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reese | 7 DISSERTACAO Observe o texto que segue, extraido da obra Viagens de Gulliver, de Jo- nathan Swift: 4 trés métodos pelos quais pode um homem chegar a ser pri- meiro-ministro. 0 primeiro é saber, com prudéncia, como servir-se de uma pessoa, de uma filha ou de uma irma; 0 se- gundo, como trair ou solapar os predecessores; e 0 terceiro, como clamar, com zelo furioso, contra a corrupcao na corte. Mas um principe discreto prefere nomear os que se valem do ultimo desses métodos, pois os tais fandticos sempre se revelam os mais obsequiosos e subservientes 4 vontade e as paixdes do amo. Tendo & disposigéio todos os cargos, con- servam-se no poder esses ministros subordinando a maioria do senado, ou grande conselho, e, afinal, por via de um ex- pediente chamado anistia (cuja natureza lhe expliquei), garantem-se contra futuras prestagées de conta e retiram-se da vida publica carregados com os despojos da nagao. Jonathan Swit. agens de Guliver Sto Pula, Abii Cultural, 1978 9. 234-5 Esse texto explica os trés métodos pelos quais um homem chega a ser orimeiro-ministro, aconselha o principe discreto a escolhé-lo entre os que cla- mam contra a corrupeao na corte ¢ justifica seu conselho. 251 A primeira caracteristica desse texto é que ele é tematico, pois analisa e interpreta a realidade com termos abstratos (método, prudéncia, corrupcdo, discre- to, vontade, paixdes etc). Quando se vale de termos concretos (homem, primeiro- -ministro), toma-os em scu valor genérico. Nao fala de um homem particular ¢ do que faz para chegar a ser primeiro-ministro, como seria em uma narracdo, mas do homem em geral ¢ dos métodos que quaiquer homem utiliza para chegar ao poder. A segunda caracteristica € que existe transformagdo de situagado no texto (por exemplo, a mudanca de atitude dos que clamam contra a corrupeao. da corte, que, quando chegam ao poder, tornam-se corruptos). A progresséo dos enunciados obedece a uma relagdo légica e nao cronolégica. Um enunciado ¢ anterior a outro no por causa de uma progresso temporal, mas por causa de uma concatenacao ldgica. Assim, 0 enunciado que diz que o principe discreto escolhe o primeiro-ministro entre os que clamam contra a corrup¢ao na corte é anterior ao que diz que os que clamam contra a corrupedo so mais obsequiosos e subservientes 4s vontades e as paixdes do amo, porque o segundo é uma explicacao para a afirmacao contida no primeiro Como o texto pretende falar de algo que ele apresenta como uma verda- de valida para todos os homens, em todos os tempos € lugares, constrdi-se com © presente em seu valor atemporal. Todos os verbos do texto esto nesse tempo. Esse texto é dissertativo. Dissertagao ¢ 0 tipo de texto que analisa, inter- preta, explica e avalia os dados da realidade. As caracteristicas do texto dissertativo sao: a) ao contrdrio do texto narrativo e do descritivo, ele é tematico, ou seja, ndo trata de episddios ou seres concretos e particularizados, mas de andlises e interpretagdes genéricas validas para muitos casos concretos e particulares; opera predominantemente com termos abstratos; b) como o texto narrativo, mostra ele mudangas de situago; ©) 20 contrario do texto narrativo, cuja ordenac&o é cronolégica, ele tem uma ordenagdo que obedece as relagées ldgicas: analogia, pertinéncia, causa- lidade, coexisténcia, correspondéncia, implicacdo ete.; d) ja que a dissertacao pretende expor verdades gerais validas para muitos fatos particulares, o tempo por exceléncia da dissertacéo € 0 presente no seu valor atemporal; admite-se nela ainda o uso de outros tempos do sistema do presente, a saber, 0 presente com valor temporal, o pretérito perfeito e o futuro do presente. Cabe agora perguntar por que existem estes trés tipos basicos de texto, a narracdo, a descricao e a dissertacdo. Cada um deles tem uma fungio distin- ta. Os textos narrativos e descritivos so figurativos. Eles representam o mundo, simulam-no. . 252 A narraco mostra mudangas de situacdo de um ser particular, com os ,enunciados dispostos numa progressdo temporal, numa relacdo de anteriorida- de ¢ de posterioridade. A narragdo capta 0 mundo em sua mudanga, no dina mismo de suas transformacdes. A descrigdo expde propriedades e aspectos de um ser particular (por exemplo, o céu estrelado numa determinada noite, um rosto sofrido, a hora do rush, um por do sol, uma personagem qualquer) numa relacéo de simultanei- dade; nela nado hd mudangas. Ela apresenta, entdo, um ser tal como é€ visto num dado momento, fora do dinamismo da mudanga. 0 texto dissertativo ¢ tematico. Explica, analisa, classifica, avalia os se- res concretos, Por isso, sua referéncia ao mundo faz-se por conceitos amplos, modelos genéricos, muitas vezes abstraidos do tempo e do espaco. Por isso, em= bora aparecam nele mudangas de situagdo, nao tém maior importancia as rela- gdes de posterioridade e de anterioridade entre os enunciados, mas as relagées logicas entre eles. 0 texto dissertativo é mais abstrato que os outros dois, ele explica os dados concretos da realidade. Por isso, numa dissertacao, as referén- cias a casos concretos e particulares, ou seja, narracGes ou descrigdes que aparecem em seu interior, ocorrem apenas para ilustrar afirmacées gerais ou para argumentar a favor delas ou contra elas. A dissertacao fala também de mudangas de estado, mas aborda essas transformagées de maneira diferente da narragdo. Enquanto a finalidade central desta é relatar mudangas, a daquela € explicar e interpretar as transformagées relatadas. O discurso dissertativo tipi- co € 0 da ciéncia, 0 da filosofia, 0 dos editoriais dos jornais ete. Geralmente se pensa que é sé na dissertacdo que o produtor do texto ex- pressa seu ponto de vista sobre 0 objeto posto em discussao. Isso nao é verda- de. Também na narracao e na descricao estao presentes os pontos de vista de quem elabora o texto. O que é diferente em cada tipo de texto é 0 modo como © produtor apresenta seus pontos de vista. Como a dissertagao é um texto te- matico, os pontos de vista, nela, so explicitos. Na descri¢do, o ponto de vista € manifestado, entre outros, pelos aspectos selecionados para serem descritos € pelos termos escolhidos. Nela, 0 produtor do texto transmite, por exemplo, uma visdo positiva ou negativa do que esta sendo descrito. Vimos na ligao anterior, na descrigao da pedreira, que, pela selecao das palavras referentes a pedreira e aos seres humanos, o descritor mostra que 0 homem esta inferiorizado em relacao @ natureza. Na narracdo, um dos meios mais eficientes de manifestar um ponto de vista é 0 encadeamento de figuras, a contraposi¢ao de percursos figurativos. A Veja SP, de 19 de outubro de 1994, publicou uma reportagem sobre Celso Russomano, reporter do Aqui e agora € candidato a deputado fede- ral mais votado nas elei¢des de 1994. Depois de narrar episodios que mostram sua atuagao como defensor dos consumidores, conta o seguinte: 254 S esculturas criadas pelo mesmo artista, cada uma delas caracterizada por dife- ss Enfases na escolha do tema € no tratamento dado a ele, A primeira peca, alto & esquerda, representa uma célebre cena da Guerra dos Cem Anos, no o XIV, na qual um grupo de burgueses de Calais € obrigado a entregar as fs da cidade ao vitorioso rei inglés. O cardter dessa obra é eminentemente tivo. A segunda peca, & esquerda, é um busto do estadista francés Georges enceau. Do mesmo mado que os retratos na pintura, bustos so eminente- fe descritivos. A terceira peca, reproduzida acima, intitulada O pensador, & das mais conhecidas obras da histéria da arte. Ao contrario de representar determinado homem pensando, procura qualificar a atitude de pensar como taco definidor do ser humano, ou seja, procura transmitir uma mensagem de ater abstrato € generalizante, caracteristica da dissertagio. 2 5 5 A casa em que mora, na rua Adalivia de Toledo, perto do Palacio dos Bandeirantes, no Morumbi, é um espinho na sua biografia de bom moo. Construida no estilo dos anos 60, com abundancia de vitrais e de vaos, a casa tem piscina ¢ dois andares. Pela cotagao de mercado, vale 400 000 délares. Em dezembro do ano passado, Rus- somano fechou o negécio por 300 000 délares, com a facilidade de que a proprietaria da casa é me do segundo marido de sua sogra, Marcia Torres. 0 contrato foi assinado por Berenice Ribeiro, cunha- da de Marcia e procuradora da mae. A divida deveria ter sido qui- tada até junho em cinco parcelas. Nesse periodo, ele pagou apenas 10 000 dolares e se recusava a discutir 0 restante até Berenice amea- car levar 0 caso A imprensa. Russomano deu mais 34 000 dodlares ¢ teria ameagado matar outro irmao de Berenice, José Carlos, se 0 caso se tornasse publico (p. 18). Ao contrapor o percurso figurativo do defensor dos consumidores ao do mau pagador e do homem que faz toda sorte de violéncia para manter uma imagem publica, o narrador esta manifestando um ponto de vista sobre a per- sonagem. Nao podemos esquecer-nos de que narracées € descricées sao textos fi- gurativos e de que por tras das figuras existe um tema implicito. TEXTO 0 texto que segue foi retirado da c OMENTADO obra Raizes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda: Nas formas de vida coletiva podem assinalar-se dois principios que se combatem e regulam diversamente as atividades dos homens. Esses dois principios encarnam-se nos tipos do aventureiro e do trabalhador. Ja nas sociedades rudimentares manifestam-se eles, segundo sua predominancia, na distingéo fundamental entre os po- vos cacadores ou coletores os povos lavradores. Para uns, 0 obje- to final, a mira de todo esforco, 0 ponto de chegada, assume rele- vancia tao capital que chega a dispensar, por secundarios, por su- pérfluos, todos os processos intermediarios. Seu ideal sera colher o fruto sem plantar a arvore. Esse tipo humano ignora as fronteiras. No mundo tudo se apre- senta a ele em generosa amplitude e onde quer que se erija um obs- taculo a seus propésitos ambiciosos, sabe transformar esse obsta- culo em trampolim. Vive dos espacos ilimitados, dos projetos vas- tos, dos horizontes distantes. 0 trabalhador, ao contrario, é aquele que enxerga primeiro a di- ficuldade a vencer, nao 0 triunfo a alcangar. 0 esforgo lento, pouco compensador e persistente, que, no entanto, mede todas as possi- bilidades de desperdicio € sabe tirar 0 maximo proveito do insigni- ficante, tem sentido nitido para ele. Seu campo visual é natural- mente restrito. A parte, maior do que o todo. Existe uma ética do trabalho, como existe uma ¢tica da aventu- ra. Assim, 0 individuo do tipo trabalhador sé atribuira valor moral positivo as agdes que sente animo de praticar e, inversamente, tera por imorais e detestaveis as qualidades proprias do aventureiro — audacia, imprevidéncia, irresponsabilidade, instabilidade, vagabun- dagem — tudo, enfim, quanto se relacione com a concepgao espa- cosa do mundo, caracteristica desse tipo. Por outro lado, as energias e esforcos que se dirigem a uma re- compensa imediata so enaltecidos pelos aventureiros; as energias que visam a estabilidade, a paz, a seguranca pessoal e os esforcos sem perspectiva de rapido proveito material passam, ao contrario, por viciosos e despreziveis para eles, Nada Ihes parece mais estiipi- do e mesquinho do que o ideal do trabalhador. Strlo Buarque se Holand Roles do Bras 8 ed. Rode lance, José Ompio, 1875. p13 Tropes gravure de Fresenio Bigs, do steulo XK ‘Acervo dos Maseus Costa ya, Fo de ane 0 texto de Sérgio Buarque de Holanda é tematico, pois é construido basicamente com termos abstratos: principio, tipo, sociedades, predominéncia, ética, proveito, insignificante etc. Fala ele de algo genérico, valido para todos os tempos e lugares: dos principios que regulam as atividades dos homens na vida coletiva, ou seja, da existéncia de uma ética do trabalho e de uma ética da aventura. 0 texto aborda uma transformacdo: a passagem do nao realizado ao realizado, operado de duas maneiras distintas. Na primeira, a do trabalhador, as realizagdes 40 produto de um trabalho lento, metédico, persistente; na segun- da, a do aventureiro, elas sao fruto da audacia etc. A ordenagao do texto € feita com base nas relacdes de comparagdo: compara-se 0 modo de ser do trabalha- dor com 0 do aventureiro, 0 tempo verbal basico utilizado no texto é o presente com valor atemporal (por exemplo, quando se diz Esse tipo humano ignora as fronteiras, nao se esta dizendo que, nesse momento, ele faz isso, mas que faz, fez e fara sempre isso). Se 0 texto é tematico, mostra mudancas de situacao, constréi sua progresséo com base nas relacées ldgicas entre seus enunciados € usa basicamente o presente com valor atemporal, é uma dissertacao. Nele, a questao posta em debate é da existéncia de dois tipos humanos bem definidos: o trabalhador, aquele que prefere o esforco persistente, 0 traba- Iho paciente, e o aventureiro, aquele que valoriza mais 0 resultado do que os meios de alcang4-lo, que despreza a monotonia do cotidiano, que tem neces- sidade de projetos grandiosos. O primeiro realiza um trabalho sem buscar re- compensa imediata; 0 segundo, ao contrdrio, deseja resultados instantaneos. Sérgio Buarque de Holanda pretende mostrar, a partir do estabelecimen- to desses dois tipos humanos e das duas éticas que regulam suas a¢ées, que 0 trabalhador teve um papel muito reduzido na obra de conquista ¢ colonizacdo da América, pois ela foi um trabalho realizado por aventureiros, que tinham pouca disposicao para o trabalho metédico, sem compensacao préxima, mas queriam prosperar a qualquer custo, obter posigdes e riquezas faceis. E isso que explica, para o autor, algumas das caracteristicas do cardter nacional brasileiro. 0 gosto pela aventura é responsavel por certos “defeitos” dos brasileiros (0 desejo de se “arranjar", de ganhar a vida sem muito trabalho etc.), mas também por certas de suas qualidades (a audacia para enfrentar desafios ete). Com muita frequéncia, ouvimos que o brasileiro tem certas caracteristi- cas que 0 distinguem dos outros povos: ¢ alegre, um tanto quanto irrespon- savel, consegue “baguncar" todas as coisas etc. Essa concep¢ao parte da ideia de que certas caracteristicas psicoldgicas dos brasileiros determinam um certo tipo de desenvolvimento histérico e social. No entanto, a questao deveria ser pensada de maneira diferente. As condicdes de vida ¢ que determinam certas caracteristicas psicolégicas de grupos e classes no interior da sociedade. Mu- 258 dadas essas condigdes, essas caracteristicas alteram-se. Além disso, nos dife- rentes grupos humanos, caracteristicas opostas existem. Guimardes Rosa, usando a figura da mandioca, discute Pressa suas duvidas sobre elas: €5sas questdes no texto que segue, ex- - Melhor se arrepare: pois, num chao, e com igual formato de ramos e folhas, nao di a mandioca mansa, que se come comum, a mandioca-brava, que mata? Agora, 0 senhor ja viu uma es- tranhez? A mandioca-doce pode de repente virar azangada — motivos nao sei; as vezes se diz que ¢ por replantada no terreno sempre, com mudas seguidas, de manaibas — vai em amargando, de tanto em tanto, de si mesma toma peconhas. E, ora veja: a outra, a mandioca-brava, também € que as vezes pode ficar mansa, a es- mo, de se comer sem nenhum mal. E que isso €? Grande sero: vers 20, ed, Fi de Jai, Nova Fonte, 1986p 0 Questio 1 A esta altura das ligoes, tendo jé tratado dos textos narrativo, descritivo € dissertativo, vamos confronté-los € observar suas marcas tipicas. Os trés textos que sequem so exemplos de cada um dos trés tipos de textos referidos nesta ligéo e nas duas anteriores. Leia-os com atengéo, classifique-os segundo esses trés ti- pos € explique a classificacao dada. O primeiro texto foi montado com passagens ¢ dados extraidos da Folha de S. Paulo (20 nov. 1991) Texto 1 ‘Aos 100 anos, a Avenida Paulista perma- nece uma janela aberta para a modemnidade. Seus 2,6km de extensio (ou 3 818 pas sos) so percorridos diariamente por 1 mi- Ihao de pessoas, em sua maioria mulheres, como revela pesquisa da companhia que mantém 0 metré correndo sob seu asfalto, A Paulista fala 12 linguas, em 18 consula- dos ali instalados. Ao lado de poucos casa- res do passado, ela abriga edificios “inte- ligentes” ¢ torres de rédio ¢ TV iluminadas | como um marco futurista. Veja agora o texto que seque, também mon- tado com passagens e dados da Folha de S. Paulo (20 nov. 1991). Texto 2 No inicio do século, a Paulista era a ave- nida mais espacosa da cidade, com tres pis- tas separadas para bondes, carruagens e ca- valeiros, Era a mais bela, com quatro fileiras de magnélias e plétanos. Era um fim de mundo, no final da Ladeira da Consolagao. La residiam os imigrantes recém-enrique- cidos: Martinelli, Crespi, Matarazzo, Riskal- lah, Von Bullow. Apés isso, ai pelos anos 50 © 60, 0 acelerado processo de urbanizagao da Cidade varreu dali os 24 casardes, como o que ocupava o n.° 46 da avenida. No seu lu- gar, surgiram prédios, alguns deles enqua- drados entre os mais modernos do mundo, como 0 Citibank € o Banco Sudameris. Ja completamente ladeada de prédios de porte, foi a recente imauguraco do me- tro que Ihe conferiu novo charme. Com todos esses antecedentes, cla ¢ hoje, apesar das contradigées, a avenida mais mo- | derma, mais dinamica, mais nervosa da cida- de, eleita pelos préprios moradores como 0 mais fiel retrato de Sao Paulo, 259 Por fim, leia agora 0 texto 3, que contém interpretagdes e andlises inspiradas no livo A casa e a rua, do antropologo Roberto da Mata Texto 3 No ambito da cultura brasileira, a Rua € a Casa ocupam lugares nitidamente dis- tintos, que, por sua vez, condicionam com- portamentos francamente diferenciados: 0 que se faz na Rua no se faz em Casa e vice-versa, Sea Casa ¢ 0 espago do aconchego ¢ da protec&o, a Rua ¢ 0 do desamparo e do abandono. “Sentir-se em casa” é uma ex- pressio da nossa lingua que significa “es- tar 4 vontade”, “sentir-se abrigado, prote- gido"; a0 contrario, “ir para o olho da rua” denota “desamparo social, exposi¢ao ao risco, solidao” A Rua é o espaco da transgressdo, onde vivem 0s malandros ¢ marginais; € 0 ter- ritério do salve-se quem puder, onde pre- valece a Jei do cada um por si, Dominio do anonimato ¢ da despersonalizagio, é na Rua que um cidadao de bem pode ser mo- lestado por autoridades de seguranca pu- blica ¢ tratado como um criminoso. QuestAo 2. (Fuvesr) FILOSOFIA Dos EPITAFIOS Sai, afastando-me dos grupos, e fingin- do ler os epitafios. E, alias, gosto dos epit fios; eles sao, entre a gente civilizada, uma expresséo daquele pio € secreto egoismo gue induz 0 homem a arrancar & morte um farrapo a0 menos da sombra que passou. Dai vem, talvez, a tristeza inconsolavel dos que sabem os seus mortos na vala comum; parece-Ihes que a podridao andnima os al canga a eles mesmos Machado de Asis, Memes pstumas de Bris Cabos. Do ponto de vista da composigéo, & correto afirmar que 0 capitulo "Filosofia dos epitafios" a) € predominantemente dissertativo, servindo 05 dados do enredo ¢ dos ambientes como fundo para a digressao, 260 b) € predominantemente descritivo, com a suspenséo do curso da histéria dando lugar construgdo do cendi ©) equilibra em harmonia narragdo e deser 0, & medida que faz avancar a historia e cria 0 cenério de sua ambientagio. 4) é predominantemente narrativo, visto que 0 narrador evoca 0s acontecimentos que mar- caram a sua saida, ¢) equilibra narragdo e dissertacdo, com 0 uso do discurso indireto para registrar as impres- ses que 0 ambiente provoca no narrador. TexTO PARA AS QUESTOES DE 3A 10 O texto que segue ¢ 0 trecho de um arti- go de Ricardo B. de Aradjo: A torcida possui a propriedade de reu- nit, “na mesma massa", pessoas situadas €m posigdes sociais diversas, homogenei- zando, em torno de clubes, as suas diferen- cas. Nesse processo, um mecanismo extre- mamente importante é 0 uniforme de cada clube: 20 mesmo tempo que separa ¢ dis- tingue cada uma das torcidas, ele “despe” cada torcedor da sua identidade civil, e 0 integra em um novo contexto, profunda- mente indiferenciado. Nesse contexto de massa que ¢ a torci- da, inexistem desigualdades, pelo menos em principio, Todos esto ali reunidos pela pai- xéio, para torcer por um dos clubes e, por- tanto, cada torcedor tem, nesse momento, 08 mesmos direitos que qualquer outro. Este titimo ponto é de grande impor- tancia, pois nos leva, de certa forma, da igualdade a liberdade. Com efeito, se todos os torcedores so considerados moralmen- te iguais, abre-se, entdo, a possibilidade pa- ra que cada um deles possa, com toda a le- gitimidade, ter uma visio inteiramente pes- soal do andamento da partida, da escala- do dos times, enfim, de qualquer aspecto relacionado ao mundo do futebol. Qualquer torcedor pode, inclusive, dis- cordar das “autoridades” em futebol, os téc- nicos, dirigentes ou comentaristas, sem que sua interpretacdo seja considerada insolen- te ou descabida. Este é um contexto em que, de alguma forma, todo mundo tem opiniao, ¢ todos tém o direito de exprimi- -la, ou seja, sao livres para explicité-la sem sofrer qualquer constrangimento. E exata~ mente por isso que as discussdes sobre 0 futebol sao consideradas “intermindveis”. Na verdade, esta impressio é causada pela propria dificuldade de se chegar a algum consenso num ambiente tio pluralista e democratico. Existe, portanto, no futebol, uma area de decisio privada, na qual cada torcedor tem liberdade para julgar e escolher segun- do suas préprias inclinagées, sem ter que sofrer qualquer interferéneia, Lembremo-nos de que a propria opcao por se torcer por de- terminado lube, de trocé-lo por outro, ou mesmo de se desinteressar do futebol, sio resoluges de “foro intimo”, que nao inte ressam a ninguém, e que devem, assim, ser tomadas com toda a independéncia. Ricardo 8. de Aaj Forgaestonha. cidnco Hoje, anol, 1 jullago. 1302, Questio 3 0 texto acima transcrito, de cardter jorna~ listico, esta abordando um tema assaciado & sociologia do futebol. a) 0 articulista esté tratando do comporta- mento especifico da torcida de um clube num Jogo em particular ou do comportamento ge- nérico de qualquer torcida em qualquer jogo? b) Esse dado pode ser considerado como uma caracteristica de textos dissertativos? Questio 4 0 redator, a0 expor seus pontos de vista, usa conceitos abstrates, apresentando suas opi- nides © comentarios de maneira explicita, 0 que é proprio dos textos de carater tematico. Cite algumas passagens que contenham conceitos desse tipo. Questio 5 Os verbos do texto esto no presente. a) Qual é 0 significado do tempo presente no percurso de todo 0 texto? b) Esse uso do presente é tipico do texto dis- sertativo? Explique por qué. Questéo 6 No nivel de sua estrutura fundamental, esse texto contém as seguintes instancias: * afirmagao da diversidade; © negagao da diversidade; * afirmagao da igualdade. Cite 20 menos uma passagem que sirve para ilustrar que nas torcidas a) existe a diversidade, b) nega-se a diversidade. 0) afirma-se a igualdade Questho 7 No texto dissertativo, a relacdo de ante- rioridade e posterioridade entre os enunciados é determinada por relagdes de natureza logica € no de natureza cronolégica. Observe, por exemplo, a seguinte passagem: "pois nos leva, de certa formo, da igualdade ¢ liberdade” Qual é 0 evento logicamente anterior que serve de fundamento para dizer que da igual- dade passamos a adquirir liberdade? Explique sua resposta. Questo 8 sagens figurativas, isto é, formadas por pala- vras de sentido conereto. Em geral, essas pas- sagens so inseridas para funcionar como ar- gumentos destinados a comprovar opinides ge- rais expressas sob a forma de conceitos abs- tratos (temas). No quarto pardgrafo, hé uma passagem fi- gurativa para ilustrar a afirmacao de que nas torcidas 0 torcedor tem direito a agirlivremen- tee de maneira pessoal. Cite essa passagem. Questio 9 0 conector portanto serve para introduzir uma concluséo relativa ao que se disse ante- riormente, Como se sabe, uma conclusdo sé é legitima quando coloca explicitamente dados ou eventos ja contidos implicitamente em pas- sagens anteriores. Que dados anteriores servem de suporte | para se afirmar: "Existe, portanto, no futebol, Num texto dissertativo, podem ocorrer pas | | | 261

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