ao menos de inicio, 4 inspiragio oficial, e conta com a presenga de ‘moradores antigos de Moji Mas a fundago é de qualquer modo coones- tada pelas autoridades, tanto mais quanto Jaca- ¢ as terras (que se situam mais para o norte. N&0-s6 por ser 0 rio ali navegavel, como, ainda, ¢ prinei- ppalmente, por abrir-se no mesmo lugar uma “extensa virzea livre de embaragos que estorvam © trajeto por terra. O fato ¢ que mais tarde, ‘¢ ainda por longo tempo, 0s que se dirigem as povoacées do médio Paraiba tratario de embar- ‘car em canoa a altura da aldeia da Escada ¢, a partir de Jacarel, iniciaréo a viagem a pé ow cavalo, Uma das razdes lembradas, alids, para justificar a criagdo, em 1653, da vila da Conceicio do Paraiba estava em ndo ser possivel Moji por ser 0 caminho longo e no haver passagem por onde levar mulheres ¢ filhos a ouvir a missa. Nao é talvez por acaso que a firea montanhosa entre Moji ¢ Jacarei recebew desde cedo o nome de “sete pecados mortais”. a0 préprio contacto dessa parte do vale do Paraiba com a vila de Sio Paulo, 0 répido. | ‘Ate 0 trigo, {que mal ¢ mencionado na documentagio conhe- cida sobre Moji das Cruzes, dé-se bem em Jacarei, e em 1775, muma época em que os cstragos da ferrugem tinham praticamente ani- 18, quilado a triticultura na capitania, 0 morgado de Mateus se refere ainda a esse lugar como ‘um dos dois, em Sao Paulo, onde ela continuava a prosperar: 0 outro era Atibaia, De que valiam, Ly ee See ae cee ee ik “com os centros mais povoados? Nao s6.0 trafego rag entre Moji ¢ Jacarei €-dificultoso, como f ‘No préprio ano da fundagao de Mé ) 5 avaliadores do inventdrio da mulher do fundador nao se arriscam a enfrentar 0 caminho, por ser spero e “de muitas aguas”. E bem | mais tarde, 0 aValiadores de outro inventario | rf ficam tolhidos de ir de Sdo Paulo a examinar Al \ it ‘umas terras na mesma Moji, por no haver canoa e mem ponte que thes deixe fazer a viagem. © mal da solidao a que, nessas circunstin- tempo da criagdo da vila de Moji faz-se alusio 1 cxhitncn do pole sence oe © consta mesmo, de certo documento, que a resenga de um desses caminhos, o-da Bertiogay se deveu 4 sua fundagio. Por ele, depois de achadas as minas tio desejadas por D. Fran- cisco de Sousa, governador delas © das capi- tanias “de baixo”, se poderiam levar e embarcar (8 reais quintos a povoagio nova que ele mandou fazer na Angra dos Reis: sdo palavras textuais do ato de confirmagao do governador em 161 ‘Além desses dois caminhos para 0 litoral, fez-se -marinha para o rio Paraiba onde diz “haver Moji ¢, depois de passar pelo Paraiba ¢ pelos campos da Boa Vista, ia ter ao lugar onde existiu até 1666 a vila de Santo Ant6nio de Caraguatatuba, | depois ermada em pro- veito de Ubatuba, E de supor que esse abandono: da primeira Caraguatatuba se deve ao fato de Moji, que com ela se comunicava, ¢ por cla com Sao Sebastido, ja nfo ser a esse tempo uma ponta de flecha na expansao paulista para nordeste, E ha mera coincidéncia de datas, se _ a criagdo da vila de Sao Sebastido ocorre no 19 Nao €, porém, em Sio Sebastido, é' efi" Uba- Taubaté-aorlitoral"0 verdadeiro “‘caminho do mar” taubateano, chamado, nos textos contem- porineos, “‘caminho do mar de Ubatuba”. Nio seria @ Gnica via transitavel entre 0 rio Paraiba © @ marinha, pois, por outra que, subindo do porto de Parati ia alcangar o rio cerca de 10 Jeguas a jusante da futura vila de So Francisco das Chagas, seguiu em 1587 @ expediclo de Martim de Si contra os tamoios refugiados serra acima, cujas peripécias esto. descritas ‘em narrativa do inglés Anthony Knivet. A Jembranga € © uso desse caminho no morrem: dele ha noticia em petigBes de sesmaria da tereeira década do século imediato. Sua pre- senga, que facilitava mais rapidamente do que © caminho de Ubatuba as comunicagdes com 0 Rio de Janeiro, poderia explicar os rapidos progressos do nicleo de Guaratingueti, que no precisou esperar dez anos, depois de cri Taubaté, para receber as insignias de vila Quando, em 1651, essa povoacHo alcanga sua autonomia municipal, jé no lugar de Para que seria seu porto natural e, durante algum tempo, serd 0 escoadouro principal de toda 2 regio taubateana e mais ainda das minas de ouro, existia templo dedicado a Nossa Senho- ra dos Remédios, que ha de ser orago da vila. Mas embora 0 porto maritimo e a vila ribeirinha do Paraiba passem a ter evolugio conexa, quando no perfeitamente sincrénica, nada prova que fosse muito freqiientado 0 caminho que ligava diretamente 0s dois tugares. Sabe-se até que, a0 tornar-se pablico, ele infletira de inicio para a vila de Taubaté, antes de ganhar as minas. Contudo, o serem no outro e mais breve trajeto, rudes 0s atalhos ¢ a serra alcantilada, tanto que teve 0 nome de Quebra Cangalhas, nio impede de todo o seu uso, e é significativo que justamente em 1650, logo antes de fazer-se vila em Guaratingueté, uma peticdo de sesmaria de Domingos Velho Cabral refere-se 20 “ca- minho ndvo", variante do primitive, que abrira © suplicante entre o mesmo povoado de Guara- tingueté © 0 porto. Nessa petigdo, mais de um dado toponimico ajuda a localizar a rea pedida em terras do atual municipio de Cunha e suas imediagdes Sucede que a futura freguesia do Facto, depois i, emelhante a0 que ‘epresemtou Sto Luis de Paraitinga entre: Tau- sbaté-e-Ubatuba, Ambos parecem ser eminen- temente, em seus comeyos, povoados de beira de estrada, nascidos da instalagio de moradores nas vizinhangas de trilhas de muito transito, Se, criada a vila de Guaratingueté, ainda se ho de esperar dez anos, ou quase, para alcangar igual predicamento © porto de Parati, ja ent&o bem povoado, nio afetaria essa demora a dispo- siglo dos paratienses de se entenderem cedo com os da vila de serra acima. O varar brenhas € 0 escalar montanhas ingremes constituem exercicio que quer mais afoiteza de animo do que comedimento e grandura de génio, ¢ consta ‘que 08 primeiros moradores daquele porto eram gente aventurosa e ind6mita, incapaz, segundo seus desafetos, de organizar-se numa ordem bem composta. Esses desafetos achavam-se prin- cipalmente entre 0s habitantes e 0 conselho de ‘Angra dos Reis, que fizeram tenaz oposigo a toda tentativa de erigirse vila num lugar po- voado, segundo alegavam, de homens alevan- tados, onde jé haveria sesmarias doadas, e que, 20 segundo pretendiam, estava na jurisdigdo da Javras nfo impede a parte de sua capitania que ha Grande. Os embargos opostos dilataram até 1667 a confirmarao do ato de clevacio de Parati a vila, onde fora erguido pelourinho por ela ainda podem transitar animais de carga desde 1660, a requerimento dos povos do lugar. Do mesmo ano de 1660°é"a determinagao ‘fundagdo'de"Moji das Gruzes, é reiterada quatro anos mais tarde, quando um dos principais moradores da mesma vila de Moji recebe certo mimero de carijés forros com a condigdo de ‘empregi-los no beneficio das ditas minas, ou margeia o rio Paraiba de mostrar, ainda por ——— “via_do Rio de Janeiro os artigos de consumo "€ © Ouro se conduzem aos ombros de escravos pretos. Um indice provavel dessa prosperidade esti no fato de ser 0 vale do Paraiba a nica parte das capitanias paulistas onde, nesse tempo, ainda se pode cogitar da formagio de um novo ‘niicleo municipal, Em 1703 desmembra-se de ‘Taubaté, por ato unilateral de seus habitantes, opovoado de Pindamonhangaba. O ato tachado, ‘embora, de ilegal, ¢ que levantou viva oposiclo entre os taubateanos, obteria confirmagio ofi- ial dois anos mais tarde, com a criagdo da vila de Nossa Senhora do Bom Sucesso, jé no despovoando. ainda em 1617, quando se manda abrir caminho . de-Stio~Sebastiio até as beiradas’do Paraibay~ limiar de uma era em que Sdo Paulo se vai “com a alegagio de que abreviaria o trajeto para mntuado de todo 0 chamado “0 declinio. acentuado e quando conelusio do caminho. cometido. em das jazidas de ouro nessas partes, obedece a EET cotica sine oe uma intuigo divinatoria, nutrida, sem divida, paulista e filho de de aparéncias reais e persistentes, vindas do tempo de D. Francisco de Sousa. A-exploragdio ‘dessa dea obedece, pois, a uma empresa metodi- - camente governada pela convicso de que atra- ves dela se chegaria a lugares excepcionalmente ries, Nao pertence unicamente a historia de So Paulo, mas também & pré-historia de Minas Gerais, e quando estas se descortinam afinal na ultima década do século XVII, remate vito- ioso de um esforgo sem tréguas, chamem-se inicialmente Minas de Taubaté. “Tamanho impulso recebera 0 povoament - do sertio do rio Paraiba que, pee os de Taubaté ja se consideram competidores © por vezes inimigos dos de Sao Paulo, unindo- 05 tlo-somente a comum aversdo. q a0 emboaba, i i Ferndo Dias Pais, permitindo a ligagio direta “entre o Rio e as lavras de ouro, relegar a segundo plano 0 “‘caminho velho” cujas agruras pode conhecer 0 mesmo governador quando fez 0 Percurso através de Parati e Taubaté, na direcio da Mantiqueira, do em carta de 1705 a0 governador the disse que, além de reduzir a menos de tersa parte 0 hem hava nela “o detrimento da viagem do mar". Quem, por Volia de 1709, quisesse ir da vila, dai a dois anos cidade, de Sio Paulo, Tumo a Minas Gerais, ¢ saisse pela Penha, que era o primeiro arranco da casa, levaria, ‘86 até Guaipacaré (Lorena), mais de 20 dias de marcha. " como entio se dizia, que se fazia a péy entre a madrugada ¢ as 13, no maximo até as 15 horas. Saindo de Guaipacaré ainda seriam precisos cerca de 3 dias de caminhada para ir ao sopé da Mantiqueira ue, na comparacdo de Antonil, 0 jesuita italiano que nos deixou uma descricéo meticulosa dessas vias, represemtava como © primeiro dos muros que tinha © ouro em seu caminho, Para que a ele nfo chegassem 03 mineiros Nota-se que a esse tempo e até bem mais ‘tarde, em’ 1733, ano em que Cristévio Pereira de Abreu, tendo melhorado 0 novo caminho do sul, passou por Si0 Paulo com numerosas cabecas de gado, ¢ entre clas cavalares ¢ mi O pri- meiro ferrador com carta de exame do oficio, passada na cidade do Porto, s6 aparece na capi. tal paulista em 1748, e nesse mesmo ano obtém licenga para “exercer ‘ferraduras ¢ cravos, tantos e de tamanha va- riedade de pregos, que no intuito de se acabar com essa discrepancia, faz-se em 1753 nova petura resp, se quem, ee ndo que the tivessem posto ferraduras. Tam. bam € possivel que se iluda quem depare com alusdes, ¢ elas nio faltam, los", ¢ efetivamente podia chamar-se assim o cavalo Ferrado, no sentido que esta palavra tem hoje, ‘mas assim também se chamavam os que traziam certa malha nas pernas, logo acima dos cascos. A divide parece plausivel a.quem leia, por exemplo, © inventério ainda hoje inédito da fazenda de Luciano Ribeiro Ramos, que se. {fez em vila de Parnaiba em 1738, de onde cons “hum cavalo zardo escuro com pés calgados Ou no de Timéteo Leme do Prado, também de Parnaiba, o qual, em 1737, deixou “hum cavalo castanho claro (...) 05 quatro pés calcados", Mas consta igualmente que o dito Timéteo deixa ainda um cavalo castanho claro, com “ués pés calgados", e aqui todas as diividas se desvanecem, pois como seria possivel calear de ferraduras trés patas do animal, deixando-the 4 quarta descalga, ¢ esperar que nessas condigdes guarde equilibrio? pag ger can tre eS nda estreita- mente ligada a0 advento de animais que, a 22 partir da jornada de Cristéviio Pereira, em 1733, no cessam de vir das campinas do sul E como esses animais se destinassem largamente ‘40s trabalhos nas minas ou a0 Rio de Janeiro, cea inevitivel_o seu transito, em qualquer dos casos, pelo vale do Paraiba, que, por essa forma, viria a ganhar um pouco da importincia per- ida desde a construgdo do caminho novo de Garcia Rodrigues Pais. Em meados do século XVIII grande € a quantidade de muares cuja criaglo se proibira na América Portuguesa, apesar de sua grande utilidade nas minas, que passam por Sio Paulo, enveredando pelas pas- sagens que dividem a Mantiqueira da Serra do Mar. Sabe-se de um negociante que entrou em 1751 com 493 e outro, no mesmo ano, com 529 pagando os respectivos direitos em Curitiba, ‘Ao todo, 0 niimero de animais que pagam direitos no mesmo registro em 1751 & de 8,994, entre cavalares, muares ¢ bovinos. Segundo ‘08 dados constantes de um livro de registro de cartas de guia de animais, que se guarda inédito ainda hoje na Camara Municipal de Moji das Cruzes, ¢ que supre-s6 em parte a falta de cifras anuais regulares para as importa- ‘ges do gado do sul, dos 32.413 animais que entre 1767 e 68 pagam ali a cota do Novo Im- posto, cujo produto se destina & reedificacao de Lisboa, depois do terremoto, acha-se assina- lado 0 destino de 17.623, e entre esses, mais de 80% dos vacuns seguem para o Rio de Janeiro, ‘a0 passo que quase 99%, se encaminham para Minas. Dos cavalares, sem contar 0s que se venderam em Sio Paulo, passam 972 para Minas ¢ 319 para o Rio. A proporgio no é constante, pois no triénio imediato — 1769 a 1771 — passam pelo registro de Curitiba 30.300 23 cabogas, com grande predominio de cavalares = 53% —, seguindo-se, nessa ordem, muares fe bovinos. E presumivel, mas sem certeza, ‘que desse mimero de cavalares importados, onde esto incluidas éguas, mas estas em quan- tidade bem menor, por isto que a freqiiente prenhez se inabilita para 0 trabalho, se deixem ficar na capitania de Sio Paulo, onde comegam 4 ser ento assinalados em grande nimero nos inventirios © transito pelo vale do Paraiba € agora facilitado pela nova estrada que, ao menos ‘na parte paulista, mandou fazer 0 governador Rodrigo César de Menezes (1721-1727), para maior facilidade das comunicagdes com 0 Rio de Janeiro, Na parte propriamente fluminense, seu prolongamento encontrou muitos oposi- tores, inclusive entre os padres da Companhia de Jesus, proprietiria da Fazenda de Santa Cruz. Apenas 0 ponto terminal da estrada foi deslocado de Parati, desmembrada de Sio Paulo em 1726, para o-litoral angrense. J se conheciam, ali, algumas “estradas de barro” ‘que desembocavam na regido de Angra, como ‘a do Facdo (Cunha) a Mambucaba, pasando por Campos Novos, oua de Areiasa Mambucaba, passando por Sto José do Barreiro, ou as que de Bananal rumavam para Ariré © 0 Frade. Com o tempo, o entreposto preferido sera 0 dos Santos Reis Magos, € a tal ponto que a barra de Angra dos Reis se tornaré 0 escoa- douro natural de grande parte do sul fluminense, boa parte da Mata mineira ¢ também de quase todo 0 “norte” paulista, s6 0 excedendo no ‘movimento comercial, 0 porto do Rio de Janeiro. Tso até meados do século XIX ¢ mesmo até a construgo da estrada de ferro de D. Pedro TI. Podia-se fazer também 0 percurso por terra para a Corte, mas era tio pouco freqlentado, aque niio se chegou ainda hoje a acordo trangjilo sobre o verdadeiro trajeto do principe D. Pedro em terras fluminenses, na viagem de 1822 a Sto Paulo, onde proclamaria a Independéncia. Sabe-se que nessa viagem foram éonsumidos 11 dias, 7 dos quais em territério paulista, a partir de Guaratingueté. Para se ajuizar do fescasso progresso havido no sistema de trans- porte pelo vale do Paraiba paulista desde que se generalizara 0 uso de cavalares naquela regio, é de notar que, j& em 1751, D. Anténio Rolim de Moura e sua comitiva também tinham gasto 7 dias no mesmo trecho, percorrendo-o ‘em sentido inverso, isto , de So Paulo @ Guara- tingueta. Nos dois casos, convém dizé-lo, era possivel abreviar 0 percurso, E sabido que na viagem de volta D. Pedro levaré apenas $ dias em todo © trajeto entre Sto Paulo ¢ o Ri E setenta anos antes, 0 conde de Azambuja achara muitos os 7 dias de sua viagem de fo Paulo a Guaratingueté, pondo a culpa da demora no ouvidor que o acompanha € que, dizi, ndo era amigo de madrugar, nem aturava sol forte. Além disso foi comboiado por uns pretos to pouco experientes que se enganaram no caminho logo a saida da cidade, Sea como for, 0 trinsito de tropas de animais, se no serve para restituir ao vale do Paraiba paulista a relativa prosperidade alcangada duran- te 08 primeiros tempos da idade do ouro em Minas Gerais, serve a0 menos para pér um ouco de remédio & pobreza de seus habitantes. E significativo a respeito o escrito de 1783 intitulado Divertimento admirdvel para 0s his- toriadores observarem as méguinas do mundo, ‘onde o autor, que se chamava Manuel Cardoso de Abreu e era natural de Itu ou Araritaguaba (Porto Feliz), diz das vilas do chamado norte da capitania de Séo Paulo que sto todas “muito pobres © a maior parte miserdveis, porque os seus efeitos, que so mantimentos, apenas dio para vestirem ¢ comerem o sal, vendendo uns nna mesma cidade (de S40 Paulo) ¢ outros para ‘© Rio de Janeiro e também aos passageiros. ..”. A {acilidade maior de comunicagées_oferecida pela estrada geral do sertdo, ¢ cra como s¢ chamava 0 caminho gberto ali por ordem de 4 Rodrigo César de Menezes, haveria de dar alguma vida aos néicleos de populagdo que cla servia. Tanto mais quanto os moradores ndo tinham necessidade de alongar-se muito de casa se quisessem vender seus cfcitos, j& que a0s tropeiros no custaria ir receber ou completar as cargas que conduzissem. O re- ccurso, agora, a cavalares ou muares para trans- porte, permitiu fixar-se melhor o significado da carga ou “carga de comerciante”, que ficava sendo a quarta ou a quinta parte do peso que cada animal aturava, Como se estimaya comu- ‘mente em 8 a 10 arrobas esse peso, distribuido por ambos os lados das cangalhas, resulta que ‘uma carga de negociante equivalia a 2 arrobas. Alias, a primeira proviséo para a venda de can- galhas de que ha noticia na documentacao municipal paulistana € de 1738, cinco anos depois da viagem de Cristévao Pereira! Nao significa isso que tal pega fosse novidade, mas dia entender que ja se tornara uma necessidade. De que géneros poderiam abastecer-se even- tualmente no vale do Paraiba os tropeiros em trdnsito para o Rio de Janeiro © Minas Gerais? Em valioso estudo acerca da estrutura social de Guaratingueté num periodo de 300 anos que, publicado em 1948, conserva hoje muito de sua atualidade, e cujas conclusdes so apli- civeis grosso modo a toda a bacia do Paraiba paulista, ainda que se concentrem de modo expresso em Guaratingueti, observava Lucila Herrmann que seus. moradores durante muito tempo desenvolveram a policultura baseada na lavoura de alimentos para homens e animais (milho, mandioca, arroz, feijio, pastagens, etc) ou ligada a indistria doméstica (farinha, metado, rapadura, algodio), ¢ & criagio, principalmente de porcos. Por essa forma proveriam & pré- pria subsisténcia e ainda utilizaram as sobras no “comércio de beira de estrada” com os viajantes que demandavam as minas das Gerais ou 0s portos de Parati ¢ Ubatuba. A essa fase ‘associa-se, para a autora, © que chamou o “ciclo da economia de subsisténcia”, baseado larga- ‘mente na lavoura do milho ¢ na criagdo de porcos. Corre 0 periodo aproximadamente de 1630 a 1775, preponderando a pequena propric- dade rural com pouca ou nenhuma escravatura. ‘Acessa ird seguir-se, segundo a autora, 0 que cchama 0 “ciclo.dos engenhos”, quando a invasio dos canaviais introduz um produto apto ao abastecimento dos mercados ea crescente acumu- acho de cabedais, isso a partir de 1775 até ‘bem entrado o século XIX. Convém notar {que neste ponto, porém, o que pode ser valido para Guaratinguetd, deixa de sé-lo, ou nfo 0 &, hho mesmo grau, para 0 vale do Paraiba paulista fem seu conjunto, A verdadeira area de eleicao da_cama-de-agiicar_ na capitania, depois pro- vincia de Sto Paulo, é ¢ continua a ser, desde fins do século XVIII, até meados do seguinte, fa que se compreende no quadrilétero marcado gwosseiramente por Sorocaba, Piracicaba, Moji Guacu e Jundiai, conforme resulta nitidamente dos estudes de Caio Prado Jimnior, desenvol- vidos ultimamente, ¢ nesse particular enrique- cidos, por Maria Tereza Schorer Petrone. De ‘acordo com os dados compilados pelo capitiio- general Anténio Manuel de Melo Castro Men- Gonga (1797-1802), s6 0 termo de Itu di em 1728 64,809 arrobas de agéicar, perto de seis ‘yezes mais do que todo 0 vale do Paraiba ¢ mais Moji das Cruzes, que produziu 11.482 arrobas. “No ano de 1799 eleva-se a producio agucarcira do vale do Paraiba, abrangendo Moji das ‘Cruzes, a 16.663, inferior & da vila de So Carlos, 1 atual Campinas, com 16.875, muito inferior 4 de Porto Feliz, com 30.672 e, naturalmente, muitas vezes menor do que a de Itu. Nesse ‘mesmo ano a producio global da drea compre- endida no “quadrilatero do agéicar” é, segundo ‘0s mesmos dados, de 141,687 arrobas de agiicar. Mais modestas, © em todo caso mais consi- deriveis do que as do vale do Paraiba so as cifras correspondentes & marinha. NAO se co- rnhecem dados completos acerca da_producio ‘agucareira do litoral paulista, mas s6 So Sebas- tio produz 21.090 em 1798 e 39.893 em 1799, ou seja, duas vezes a mais do que 0 “norte” da capitania. [A desproporeio verificada nos iltimos anos do século XVIII se_acentua consideravelmente nas décadas seguintes ¢, embora o estutlo de Lucila Herrmann para Guaratingueté prolongue © “ciclo dos engenhos” até 1836, os nimeros divulgados para 1835 pelo marechal Daniel Pedro Miiller no Ensaio de um quadro estatistico da Provincia de Sto Paulo atestam elogiiente- mente 0 seu declinio. Guaratingueta ainda é, nto, como sempre 0 fora, o maior municipio acucareiro do “norte” paulista, mas sua pro- dugio agora néo vai a mais de 1.114 arrobas, sendo a de todo o vale do Paraiba de 3.724 que & de qualquer forma, uma cifra ridicula se comparada as 446.577 arrobas que produzem fs vilas compreendidas no ““quadrilétero agu- careiro”. Para esses resultados, entretanto, con Iribui de modo decisivo a penetragio, a0 longo do vale do Paraiba paulista, da lavoura cafecira, que vai dar incremento novo ¢ pode-se dizer, sem precedentes, 4 economia ¢ & sociedade da regido. Nao é excessivo dizer, de qualquer maneira, que a lavoura canavieira preparau.ali, de algum modo, a infra-estrutura sobre, a qual haverio de implantar-se, com perspectivas muito. mais amplas, 08 cafefais. A rigor o chamado ciclo ‘dos engenhos nfo € muito mais, nesse caso, do que um prolongamento ¢ um enriquecimento dda lavoura de subsisténcia da fase anterior. No estudo hi pouco lembrado de L. Herrmann, ‘este ponto fica bem caracterizado onde se diz jque, “"ndo obstante a invasio dos canaviais, 0 cearacteristico do ciclo anterior perdura no dos tengenhos: estrutura econ6mica repousa sobre ‘a pequena propriedade”. Ha, sem davida, umas poucas excedes, como, em Guaratingueti, o engenho da Conceig&o, ém Putim, 4 margem esquerda do rio Paraiba, mas & preciso notar {que nele, 20 lado da produgéo de agicar, havia criagio de gado, o que requeria espagos maiores ppara pastagens. De resto, 0 falar-se em engenhos, ‘a propésito da fase em que predominou a lavoura canavicira na regidio, presta-se a reparos, dado 6 e que tende a excluir 0s foreiros, os que “lavram @ favor” © todos os que se valem de engenho alheio, nio tendo de préprio sendo os seus Proprios canaviais, © seriam provavelmente a maioria. No estudo de Lucila Herrmann & devidamente assinalada a presenga dessa cate- goria, formada de individuos que tinham terra, as vezes, © recursos, para plantar sua cana, ‘mas ndo dispunham do necessirio para bene- ficiar © produto ou, quando muito, faziam rristicas de rapadura ¢ aguardente A seu respeito observa mesmo, a pesquisa- dora, que seria licito “interpretar esse habito do empréstimo do engenho alheio como uma forma embrionéria da cooperativa agricola. Do Produto, agicar, aguardente, uma parte per- tence a0 proprietirio do engenho, pelo paga- ‘mento do aluguel, outra ao plantador”. Também se poderia, com mais razdo, filié-lo is “banali- dades” medievais, por onde aquele que obtivesse Concessio régia especial para construir um moi- tho de trigo, por exemplo, ou um lagar de azzite, se obrigava a colocé-lo disposigio dos lavradores mediante 0 pagamento com uma arte da farinha ou do azeite produzidos, parte que se chamava, em portugués, a “maquia”, 0 senhor do estabelecimento. Em Portugal, 0 © sistema existiu de longa data e foi introdu- ido desde cedo no Brasil. Quem, em So Paulo, no século XVII, mais exatamente depois de 1610, quando se autorizou a importacdo. de sementes de trigo ou bacelos, aparentemente do Rio da Prata, quisesse moer trigo, teria de Apelar, se no tivesse moinho, para os que tivessem moenda particular, ¢ estes pertenciam uase sempre 4 gente principal da terra, ou ‘mais abonada, pois além dos gastos para armi-lo, tinham facilidades maiores para obter “data de gua ¢ assento”. A partir de 1614, comecaram 4 aparecer desses moinhos.“banais” na vila de Sio Paulo, ou registros de datas para_levanté- los, como o de Joo Fernandes Saavedra, no caminho de Pinheiros, os dois de Manuel Joao Branco para a banda do Jerobatuba, que era 0 ‘outro nome do mesmo rio Pinheiros, o de Cor- nélio de Arzio, provavelmente no Anhanga- bai, o de Amador Bueno, a margem do Man- daqui... Mas o principio também vigorou, no Brasil, ara lavoura ¢ 0 fabrico do agiicar, ¢ no apenas em $80 Paulo ou no vale do Paraiba paulista, Antonil estende-se largamente sobre as relages efetivas ow ideais do senhor de engenho com 0s lavradores que dele dependiam, forgosamente ou ndo, Era este iltimo 0 caso dos que, por antiga obrigaga0 ou contrato, s6 podiam moer sua cana em um mesmo engenho onde tinham Partido arrendado © também os que, donos de plantagdo prépria, ou cujo contrato de arrendamento nio contivesse cliusula que os compelisse a mandar a cana produzida a0 Proprietério, podiam, a0” menos teoricamente, escolher a moenda que melhor Ihes convicsse. No primeiro caso estavam os chamados ‘avr dores obrigados” © nos outros os “lavradores livres”, © a cana levada a moer chamava-se ora “cativa”, ora livre ou isenta. Na pritica acontecia quase sempre que.ambas se equiva- lessem, pois ao lavrador era de toda convenién- sia levar a moer seu produto no engenho mais réximo, a0 paso que 0 dono da moenda finha como forgd-lo a recorrer aos seus prés- timos, acrescentando ou abatendo na quanti- dade © qualidade do agiicar que exigisse em aga do trabalho feito. A diferenga esté em que o senhor de engenho, ao contririo do senhor de moinho de trigo — ou de milho —, nao dependia ou dependia menos, do poder Pablico, para erigir seu estabelecimento. Por isso, ou porque precisasse gastar mais em maqui- ‘as ¢ em pessoal, estava ao alcance do primeiro cobrar do lavrador metade de todo 0 produto beneficiado, ou mais ainda, quando se tratasse 7 de lavracor “livre”, ao passo que a maquia do moleito dependia de posturas que a fixavam geralmente na sétima, quando muito na quarta parte da farinha obtida. Todo esse “complexo” da cana-de-agiicar, laborado nas capitanias do nordeste (ou talvez Ja na ilha da Madeira) reproduz-se em Sio Paulo. Se existe diferenga € na nomencl assim, ao nome de “casa grande” substitui-se aqui_o de “sede”. E ao senhor de engenho chama-se “cngenheiro”, até que esta design: ‘go passe a ser monopolizada pelo tipo protis- sional que a guarda para si nos dias atuais, A verdade € que na provincia de Sao Paulo e, ‘mais ainda, no vale do Paraiba da época, no sobrou tempo para desenvolver-se um complexo independente da cana-de-acicar. A_passagem da fase da lavoura de subsisténcia fez-se aqui sem sobressaltos e descontinuidades, e, em rea- lidade, @ riqueza nova no ¢ tamanha_que chegue @ apagar as antigas usancas ¢ nem as virtudes civis e domésticas que se mantiveram como hibernadas nos tempos da_mais_ triste ¢ apagada pobreza. Saint-Hilaire, viajando pelo vale do Paraiba, péde notar que seus moradores, como os paulistas em geral, se mantinham ainda fitis 4 rede de dormir e descansar, em contraste com os mineiros que, quase todos, tinham jé abandonado esse uso herdado dos indios © dos bandeirantes, para se afeigoarem cama ¢ ao catre, que sio trastes de emboaba. A vigilancia eclesiéstica ainda tinha como pre- servar a diserigio_no trajar, sobretudo entre mulheres, ¢ um vigirio de Guaratingueté amea- sa com @ pena de excomunhdo ais que andem de saia tdo curta que Ihes “aparegdo 0s artelhos dos pés” ou caiam “A maneira de degrios de sepulero, aparecendo mais interior, nova moda que com escandalo de toda a modestia e hones- tidade tem entretido o demonio. Nao impedia ‘isso que 08 proprios clérigos, com todo o pres- tigio de que desfrutavam, ou até por causa de sua preeminéncia social, tivessem vida menos solta de costumes do que os do resto do Brasil, sem que essa soltura os desconceitue na comuni- dade. O governador Franca © Horta (1802- 1811), que tivera ordem de intensificar na capi- tania paulista 0 recrutamento para as guerras do sul, precisou, certa vez, desenganar 0 capitlo- mor de Taubaté da curiosa erenga de que a obrigagdo de alistamento nfo se entendia com filhos de padre. 8 Nao obstante esses residuos arcaicos, os moradores do vale do Paraiba continuam, ainda ‘pa fase em que a policultura primitiva parece querer dar lugar & monocultura canavicira, a fazer longas viagens, de preferéncia para’ o Rio de Janeiro, a fim de se proverem.cas tiltimas novidades fluminenses ¢ européias. Spix e Mar tius, que correram toda a regido nas tltimas semanas de 1817 © nas primeiras de 1818, s6 encontraram janelas envidragadas desde que sairam do Rio, quando chegaram a0 vilarejo de Guaratingueté. Os contactos e os negacios dos hhabitantes da maior parte da area reguda Pelo rio Paraiba, mais facilmente se faziam com 0 Rio de Janeiro do que com a capital da provincia. Essa situacio 36 comecava a mudar em Taubaté, que tinha comércio maior com Sao Paulo, embora os naturalistas bavaros Julgassem notar que ainda subsistia, mal disfar- sada, a animosidade velha dos taubateanos contra 0s paulistanos. Sabe-sc, dos iiltimos, ue pagavam na mesma moeda a malquerenga, conforme uma trova dizia: Cavalo pangaré, Mulher que mija, de pé, Gente de Taubaté, Liberanos domine © que pouco notaram os naturalistas, bons observadores € botanicos de alto renome, prin. cipalmente Martius, porque Spix era principal- mente zoélogo, foram canaviais. Em Bananal, © que especialmente thes chamou a atencao foram os milharais, que, seria entdo, a principal Plantagiio do distrito. Em Silveiras assinalam, € certo, plantagdes de cana, mas depois do milho ¢ da mandioca. Em Guaratingueta destacam sobretudo 0 tabaco, parecendo-lhes ali o solo Singularmente adequado a0 seu cultivo, tanto que 0 fumo local, tabaco de serra acima, como era geralmente chamado, s6 dava primazia ao tabaco da marinka, mormente a0 que se fabri- cava na ilha de Sto Sebastido. Em Taubaté observaram a bondade das esteiras de palha ld fabricadas © que tinham aceitaglo até na Corte, ¢ da lavoura, sem especifiear qual fosse, salvo onde falasse nas uvas de boa qualidade ue medravam naquela latitude ainda tropical. Mas 0 que chamou mais vivamente sua atengio, ‘mos arredores da vila, foram as fazendas de Sriagio, Ha muita noticia, pela mesma époea, 29 da presenga dessas fazendas em toda a extensio do vale do Paraiba paulista e no é muito querer enlagar esse fato ao crescente influxo de naturais de Minas, que desde fins do séeulo XVIII se vai fazer sentir cada vez mais, néo s6 aqui como no norte verdadeiro da capitania de Sio Paulo, © norte de Franca, Batatais, e também de Casa Branca, onde também se tentou o estabelecimento de casais de ilhéus, maneira do que se tinha feito anteriormente no Rio Grande de Sio Pedro, Essas migragdes_tém sido freqiientemente atribuidas ao declinio da mineragio, embora os lugares de procedéncia (tajuba, Campanha, Aiuruoca, Pouso Alto, Bac- pendi € outros) no pertencessem sempre a ‘reas onde a tradigdo das lavras de ouro e pedras reciosas fosse mais poderosa ou persistente, Por outro lado parece fora de divida que a tals. migragdes, ¢ no s6 a0, cresimento demo- ‘grifico vegetative ou as promessas de riqueza facil oferecidas por alguma lavoura de cunho comercial, como seria mais tarde a do café, Se_deve atribuir 0 aparecimento em ripida sucesso de novas-vilas numa regio que, situada ‘no caminho entre as cidades de So Paulo ¢ do Rio de Janeiro, podia retirar proveito de tal situagio. E notério, aids, que 4 vaidade pessoal de certos capitdes-generais amigos de perpetuar a lembranga de sua administracio pa toponimia das terras que governaram, se atribuiu 0 terem dado autonomia municipal fa povoados que néio mereciam tanta honra, ‘a fim de thes impor 0 proprio nome. ‘Ninguém fez mais por merecer essas criticas, ‘em Sto Paulo, do que D. Luis Antdnio de Sousa Botelho Mourio, 0 morgado de Mateus (1765- 175). A cle se deve a clevagio a vila, em 1767, de Sao José dos Campos, onde nio ousou mudar 0 orago, mas em 1770 mandou erigit pelourinho, condecorando-a com seu onoms- tico, na localidade que passou_a_chamar-se Sao Luis de Paraitings. Mais sobrio, mas ‘apenas nesse particular, seré o governador se- guinte, Martim Lopes Lobo Aires de Saldanha (1775-1782) ¢, em verdade, nem poderia, sem ‘grosseira incongruéncia, dar-se a0 abuso que ‘ao insistentemente critica em seu antecessor. Contudo, Francisco da Cunha Menezes, que ‘exerceu 0 governo logo depois (1782-1786), ‘mas que deve deixar a capitania para ir.assumir posto semelhante na India, ndo o fard sem fantes criar, em 1785, na antiga freguesia do Facto, avila de Cunha, assim nomeada por causa de seu apelido. A Francisco da Cunha sucede Bernardo José de Lorena (1788-1797), depois do governo interino do Marechal Frei Jost Raimundo Chichorro (1786-1788), ¢ ja Jno ano da sua chegada, 1788, eleva-se a vila a ‘freguesia de Nossa Senhora da Piedade de Guai- ypacaré, com o nome de Lorena. J4 em 1781 aproximadamente, comera a povoar-se 0 sitio de Nossa Senhora da Conctigao de Embai, a Tutura Cruzeiro, Pelo mesmo ano, ou pouco depois, desenvolvem-se pequenos niicleos nos sitios onde se erguerdo_as_vilas de Bananal, ‘Cachoeira, Arcias, Silveiras, ¢ de um_aldea- mento de indios (Puris), criado em 1800, nasce Queluz Alguns desses micleos vio conhecer ‘nos anos imediatos notével incremento, a co- ‘meyar por Areias, que a bem dizer ainda nfo ‘existe em 1800, e j4 6 vila em 1816. De Arcias dependera, no eclesiistico, a localidade de Ba- anal, que se emancipa em 1811 para formar pardquia propris, se tora vila em 1832, € cidade em 1849. J& agora alcancara toda a sua pujanga a era do café no vale do Paraiba Paulista e comegava a conquistar novas dreas. Quando principiou essa lavoura a ganhar “norte” da provincia? O aparecimento do café no rol das exportagdes paulistas niio era rnovidade. “O mais velho dos documentos da exportagiio por Santos até hoje desvendado data de 1795", escreve Afonso d’E. Taunay, referindo-se a uma remessa do marcchal José ‘Arouche de Toledo Rendon a seu itmio, Diogo de Toledo Lara Ordonhes, entéo em Lisboa. “E em outro lugar, esereve ainda Taunay — “Documentos insofismaveis nos autorizam a rer que a partir de 1797 jamais deixou de se dar a exportagio paulista de café, qui¢é com jintermiténcias maiores ou menores”. © aoess0, hoje mais facil, a antigos mapas de importaco fe exportagao, permite modificar um tanto esses dados. A primeira remessa de café produzido ‘em Séo Paulo, de que ha noticia segura, ocorre, de fato, bem antes em 1792, tendo ido na galera Nossa Senhora Madre de Deus e Sao José Belona, fe nfo € a unica do ano. De 1794 é a primeira remessa de José Arouche a0 irmio, © que niio impede a existéncia da outra remessa de 1795, ‘a que se refere Taunay. No mesmo ano de 1794, em que foram aquelas amostras, zarparam_ para Lisboa uma galera, uma sumaca ¢ trés navios, todos levando café. Faltam elementos ‘que permitem estimar 0 montante em arrobas 30 dessas remessas, mas pode-se dizer, se as pri- meiras sairam em 1792, que coincidiram com as 160 arrobas que na mesma data deixaram a Guanabara com destino a Lisboa. Da capi- tania de Sio Paulo, sabe-se, pelos dados que compilou 0 capitio-general’Anténio Manuel de Melo Castro © Mendonga, de um embarque, em 1798, de 1.040 arrobas, e nesse total entram 628 arrobas, mais de 60% destinadas ao Rio de Janeiro, ¢ teriam servide, talvez, para engrossar fas exportapdes fluminenses. Fluminenses no sentido em’ que era usada entio a palavra, € ue podia abranger os naturais da cidade do Rio. Aquele total refere-se, porém, a exporta- ‘90es feitas pelos portos paulistas, entre Ubatuba € Paranagud, entio pertencente a capitania de Sio Paulo. Do vale do Paraiba, se alguma exportagdo houve, nfo se pode ter certeza, pois em 1799 ainda nio existia nem sequer 0 registro de Cunha, e se jd existisse s6 forneceria dados bastante incompletos a respeito, ja que nio incluiriam areas mais vizinhas da provincia fluminense. Nem se pode afirmar com seguranca que ja entio houvesse plantio de café em tais. ‘reas. Se fosse licito aceitar ao pé da letra as informacdes de Antonio Manuel de Melo Cas- tro ¢ Mendonga, 0 “Pilatos”, como era chamado pelos paulistas, nfo existia ou era insignificant “Ele vegeta e produz bem em toda a Capitani ‘escreve, ‘mas com especialidade na Marinha, conde o clima, por quente © amido, concorre sobremaneira para a sua melhor frutificago, de forma que pela grandeza de cada grdo se * distingue 0 que hi da Marinha ou da Serra acima, sem que este acidente 0 faga diverso ‘na qualidade”. E acrescenta que, nao obstante aa boa qualidade do solo assim como a facilidade € pouca despesa para 0 aprovcitamento, por isso que 0 cafeeiro s6 requer colheita, separagio ‘da primeira casca e seca dos gros, que se fazem ‘com pouces gastos, ninguém cuidara, na capi- tania, de fazer dele cultivo regular, visando ao mercado. “A cultura deste género”, diz ‘mais, “no passa de alguns pés, que cada hum ispersadamente planta nas suas fazendas para ‘omato das ruas e passeios dellas ...”. O litoral @ que provavelmente quer aludir o “Pilatos” € provavelmente a marinha de Santos € a de ‘Ubatuba que, nos mapas de exportaciio anexos 4 sua Meméria econdmico-politica, S40 08 portos de onde saem as maiores remessas. O café de serra acima descendia talvez das mudas plan- tadas primeiramente em Jundiai, segundo cons- ta, j@ nos fins do séeulo XVIII € que se propa- ‘garam em seguida para os municipies vizinhos. E possivel que pela mesma época comecasse a penetrar o café na parte paulista do yale do Paraiba,: por onde se prolongariam as planta- ees do planalto fluminense. Segundo a versio mais getalmente acreditada, do café que por volta de 1760 levou do Maranhio ao Rio de Janeiro o desembargador Joao Alberto Castelo Branco, procedem as plantagdes do padre Jotio Lopes e depois as do padre Anténio do Couto, ‘na fazenda do Mendanba, situada na freguesia de Campo Grande. Foi do Mendanha que co- mecaram a subir 0s cafezais para serra acima, na diregdio de So Joio Marcos e, finalmente, de Areias, onde chegariam por volta de 1790 4 pouco mais tarde, propagando-se em seguida ‘nos municipios paulistas das proximidades. Es- taria nisto uma das causas da prosperidade rapida que alcangaram logo ao inicio do século XIX, nfio s6 Areias como Bananal ¢ Queluz? fato € que pelo primeito decénio do mesmo séoulo XIX, ndio_deixa de ser_mencionado 0 ceafé entre os produtos que, de Sio Paulo, se exportavam para o Rio de Janeiro e Minas pela via terrestre, © a via terrestre, no caso, 66 podia correr pelo vale do Paraiba, c, mais preci- samente, por Areias, De Arcias escreve Mon- senhor Pizarro, nas Memérias histéricas do Rio de Janeiro (1822), que seu terreno era fétil, “especialmente em caffé, que d'ahi se exporta pelo caminho de terra para o Rio de Janeiro, ‘onde (@) vendido a 2 mil réis cada arroba”. Também de Lorena, municipio de que em 1816 se desmembrou Arcias, a que foram adjudicadas as freguesias do Bananal € Queluz, escreve Pizarro que é fértil também em café, ““em cujo aénero consiste a principal agricultura dos habi- tantes...”. Nas localidades que se seguem, em direglo a Sto Paulo, também ja aparece ‘© calé, a0 lado, ora da cana-de-acicar (Guara- tingueti e Pindamonhangaba), ora do aciicar © do fumo (Taubaté e Jacarei). De Jacarei, consta que exporta “por Sio Sebastiiio e por Santos abundante café ¢ fumo: © por terra muita poreada”. Quanto a Moji, exporta “algum café, algodio em rama, € tecido € porcos”. Seria de data relativamente recente a expan- slo_ou, a0 menos, a producdo dos cafezais ro chamado norte de Sio Paulo, pois ao publicar em 1817 a sua Corografia brazilica, Aires do Casal no chega a arrolé-los ainda entre as Tiguezas da regido, embora registre 0 algodio, © tabaco, 0 agiicar (em Taubaté ¢, principal- mente, em Guaratinguet®), mantimentos em eral, além de porcos, galinhas © gado grosso. Seja como for, a grande lavoura cafecira_ndo comeca a afirmar-se aqui senfio_na_terceira dévada do século XIX, ¢ seu Apice_situa-se no periodo que corre de 1836 2 1886. Em Gua- ratingueté, por exemplo, produzem-se, em 1836, 22.442, em 1854, 100.885, em 1886, 350.000, seguindo-se um declinio quase vertical. A popu- lagdo local também se desenvolve paralela- mente durante esse meio século, se bem que ‘num ritmo mais moderado: de 7.658 almas em 1836, sobe a 11.482 em 1854 (excluindo-se Apa- recida) € @ 25.632 em 1886, Ao abatimento posterior na produgo cafeeira no corresponde, como se poderia esperar, uma sensivel reducdo ‘no ritmo da expansio demogrifica, pois em 1920, a0 paso que a produgdo havia caido 97.687 arrobas, menos de um tergo dos totais de 1886, a populagio tivera um incremento de perto de 70% em igual periodo, E embora sem alinhar as cifras relativas a outros lugares do vale do Paraiba paulista, nfo parece arbi- trario admitir que passaram por um provesso semelhante, ao menos 05 que foram diretamente servidos pela linha da Central do Brasil, que teria agido ali como um condensador demo- sraico. E também por volta de 1820 que comecam a surgir em toda aquela area as residéncias senfioriais, que marcam 0 apogeu da civiizagao do café em Séo Paulo, antes de trasladar-se para o oeste da provincia, e de que alguns dos mais belos exemplares se acham representados neste volume, Segundo presuncao de Tom Maia, que fixou em belos desenhos muitas dessas vivendas, uma das mais antigas, sendo a mais antiga, seria a sede da fazenda Pau @’Alho, situada em Sio José do Barreiro, e ora em curso de restauragio para nela instalar-se 0 Museu ‘Nacional do Café. A uberdade do solo, suge- ida no proprio nome da fazenda, que 0 da f@rvore propria de terras aptas ao cultivo da rubiécea, além de sua localizagio no caminho de Areias, mostra talvez uma das portas de ingresso, na provincia dos cafezais fluminen- ses, A fazenda refere-se Saint-Hilaire, que nela passou em abril de 1822, a caminho do Rio, € diz que é a maior plantagdo avistada em sua viagem, até aquele momento, Em agosto do ‘mesmo ano jantou ali 0 principe regente D. Pe- dro, na viagem em sentido contrério, que 0 conduziu a Sio Paulo © a proclamagdo da Independéncia. Hoje, apesar dos estragos do tempo, € reconhecivel ainda 0 aspecto do casarao ccuja estrutura, segundo os especialistas do IPHAN (Instituto do Patriménio Histérico € Artistico Nacional, segue as linhas tradicionais dos engenhos fluminenses, assim como a das fazendas minciras, com seu embasamento de pedra ¢ a5 paredes de pau-a-pique, a denuncia- rem, no conjunto, um “notavel amadurecimento do problema rural cafezista”. ‘A ela ainda nao se referem Spix ¢ Martius, que, no entanto, aludem a localidade do “Bar- reiro”, por onde passaram, depois de deixar Bananal, situada a coisa de 5 léguas de distancia. Nao prova essa omissio que a fazenda, ow a 32 sede da fazenda, do Pau d’Alho, cuja presenga se imporé to visivelmente em 1822, ainda fossem inexistentes em 1817, mas sugere a0 menos que a casa onde jantou D. Pedro teria sido construida no intervalo. Essa suposigao € reforgada pela circunstincia de ndo figurar seu proprictério Jodo Ferreira, ou Joao Ferreira de Sousa, 0 mesmo que juntamente com um fitho, Francisco, acompanhou 0 principe no resto do percurso, pertencendo ambos a sua guarda de honra, entre 0s que, de acordo com 0 tombamento daquele ano, teriam na Provincia de Sio Paulo mais de 30 escravos, que ainda era_um minimo compativel com tamanha plan- taco. No municipio de Arcias, onde entéo se achava o lugar do Barreiro, ja havia, no entanto, dois fazendeiros com escravatura rela- tivamente numerosa, e que se acham devidamente arrolados no mesmo tombamento de 1817 ‘Um deles, com 50 escravos, & 0 capitio-mor Domingos da Silva, que tem a fazenda do Ri- beirto, entre o Pau d’Alho e Areias, distando desta cerca de uma legua. Ao mesmo proprie- tario se refere Francisco de Castro Canto ¢ Melo, no passo de sua relagio da viagem de D. Pedro, onde se lé: “No dia seguinte, dezes- sete (de agosto), foi o pouso em Arcias. Nesse dia, jantou o principe na fazenda do coronel Jodo Ferreira, no Pau d’Alho, e seguindo, parou na casa do capitio-mor Domingos da Silva, onde teve 0 mais franco e generoso aco- Thimento”. Trata-se de Domingos da Silva Moreira, natural de Pouso Alto, Minas Gerais, © foi dos primeiros povoadores de Areias, onde se stabeleceu seu pai, oriundo de Taubaté ou Pindamonhangaba, por volta de 1796, com toda a familia, ¢ viria a ser uma das figuras conspicuas da regido, juntamente com 0 coronel Joo Ferreira, cujo nome esté associado, assim como o do alferes Jost Gomes dos Santos, is origens da cidade de Sdo José do Barreiro. Consta, com efeito, qué ambos, “pelos anos de 1820, pouco mais ou menos”, escreve Azevedo ‘Marques, repartiram certa extensio de terra de sua propriedade, ali edificando um templo com a invocagio de Sdo José. Em 1836, tornou-se capela curada, e em 1842, sede de freguesia. Do micleo formado nas proximidades do Pau ¢Alho nasceria em 1859 a vila, desmembrada do municipio de Areias, ¢ em 1885 a cidade de So Jofo do Barreiro. No tombamento pro- 33 vincial de 1817 0 outro nome a figurar, com fazenda no mesmo municipio, € 0 de Gabriel Serafim, com um total de 43 escravos. Trata-se, com certeza, do futuro capitio-mor Gabriel Serafim da Silva, dono da fazenda Quilombo, ‘que seria senhor de muita terra, muito escravo, ‘muito dinheiro ameathado em casa. Este em tal abundincia que, ao morrer 0 capitéo, celi- batirio e sem filhos, a casa the foi saqueada, ‘© quase se pode dizer que dela ndo ficou pedra sobre pedra. Essa, pelo menos, a tradigdo, guardada ¢ transmitida pelo historiador ¢ genca- logista do vale do Paraiba paulista, Carlos da Silveira. Entretanto, 05 trés senhores de excravos do municipio de Areias registrados no tombamento de 1817 ainda estio bem longe de figurar entre 05 maiores proprietérios rurais da provincia que assinala 0 mesmo rol. O maior é de Jonge, © coronel Luis AntOnio de Sousa, que ali aparece com 290 escravos. Esse magnata que, a0 seu tempo, foi dos homens mais opulentos de Sao Paulo ¢ do Brasil, tinha porém suas proprie- dades rurais em Campinas, ndio no vale do Paraiba, ¢ cultivava acticar, no, ou pelo menos rio em escala apreciével, café. Dele escreveu Luis d’Alincourt no ano seguinte (1818), que s6 na drea campincira tinha 17 engenhos de cana, com uma colheita anual no inferior a 30.000 arrobas de acicar, ¢ que a renda de sua casa andava em 80,000 cruzados, sendo que tum s6 dos engenhos rendera 9 contos de réis em 1817. Tirante, porem, 0 futuro brigadeiro Luis Anténio, nenhum outro proprietario rural tinha em Sao Paulo maior niimero de escravos do que o sargento-mor Manuel José de Melo, com 180 cativos em sua fazenda de Guaratin- gueté. Portugués de Sto Jodo da Foz, Manuel José cedo se estabeleceu na regido, onde foi figado por casamento a familia antiga da terra e onde tinha fazenda nio nomeada né tomba- mento. Sua ou de sua gente era a Fazenda dos Barboza, tio bem representada no presente documentério iconografico. O apelido era fre- qiente em Guaratingueté entre a larga descen- déncia de Diogo Barbosa Rego, que viveu na ‘mesma vila e nela faleceu em 1661, apenas quatro anos depois de fundada, ¢ sera tetrave da mulher do sargento-mor. Haveria simples coincidéncia nessa homonimia que parece rela- cionar a fazenda de Manuel José de Melo & geraglo de Diogo Barbosa? Note-se, porém, ‘que se a propriedade ainda hoje conhecida como fazenda dos Barbosa é a mesma em que Iabu- tavam 180 cativos no ano de 1817 — ¢ 200 no seguinte, segundo resulta do Recenseamento das Ordenangas de 1818 —, outra.é a sede epresentada nos desenhos as pags. 114/115 do presente volume. Esta, de acordo com pesquisas ‘efetuadas por Thereza Regina de Camargo Maia, foi edificada j& nos meados do século passado ce deveria ser casa “que durasse sempre” segundo seu proprietério, Pelas mesmas pesquisas fica- se sabendo que cinco anos se consumiram 36 nna socagem das taipas e que — assim o diz a tradigdo — trabalhavam nesse servigo, durante fa noite, os mesmos escravos que de dia tinham estado no eito. ‘A fazenda de Manuel José nfo era a dinica que, na provincia de Sdo Paulo, tinha 180 ‘escravos em 1817, Outros tantos trabalhavam na Conceigéo, do alferes Luis Gongalves, em Bananal, Logo em seguida, vinha com 150 es- gravos a de Braz Oliveira Arruda, chamada Pouso Seco, também em Bananal. O lugar de Pouso Seco ficava exatamente por onde passou D, Pedro em 1822, antes de alcangar a fazenda Trés Barras do ““fazendeiro Hilério", que deve- ria hospedé-lo, Esse fazendeiro, de quem Fran- cisco de Castro, em sua relagiio da viagem do Principe Regente a Sio Paulo, s6 dé 0 prenome, tinha também fazenda em Sio Joio Marcos, nna provincia ffuminense, ¢ ali havia pousado, no dia anterior, 0 futuro imperador. Chamava-se Hildrio Gomes Nogueira, ¢ era sogro de Braz Oliveira Arruda, 0 proprietario de “Pouso Seco”. Isso faz presumir que as ditas fazendas pode- riam originar-se de uma s6 ¢ vasta propriedade. ‘A julgar pelo tombamento de 1817 faria pobre figura a “Trés Barras” ao lado da “Pouso Seco”, ji que Hilério nao possuia ali mais de 45 escra- vos, ao passo que Braz, seu genro, tinha, na propriedade contigua, exatamente quatro vezes esse nimero, Nem por isso Hilario Gomes deinava de ser fazendeiro respeitavel na época, ‘mesmo sem entrarem em linha de conta suas terras na provincia do Rio. O pintor Rugendas, ‘que conhecia bem essa provincia, escreveu, ‘com efeito, que jé podiam ento ser consideradas importantes as fazendas com 34 escravos € outros tantos cavalos ¢ bois. Em. 1860 esteve Emilio Zaluar em Trés Barras, depois de deixar f fazenda do entlo bartio da Bela Vista, mais tarde visconde de Aguiar Toledo, ¢ antes de visitar em Bananal a do comendador Manuel Laer dae eoARM >) 4 de Aguiar Valin (que também seria titular do Império quando, em 1884, foi feito bario de ‘Aguiar Valin) e admirou vivamente nas paredes da sala e da capela as pinturas do artista espa- nhol José Maria Villaronga, nao Vilarongo como est em seu livro, Todo 0 edificio que, no estado atual, se acha representado no presente documentério, com o nome de fazenda Resgate, esti sendo restaurado, e uma vez terminadas as ‘obras deverdo estar recuperadas as. pinturas que tanto entusiasmaram 0 visitante portugués. A nfase que se possa dar ao papel de Bana- nal na era do café do vale do Paraiba paulista é plenamente justificada quando se considere a extensio ¢ a produtividade sem par das suas fazendas, Pelo tombamento de 1817, quando ‘4 povoagdo nio tinha alcancado a autonomi ‘municipal, havia em suas redondezas, para um total de apenas 84 lavradores, 886 escravos, ou seja, cerca de 10 cativos por lavrador, pro- porgio que s6 encontra equivalente em Cunha. Mas em 1817 ainda estava longe essa area de alangar a prosperidade que teria mais tarde, Principalmente na década que se iniciaria em 1860 quando, com uma arrecadagdo, em 1864-65, de 36:4858951, © em 1866-67 de 34:2818745, ultrapassa a propria capital que, nos mesmos anos, rende, respectivamente, 26:804S000 € 31:1695000, Por outro lado, a afinidade de inte- esses e a intimidade de relagdes com alguns ‘municipios fluminenses e mineiros vizinhos, onde todos os fazendeiros formavam como uma s6 familia, destacavam Bananal do restante da provincia de So Paulo e até da maior parte do proprio vale do Paraiba paulista, apesar de todo ele ter na Corte o seu escoadouro natural. Isso pode explicar largamente os propésitos autonomistas que jé em 1829 surgiram ali e fem outras localidades préximas — Rezende, Valenga, Parati, S40 Joo Marcos, Itha Grande, nna provincia do Rio de Janeiro; Campanha Baependi, em Minas Gerais; Areias, Cunha : _ 35 © Guaratinguetd, em Sio Paulo, Naquele mesmo ‘ano propés 0 padre José Marques da Mota, na Camara de Rezende, para a nova provincia o nome dessa cidade, que se tornaria sua capital. Seria talvez 0 primeiro, mas ndo ser 0 iltimo plano separatista — separatista com relaglo a Sio Paulo — que envolve Bananal ou nela se inicia. O5 promotores do movimento de 1829 ficaram tolhidos de levi-lo adiante devido is turbuléncias do fim do primeiro reinado, as agitagdes do periodo regencial e finalmente is sublevacdes de 1842. Em 1842 nilo deixaria 0 “norte” da pro- Vincia de solidarizar-se com os sentimentos liberais que provocaram a rebelio sorocabana e seu correspondente em Minas Gerais. Indepem dentemente de Sorocaba, ainda que estimulados pelo seu exemplo, sublevaram-se sobretudo em Lorena 03 liberais, com a conivéncia de alguns chefes politicos e fazendeiros fluminenses, como 15 Breves, de Sfio Jollo Marcos, ¢ aos poucos foram dominando ou inquietando toda a regido ue se estende de Taubaté as fronteiras da pro- vineia do Rio de Janeiro. Como fossem poucos 0s homens que poderia distrair Caxias, ocupado em exterminar 05 outros focos de rebelio em So Paulo, seguiram diretamente da Corte as forgas que deveriam agit nessas partes. Nao silo poucas as dificuldades ali ericontradas, de icio, pelas tropas legalistas. Em Areias, os Permanentes mandados do Rio de Janeiro se vviram_severamente castigados entre os dias, 21 € 24 de junho, e s6 puderam salvar-se no ‘iltimo dia, gragas a chegada de um corpo de fuzileiros navais mandados igualmente da Corte. ‘Ao contrério do que esperava 0 governo central, ‘2 divulgagdo das noticias do revés dos iberais, paulistas da entrada do comandante-chele em Sorocaba, longe de acalmar, teria aculado mais ainda, na aparéncia, as paixdes politicas rnesse novo foco de rebeldia, de sorte que se impunha a necessidade de reforcos. © proprio Caxias foi a Taubaté, onde a 11 de julho, entre- tanto, declarou que n&o havia mais rebeldes na provincia de Sdo Paulo, ou que estes fugiam © se entregavam, A verdade, porém, ¢ que, logo ao dia seguinte, ria ferir-se nas proximidades de Silveiras, 0 combate mais sangrento de toda arebelido. O ataque aos liberais, que dominavam a localidade, foi desfechado pelo capitio Manuel Antonio da Silva, procedente do Rio de Janeiro, prolongando-se os combates varias horas, até que, dominado pelos legais um sitio estratégico, se viram forgados 0s rebeldes a abandonar ~ suas trincheiras junto a Silveiras. Nessa luta, 8 soldados do governo foram mortos © 14 fe- ridos, presumindo-se que, dentre os liberais, 40 teriam eaido sem vida. Seguiu-se uma cena de saques ¢ devastagdes ‘em que, na dnsia de vingar 0s soldados da lei ‘mortos pelos rebeldes, no se distinguiu menos ‘a gente do capitio Manuel Antdnio do que contingente de fuzileiros navais chegados a0 lugar s6 depois do combate, Na Corte, sera forgado 0 Ministro da Guerra, José Clemente Pereira, a dar explicagées sobre as tropelias que teriam cometido os contingentes legalistas: a principal explicagao foi de que estiveram de todo alheias a elas as forgas do Exército Pacifi- cador. Com efeito, no dia 13 de julho, quando se consumara 0 saque a Silveiras, ainda se ‘achava Caxias, seu comandante, em Taubaté, distante 20 léguas do local dos acontecimentos. A 15 avangou até Pindamonhangaba, onde permanecera ainda todo o dia seguinte. Uma semana depois desembarca no Rio de Janeiro, onde se prepara para a miso nova que 0 aguarda em Minas. Contudo, 0 movimento sedicioso de Silveiras ¢ de todo 0 nordeste da Provincia de Sio Paulo, nio cessaré completa- mente antes de 28 de julho, Jé a 18 de julho fora decretada a separagio ‘da mesma provincia e incorporagiio & do Rio 36 de Janeiro, dos municipios paulistas de Bananal, ‘Arcias, Queluz, Cunha, Silveiras, Lorena e Gua- ratingueté, A medida tinha cardter provisério, E certo, s6 devendo perdurar até serem comple- tamente extintos os nicleos sediciosos assim como as conseqiiéncias imediatas do levante. Mais tarde, porém, no cessariam, ainda que por motivo bem diferente, em alguns desses lugares, principalmente em Bananal, reiterados movi- mentos visando a ancxé-las definitivamente provincia fluminense, Os motivos prendiam-se sobretudo as estreitas relagdes comerciais que entretinba toda a parte paulista da bacia do Paraiba, mas principalmente ‘vs municipios de Bananal, Queluz, Arcias ¢ Silveiras com a capi- tal do Império, bem mais do que com a cidade de So Paulo. Extensio natural da area cafecira fluminense ¢ dependente, cconomicamente, da Corte, pouco tinha a ver essa regio com a evolugdo da lavoura comercial do restante da Provincia, que se desenvolveu de preferéncia no Oeste, 0 Oeste da maior parte do século passado, que teve seu centro primeiramente em Ttu, ¢ depois em Campinas. A principio todas as atengdes se dirigiam nele para 0 agicar, que tinha saida relativamente facil, ainda que nem sempre encontrasse boa aceitacio, pois devendo ser transportado sobre longas distancias cm tropas de animais, exposto as chuvas, nio aro jé cherava a Santos deteriorado, (© bom sucesso da lavoura cafecira no nor- deste da provincia, que comeyou a patentear-se 4-na década de 1820-30, no perturbou a pri

Você também pode gostar