Você está na página 1de 25
Vill ENCONTRO DAS UNIVERSIDADES DE LINGUA PORTUGUESA PORTUGUES EM ANGOLA - REFLEXOES Por A.A. MINGAS MACAU, 21 — 23 de Abril de 1988 Signos Utilizados ¢- Palatal surda [tl] nh - Nasal palatal [p] ny- Africada palatal pré-nasal [nds] INTRODUGAO E com muito prazer que nos encontramos aqui, a fim de participar nesta Assembleia ¢ colaborar na discussao sobre uma lingua que se tornou para todos ‘os Angolanos importante, a lingua portuguesa. A nossa intervengao constitul uma refiexo que tem, como base de andlise, a situagde linguistica angolana Apraz-nos salientar que a situago linguistica em Angola nae difere muito da de Macau, Com efeito, Id como cé, ela caracteriza-se, fundamentalmente, por uma multipliciadade de linguas, aparentadas entre si, que se opdem ao portugues, lingua herdada do periodo colonial. Ume anélise da situago linguistica angolana permite-nos constaiar a existéncie, em Angola, de dois grupos de familias linguisticas africanas, a saber a bantu, que engioba 2 quase totalidade das linguas africanas faladas no pais ¢ a ndo-bantu, que se subdivide em dois sub- grupos, nomeadamente, kung e khoisan, que constituem verdadeiras ilhas no herizonte linguistico bantu. As linguas africanas, veio juntar-se, por intermédio do fenémeno colonial, no séc. XV, uma lingua neolatina, © portugués. Em consequéncia desse facta, no plano linguistico, Angola faz a tansig&o entre a Africa cantral, francétona e a Africa austral, angléfona. O portugués 6, actuaimente, a Unica lingua utilizada no pais beneficiando de um estatuto privilegiado, o de lingua oficial. Contudo, tendo em conta que as linguas africanas, analisadas globalmente, néo tinham sido objecto de nenhuma pesquisa cientifica por um lado e, considerando por outro, 2 necessidade de as prestigiar cultural e socialmente, foi criedo, na década dos anos 70, pela entao Secretaria de Estado da Cultura, o Instituto Nacional de Linguas, mais tarde Instituto de Linguas Nacionais. O Instituto de Linguas Nacionais, 6rgao reitor da investigago linguistica no pais, apés varios estudos descritivas, props ac Governo 6 estudo prioritéria de seis linguas bantu, classificadas como maioritarias. Esta decisdo teve, como base, a premissa de que essas linguas tinham sofrido um fenémeno de dielectizagao, 6 que permitia @ intercompreensdo entre as suas respectivas variantes. Foram assim identificadas como maioritérias © kikongo, 0 kimbundu, 0 cokwe, o mbunda {integrante do grupo ngangela), o oshikwanyama e 0 umbundu. De relevar que, pese embora a existéncia de descrigdes cientifices das seis linguas locais, assim come de regras para a sua utilizagdo na escrita, essas linguas mantém-se actualmente reduzidas t80-somente 4 comunicagao oral Uma anélise dinamica da comunicagdo no nosso pais permite-nos constatar que a gua portuguesa ¢ a Unica utilizada, @ nivel nacional, no ensino formal, como veiculo e matéria de ensino. Ela é, por outro lado, a lingua utllizada pelos dirigentes angolanos quande se dirigem &s populacies; ela é a lingua da Justiga, da Assembieia Nacional e da Comunicag&o Social. De salientar contude que, no que respeita a citima, tem-se verificado um esforgo no sentido de promover as linguas locals, esforgo que se consubstancia na sua utiizapéo nos programas radio-difundidos e televisionados, embora a uma periodicidade e tempo de antena bastante inferiores aos utilizados com a lingua portuguesa. No que respeita ao ensino informal, € de louvar a acgao de algumas instituigdes como sejam a lgreja, que utilize as linquas locais 20 nivel do ensino em Luanda (ICRA) e em Kabinda (Seminario); 0 Clube da UNESCO, que utiliza uma variante da lingua kikongo para a alfabetizagSe de adultos; elgumas ONGs, radicadas no pais, que optaram, de igual modo, pela iniradugdo do ensino de algumas das linguas locais no seu programa de fornagao. ‘As linguas de maior difusdo, em ordem decrescente € @ escala nacional s&o, nomeadamente, 0 umbundu, com 2, (dois @ meio) milhdes de locutores, 0 kimbunay, com 2, (dois) milhes de locutores, e 0 kikongo (variantes), com 1.5 (um e meio) milho de locutores'. " Tnformagies do Censo de 1987 que, eaibora ad actualizadas, permitem-nos ter uma ideia de distriberiao, ea gems americas, dos locutores das diferentes lingnas. L- O PORTUGUES EM ANGOLA 4. Breve resenha historica Tendo em conta a origem da lingua portuguesa, que difere estruturalmente da maioria das linguas faladas em Angola,” e a necessidade de existéncia de uma legislagSo. sobre a sua utilizago, no quadro de uma politica linguistica, leva-nos & reflex sobre 0 seu estatuto no pais, dos pontos de vista sdcio € psico- linguistic. Somos em crer, contudo, ser importante que comecemos por uma breve reirospectiva histérica do portugués em Angola. E gracas ao fenémene colonial qué foram criadas as condigdes objectivas para que © portugués, lingua neclatina, integrasse © grupo de linguas falades em Angola, Embora, num dado momento, fivesse sido imposta, a dinamica histérica permitiu que esta lingua coexistisse, durante mais de cinco séculos, com as linguas africanes © fosse até adoptada pela novel sociedade angolane, Por outro lado, a luta de libertago nacional, acto ¢ factor de cultura maiores do nosso povo, teve como veiculo de comunicaggo a lingua portuguesa. Com efeito, ‘0s nossos poetas denunciaram o fenémeno colonial utilizando 2 lingua do colonizador, ou seja, a lingua portuguesa; os nossos politicos utiiizaram-na igualmente para mobilizar as largas masses populares. O portugués, enfim, foi a lingua oficial da Angola colonizada e é a lingua oficial da Angola independente. Este tipo de raciocinio parece-nos importante para o desenrolar do qué se Segue, isto 6, uma reflexdo sobre a necessidade de definigdo do estatuto real da lingua portuguesa em Angola. Port em Angola: “lingua estrangeira” ou “lingua se ig Na sequéncia do acima exposto, parece-nos igualmente importante o esclarecimento sobre a situacdo real do portugués no pais, relativamente as ? Consaltar anexe 1 outras linguas europeias como o francés é © ingiés* efou africanas, como por exemplo, o lingala.* linguas apresentando um niimero relativamente grande de locuteres. A diferenga entre as duas designagSes néo depende, coma se pode set tentado @ pensar, da nalureza das linguas casxistindo no pais, mas sim, do ponto de vista utiizado para analisé-las. Assim, a designacSo “lingua estrangeira"” pertence & terminologia especifica da sociolinguistica, tendo, por conseguinte, como elemento de andlise, a sociedade utente, ou seja, um agregado de individuos ligados por uma heranga cultural comum. A segunda, a saber, a ‘lingua segunda’, esi ligada & psicolinguistica ¢ 0 elemento de analise é o individuo. No que respeita aos respectivos significados, comecemas por definir lingua estrangeira. Ela € uma lingua diferente da falada pelos membros de uma dada comunidade linguistica. Esta definicso é correcta e justifica-se quando aplicada, por exemplo, 2 Portugal ou 4 Franca, paises monolingues onde, por conseguinte, existe originalmente uma s6 comunidade linguistica, social e historicamente. Contudo, num pais como Angola, caracterizado por uma Mmultiplicidade linguistica e constituinde, por conseguinte, um conjunto de povos e cultura diferentes, 0 estatuto de lingua estrangeira, aplicada ao portugués, nao ¢ muito real e muito menos claro, pois o francés, o inglés eo lingala coexistem em Angola com o portugués. Por outro lado, partindo desta premissa, o Kimbundu seria lingua estrangeira para um locutor de umbundu e vice-versa. E, 9 que seria mais grave ainda, poderia levar os locutores de umbundu a considerar todas as linguas africanas de Angola como estrangeiras, pois 0 umbundu é @ tnica que s6 ¢ utilizada em Angola. Na realidade, todas as outras linguas angolanas séo igualmente utlizadas como linguas primeira efou segunda de comunidades africanas habitande para |é das fronteitas angolanas € precisamente com a mesma designagdo. Excepgao feita ao Kimbundu, que tem a designagéo de kipende, na vizinha Republica Democrética do Congo ® 4 sua aprendizagem é obrigatéria a partir do 20 nivel de ensino. “Lingua primeim de elementos da diispora angolara orionds de vizinha Repiblica Democratica do Congo, Convém reconhecer, todavia que, ao contrério do francés, inglés e/ou lingala, a lingua portuguesa ¢ as africanas faladas em Angola hd mais de cinco séculos sao as Unicas a serem utilizadas na socializagZo dos Angolanos. E cla que esta afirmagZo no tem em linha de conta a didspora, porquanto, para nds, 0 que importa analisar 6 a situacdo linguistica interna do pais. © que acabémos de explanar, leva-nos a concluir que, em Angola, 2 lingua portuguesa nao deve ter o mesmo estatuto que o francés, o inglés ou mesmo a lingala, na medida em que estas Uitimas linguas S40, efectivamente, diferentes das faladas pelas populagdes habitando o pais ha varios séculos. Pensamos, por conseguinte, que uma definiggo correcta deve ter igualmenté em linha de conta 0 factor tempo € no to somente as comunidades linguisticas. Assim, seré a diferenga linguistics, sliada ao factor tempo, que poderé possibilitar uma definiggo adequada Assim, 0 estatuto de facto do portugués, em Angola, néo senda 0 de “lingua estrangeira", toma-se evident qué 86 he resta © estatuto de “lingua segunda’ Esta nogéo, ac contrério da primeira, integra a terminologia psicolinguistica , como © préprio nome nos deixa entender, ela é e sequnda de vérias linguas que um mesmo individu pode falar é/ou dominar. Nesta acepeSo, e tendo em conta o contexto angolane, “lingua segunda" poderé ser qualquer uma das varias linguas faladas em Angola e aprendidas depois da primeira. Esta nogao esté portanto ligada & ordem cronologica de aprendizagem de um meio de comunicagao. Concretizando 0 acima exposto € considerando a din&mica do processo colonial, podemes efirmar que o portugués 6 a um tempo “lingua primeira” € “lingua segunda" em Angola, do mesmo modo qué 6 kimbundu, 0 iwoyo® ou 9 umbundu. Na realidade, 20 nivel da capital do pais e provincias, muitos Angolanos hé que 4am 0 portugués como lingua primeira, embora percentualmente © portugues seja mais lingua segunda que 6 kimbundu ou qualquer outra das linguas africanas na mesma situagdo que o kimbundu. Contudo, hé uma situagZo particular relaclonada com os Angolanos que tém 0 partugués como lingua primeira pois, ® Warlamte do kikongo, falada na capital da provincia de Kabinda, mais precisamemte, no litorall sul. da Sonteira até Pits. uma vez que no se verificou, no periodo apés independéncia, a introducdo de uma lingua africana no curriculo escolar, esses mesmos tém, no raras vezes, come linguas segunda, terosira e por vezes até quarta, uma lingua europeia A situagdo porém, é outra 20 assim como do campo, porquanto-a lingua primeira é, na maioria esmagadora dos da periferia das capiteis do pals e provinciais casos, uma lingua engolana dé origem africana sendo, consequentemente, o portugués lingua segunda, terceira ou mesmo quarta. Com efeito, devido a situago de guerra civil instaureda no pais, as populagées rurais viram-se forgadas a abandonar o seu habitat e a fixar-se noutras provincias, preferencialmente, nas do litoral Uma vez instaladas, essas populagdes $40 levadas @ contactar com os residentes. Como, de um modo geral, os habitantes da periferia assim coma os do campo néo tém um dominio perfeito da lingua portuguesa, 2 lingua utllizada nas suas relagSes familiares & uma lingua africana, diferente da utilizada pelos recém- chegados, o que es leva, num esforgo de integragao, @ aprender a lingua local, Convenhamos contude que, havende maior seguranga 20 nivel das capitais © tendo em conta que esias 8&0, por exceléncia, © terreno de aoglo da lingua portuguesa, esta & percentualmente, ac nivel das mesmas, mais lingua segunda que terceira ou quarta, relativamente a uma lingua local. 3. 0 ensing do portuqués em Angola Durante o perfado colonial, a lingua portuguesa foi utilizada no ensino formal come veicule € matéria de ensino. Idéntica sitvagSo se verifica actualmente. ‘Contudo, durante 0 periode colonial, o acesso a escola implicava uma seleccéo automética, na medida em que somente os “Assimilades, camade privilegiada da populacdo dos centros urbanos, @ respectivas periferias finham essa sociedade affieana, nesse periodo, estava dividida cm dois grupos: o dos ~Assimiladas”, que acsdiam, aulomaticamente, a cidadania portuguesa c-o dos “Indigenas". Sujetos ao pazamento de wm mposio e que s6-apés um ename especial, kam a possibilidade de obter um cartao de identidale portugues. possibilidade. No entanto, apés a independéncia, a gratuidade de ensino por um lado © © fenémeno “guerra civil” por outro, levou a uma concentracZo da populace do interior ao nivel das capitais e ao aumento da populacdo em idade escolar. TTende em conta que as primeiras utllizagSes linguisticas da crianga poem em evidéncia o aspecio fundamental da inteng&o referencial, ou seja, @ associacao da ico, € dbvio que a passagem de representagdes suscitadas por uma situagdo especifica de comunicagae para palavra a uma situagao exterior ou signo extraling: © dito ou mensagem implique, necessariamente, a utilizagZo de mecanismos mentais ligados ao campo cognitivo. Com efeito, para a produgéo de uma mensagem, hé todo um trabalho de pesquisa mental, porquanto a crianga deve ar forma 2s ideias a transmit. Mas para a sua concretizagdo verbal, ela necesita de fazer uma selecto 20 nivel da sua meméria lexical, pois cada item utilizar tem uma tungao especifica na mensagem a ser transmitida. Convenhamos que, se a0 nivel da sua meméria lexical 9 existirem itens de uma lingua africana, € 2 crianga tiver que os verbalizar em portugués, esta situacdo provocaré, sem sombra de dividas, um conflite interno capaz de gerar limitapes: de varia ordem na mesma. Per canseguinte, @ uso exclusive da lingua portuguesa. a0 nivel das comunidades rurais angolanas, como veiculo ¢ matéria de ensino, como se de uma lingua primeira se tratasse, ndo é o mais indicade, nem cientifica nem pedagagicamente. Se considerarmos que a lingua da escola nao deve ser diferente da utilizada pela crianga no meio familiar, se por um lado, atendermos @ diferenga estrutural existente entre a lingua portuguesa € as africanas; se, por outro, tivermes em linha de conta que a lingua e cultura portuguesas, como afirmémos, néo conseguiram implantar-se no seio das grandes massas rurais; se tivermos presente que 0 ensino do portugués foi prejudicado, ndo sé devido & fuga de professores da disciplina para Portugal, como também ao numero exiguo de docentes angolanos capazes de ministrar um ensino de qualidade, entao teremos que admitir que © portugués nao poder nunca permitir crianga angolana, que tenha uma lingua africana como primeira, expressar-sé de modo esponténeo, nem criar nessa lingua, pois criar deve ter como base um dominio total da cultura de origem veiculada pela lingua Assim, pensamos que © ensino do portugués no nosso pais, contrariamente aa que se tem vindo a verificar, deverd ter duas vertentes: come lingua primeira a0 nivel da capital do pais e provincias e, como lingua segunda, ao nivel das periferias das mesmas e do campo. Esta diferenciagdo levara & utilizacso, no primeiro caso, do portugués como veicule e matéria de ensino, com integragdo progressiva de uma ou vérias linguas locais e, no segundo, verificar-se-4 0 conirario. $6 assim, estamos em crer, sera defendida a integridade de cade uma das linguas em presence. IO PORTUGUES DE ANGOLA 1. Uma nova realidade Apés debrugarmo-nos sobre © “Portugués em Angola’, 0 que nos levou a uma andlise da lingua sob um ponto de vista ex6geno, vamos tentar analisé-la sob urn ponto de vista endégeno. E aqui, obviamente, o que nos vai interessar nao ¢ a sua relagdo as outras linguas angolanas com as quais esté em contacto, mas sim © portugués que resultou ou mais precisamenie, esié a resuitar desse contacto, mais coneretamente, 0 "portugués de Angola’, au melhor, o “angolane". Como afirmamos inicialmente, @ lingua portuguesa é neoiatina, pelo que ¢, estruturalmente, diferente das linguas com que esté em contacto, em Angola. Este contacto 6 dinamico e esta a ter como resultado um fenémeno bilateral de- interferéncias. Assim, no s6 9 portugués influenciou as linguas africanas como: também foi por elas influenciado. Devido ao longo periodo de contacto, essa influéncia verificouse a vérios niveis, provocando alteragGes fonéticas, fonslagicas, lexicogréficas morfo-sintacticas. ‘As alteragSes supra citadas estéo na base do aparecimento de uma nova realidade linguistica em Angola, a que chamamos o “portugués de Angola” ou 10 “angolano’, & semelhanca do que aconteceu ao brasileifo ou ao crioulo. Embora ‘em estado embrionario, 0 “angolano” apresenta ja especificidades proprias, que tentaremos analisar de sequida. Pensames que, no nosso pais, 0 “portugués de Angola” sobrepor-se-4, seguramente ao “portugués padrSo’, como lingua segunda dos Angolanos. 2. Caracteristicas especificas’ do angolano As caracteristicas especificas constituem um conjunto de elementos que permitem ao “angolano” inguir-se quer do portugués padrao, quer das linguas africanas do pais. Essas caracteristicas esto ligadas 4 especificidade das linguas bantu come um conjunto linguistico coeso e s8o as seguintes: 4. Monotongagao dos ditongos portugueses; 2. Perda de nasalizago das consoantes ini dos itens emprestadas as linguas africanas; 3. Presenga de vogais epentéticas efou paragégicas, 4, Substituiciio da africada palatal [tf] pela palatal simples [J]; §, Substituigao da africada palatal sonora [ds] péla palatal simples [3]; 6. Substituigao da vibrante [r] pela liquida [I] 7. Neutralizagao da oposigao [o] ~ [c] em posi¢go inicial ou média de um item: 8 Neutralizagiio da oposicao [o] ~ [D] em posige inicial ou média de um item 9. Substituic&o da lateral palatal [ 7.] pela dental [Ts 40, Sonorizagae das consoantes surdas portuguesas; 11, Substituigo da palatal sonora [5] pela alveolar sonora [2]: 12, Nasal 413, Substituig&o da énclise pronominal pela préclise; gio das consoantes orais portuguesas: 44, Singularizagée dos plurais de itens emprestados as linguas africanas, 15, Apassivagio verbal 7 Consultar exemiplos nos snexos. u ‘CONCLUSAO- A titulo de conclusdo, podemes afirmar que, embora a maioria esmagadora da populagSo das periferias dos centros urbanos fale portugués, uma vez que o acesso & escola foi sempre selective, verificqu-se no periodo colonial uma interferéncia das linguas matemas afticanas no portugués da época. Em consequéncia, a grande maioria da populagdo tem uma lingua africana como lingua primeira o que nos permite admitir que o “portugués de Angola" ou 0 “angoiano” 6, prioritariamente “lingua segunda’ em Angola. importa relevar, por outro lado, que actualmente e tendo em conta o numero exiguo de protessores de lingua pertuguesa, esta disciplina no 6, na maior parte das vezes, ensinada com 0 rigor necessério. De salientar, igualmente que ‘falar’, é diferente de “falar e dominar’. Assim, constata-se que a capacidade de expressdio de uma grande parte dos Angolanos 6, de longe, superior 2 sua capacidade de compreensao da lingua portuguesa. — de realgar que o fenémeno de desvio relativamente @ norma padréo 6, actualmente, muito mais forte, o que @ aids, natural, Com efeito, no apés independéneia, facilitado o contacto mais aberta entre os vérios grupos linguistics, bem como entre o campo e as cidades, devido ao factor guerra, a lingua portuguesa atingiu niveis de interfer€ncia nunca antes aloangados. A interferéneia actual porém, ndo se consubstancia somente em desvios mas igualmente em “errs”. Se os desvios s&o, para nés, o resultado légico da dindmica intema da lingua portuguesa em contacto com outras diferentes, 0 mesmo ndo acontece com 0 “erro” que deve ser compreendido para qué s@ possa ajuder a crianga a ultrapassé-lo. Convém, por conseguinte, alertar os dirigentes angolanos para a necessidade de um trabalho profunde no sentido de controlar a evolugao do erro, através de um ensino cuidado na formagéo de formadores de portugués, por um lado , por autro, de um trabalho idéntico no que respeita as linguas ficanas, pois @ sobrevivéncla de uma e de outras esto disso dependentes. ‘Somos de opiniae, todavia, que toda a acco a realizar no sentido de melhorar as 2 condigSes de ensino da lingua portuguesa em Angola nao deve ser sd uma preocupagdo dos Angolanes pois, embora a lingua seja “nossa’, ela 6, de direito, portuguesa © por epee angolana. Reconhecemos a urgéncia dé um esforgo conjunto e maior da parte portuguesa do que da angolana porquanto o fendmeno = portugués de...” ndo é especifico 36 da sociedade angolana, mas sim de todas aquelas em que o portugués esteve ou esté em contacto cam linguas diferentes. Na realidade, como todas sabemos, 0 mesmo fenémeno verificou-se no Brasil, Cabo Verde, Guind-bissau e $80 Tomé, onde se cristalizou e € hoje possivel delinear-se uma norma da nova realidade linguistica. Em Angola, ela estd em formagao @ essa formagao, se controlada, poderd evoluir no sentido de uma coexisténcia harmoniosa do portugués com as linguas africanas. Muito obrigada pela atengao qué $e dignaram prestar-me. B BIBLIOGRAFIA BONVINI, Emilio / 1985 Prédication et Enonciation en kasim, Paris, CNRS, 199 p CINTRA, Lindley e CUNHA, Celso / 1984 Grandtiva do Portugués Cordemporaneo, Lisboa, Sa da Costa, 734 p. GUTHRIE, Malcolm, / 1948 Classification of the Bantu Languages, London, Oxford University Press, 1p INSTITUTO DE LINGUAS NACIONAIS, / 1980 Histérico sobre at Criagdio dos Aljahetos em Linguas Nacionais, Lisbos, E4, 70, 178 p. NGALASSO, Mwatha Musanji, / 1986 O Ensino das Linguas Segundas em Africa, Luanda, Instituto de Linguas Nacionais, 6 p. GUERRA MARQUES, Irene Maria, / 1986 Algumas consideraeies sobre a problemdtica linguistica em Angola, INALD, Institute Nacional do Livro ¢ do Disco, Luanda, 30 p. MIGUEL, Maria Helena, / 1997 Pronominalizagdo do portugués em Luanda, Luanda, [SCED, Test de licenciatura, 150 p. MINGAS, A. A, / 1988 Interference du Kimbundu sur le portugais parlé & Luanda, Mémoire de maitrise sous 1a Direction de Louis-Jean Calvet, Paris, Université Paris V_ 74 p. 19950) Ltude Grammaticale de Viwoyo, Thése de Doctorat sous la Direction "Emilie Bonvini, Paris, Université Paris V, 450 p. »/ 1995 b) Linguas Nacionais ¢ Independéncia, intervengio apresentada mo coloquio nacional, “Cultura em Novembro”, Luanda, 6 p a 11997 Comumicagéo em Angola: pasado e presente, intervengio apresentada no coléquio nacional, “Cultura em Novembro”, Luanda, $ p. RIBAS, Oscar, / 1962 Missosso, Luanda, Tip. Angolana, 319 p. WELMERS, William, / 1973 African Languages Structures, Berkley, California University Press, 488 p. 4 angolanas de ot ‘Acste nivel, algumas das diferengas entre o portugués padréo e as linguas bantu de Angola € que poderao ser confirmadas através dos varios exemplos que apresentamos, so as seguintes: Portugues. |. Existancia de acentos; Linguas bantu Existéncia de tons: Existéncia de complexos sonsongaticas pré- lil, Existéncia de oposigao (él, fe] em ictal ou media iv. Existéncia de oposigae fo], e/ou [u] em:- posicgo inicial ou mécia i we | Existéncia de opasig&o fol, [ul em posicSo final: Vi Bxdstoncia de ditongos ‘Vi. Existéncia de silabas abertas e fechadas _Existéncia de silabas abertas;* viii. Existéncia de énclise pronominal Exdsténcia de prociise pronominal, ix. A nogSo de género implica uma referéncia | - sexual x. O mimero ndo € mareado 20 nivel do singular | © nimero ¢ marcado ao nivel do singular e do plural com afixos.? * As silabas finais fochadas das formas verbais pormmuesis sic substituidas por silsbus abertas, oano nos ‘exemplos que segucm: fcantart> [katare] /ou [kita * Beses affxos tm uma dupla fungdo, a saber, integrar os nomes da lingui numa tucinomia por outro lado, torné-los aptas & plurifincionalidade. ANEXO IL. - . Garacteristicas Gerais do angolano Este tipo de caracteristicas. constituem interferéncias que esto ligadas ao comportamento de uma lingua neolatina (caso do portugués), quando em contacto com uma lingua bantu. Salientamos que, dos pontos de vista fonéticoffonolégico, lexical € morfo-sintactico, séo de reter as seguintes caracteristicas do angoleno: 1. Nivel fonética/fonolégica a.- Monotongacdo de ditongos portuaueses Lingua de origem: portugues angolano dois laos} dei (dey) bei ra [Dera] bel rey mau [mawy] Touro pny] fio byl b - Perda de nasalizac&o de items emprestados &s linguas afficanas Lingua de origem: iwoyo angolano Mbukumazi “nome de uma localidade" Bukumazi Ntandu Nzinze “nome de uma lovalidade" = Tandu Zinze Nsatu “fruto silvestre” Safu Nkonde * nome proprio ~ Konde Lingua de origem: kivornbe angolano Mbelize * nome de uma localidade * Belize Ngimbi ‘ nome préprio * Giri Nezawu * nome préprio* Zou Mbuku Nzawu Buku Zau 16 Lingua de origem: kimbundu angolano ndende * ffute da palmeira" aéaaém mbombe ” mangioea fermentada” bombs Ngombo ~ name de uma dlvindade * Gombo Neeribu ~ nome proprio ~ Dembo (s) Lingua de origem: wmbundu angolang. ‘Onjamba * nome a uma localidade * Jamba COnjimbowa “ nome de um vegetal ” gimboa COnjikawu * nome de urn vegetal” gicdo ‘Ondombe * nome de uma lacalidade * Dombe c.« Presenca de vouais epentéticas e/ou paragéaices Lingua de origem: portuaués angolano apto Tepetul lub Teulube } ritmo [stimu alvoroga [alevorosu] cantar (katare } ‘oposto besfutu) d.- neutralizacdo da oposics&o [ e 1~[e lem posie4o inicial ou média Lingua ae origem: portuqués. angolano perda Ibert} dedo [dedu} lateral Taterale] ceder [sedere] vela [rela] ele [ee] W ¢,- neutralizacdo da oposi¢So fo] ~[s] Lingua de origem: portugues arroto ‘oposto orosta ‘sono angolane [Rota] [pofutu] (eset [senu} f- neutralizacso da oposicao [7] ~{ ul em posic&o mediana Lingua de origem: portuqués oto boneee poder amrotar professor angolano [oatawu ] [boneku J [pero] [ostare] Iprofesore] g.- Substituicdo da palatal lateral | 2. | pelo complexe | I: Lingua de origem: portuaués angolano otho btyu) velho [vetyu] milho [mityey ‘Substituicdo da vibrante [| pela lateral [1 Lingua de origem: portuaués angolano Secretario Seketalt Bena Beleta Branca Balanca Bris Balaji 18 8. Caracteristicas regionais ‘Ao contrério das precedentes, as caracteristicas regionais estéo ligadas as especificidades individuais de cada uma das linguas bantu em presenga pois, embora pertencentes 2 uma mesma familia linguistica cada ume delas apresenta da particularidades préprias. Indicamos apenas algumas das verificadas em Cat eno Huambo sendo, nomeadamente, para a iwoyo: a. Substituic&o da africada palatal surde [t{] pela palatal simples [f] Lingua de origem: iwoyo, angolano Ginkanda * nome préprio* ‘Gizu“ nome de uma losalidede * Chizu iyobo * nome de uma localidade" ‘Chiobo ‘Cinzadi " nome de ums localidade * ‘Chinzazi b_Perda de slongamento silabico Lingua de origem: iwovo, angglano maambu * problemas, questoes” mambo c, SubstituicSo da palatal sonora [5] pela alveolar [ z Lingua de origem: portuqués angolano viagem viaze gente zente noze d. Ensurdecimenta de consoantes sonoras portuguesas. Lingua de origem: portuqués angolana governo [euternuy ganhar [eaitare] 9 @, para o umbundu: a. Perda do aumento Lingua de origem: umbundu angolano ‘Ongamba “ nome de uma localidade * Suna Olombwa “nome de um vegetal” Jomboa ‘Onglikawu * nome de uma planta * gelicao”® . Velarizacae da africada palatal [ t! Lingua de origem: umbundu angoiano (Qcisangwa * bebida tradicional ” quissingua (Ocimbombo * idem * quimbombo ¢. SubstituieSo da sfricada palatal sonora [ds] pela palatal simples [=] Lingua de origem: umbundu angotano ‘Onyamba * elefante~ ube ‘Ongikdwu * nome de uma localidade ~ giefio ‘Onsilikdwu * nome de ums planta ~ seit d. Sonorizacdo de consoantes surdas portuquesas Lingua de origem: portugués angolano, entender [endendere] encantar eeedeer cantar Tigersrsy sentir [sendire] "° Bste nome vem do portugués /manjericio! 20 @. Nalizacdo de consoantes orais Lingua de origem: portuauds angolane, ea Inganyu} = Ingandare} toda [onda] B. Nivel morfo-sintactico a. Singularizago de plurais de itens das linguas africanas: Lingua de origem: iwoyo angolano maambu’"’ “ problemas, quesiées” mambo: bakama * mascarados * "yakama Lingua de origem: kimbuncus angolano. jinguba “amendoim** gingube maka “problemas, questées" maka b. Substituico da Enolise pronominal pela oréclise Lingua de origem: portugués angolane. contei-te uma historia bonita ~ te contel ume historia." disse-te * tedisse, te faler 1 uaa & @ plural d¢ dyamiba, Entra no angolano como singular, pelo que o plural &: /mambos!: maamba make mu buals “ha problemas ma aldcia” “hd um problema ...” (angolano). *2 Os Bakamas sio onginicos do Mayambe e cobrem © corpo com fothas secus de bananeiras. O sou singnlar é, fnkamal "3 8 a plural de fngubal: calm igualmenteno angolano com singular ¢ seu plural ¢/gingubasl “smaka” ¢ 9 plural de dia Este timo termo sofre urn fenémeno ée cxpansio semulatica, signficando, cm agolano: “opinio, informacio~ eam mates Angolanos, 0 yet flar€ sndnimo do verbo diver. a c. Transformacéo da silaba Lyo/ num ditongo decrescente Lingua de origem: iwovo Ngoyo: Ciyebo d. Apassivacdo verbal Lingua de origem: portuaués Eu nasci"* *8 De acorda coma Giliselia bant, 0 acto de nascenga ¢ passive para o filho: Ele no “nascc”, angolano Nooio Chiabo angolano “aminha mfe me nasceu" ANEXO Ill, - Cont das linquas bantu A. Geral Lingua de origem: iwoyo saka-foya* esparregado "” muamba“ molho de polpa de dendém * nsafu “fruto sivestre mayaka“ plo de mandioca fermentada” maambu “temas. questdes, problemas * Lingua de origem: kimbundu jinguba * Arachis hypogea L.* dika * assunto, tema, problema maka" assumtos, temas, problemas” muzonge “ prato tradicional" Kizaka * esparregado * ikalundu ~ estado de éxtase* kitande pure de feo feto com dee de palma" kilombo kya has albino * misoso * carts * mufete * prato tragicional* Kitab" puré de jinguba * ‘afufutla “goluseima tradicional * Lingua de origem: umbundu olowengo * fruto siivestre * coswanga esparregado ° ‘olombi * prato tradicional * ocisangwa * bebida tradicional " Feico com folhs da planta da mandioca. en angolano saca-folha muamba satu maiace mambo Angolane sginguba ica maka musongue quisaca calundus (te9) quitande ‘quilomibo quiass2 missosso mutete quitaba ‘quitufutila angolano: Loengo (5) suanga lombi quissingus B. Antroponimia Lingua de origem: iwoyo Futi Nzawu Cinkanda Nsimba, Lingua de origem: kimbundu: Ngana Divuwa Kits Ndembu Fuxi Lingua de crigem: portugués Anténio ‘Secretirio Lingua de origem: umbundu Ongamba angolano Futi Zau Chincanda, Simba angelano Ngana Divua Quituxi BDembo Fud angolano Tonha ‘Soketdli angelane- Jamba Cara Ana Lidia, Gostaria de comegar felicitata pela organizagSo do encontro que se revelou de uma Importancia extrema para a melhoria da situago de portugués nao s6 em Portugal como nos paises africanos de lingua oficial portuguesa. Contrariamente ao previsto, 36 agora me foi possivel enviar-the o texto da minha intervencdo de Macau, esperando que se chegue a tempo de ser incluido na publicag&o. Saiba que, por razGes alheias & minha vontade, nda me fol possivel contactar consigo, lage ap6s a concluse do curso, para Ihe entregar o trabalho que preparei para 0 efeito. E que a falta de um computador, tornou bastante dificil a correc¢ao que achei que © texto merecia. Aproveito a presenca em Angola da Dra. Agnela Barros, que ai se encontra em preparag&o do seu mestrado, para Ine enviar o texto com as correccdes devidas. Sem outro assunto de momento, queira, cara Doutora, aceitar a expresso da minha mais alta consideracao. Amélia Mingas: Luanda, 2 de Setembro de 1998

Você também pode gostar