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CRISTÓVÃO COLOMBO: GLORIOSO OU INFAME?

José Raimundo Gomes da Cruz


Procurador de Justiça de São Paulo aposentado

Em recentes viagens internacionais, encontrei estátuas do célebre Descobridor


das Américas em alguns lugares: no começo do Central Park, em N. York, no final da 5ª
Avenida; perto do Porto de Barcelona e dentro da imensa e suntuosa Catedral de
Sevilha, de cujas vizinhanças ele partiu com as três caravelas obtidas dos Reis Católicos
da Espanha – Santa Maria, Pinta e Nina – para a grande aventura da descoberta do novo
Continente, em 1492. Lá repousam seus restos mortais, que peregrinaram por vários
países, anteriormente. E com destaque: em vez de alinhar-se com os demais altares do
lado esquerdo do magnífico templo, sua urna funerária se projeta sobre o amplo
corredor, com intencional destaque.

Mas leio, no jornal O Estado de S. Paulo, de 2/6/2013 a manchete: “Cristóvão


Colombo, o novo inimigo de Cristina Kirchner” (p. A15).

A matéria do Estadão é assinada por Ariel Palácios, correspondente em Buenos


Aires, que começa afirmando que o “genovês Cristóvão Colombo nunca colocou seus
pés no atual território argentino”. A atitude da presidente portenha estabeleceu
“controvérsia entre o governo federal, a prefeitura e a comunidade italiana”.

Já se iniciou a remoção do monumento de 623 toneladas de mármore de Carrara:


“Cristina considera o navegante um ‘genocida’ dos indígenas das Américas”. Ela
pretende trocar a estátua do grande descobridor pela “da boliviana Juana Azurduy,
mulher que esteve com as tropas argentinas na luta da independência. Azurduy, que
nasceu e morreu em Sucre, na Bolívia, é uma das heroínas da presidente, que a cita com
frequência em discursos.”

O representante da comunidade italiana em Buenos Aires lamenta que não tenha


havido consulta a tal entidade, doadora da estátua à Argentina, em 1910.

Controvérsias sempre existirão, a respeito do passado histórico. Pareciam


tranquilas a nacionalidade e região de origem de Colombo. Impressiona, na Wikipedia,
ampla demonstração de que o grande navegador era português.

O historiador Edward McNall Burns observa: “A civilização da última fase da


Idade Média ou Época Feudal e a da Renascença têm, na verdade, muito mais traços
comuns do que usualmente se imagina. Ambas se distinguiram pelo humanismo, por um
novo interesse pelo homem como a criatura mais importante do universo.” (História da
Civilização Ocidental. Trad. Lourival Gomes Machado et alii. 20. ed. Porto Alegre :
Globo, 1977. v. 1. p. 313).

O Petit Larousse Illustré 1989 informa que o genovês Colombo era filho de um
tecelão e que, após algumas viagens, fixou-se em Portugal. Em seguida, refere-se às
quatro sucessivas viagens dele ao continente americano, começando em 1492, sob o
patrocínio dos soberanos espanhóis.
Paulo Rónai recolheu passagem de Anatole France de interesse para a reflexão
sobre os grandes vultos do passado: “Cristóvão Colombo, que viveu e morreu como um
santo e vestiu o hábito do bom santo Francisco, não teria buscado, sem dúvida, o
caminho das Índias, se tivesse previsto que o seu descobrimento causaria o extermínio
de tantos povos vermelhos, na verdade cheios de vícios e cruéis, mas sensíveis ao
sofrimento, e que traria na velha Europa, com o ouro do Novo Mundo, doenças e crimes
desconhecidos.” (Dicionário Universal de Citações. Rio de Janeiro : Nova Fronteira,
1985. p. 188).

Também Gilberto Freyre discordava da visão romântica dos povos selvagens,


com seus preconceitos e seus medos. Mas não é este o momento mais oportuno para tal
discussão. Enquanto não existir mais fundamentada revisão histórica, o prestígio dos
grandes vultos desta deve subsistir intacto.

Isso também vale para Juana Azurdui e tantas personagens heróicas do passado,
que em nada se beneficiariam com a instabilidade do prestígio tão transitório.

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