Você está na página 1de 23
08 Ree Manet Anudnis Pin vet bate, A presente obre constitu’ s adapter pera teatre da novela Os Firetes, de Manuel Anténic Fine. A edeptagéa foi feita pelo propria Autor, ne quadre de uma rezidéncis na Companhia Fé de Vento, do Porto, realizeds com o apaio de Fundacdo Calouste Gulbenkian. Com encenacdo de joo Laiz, «Os Pirstes» - primeira parte de um diptice dramético sobre ¢ mar - foi estrenda pelo «Pé de Vento» no Teatra de Vilerinha, na Porto, em 39 de abril de 1397. Cenario A cena é desnivelada. O nivel inferior & constituido pelo quarto de uma cass pobre: uma cama de ferro. uma cémoda; alguns livros cademnas sobre a cémads; uma cadeira. Uma porta 3 direita. @ mesmo nivel serve ainda de sala, apés mudanca de aderecos: cémoda passa a ter um vasa de flores sobre um «naperon» de renda; 3 cama & substituida por uma mesa rodeads por trés cadeiras. Breves escadas do para o nivel superior, o séthe, um metro acima. ‘As escadas constituem outro «espaco>, auténame embora escasso: € um sespaco entre realidades®. um lugar de passagem.. No sét30 smontos-sa todo o tipo de velbsrias: pilhas de caixas, alguns bringuedos, pneus, uma maquina de costure, um manequim, 2 mevitével arcs. Paus altos e cordas, uma au duas pipas. Bancos cadeiras velhas. Entre os dois niveis, uma janela alta para a rua lo chao do sét3o encontra-se aproximadamente ao nivel do terco inferior da janela, pelo que esta pertence tanto ac «espaco do quarto/salax como 20 «espaco da sétiox).4 janela tem largas cortinas brancas soltas. Os espaces relatives do quarto/sala e do sét3o distribuem-se aproximadamente no sentide da diaganal da palco, de made que um @ outro possam dispor de toda a profundidade de cena. Personagens: Manuel e Ana, adolescentes ambos; Capito dos piratas (voz e vulto); Mae de Manuel. +Manuel> Anas A Mex Esboces de Suzanne Rosier pera os figurines de Os Pirates. Cena um srs Meio da tarde. ‘Dis de tempestade, A chuva bate furiosamente na janels, 0 vento ‘agita as cortinas. ‘Oruido do mar embravecido ao fundo. 6 gemide da ronca Quando stra pano, Manuel Ana estie, de pé, em silénco,olbando 0 «espaco do quarto» esta invisivel (negral. ANA (De costas, diante da - Que tempestade! Se algum barco sai hoje 20 mar, afu MANUEL (Também de costas! - Os barcos hoje nao saem. O mar esta muito bravo... ANA-O mare a terra... MANUEL -E 0 eéu, @ 0 céu também... Vem ai uma trovoada.... (ANA - Uma trevoada? Deus nos livre! Nao dés azar! MANUEL (Volts-s# pars Anz, erguando os braces amescadoramentel - ANA (Recua, assustada) - NSo sejas palerma! Assustaste-me... MANUEL (Rindol - M3o me digas que tens medo de trovoadas... ANA - E tu nao tens?... Palerma... MANUEL (O5-he 3 mo) - Pronto, Ana, descul; trovejo mais Um trove la Fore. ‘Ang @ Manuel estacam, assustados. (ainda a ric) Eu no MANUEL - Eu no te dizia?... Ana puxa Manuel para 9 centro da cena. ANA. Sai da janela! Pode cair algum raiot MANUEL - Ora, um raio!... Os raios caem no mar! Ana senta-se num banco. - - Manuel vai sentar-e numa cadeira. A codeira tem ma pema partida ANA (Rindo alto) - Ah, ah! Os raios a cair no mar e tu a cair no. chao... Manuel muda de cadeira e vem sentarse ae lado de Ana. MANUEL (Voltando-se para 2 janela) = Lembras-te do nauirégio?... Foi de tempestade assis ANA - Nao fales nisso... E triste... (lha em volta, procurando mudar de ‘gssunto] As coisas que a tua m3e aqui guarda! (Pegs numa Eonecs semidesfeits) Nao me digas que tu também brincavas com bonecas! ‘Outre trav3o. Ana encolhe-se de medo. MANUEL - (Sem tirar os olhos da janela) - Foi no dia em que fomos despedir-nos do meu pai... Chovia e trovejava... Como agora... na levante-se 2 ands de um lado pare @ outro, miranda as coisas no séta0, até que se detém diante ds arcs. L8 fora, um So ladra furiosamente MANUEL - Achas que a América é muito longe? do outro lado do mar, deve ser ANA (Sem o olhar) - Eu cei longe. MANUEL - O meu pai nao escreve ha trés semanas! A minha mae n3o fala, mas eu sei que esta aflitissima. A ultima ver que escreveu disse que ia ti trabalhar para outra fabrica. A minha mae tem medo que lhe tenha acontecido coisa. (Pausa:) Lembras-te do senhor Albino! ANA - No... MANUEL - (Aponta para a janela) - Morava na casa ali defronte, mesmo do outro lado da rua. Foi para a América e a familia nunca mais soube dele... (ANA - Ora... Um dia, quando ni ém estiver a we (péecse de jocihos diante ds ares, tents abria) O que & que haverd aqui dentro? Manuel fica um momento em silincio, olhando para a janela. Finalmente levanta-se e aproxima-se de Ana. MANUEL -Devem ser roupas e coisas assim. A minha mae tem a mania de quardar tudo... ANA (Cheia de curiosidade) - Abrimola? E se cd estivesse um ‘tesouro?... MANUEL (Baixando-se 30 Isdo de Ana) - Um tesouro?! Em minha casa?... S6 se for uma tesoura... ANA -Abrimo-la, abrimo-la2| MANUEL -Esta bem, abre-se... Debrugam-se os dois sobre 2 arca tentando, em vio, ANA - Estd fechada 3 chave. = MANUEL - Qual chave qual carapuca! Esta ¢ perrat (Afasta-se, a procura de qualquer coisa com que abrir a arca. Volta com uma a tesoura ferrugenta:) Olha, encontrei a tal tesoura... Agora 56 falta 0 tesouro.., Esforcam-se ambos por abrir a arca com a tesoure. Manuel vai buscar ‘0 banco e senta-se, tantanda forcar a arca. Ana asté de joelbos a seu lade. (O vento continua a soprar la fora e.2 chuva a cair De vez em quando, 20 lange. soa a ronca. Depois de varias tentativas, Manuel e.Ana conseguem finalmente abrir aarea. ‘ANA (Inclinada para dentro da arca) - Ena, tanta tralha! MANUEL - Eu no te dizia! ‘Ana puxa um velho vestido preto de dentro da arca. ANA - Olha! Parece a batina do Padre Timsteo: Me sade pels cabeea = eb ‘rites sands fe poe as ‘imitando 0 Padre) Caros irmaos.. Rezai pelos vossos pecados... Cem pai-nossos ¢ cem avé-marias... ‘Quem da mais, quem da mais? Ana rie salta 3 volta de Manuel De repente, Manuel cala-se e fica quieto ¢ muito sério. Ana deixa também de rit, @ para diante dele a olh-lo, sem compreender ANA que foi, Manuel? MANUEL (De cabecs baixe © bracos caidos 20 longo do core) - Nada, lembrei- ANA - Do naufragio? Outra vez? Oh, Manuel... Manuel - © Padre Timéteo, na catequese, pediu-nos que rezdssemos pelos tembroseee Pes ave ANA - Sei la, ja foi ha tanto tempo... MANUEL - Rezdmos um terco inteiro. 0 Padre Timéteo dizia que, se of todos juntos, Nossa Senhora salvava o: Nossa Senhora ouvia as criancas, porque as criancas Ihe faziam lembrar o filho, que morreu na cruz. (Pausz.) Lembras-te do nome do navio? Era o , cum MAE (Voltando-se para Manuel - Anda, senta-te. A comida esta a arrefecer. Manuel 2 3 Mae sentam-se 3 mesa © comesam a comer MAE - Pus também um prato e um talher para o teu pai. E Natal, quem sabe se ele nSo aparece sem nds esperarmos? Gosta tanto de fazer surpresas... ‘Comem os dois em siléncio. MAE - Sabes que chegaram as familias dos marinheiros do navio afundado? Coitados... © mar ja atirou mais trés corpos 4 (Repara no siléncio de Manuel) Desculpa, nao devia falar Ge coisas tristec... Amanha ¢ Dia de Natal, née devia estar a falar destas coisas... Pausa, Mudande de assunte) Queres que te dé ja a tua prenda? MANUEL - N30, mie. Sé 3 meia-noite. 14 MAE - Ache que vais gostar... E uma coisa de vestir... MANUEL - Néo digas, mae, ndo digas! Sé 4 meia-noite! MAE- Pronto, eu ndo digo nada. AMie levanta-se e abre uma gawela da cémods, tirando um prato com ‘bolos e Colocando-o sabre a mesa. MAE- Fiz biscoitos de limo... A Mie toma a sentar-se. MANUEL - 0 Padre Timétee centou-nos que ne navie vinha um rapaz. 0 jornal diz que se chamava Robert... Tinha 10 anos... Vinha no bete que o navio lancou lego que encalhou e que se partiu contra os rochedos... Mas ja apareceram os corpos do bote, e o dele nao... MAE - Eu sei. A mae dele é uma senhora inglesa, uma nobre. “Tambem chegou antem, com ss outres familias. Ele ea neles dele, uma menina de 3 anos, chamada Ana... Vi as duas na Missa por alma dos Coitada! Perder assim um filho... Tao . Pause.) Tinha a tua idade... AMae levants-se outrs ver ¢ tvaz, de cima da cémods, um cesto com algumas pecas de fruta Tirso prato da frente de Manuel e pbe-he um MAE - Cor laranja... Queres que a descas 2? E depoi: ‘come os biscaitos .. (ChegerIne tambem o prate des biscortos) Ficaram-me muito bons. Manuel rods, distraido, a laranja na mo. MANUEL - Eu também as vi... Andavam as duas a passear na ‘olhar para o mar. MAE- Ela é muito bonita, nao é? MANUEL - Quem? 4 MAE - A menina. E tio branca e to bonita! (Pausa. A Mie tira a laranja das mavs de Manuel @ comeca a descascarlha) Dizem que um mago disse 3 senhora it que o filho ainda esta vivo, que se salvou a nado... Ela julga que ele pode estar por ai,,em qualquer, sitio da costa, ou em algum, ilhsu abandonado... uspirendo) Coitadinha... (Pausa. Mudendo de tom) Mas no falemoz mais disso... MANUEL - 0 Padre Timéteo contou-nos também encontraram um caixote na praia com uma cruz la dentro. Ele pensa que aquilo quer dizer alguma coisa, que ¢ um designio qualquer . MAE (Entragande 3 laranja descascads 3 Manual) - Pronto, agora no se fala mais de coisas tristes... Toma, come a laranja. E depois i. ‘| pouco 0 horas de irmos para 3 MANUEL - Achas que ela também vai 4 missa da meia-noite? 15 MANUEL - A menina. A Me levanta-se © comeca a tirar a mesa. MAE (Tristementel - Afinal o teu pai ndo veio... Manuel levanta-se também. MANUEL- Achas que elas irdo 4 missa? MAE - Nao sei. Elas estao as duas tao cansadas, coitadinhas... E a senhora ir parece tao doente... Manuel faz mencao de ajudar a Mae a tirar a mesa. MAE - N30, deixa, eu isco. Vai-te arranjar que ji é tarde. ‘Verte 3 capa, que ests fri A Mae forga docemente Manuel em dirego 2 porta. ‘Manuel dirige-se para a porta. A Me vai atras dele. MAE - Toma, leva um biscaito... Manuel sai. Ame fica sozinha, em siléncio, tirands a mesa. ‘Poe 2 cesta da fruta e 9 prato dos bolos em cima da cémoda. As huzes extinguem-se lentamente. Cena sete sEspaco do soto. Dia. Manuel esté 3 janela, de costas para o pliblice, olhando pensativo para hove suavemente. MAE (Em voz off? - Manuel! Surge a Mie. vinda das escadas. de avental. 8g 0a) a ae I ears wre een a Petia de iebre, Ihe a mao na testa.) Estas ‘amanha ¢ melhor nao ires a escola. AMBe pega na mio de Manuel 2 puxz-o em direcio as escadas. MAE - Nio gosto que te ponhas para aqui sozinho. Anda, fazer-te o anche... Pode ser que a Ana apareca e lancham oc dois... Ela e a cenhora gostaram da marmelads que Ihes mandei? MANUEL - Gostaram... Principiam ambos 2 descer as escadas. 16 MAE - Amanhd faco mais e tomas a levar-Iha... INota do Autor: cena de tem breve dessnce spe inne dime pecan Cagare' age Co certs aiiial par vestide com 2 mesma roupa de Cena oito Quarto. Fim da tarde. Manuel ests de cama, daente. Entra a Me cam uma carta na mio. MAE ~ olha. o teu pal escreveu Também esteve doente, como tu. Gentendg-se na da cama) Na America ainda faz do que aqui Mostra 3 carta 3 Manual, que se soarque e pega nels MAE - Diz ele que tem estado sempre a nevar... Neve... Nunca vi neve... Meu Deus, que frio deve ser! MANUEL (Ofhando a carta) - Ele nao diz quando vem? . Mas diz que talvez em breve Ia possamos (cancia a cabeca de Manuel) N3e gostavas de ver neve? Manuel entraga de nove a carta s Me e volta a deitar-se. MANUEL - Nao sei. (Pause) Era bom era que ele voltasse. Na fabrica daz conservas ja estdo a meter gente outra vez... Podia arranjar trabalho cé... MAE - Pois era, pois era... (Pause:) Um dia volta, (Procurande mudar de assunto.) Tomaste © comprimi MANUEL - Tomei. MAE - Queres outro copo de leite? MANUEL - Nae, mae, obrigado. Pancadas na je Manuel e 2 Mae voltam-se. Rosto de Ana sorrindo 3 janela. AMie dirige-se para Manuel ajaita a roupa ¢ A Mae regressa pouco depois com Ana. INata do Autor: Ana vestida e penteada diferentemente das Cenas 1 ¢ 5 do sétao, de moda a sugerir um tempo distinto} 17 ANA (Entranda) -Estas melhor? MANUEL - Estou, muito obrigado. Mle -Ainda tem um bocadinho de febre... Mas segunda-feira jé vai ‘4 escola outra vez. (Pausa’) Ea senhora? Esta melhor? ANA (Para 2 Mae) - Lady Elisabeth? Nao, esta cada vez mais fraca... Ficou a dormir no hotel... que ela esta a sofrer... (Mudando de tom) Ea Vou buscar-lhe um bocadinho de torta de ANA - Nao se incomode, ebrigada... AMie sai. Ana Manuel ficam sos. Ana sorni. A Me regressa com dois pratos com torta. Entrega um 3 Ana e outro ao Manuel. MAE - Toma, Manuel, esta muito boa. MANUEL - N3o quero, mie, obrigado. MAE -Vé IS, sé para fazeres companhia 4 Ana. Ana senta-se na cama, segurando 0 seu prata. Manuel soergue-se, com o prato sobre o travesseiro. MAE (Ssindo de novo) - Agora fiquem os dois um bocadinho 3 conversar que eu vou Id dentro e js venho... AMBe sai. Ana fica um momento em siléncio @, depois, volts-se para Manuel. ANA.- Lady Elisabeth esta muito mal, ndo digas nada 3 tua me. N3o quer ir-ce embora, nem cequer abre as cartas que recebe de Inglaterra... nunca fecha ax janelas, nem spaga 9 luz, nem de noite, sempre a olhar para o mar. (Pausa.) 0 que mais me aflige € que nao chora... Esta convencida que, se chorar, Robert more... Afasta 0 prato e torna a meter-se sob os lengéis. ANA,- Teve um sonho, sabes? Viu Robert apanhado por piratas e levado no barco deles pelo mar fora, para muito longe... Esta convencida de que os piratas hao de voltar a iha e que, entdo, tornard a encontra-lo... (Pausz.) Passa os dias fechada no quarto, a tentar dormir e sonhar o mesmo sonho, para ver Robert outra vez. MANUEL (surpreso @ assustado! - Um barco de piratas? Robert: Manuel olha-a sem dizer nada. f 18 ANA - Sim, Pediu-me te contasse o sonho dela. quer que mais ninguém o saiba, nao digas nada 4 tua mse, no? Nem ao capelio que a confacea ela o contou. MANUEL - A mim? Porqué a mim? ANA - Nao Gosta muito de ti! E estranho, mal te conhece... Mas és a Unica pessoa da ilha de quem ela gosta. A Mize abre a porta e entra navamente. MAE (Para Ana) - Entdo a torta? Estava boa? (Para Manuel. reparando que ele mal tocara no doce) Oh, Manuel, n3o comeste nada... Uma torta de laranja tae boa... Ana poe-se de pé. _ANA - Tenho que me ir embora... Lady Elisabeth pode precisar de mim... MAE (Para Ana) - 38? (Pegando-the.na méo:) Tem razéo, Ana, va, vd... Ela precisa de co coitadinha. ANA (Pars Manuel) - Até amanh3. Vé se ficas bom, sim? MAE - Até amanh3, Ana. Eu amanha um bolo para levar 4 fago par Saem as duas. Manuel fica de novo sé. Vira-se de lado e cobre a cabeca com os cobertores. Extinguem-se as luzes. Cena nove aes Mesma cendrio das Canas 1 ¢ 5. [Nota do Autor: cena de -scontinuagaor do tempo e do lugar delas). Ao longe. a tempestade © 0 gemide da ranca. A cena comega com Manuel e Ana junto 3 janela, na mesma situagio em que terminam 3 Cena 5. ANA- Farece que foi tude hd tanto tempo... MANUEL - Pois parece... ANA (Sentando-se sobre a arcal - Tu é que me fizeste lembrar estas coisas... Eu nao queria... MANUEL (4proximando-se 2 ficando de pa a seu lado) - Tu é que me pediste para eu contar... (ANA- Eu sei, desculpa. MANUEL - No estejas triste... ANA- Eu no estou triste. is MANUEL Nao estejas... ‘ANA (Erquenda a cabecs para Manuel! - Nunca me tinhas falado do ‘teu sonho, nem dos plratas... MANUEL - Ng queria que ficasses wiste... (Fausa) E tudo tao confuse. As vezes acho que foi um sonho. Mas ha tantas coisas que nio compreendo... ANA - EB Elisabeth, lembras-te?, também sonhou dan’ oti nt Sate tenbceey anh, zie alarmada:) Meu Deus! MANUEL (Tapando-lhe 2 boca) -N3o, nde digas nada. N3o quero ouvir. ‘AMA (Libertando-se) - N3o vés que.. MANUEL (Afestando-se de repente) - Eu sei, eu sei. Mas ndo quero ouvir! ANA (Docemente) - Pronto, pronto, eu nao digo nada... Manuel deixa-se cair sobre o banco, lange de Ana. MANUEL - Oh, Ana, se tu soubesses... Ha tantas coisas que nde te Ana volta-se para ele. ANA - Coisas que ndo me contaste? Mais cc’ MANUEL - Nao quero contar. Ana ergue-se @ aproxima-se dele| [ANA - Tens que contar. Falaste nisso, agora quero saber... MANUEL - No posso, no cou capaz. ANA (insistinda) - Conta, tens que contar! (Sentando-se a seu lado) ‘Tem que ver com os piratas, no tem? MANUEL (Num murmiirio) - Tem .. que 4? Conta! Depressa... MANUEL - No passe, tenho medo que fiques zangada comigo. ANA - Zangada contigo? Nao sejas tolo. Nunca me hei de zangar contigo... (Puxands 0 seu banco para diante dele} Mas tens que me contar, no pedemos ter coisas escondidas um do outro... MANUEL (Endireitando-se) - Pronto, eu conto, (Encara Ana e, depois, baixa os olhos para 0 chio:) Lembras-te do dia em que me encontraste na praia com aquele pescador? ANA - Com o velho maluce? 20 MANUEL - Sim, aquele que esteve na América... (Pauss) Ele contou-me uma coisa terrivel... (Hesita de nova) Nao sei se sou capaz de te contar «.. ANA, - Canta, agora que ja comecaste tens que me contar tudo! MBNUEL (Pondo-se de pe briscsmente) - Ele falou-me do meu sonhot ‘ANA - De teu sonho? Do somho dos piratas? O velho? Mas... Como... ¢ que ele podia saber?... MANUEL - N3o sei... Sabia tudo... me ce, it do sonho, Heh fuk se Sabla sudo... Pergumegume se. depois do sonho, adormecide outra vez, porque os piratas regressaram. ANA (incrédula) - Os piratas? Falou-te dos piratas? MANUEL - Sim. Contou-me que ia para a cabana dele e que viu o barco dos piratas a rondar novamente a ilha e pensou: «O rapaz deve ter adormecido outra vez!» i ANA- Mas... No é possivel... No faz sentido... MANUEL - Eu sei... Por isso é que te disse que nde compre: ANA (Ansiosa) - E que mais? 0 que é que ele disse mai: MANUEL (Num félego, sem se deter) - Disse que se escondeu nos rochedos a espreitar, e que viu os piratas descerem um bote. E que 0 Capitso gritava com eles que procurassem © grumete! Que os enforcava a todos se eles no encontrassem o grumete! ANA- Mas... O grumete... MANUEL - Sim, eu... Foi o que © Capito me chamou no sonho... ANA.- Nao pode ser... MANUEL - Pois ndo! Convenceram-se de que era eu, e que tinha caido e desmaiadot Meteram-no no barco e tornaram a zarpar para 0 j= murmério:) Um rapaz mais ou menos como eu, da ANA (Mum grito sufocada) - Robert! Levaram mesmo Robe! MANUEL (Agarrando-se 2 Ana) - Wés, was? Por isso é que eu nao te queria contar. Ana pés-se também de pé e encostou-se 3 com os olhos pes pe danela ‘Manuel segura 2 cabeca entre as mos. MANUEL - Desculpa, Ana, desculpa! Eu no tive culpa, eu nio tive meu culpa... Se calhar € tudo mentira, ele ndo podia saber do ‘nem dos piratas... 2 ANA (Voltande-se para Manuel) - Mas entio... Elisabeth... Robert 2 ser sabre a arcs, confundida & mesmo Robert! MANUEL - Nao pode ser, Ana, néo pode ser! Foi um sonho, foi s6 um sonho! ANA - Julgaram que eras tu! Levaram Roberti!... (4bansda 3 cabeca) Nao pode ser! Os piratas nao existem! Foi tudo um sonho! Como € que sabia? Nao pode ser, nao compreendo... MANUEL (Muito aflita) - Pois no. No pode ser... ANA - Meu Deus... MANUEL - Vs? No devia ter-te contado... MANUEL - Eu no conto, juro! A chuva volta 2 cair.com forga, @ as cortinas estremecem de nove com ove panca geme mais alte. Manuel e Ana esto agora parades, de pé, diante da janela, olhando a Manuel pée os braces sobre os ombros de Ana. Ficam os dois longamente em siléncio. Ana volta-se devagar e caminha em direc3o arca ANA (Pegando no lenco vermelha) - Das-mo, Manuel? A "1 MANUEL - Clare que dou. Mas... ANA (Guarda o lengo @ aproxime-se de nove de Manyel e da janela) Nunca mais contes estas coisas a ninguém, esta bem? MANUEL - Eu nunca mais conto... Mas... j.Fica um searedo sé nossa... Foi tude um sonho, acho eu. *Nidol ‘compreende mac fol de. carters’ tude um sonha. nautragio, os piratas, tudo, foi tudo um sonho! Se pode ter sido um sonho! Se deitarmos fora o lengo até esta conversa foi um sonho... Amanha acordames e ngo nos lembramos de nada... Lada a lade, a5 dais ficam, como na inicio da peca, olhanda em siléncio a ruaea chuva a bater nas vidragas. 22 As luzes, Jentamente, extinguem-se. 23

Você também pode gostar

  • Ficha 10
    Ficha 10
    Documento2 páginas
    Ficha 10
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Ficha 4
    Ficha 4
    Documento3 páginas
    Ficha 4
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Ficha 8
    Ficha 8
    Documento2 páginas
    Ficha 8
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Correcao 3
    Correcao 3
    Documento1 página
    Correcao 3
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Ficha DDDI
    Ficha DDDI
    Documento2 páginas
    Ficha DDDI
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Correcao 1
    Correcao 1
    Documento2 páginas
    Correcao 1
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Correcao 2
    Correcao 2
    Documento1 página
    Correcao 2
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Fichadragao
    Fichadragao
    Documento1 página
    Fichadragao
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Dicionario
    Dicionario
    Documento3 páginas
    Dicionario
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Noticia
    Noticia
    Documento6 páginas
    Noticia
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Ficha 7
    Ficha 7
    Documento5 páginas
    Ficha 7
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Apresentacao 2
    Apresentacao 2
    Documento9 páginas
    Apresentacao 2
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações
  • Apresentacao 1
    Apresentacao 1
    Documento11 páginas
    Apresentacao 1
    Sandra Ferreira
    Ainda não há avaliações