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SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0

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Ateliê de Gêneros Acadêmicos
didatização e construção de saberes

Regina Celi Mendes Pereira


(Org.)

Ideia
João Pessoa
2020

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


Todos os direitos da organizadora. A responsabilidade sobre textos e
imagens são dos respectivos autores.

Editoração/Capa: Magno Nicolau

Revisão: José Themístocles Ferreira Júnior

Ilustração da capa
O. Von Corven - Tolzmann, Don Heinrich, Alfred Hessel and Reuben
Peiss. The Memory of Mankind. New Castle, DE: Oak Knoll Press, 2001

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD

A864 Ateliê de gêneros acadêmicos: didatização e construção de


saberes [recurso eletrônico] / organizadora: Regina Celi
Mendes Pereira. – Dados eletrônicos - João Pessoa: Ideia,
2020.
4.9mb; pdf

ISBN 978-65-5608-084-0
1. Linguística. 2. Gêneros acadêmicos. 3.Escrita acadêmi-
ca - didatização. I. Pereira, Regina Celi Mendes. II.Título.

CDU: 81:001.891
Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária Gilvanedja Mendes, CRB 15/810

Agradecemos o apoio financeiro da CAPES


Publicação feita com recursos do Processo: 305817/2017-5
Demanda/Chamada: Chamada CNPq N º 12/2017 – (Bolsas de
Produtividade em Pesquisa – PQ.).

EDITORA
contato@ideiaeditora.com.br
www.ideiaeditora.com.br

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................. 7
REGINA CELI MENDES PEREIRA

I PARTE
A RELAÇÃO ENTRE OS TEXTOS E AS DIVERSAS FORMAS DE
CONSTRUIR CONHECIMENTOS

COMO AS DIFERENTES ÁREAS DO CONHECIMENTO CONCEBEM


O FAZER CIENTÍFICO?....................................................................................... 17
POLIANA DAYSE VASCONCELOS LEITÃO
REGINA CELI MENDES PEREIRA

A INFRAESTRUTURA TEXTUAL DE ARTIGOS CIENTÍFICOS E RESUMOS


DA ÁREA DOS ESTUDOS LITERÁRIOS ............................................................... 89
EVANDRO GONÇALVES LEITE
FRANCISCO EDSON GONÇALVES LEITE

A PRODUÇÃO DE RESUMOS DAS ÁREAS DE JORNALISMO E EDUCAÇÃO:


UM OLHAR SOBRE A PLANIFICAÇÃO TEXTUAL E O GERENCIAMENTO
DAS VOZES..................................................................................................... 116
FABIANA RAMOS
IARA FRANCISCA ARAÚJO CAVALCANTI

A INFRAESTRUTURA TEXTUAL EM RESUMOS ACADÊMICOS NAS ÁREAS


DE NUTRIÇÃO E ARQUITETURA: CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS ............ 141
JOELMA DA SILVA SANTOS
TATIANA FERNANDES SANT´ANA

RESUMOS DE ARTIGOS CIENTÍFICOS: UMA ANÁLISE DO GÊNERO NOS


PERIÓDICOS DO CAMPO DA PSICOLOGIA...................................................... 161
RENATA DE LOURDES MACHADO DA COSTA

RESUMO ACADÊMICO DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO À LUZ DO ISD ........... 188


PATRÍCIA BARRETO DA SILVA CARVALHO
BRUNO SALGADO COLE

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II PARTE
PROCESSOS DE DIDATIZAÇÃO DOS GÊNEROS ACADÊMICOS

O PROCEDIMENTO DE ESQUEMATIZAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE RECEPÇÃO E


DE CONSTRUÇÃO TEXTUAL............................................................................ 218
RAQUEL BASÍLIO DA CUNHA DIAS DE MELO
REGINA CELI MENDES PEREIRA

PERSPECTIVAS DE AGIR E CAPACIDADES DE LINGUAGEM MOBILIZADAS NA


EXPOSIÇÃO ORAL .......................................................................................... 245
ROZIANE MARINHO RIBEIRO

CONTRIBUIÇÕES PARA UM MODELO DIDÁTICO DO GÊNERO


‘RESUMO DE COMUNICAÇÃO’ ....................................................................... 267
FLORENCIA MIRANDA

ESCRITA ACADÊMICA NO ENSINO SUPERIOR: UM ESTUDO EM INTRODUÇÕES


DE ARTIGOS CIENTÍFICOS DE ALUNOS DE GRADUAÇÃO ................................ 309
SOCORRO CLÁUDIA TAVARES DE SOUSA

REPRESENTAÇÃO DA ESCRITA DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA: O RESUMO


EM PERIÓDICOS DAS CIÊNCIAS SOCIAIS QUALIFICADOS PELA CAPES ........... 341
ALESSANDRA SOUZA SILVA
LINDUARTE PEREIRA RODRIGUES

DAS PRÁTICAS DE PLÁGIO À AUTONOMIA TEXTUAL ..................................... 375


WEBERT CAVALCANTI BARROS

SOBRE OS AUTORES ...................................................................................... 391

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APRESENTAÇÃO

O
nome ateliê pode estar associado a diferentes contextos e
atividades (textos, pintura, escultura, costura etc.) e isso é
muito significativo porque garante que seja mantido,
mesmo nessa diversidade de lugares, um sentido quase único para
o que denomina: espaço de criação e construção. Em um desses
espaços de criação, este livro, em sua versão impressa, publicado
em 2014, foi concebido e gerado, reunindo os trabalhos desenvol-
vidos na primeira etapa do projeto, intitulado Ateliê de Textos
Acadêmicos (ATA), no período correspondente aos anos de 2012 e
1013. De 2014 até 2019, já foram publicados mais quatro livros:
Entre conversas e práticas de TCC (2016), Ateliê de letras: Pro-
jetos no Tear (2017), Escrita na Universidade: panoramas e de-
safios na América Latina, (2018) e, por ultimo, Cultura Discipli-
nar e Epistemes: representações na escrita acadêmica (2019).
Até 2016, o nosso projeto articulou-se às ações do Programa
Nacional de Pós-doutoramento Institucional1
(PNPD/CAPES/CNPq), empreendido no âmbito das pesquisas do
Programa de Pós-graduação em Linguística (PROLING) da Uni-
versidade Federal da Paraíba (UFPB), na área de Linguística Apli-
cada, e vinculado ao Grupo de Estudos em Letramentos, Interação
e Trabalhos (GELIT/UFPB/CNPq). Contou, então, com financia-
mento que permitiu a publicação dos livros acima apresentados e
a participação de duas bolsistas de pós-doutorado Poliana Dayse
Vasconcelos Leitão e Raquel Basílio, que constam como autoras de
capítulos deste livro.

1 CAPES – PNPD – Processo nº 23038.007066/2011-60.

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O Ateliê de Gêneros Acadêmicos: didatização e con-


strução de saberes, agora em versão digital2, permite estreitar o
diálogo com um número maior de leitores, tendo em vista a facili-
dade de circulação, e compartilhar com outros grupos de estudos
em escrita acadêmica uma historiografia das pesquisas do ATA em
sua primeira etapa do trabalho
As ações do ATA têm como objetivo maior investigar o
processo de elaboração de diferentes gêneros acadêmicos em inter-
face com diversas áreas de conhecimento. Nesse sentido, atuamos
em dois eixos: 1) desenvolvendo processos de didatização da escri-
ta acadêmica (resumo, resenha e artigos científicos) em disciplinas
de português instrumental, metodologia científica e Leitura e Pro-
dução de Textos I (LPT I); 2) analisando as especificidades dos
parâmetros de produção e as da arquitetura textual dos resumos
(abstracts) e artigos de divulgação científica em diferentes áreas de
conhecimentos (BRONCKART, 1999).
Em linhas gerais, além de procurarmos oferecer subsídios
para a o exercício da escrita acadêmica em maior escala, buscamos
responder aos seguintes questionamentos: o que significa escrever
um artigo ou uma resenha na área de ciências médicas e na área de
linguística? As diferentes áreas de conhecimento afetam a estrutu-
ra característica dos gêneros e sua materialidade textual-
discursiva? Há uma relação entre estrutura composicional do gê-
nero e campo epistemológico? Como os diferentes campos conce-
bem o processo dialógico de construção da autoria? Como a noção
de campo afeta a concepção de ciência? As pesquisas se encontram
em pleno processo de execução, mas já é possível divulgar alguns
resultados do que foi realizado até agora, ainda que, neste momen-
to, não tenhamos condições de responder todas essas perguntas.
As reflexões aqui encaminhadas têm como suporte teórico-
metodológico geral os princípios do Interacionismo Sociodiscursi-
vo, notadamente os trabalhos de Bronckart (1999, 2006, 2008) e

2 Publicação feita com recursos do Processo: 305817/2017-5 De-


manda/Chamada: Chamada CNPq N º 12/2017 – (Bolsas de
Produtividade em Pesquisa – PQ.).

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Schneuwly e Dolz (2004), contemplando os dois eixos de investi-


gação do ATA. Desse modo, o livro está organizado em duas se-
ções assim nomeadas: A relação entre os textos e as diversas for-
mas de construir conhecimentos e Processos de didatização dos
gêneros acadêmicos.
Na primeira, os capítulos problematizam a estrutura dos
resumos publicados em periódicos de diferentes áreas de conhe-
cimento. Nesse sentido, no capítulo que inicia a discussão, Como
as diferentes áreas do conhecimento concebem o fazer científico?
Poliana Dayse Vasconcelos Leitão e eu analisamos como o conhe-
cimento científico é construído nesses variados campos do saber,
atentando para as especificidades do domínio discursivo científico
em relação aos demais domínios de construção do conhecimento.
Nesse percurso de análise, os dados revelaram a presença dos dois
grandes paradigmas norteadores do fazer científico, o positivista e
o interpretativista. Entretanto, constatamos que ora o primeiro se
sobrepõe ao segundo, ora o segundo se sobrepõe ao primeiro, ora
os dois parecem dialogar harmonicamente e ora nenhum deles
está presente, é o que acontece com as áreas de Direito e de Jorna-
lismo. Em alguns resumos dessas duas áreas, parece não existir a
distinção entre, respectivamente, construir conhecimento jurídico e
construir conhecimento científico sobre o conhecimento jurídico e
construir conhecimento jornalístico e construir conhecimento cien-
tífico sobre o conhecimento jornalístico.
Em continuidade ao delineamento de como se estruturam
os resumos nos diferentes campos, os demais capítulos da primei-
ra seção vão tratar dessa caracterização, enfocando, cada um deles,
uma área específica e um enfoque diferenciado de análise. Evan-
dro Gonçalves Leite e Francisco Edson Gonçalves Leite, no capítu-
lo seguinte, intitulado A infraestrutura textual de artigos científi-
cos e resumos da área dos estudos literários analisam esse aspecto
nos dois gêneros, além de relacioná-los a peculiaridades e caracte-
rísticas da área do conhecimento a que pertencem. Os resultados
evidenciam que os dois gêneros possuem o mesmo tipo de discur-
so (o teórico), mas diferem quanto às sequências textuais (descriti-
va nos resumos; argumentativa, expositiva e descritiva nos arti-
gos). Quanto ao plano geral, ambos apresentam peculiaridades

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que os afastam um pouco das prescrições socialmente referenda-


das para os gêneros, o que parece ser uma característica comparti-
lhada pelos membros da área, na condição de sujeitos legitimados
naquele campo científico.
No terceiro capítulo, A produção de resumos das áreas de
jornalismo e educação: um olhar sobre a planificação textual e o
gerenciamento das vozes, Fabiana Ramos e Iara Francisca Araújo
Cavalcanti investigam os elementos que compõem o seu plano
geral, bem como o posicionamento enunciativo neles presentes.
No que tange ao posicionamento enunciativo dos autores, foi cons-
tatada uma tendência à voz neutra, marcada principalmente pela
impessoalidade. Já no que se refere à planificação textual, a análise
constatou que não é constante a presença de todos os elementos
que entram na composição do plano global dos resumos em foco, o
que pode ser explicado pela ausência de uma homogeneidade nas
práticas de letramento em diferentes áreas do conhecimento no
que diz respeito à produção dos gêneros acadêmicos e, em especi-
al, do gênero resumo.
O quarto capítulo, A infraestrutura textual em resumos
acadêmicos nas áreas de nutrição e arquitetura: convergências e
divergências, também focaliza elementos da infraestrutura textual.
Joelma da Silva Santos e Tatiana Fernandes Sant’ana listaram
comparativamente os seguintes aspectos: a) pontos convergentes:
nos quatro periódicos pesquisados, os resumos são escritos na ter-
ceira pessoa do singular, com contextualização de tema, objetivos
explícitos, fundamentação teórica sem indicação de autoria e, prin-
cipalmente, os da área de Arquitetura, praticamente não apresen-
tam metodologia ou resultados; e, b) pontos divergentes: dos qua-
tro periódicos, apenas um apresenta norma para a produção, nos
demais, isso não existe, deixando a critério do(s) autor(s) a organi-
zação textual. Outro resultado apontado, que se estende às demais
áreas investigadas, refere-se à questão da classificação qualis, que
parece não ser um fator fundamental nas produções analisadas.
Renata de Lourdes Costa de Menezes focaliza, no quinto
capítulo, Os resumos nos periódicos do campo da Psicologia. A
autora parte do pressuposto de que, no cerne dos diversos campos
do conhecimento, as comunidades científicas comungam tacita-

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mente de comportamentos linguísticos e cognitivos específicos que


fundam e regem o trabalho de apreensão da realidade, respeitados
os limites de cada objeto. Os resultados evidenciam a forma parti-
cular de a Psicologia veicular o saber sistematizado que leva em
consideração fatores socioculturais internos e estratégias cogniti-
vas próprias ao se utilizarem da linguagem da maneira como fa-
zem.
O sexto e último capítulo da primeira seção, Resumo aca-
dêmico de matemática: um estudo à luz do ISD, aborda a organi-
zação temática e discursiva do gênero, identificando as principais
características do texto acadêmico desta área de conhecimento com
base no estudo da aspectualidade verbal. Patrícia Barreto da Silva
Cole e Bruno Salgado Cole verificaram que, na organização temá-
tica, as principais características do resumo acadêmico matemático
(RAM) foram: a estruturação balizada na descrição do problema,
da metodologia e dos resultados, a baixa densidade verbal e a fre-
quência significativa de substantivos, e, na abordagem discursiva,
foram: a presença de verbos do tipo de Acabamento (VAc) e Estado
(VE), caracterizando um texto preocupado com a concisão e preci-
são.
Na segunda seção do livro, são relatadas e discutidas expe-
riências didáticas na elaboração de gêneros acadêmicos em contex-
to universitário. Abrimos essa discussão com o sétimo capítulo, O
procedimento de esquematização como estratégia de recepção e
de construção textual, no qual Raquel Basílio e eu examinamos as
estratégias de didatização do gênero resumo, em especial, a com-
preensão do procedimento de esquematização do texto como es-
tratégia de recepção e de construção textual nas atividades de rees-
crita realizadas em sala de aula com alunos do primeiro período
do Curso de Letras da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) na
disciplina de Metodologia do Trabalho Científico. Nossas observa-
ções partiram das questões sobre o saber científico; o trabalho científi-
co, a pesquisa científica e as normas que regem as publicações cientí-
ficas. Em síntese, constatamos que o procedimento de esquemati-
zação do texto, a planificação, se configura como mecanismos de
recepção do textual e, ao mesmo tempo, como estratégia de didati-
zação dos mecanismos de construção textual.

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No oitavo capítulo, Perspectivas de agir e capacidades de


linguagem mobilizadas na exposição oral, Roziane Marinho Ri-
beiro considera os elementos linguístico-discursivos do agir, ex-
pressos na exposição oral. A análise recai sobre exposições orais
produzidas por alunos universitários de uma universidade públi-
ca, de Lisboa-PT, envolvidos num processo de intervenção didáti-
ca. Em conclusões abreviadas, podemos dizer que os alunos, após
este processo de intervenção didática, produziram exposições
orais com mais qualidade, mas foi possível perceber também que
muitos deles ainda apresentaram dificuldades em identificar e
compreender as características formais e funcionais do gênero.
Entendemos que isto seja resultado, sobretudo, da sedimentação
de experiências com este gênero ao longo de toda a sua trajetória
escolar, bem como das práticas rarefeitas de oralidade na escola e
na academia.
Florencia Miranda defende no nono capítulo,
Contribuições para um modelo didático do gênero ‘resumo de
comunicação’, a necessidade de tomar o resumo de comunicação
como um objeto de ensino dos cursos universitários, porque se
trata de um gênero que aparenta simplicidade (pela extensão, por
exemplo), mas envolve procedimentos de produção e mecanismos
linguístico-discursivos complexos. Apresenta, então, um modelo
preliminar, que não tenha a pretensão de dar conta de todos os
aspectos envolvidos na elaboração de resumos desta espécie, mas
antes compreender a dinamicidade e a versatilidade do gênero,
evitando uma visão rígida ou estática dele.
No décimo capítulo, Escrita acadêmica no ensino superior:
um estudo em introduções de artigos científicos de alunos de
graduação, Socorro Cláudia Tavares de Sousa investigou como se
configura a seção de introdução de artigos de pesquisa, produzi-
das por alunos do curso de Letras/Português UFPB, durante a
disciplina de Pesquisa Aplicada ao Ensino de Língua Portuguesa
(PAELP), nos semestres de 2012.2 e 2013.1. A análise de vinte tex-
tos identificou similaridades em relação aos propósitos comunica-
tivos e aos movimentos retóricos apresentados por Swales (1990).
No entanto, as produções dos alunos apresentaram algumas pecu-
liaridades: a ausência do propósito comunicativo de estabelecer um

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nicho que não se materializou em nenhum exemplar do corpus e a


presença de movimentos retóricos específicos no propósito comu-
nicativo de ocupar o nicho.
Alessandra Souza Silva e Linduarte Pereira Rodrigues, no
décimo primeiro capítulo, Representação da escrita de divulga-
ção científica: o resumo em periódicos das ciências sociais quali-
ficados pela capes, analisam textual e discursivamente 6 resumos
de revistas da área de Ciências Sociais, objetivando fomentar um
debate em prol do aperfeiçoamento da escrita acadêmica. A dis-
cussão sobre este gênero, com ênfase nas abordagens semântica,
pragmática e lexical, passa pelo viés da organização retórica e dos
objetivos comunicativos, o que o diferencia das demais tipologias
de resumo, como é o caso da resenha crítica, gênero que também
circula na comunidade científica e chega a ser confundido com o
resumo acadêmico. Os autores pretendem, assim, promover uma
reflexão sobre as estratégias de produção do texto acadêmico, bem
como sobre os suportes teóricos, os quais alicerçam os conceitos
básicos de linguagem e escrita apresentados.
O último capítulo, Das práticas de plágio à autonomia tex-
tual, aborda um problema bastante atual e que diz respeito a todos
os envolvidos em práticas de letramento acadêmico. Webert Ca-
valcanti Barros relata uma experiência desenvolvida com estudan-
tes de graduação de diferentes Cursos da UFPB, entre os quais,
Português Instrumental e Produção Textual, no semestre 2012.2,
de dezembro de 2012 a maio de 2013, sobre orientações acerca de
como lidar com ideias alheias na elaboração de textos. As comuni-
cações orais sobre plágio e autenticidade dos alunos culminaram
em relatos escritos acerca dessas exposições e do tema em questão
elaborados pelos demais estudantes que assistiram tais comunica-
ções. O autor defende que esse processo de aprendizagem colabo-
rativa proporciona o despertar para o cuidado em lidar com ideias
ou textos de outrem.
Assim, em conformidade com os objetivos do ATA, que se
configura como um projeto de investigação dos aspectos linguísti-
co-discursivos dos textos acadêmicos e, acima de tudo, essencial-
mente interdisciplinar, nos aspectos epistêmicos e teórico-
metodológicos, o livro busca contribuir com o acesso ao letramen-

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to acadêmico e promover o debate entre alunos e professores. A


nossa motivação, e aqui me pronuncio em nome de todos os que
integram o ATA, respalda-se na necessidade de proporcionar for-
mação acadêmica de primeiro nível frente às demandas atuais de
qualificação profissional. A proficiência em textos escritos tem sido
e sempre será um desafio tanto para a comunidade escolar como
para os demais setores da sociedade (Cf. LAVE e WENGER, 1991)
e, para isso, a academia precisa inovar em formas de tornar esse
letramento acessível a uma maior parte da população.
Este livro, agora em versão digital, permite estreitar o diá-
logo com um número maior de leitores, tendo em vista a facilidade
de circulação, e compartilhar com outros grupos de estudos em
escrita acadêmica uma historiografia das pesquisas do ATA em
sua primeira etapa do trabalho.
A todos, uma boa leitura e diálogos promissores!

Regina Celi Mendes Pereira

Referências

BRONCKART, J.P. Atividades de linguagem, textos e discursos. São


Paulo: Educ, 1999.
______. Atividade de linguagem, discurso e desenvolvimento humano.
São Paulo: Mercado de Letras, 2006.
______. A atividade de linguagem em relação à língua – homenagem a
Ferdinand de Saussure. In: GUIMARÃES, A. M. de M., MACHADO,
A. R. & COUTINHO, A. (orgs.) O interacionismo sociodiscursivo –
questões epistemológicas e metodológicas. São Paulo: Mercado de Le-
tras, 2007, p. 19-42.
______. O Agir nos Discursos: das concepções teóricas às concepções
dos trabalhadores. Tradução de Anna Rachel Machado e Maria de
Lourdes Meirelles Matencio. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008.

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DOLZ, Joaquim & SCHNEUWLY, Bernard. Gêneros e progressão em


expressão oral e escrita – elementos para reflexões sobre uma experiência
francófona. In: Gêneros orais e escritos na escola / Tradução e organi-
zação Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP: Mercado de
Letras, 2004[1996], p.41-70.
LAVE, Jean; WENGER, Etienne. Situated learning: legitimate peripheral
participation. Cambridge: Cambridge University Press, 1991.
PEREIRA, R. C. M (Org.). Ateliê de Gêneros Acadêmicos: didatização e
construção de saberes. 1. ed. João Pessoa: Ideia, 2014.
PEREIRA, R. C. M. Entre conversas e práticas de TCC. 1. ed. João Pessoa:
Ideia, 2016. http://www.ideiaeditora.com.br/loja/e-books/entre-
conversas-e-praticas-de-tcc/
PEREIRA, R. C. M.; LEITAO, P. D. V. (Orgs.) Ateliê de Letras – Projetos
no Tear. João Pessoa: Ideia, 2017.
https://publi.ufpb.br/index.php/elivre/catalog/view/118/103/289-1
PEREIRA, R. C. M. (Org.). Escrita na Universidade: panoramas e desafi-
os na América Latina. 1. ed. João Pessoa: EDUFPB, 2018. v. 1. 266p.
https://www.ideiaeditora.com.br/loja/e-books/escrita-na-
universidade-panoramas-e-desafios-na-america-latina/
PEREIRA, R. C. M. (Org.) Cultura Disciplinar e Epistemes: representa-
ções na escrita acadêmica. 1. ed. João Pessoa: ideia, 2019. v. 1. 282p.
https://www.ideiaeditora.com.br/produto/cultura-disciplinar-e-
epistemes-representacoes-na-escrita-academica/
SWALES, John. Genre Analysis. English in academic and research set-
tings. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

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I PARTE

A RELAÇÃO ENTRE OS TEXTOS


E AS DIVERSAS FORMAS DE
CONSTRUIR CONHECIMENTOS

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COMO AS DIFERENTES ÁREAS


DO CONHECIMENTO CONCEBEM
O FAZER CIENTÍFICO?
Poliana Dayse Vasconcelos Leitão
Regina Celi Mendes Pereira

Introdução

No século XXI, denominado de Era da Ciência, o letramen-


to científico é uma exigência em diferentes esferas sociais. No âm-
bito acadêmico, em todas as áreas de conhecimento, estar imerso
em práticas de letramento científico é condição essencial para o
reconhecimento não apenas intelectual, mas também profissional.
Dentre os gêneros textuais mais recorrentes no processo de apro-
priação dessas práticas, encontra-se o artigo científico. No interior
desse gênero, localiza-se o elemento pré-textual resumo – nosso
objeto de investigação nesse capítulo. Nosso objetivo é analisar
como o conhecimento científico é construído em resumos de arti-
gos científicos de diferentes áreas de conhecimento, atentando
para as especificidades do domínio discursivo científico em rela-
ção aos demais domínios de construção do conhecimento.
Para alcançarmos nosso propósito, pautamo-nos nos prin-
cípios teórico-metodológicos do Interacionismo Sociodiscursivo
(ISD). Dentre outras teses, o ISD defende a indissolubilidade da
interligação entre aspectos linguísticos, psicológicos e sociais, bem
como a explicitação desses aspectos nas práticas linguageiras situ-
adas (ou nos textos-discursos). E argumenta que essas práticas são
as principais responsáveis pelo desenvolvimento humano, em to-
da sua amplitude, conhecimentos, saberes, capacidades do agir e
identidade das pessoas (BRONCKART, 2006, p. 10). Para viabilizar
o estudo dessa interligação, o ISD propõe três níveis de análise: o

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organizacional, o enunciativo e o semântico, que devem ser inves-


tigados em conexão com o estudo do contexto sociointeracional de
produção. Nesse artigo, vamos nos pautar no primeiro, mais preci-
samente no plano geral dos resumos, e no segundo níveis.
Nosso trabalho insere-se no âmbito da Linguística Aplica-
da, visando compreender e, principalmente, redimensionar os
processos de ensino e de aprendizagem de diferentes gêneros tex-
tuais. Esses objetivos também são empreendidos pelo projeto de
pesquisa Ateliê de Textos Acadêmicos (ATA/PNPD/UFPB), que
impulsionou nossa pesquisa. O ATA está interligado ao Grupo de
Estudos em Letramento, Interação e Trabalhos (GELIT/UFPB),
que tem duas linhas de pesquisas: 1) as referentes às práticas de
letramento em diferentes esferas discursivas, contemplando a di-
datização da escrita; e 2) as concernentes às atividades do trabalho
educacional desenvolvidas em diferentes contextos de atuação.
Dentre as metas do ATA, encontra-se a organização de um corpus
de gêneros acadêmicos representativos de diferentes áreas de co-
nhecimentos de modo a parametrizar as condições de produção
em cada comunidade discursiva – nosso estudo pretende contribu-
ir para o alcance dessa meta.
Os textos-discursos constitutivos de nosso corpus são ses-
senta e seis (66) resumos, coletados por alguns de nossos colabo-
radores1, através de pesquisas documentais, de caráter qualitativo,
em periódicos especializados. De cada área de conhecimento, onze
(11) ao todo (Arquitetura, Direito, Filosofia, Jornalismo, Medicina,
Nutrição, Odontologia, Educação, Psicologia, Linguística e Litera-
tura), selecionamos dois (02) periódicos2 e, de cada periódico, três
(03) resumos, perfazendo um total de seis (06) resumos por área.

1 Bruno Cole, Cristiane Marinho da Costa, Evandro Gonçalves Leite, Fa-


biana Ramos, Fábio Pessoa da Silva, Iara Francisca Araújo Cavalcanti,
Joelma da Silva Santos, Patrícia Barreto da Silva Cole, Poliana Dayse Vas-
concelos Leitão, Raquel Basílio da Cunha, Renata de Lourdes Costa de
Menezes, Rivadavia Porto Cavalcante, Tatiana Fernandes Sant’ana.
2 Periódicos contemplados: Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regi-

onais (ANPUR) (Qualis A2), Cidades (Presidente Prudente) (Qualis B1),


Revista Novos Estudos Jurídicos (Qualis A2), Revista Eletrônica Direito e
Política (Qualis B3), Cognitio: Revista de Filosofia (Qualis B1), Principia:

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1. Letramento científico

De acordo com Santos (2007, p. 474), a origem das reflexões


referentes à necessidade de uma educação científica remonta ao
século XVI, mais precisamente a Francis Bacon (1561-1626), que
indicava o papel da ciência a serviço da humanidade. Entretanto,
comenta o autor, o letramento científico passou a ser mais ampla-
mente discutido no início do século XX, com a intensificação do
avanço científico e tecnológico.
A expressão “letramento científico”, segundo o Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) (2011, p. 01),
diz respeito não apenas à compreensão de conceitos científicos,
mas também à capacidade de aplicar esses conceitos e de pensar
sob uma perspectiva científica. Assim, envolve três competências
básicas: 1) Identificar questões científicas; 2) Explicar fenômenos
cientificamente; e 3) Utilizar evidências científicas. Além dessas
competências, requer “a consciência de como a ciência e a tecnolo-
gia moldam nosso meio material, cultural e intelectual”, bem como
“o interesse em engajar-se em questões científicas, como cidadão
crítico capaz de compreender e tomar decisões sobre o mundo
natural e as mudanças nele ocorridas” (INEP, 2011, p. 01-02). De-
fendemos que essas ações são imprescindíveis para estabelecermos
os limites não intransponíveis, porém necessários para situarmos

Revista Internacional de Epistemologia (Qualis B1), Revista FAMECOS:


mídia, cultura e tecnologia (Qualis A2), Revista Brazilian Journalism Re-
search – BJR (Qualis B1), Revista Brasileira de Linguística Aplicada
(RBLA) (Qualis A1), Revista de Estudos Linguísticos Veredas (Qualis A2),
Aletria: Revista de Estudos de Literatura (Qualis A1), BOITATÁ: Revista
do GT de Literatura Oral e Popular da ANPOLL (Qualis B1), Revista de
Saúde Pública – RSP (Qualis A2), Revista Brasileira de Ciências da Saúde
– RBCS (Qualis B5), Metabolism: Clinical and Experimental (Qualis A2), Nu-
trire: Revista da Sociedade Brasileira de Alimentos e Nutrição (Qualis B4),
Cadernos de Saúde Pública (Qualis B1), Revista de Odontologia da Uni-
versidade Cidade de São Paulo (Qualis B4), Revista Educação em Questão
(Qualis A2), Contexto & Educação (Qualis B3), Estudos de Psicologia
(UFRN) (Qualis A2) e Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia
(Qualis B3).

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 20

as práticas de linguagem no interior, no contorno ou no exterior do


domínio discursivo científico ou de outros domínios de construção
do conhecimento.
São vários os gêneros textuais cuja finalidade precípua é
propagar o conhecimento científico. Dentre eles, o artigo científico,
também denominado artigo acadêmico, é um dos mais utilizados
em virtude da grande quantidade de periódicos especializados
que se disponibilizam a publicar esse gênero textual.
Marconi e Lakatos (2003 [1985], p. 259) concebem o artigo
científico como um pequeno estudo, de caráter completo, que ver-
sa sobre “uma questão verdadeiramente científica”. Argumentam
que esse tipo de trabalho científico, que, assim como outros, apre-
senta o resultado de estudos ou pesquisas, diferencia-se dos de-
mais em função de seu reduzido tamanho e da diversidade e atua-
lidade de seu conteúdo. Contudo, salientam as autoras, sua com-
pletude permite ao leitor repetir a experiência divulgada, pautan-
do-se na descrição da metodologia empregada, do processamento
utilizado e dos resultados obtidos. Ressaltam também que o artigo
científico é publicado em revistas ou periódicos especializados,
constituindo-se a seção principal desses suportes. Concordamos
com as escritoras quanto às vantagens do artigo científico em rela-
ção a outros gêneros científicos, entretanto acreditamos que o pro-
cesso de construção do conhecimento científico não pode ser con-
cebido como uma simples repetição ipsis litteris de outros experi-
mentos.
Motta-Roth e Hendges (2010, p. 65), também ressaltam que
o artigo acadêmico é elaborado visando à publicação em periódi-
cos especializados. E apontam como ponto de enfoque dessa pu-
blicação “os resultados de uma pesquisa sobre um tema específi-
co”. Além disso, explicitam a quantidade de palavras contidas
nesse gênero textual, “10 mil palavras”. Reportam-se ainda à utili-
dade do artigo acadêmico não como uma possibilidade de repeti-
ção da experiência divulgada, mas como um instrumento de co-
municação entre pesquisadores, profissionais, professores e alunos
de graduação e de pós-graduação. Diferentemente das autoras,
considerando as inferências que podem ser feitas a partir do termo
“instrumento de comunicação”, diríamos que o artigo científico

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constitui-se como um meio de interação, de diálogo entre esses


agentes.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a par-
tir da NBR 6022:2002, que sistematiza a apresentação dos artigos
em publicação periódica científica impressa, em seu item três, “De-
finições”, mais precisamente no subitem 3.3, conceitua o artigo
científico como “parte de uma publicação com autoria declarada,
que apresenta e discute ideias, métodos, técnicas, processos e re-
sultados nas diversas áreas do conhecimento” (ABNT, 2003a, p. 2).
E, no item quatro, “Artigo”, distingue dois tipos de artigo: a) arti-
go original (relatos de experiência de pesquisa, estudo de caso
etc.); b) artigo de revisão (ABNT, 2003a, p. 3). O primeiro é defini-
do como “parte de uma publicação que apresenta temas ou abor-
dagens originais” e o segundo, como “parte de uma publicação
que resume, analisa e discute informações já publicadas” (ABNT,
2003a, p. 3).
Com relação à organização estrutural, ainda conforme a
NBR 6022:2002, o artigo deve conter: 1) Elementos pré-textuais: a)
título, e subtítulo (se houver); b) nome (s) do (s) autor (es); c) re-
sumo na língua do texto; d) palavras-chave na língua do texto; 2)
Elementos textuais: a) introdução; b) desenvolvimento; c) conclu-
são; e 3) Elementos pós-textuais: a) título, e subtítulo (se houver)
em língua estrangeira; b) resumo em língua estrangeira; c) pala-
vras-chave em língua estrangeira; d) nota (s) explicativa (s); e) re-
ferências; f) glossário; g) apêndice (s); h) anexo (s).

1.1 Resumo(s): algumas prescrições

A ABNT, através do subtítulo 3.27, “resumo na língua ver-


nácula”, da NBR 14724:2011, que estabelece os princípios gerais
para elaboração de trabalhos acadêmicos, visando a sua apresenta-
ção (ABNT, 2011, p. 5), define esse elemento pré-textual como a
“apresentação concisa dos pontos relevantes de um texto, forne-
cendo uma visão rápida e clara do conteúdo e das conclusões do
trabalho” (ABNT, 2011, p. 8). Essa conceituação, a nosso ver, em-
bora destaque a necessidade de o resumo evidenciar o conteúdo
abordado e as conclusões averiguadas, é bastante sucinta. Além

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disso, ao referir-se a “pontos relevantes”, envolve apreciação valo-


rativa, tornando-se insuficiente para orientar a produção de resu-
mos. Provavelmente, em virtude dessa limitação, a NBR
14724:2011, no subtítulo 4.2.1.7, determina que o resumo na língua
materna deve ser elaborado conforme a NBR 6028:2003 (ABNT,
2011, p. 11), que versa especificamente sobre “os requisitos para
redação e apresentação” desse elemento pré-textual obrigatório
(ABNT, 2003b, p. 1).
A NBR 6028:2003, no subitem 2.2, conceitua o resumo de
maneira ainda mais sintética como a “apresentação concisa dos
pontos relevantes de um documento” (ABNT, 2003b, p. 1). Entre-
tanto, amplia esse conceito ao longo do texto. Essa ampliação co-
meça a partir da exposição dos diferentes tipos de resumo, nos
subitens 2.3, 2.4 e 2.5. Segundo a ABNT (2003b, p. 1), os resumos
podem ser classificados como: 1) resumo crítico (também chamado
de resenha ou de recensão, quando analisa apenas uma edição
entre várias): destina-se a apresentar a análise crítica de um docu-
mento; 2) resumo indicativo: reserva-se a indicar “apenas os pon-
tos principais de um documento” [grifos nossos], sem expor da-
dos, requerendo, portanto, a consulta ao original; 3) Resumo analí-
tico: dedica-se a informar o leitor acerca das finalidades, metodo-
logias, resultados e conclusões do documento, dispensando a con-
sulta ao original (ABNT, 2003b, 1).
Como podemos observar, dentre as definições apresenta-
das, apenas a de resumo analítico destaca as informações a serem
explorados. Entretanto, ao instituir as “Regras gerais de apresenta-
ção” do resumo, a NBR 6028:2003 deixa subentendido que os as-
pectos elencados devem ser contemplados também no resumo
crítico e no resumo indicativo. Essa exigência fica evidente quando
a norma, no subitem 3.1, estabelece que o “resumo deve ressaltar o
objetivo, o método, os resultados e as conclusões do documento”
(ABNT, 2003b, p. 2), evidenciando, desse modo, os pontos que
considera relevantes para elaboração do elemento pré-textual em
discussão. No mesmo subitem, a norma ressalta que a ordem e a
extensão dos itens especificados dependem do tipo de resumo
(informativo ou indicativo) e do tratamento que cada um deles
recebe no documento original (ABNT, 2003b, p. 2). No subitem 3.3,

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determina que o resumo deve constituir-se de uma sequência de


frases afirmativas concisas, e não de enumeração de tópicos
(ABNT, 2003b, p. 2). No subitem 3.3.1, prescreve que a primeira
frase do resumo deve ser significativa e explicar o tema principal
do documento e que, após essa explicação, deve ser explicitada a
categoria de tratamento estabelecida para coleta de dados (“me-
mória, estudo de caso, análise da situação etc.”) (ABNT, 2003b, p.
2). Além disso, no subitem 3.3.5, fixa a extensão dos resumos: a)
para trabalhos acadêmicos (teses, dissertações e outros) e relatórios
técnico-científicos, de 150 a 500 palavras; b) para artigos de perió-
dicos – nosso objeto de investigação –, de 100 a 250 palavras; e c)
para indicações breves, de 50 a 100 palavras. Destaca ainda que os
resumos críticos, em virtude de “suas características especiais”,
não se submetem a limite de palavras (ABNT, 2003b, p. 2).
A NBR 6022:2003, que, conforme comentamos, busca sis-
tematizar a apresentação dos elementos constitutivos dos artigos
em publicação, também faz menção à NBR 6028 e determina como
devem ser as frases constitutivas do resumo e a quantidade de
palavras que esse elemento deve conter:

Elemento obrigatório, constituído de uma sequência de fra-


ses concisas e objetivas e não de uma simples enumeração
de tópicos, não ultrapassando 250 palavras, seguido, logo
abaixo, das palavras representativas do conteúdo do traba-
lho, isto é, palavras-chave e/ou descritores, conforme a NBR
60283 [grifos nossos] (ABNT, 2003a, p. 3).

As orientações evidenciadas pela ABNT são retomadas pe-


la maioria dos autores dos Manuais de Metodologia Científica. Em
alguns casos, essa recuperação aparece com recomendações adici-
onais, na tentativa de sanar as lacunas deixadas pelos documentos
da referida associação. É o caso, por exemplo, de Medeiros (2000,
p. 123), para quem a definição delimitada pelo Fórum Nacional de
Normalização “pode ser melhorada”. Para alcançar esse intento, o
autor sugere a seguinte explicação: “resumo é uma apresentação

3 O documento refere-se à NBR 6028:1990.

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sintética e seletiva das ideias de um texto, ressaltando a progressão


e a articulação delas. Nele devem aparecer as principais ideias do
autor do texto”.
Entretanto, acreditamos que a definição de Medeiros tam-
bém não explicita com clareza os pontos a serem abordados. Esses
aparecem quando o autor enumera as “partes constantes de um
resumo” produzido pelo próprio pesquisador, autor do artigo ci-
entífico: “natureza da pesquisa, resultados e conclusões”, e acres-
centa que o valor e a originalidade das descobertas realizadas
também devem ser destacados (MEDEIROS, 2000, p. 123). Quando
o resumo versa sobre textos de outros autores, deve expor “o as-
sunto do texto, o objetivo do texto, a articulação das ideias e as
conclusões do autor do texto objeto do resumo” (MEDEIROS,
2000, p. 123).
Severino (2000, p. 173) não menciona a NBR 6028:2003, em-
bora sua concepção de resumo aproxime-se do conceito de resumo
indicativo proposto pela norma. Para abordar o assunto, utiliza o
termo resumo técnico de trabalho científico e argumenta que esse
tipo de resumo “consiste na apresentação concisa do conteúdo de
um trabalho de cunho científico (livro, artigo, dissertação, tese
etc.)”. Esclarece ainda que a “finalidade específica” dessa modali-
dade de resumo é:

passar ao leitor uma ideia completa do teor do documento


analisado, fornecendo, além dos dados bibliográficos do do-
cumento, todas as informações necessárias para que o lei-
tor/pesquisador possa fazer uma primeira avaliação do tex-
to analisado e dar-se conta de suas eventuais contribuições,
justificando a consulta do texto integral (SEVERINO, 2000,
p. 173).

A citação destacada evidencia que o autor principia suas


reflexões a partir de ponderações acerca da função social do resu-
mo, não apenas do ponto de vista de quem escreve, mas também
de quem lê. Em seguida, Severino (2000, p. 173) elenca as informa-
ções que um resumo deve contemplar, as quais precisam se pautar
na ideia central do trabalho. São elas: natureza do trabalho, objeto

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tratado, objetivos visados, referências teóricas de apoio, procedi-


mentos metodológicos adotados, conclusões e resultados. Consta-
tamos, nessa enumeração, a indicação de duas informações não
previstas na NBR 6028:2003, o objeto de estudo e o referencial teó-
rico, que consideramos fundamentais para o domínio discursivo
científico. Aspectos que são reforçados quando o estudioso destaca
as perguntas que o resumo precisa responder, as quais, acredita-
mos, são bastante profícuas para orientar sua produção. São elas:

De que natureza é o trabalho analisado (pesquisa empírica,


pesquisa teórica, levantamento documental, pesquisa histó-
rica etc.)? Qual o objeto pesquisado/estudado? O que se pre-
tendeu demonstrar ou constatar? Em que referências teóri-
cas se apoiou o desenvolvimento do raciocínio? Mediante
quais procedimentos metodológicos e técnico-operacionais
se procedeu? Quais os resultados conseguidos em termos de
atingimento dos objetivos propostos? (SEVERINO, 2000, p.
173).

Motta-Roth e Hendges (2010, p. 152), referem-se, especifi-


camente, ao abstract ou resumo acadêmico e conceituam-no como
“um texto breve que encapsula a essência do artigo que se segui-
rá” [grifos das autoras]. Segundo as autoras, os principais objeti-
vos de um resumo são: “sumarizar, indicar e predizer, em um pa-
rágrafo curto, o conteúdo e a estrutura do texto integral que se-
gue” e “persuadir o leitor a continuar a ler o texto integral, para
convencê-lo de que o artigo que segue é interessante e que os re-
sultados são relevantes”. Esses objetivos mostram que as estudio-
sas, assim como Severino (2000), explicitam as funções sociais do
resumo, tanto na perspectiva dos enunciadores como na dos enun-
ciatários. As pesquisadoras defendem que a estrutura retórica do
resumo assemelha-se à do artigo científico (MOTTA-ROTH;
HENDGES, op. cit., p. 152).
Ainda conforme as autoras, como o artigo acadêmico pode
ser de pelo menos dois tipos, revisão de literatura ou empíri-
co/experimental, o resumo também poderá apresentar uma dessas
duas formas de organização retórica. O resumo de artigo de revi-
são de literatura possuirá um caráter teórico e constituir-se-á dos

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elementos centrais da discussão feita no corpo do artigo: objetivo


do trabalho, natureza da pesquisa, principais questões teóricas a
serem abordadas (MOTTA-ROTH; HENDGES, op. cit., p. 153).
Normalmente, o resumo de artigo empírico ou experimental com-
põe-se de cinco movimentos que podem subdividir-se em diferen-
tes subfunções, as quais não são, necessariamente, concomitantes:
1) Situar a pesquisa: Estabelecer interesse profissional no tópico;
Fazer generalização do tópico; Citar pesquisas prévias; Estender
pesquisas prévias; Contra argumentar pesquisas prévias; Indicar
lacunas em pesquisas prévias; 2) Apresentar a pesquisa: Indicar as
principais características; Apresentar os principais objetivos; Le-
vantar hipóteses; 3) Descrever a metodologia; 4) Sumarizar os re-
sultados; e 5) Discutir a pesquisa: Elaborar conclusões, Recomen-
dar futuras aplicações (MOTTA-ROTH; HENDGES, 1996, p. 68
com base em BITTENCOUR, 1995, p. 485 apud MOTTA-ROTH;
HENDGES, 2010, p. 155).
Que forma (s) de conceber o resumo é (são) considerada (s)
no processo de elaboração dos resumos analisados? Que concep-
ção de ciência as formas adotadas pelos pesquisadores revelam?
Qual o nível de proximidade/distanciamento entre as áreas de
conhecimento contempladas e os parâmetros estabelecidos para
situar uma ação de linguagem dentro do domínio discursivo cien-
tífico? Essas são as questões que nortearam nossa análise e que
abordaremos no próximo tópico.

2. Concepções do fazer científico em resumos de artigos


científicos

A publicação não apenas dos resumos, mas dos artigos,


como um todo, depende, dentre outras exigências, de os pesquisa-
dores cumprirem as normas estabelecidas pelos periódicos especi-
alizados aos quais submetem seus trabalhos para apreciação. Con-
siderando as normas dos periódicos analisados em relação, especi-
ficamente, ao elemento resumo, constatamos que essas variam
quanto ao grau de profundidade de orientação, indo desde a sim-
ples indicação da (s) língua (s) em que deve ser elaborado e da

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quantidade de palavras e/ou linhas que deve conter até a delimi-


tação e explicação dos itens ou seções que devem constituí-lo. Essa
variação pode ser verificada no Quadros 01 (conferir Apêndice A),
organizado a partir das áreas de conhecimento contempladas, que
agrupamos a partir das grandes áreas de conhecimento delineadas
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Supe-
rior (CAPES). Dentre essas grandes áreas, investigamos quatro:
Ciências da Saúde, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas
e Linguística, Letras e Artes. Para uma apresentação mais didática
dos dados, subdividimos nossa análise com base nessas quatro
grandes áreas de conhecimento selecionadas.

2.1 O fazer científico em Ciências da Saúde

No que concerne às Ciências da Saúde, a área de Medicina


é a que segue uma orientação mais rigorosa, tanto quanto às nor-
mas estabelecidas pelos periódicos, como quanto ao cumprimento
dessas normas pelos autores que submetem seus artigos científicos
à publicação, apesar de realizarem alguns acréscimos. O rigor exi-
gido nessa área parece-nos revelar uma orientação positivista
quanto ao processo de construção de conhecimento científico, a
ponto de o resumo, predominantemente, empírico/experimental,
transformar-se em uma espécie de gênero formulaico constituído
de itens ou seções intitulados (as) que devem ser preenchidos pelo
pesquisador e que, muitas vezes, funcionam como elementos coe-
sivos conectores das partes do resumo.
A Revista de Saúde Pública, antes de prescrever a organi-
zação estrutural a ser adotada pelos autores (Os resumos devem ser
apresentados no formato estruturado, com até 300 palavras, con-
tendo os itens: Objetivo, Métodos, Resultados e Conclusões4), re-
fere-se às particularidades do resumo atrelando-as às categorias de
artigo: As especificações quanto ao tipo de resumo estão descritas em
cada uma das categorias de artigos. Essas peculiaridades são reforça-

4 Em nossa análise, centramo-nos, exclusivamente, nos textos constituti-


vos dos resumos propriamente ditos. Por isso, não teceremos considera-
ções acerca dos títulos e das palavras-chave.

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das quando a norma ressalta que os resumos de “ensaios teóricos e


os de artigos sobre metodologia e técnicas usadas em pesquisas” devem
ser elaborados “no formato narrativo, que, neste caso, terão limite de
150 palavras”. E também quando explana, em tom didático, a regra
geral de estruturação desse elemento: Como regra geral, o resumo
deve incluir: objetivos do estudo, principais procedimentos metodológicos
(população em estudo, local e ano de realização, métodos observacionais e
analíticos), principais resultados e conclusões.
Vejamos um exemplo redigido por dois autores que se-
guem as orientações estabelecidas, sem incluir nenhum item adici-
onal, apenas substituem a população em estudo pelo corpus de
análise fazendo os ajustes necessários decorrentes da natureza da
pesquisa, no caso, a documental:

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OBJETIVO: Analisar o aumento do número de Objetivo5


autores por artigo em revistas científicas brasileiras
de saúde coletiva. MÉTODOS: Foram pesquisados Descrição do
na base de dados LILACS artigos publicados em corpus de aná-
seis revistas de saúde coletiva e uma revista médi-
lise
ca (para comparação), da coleção SciELO, com
classificação Qualis, da Capes, igual ou superior a
B-1, entre 1999 e 2010. Foram avaliadas a evolução
da mediana de números de autores/artigo e a pro- Procedimentos
porção de artigos com mais de quatro autores. de análise
Estimou-se a associação entre o triênio de publica-
ção e a presença de quatro ou mais autores por Método de
artigo por meio de odds ratio de Mantel-Haenzel, análise
ajustadas para o tipo de revista. RESULTA-
DOS: Houve crescimento da mediana do número
de autores e da proporção de artigos com mais de
quatro autores para todas as revistas, principal-
mente no último triênio. As odds ratio para publica-
Resultados da
ção de artigos com quatro autores ou mais, ajusta- Pesquisa
das para os tipo de revista, foram: segundo triênio:
1,3 (IC95% 1,1;1,4); terceiro triênio: 1,5 (IC95%
1,3;1,8); quarto triênio: 2,39 (IC95% 2,1;2,8). CON- Conclusão
CLUSÕES: Periódicos científicos de saúde coletiva
têm apresentado aumento no número de autores
por artigo ao longo dos anos, independentemente
da orientação editorial [negritos dos autores] [real-
ces e sublinhados nossos] (REVISTA DE SAÚDE
PÚBLICA).

Exemplo 01: Resumo da Revista de Saúde Pública

No exemplo 01, observamos que os pesquisadores, para al-


cançarem seu objetivo (Analisar o aumento do número de autores por
artigo em revistas científicas brasileiras de saúde coletiva), empregam

5 Destacaremos as informações constitutivas do plano geral dos resumos


utilizando sombreados e setas; as modalizações empregando os seguintes
recursos gráficos: modalizações lógicas; modalizações deônticas; modali-
zações apreciativas; modalizações pragmáticas; e elementos linguísticos
relevantes para análise fazendo uso do itálico e do sublinhado.

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uma medida estatística bastante elaborada (a odds ratio de Mantel-


Haenzel). Essa escolha indica-nos a adoção do modelo positivista
de ciência, que requer métodos rigorosos de investigação, de cará-
ter quantitativo, para coleta e análise dos dados. Outro aspecto
adotado pelos autores que reforça esse modelo é a apresentação
dos resultados como fatos atestados, os quais são expressos atra-
vés de modalizações lógicas (houve acréscimo; Periódicos [...] têm
apresentado aumento). Temos também a “neutralidade”, construída
através da utilização da forma impessoal, como traço caracteriza-
dor desse modelo. No exemplo em análise, detectamos ainda que
os autores pontuam as informações solicitadas sem se preocupa-
rem com o estabelecimento de elos coesivos entre as partes consti-
tutivas do resumo. Desse modo, caso retirássemos a indicação dos
itens, o texto apresentaria problemas de coesão textual.
Os demais resumos da Revista de Saúde Pública averigua-
dos diferenciam-se do transcrito acima por acrescentarem reco-
mendações no item Conclusão. Em um dos resumos, de elaboração
coletiva, oito autores, a recomendação é apresentada a partir de
uma modalização deôntica: “Este resultado indica a necessidade de
haver continuidade na vigilância em saúde”. E, no outro, construído
por dois autores, a partir de modalizações apreciativas: “Mudar as
atitudes e melhorar o conhecimento que se tem acerca do envelhecimento é
essencial no enfrentamento das demandas advindas dessa fase da vida.
Qualificar a formação do agente comunitário de saúde é fundamental no
cuidado ao idoso na atenção primária” [grifos nossos].
Também detectamos o acréscimo de recomendações no
item Conclusão em um dos resumos da Revista Brasileira de Ciên-
cias da Saúde – RBCS. Esse periódico, além de determinar a subdi-
visão do resumo em itens, colocando-a como obrigatória (O Resu-
mo/Abstract deverá, obrigatoriamente, ser estruturado, isto é, ser
subdividido nos seguintes itens descritos como necessários para cada
seção [...] Objetivo, Metodologia, Resultados e Conclusão [grifos
nossos]), estabelece a maneira como os itens devem ser descritos
(de modo claro e objetivo), bem como o espaço a ser utilizado (O
Resumo/Abstract deve ser escrito em espaço simples) e a quantidade
de palavras a serem empregadas (ter entre 200 a 250) [grifos nos-

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sos]. O periódico indica ainda o que deve ser evitado (parágrafos,


citações bibliográficas e notas).
Considerando essas orientações, constatamos que, dos três
resumos da RBCS analisados, todos de elaboração coletiva, duas
compostas por três autores e uma por seis, nenhum apresenta o
termo Metodologia, um o substitui por Método e dois por Materi-
ais e Métodos. Outro dado singular é o acréscimo do item Introdu-
ção, verificado em um dos resumos, elaborado por três pesquisa-
dores. Essa inclusão remete-nos a um dos elementos concebidos,
no âmbito científico, como elementos textuais e comprova a afir-
mação de Motta-Roth e Hendges (2010, p. 152) quanto ao fato de a
estrutura retórica do resumo assemelhar-se à do artigo científico.
Um terceiro dado peculiar é a apresentação de uma breve justifica-
tiva, antecedendo a explicitação do objetivo do estudo. Esses
acréscimos revelam que os autores preocuparam-se em contextua-
lizar e justificar o tema:

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Introdução: Nos últimos 50 anos percebe-se um Contextualiza-


aumento significativo na população de idosos, uma ção do tema
parcela de pessoas que devido a alterações ocorren-
tes em seus corpos pelo passar dos anos, tem suas Justificativa da
condições físicas diminuídas. Objetivo: Sabendo-se pesquisa
que essa diminuição da capacidade funcional é um Objetivo
dos fatores causadores da depressão em idosos, o
presente estudo tem como objetivo verificar a in- Método de cole-
fluência da prática de exercícios físicos na ocorrên- ta e Método de
cia de sinais sugestivos de depressão geriátrica. Análise
Materiais e Métodos: Os dados foram coletados Participantes da
por meio de uma entrevista estruturada utilizando pesquisa6
a Escala Geriátrica de Depressão (YESAVAGE,
1983). Resultados: Das 15 idosas entrevistadas,
conforme pontuação da Escala Geriátrica de Yesa- Resultados
vage, 12 apresentaram grau normal (80%), 3 de-
pressão média (20%) e nenhuma depressão mode-
rada/severa (0%). Os dados coletados mostraram
uma possível afirmação de que a prática de exercí-
cios físicos regulares contribui de forma positiva Conclusão
para diminuir os níveis de depressão em idosas,
pois o indivíduo ativo apresenta um menor risco
de desenvolver doenças, devido à prática propria-
mente dita e também ao convívio social. Conclu-
são: Desta forma conclui-se que a partir dos dados
coletados [sic], a prática de atividade física, possi-
velmente contribui para uma melhora na capaci-
dade funcional [sic] e ao mesmo tempo reduzindo
os níveis de depressão geriátrica [negritos dos au-
tores] [realces e sublinhados nossos] (REVISTA
BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – RBCS).

Exemplo 02: Resumo da Revista Brasileira de Ciências da Saúde

Ainda considerando o exemplo 02, outro ponto relevante é


o fato de a coesão textual entre as partes do resumo ser construída
por elementos linguísticos específicos (Sabendo-se que essa diminui-
ção, Os dados foram coletados, Das 15 idosas entrevistadas, Dessa for-

6 Informação relacionada à metodologia

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ma), e não pela presença da denominação de seus itens constituti-


vos. Esses podem ser facilmente depreendidos; a conclusão, por
exemplo, é explicitada pelo emprego do verbo concluir na forma
impessoal (conclui-se) – forma recorrente em todos os resumos da
RBCS. Nesse item, temos também, no exemplo em análise, o em-
prego da modalização lógica possivelmente contribui para explicitar
a conclusão, colocando a contribuição da atividade física para me-
lhoria das condições de vida na terceira idade como uma possibi-
lidade, e não como uma convicção, evidenciando, assim, o caráter
refutável do conhecimento científico. A modalização lógica e os
mesmos efeitos linguístico-discursivos também podem ser perce-
bidos no trecho: Os dados coletados mostram uma possível afirmação,
que se encontra nos Resultados. No item Introdução, mais precisa-
mente na contextualização do tema e na justificativa da pesquisa,
detectamos a presença de modalizações lógicas (Nos últimos 50
anos percebe-se um aumento significativo; uma parcela de pessoas [...]
tem suas condições físicas diminuídas), que colocam as informações
como atestadas para fortalecer a validade da pesquisa. E, no item
Objetivo, observamos outra modalização lógica (essa diminuição da
capacidade funcional é um dos fatores causadores da depressão) que
emana de uma modalização pragmática (Sabendo-se que), incluin-
do os pesquisadores como sabedores conscientes dos efeitos da
diminuição da capacidade funcional.
No que concerne à área de Nutrição, os dois periódicos
examinados são categóricos quanto às determinações acerca da
produção do resumo. O primeiro, a Revista Metabolism: Clinical and
Experimental, inicialmente, explicita que “todos os artigos, com
exceção de editoriais e comentários, devem incluir um resumo estrutu-
rado de até 250 palavras” [grifos nossos]. Em seguida, divulga um
esclarecimento que nos remete às ponderações de Motta-Roth e
Hendges (2010): As informações relatadas no resumo devem resumir a
lógica do estudo, os métodos, os resultados principais e sua interpretação
ou implicações e, paralela e aparentemente, à configuração do re-
sumo de revisão de literatura. Mas, logo após, institui a organiza-
ção estrutural do resumo: O resumo deve ser dividido nas seguintes
seções: Objetivo, Materiais / Métodos, Resultados, Conclusões,
direcionando-nos para à estrutura do resumo empíri-

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co/experimental. E, finalmente, conclui as prescrições impondo


algumas limitações para constituição do resumo: O resumo não deve
incluir referências e abreviaturas devem ser mantidas a um mínimo.
Contudo, convém observarmos que, ao referir-se à necessidade de
o resumo interpretar os resultados ou explicitar suas implicações,
o periódico nos sugere uma concepção de ciência que une aspectos
quantitativos e qualitativos.
Apesar das exigências, dos três resumos avaliados nesse
periódico, todos de construção coletiva (quatro, nove e dez auto-
res), apenas um é organizado no “formato estruturado”, ou seja,
apresenta a indicação dos itens especificados, sem os quais perde-
ria sua coesão textual. Os demais são organizados em “formato
não estruturado”, isto é, contemplam os itens solicitados, mas são
construídos em forma de um parágrafo cuja coesão textual é cons-
truída por diferentes elementos linguísticos, e não pela designação
dos itens. Contudo, evidenciam uma concepção de ciência arrai-
gada à visão positivista, desenhada por uma linguagem, predomi-
nantemente, técnico-científica, marcada pela recorrência a termos
específicos da área, pelo tom “neutro” e objetivo e pela predomi-
nância de modalizações lógicas, geralmente, empregadas para
atestar a veracidades dos fatos investigados e/ou de modalizações
pragmáticas, geralmente, utilizadas para comprovar a validade
dos Materiais/Métodos aplicados. Vejamos o exemplo 03, elabo-
rado por dez autores, que possui todos esses traços e coloca os
resultados do estudo, centrado na análise de aplicação de dietas na
redução da acumulação de gordura, como possíveis, e não como
certos:

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A resistência à insulina é caracterizada por distúrbios Contextuali-


no metabolismo lipídico no músculo esquelético. Nos- zação do
so objetivo foi investigar se a expressão do gene e áci- tema
dos graxos (FA) perfil de lipídios do músculo esquelé-
tico são afetados por diferentes dietas em quantidade e Objetivo
qualidade de gordura em indivíduos com a síndrome
metabólica (SM) e diferentes graus de sensibilidade à Participantes
insulina. 84 pacientes (idade 57,3 ± 0,9 y, IMC 30,9 ± 0,4 da pesquisa
kg / m 2 , 42 M/42 F) foram designados aleatoriamen-
te para um de quatro iso-energéticas dietas: maior SFA Materiais e
(HSFA); alta MUFA (HMUFA) ou dois baixo teor de Métodos
gordura e de alta complexos de hidratos de carbono, as
dietas suplementadas com 1,24 g / dia de cadeia longa
n -3 PUFA (LFHCC n óleo -3) ou de controlo (LFHCC)
durante 12 semanas. Em um subgrupo de homens (n =
26), TAG muscular, DAG, AGL e conteúdos de fosfoli-
pídios foram determinados incluindo sua taxa fracio- Resultados
nal sintético (FSR) e composição FA em jejum e 4 horas
após o consumo de uma refeição rica em gordura mis-
to, tanto pré e pós-intervenção. Os genes envolvidos na
lipogénese foram reprimidos após HMUFA (alteração
média fold - 1,3) e depois LFHCC n -3 (mudança fold -
1,7) em indivíduos resistentes à insulina (<mediana de
(S I)), enquanto que em indivíduos sensíveis à insulina
(> mediana a sensibilidade à insulina), o efeito oposto Conclusão
foi mostrado (mudança dobra + 1,6 para as duas die-
tas). HMUFA dieta tendeu a diminuir no FSR TAG ( P
= 0,055) e DAG ( P = 0,066), ao passo que o LFHCC n -3
dieta reduziu o teor de TAG ( P = 0,032). Em conclu-
são, e HMUFA LFHCC n -3 dietas reduziu a expressão
dos genes lipogênicas no músculo esquelético de indi-
víduos resistentes à insulina, ao passo que HMUFA
reduziu a taxa de síntese fraccionai de DAG e TAG e
LFHCC n-3, o teor de TAG. Os nossos dados indicam
que estas dietas podem reduzir a acumulação de gor-
dura muscular afectando o equilíbrio entre a síntese de
FA, de armazenamento e de oxidação [realces nossos]
(METABOLISM: CLINICAL AND EXPERIMENTAL).

Exemplo 03: Resumo da Revista Metabolism: Clinical and Experimental

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O segundo periódico, a Nutrire: Revista da Sociedade Brasi-


leira de Alimentos e Nutrição, estabelece como normas as línguas
em que os resumos devem ser constituídos (português, inglês e es-
panhol), a quantidade de palavras que devem conter (até 250 pala-
vras) e a forma como deve ser estruturado (seções). E determina as
seções a serem contempladas considerando dois tipos de artigo, os
Artigos originais (objetivo, métodos, resultados e conclusões) e os Arti-
gos de revisão (objetivo, fonte de dados, síntese dos dados e conclusões),
salientando que os resumos devem adequar-se à modalidade de
artigo a ser submetido à publicação.
Os três exemplos considerados também de elaboração cole-
tiva (três, quatro e seis autores), embora não sejam constituídos no
formato estruturado, contemplam os itens: objetivo da pesquisa,
metodologia, resultados e conclusões. Um deles restringe-se a ex-
planar essas informações e a seguir a ordem indicada. Outro,
exemplo 04, construído por seis autores, exposto a seguir, começa
com a contextualização do tema (O consumo de frutas [...] a própria
alimentação) atrelada à indicação do objetivo da pesquisa e do obje-
to de estudo, destacados de forma indireta (observando-se então ati-
tudes indesejáveis na alimentação como a baixa ingestão de frutas e horta-
liças). Em seguida, apresenta aspectos metodológicos: 1) O público
alvo (foram 122 estudantes [...] entre 17 e 28 anos) e 2) Materiais e Mé-
todos (formulário e também a aplicação de um questionário de frequência
alimentar semiquantitativo (QFSQ)). Logo após, expõe os resultados
(Segundo o número de refeições [...] igual ou mais de três porções diá-
rias). E, finalmente, aduz uma recomendação, de caráter apreciati-
vo, para os nutricionistas (Este é um desafio para nutricionistas em
busca de intervenções [...] para práticas alimentares saudáveis):

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O consumo de frutas e hortaliças é baixo na maio- Contextualiza-


ria dos países, tornando os indivíduos mais suscep- ção do Tema
tíveis às doenças crônicas não transmissíveis. No
caso dos universitários, surge um novo estilo de Justificativa da
vida a partir do ingresso na universidade. Eles Pesquisa
devem escolher e preparar a própria alimentação, o Objetivo
que pode ser interpretado por eles de forma nega-
tiva quanto a sua capacidade de tomar decisões Objeto de estu-
sobre a própria alimentação, observando-se então do
atitudes indesejáveis na alimentação como a baixa Informantes da
ingestão de frutas e hortaliças. O público alvo fo- Pesquisa
ram 122 estudantes do curso de Graduação em
Nutrição da Universidade Federal do Triângulo Materiais e Mé-
Mineiro (UFTM) com idades entre 17 e 28 anos. Foi todos
feito levantamento de informações de âmbito geral
em formulário e também a aplicação de um questi- Resultados
onário de frequência alimentar semiquantitativo
(QFSQ) para avaliação de frequência e consumo de
frutas e hortaliças. Segundo o número de refeições
realizadas, 68,9% dos estudantes fazem 5 ou mais
refeições por dia. A maioria dos estudantes tem o
hábito de consumir hortaliças semanalmente, ape- Conclusão
sar do consumo não ser adequado em quantidade.
Os mais consumidos diariamente são as hortaliças
cruas. O consumo de frutas ainda é baixo, sendo Recomendação
que apenas 27,79% deles ingerem igual ou mais de
3 porções diárias. Em síntese, a maioria da popula-
ção estudada possui o hábito alimentar adequado
em relação ao número de refeições, porém o núme-
ro de porções de frutas e hortaliças é considerado
baixo. Este é um desafio para os nutricionistas em
busca de intervenções como programas de promo-
ção da saúde, para incentivo de práticas alimenta-
res saudáveis [realces nossos] (REVISTA NU-
TRIRE).

Exemplo 04: Resumo 01 da Nutrire: Revista da Sociedade


Brasileira de Alimentos e Nutrição

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E o terceiro, exemplo 05, composto por quatro autores, des-


tacado abaixo, problematiza o tema (Evidências sobre [...] consumo de
frutas e verduras), explicita os objetivos do trabalho (O objetivo deste
trabalho foi [..], além de [...] do consumo alimentar de adolescentes), co-
menta aspectos metodológicos (A frequência de consumo dos alimen-
tos foi categorizada [...] com idades entre 12 e 13 anos), evidencia os
resultados (A maior parte dos pais dos adolescentes [..] associou-se à sua
inadequação) e ressalta a conclusão (Pode-se concluir [...] consumo
alimentar inadequado dos adolescentes). Quanto aos resultados da
pesquisa, constatamos que esses são enumerados um após o outro,
sem o estabelecimento da devida interligação entre as ideias, pre-
judicando, assim, parte da coesão textual do resumo.

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Evidências sobre a disponibilidade de alimentos no Justificativa da


Brasil indicam que a transição alimentar tem sido Pesquisa
desfavorável quanto à prevenção da obesidade, o
que inclui maior ingestão de refrigerantes, biscoitos
e demais alimentos industrializados, e queda no Objetivos
consumo de frutas e verduras. O objetivo deste
trabalho foi estimar a frequência de consumo de
alimentos e de grupos alimentares, além de analisar
a influência do “tempo em atividades de lazer se- Métodos
dentárias” e das variáveis demográficas e socioeco-
nômicas na determinação do consumo alimentar de
adolescentes. A frequência de consumo dos alimen- Participantes a
tos foi categorizada em adequada e não adequada. Pesquisa
A relação das variáveis explanatórias com o desfe- Resultados
cho foi verificada por meio de regressão logística
múltipla. Participaram do estudo 344 adolescentes,
sendo a maioria do gênero feminino e com idades
entre 12 e 13 anos. A maior parte dos pais dos ado-
lescentes cursou até o 2º grau. A maioria das famí-
lias tinha rendimentos de até três salários mínimos.
Segundo, terceiro e quarto quartos de tempo gastos
nas atividades de lazer sedentárias associaram-se à
inadequação do consumo de legumes e verduras,
de salgados, de refrigerantes/sucos industrializa- Conclusão
dos e de doces. A maior idade dos adolescentes
associou-se ao consumo inadequado de legumes e
verduras; a maior renda familiar associou-se ao
consumo adequado de refrigerantes; pertencer à
Escola Municipal 2 associou-se à adequação do
consumo de doces e a renda familiar de 2 a 3 salá-
rios mínimos associou-se à sua inadequação. Pode-
se concluir que principalmente o maior tempo de
atividade de lazer sedentária é fator importante na
determinação do consumo alimentar inadequado
dos adolescentes. [realces nossos] (REVISTA NU-
TRIRE).

Exemplo 05: Resumo 02 da Nutrire: Revista da


Sociedade Brasileira de Alimentos e Nutrição

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Quanto à área de Odontologia, a revista Cadernos de Saú-


de Pública especifica apenas as línguas em que os resumos devem
ser redigidos (todos os artigos submetidos em português ou espanhol
deverão ter resumo na língua principal e em inglês) e a quantidade de
caracteres que devem conter (no máximo 1100 caracteres com espaço).
Dos três resumos analisados, todos de construção coletiva, seis,
cinco e cinco autores, dois contemplam itens provenientes da es-
trutura canônica empírico/experimental: objetivo, metodologia,
resultados e conclusões, que são delineados por palavras perten-
centes, direta ou indiretamente, ao seu campo. Desses dois, um
acrescenta a contribuição do estudo a partir de uma modalização
apreciativa: “Essa versão é válida e confiável para avaliar a percepção
da estética dentária em crianças e em seus pais”; e outro uma reco-
mendação para sanar os problemas referentes à saúde bucal atra-
vés de uma modalização deôntica: “Assim, é necessário investir em
educação permanente para a adequação dos processos de trabalho realiza-
dos pelas equipes e a redução das diferenças entre as práticas realizadas
nos diversos municípios de Pernambuco”. O resumo, formulado por
cinco autores, que foge a essa organização estrutural contém Con-
textualização do Tema, Problematização/Justificativa e Objetivo
do trabalho, explicitando uma concepção de cunho interpretativis-
ta, não apenas em virtude da composição adotada, mas pelo tom
conativo, introduzido ora por modalizações pragmáticas ((envolve
melhorias [...] organização [...] programas específicos [...] e, obviamente
[...]) e ora por modalizações deônticas (necessidade de reorientação); e
pelo tom apreciativo que circundam todo o texto (O avanço verifi-
cado; descompasso; o reconhecimento de avanços):

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O avanço verificado no enfrentamento de neoplasi- Contextualiza-


as malignas por meio dos sistemas de saúde envol- ção do Tema
ve melhorias nas áreas de vigilância, organização de
redes de assistência, programas específicos voltados
às prevenções primária e secundária e, obviamente,
aos avanços técnico-científicos que caracterizam a Justificativa da
abordagem diagnóstica e terapêutica. Embora seja Pesquisa
notável o reconhecimento de avanços no manejo de
neoplasias malignas em todas as áreas citadas, o
câncer da boca permanece com indicadores de mor- Objetivo
bidade e mortalidade que parecem não acompanhar
o acúmulo científico no conhecimento da doença. O
presente manuscrito objetiva discutir os motivos
desse descompasso, a necessidade de reorientação
de prioridades na abordagem do câncer da boca e
sua efetivação como política pública de saúde [real-
ces nossos] (CADERNOS DE SAÚDE PÚBLICA).

Exemplo 06: Resumo da Revista Cadernos de Saúde Pública

A Revista de Odontologia da Universidade da Cidade de


São Paulo é mais minuciosa quanto à determinação das regras pa-
ra composição do resumo. Além de indicar a quantidade de pala-
vras (250) e o modo de organização (estruturado ou narrativo), re-
comenda o uso da terceira pessoa do singular e do verbo na voz ativa e
especifica e comenta os itens que devem constar no resumo de
artigo original: Introdução (propósitos do estudo ou investigação), Mé-
todos (material e métodos empregados), Resultados (principais resultados
com dados específicos) e Conclusões (as mais importantes). Temos a
adoção do elemento textual introdução como item constitutivo do
elemento pré-textual resumo, demarcando a imbricação entre o
resumo e a organização composicional do artigo científico. Os três
resumos de artigos originais analisados, todos de construção cole-
tiva (três, três e cinco autores), tentam cumprir as recomendações,
adotando a forma estruturada e utilizando a terceira pessoa. Entre-
tanto, um deles não contém conclusão e o outro não contém resul-
tados. Essa última ocorrência encontra-se no exemplo 07, escrito
por três autores, a seguir, que, como o exemplo anterior, também

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expressa uma concepção de ciência de cunho interpretativista, ca-


raterizada, em maior frequência pelo tom conativo, expresso, so-
bretudo, por modalizações pragmáticas, mas também por modali-
zações deônticas, como a que aparece na ressalva feita pelos auto-
res ao final do resumo, bem como pelo tom apreciativo, expresso
por expressões quantificadoras (inúmeras aplicações; diversas esfe-
ras etc.), intensificadoras (qualquer tipo de; maior produtividade e
interação) e qualificadoras (prática e versáteis):

Introdução: Nas universidades, em qualquer tipo de Contextualiza-


faculdade ou instituto de pesquisa, é possível obser- ção do Tema
var as inúmeras aplicações da informatização: geren-
ciamento de banco de dados, organização de catálo- Justificativa da
gos, agilização de diagnósticos, entre outras. Dentro Pesquisa
desse contexto, o ensino a distância pode facilitar
esse aprendizado, porém os alunos, futuros profissio-
nais, precisam estar preparados para lidar com as
novas ferramentas disponibilizadas, usando-as em Objetivo
seu benefício e, consequentemente, em sua capacitação
profissional, para a garantia de maior produtividade e Procedimentos
interação com as diversas esferas no campo de traba- Pedagógicos
lho. Este trabalho tem como objetivo desenvolver
um curso a distância sobre a utilização de um siste-
ma aplicativo odontológico. Métodos: Para isso, foi
utilizada a plataforma Moodle, com seus recursos
disponíveis. A elaboração do curso proposto foi Conclusão
dividida em duas partes: planejamento pedagógico e
inserção do conteúdo pedagógico dentro dos recur- Ressalva
sos técnicos da plataforma Moodle. O curso foi com-
posto por 14 módulos, com o intuito de possibilitar o
aprendizado de forma progressiva e racional. Conclu-
sões: Concluiu-se que essa plataforma permitiu a
elaboração do curso a distância proposto de forma
prática e versátil, em função dos recursos e atividades
que possui. Entretanto, para o uso dessa plataforma,
deve-se ter domínio dos conceitos básicos de infor-
mática e das ferramentas da plataforma Moodle
[realces nossos] (REVISTA DE ODONTOLOGIA DA
UNIVERSIDADE DA CIDADE DE SÃO PAULO).

Exemplo 07: Resumo da Revista de Odontologia da


Universidade da Cidade de São Paulo

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Considerando os dados averiguados, podemos afirmar


que, dentre as três áreas de Ciências da Saúde contempladas (Me-
dicina, Nutrição e Odontologia), a de Medicina é a única que as-
sume uma concepção de ciência pautada, predominantemente, no
paradigma positivista, caracterizado, nos resumos observados,
pelo modelo de organização estrutural, bem como pelo predomí-
nio da linguagem técnico-científica, delineada não apenas por ter-
mos técnicos de cada área, mas também pela neutralidade, ausên-
cia de responsabilidade enunciativa, e pelo tom objetivo. A área de
Odontologia, ao contrário da de Medicina, adota uma concepção
fundamentada, predominantemente, no paradigma interpretativis-
ta, constituído, nos dados estudados, pela contemplação dos ele-
mentos indicados para o resumo empírico/experimental, explo-
rando-os na forma estruturada ou na forma não estruturada, mas
utilizando uma linguagem, embora, preponderantemente, objetiva
e neutra, menos carregada de termos técnico-científicos. Na área
de Nutrição, encontramos as duas concepções de ciência, a de pa-
radigma positivista e a de paradigma interpretativista. Entretanto,
a ênfase, aparentemente, recai sobre a primeira orientação. Dentre
as constatações realizadas, uma despertou nossa atenção, a grande
quantidade de autores por artigo, deixando-nos a seguinte indaga-
ção: Todos colaboraram efetivamente para construção do texto ou
contribuíram como pesquisadores, coletando dados?
Passemos à investigação dos resumos da área de Ciências
Sociais Aplicadas.

2.2 Fazer científico em Ciências Sociais Aplicadas

Com relação às Ciências Sociais Aplicadas, todas as áreas


analisadas (Arquitetura, Direito e Jornalismo) optam por uma pos-
tura menos rigorosa quanto à delimitação de prescrições para ela-
boração dos resumos. Os periódicos de Arquitetura, a Revista Bra-
sileira de Estudos Urbanos e Regionais (ANPUR) e a Revista Ci-
dades (Presidente Prudente), determinam apenas a quantidade
mínima e máxima de palavras que os resumos devem conter, res-
pectivamente, 100 e 150, e as línguas em que devem ser versados,
português e inglês. O periódico Cidades também abre a possibilida-
de para outras línguas ao afirmar que, A critério do autor, poderá ser
enviado um terceiro resumo em francês, espanhol ou alemão. Assim co-

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mo as revistas examinadas, os resumos da área de Arquitetura


apresentam uma organização mais livre e expressam uma concep-
ção de ciência de tendência interpretativista.
Os três resumos da Revista Brasileira de Estudos Urbanos e
Regionais (ANPUR) contêm como elemento comum apenas a indi-
cação dos objetivos do trabalho. O primeiro resumo, produzido
por seis autores, constitui-se de contextualização/justificativa do
tema, exposta de forma direta, descrição da organização do artigo
atrelada à exposição dos resultados que se fundem e/ou se con-
fundem com a indicação dos objetivos do trabalho e, por fim, des-
taque da conclusão, todos delineados de maneira indireta:

A classificação da rede urbana brasileira é impor- Justificativa da


tante ferramenta de gestão governamental, econômica Pesquisa
e social, pois possibilita um direcionamento mais
acertado de investimentos urbanos. Partindo-se da Corpus de
análise de três estudos recentes que elaboraram Análise
classificações para a Rede Urbana – o primeiro,
Configuração Atual e Tendências da Rede Urbana,
desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas
juntamente com o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística; o segundo, Política Nacional de De-
senvolvimento Regional, do Ministério da Integra- Resultados/
ção Nacional, e o terceiro, Tipologia das Cidades Objetivos
Brasileiras, elaborado pelo Observatório das Me-
trópoles, – percebe-se a permeabilidade e complemen-
taridade entre eles, as grandes contribuições trazi-
das e o desafio que é produzir uma classificação
condizente com a diversidade das cidades brasilei- Conclusão
ras. Destaca-se ainda como as diferentes leituras da
rede urbana incorporam-se às políticas públicas,
sendo os estudos realizados parte do processo de
construção da política urbana nacional. Assim,
acredita-se que grandes desafios foram vencidos.
[realces nossos] (REVISTA BRASILEIRA DE ES-
TUDOS URBANOS E REGIONAIS (ANPUR).

Exemplo 08: Resumo 01 da Revista Brasileira de


Estudos Urbanos e Regionais (ANPUR)

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No exemplo 08, detectamos várias expressões qualificado-


ras que marcam a postura avaliativa dos escritores. Esse caráter
valorativo encontra-se também na modalização apreciativa (é im-
portante) presente na contextualização/justificativa do tema, que
destaca a importância da classificação da rede urbana. Além desse
tipo de modalização, constatamos a presença de modalizações
pragmáticas (pois possibilita [...], que elenca o papel desempenhado
pela classificação da rede urbana) e lógicas (percebe-se [...] e incorpo-
ram-se [...], que ressaltam reflexões sobre os estudos analisados).
No que diz respeito ao segundo resumo da Revista Brasi-
leira de Estudos Urbanos e Regionais (ANPUR), elaborado por
dois escritores, compõe-se do objetivo e da descrição da organiza-
ção do trabalho, intercalada pela apresentação de alguns resulta-
dos. E o terceiro e último resumo (três pesquisadores) constitui-se
de contextualização/justificativa do tema, delineamento das ques-
tões de pesquisa, explicitação do objetivo, indicação do objeto de
estudo e comentários acerca das estratégias de análise:

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Em meados do século XIX, a articulação sistematiza- Contextuali-


da do território da nação brasileira foi formulada zação do Te-
como ponto-chave para a estruturação da economia e ma
da sociedade modernas. Esse intento ultrapassava as
antigas demandas de controle geopolítico e encon-
trou nas estiagens prolongadas nas “províncias do Problematiza-
norte” um sério problema. Falar de nova estrutura ção do Tema
territorial pressupõe indagar: que conhecimentos e Problema de
informações iconográficas sobre o território em reor- Pesquisa
ganização tinham aqueles que adentraram no “Brasil
desconhecido”? Discutir pertinências e limites do uso Objetivo
das fontes cartográficas como documentos que per-
mitam compreender as ações sistematizadas sobre o Corpus de
território nordestino é o objetivo deste artigo. Para Análise
tanto, privilegiar-se-á o “Atlas do Império do Brazil”,
organizado por Cândido Mendes de Almeida, em
1868, com ênfase nas províncias mais atingidas pelas Procedimento
secas: CE, RN, PE e PB. O Atlas é lido assim dentro de Análise
da trama de relações da formação da cultura técnica (de Leitura)
moderna no Brasil e, mais especificamente, dos pro-
cessos que levariam à definição da região Nordeste
[realces nossos] (REVISTA BRASILEIRA DE ESTU-
DOS URBANOS E REGIONAIS (ANPUR)).

Exemplo 09: Resumo 02 da Revista Brasileira de


Estudos Urbanos e Regionais (ANPUR)

Os três resumos da Revista Cidades (Presidente Prudente),


assim como os do primeiro periódico de Arquitetura, sintetizam a
organização estrutural dos artigos, centrando-se, quase que exclu-
sivamente, nos objetivos de cada parte constitutiva do trabalho.
Com base nessa constatação, podemos afirmar que esses resumos,
todos de produção individual, empregam o formato do resumo de
revisão de literatura. E, fundamentadas na análise da materializa-
ção da sintetização organizacional, podemos declarar que os re-
sumos apontam para construção do conhecimento científico a par-
tir de um viés interpretativista, marcado pela presença de expres-
sões avaliativas e por modalizações pragmáticas e lógicas.
Vejamos um exemplo:

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O texto destaca aspectos polêmicos do Projeto de Lei Objetivos


3057/2000 - "Lei de Responsabilidade Territorial" - +
que apresenta propostas contraditórias em relação à Organização
função social da cidade e da propriedade expressa Textual
na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Corpus de Análi-
Cidade. O texto propõe regularizar os loteamentos se
"murados" (loteamentos e/ou condomínios fecha-
dos) por meio da regularização fundiária de inte- Resultados
resse específico e loteamentos de acesso restrito. Os
promotores imobiliários atuam para a aprovação Considerações
do Projeto de Lei que lhes permitiria aumentar as
rendas, juros e lucros. Os movimentos populares
urbanos lutam contra a cidade de "feudos" e con-
tam com a atuação da AGB, com o Conselho das
Cidades e com o Ministério Público Federal, que
mostra a inconstitucionalidade desse projeto [grifos
nossos] (REVISTA CIDADES (PRESIDENTE PRU-
DENTE).

Exemplo 10: Resumo da Revista Cidades (Presidente Prudente)

No que se refere à área de Direito, das duas revistas exa-


minadas, Revista Novos Estudos Jurídicos e Revista Eletrônica
Direito e Política – UNIVALE, apenas uma, a primeira, faz alusão
direta às informações que devem ser ressaltadas. Conforme as
normas do primeiro periódico, o resumo (Abstract) deve ser es-
crito em português e inglês ou no idioma de origem, ressaltando objeti-
vos, metodologia e síntese das considerações finais e conter no
máximo 150 palavras. De acordo com as regras do segundo periódi-
co, Em todos os artigos submetidos deve ser incluído um resumo infor-
mativo com o máximo de 150 palavras e espaço entre linhas sim-
ples. Se resgatarmos as orientações da ABNT, o resumo informati-
vo ou resumo analítico, como denomina esse documento, é aquele
em que as finalidades, metodologias, resultados e conclusões do
documento são destacados.
Dos três resumos contemplados da Revista Novos Estudos
Jurídicos, um de construção individual e dois de produção em
dupla, dois seguem uma organização retórica pautada no modelo
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de revisão de literatura, mas constituído pela descrição da organi-


zação estrutural do artigo, composto por objetivos, metodologia e
síntese das considerações finais. Contemplemos um deles, que
possui um autor e um tradutor, que, no sumário e na nota de ro-
dapé, aparece como coautor:

O texto pretende esclarecer o significado dos argu- Objetivos


mentos de autoridade no Direito. O autor utiliza +
exemplos de decisões judiciais que demonstram a Organização
importância e a complexidade desses argumentos no Textual
raciocínio jurídico. Explica em que sentido o Direito
é uma prática autoritativa e demonstra a estrutura
dos argumentos de autoridade (práticas ou teóricas), Sinalização da
para então concluir ressaltando em que consiste o Conclusão
caráter peculiarmente limitado da prática judicial
[realces nossos] (REVISTA NOVOS ESTUDOS JU-
RÍDICOS).

Exemplo 11: Resumo 01 da Revista Novos Estudos Jurídicos

No exemplo 11, o tradutor inicia o resumo contemplando o


objetivo do trabalho. Depois, indica os dados utilizados na consti-
tuição da primeira parte da pesquisa. Em seguida, evidencia a ação
empreendida na segunda parte do texto. E, finalmente, emite a
conclusão, que, em virtude do emprego do vocábulo ressaltando,
apresenta um pequeno truncamento. Um aspecto interessante,
nesse resumo, é o emprego da terceira pessoa do singular, que,
aparentemente, seria uma tentativa indireta de o enunciador as-
sumir a autoria do texto e a responsabilidade enunciativa pelo que
é declarado. Entretanto, evidencia que a autoria das ideias apre-
sentadas, na realidade, pertence a outro agente produtor, pois o
artigo analisado trata-se da tradução de um artigo publicado ori-
ginalmente em espanhol. Esse fato gerou-nos uma inquietação: Por
que essa tradução não aparece em uma seção específica destinada
a esse fim? O fato de o tradutor aparecer como coautor no sumário
e na nota de rodapé não seria um caso de crime contra a proprie-
dade intelectual?

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O terceiro e último resumo da Revista Novos Estudos Jurí-


dicos, apresenta uma forma de organização peculiar, constituída
apenas da contextualização do tema e da evidenciação da conclu-
são, que é apresentada através de uma afirmação categórica ex-
pressa a partir da modalização deôntica É preciso repensar, que con-
cebe ao resumo um tom apelativo cujo intuito é convencer o leitor
da possibilidade de utilização de meios alternativos, que não os Tri-
bunais, para resolução de controvérsias.

O acesso à Justiça é considerado, hodiernamente, Contextualiza-


como sinônimo de acesso aos Tribunais. Isso se dá ção do Tema
em razão da tendência de judicialização dos con-
flitos, ou seja, espera-se que todas as controvérsias Conclusão
sejam resolvidas em juízo. É preciso repensar esse
modelo, aceitando-se como eficientes e adequados
os meios alternativos de solução de controvérsias,
aptos a contribuir, outrossim, para a manutenção
da paz social [grifos e realces nossos] (REVISTA
NOVOS ESTUDOS JURÍDICOS).

Exemplo 12: Resumo 02 da Revista Novos Estudos Jurídicos

Dos três resumos da Revista Eletrônica Direito e Política –


UNIVALE, um organiza-se sob a forma de resumo de revisão de
literatura, um aproxima-se do modelo de resumo empíri-
co/experimental e um estrutura-se a partir da exposição de argu-
mentos e da elucidação da conclusão. Um dado recorrente é a uti-
lização de afirmações categóricas, delimitadas por modalizações
deôntica. O primeiro caso, o de resumo de revisão de literatura
(dois autores), faz uma síntese dos objetivos do trabalho, atrelan-
do-os, indiretamente, aos aspectos a serem discutidos ao longo do
texto:

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O presente artigo busca analisar a relação do meio Objetivos


ambiente com o desenvolvimento e a globalização. +
Propõe a análise de documentos internacionais Organização
que versam sobre questões ambientais, sociais e Textual
econômicas. Procura identificar se o Estado Brasi-
leiro tem respondido às demandas ambientais, Corpus de Análi-
especialmente nas duas últimas décadas do século se
XX, quando a tutela ambiental passou a ser discu- Contextualiza-
tida internacionalmente, destacando alguns im- ção do Tema
portantes princípios ambientais que foram consti-
tucionalizados. Analisa questões nucleares que
fundamentam a produção e uso de formas de
energias limpas e renováveis, tais como mudanças Objeto de Estu-
climáticas, dependência e crises do setor petrolífe- do
ro e um potencial mercado interno e internacional.
Aborda a produção de etanol e biodiesel no Brasil,
alguns marcos regulatórios específicos, bem como Recomendação
os impactos ambientais e sociais dessa atividade.
Ressalta a necessidade da discussão sobre as ex-
ternalidades decorrentes da produção de biocom-
bustíveis, com ênfase na segurança alimentar
(REVISTA ELETRÔNICA DIREITO E POLÍTICA –
UNIVALE).

Exemplo 13: Resumo 01 da Revista


Eletrônica Direito e Política – UNIVALE

O segundo caso, o exemplo do resumo empíri-


co/experimental (um autor) que apresenta todos os itens solicita-
dos nesse modelo, mas, excetuando-se os objetivos, os demais
itens não aparecem em sua ordem canônica. A ordem estabelecida
é a seguinte: objetivos, resultados, conclusão, justificativa e meto-
dologia. Esse último item apresenta problemas de ordem informa-
cional, pois não existem técnicas de referentes, mas de referencia-
ção, as quais não são técnicas de coleta de dados. Além disso, em-
prega o termo categorias básicas, mas não explicita que categorias
serão consideradas. Essas limitações, talvez, sejam decorrentes de
o agente produtor estar ingressando no processo de construção do
conhecimento científico. Contudo, revelam a necessidade de nós,

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professores formadores, auxiliarmos nossos alunos no processo de


inserção no universo acadêmico-científico:

O presente artigo tem como objetivo analisar a Objetivos


emergência de uma sociedade global a partir de
algumas transformações no processo de globaliza-
ção. Nesse sentido, o presente artigo também pro-
cura identificar de que maneira o atual processo de
globalização pode estar colaborando para o estabe- Contextualiza-
lecimento de outra globalização, menos egoísta e ção do Tema
perniciosa. A partir da constatação dos problemas
planetários decorrentes da globalização egoísta e, Resultados
num segundo momento, da emergência dessa ou-
tra globalização, mais solidária, os resultados da Conclusão
pesquisa apuraram uma mudança concomitante
do ser humano, principalmente a partir de três
questões básicas: a defesa do meio-ambiente, a luta Justificativa
pela Democracia e a efetiva aplicação dos Direitos
Humanos no planeta. Como consequência dos Metodologia
resultados apresentados, o presente estudo consta-
tou a emergência de uma sociedade global solidá-
ria. O presente estudo se justifica pelas atuais limi-
tações do Estado moderno no tratamento dos pro-
blemas de dimensão planetária e, ao mesmo tem-
po, na identificação de processos alternativos em
evolução. O artigo foi desenvolvido com base no
método indutivo e foi operacionalizada pelas téc-
nicas do referente, categorias básicas e fichamento
[realces nossos] (REVISTA ELETRÔNICA DIREI-
TO E POLÍTICA – UNIVALE).

Exemplo 14: Resumo 02 Revista Eletrônica Direito e Política – UNIVALE

O terceiro caso constatado, o do resumo argumentativo,


exemplo 15 (dois autores), compõe-se de duas premissas construí-
das a partir de modalizações deônticas, que dão origem a um ter-
ceiro argumento, expresso, através de uma modalização pragmáti-
ca que ganha corpo a partir de uma modalização lógica, como
sendo uma dedução das premissas anteriores. Os três argumentos

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desencadeiam uma conclusão, que é colocada, de forma categórica,


através da modalização deôntica deve, como uma obrigação do
Supremo Tribunal Federal. A partir da conclusão, é expressa uma
consequência elaborada através de uma modalização pragmática,
possibilita. Essa forma de constituição revela a sobreposição do
domínio discursivo jurídico em relação ao domínio discursivo ci-
entífico. Essa priorização leva-nos ao seguinte questionamento:
Quais os traços delineadores do fazer científico no texto em análi-
se?

A ideia democrática de um Estado de Direito Am- Premissa 01


biental não pode ser limitada à soberania de cada
País. A soberania, por sua vez, não deve se tornar Premissa 02
um elemento do Estado que dificulte a proteção do Dedução
meio ambiente. A partir dessas premissas os prin-
cípios da solidariedade e da cooperação internaci- Conclusão
onal são chamados a fortalecer o direito funda-
mental ao meio ambiente sadio e equilibrado. Neste
contexto, deve o Supremo Tribunal Federal avan- Ponderação
çar na valorização dos tratados internacionais na
ordem jurídica interna que, em razão do seu cará-
ter supralegal, possibilitam à Jurisdição Constitu-
cional a edificação de um Estado Ambiental Coo-
perativo [realces nossos] (REVISTA ELETRÔNICA
DIREITO E POLÍTICA – UNIVALE).

Exemplo 15: Resumo 03 Revista Eletrônica Direito e Política – UNIVALE

Na área de Jornalismo, quanto às especificações das nor-


mas, essas se limitam a indicar a quantidade de linhas ou de pala-
vras que o resumo deve conter e a língua em que devem ser elabo-
rados. A Revista FAMECOS, da Faculdade de Comunicação Social,
do Programa de pós-graduação em comunicação social: mídia,
cultura e tecnologia, determina dez (10) linhas, tanto para o resu-
mo como para o abstract (dez – 10) e a Brazilian Journalism Research
– BJR estabelece a quantidade mínima e máxima de palavras (res-
pectivamente, 130 e 150).

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Na Revista FAMECOS, todos os resumos sondados são de


produção individual e apresentam estrutura, embora singular,
marcada por traços do modelo de revisão de literatura. Dois deles
foram construídos na forma impessoal e um na primeira pessoa do
singular. Apesar das especificidades de cada resumo, alguns ele-
mentos se repetem. São eles: a justificativa/contextualização do
tema e objetivos do trabalho, que aparecem em dois (02) resumos;
e os conceitos norteadores do trabalho, que apontam, direta ou
indiretamente, para o referencial teórico, que também ocorre em
dois textos. Quanto aos aspectos particulares, ou seja, aqueles que
não se repetem, podemos destacar: a explicitação da conclusão, a
evidenciação da hipótese de pesquisa e a indicação, explícita, do
referencial teórico-metodológico adotado. Ilustremos esse último
caso, que aparece em um resumo composto pela contextualização
do tema, indicação do objeto de estudo, explicitação do referencial
teórico-metodológico e esclarecimento dos objetivos do trabalho e,
ao contrário dos demais, constituído de trechos construídos em
tom apelativo, estabelecido pelas escolhas lexicais e pelas modali-
zações lógicas:

O Caso Eloá, de 13 a 17 de outubro de 2008, impac- Contextualiza-


tou o país. Foi um sequestro, com morte de uma ado- ção do Tema
lescente, que superou 100 horas de duração. Teve Objeto de Estu-
um final trágico. A sua representação, através dos do
discursos do Jornal da Record é o objeto de estudo
do presente ensaio. Para tanto, iremos disponibili- Referencial Teó-
zar alguns pressupostos da Semiologia, de Roland rico
Barthes, para compreendê-lo e explicá-lo em sua Objetivos
produção de sentido [realces e grifos nossos] (RE-
VISTA FAMECOS).

Exemplo 16: Resumo 01 da Revista FAMECOS

Constatamos, no exemplo 16, a mescla de dois domínios


discursivos, o jornalístico, que se revela nos três períodos iniciais
do resumo, que contextualizam o tema e, indiretamente, justificam
sua escolha; e o científico, que se expressa nos demais períodos,
que trazem aspectos bem característicos desse domínio, o objeto de

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estudo (a representação do Caso Eloá), o corpus de análise (discursos


do Jornal da Record), o enfoque teórico (a Semiologia, de Roland
Barthes) e os objetivos do trabalho (compreender e explicar a pro-
dução de sentidos dos discursos).
O terceiro e último exemplar da Revista FAMECOS anali-
sado, exemplo 17, a seguir, descreve a organização do texto; tece
considerações quanto à relação entre Jornalismo e Histórica; apre-
senta aspectos de ordem analítica, destacados como norteadores
das duas primeiras partes do artigo; e expõe um comentário referente
ao fato de o texto, originalmente ter sido apresentado em um concur-
so público para Professor Titular, no qual a autora foi aprovada:

Neste texto apresento, inicialmente, três cenários Organização


constitutivos das relações Jornalismo e História e Textual
que foram denominados, respectivamente, Jorna- +
lismo e História, História no Jornalismo e História Objetivos
do Jornalismo. Esses três movimentos constituem o Justificativa
cerne das trocas epistemológicas entre o campo
teórico do jornalismo e o campo teórico da história.
Ainda como parte do que chamamos História do Objeto de Estu-
Jornalismo, são analisados alguns cenários das do
transformações do jornalismo brasileiro na primeira
metade do século XX, constituindo, dessa forma,
um exercício de natureza metodológica para o de-
senvolvimento das premissas teóricas apresentadas Comentário
nas duas primeiras partes do artigo. Este texto,
originalmente, foi apresentado sob a forma de con-
ferência no concurso público para Professor Titular
de Jornalismo da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), realizado em dezembro de 2011, e
no qual fui aprovada [realces e grifos nossos] (RE-
VISTA FAMECOS).

Exemplo 17: Resumo 02 da Revista FAMECOS

O comentário, no final do resumo, evidencia, explicitamen-


te, a interferência de aspectos sociossubjetivos envolvidos no pro-
cesso de produção de texto, mas poderia ter sido apresentado em
nota de rodapé. Assim, cumpriria seu intuito, comprovar a valida-

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de do artigo, e não geraria a quebra do fluxo argumentativo refe-


rente ao conteúdo temático abordado.
Os resumos do periódico Brazilian Journalism Research, se
comparados aos do periódico anterior, apresentam uma organiza-
ção estrutural menos mutável quanto aos elementos constitutivos
e evitam afirmações categóricas, bem como o tom apelativo. Todos
delimitam os objetivos do trabalho, dois os expressam destacada-
mente no início do texto e um os expõe atrelados à síntese da es-
truturação textual, que, geralmente, aparece nos dois primeiros
períodos. As perguntas de pesquisa são mencionadas em um dos
resumos. Os resultados são explicitados em dois exemplares.
Quanto aos aspectos metodológicos, o corpus é apresentado em
dois trabalhos, os informantes em um e a natureza da pesquisa
também em um. A conclusão é expressa em dois dos três objetos
investigados. Essas averiguações apontam-nos para uma espécie
de mescla do modelo empírico/experimental e do modelo de revi-
são de literatura, na qual ora predomina o primeiro, recorrente em
um resumo, e ora o segundo, empregada em dois exemplos. No
exemplo 18, a seguir, parece predominar o modelo empíri-
co/experimental, contudo o modelo de ciência adotado é o inter-
pretativista, marcado, dentre outros aspectos, pelo uso de expres-
sões qualificadoras:

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O propósito deste artigo é discutir as configura- Objetivo


ções das redes de pesquisa em jornalismo. Discute- Objeto de Estu-
se a capilaridade da cultura visual e os reiterados do
debates em torno do estatuto epistemológico da
comunicação. Por que os jornais vêm investindo Problemas de
maciçamente nos recursos visuais, operando mu- Pesquisa
danças estruturais em sua fisionomia? Em nome de
quê essas mudanças gráfico-visuais se efetivam? Resultados
As confluências entre comunicação e visualidades
(no plural para dar conta de sua imensa variedade e
implicações) são, ao que parece, um enfrentamento
inadiável em torno das contemporâneas mudanças
do jornalismo. A formação dessas redes repousa,
assim, numa complexidade variável e dinâmica, em
um ilimitado território de exploração do qual parti-
cipam, de modo importante, simultaneidades, Conclusão
ambiguidades, níveis de determinação e indeter-
minação. Conclui-se que um princípio teórico-
político necessita ser encontrado para que a tríade
visualidades, jornalismo, comunicação possa ser cote-
jada no âmbito das redes de pesquisa. [realces e
grifos nossos] (BRAZILIAN JOURNALISM RE-
SEARCH).

Exemplo 18: Resumo 01 da Brazilian Journalism Research

E, no exemplo 19, parece predominar o modelo de revisão


de literatura, que também adota um caráter interpretativista, mar-
cado, dentre outros traços, pela assunção da responsabilidade
enunciativa, expressa pela utilização da primeira pessoa do plural,
e pela utilização de expressões avaliativas:

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O quadro geral do artigo é a relação entre a im- Objeto de estu-


prensa regional, os cidadãos e a política democráti- do
ca. Nessa discussão, vamos tentar refletir sobre os Objetivos
limites e possibilidades do jornalismo público, utili- +
zando os conceitos de esfera pública, sociedade Marco Teórico
civil e mundo da vida, que parecem ser úteis ferra-
mentas teóricas para superar a falta de consistência Organização
teórica do jornalismo cívico. Na segunda parte do Estrutural
artigo, apresentamos alguns resultados do projeto Corpus de Análi-
“Agenda dos Cidadãos” desenvolvido por uma se
rede de pesquisa liderada pela Universidade da
Beira Interior focando jornais regionais espalhados
por todo o território português. Esta pesquisa cen- Recomendações
tra-se na identificação de práticas de enquadramen-
to e rotinas noticiosas. Além disso, defendemos o
aprofundamento desta rede de pesquisa com a
busca de novos métodos para aumentar a presença
de cidadãos comuns no jornalismo, a qual será
melhorada com a criação do observatório de media
dirigido à imprensa regional. [realces e grifos nos-
sos] (BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH).

Exemplo 19: Resumo 02 da Brazilian Journalism Research

Frente aos exemplos analisados, constatamos que todas as


áreas de Ciências Sociais Aplicadas investigadas (Arquitetura, Di-
reito e Jornalismo), assumem uma postura interpretativa quanto
ao fazer científico, caraterizada pela predominância do tom cona-
tivo, construído, principalmente, por modalizações deônticas e
pragmática, mas também lógicas e apreciativas, bem como do tom
valorativo, expresso por expressões qualificadoras, quantificado-
ras e intensificadoras. Entretanto, em alguns resumos da área de
Direito e de Jornalismo parece não existir distinção entre os limites
que separam esses domínios discursivos do domínio científico, ou
seja, a construção do conhecimento jurídico ou do conhecimento
jornalístico parece não diferenciar-se da construção do conheci-
mento científico sobre o conhecimento jurídico ou sobre o conhe-
cimento jornalístico. A partir dessa postura, adotam, predominan-
temente, o modelo de resumo de revisão de literatura.

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2.3 Fazer científico em Ciências Humanas

Em relação à área de Educação, a Revista Educação em


Questão, além de indicar o idioma em que deve ser redigido (por-
tuguês ou espanhol) e a quantidade de linhas (10) ou palavras (130)
que deve conter, destaca os elementos que necessariamente o ele-
mento pré-textual em análise deve apresentar (objetivo, referencial
teórico e/ou procedimento metodológico e resultados), colocando-os co-
mo construtores da consistência do resumo, ressaltando que se
trata de um aspecto no qual reside a apreciação do artigo. E a Revista
Contexto e Educação explicita apenas a obrigatoriedade da apre-
sentação do resumo e a quantidade mínima (100) e máxima (200)
de palavras que precisam conter.
No que diz respeito ao cumprimento das orientações esta-
belecidas pelo primeiro periódico, constatamos que os três resu-
mos perscrutados (um escrito individualmente, de forma impesso-
al, e dois em dupla, na primeira pessoa do plural) informam o (s)
objetivo (s) do trabalho. Dois destacam os pressupostos teórico-
metodológicos e procedimentos metodológicos, enquanto o outro
apenas esse último aspecto. Dois trazem os resultados da pesquisa
e um não. No exemplo 20, construído por dois autores, a seguir,
encontramos algumas informações peculiares: uma citação indire-
ta pautada em Marc Bloch (2001); a indicação da relevância do
estudo, apresentada a partir de uma modalização pragmática, que
se origina de outra modalização pragmática e a explicitação da
importância do tema para os pesquisadores, ressaltada por uma
modalização apreciativa:

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Este artigo trata da importância da sensibilidade Contextualiza-


para a formação humana em Tomás de ção do Tema
Aquino, teólogo e filósofo italiano do século XIII. Objeto
Nosso objeto é composto pelas paixões da alma, de Estudo
consideradas pelo teólogo-filósofo na primeira Pressupostos
seção da segunda parte da Suma Teológica. Para o Teórico-
desenvolvimento de nossas reflexões, nos pauta- -Metodológicos
mos nos pressupostos teórico-metodológicos da Citação
História Social, principalmente por meio das for- Indireta
mulações de Marc Bloch (2001). De acordo com Conclusão
esse autor, o passado pode nos ensinar, por meio
dos estudos históricos, sobre a natureza do ho-
mem e da sociedade, servindo aos homens do
presente como fundamentos do agir. Nesse senti-
do, acreditamos que o estudo das obras de Tomás
de Aquino, na perspectiva da História da Educa-
ção, pode contribuir para pensarmos sobre as rela-
ções educativas, tema bastante caro para nós atu-
almente. [realces nossos] (REVISTA EDUCAÇÃO
EM QUESTÃO).

Exemplo 20: Resumo 01 da Revista Educação em Questão

Outro aspecto singular, considerando os elementos enume-


rados, é o acréscimo da contextualização/justificativa do tema,
elaboradas com o intuito de evidenciar o compromisso não apenas
profissional, mas também social das autoras no exemplo 21:

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No âmbito da formação de professores, tem sido Contextualiza-


discutida a importância de ações formativas que ção do Tema
tenham como foco a análise de necessidades na
formação docente. Preocupadas com essas questões Justificativa
e com o insucesso na alfabetização de crianças da Tipo de Pesqui-
escola pública, realizamos uma pesquisa-ação que sa
teve como objetivo investigar/intervir nas necessi- Objetivo
dades formativas de professores do Ensino Funda- Objeto de Estu-
mental da escola pública, no âmbito das dificulda- do
des ortográficas dos seus alunos, construindo com
esses professores conhecimentos sobre o processo Local da Pesqui-
de ensinar/aprender ortografia. Desenvolvemos o sa
estudo numa escola municipal de Ensino Funda- Participantes
mental I, com sete professoras e uma vice-diretora. da Pesquisa
Os principais resultados apontaram que a reflexão Resultados
das docentes sobre as suas necessidades formativas
contribuiu para (trans)formação de suas concepções
e práticas relacionadas ao ensino da ortografia,
mesmo diante de dificuldades encontradas na prá-
tica pedagógica [realces nossos] (REVISTA EDU-
CAÇÃO EM QUESTÃO).

Exemplo 21: Resumo 02 da Revista Educação em Questão

Quanto aos resumos da Revista Contexto e Educação, todos


eles, assim como os da Revista Educação em Questão, comportam
uma organização estrutural pautada, predominantemente, no mo-
delo de revisão de literatura e revelam uma concepção de ciência
inspirada no paradigma interpretativista. O primeiro exemplar, de
elaboração individual e estilo impessoal, contém apenas contex-
tualização/justificativa do tema, considerando os âmbitos teórico e
social (O tema da qualidade no âmbito educacional não é totalmente no-
vo [...] a concepção de qualidade é determinante na elaboração e institui-
ção de políticas públicas para o setor educacional) e descrição da orga-
nização do texto atrelada aos objetivos do trabalho (O texto discute
o desenvolvimento da concepção de qualidade social da educação [...] e
aponta os principais documentos que abordam a questão. Ainda, pro-
põe indicadores que poderão servir de suporte teórico para a identifica-
ção de políticas educativas [...]).

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O segundo, produzido por dois autores, compõe-se da de-


signação da natureza da pesquisa (estudo bibliográfico); da enume-
ração dos objetivos atrelando-os às questões de pesquisa ([..] busca
compreender quais são os diferentes grupos da elite identificáveis nos
estudos sobre a escolarização [...] e quais as estratégias têm sido aciona-
das pelas famílias para garantir o sucesso escolar dos filhos [...] Pers-
cruta possíveis respostas a essas questões [...]); e da anotação, a partir
de uma modalização pragmática, da contribuição do estudo teórico
(Sem a pretensão de findar a discussão, consideramos que esse exercício
teórico contribuiu para elucidar conceitos e estabelecer as relações
necessárias para compreender [...]) relacionando-a, indiretamente
aos resultados ([...] compreender que há diferentes grupos de elite, que
possuem peculiaridades específicas, mas que se caracterizam pela cons-
ciência de si e pelo reconhecimento dos outros [...] e que as estratégias
escolares são resultantes de habitus determinados [...]).
O terceiro e último resumo, de autoria individual, formula-
se a partir da distinção da espécie do trabalho (recorte de relatório de
pesquisa), da descrição dos pontos centrais do trabalho e da ênfase
às oportunidades e aos convites oferecidos pelas concepções emer-
gentes, colocando-as com um desafio, utilizando-se, para tanto, de
modalizações apreciativas e de argumentos emocionais:

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Este trabalho, recorte de relatório de pesquisa, é Natureza do


uma reflexão sobre a necessidade e possibilidades Trabalho
de reconhecimento da diversidade para realizar o Objetivo
sonho da inclusão. Especificamente, a reflexão Resultados
coloca em evidência o potencial de concepções Conceitos
como indeterminação, complementaridade, bioci- Adotados
ências e biopoder como contribuições auxiliadoras
na criação de uma proposta educacional para am- Conclusão
pliar a formação de mentalidades de reconheci-
mento da diversidade. Essas e outras concepções
emergentes, no seio das mais diferentes áreas do
conhecimento, apresentam-se como oportunidades Ponderação
para olhares mais atentos sobre nós seres humanos e
também convites para sairmos do isolamento para
exigir a vivência da proximidade e do acolhimen-
to. Um desafio, difícil e complexo, que tem a tarefa
exigente de cultivar o desejo de aceitar o diferente,
de acolher o diferente, de cuidar do diferente e de
ter compaixão [realces nossos] (REVISTA CON-
TEXTO E EDUCAÇÃO).

Exemplo 22: Resumo 03 da Revista Educação em Questão

No que concerne à área de Filosofia, o periódico Cognitio:


Revista de Filosofia recomenda apenas que o resumo seja elabora-
do na mesma língua em que o texto for redigido e que não ultra-
passe 250 palavras. O periódico Principia: Revista Internacional de
Epistemologia ressalta que “Os manuscritos devem incluir também
um abstract em inglês, que não exceda 150 palavras” e lembra, de mo-
do apelativo, que o (s) autor (es) “Por favor, inclua (m) um resumo”.
Qual seria a razão desse pedido? A ausência recorrente desse ele-
mento pré-textual nos artigos submetidos à análise?
Os resumos da Cognitio, todos de produção individual, um
construído na primeira pessoa do singular e dois na forma impes-
soal, centram-se na sintetização dos pontos que serão abordados
ao longo do texto, constituindo-se, do ponto de vista estrutural,
como resumos de revisão de literatura e, do ponto de vista do fa-
zer científico, como de orientação interpretativista. No primeiro
exemplar, essa síntese revela-se a partir da especificação do pri-

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meiro e principal objetivo do texto (“Neste artigo, eu examino o slo-


gan tentativa e erro como explicação para o conhecimento científico,
especialmente na forma do método hipotético-dedutivo”), da discrimina-
ção da conclusão (“O slogan tentativa e erro é demasiado vago e im-
plausível como explicação do conhecimento científico”) e da exposição
do segundo objetivo (“Conexamente, eu questiono a desatenção em
relação à relevância do contexto de descoberta para a epistemologia”).
No segundo, através da enumeração dos objetivos, atrelan-
do-a ao referencial teórico-metodológico adotado e aos conceitos a
serem adotados (“O presente artigo objetiva desenvolver as teses
básicas de constituição de uma teoria social a partir da obra de Robert
Brandom, expondo tal percurso pelo esclarecimento de termos como:
inferência semântica, expressivismo e pragmática normativa”), aos pa-
râmetros de análise (“Será tematizado como uma nova compreensão
do conceito de inferência material, no contexto de uma semântica de bases
pragmáticas, pode ser razoável para propor uma justificação das práti-
cas sociais”) e às metas pretendidas, bem como às implicações des-
sas, utilizando-se, para isso, de modalizações pragmáticas (“Ao
final, espera-se propor as bases de uma teoria lógica da realidade social e
demonstrar a importância do pragmatismo e do seu potencial de diagno-
se que, com base numa semântica inferencial, torna-se capaz de des-
crever, articular e explicitar compromissos e responsabilidade dos ato-
res sociais”).
As modalizações pragmáticas também são empregadas no
terceiro e último exemplo, no qual encontramos ainda uma moda-
lização apreciativa e a seguinte organização estrutural: objetivo,
acompanhado do referencial teórico-metodológico e ressaltado
como se estivesse respondendo uma pergunta; parâmetros de aná-
lise; e conclusão:

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O objetivo é discutir a noção de performativo intro- Objetivos


duzida pela Teoria dos Atos de Fala como central +
para a formulação de uma concepção pragmática de Organização
linguagem, uma vez que enfatiza sobretudo a inter- Textual
pretação da linguagem como ação. Essa posição Marco Teórico
será contrastada com o contextualismo, procurando Resultados
mostrar que permite ir além deste na análise do uso
da linguagem como realização de atos de fala em
contextos específicos, de acordo com determinadas Conclusão
condições e produzindo determinados efeitos e
consequências. O conceito de performativo permite
captar, precisamente, tanto as condições de possibi-
lidade de realização dos atos quanto seus efeitos e
consequências [realces nossos] (COGNITIO: REVIS-
TA DE FILOSOFIA).

Exemplo 23: Resumo 03 da Cognitio: Revista de Filosofia

Os resumos da Principia apresentam as mesmas caracterís-


ticas dos examinados no periódico anterior, organização centrada
no modelo de resumo de revisão de literatura e concepção de ciên-
cia pautada na perspectiva interpretativista. O primeiro resumo,
escrito por dois autores, na primeira pessoa do plural, contém
apenas dois itens, a contextualização do tema circunscrita por dis-
cussões teóricas e marcada por modalizações apreciativas e o obje-
tivo central do artigo:

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A ideia intuitivamente plausível de que pelo menos Contextualiza-


alguns de nossos estados mentais teriam aspectos ção do Tema
fenomenais qualitativos aos quais nós teríamos um
acesso cognitivo privilegiado é considerada por
muitos filósofos como incompatível com a ontolo-
gia fisicista. Alguns defensores radicais do fisicismo
preferem simplesmente negar a existência de aspec-
tos qualitativos, ao passo que outros materialistas
procuram reinterpretar a cognição do caráter feno-
menal da nossa experiência do mundo como a Objetivos
aquisição de uma habilidade, isto é, como uma
forma de know-how, em oposição à aquisição de
informação (know-that). O presente trabalho expõe
e examina criticamente algumas tentativas recentes
de compatibilização da natureza sui generis da
apreensão cognitiva do caráter fenomenal da nossa
experiência com a tese materialista de que o conte-
údo proposicional dessa cognição é constituído
exclusivamente por fatos físicos. [realces nossos]
(PRINCIPIA: REVISTA INTERNACIONAL DE
EPISTEMOLOGIA).

Exemplo 24: Resumo 01 da Principia:


Revista Internacional de Epistemologia

O segundo descreve a organização estrutural do trabalho


evidenciando: objetivos (“Neste artigo, analisamos a relação entre a
atribuição de conhecimento a um agente humano em dois tipos de situa-
ções [...]”); metodologia de análise (“Nossa discussão parte de uma
distinção que fazemos entre hipóteses descritivas e explicativas”); ideias
defendidas (“Após estabelecer a relação entre as noções de regra e de
crença, procuramos sustentar a ideia de que há precedência das mo-
dificações de comportamento [...] Discutimos ainda se pode haver cren-
ças que não acarretam modificações de comportamento, defendendo
que em determinadas condições [..] devemos atribuir a elas também cren-
ças desse tipo”); e conclusão (“Tendo em conta tais pontos, procuramos
retratar a epistemologia como uma teoria dos processos de investigação
envolvidos na ação humana”).

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O terceiro apresenta a hipótese defendida, que traz consigo,


num processo de imbricação, o referencial teórico adotado, a expli-
citação de alguns conceitos e a conclusão e se utiliza, predominan-
temente, de modalizações pragmáticas, bastante recorrentes nos
resumos das Ciências Humanas abordadas:

Este artigo defende a hipótese de que Ernst Mach Hipótese


(1838-1916) recorreu ao naturalismo (termo que ele Referencial
não usou) — atitude derivada da sua aceitação da Teórico
teoria da evolução de Darwin — como arma contra Resultados
a metafísica (aqui compreendida como uma atitude Explicitação de
em favor da busca por fundamentação última, fixa e Conceitos
definitiva), já que procuraria estabelecer critérios de Conclusão
avaliação, incluindo os relativos à escolha de teorias
científicas, efetivamente capazes de serem usados
pelos seres humanos [realces nossos] (PRINCIPIA:
REVISTA INTERNACIONAL DE EPISTEMOLO-
GIA).

Exemplo 25: Resumo 03 da Principia:


Revista Internacional de Epistemologia

Na área de Psicologia, os dois periódicos investigados, a


Revista Estudos de Psicologia e a Gerais: Revista Interinstitucional
de Psicologia, embora remetam os autores para o Publication Ma-
nual da American Psychological Association (APA) e para os Manuais
de Normalização de Trabalhos Científicos da Biblioteca Virtual em
Saúde, indicam somente as línguas em que o resumo deve ser ela-
borado (Português e Inglês) e a quantidade de palavras que, depen-
dendo do tipo de trabalho a ser apresentado, deve conter. A pri-
meira determina o mínimo de 100 e máximo de 150 palavras no caso de
relatos de pesquisa, estudos teóricos e revisões críticas; e o mínimo de 50
e o máximo de 100 palavras, no caso de relatos de experiência profis-
sional e notas técnicas. A segunda estipula apenas o máximo de
palavras 150 para relatos de pesquisa e estudos teóricos, ou 100 palavras
para relatos de experiência, notas técnicas e resenhas.
Os três resumos da Revista Estudos de Psicologia, embora
contenham itens comuns provenientes da estrutural canônica, pos-

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suem composição particular, demonstrando uma concepção de


ciência interpretativista com traços positivistas e uma concepção
de resumo veiculada ao tipo de pesquisa empreendido e aos obje-
tivos pretendidos. O primeiro resumo, que possui três autores e
mescla a forma impessoal e a primeira pessoa do plural, priori-
zando a primeira, constitui-se de contextualização do tema (A edu-
cação em/para os Direitos Humanos demanda a discussão do papel da
escola [...]. Essa formação [para a cidadania] deve considerar a neces-
sidade do ideal de democracia estar em todos os níveis do contexto escolar
[...]); aspectos metodológicos (Nesta pesquisa utilizamos o conheci-
mento adquirido por uma experiência de atuação em psicologia escolar em
uma instituição de Educação Infantil de Brasília [...]); objetivos da pes-
quisa (O objetivo foi discutir como o psicólogo escolar participava da
implementação da noção de democracia no cotidiano da escola e auxilia-
va a construção da coerência [...]) e conclusão (A análise dessa experi-
ência mostrou a importância da psicologia na construção de uma educa-
ção para a democracia que trabalhe junto aos educandos [...]).
O segundo, exemplo 26, elaborado, em estilo impessoal,
por dois autores, segue uma organização mais positivista e orde-
na-se de objetivo do estudo, metodologia (variáveis, local da pes-
quisa, amostra e procedimento de coleta) e resultados:

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O presente trabalho objetivou testar empiricamente Objetivo


um modelo teórico multinível de predição de de- Variáveis
sempenho individual no trabalho. As variáveis
antecedentes investigadas, isoladas ou em intera-
ção, corresponderam à idade, gênero, cargo, grau
de escolaridade, tempo de serviço e percepção de Local de Pesqui-
suporte à aprendizagem, medidas no nível indivi- sa
dual e de contexto, e satisfação no trabalho, de nível Composição da
individual. A pesquisa foi realizada em uma em- Amostra
presa pública, do ramo de pesquisas agropecuária e Forma de Coleta
atuação nacional. A amostra (N = 808) contou com
funcionários distribuídos em 45 unidades centrali- Resultados
zadas e descentralizadas da empresa pelo Brasil. A
coleta de dados foi realizada à distância, via e-mail.
Os resultados multiníveis corroboraram o modelo
teórico de pesquisa hipotetizado e evidenciaram
que a variância de desempenho foi explicada por
distintos preditores de nível individual e de contex-
to, isoladamente ou em interação. [realces nossos]
(REVISTA ESTUDOS DE PSICOLOGIA).

Exemplo 26: Resumo 02 da Revista Estudos de Psicologia

O terceiro, que também contém dois autores e estilo impes-


soal, organiza-se em objetivo, contextualização do problema, mé-
todos, resultado e observação. Ilustremos esse último resumo, que
apresenta uma organização estrutural menos tradicional:

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Este artigo visa descrever a intervenção com uma Objetivo


criança de 7 anos de idade com problemas alimen- Participante da
tares: Pedro recusava-se a comer alimentos sólidos Pesquisa
desde bebê. A intervenção baseou-se nos princí- Objeto de
pios cognitivo-comportamentais, incluindo treino Estudo
parental e exposição gradual aos alimentos evita- Referencial
dos, seguida de reforço positivo. Contudo, na fase Teórico-
final, seguiu-se uma orientação narrativa, no senti- -Metodológico
do de promover a consolidação da mudança, por Resultados
meio da elaboração de resultados únicos e valida- Comentário
ção social da mudança. O comportamento alimen-
tar de Pedro melhorou ao longo das 13 sessões.
Vale destacar que os ganhos se mantiveram até a
última consulta de follow-up que aconteceu 6 meses
depois da finalização [realces nossos] (REVISTA
ESTUDOS DE PSICOLOGIA).

Exemplo 27: Resumo 03 da Revista Estudos de Psicologia

Dos três resumos da Gerais: Revista Interinstitucional de


Psicologia – todos elaborados por apenas dois autores, dois de
maneira impessoal e um na primeira pessoa do plural – dois tam-
bém retomam itens previstos no modelo estrutural canônico posi-
tivista, mas apresentando formas de organização diversa. O pri-
meiro explicita os objetivos do artigo, indica o referencial teórico
adotado – aspecto pouco comum nos resumos de Psicologia estu-
dados –, destaca o método de investigação e destaca a conclusão
da pesquisa. O segundo destaca, de maneira sintética, a contextua-
lização do tema, o objetivo do trabalho, o tipo de pesquisa e local
de realização – esses dois aspectos referentes à metodologia – e a
expectativa traçada. Vejamos esse último caso:

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O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é Contextualiza-


concretizado nos Centros de Referência da Assis- ção do Tema
tência Social (CRAS), espaços públicos estatais que
ofertam serviços de Proteção Social Básica de cará- Objetivos
ter preventivo. O objetivo deste trabalho é refletir Tipo de Pesqui-
sobre a atuação do psicólogo no CRAS/SUAS a sa
partir da experiência de campo em dois municípios Local da Pesqui-
de pequeno porte de Minas Gerais/Brasil. Espera- sa
se promover uma reflexão sobre a inserção de tal
profissional nesse novo contexto [realces nossos]
(GERAIS: REVISTA INTERINSTITUCIONAL DE
PSICOLOGIA)

Exemplo 28: Resumo 02 da Gerais:


Revista Interinstitucional de Psicologia

Apenas um foge ao modelo de resumo empíri-


co/experimental e aproxima-se do modelo de revisão de literatura,
constituindo-se de objetivo e de descrição da organização estrutu-
ral do trabalho, atrelando-a ao referencial teórico adotado:

Neste artigo abordaremos como S. Freud, ao se Objetivo Geral


encarregar da clínica da histeria, se vê levado a
abandonar o realismo psicológico de suas primei- Organização
ras elaborações. Para tal, abordaremos em primeiro Textual
lugar o conceito de realismo psicológico a partir da +
obra do epistemólogo Robert Blanché. Em seguida Objetivos
faremos um breve percurso na obra de Freud para Específicos
apontar como ele abandona as concepções realistas
em prol de uma busca da origem dos problemas Referencial
psíquicos da histeria no conceito de fantasma. Por Teórico
fim especificaremos a partir de duas passagens do
seminário de Lacan sobre a relação de objeto a
importância do fantasma para pensarmos as tenta-
tivas atuais de reduzir a clínica psicanalítica a no-
vas formas de realismo psicológico [realces nossos]
(GERAIS: REVISTA INTERINSTITUCIONAL DE
PSICOLOGIA).

Exemplo 29: Resumo 03 da Gerais:


Revista Interinstitucional de Psicologia

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Com base nos dados analisados, verificamos que as áreas


de Ciências Humanas contempladas (Educação, Filosofia e Psico-
logia), sobretudo, as áreas de Educação e Filosofia, priorizam o
fazer científico de cunho interpretativista, marcado, nos textos
analisados, dentre outros aspectos, pela primeira pessoa, tanto do
plural como do singular, que atribui ao (s) autor (es) a responsabi-
lidade pelo que é enunciado; pelas modalizações pragmáticas, uti-
lizadas com o intuito de descrever os passos seguidos para conse-
cução da pesquisa e/ou de enumerar os objetivos pretendidos; e
pelas modalizações lógicas e expressões avaliativas, recursos lin-
guístico-discursivos utilizados para persuadir o leitor a concordar
com os argumentos e/ou conclusões apresentados. Em Educação e
em Psicologia, o modelo de resumo adotado mescla informações
do modelo de revisão de literatura e do modelo empíri-
co/experimental, dando prioridade a essa segunda orientação e
acrescentando o referencial teórico-metodológico, como recomen-
da Severino (2000). E, em Filosofia, prevalece o modelo de revisão
de literatura, embora nele também encontremos a exposição do
referencial teórico-metodológico.

2.4 Fazer científico em Letras, Linguística e Artes

Na área de Linguística, quanto às orientações dos periódi-


cos, encontramos duas posturas, uma menos e outra mais criterio-
sa. Enquadra-se, no primeiro caso, a Revista Brasileira de Linguís-
tica Aplicada – RBLA, que aponta a quantidade máxima de linhas
(10) que o resumo deve conter e as línguas (português e inglês) em
que deve ser elaborado. E, no segundo, a Revista de Estudos Lin-
guísticos Veredas, que, além de asseverar que O resumo deve,
obrigatoriamente, conter os seguintes elementos: objetivo do estu-
do, aporte teórico/metodologia adotada, síntese dos resultados,
discrimina os seguintes pormenores: localização da palavra resu-
mo (na terceira linha abaixo do nome do autor), o tipo de letra (caixa
alta), a pontuação que deve procedê-la (dois pontos), a forma de
apresentação (parágrafo único, espaço simples, justificado, Fonte: Times
New Roman, corpo 10) e a quantidade máxima de linhas (sete). Em-
bora os elementos destacados nesse periódico não constem no an-

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terior, são contemplados nos resumos das duas revistas. Eviden-


cia-se, nos dados dessa área, ao contrário do que acontece na mai-
oria das áreas averiguadas, a retomada dos pressupostos teóricos
adotados, ressaltados, de forma direta, em vários momentos do
texto, e a mescla entre as informações constitutivas do plano geral
do resumo.
No que se refere aos resumos da RBLA, o primeiro exem-
plar, de autoria individual e estilo impessoal, compõe-se de objeti-
vo central, que delineia o problema de pesquisa, que por sua vez,
especifica o corpus de análise (O presente artigo tem por objetivo
central analisar como, na área de Linguística, os(as) autores(as) de
exemplares do gênero textual artigo acadêmico constroem significados
interpessoais de posicionamento avaliativo ao produzirem seus textos) e
de objetivos específicos, que informam o objeto de estudo, o refe-
rencial teórico e as categorias de análise e apresentam detalhes do
corpus considerados (“Como delimitação desse objetivo central, esta
pesquisa busca mapear e analisar os adjuntos modais (HALLIDAY,
1994) realizados por advérbios simples [...] na produção de exemplares
do gênero artigo acadêmico na área de Linguística e, ainda, verificar
comparativamente como esses adjuntos modais se apresentam em exem-
plares de artigos experimentais, artigos teóricos e artigos de revisão de
literatura”).
O segundo, também de autoria individual e estilo impesso-
al, estrutura-se em: contextualização do tema, que explicita o con-
ceito adotado (comunicação alternativa e/ou ampliada) e destaca suas
vantagens e limitações com o intuito de justificar a escolha do te-
ma; objetivo de pesquisa; orientação teórica adotada; e resultados.
Aspectos construídos, a partir de modalizações pragmáticas, que
são predominantes, e modalizações lógicas:

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A comunicação denominada alternativa e / ou Contextualiza-


ampliada compõe-se de recursos de tecnologia ção do Tema
assistiva que possibilitam expressão ou ampliação
da capacidade comunicativa a pessoas que apre-
sentam comprometimento significativo na lingua- Justificativa
gem verbal. Entretanto, a comunicação estabeleci- Objetivo
da nem sempre transcende o responder funcional
sob limitado repertório. O artigo discorre sobre Fundamentação
linguagem e sujeito da enunciação, suas relações Teórica
com o desenvolvimento da autoria e implicações
na constituição subjetiva de sujeitos não falantes. Resultados
Fundamenta-se em princípios das abordagens
enunciativo-discursiva, de Bakhtin, e histórico-
cultural do desenvolvimento humano. Salienta-se
o papel e a responsabilidade do mediador, seja
quando, por sua interlocução, favorece o ampliar
da comunicação significativa e autora, seja, con-
trariamente, quando restringe essas possibilida-
des. [realces nossos] (REVISTA BRASILEIRA DE
LINGUÍSTICA APLICADA - RBLA).

Exemplo 30: Resumo 02 da


Revista Brasileira de Linguística Aplicada – RBLA

O terceiro e último, elaborado individualmente e no estilo


impessoal, formula-se de: contextualização e justificativa do tema,
tendo em vista o estado da arte, de esclarecimentos teórico-
metodológicos e de conclusão e utiliza-se de modalizações lógicas,
pragmáticas e expressões apreciativas, que, em sua maioria, são
apresentadas entre aspas, sinalizando que se emanam dos partici-
pantes da pesquisa, e não do agente produtor:

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São inúmeros os trabalhos sobre o ensino- Contextualiza-


aprendizagem da escrita no ensino fundamental e ção do Tema
médio. No entanto, a escrita acadêmica ainda não Justificativa
tem recebido a merecida atenção, no Brasil. Serão Objetivo
analisados aqui alguns elementos próprios das Objeto de
condições de produção de escrita de alunos de um Estudo
curso de graduação. A concepção bakhtiniana, Referencial
para a qual o domínio de um gênero é um compor- Teórico-
tamento social, articulada com uma abordagem -Metodológico
etnográfica, delineia o referencial teórico-
metodológico principal. Abordar o texto etnografi- Conclusão
camente significa tratá-lo como um traço ou um
elemento de uma situação social, que inclui igual-
mente os valores, regras, significados e atitudes,
assim como modelos de comportamento dos parti-
cipantes da interação. Conclui-se que o envolvi-
mento da universidade com o ensino-
aprendizagem da escrita acadêmica demanda pes-
quisas sobre habilidades e competências linguísti-
cas e também sobre fundamentos e estratégias que
permitam refazer princípios e crenças que têm
levado nossos alunos a uma relação “tímida”, “defi-
ciente”, “inadequada” e tensa com as práticas acadê-
micas letradas [realces nossos] (REVISTA BRASI-
LEIRA DE LINGUÍSTICA APLICADA - RBLA).

Exemplo 31: Resumo 03 da


Revista Brasileira de Linguística Aplicada - RBLA

Quantos aos resumos da Veredas, o primeiro, de produção


individual e de estilo, predominantemente, impessoal, mas com
uma marca de primeira pessoal do singular (Objetivo) é composto
por objetivo (Este artigo pretende percorrer um breve percurso (mas
não o único) dos estudos da Linguística formal até a Análise do Discurso
(Pêcheux)), percurso teórico (Objetivo os caminhos teóricos que levam
ao quadro epistemológico da Análise do Discurso, passando: i) pela Lin-
guística enquanto ciência da linguagem, ii) por Benveniste e sua teoria da
enunciação, iii) por Lacan e sua releitura de Freud sobre a subjetividade,
para chegar ao lugar da Análise do Discurso) e conclusão, que é ex-

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pressa em forma de resultado a partir de modalizações lógicas


(Como resultado desse percurso, pode-se afirmar que a Análise do Dis-
curso, bebendo de fontes epistemológicas variadas, se situa num lugar
de entremeio, ou seja, não simplesmente toma conceitos de outras
áreas, mas os ressignifica para a formação de seu quadro teórico).
O segundo, elaborado em dupla e em primeira pessoa do
plural, é constituído por: objetivo geral e, a partir desse, os objeti-
vos específicos, que expõem o enfoque das discussões, o corpus
investigado, o arcabouço teórico-metodológico – denominação empre-
gada no resumo – e o problema de pesquisa, que carrega abarca o
objeto de estudo:

A presente pesquisa objetiva problematizar a funci- Objetivos


onalidade de um tema de redação, tendo como en-
foque duas utilidades, a de averiguação da compe- Corpus de Aná-
tência escritora e também uma possível forma de lise
vigilância através da escrita. Para tal empreendi-
mento, utilizamos como corpus um tema de redação
do SARESP/2008 para 6ª série, no qual se utilizou o Referencial Teó-
gênero carta pessoal para motivar a interlocução das rico-
produções textuais. Como arcabouço teórico- -Metodológico
metodológico, recorremos a alguns pressupostos Problema de
foucaultianos em interface com a AD de linha fran- Pesquisa
cesa. Por meio de nossas análises, observamos como Objeto de Estu-
marcas discursivas do poder e da vigilância poderi- do
am estar presentes em um tema de redação, marcas
nem sempre perceptíveis pelos sujeitos. [realces
nossos] (REVISTA DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS
VEREDAS)

Exemplo 32: Resumo 02 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

O terceiro, produzido em dupla e na modalidade impesso-


al, é organizado em: objetivo, que situa o leitor quanto à natureza
da pesquisa, ao objetivo específico e ao objeto de estudo, resulta-
dos, respaldo teórico-metodológico – com indicação de autores e
obras –, e conclusão:

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Apresenta-se uma revisão dos conceitos de retex- Objetivos


tualização e reescrita, estabelecendo relações entre Natureza da
esses termos e a atividade profissional de editor e Pesquisa
revisor. Além destas, outras atividades surgem em Objeto de Estu-
um cenário complexo em que há certa “agregação” do
(KRESS; VAN LEUWEEN, 2001) na estrutura das Contextualiza-
atividades dos profissionais do texto. Com base, ção do Tema
principalmente, em conceitualizações de Marcus- Referencial Teó-
chi (2001), Dell’Isola (2007), Matencio (2002; 2003) e rico-
em obras sobre produção editorial, são retomados -Metodológico
aspectos da reescrita e da retextualização que se
aproximam da revisão e da edição de textos. Con-
clui-se que a área de edição profissional tem inte- Conclusão
resses em comum com práticas de produção textu-
al no âmbito da educação. [realces nossos] (RE-
VISTA DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS VEREDAS)

Exemplo 33: Resumo 03 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

Na área de Literatura, as normas da Aletria: Revista de es-


tudos de Literatura e as da Boitatá: Revista do GT de Literatura
Oral e Popular da ANPOLL especificam somente as línguas em
que o resumo deve ser elaborado. A primeira determina a necessi-
dade de um resumo em português e outro em inglês, francês ou
espanhol e a segunda, de um na língua do texto e outro em espanhol,
francês ou inglês. Nos exemplos analisados, tanto na primeira como
na segunda revista, todos de produção individual, um traço recor-
rente é a indicação da obra contemplada e/ou de seu respectivo
autor, seguida de uma breve descrição do texto, geralmente, mar-
cada por modalizações apreciativas.
O primeiro resumo da Aletria destaca o objetivo do estudo,
utilizando uma modalização pragmática, o objeto de estudo, que é
qualificado a partir de uma modalização apreciativa (“Este estudo
tem por objetivo discutir as representações de esporte em Os Maias
(Eça de Queirós, 1888), um dos mais celebrados romances escritos em
língua portuguesa”) e os argumentos defendidos, empregando mo-
dalizações pragmáticas (“Argumentamos que os olhares do literato
podem nos auxiliar a compreender a presença da prática no quadro das

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tensões culturais existentes em Portugal nas décadas finais do século19,


inclusive no que se refere à relação do país com o ideário e imaginário da
modernidade.).
O segundo ressalta as obras analisadas, comenta como o
autor Manuel de Barros aborda o tema da pesquisa, recorrendo a
modalizações lógicas, e aponta os objetivos do trabalho, através de
modalizações pragmáticas, aliando-os aos aspectos abordados ao
longo do artigo e, a partir desses, destaca a importância das obras
contempladas, recorrendo a expressões avaliativas, que perpassam
todo o resumo, como também a uma modalização apreciativa:

Em Memórias inventadas, A infância (2003), A segun- Corpus de Análi-


da infância (2006) e A terceira infância (2008), Manoel se
de Barros (Cuiabá, MT, 1916) traz para a escrita Conclusão
memorialista aspectos formais inusitados e apresen-
ta uma fauna sui generis, composta por lesmas,
lacraias, sapos, entre outros animais que habitual-
mente fogem a uma valoração positiva do ponto
de vista estético. A exceção ficaria por conta dos Objetivos
pássaros, que se furtam ao padrão de apreciação
dos bichos já referidos. O presente trabalho busca,
de início, evidenciar a poesia do escritor como
espaço de inclusão do que muitas vezes é tomado
como repulsivo, evidenciando o sentido de meta-
morfose da arte, enquanto terreno da outridade;
em segundo lugar, interessa ver como a figura do
animal, em sua atuação no mundo natural, funcio-
na como suporte para a dicção metanarrativa que
impregna todo o relato, sendo, portanto, de suma
importância, uma vez que as Memórias situam-se
no domínio da poeisis. [realces nossos] (ALETRIA:
REVISTA DE ESTUDOS DE LITERATURA).

Exemplo 34: Resumo 02 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

O terceiro e último resumo enumeram os aspectos analisa-


dos, interligando-os à indicação da obra, ao conceito teórico esco-
lhido e aos resultados:

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Este trabalho analisa o romance CereusBloomsat Ni- Objetivos


ght, de ShaniMootoo, que narra a estória de perso- Objeto de
nagens de descendência indiana que imigraram para Estudo
o Caribe como mão de obra através de contratos de Resultados
trabalho. Partindo de teorizações sobre performance Referencial
de gênero, analisa a representação dessas persona- Teórico
gens cujas vivências, marcadas pela violência e pela Conclusão
exclusão, estão relacionadas não apenas a sua expe-
riência diaspórica, mas também a suas orientações
sexuais e à inadequação dos papéis de gênero às
quais estão submetidas [realces nossos] (ALETRIA:
REVISTA DE ESTUDOS DE LITERATURA).

Exemplo 35: Resumo 03 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

Com relação aos resumos da Boitatá, o primeiro formula-se


a partir da indicação da natureza da pesquisa (“O presente artigo é
uma abordagem sucinta sobre”), do objeto de estudo (“as relações entre
o romance experimental Catatau (1975) de Paulo Leminski e elementos de
oralidade que o estruturam”) do referencial teórico adotado (“valen-
do-se dos estudos de Mikhail Bakhtin e Walter Ong”).
O segundo centra-se na descrição e análise da obra investi-
gada, fundamentadas, predominantemente, em modalizações lógi-
cas e pragmáticas, que contém expressões apreciativas, com o in-
tuito de ressaltar o estilo de Manuel de Oliveira Paiva:

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Num episódio do extraordinário romance de Descrição e


Manuel de Oliveira Paiva, a personagem Calu Análise da
narra a Margarida a “História dos cinco mui- Obra
tos”, espécie de narrativa de exemplo e pro-
veito sobre um ex-namorado vingativo que
provoca a desgraça de uma jovem ao mentir
sobre a condição dela, sendo severamente cas-
tigado por Deus. No contexto do romance, Análise de
essa admoestação toma veios irônicos, uma Aspectos Lin-
vez que Calu será, junto com o marido Silvei- guístico-
ra, a alcoviteira dos amores furtivos de Mar- -Discursivos
garida e Secundino. A partir desse episódio,
notamos a presença de outras marcas de ora-
lidade, como letras de baiões e grafias que
sugerem tentativa de registro de oralidade ao
longo do texto. O contraste entre os escritos
(formal, por vezes rígido e frequentemente
ocultando segundas intenções) e o registro
que busca o oral (informal, ritmicamente se-
dutor e frequentemente veiculando valores
eufóricos) permeia o texto, mas o romance,
uma história de traições e de interesses, con-
tamina os significados “positivos” da tradição
oral, conferindo-lhe uma leitura permeada de
cínico pragmatismo. [grifos nossos] (BOITA-
TÁ: REVISTA DO GT DE LINGUAGEM
ORAL E POPULAR da ANPOLL).

Exemplo 36: Resumo 02 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

O terceiro na exposição de argumentos em defesa da litera-


tura indígena, que são reforçados por um discurso citado, lem-
brando-nos um artigo de opinião:

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Repensar a literatura brasileira, inserindo a produ- Contextualiza-


ção do índio no rol de textos canonizados, implica ção do Tema
não aceitar que, na verdade, o que se tem no Brasil
é nada mais que uma literatura lusófona. Ao enal- Objetivos
tecer a literatura indígena não se pretende dar um
valor apenas para compensar um sentimento de
dívida, mas de dar visibilidade a algo que existe há Recomendação
muito tempo, inclusive antes da chegada da escrita para Consecu-
ao território do que hoje é chamado Brasil2. O exer- ção dos Objeti-
cício que se há de fazer é para a valorização da vos
literatura indígena, seja ela oral ou escrita, em lín-
gua autóctone ou em língua portuguesa, como Conclusão
objetos estéticos e culturais singulares, percebendo
o que essa literatura tem de específica e de univer- Argumento de
sal ao mesmo tempo. Também os indígenas con- Autoridade
cordam que se a escrita for imprescindível ela deve
ser um recurso, contanto que eles obtenham um
espaço: “o índio fala, o índio pensa. Então, vamos
passar na escrita, pra que a sociedade entenda
melhor o povo indígena3” [“Fala do índio guarani
Olivio Jekupé citada em GOLDEMBERG, Débo-
rah& CUNHA, Rubelise da] [grifos nossos] (BOI-
TATÁ: REVISTA DO GT DE LINGUAGEM ORAL
E POPULAR da ANPOLL).

Exemplo 37: Resumo 03 da Revista de Estudos Linguísticos Veredas

As áreas de Letras e de Literatura assumem o fazer científi-


co de cunho interpretativista. Em Letras, a estrutura do resumo
mescla o modelo de revisão de literatura e o modelo empíri-
co/experimental e, em Literatura, centra-se, exclusivamente, no
primeiro modelo. As duas áreas fazem uso de modalizações
pragmáticas, para apresentar os objetivos e/ou procedimentos da
pesquisa; modalizações lógicas, para contextualizar e/ou justificar
o tema e explicitar as conclusões; modalizações deôntica, para de-
linear recomendações; e apreciativas, para evidenciar o valor das
obras literárias investigadas. As duas primeiras são mais recorren-
tes que as duas últimas. Nas duas áreas, a forma impessoal é uma
constante nos dados selecionados.

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Considerações finais

Considerando os dados averiguados, podemos afirmar


que, dentre as quatro grandes áreas estudadas (Ciências da Saúde;
Ciências Sociais Aplicadas; Ciências Humanas; Letras, Linguísticas
e Artes) apenas na primeira, mais particularmente na área de Me-
dicina, encontramos uma concepção de ciência pautada, predomi-
nantemente, no paradigma positivista, caracterizado, nos resumos
observados, pelo modelo empírico/experimental de organização
estrutural, bem como pelo predomínio da linguagem técnico-
científica, delineada pelo uso excessivo de termos técnico-
científicos, pela objetividade e pela neutralidade, ausência de res-
ponsabilidade enunciativa.
Nas demais grandes áreas, temos o predomínio, quase que
exclusivo, da concepção interpretativista de ciência, demarcada
por uma menor densidade de termos técnico-científicos, pela obje-
tividade e por uma maior expressividade enunciativa, que, mesmo
mantendo a impessoalidade, revela-se através de manifestações
linguístico-discursivas de cunho avaliativo. Entretanto, o modelo
de resumo utilizado ora assume a organização do modelo empíri-
co/experimental, ora a do modelo de revisão de literatura.
Nas áreas de Direito e de Jornalismo, encontramos resumos
cuja constituição parece não perceber a diferença entre a constru-
ção do conhecimento jurídico ou do conhecimento jornalístico e a
construção do conhecimento científico sobre o conhecimento jurí-
dico ou sobre o conhecimento jornalístico. Levando-nos a questio-
nar, embora reconheçamos o caráter relativamente estável dos
gêneros textuais, quais os limites constitutivos das diferentes áreas
de construção do conhecimento, particularmente, do científico.

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCINICAS. NBR: 6022.


Informação e documentação - Artigo em publicação periódica científica
impressa – Apresentação. Rio de Janeiro: maio de 2003a.

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______. NBR: 6028. Informação e documentação - Resumo – Apresenta-


ção. Rio de Janeiro: novembro de 2003b.
______. NBR 14724:2011. Informação e documentação — Trabalhos aca-
dêmicos — Apresentação. Rio de Janeiro: 17 de março de 2011.
BRASIL. Marcos Referenciais do PISA: Letramento Científico. Brasília:
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), 2011.
Disponível em:
http://download.inep.gov.br/download/internacional/pisa/2010/letra
mento_cientifico.pdf
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos:
por um interacionismo sociodiscursivo. São Paulo: EDUC, 1999.
______. Atividade de linguagem, discurso e desenvolvimento humano.
Coleção ideias sobre linguagens (17). Campinas, SP: Mercado das Letras,
2006.
MACHADO, Ana Rachel, LOUSADA, Eliane e ABREU-TARDELLI, Lília
Santos. Resumo. Leitura e produção de textos técnicos e acadêmicos (1).
São Paulo: Parábola Editorial, 2004.
______. Planejar gêneros acadêmicos. Leitura e produção de textos técni-
cos e acadêmicos (3). São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
MEDEIROS, João Bosco. Redação científica: a prática de fichamentos,
resumos, resenhas. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2000 [1991].
MICHEL, Maria Helena. Metodologia e pesquisa científica em Ciências
Sociais. São Paulo: Atlas, 2005.
MOREIRA, Walter. Revisão de Literatura e Desenvolvimento Científico:
conceitos e estratégias para confecção. In: Janus. Ano 1, Nº 1. Lorena –
SP: 2º semestre de 2004.
MOTTA-ROTH, Désirée; HENDGES, Graciela Rabuske. Produção textual
na universidade. Estratégias de Ensino (20). São Paulo: Parábola Editori-
al, 2010.
MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos
de metodologia científica. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2003 [1985].
SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. Educação científica na perspectiva
de letramento como prática social: funções, princípios e desafios. Revista
Brasileira de Educação. Rio de Janeiro: ANPEd; Autores Associados, v.
12 n. 36 v. 12 n. 36 set./dez. 2007. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v12n36/a07v1236.pdf
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 21ª
ed. São Paulo: Cortez, 2000 [1941].
SWALES, John M. Genre analysis: English in academic and research
settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 83

APÊNDICE A

Quadro 01: Normas estabelecidas


para os resumos de artigos científicos

NORMAS
GRANDES ÁREAS REVIS- QUANTO À OR- QUANTO AO PLA-
ÁREAS TAS GANIZAÇÃO NO GERAL
ESTRUTURAL
Os resumos devem Os resumos devem ser
Revista de ser apresentados apresentados no forma-
Saúde no formato estrutu- to estruturado [...],
Pública – rado, com até 300 contendo os itens:
RSP palavras [...]. Exce- Objetivo, Métodos,
(Qualis tuam-se os ensaios Resultados e Conclu-
A2) teóricos e os artigos sões. Excetuam-se os
sobre metodologia ensaios teóricos e os
e técnicas usadas artigos sobre metodo-
em pesquisas, cujos logia e técnicas usadas
resumos são no em pesquisas, cujos
formato narrativo, resumos são no forma-
que, neste caso, to narrativo [...].
MEDICINA

terão limite de 150


palavras [grifos da
Revista].
CIÊNCIAS DA SAÚDE

Revista O Resu- O Resumo/Absctract


Brasileira mo/Abstract deve- deverá, obrigatoria-
de Ciên- rá, obrigatoriamen- mente, ser estrutura-
cias da te, ser estruturado do, isto é, ser subdivi-
Saúde – [...]. O Resu- dido nos seguintes
RBCS mo/Abstract deve itens descritos como
(Qualis B5) ser escrito em necessários para cada
espaço simples, cessão, como por
sem parágrafos, exemplo: Pesquisa:
citações bibliográ- Objetivo, Metodologia,
ficas ou notas e ter Resultados e Conclu-
entre 200 e 250 são, descritos, de
palavras. modo claro e objetivo
[...].
Imediatamente As informações rela-
após a página de tadas no resumo
título, todos os devem resumir a
Metabo-
NUTRIÇÃO

artigos, com exce- justificativa do estudo,


lism: ção de editoriais e os métodos, os princi-
Clinical comentários, de- pais resultados e sua
and Exper- vem incluir um interpretação ou
imental resumo estrutura- implicações, ou forne-
(Qualis do de até 250 cer um resumo sucinto
A2) palavras [...]. no caso de mini-

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comentários. O resu-
mo deve ser dividido
nas seguintes seções:
Objetivo, Materiais /
Métodos, Resultados,
Conclusões. O resumo
não deve incluir refe-
rências e abreviaturas
devem ser mantidas a
um mínimo. No ab-
strato é necessário
para comentários e
editoriais.
Nutrire: Preparação do Artigos originais:
Revista da Artigo [...] Resumo objetivo, métodos,
Sociedade estruturado: deve resultados e conclu-
Brasileira ter no máximo 250 sões (objective, me-
de Ali- palavras e não thods, results and
mentos e pode utilizar abre- conclusions); [...]
Nutrição viaturas e siglas; Artigos de revisão:
(Qualis B4) deve ser estrutura- objetivo, fonte de
do na forma de dados, síntese dos
seções [...] [grifos dados e conclusões
da Revista]. (objective, data source,
data synthesis and
conclusions) [grifos da
Revista].
Com exceção das
contribuições
enviadas às seções
Cadernos Resenha ou Cartas,
de Saúde todos os artigos
Pública submetidos em
(Qualis B1) português ou
espanhol deverão
ter resumo na
ODONTOLOGIA

língua principal e
em inglês. Os
artigos submetidos
em inglês deverão
vir acompanhados
de resumo em
português ou em
espanhol, além do
abstract em inglês.
O resumo pode ter
no máximo 1100
caracteres com
espaço [...].
Resumos: Artigos Resumos: Artigos
Revista de originais: com até originais: [...] contendo

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 85

Odonto- 250 palavras con- informação estrutura-


logia da tendo informação da, constituída de
Universi- estruturada [...]. Introdução (propósi-
dade Para outras catego- tos do estudo ou
Cidade de rias de artigos o investigação), Méto-
São Paulo formato dos resu- dos (material e méto-
(Qualis B4) mos deve ser o dos empregados),
narrativo com até Resultados (principais
250 palavras. O resultados com dados
Abstract deverá ser específicos) e Conclu-
incluído antes das sões (as mais impor-
Referências. Quan- tantes). Para outras
do o manuscrito categorias de artigos o
for escrito em formato dos resumos
espanhol, deve ser deve ser o narrativo
acrescentado re- [...].
sumo nesse idio-
ma. Dar preferên-
cia ao uso da ter-
ceira pessoa do
singular e do verbo
na voz ativa.
Revista Devem constar em
Brasileira arquivo e folha
de Estu- separados: a) Um
dos Urba- resumo em portu-
nos e guês e outro em
Regionais inglês, contendo
(Qualis entre 100 (cem) e
A2) 150 (cento e cin-
quenta) palavras
CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

[...].
ARQUITETURA

Os artigos científi-
Cidades cos devem ter
(Presiden- obrigatoriamente
te Pruden- um resumo de, no
te) mínimo, 100 pala-
(Qualis B1) vras e, no máximo,
150 palavras, em
português e inglês.
A critério do autor,
poderá ser enviado
um terceiro resumo
em francês, espa-
nhol ou alemão
[...].
Revista Os artigos deverão [...] resumo (Abstract)
DIREITO

Novos ser inéditos, [...] e em português e inglês


Estudos atender ao seguinte [...] ressaltando objeti-
Jurídicos conteúdo e nesta vos, metodologia e
(Qualis ordem [...] resumo síntese das considera-

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A2) (Abstract) em ções finais (máximo


português e inglês 150 palavras)
ou no idioma de
origem [...].
Em todos os artigos [...] um resumo in-
Revista submetidos deve formativo.
Eletrônica ser incluído um
Direito e resumo informati-
Política vo com o máximo
(Qualis B3) de 150 palavras e
espaço entre linhas
simples. [...] Im-
portante: Além de
versar o resumo no
idioma pátrio,
também se deve
apresenta-lo em
um dos seguintes
idiomas: espanhol,
inglês, italiano ou
alemão
Revista Cada proposta de
FAME- artigo deve incluir
COS: impreterivelmente
mídia, [...] resumo de até
cultura e dez (10) linhas em
tecnologia português; abstract
JORNALIS-MO

(Qualis de até dez (10)


A2) linhas em inglês
[...].
Revista Resumo com, no
Brazilian mínimo, 130 e, no
Journal- máximo, 150 pala-
ism Re- vras.
search –
BJR
(Qualis B1)
Revista O artigo INÉDITO A apreciação do artigo
Educação [...] deve constar de reside na consistência
em Ques- resumo e abstract, do resumo (apresen-
CIÊNCIAS HUMANAS

tão em torno de 10 tando, necessariamen-


(Qualis linhas ou 130 te, objetivo, referencial
EDUCAÇÃO

A2) palavras [...]. teórico e/ou procedi-


mento metodológico e
resultados).
Contexto O artigo deve
& Edu- conter obrigatori-
cação amente um resumo
(Qualis B3) contendo no míni-
mo 100 e no máxi-
mo 200 palavras

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[...].
Cognitio: Todo artigo deve
Revista de ser precedido por:
Filosofia [...] um resumo na
(Qualis B1) língua do texto,
que não deve
ultrapassar 250
FILOSOFIA palavras [...].
Principia: Por favor, inclua
Revista um resumo. [...] Os
In- manuscritos devem
ternacio- incluir também
nal de um abstract em
Episte- inglês, que não
molo-gia exceda 150 pala-
(Qualis B1) vras [...].
As páginas iniciais
Estudos deverão conter: [...]
de Psico- resumo em portu-
logia guês, com mínimo
(UFRN) de 100 e máximo
(Qualis de 150 palavras no
A2) caso de artigos
(estudos empíricos,
estudos teóricos e
revisões críticas);
Gerais: Resumos em por-
PSICOLOGIA

Revista tuguês e inglês


Interinsti- (Abstract): Resumo
tucional em português com
de Psico- no máximo 150
logia palavras (relatos de
(Qualis B3) pesquisa e estudos
teóricos), ou 100
palavras (relatos de
experiência, notas
técnicas e resenhas)
[...] O resumo em
inglês (Abstract) e
[..] devem ser
compatíveis com o
texto em português
Revista O trabalho deve
Brasileira conter título em
LINGUÍSTICA E

LINGUÍSTICA

de Lin- português e inglês,


guística
LETRAS,

incluindo dois
ARTES

Aplicada resumos de até 10


(RBLA) linhas nas duas
(Qualis línguas [...]
A1)
Resumo: na tercei- O resumo deve, obri-

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Revista de ra linha abaixo do gatoriamente, conter


Estudos nome do autor. os seguintes elemen-
Linguísti- Colocar a palavra tos: objetivo do estu-
cos Vere- RESUMO em caixa do, aporte teóri-
das alta, seguida de co/metodologia ado-
(Qualis dois pontos. Redi- tada, síntese dos
A2) gir o texto em resultados [grifos da
parágrafo único, Revista].
espaço simples,
justificado, de no
máximo sete linhas
[...]Fonte: Times
New Roman, corpo
10, para todo o
resumo.
Aletria: O original, digita-
Revista de do em espaço
Estudos duplo, fonte 12,
de Litera- Times New Ro-
tura man, deve desen-
(Qualis A!) volver-se na se-
guinte sequência:
[...] resumo [...] em
português [...]
resumo [...] tradu-
LITERATURA

zidos para outra


língua (inglês,
francês ou espa-
nhol),
BOITA- Resumo [...] na
TÁ: Revis- língua do artigo e
ta do GT outro em Espanhol,
de Inglês ou Francês.
Literatura
Oral e
Popular
da AN-
POLL
(Qualis B1)

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A INFRAESTRUTURA TEXTUAL
DE ARTIGOS CIENTÍFICOS E RESUMOS
DA ÁREA DOS ESTUDOS LITERÁRIOS
Evandro Gonçalves Leite
Francisco Edson Gonçalves Leite

Introdução

O estudo de gêneros textuais da esfera acadêmica vem ga-


nhando cada vez mais espaço nas pesquisas em Linguística. Mes-
mo assim, a pluralidade de áreas da ciência multiplica as possibi-
lidades de estudo desses gêneros, haja vista que cada uma tem
suas próprias regras de produção e veiculação de conhecimentos,
que determinam diferentes modos de configuração dos gêneros
que empregam em suas atividades de linguagem.
Partindo desse princípio, o presente artigo visa a estudar
artigos científicos com seus respectivos resumos, publicados em
periódicos eletrônicos da área dos estudos literários. Nosso objeti-
vo é analisar, comparativamente, a configuração da infraestrutura
textual de tais gêneros, associando-os a características da área do
conhecimento em que tais textos são produzidos. Para isso, seleci-
onamos cinco periódicos de diferentes estratos de qualificação na
avaliação da CAPES (A1, A2, B1, B2, B3), e de cada um deles cole-
tamos aleatoriamente um artigo: respectivamente, Cardoso (2012)1,

1 CARDOSO, A. C. de A. A transparência do concreto: a linguagem ima-


gística de Iracema. O eixo e a roda: revista de literatura brasileira, v. 21, n.
2, p. 65-83, jul./dez. 2012. Disponível em:
<www.letras.ufmg.br/poslit/08_publicacoes_pgs/Eixo e a Roda 21,
n.2/04-Andre Cabral.pdf>. Acesso em: 30 mai. 2013.

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Antonio (2012)2, Mello (2012)3, Silva e Lima (2012)4 e Braga-Pinto


(2012)5. Também coletamos as normas de publicação desses perió-
dicos.
A literatura, na acepção de área do conhecimento e sinôni-
ma de estudos literários, é uma ciência que se interessa pela litera-
tura, no sentido de uma forma de arte6. Entretanto, não é fácil pre-
cisar o que seja essa arte. Eagleton (2003) tenta definir o que carac-
teriza a literatura apontando e ao mesmo tempo questionando
concepções amplamente disseminadas no campo literário: escrita
imaginativa, de ficção, não verídica; emprego peculiar da lingua-
gem; discurso não pragmático, autorreferencial, que fala de si
mesmo; escrita bonita, tipo de escrita altamente valorizada. Con-
tudo, chega à conclusão de que não há uma definição “objetiva” e
que a noção de literatura deriva de juízos de valor (ideologias) que
são sociais e historicamente variáveis. A despeito dessa dificulda-

2 ANTONIO, L. O auto da Compadecida: um cordel de frente para as


câmeras. Terra roxa e outras terras: revista de estudos literários, v. 24, p.
16-26, dez. 2012. Disponível em:
<http://www.uel.br/pos/letras/terraroxa/g_pdf/vol24/TRvol24b.pdf>
. Acesso em: 30 mai. 2013.
3 MELLO, J. C. de. A Clarice de Ana Miranda. Anuário de literatura, Flo-

rianópolis, v.17, n. 2, p. 119-130, 2012. Disponível em:


<http://periodicos.ufsc.br/index.php/literatura/article/view/2175-
7917.2012v17n2p119/23266>. Acesso em: 30 mai. 20113.
4 SILVA, D. S. de Q.; LIMA, M. L. V. Disjunção parental: intertexto com a

Bíblia nos romances Lavoura arcaica e O evangelho segundo Jesus Cristo.


Revista literatura em debate, v. 6, n. 11, p. 127-138, dez. 2012. Disponível
em:
<http://revistas.fw.uri.br/index.php/literaturaemdebate/article/view/
649/1202>. Acesso em: 30 mai. 2013.
5 BRAGA-PINTO, C. José Lins do Rego e as fronteiras da amizade: Doi-

dinho. Olho d´água: revista do Programa de Pós-graduação em Letras da


UNESP, São José do Rio Preto, p. 75-85, jul./dez. 2012. Disponível em:
<http://www.olhodagua.ibilce.unesp.br/index.php/Olhodagua/article
/viewFile/149/171>. Acesso em: 30 mai. 2013.
6 Utilizaremos o termo estudos literários para nos referirmos à área da ci-

ência, reservando literatura para a forma de arte, a fim de evitarmos am-


biguidades.

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 91

de, podemos afirmar que os estudos nessa área da ciência focali-


zam principalmente as obras consideradas literárias e seus escrito-
res, a partir das mais diferentes abordagens teóricas, algumas de-
las apontadas pelo próprio Eagleton (2003): fenomenologia, her-
menêutica, teoria da recepção, estruturalismo e pós-
estruturalismo, semiótica e psicanálise, o que mostra que essa área
tem forte vocação interdisciplinar, pelas relações com a filosofia, a
sociologia, a psicologia, a história, entre outras. Portanto, podemos
dizer que os objetos dos estudos literários são os mais plurais,
desde as obras mais clássicas e socialmente prestigiadas como câ-
none, até a chamada cultura de massa, a literatura popular, bem
como a interseção da literatura com outras artes, linguagens e mí-
dias (como o cinema e a música). Quanto à metodologia emprega-
da nesses estudos, geralmente rejeitam-se as tendências positivista
e determinista (como o faz grande parte das chamadas ciências
humanas), sob o argumento de serem reducionistas e de não pode-
rem explicar suficientemente os fenômenos estudados. A esse res-
peito, refletem Murad e Vicente (2010, p. 402):

Os obstáculos entre as ciências “duras” e as humanidades


foram erguidos, de um lado, pelo otimismo metodológico
exacerbado de positivistas como Comte, que acreditavam na
possibilidade da redução da natureza humana a processos
mecânicos e, por outro, pelas restrições excessivamente rígi-
das impostas pelos positivistas lógicos ao escopo e objetivos
da investigação científica, excluindo a complexidade e limi-
tações definidoras dos problemas das humanidades.

Enfim, quanto à metodologia empregada em seus estudos,


coaduna-se com as tendências amplamente utilizadas nas ciências
humanas, rejeitando muitos dos paradigmas mais comuns nas
ciências “duras”.
O corpus deste trabalho (artigos científicos com seus respec-
tivos resumos) será analisado levando-se em conta o conceito de
infraestrutura textual proposto pelo Interacionismo Sociodiscursi-
vo (ISD), as orientações e prescrições socialmente estabelecidas
para os gêneros, tentando associá-los às propriedades que definem

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a ciência à qual pertencem, no sentido de evidenciar as caracterís-


ticas e peculiaridades que marcam tais gêneros.
O trabalho está organizado da seguinte forma: primeira-
mente, fazemos uma exposição das características dos gêneros
artigo científico e resumo; em seguida, analisamos comparativa-
mente a infraestrutura textual dos resumos e artigos que constitu-
em nosso corpus; posteriormente, tentamos relacionar certas espe-
cificidades dos gêneros a propriedades do fazer científico nos es-
tudos literários; por último, segue a conclusão.

1. Gênero artigo científico

O artigo científico7 pode ser caracterizado como “parte de


uma publicação com autoria declarada, que apresenta e discute
ideias, métodos, técnicas, processos e resultados nas diversas áreas
do conhecimento.” (ABNT, 2003a, p. 2). Segundo a ABNT, os arti-
gos podem ser originais, quando os temas e sua abordagem são
originais; ou de revisão, quando aborda informações já publicadas.
Estrutura-se em elementos pré-textuais, textuais e pós-textuais. Os
primeiros são compostos de título e subtítulo (se houver), nome(s)
do(s) autor(es), resumo e palavras-chave na língua do texto; os
segundos por introdução, desenvolvimento e conclusão; os tercei-
ros por título e subtítulo (se houver) em língua estrangeira, resu-

7 Existem variações quanto à denominação do gênero. A NBR 6022


(ABNT, 2003a) utiliza a denominação artigo científico, que é também se-
guida em manuais de metodologia científica, como Marconi e Lakatos
(2010) e Severino (2011). Motta-Roth e Hendges (2010) utilizam as deno-
minações artigo científico e artigo acadêmico como sinônimas, mas optam
pela segunda. Já Nogueira (2007) utiliza duas terminologias – artigo cientí-
fico e artigo acadêmico-científico – com sentidos diferentes: a primeira com-
preenderia os artigos que trazem temas e abordagens inéditas; a segunda,
os que não tratam necessariamente de temáticas inéditas, embora tam-
bém desenvolvam temas de forma teoricamente fundamentada. Nesse
trabalho, reconhecemos as duas expressões como sinônimas e adotamos a
que é usada pela ABNT.

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mo e palavras-chave em língua estrangeira, nota(s) explicativa(s),


referências, glossário, apêndice(s) e anexo(s).
Além dessas normatizações e dos manuais de metodologia
científica – os quais ratificam tais prescrições –, também estudos na
área da Linguística têm se dedicado à descrição do gênero. Motta-
Roth e Hendges (2010) oferecem a escritores iniciantes um material
didático para subsidiar a produção de artigos científicos. Segundo
elas, o artigo pode ser definido como “[…] um documento escrito
por um ou mais pesquisadores para relatar os resultados de uma
atividade de investigação […]” (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010,
p. 66). Ainda de acordo com as autoras, é essencialmente ligado ao
meio universitário; serve como meio de comunicação entre profes-
sores, pesquisadores e alunos de graduação e pós-graduação; é
publicado em anais de congressos científicos, revistas especializa-
das e livros, para divulgar resultados de pesquisas e estudos.
Os temas desenvolvidos nos artigos são os mais variados, a
depender das especificidades de cada área do conhecimento, e isso
define também a configuração do artigo. Assim, Motta-Roth e
Hendges (2010) elencam três tipos de artigo: de revisão teórica,
que consiste no levantamento bibliográfico da literatura sobre um
tema específico; experimental, que relata um experimento; e empí-
rico, que apresenta resultados de observações que não foram feitas
em ambiente de laboratório.
De acordo com Motta-Roth e Hendges (2010), o gênero es-
trutura-se em: resumo, que detalharemos na próxima seção; intro-
dução, que deve abordar, em termos de conteúdo, o tema, a con-
textualização da pesquisa, os objetivos, a justificativa, a base teóri-
ca e/ou metodológica e a estruturação do trabalho; revisão da lite-
ratura, que pode aparecer como seção independente ou integrar a
introdução e por meio da qual “[…] reportamos e avaliamos o co-
nhecimento produzido em pesquisas prévias, destacando concei-
tos, procedimentos, resultados, discussões e conclusões relevantes
para o trabalho. […]” (p. 91); metodologia, que tem por objetivo
“[…] apresentar os materiais e métodos (participantes ou sujeitos,
instrumentos, procedimentos, critérios, variáveis/categorias de
análise etc.) a serem adotados. […]” (p. 114), assumindo configura-
ções diferentes a depender da área do conhecimento e do objeto de

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estudo; resultados e discussão, que se dedica a apresentar e inter-


pretar os dados obtidos; e conclusão, que resume e interpreta os
resultados, relaciona-os com as pesquisas prévias, discute implica-
ções teóricas e práticas e aponta direcionamentos para outros tra-
balhos na mesma temática, podendo aparecer como seção inde-
pendente ou como parte dos resultados e discussão.
Nos periódicos em estudo, as normas para a elaboração dos
artigos focalizam principalmente questões de formatação e de ela-
boração de citações e referências. Quanto à estrutura, mencionam
a extensão – quase sempre em torno de 20 páginas – e os itens que
são obrigatórios: título e subtítulo, resumo com palavras-chave em
português e em língua estrangeira, texto e referências. Apenas um
dos periódicos salienta que os artigos devem destacar a fundamen-
tação teórico-metodológica, procedimentos empregados e resulta-
dos e conter preferencialmente introdução, desenvolvimento e
conclusão; outro se limita a dizer que o corpo do artigo deve se-
guir as normas da ABNT.

2. Gênero resumo

A palavra resumo é usada para nomear textos que sinteti-


zam, condensam informações de outros textos. Machado (2010),
por meio da investigação da ocorrência de resumos em diversas
fontes da mídia impressa e digital, apresenta alguns subtipos:
• resumos tipicamente escolares, que, direcionados a es-
tudantes, procedem à apresentação, de forma concisa,
de todo o conteúdo da obra;
• resenhas críticas, que, além do resumo da obra, contêm
ainda avaliações;
• contracapas de livros, que têm o objetivo de levar o lei-
tor a ler a obra completa e, por isso, apresentam dela
apenas conteúdos parciais;
• resumos de artigos ou outras obras científicas produzi-
dos por pessoa diferente do autor da obra resumida;
• abstracts de artigos científicos e resumos de teses, que,
produzidos pelos próprios autores da obra, aparecem

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como partes desses textos, mas podem funcionar auto-


nomamente.

Nosso interesse nesse trabalho está nos abstracts/resumos


que acompanham artigos científicos e que são produzidos pelos
próprios autores, com o objetivo de “[…] sumarizar, indicar e pre-
dizer, em um parágrafo curto, o conteúdo e a estrutura do texto
integral que segue […]” (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010, p.
152), para que o leitor decida se vale a pena ler o texto integral.
Nesse sentido, as autoras apontam que o resumo pode ter até a
função de convencer o leitor de que as informações veiculadas no
artigo são relevantes.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas, através da
NBR 6028 (ABNT, 2003b), estabelece normas para a redação e a
apresentação de resumos. Segundo a ABNT, resumo é a “apresen-
tação concisa dos pontos relevantes de um documento” (p. 1). Ele
apresenta três subdivisões: resumo crítico (ou resenha), que é re-
digido por um especialista e procede a uma análise crítica de um
documento; resumo indicativo, que apenas assinala os pontos
principais de um documento, mas não dispensa a leitura do origi-
nal; e resumo informativo, que contém informações como objeti-
vos, metodologia, resultados e conclusões de um documento e
que, por isso, pode dispensar a leitura do original.
Além de definir o gênero e classificá-lo, a NBR 6028
(ABNT, 2003b) ainda apresenta orientações quanto ao conteúdo, a
questões linguísticas e até à formatação. Quanto ao conteúdo, deve
conter objetivo, metodologia, resultados e conclusão, além de pa-
lavras-chave ao final. Quanto aos aspectos linguísticos, ressalta
que deve ser escrito na voz ativa e em terceira pessoa e que as fra-
ses devem ser concisas e afirmativas. Quanto à formatação, norma-
tiza a extensão do resumo, sua paragrafação, a posição de cada
parte que o compõe (referência e palavras-chave).
Essas normas são ratificadas nos manuais de metodologia
científica, a exemplo de Medeiros (2011), que, além de mencionar
as definições, regras e classificação dos resumos, ainda apresenta
orientações quanto ao processo de sumarização a ser empregado
na elaboração de um resumo.

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Também a Linguística tem-se interessado pelo estudo do


gênero, seja com objetivos descritivos, didáticos ou ambos. Deles,
vale destacarmos, mais uma vez, Motta-Roth e Hendges (2010),
que promovem a didatização e o ensino do gênero para estudantes
e pesquisadores, tomando como base a descrição de resumos efeti-
vamente produzidos nas mais diversas áreas do conhecimento.
Nesses manuais, reforçam-se muitas das prescrições constantes na
NBR 6028, o que já é esperado haja vista que a grande maioria dos
periódicos em que tais textos são publicados recomenda a obser-
vância às determinações da ABNT.
Além desses materiais, os autores de artigos devem levar
em conta as orientações do próprio periódico a que submetem o
trabalho, as quais se restringem, nos resumos em estudo, à exten-
são e à quantidade de palavras-chave.

3. A infraestrutura textual dos artigos científicos e resumos

Segundo Bronckart (1999), todo texto pertence a um gênero


e sua produção materializa uma ação de linguagem em que está
envolvido um sujeito singular. Para realizar as ações de lingua-
gem, que são formas pelas quais podemos agir no e sobre o mun-
do, os sujeitos devem mobilizar um conjunto de conhecimentos,
adquiridos em suas próprias ações ou na avaliação que fazem das
ações de outras pessoas com as quais interagem nas mais diversas
atividades sociais de uso da linguagem. Esses conhecimentos são
denominados “capacidades de linguagem” e são de três tipos:
• Capacidades de ação: possibilitam ao sujeito adaptar
sua produção à situação de ação de linguagem (repre-
sentações do conteúdo temático e dos contextos físico,
social e subjetivo) e ao gênero textual.
• Capacidades discursivas: possibilitam escolher a infra-
estrutura textual (tipos de discurso e sua articulação, se-
quências e outras formas de planificação, plano geral);
• Capacidades linguístico-discursivas: possibilitam reali-
zar operações de linguagem implicadas na produção do
texto e são de quatro tipos: (1) operações de textualiza-

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ção (conexão, coesão nominal e coesão verbal); (2) me-


canismos enunciativos (gerenciamento de vozes e moda-
lizações); (3) construção de enunciados, orações e perío-
dos; e (4) escolha de itens lexicais.

Nesse trabalho, interessa-nos particularmente as capacida-


des discursivas, que compõem a infraestrutura textual, tratada por
Bronckart (1999) como o nível mais profundo da organização in-
terna do texto empírico.

3.1 Tipos de discurso

Os tipos de discurso, de acordo com Bronckart (1999), são


os diferentes segmentos de natureza linguística que entram na
composição de todo e qualquer texto. Eles são o resultado de se-
miotizações, na língua natural, de operações psicológicas constitu-
tivas dos mundos discursivos8 criados pela atividade de lingua-
gem. A construção desses mundos se dá através de duas opera-
ções. Uma diz respeito à relação entre as coordenadas gerais que
organizam o conteúdo temático mobilizado no texto e as coorde-
nadas gerais do mundo ordinário em que acontece a ação de lin-
guagem: as coordenadas organizadoras do conteúdo temático po-
dem ser conjuntas (próximas e acessíveis) ao mundo ordinário da
ação, configurando o mundo da ordem do expor; ou disjuntas (dis-
tanciadas) desse mundo, configurando o mundo da ordem do nar-
rar. A outra alude à relação entre as instâncias de agentividade do
texto e seu espaço-tempo e os parâmetros materiais (objetivos) da
ação de linguagem: implicada, quando essa relação é explicitada e
o conteúdo temático está integrado nesses parâmetros, cujo conhe-
cimento se torna necessário à compreensão do texto; ou autônoma,
quando ela não é explicitada e o conhecimento de tais parâmetros
não é condição para a compreensão do texto. O cruzamento dessas

8 Não devemos confundir os mundos discursivos com o mundo ordinário


ou vivido: os primeiros são mundos virtuais criados pela atividade de
linguagem; o segundo são os mundos (objetivo, social e subjetivo) repre-
sentados pelos agentes ao desenvolverem ações de linguagem.

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duas operações origina os tipos de discurso, que podem ser divi-


didos em quatro: discurso interativo (mundo do expor implicado),
discurso teórico (mundo do expor autônomo), relato interativo
(mundo do narrar implicado) e narração (mundo do narrar autô-
nomo).
Nos resumos que introduzem os artigos científicos, perce-
bemos, quanto à configuração dos mundos discursivos, que se
trata do mundo do expor autônomo. Pertence à ordem do expor
porque as coordenadas que organizam o conteúdo temático do
texto são conjuntas ao mundo ordinário, ou seja, o conteúdo temá-
tico é avaliado/interpretado à luz dos critérios do mundo ordiná-
rio, o que se mostra condizente com a própria função da constru-
ção e da divulgação do conhecimento científico: elaborar interpre-
tações, descrições e explicações com pretensão de verdade sobre os
mais diversos fatos, processos e fenômenos do mundo ordinário. É
autônomo porque as instâncias de agentividade do texto e seu
espaço-tempo e os parâmetros materiais (objetivos) da ação de
linguagem não estão integrados ao conteúdo temático, cuja inter-
pretação não necessita da explicitação de tais instâncias e parâme-
tros; ou seja, a validade do conteúdo científico veiculado nos textos
não depende das circunstâncias particulares do ato de produção.
Assim, o tipo de discurso predominante no resumo é o discurso
teórico. Vejamos um exemplo:

Resumo: Braga-Pinto (2012, p. 75)


A noção de amizade ocupa um lugar essencial, mas peculiar den-
tro do imaginário e do pensamento brasileiro nas primeiras déca-
das do século XX. Assim, vê-se no início dos anos 1920 o obscure-
cimento do ceticismo de um Anatole France e, sobretudo a partir
do Rio de Janeiro, a consolidação de pensadores católicos ou idea-
listas cujos personagens servem de modelo para toda uma geração
“nascida com o século”, como a definiria Gilberto Freyre. Minha
hipótese é a de que esta amizade masculina, intimista e quase ex-
clusivamente espiritual começa a demonstrar sinais de crise com a
exigência de representação do social e de um novo espaço nacional
que já não se conforma aos modelos idealizados de sociabilidade
de matriz europeia. Para compreender a convivência instável entre

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duas noções tradicionais de amizade (espiritual e social), discutirei


como a noção de amizade se configura na obra Doidinho, de José
Lins do Rego. No regionalismo simultaneamente realista e subjeti-
vista do romancista, a representação de uma sociedade masculina
e inter-racial aponta para contradições e preocupações que se ma-
nifestam em formas ambivalentes de desejo e de pânico, revelando
pontos de conflito que envolvem culpa, nostalgia, melancolia, me-
do de contágio e degeneração de valores psicológicos e sociais.

O resumo acima possui algumas caraterísticas bastante


prototípicas do discurso teórico, mas outras que, a princípio, pode-
ríamos identificar como pertencentes a outro tipo. Quanto às pri-
meiras, podemos destacar, nos dois primeiros períodos, o uso da
3ª pessoa do singular e, em todo o texto, da voz ativa, do presente
do indicativo com valor genérico, de organizadores lógico-
argumentativos (“assim” “como”, “para” seguido de infinitivo),
além da menção ao intertexto científico, ao citar Anatole France e
Gilberto Freyre. Quanto às segundas, podemos citar a mudança da
voz empregada no texto para a 1ª pessoa do plural a partir do ter-
ceiro período do texto (“minha”, “discutirei”). Em relação ao em-
prego da 1ª pessoa, Bronckart (1999) diz que algumas formas da
primeira pessoa do plural podem remeter “[…] aos polos da inte-
ração verbal em geral […], mas não aos protagonistas da interação
em curso […]” (p.172), enquadrando o uso de tais formas no dis-
curso teórico. Considerando-se os parâmetros sociossubjetivos de
produção, embora não nos estejamos concentrando nesse nível de
análise, entendemos que essa ocorrência, bem frequente na escrita
acadêmica, demarca o compartilhamento da responsabilidade
enunciativa, caracterizando a “humildade” autoral. Em outros
resumos, há presença de elementos dêiticos com referência intra-
textual e não exofórica (“este artigo”), o que Bronckart considera
como marca do discurso teórico.
Nos artigos que sucedem os resumos, também prevalece o
discurso teórico, pelas mesmas razões apontadas em relação aos
resumos: a referência ao intertexto científico, feita tanto na forma
de citações diretas quanto indiretas; a presença de organizadores
lógico-argumentativos, como “pois”, “porque”, “assim”, “portan-

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to”, “por um lado... por outro”; o uso de dêiticos com referência


intratextual, como o emprego de termos como “abaixo” e “a se-
guir” para introduzir citações, “aqui” para fazer referência ao pró-
prio artigo em curso; e o uso ora da 1ª ora da 3ª pessoa do discurso
para marcar a voz que fala no texto. Retomando as palavras de
Bronckart (1999), acreditamos que a 1ª pessoa pode remeter aos
polos da interação em curso, mas reconhecemos que é difícil falar
de uma autonomia total do texto em relação às instâncias de agen-
tividade e aos parâmetros físicos da ação de linguagem, mesmo
em se tratando do discurso teórico, visto que o nome do autor logo
abaixo do título já marca certa implicação.

3.2 Sequências textuais

Sequências textuais correspondem à organização linear do


conteúdo do texto; “[…] são formas específicas de organização de
enunciados, que se combinam entre si de múltiplas maneiras para
dar lugar a um texto propriamente dito. […]” (BRONCKART,
2003, p. 55). Comumente conhecidas como superestruturas textu-
ais, as sequências podem ser combinadas em um texto de diferen-
tes formas e classificam-se em seis tipos, com as respectivas fases.
A apresentação a seguir traduz as formas prototípicas das sequên-
cias:
• Sequência narrativa: organização da histórica contada
por um processo de intriga (um todo acional dinâmico
que produz uma relação de causalidade entre os aconte-
cimentos); compõe-se das seguintes fases: situação inici-
al, complicação, ações, resolução, situação final e, em al-
guns casos, avaliação e moral;
• Sequência descritiva: apresentação de aspectos e propri-
edades acerca de um tema; suas fases prototípicas são
ancoragem, aspectualização e relacionamento;
• Sequência argumentativa: exposição de raciocínios lógi-
cos a respeito de um tema; tem como fases: premissas,
apresentação de argumentos, apresentação de contra-
argumentos e conclusão ou nova tese;

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• Sequência explicativa: explicação das causas e/ou das


razões de uma afirmação inicial, organizada nas seguin-
tes fases: constatação inicial, problematização, resolução
e conclusão/avaliação;
• Sequência dialogal: segmentos de discursos interativos
dialogados (conversações), estruturados em turnos de
fala, cada um decomposto em atos discursivos (atos de
fala); suas fases são abertura, transação e encerramento;
• Sequência injuntiva: descrição de ações, para que o des-
tinatário aja de um certo modo pretendido; suas fases
são as mesmas da sequência descritiva.

As outras formas de planificação dizem respeito a outras


maneiras de organização linear; são os scripts, que correspondem a
um grau zero de planificação, e as esquematizações, que se divi-
dem em definição, enumeração, enunciado de regras e cadeia cau-
sal.
Diferente do que observamos na configuração do tipo de
discurso, as sequências textuais de resumos e de artigos são dife-
rentes.
Nos artigos, prevalecem as sequências expositiva e argu-
mentativa, e isso pode ser justificado pela própria finalidade des-
sas sequências na construção do gênero: respectivamente, ex-
por/explicar conceitos científicos já formulados e conhecidos ou
em construção naquele momento; defender uma tese (um ponto de
vista) sobre determinado tema com base em premissas e argumen-
tos (notadamente de provas e de autoridade) com a finalidade de
convencer os leitores. De acordo com Silva (1999), o pesquisador,
além de apresentar seus dados, posiciona-se sobre eles, pois quer
convencer a comunidade científica da validade de suas afirmações.
Além dessas duas, há presença de trechos de sequência descritiva,
principalmente na descrição do conteúdo de outros textos (obras
literárias ou de fundamentação teórica). Vejamos alguns trechos:

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Artigo: Mello (2012, p. 120)


A metaficção historiográfica constitui-se a partir de uma relativi-
zação do conceito de história, pois essa deixa de ser tida como
verdade absoluta. A historiografia passa a ser questionada e sua
escrita passa a ser metadiscursiva. Isso implica em uma reaproxi-
mação de história e ficção e em uma releitura por parte desta à
história oficial a partir do presente, evidenciando as suas falhas,
exclusões, mentiras, esquecimentos, o que decorre de uma crise
epistemológica […]

Artigo: Antonio (2012, p. 18)


Em linhas gerais podemos dizer que o Auto da compadecida de Ari-
ano Suassuna combina duas perspectivas. De um lado mantém as
tradições próprias da literatura do povo nordestino, o que dá ao
texto um caráter nobre de resgate e defesa de uma cultura origi-
nalmente brasileira, não “contaminada” pela cultura híbrida, glo-
balizada, “rebaixada” para um nível médio e veiculada pelos mei-
os de comunicação de massa, em especial a televisão. Por outro
lado, retoma um gênero literário tradicional, pois segue a fórmula
do teatro nascido na Idade Média e revitalizado pelas mãos de Gil
Vicente.

Artigo: Mello (2012, p. 121)


Em Clarice, as estruturas das biografias tradicionais são parodia-
das: a novela principia e finaliza em acontecimentos banais, não se
concentra nos principais momentos da vida da escritora: o incên-
dio em seu quarto não é narrado, ele aparece apenas em sucintas
referências e relacionado a outros eventos no fluxo de consciência
da personagem, como ocorre no capítulo Banho de mar, no qual
Clarice está tomando banho de mar e essa ação remete ao fogo: “O
mar está de um azul tão profundo e escuro que dá medo até um
marinheiro. Clarice sente medo. Não quer morrer. Não quer ir
para tão longe. Sente o fogo em suas mãos” (MIRANDA, 1999, p.
58).

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Artigo: Silva e Lima (2012, p. 131)


Tomo aqui obviamente o conceito de paródia tal como revisitado
por Affonso Romano de Sant’Anna em seu livro Paródia, Paráfrase
& Cia., o termo é considerado como uma perversão em relação ao
texto de origem, como uma discordância ou oposição em relação
ao texto parodiado. No romance analisado, a paródia do romance
se faz porque sua história “entra em antagonismo com a voz origi-
nal” (SANT’ANNA, 2003, p. 14) da Bíblia, promovendo o jogo de
espelhos de que fala o teórico.

Artigo: Silva e Lima (2012, p. 128-129)


Em Lavoura Arcaica, romance escrito por Raduan Nassar em 1975,
narra-se a vida de uma família libanesa que sofreu um processo de
transplante cultural. Durante esse processo, as sucessivas gerações
entram em conflito por não achar uma espécie de meio-termo en-
tre a permanência da tradição e as mudanças que se impõem no
novo ambiente.

Os dois primeiros trechos exemplificam a sequência expli-


cativa. Nesse caso, apresentam-se conceitos e constatações (sobre
metaficção historiográfica e perspectivas da obra O auto da Compa-
decida) que são justificadas, explicadas nas frases seguintes. Os
dois trechos seguintes são representativos da sequência argumen-
tativa e constituem a estratégia argumentativa mais abundante-
mente utilizada nos artigos: apresentar uma ideia e comprová-la
com trechos da obra em análise ou com afirmações de outros estu-
diosos sobre o tema. Além dessas duas, também é comum encon-
trarmos relações de causa e consequência, exemplos, comparações
e refutação de argumentos contrários. O último trecho correspon-
de à sequência descritiva, ao descrever o conteúdo/enredo da obra
literária em estudo.
Essa sequência descritiva de texto é que predomina nos re-
sumos. Como sabemos, a função do resumo é sintetizar as ideias
veiculadas no artigo, procurando seguir inclusive a mesma estru-
tura daquele. Em outras palavras, o resumo deve ser uma descri-
ção, não de ser, objeto ou paisagem, mas de outro texto e das ações

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nele realizadas: do conteúdo e da estrutura do artigo que introduz.


Essa ideia de descrição de texto, com a qual concordamos, aparece
em Machado (1996) e é desenvolvida em Trevisani (2009) através
da análise de resumos de artigos científicos. Aplicamos esse méto-
do de análise no resumo apresentado abaixo:

Resumo: Antonio (2012, p. 16)


Propomos um estudo de viés comparativo entre os textos: Auto da
compadecida, peça teatral de Ariano Suassuna, publicada em 1955 e
a micro-série de título homônimo, de Guel Arraes, apresentada em
quatro capítulos na Rede Globo em janeiro de 1999. Por fim, a
transformação desta série em filme no ano de 2001. Objetiva-se
abordar os aspectos vistos em conjunto ou em seus detalhes que
forneçam subsídios para o entendimento de como o meio de circu-
lação se impõe enquanto elemento preponderante na configuração
de textos adaptados e a posição em que os diferentes consumido-
res se relacionam com a obra a ser transposta.

Embora se trate de uma descrição de texto, as mesmas fases


da sequência descritiva podem ser observadas nos resumos. O
resumo acima se inicia com a ancoragem “Propomos um estudo de
viés comparativo entre os textos”, que se divide em duas aspectua-
lizações: “Auto da compadecida”, que se transforma em subtema e
gera mais uma aspectualização (“apresentada em quatro capítulos
na Rede Globo”) e um relacionamento (“em janeiro de 1999”; e “a
transformação desta série em filme”, seguida também de um rela-
cionamento (“no ano de 2001”). Ocorre uma reformulação do tema
em uma nova ancoragem (“Objetiva-se abordar aspectos”), que se
divide em relacionamento (“vistos em conjunto ou em seus deta-
lhes”) e aspectualização (“subsídios”). Essa aspectualização trans-
forma-se num subtema que gera novas aspectualizações: “o enten-
dimento de como o meio de circulação se impõe enquanto elemen-
to preponderante na configuração de textos adaptados”; “a posi-
ção em que os diferentes consumidores se relacionam com a obra a
ser transposta”. Além de apresentar as fases da sequência descriti-
va, os resumos apresentam verbos que evidenciam tratar-se de

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sequências descritivas de ações (“propomos”, “objetiva-se abor-


dar”), o que ratifica as teses de Machado (1996) e Trevisani (2009).

3.3 Plano geral

Planejamento geral (ou plano geral) refere-se, conforme


Bronckart (1999), à organização do conteúdo temático. Esse plano
geral pode assumir formas variáveis, a depender do gênero ao
qual o texto pertence, da sua extensão, da natureza do conteúdo
temático e das condições externas de produção.
Essa categoria constitui nosso maior foco de interesse, jus-
tamente pelas particularidades que caracterizam os resumos e os
artigos da área dos estudos literários e os diferem tanto das pres-
crições da ABNT quanto de outras áreas do conhecimento.
Numa primeira observação dos artigos, fica evidente uma
peculiaridade importante: dos cinco artigos analisados, apenas
Mello (2012) apresenta a subdivisão em seções conforme preceitu-
am a ABNT e os manuais de metodologia científica. Mesmo assim,
não há a presença de uma revisão da literatura separada das análi-
ses: uma está diluída na outra. Os demais artigos não apresentam
qualquer subdivisão, o que não significa que eles não contenham
introdução, revisão da literatura, resultados e discussões e conclu-
são. Na ausência de subtópicos que demarquem essas partes, ga-
nham destaque alguns sintagmas e expressões que se tornam mui-
to importantes para o estabelecimento da progressão e da coerên-
cia textuais. Algumas vezes as sinalizações são bem evidentes:

Artigo: Antonio (2012, p. 17)


Assim, propomos um estudo de viés comparativo entre os textos:
O auto da compadecida, peça teatral de Ariano Suassuna, publicada
em 1955 e encenada no Recife em 1956, premiada no Rio de Janei-
ro, se configura como destacada obra do teatro moderno brasileiro;
a micro-série de Ariano Suassuna, apresentada em quatro capí-
tulos na Rede Globo em janeiro de 1999 de Guel Arraes (autor de
programas como TV pirata, Armação ilimitada e Comédia da vida pri-
vada.); e por fim a transformação da série de 1999 em filme levado
aos cinemas em 2001, pelo mesmo diretor e co-produtores.

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Artigo: Cardoso (2012, p, 80)


Os símiles de Alencar, assim, são fruto de uma tradição mais am-
pla, que vai além daquela do romance indianista e que é pautada
pela busca de uma linguagem transparente na qual a intermedia-
ção do meio deve ser reduzida ao mínimo. Trata-se de uma tradi-
ção que remonta ao século XVIII, quando, de acordo com David
Marshall, buscava-se um ideal de leitura que seria análogo à expe-
riência de testemunhar um espetáculo comovente. O texto deveria,
então, criar a ilusão de que o leitor estava sendo confrontado com
uma imagem, pois o apelo ao sentido da visão seria a maneira
mais eficiente de envolver e comover o leitor. […]

Artigo: Braga-Pinto (2012, p. 83)


Para concluir, pode-se dizer que neste momento da obra de José
Lins do Rego (e não só dele), nota-se primeiramente um esforço ou
uma necessidade de se imaginar formas horizontais de sociabili-
dade – de filia ou, simplesmente, amizade – como alternativa ao
modelo patriarcal, ou filiativo, para usar o termo de Said. […]

Observemos a função das expressões “propomos” no pri-


meiro fragmento, “assim” no segundo e “para concluir” no tercei-
ro. Na ausência de seção para marcar a introdução (onde normal-
mente o objetivo do trabalho aparece) e a conclusão, são esses ele-
mentos os responsáveis para sinalizar ao leitor esses movimentos.
No caso do terceiro fragmento, o autor procura ser o mais claro
possível, provavelmente ciente da importância desse elemento de
coesão na progressão de seu texto.
Mas nem todas as partes dos artigos encontram-se tão cla-
ramente demarcadas por conectores ou outros elementos de coe-
são. É comum não haver uma separação entre revisão da literatura
e análise dos dados, como podemos observar nos exemplos abaixo:

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Artigo: Mello (2012, p. 123)


Nas narrativas pós-modernas “el presente aparece metaforizado,
se debilita y disemina. En consecuencia se impone un retorno al
pasado, operación en la que domina la memoria (…) el hombre
persiste en la búsqueda de sí mismo en el tiempo” (GONZALES,
2002, p. 19). Essas características estão presentes em Clarice, já que
a personagem retorna ao seu passado ao longo da narração e a
memória dos acontecimentos está explícita de maneira fragmentá-
ria, como é característico da mesma, sendo uma forma de Clarice
encontrar a si mesma partindo do passado, e do narrador criar a
sua Clarice. “Se abre paso la búsqueda de otra historia, desmitifi-
cada, desacralizada, secularizada, despojada de las aureolas nada
sagradas del poder” (GONZALES, 2002, p. 18), pois esse texto des-
sacraliza também a historiografia literária, uma vez que foge da
visão convencionada da escritora, abordando sua história interior,
a sua intra-história imaginária.

Artigo: Cardoso (2012, p. 68)


[…] Assim, para Spacks, a sensibilidade exige uma certa performan-
ce, na qual sentimentos são exibidos diante de um espectador que
deveria reagir a eles. No entanto, esse processo acarreta uma am-
biguidade: ele pode ser mal interpretado, ou as manifestações
emocionais atribuídas às causas erradas.6 Pior ainda, essas mani-
festações de sentimento podem ser um embuste intencional. Alen-
car procura evitar esse risco recorrendo à autoridade de seu narra-
dor, que nos garante que Lúcia, ao escolher suas vestes brancas,
estava agindo por instinto e, portanto, de forma espontânea. Além
disso, ele procura controlar ainda mais a interpretação do leitor ao
nos mostrar, logo nas primeiras páginas do romance, Lúcia como
uma personagem cuja pureza não é fruto da dissimulação. Ela nos
é apresentada pela primeira vez à entrada da igreja da Glória du-
rante uma festa religiosa, olhando para as nuvens no horizonte.
Inconsciente de tudo o que a cerca e de estar sendo observada, ela
exala inocência e castidade. […]

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Em Mello (2012), ao mesmo tempo em que se apresentam


características da metaficção historiográfica, enquadra-se a obra
Clarice, objeto de análise do artigo, nessa categoria. Cardoso (2012)
apresenta a noção de sensibilidade na literatura sentimental e, em
seguida, já a associa a um dos textos em análise no artigo: o ro-
mance Lucíola. Concordamos com Hendges (2001) quando afirma
que a revisão da literatura perpassa todas as seções do artigo, mas
queremos chamar atenção para o fato de não haver uma seção es-
pecífica para ela, que aparece diluída nas análises.
Outra peculiaridade importante refere-se à pouca relevân-
cia dada a informações metodológicas. Nos artigos, de modo geral,
apresenta-se apenas o material que será objeto de estudo, às vezes
uma breve descrição do enredo da obra literária em análise, mas
nunca informações sobre métodos de abordagem, procedimentos
de análise, técnicas e instrumentos de pesquisa. Apenas em um
dos artigos, Antonio (2012), menciona-se que o estudo terá um viés
comparativo. Até mesmo no artigo que é dividido em seções, Mel-
lo (2012), não há uma que se dedique às questões metodológicas,
tão importantes em outras áreas do conhecimento.
Nos resumos, também não há uma observância rígida à or-
ganização em introdução, metodologia, resultados e conclusão,
prescrita na ABNT e nos manuais de metodologia científica. O
mais comum é que apareçam apenas algumas dessas partes: obje-
tivo e/ou tema em todos eles; hipótese em dois; metodologia em
todos eles; resultados em três.
A fim de oferecermos uma caracterização do plano geral
dos resumos estudados, elaboramos a tabela abaixo. Para isso,
consideramos três grandes partes em que eles aparecem estrutura-
dos: introdução, na qual englobamos tema e/ou objetivo(s) e hipó-
tese; metodologia, que compreende informações sobre o referenci-
al teórico e materiais e métodos; e resultados. Não mencionamos o
item conclusão, já que não houve ocorrência deles no corpus em
análise.

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Tabela 1: Plano geral dos resumos


RESUMOS
Silva e Braga-
PARTES Cardoso Antonio Mello
Lima Pinto
(2012) (2012) (2012)
(2012) (2012)
INTRODUÇÃO X X X X X
METODOLOGIA X X X X X
RESULTADOS X X X

Três dos resumos seguem mais fielmente a estrutura pres-


crita pala ABNT; os demais não apresentam resultados. Vejamos
um exemplo de cada caso:

Resumo: Cardoso (2012, p. 65)


Este artigo parte da análise de um trecho do romance Lucíola, de
José de Alencar, para chegar a uma discussão mais ampla dos sí-
miles empregados por Alencar em seus romances indianistas e,
mais especificamente, em Iracema. A passagem de Lucíola analisada
oferece uma das chaves para compreender a linguagem imagística
usada por Alencar nos romances indianistas: a busca de uma lin-
guagem transparente, calcada em imagens e associada ao primiti-
vo e à natureza. Este trabalho procura demonstrar que a busca por
esse tipo de linguagem faz parte de uma longa tradição sentimen-
tal que tem sua origem na Europa do século XVIII e que ainda in-
fluencia a obra de Alencar. Convenções sentimentais ligadas à sen-
sibilidade e à empatia estariam por trás dos símiles criados por
Alencar em Iracema, que seriam um exemplo de seu desejo de criar
uma linguagem expressiva que apagaria a intermediação da lin-
guagem verbal.

Resumo: Silva e Lima (2012, p. 127)


Análise do tema da disjunção parental em Lavoura Arcaica (1975)
de Raduan Nassar e em O Evangelho Segundo Jesus Cristo (1991) de
José Saramago, levando em consideração o diálogo intertextual
entre essas obras e o texto da Bíblia. Considerando que essas obras
promovem rasuras em relação às narrativas do Novo Testamento,

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propõe-se uma leitura das dissemelhanças entre a congregação


familiar que aparece no texto sagrado e a dissolução desse grupo
nos romances em estudo. Levanta-se a hipótese de que as obras
literárias, ao investir nos vazios e nas lacunas deixadas pela forma
narrativa da Bíblia, fazem uma revisitação das histórias que repre-
sentam.

No primeiro exemplo, percebemos a presença do tema, dos


objetivos, de informação metodológica quanto ao material a ser
estudado/analisado e dos resultados. No segundo, há presença de
objetivo e hipótese (esta em lugar dos resultados), e um pouco
mais de informações metodológicas, pois elenca os materiais, mas
também faz referência a um método a ser utilizado: a comparação
entre dois textos. De qualquer modo, salientamos que, embora
presente em todos os resumos, as informações metodológicas res-
tringem-se predominantemente a elencar a obra literária a ser ana-
lisada e, em dois casos, a breve menção à teoria ou aos autores que
servirão de fundamentação teórica.
Como os resumos são síntese dos artigos, a já mencionada
escassez de informações metodológicas nos artigos também se
reflete nos resumos, o que reforça nossa hipótese de que constitu-
am aspectos de caráter secundário nessa área do conhecimento.
Salientamos, entretanto, que a pouca quantidade de dados meto-
dológicos não nos permite inferir ou julgar que os textos frutos de
pesquisas careçam de fundamentação metodológica. O que nos
parece é não haver necessidade, para os membros da área, de ex-
plicitar tal fundamentação nos resumos e nos artigos.

4. Das propriedades do texto a características do subcampo dos


estudos literários

De acordo com Bronckart (1999), os agentes produtores,


numa dada situação de comunicação verbal, não apenas escolhem
um gênero entre os disponíveis no arquitexto, mas também os
adaptam em função dessa mesma situação. Conforme vimos na
seção anterior, a despeito das orientações e normatizações da

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ABNT, dos manuais de metodologia científica e até das normas de


publicação das revistas, a estrutura de artigos e resumos pode va-
riar, seja de uma disciplina para outra, seja no interior de uma
mesma disciplina, mediante as especificidades do objeto de estu-
do.
As peculiaridades mais significativas na infraestrutura tex-
tual de artigos e resumos em relação às prescrições, especialmente
da ANBT, são:
• nos artigos: a ausência de divisão de quatro artigos em
seções, a quase inexistência de informações metodológi-
cas, restritas prioritariamente à menção ao material a ser
analisado;
• nos resumos: o não seguimento à estrutura proposta pe-
la ABNT; a pouca quantidade de informação metodoló-
gica, também restrita à indicação do material de análise.

Essas modificações, entretanto, não acontecem ao acaso,


pois nem todo agente produtor pode operar inovações nos gêne-
ros. Bhatia (2001) defende que existe um embate entre forças que
atuam para garantir a estabilidade dos gêneros e forças que tentam
promover a mudança e a inovação, de modo que eles são apenas
relativamente estáveis e possuem uma natureza dinâmica. Entre-
tanto, segundo o mesmo autor, gêneros mais institucionalizados,
por terem uma autoria mais social do que individual, seriam mais
controlados pelas convenções genéricas, que incluem o propósito
comunicativo, a recorrência de situações retóricas e certa organiza-
ção estrutural. Desse modo, apenas membros legitimados de dada
comunidade disciplinar estariam autorizados a promover mudan-
ças no gênero.

Somente os membros da comunidade especializada que ad-


quiriram o direito de apropriar-se das formas genéricas têm
o poder tanto de construir, interpretar e usar os recursos ge-
néricos como de explorá-los na criação de novas formas,
misturar padrões genéricos e também controlar as respostas
dos de fora. Não há melhor ilustração do provérbio “conhe-
cer é poder” que essa do poder genérico. (BHATIA, 2001, p.
110).

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No caso dos periódicos em estudo, de impacto nacional e


até internacional, tais mudanças, operadas por membros legitima-
dos pela sua comunidade, encontram uma situação propícia para
acontecer, já que acontecem pelas mãos de pesquisadores cujo co-
nhecimento reflete-se em legitimação e poder. É evidente que não
se trata de uma mudança radical que descaracterize os gêneros
artigo e resumo ou possibilite falar da emergência de novos gêne-
ros, mas pesquisadores e periódicos parecem não se importar tan-
to com o seguimento rígido de algumas prescrições socialmente
aceitas para esses gêneros acadêmicos, o que fica perceptível na
estrutura dos exemplares estudados.
Essas considerações nos remetem à própria lógica do mun-
do (ou campo) científico – tal qual proposta por Bourdieu (2004) –,
da qual os gêneros textuais, como instrumentos de ação nesse con-
texto específico, também fazem parte. Segundo Bourdieu (2004),
campo científico é um universo formado por instituições e agentes
que produzem, reproduzem ou difundem ciência, e divide-se em
subcampos, que correspondem às diferentes disciplinas, no nosso
caso, os estudos literários. Esses campos e subcampos possuem
regras, imposições e solicitações – que são criadas e devem ser
seguidas pelos seus agentes – as quais podem ser mais ou menos
dependentes de forças externas, a depender do grau de autonomia
do respectivo (sub)campo. Essa influência externa é mediada e
avaliada sob a lógica do campo e, quanto mais autônomo ele for,
menos sujeito estará a essas pressões, ou seja, maior será seu poder
de refração. Esse poder de refração pode ser observado na cons-
trução dos artigos ora analisados, visto que eles contêm peculiari-
dades que escapam às normas externas que são socialmente refe-
rendadas.
Mas nem todos os agentes têm capital científico suficiente
para operar tais mudanças: somente aqueles que são reconhecidos
pelos seus pares, seja pelo seu prestígio pessoal ou pelas posições
importantes que ocupam nas instituições científicas. As peculiari-
dades estruturais verificadas nos artigos são responsabilidade de
pesquisadores com relativa experiência, selecionados entre tantos
outros que submetem textos aos periódicos, e são referendadas

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pelo corpo editorial de tais periódicos, com poder institucional


para barrar ou referendar tais inovações.
Enfim, a forma que assume um gênero numa dada esfera
de comunicação ou num certo campo depende não só das norma-
tizações externas, mas também das regras referenciadas pelos
agentes e instituições que detêm o capital simbólico – ou, em se
tratando do campo científico, o capital científico – a serem segui-
das por todos aqueles que querem participar daquele (sub)campo.

Conclusão

Neste trabalho, propusemo-nos a analisar artigos científicos


com seus respectivos resumos, publicados em periódicos eletrôni-
cos da área dos estudos literários. Nossa finalidade foi compreen-
der como se organiza a infraestrutura textual de artigos e resumos,
comparando-as entre si, assim como interpretar possíveis particu-
laridades, levando em consideração principalmente aspectos que
caracterizam o fazer científico e própria constituição desse campo.
Verificamos que, de fato, esses gêneros, apesar de não se
afastarem por completo das normas socialmente estabelecidas pa-
ra eles, apresentam algumas especificidades. É preciso ressaltar
que tais peculiaridades não são consideradas erros ou afastamento
de um padrão de referência; pelo contrário, são, a nosso ver, parte
integrante das regras de cientificidade do subcampo dos estudos
literários e são compartilhadas por pesquisadores e comitê editori-
al de tais periódicos.
Portanto, conforme Nascimento (2002), a academia abrange
várias comunidades que são formadas por membros de diferentes
disciplinas. Essas comunidades, a despeito de certas convenções
da língua e da estrutura do gênero, podem, além de reproduzir,
também transformar essa estrutura. Assim, as diferenças entre as
comunidades disciplinares podem acarretar variações na configu-
ração do gênero, conforme demonstramos na análise de artigos
científicos e seus respectivos resumos publicados em periódicos na
área dos estudos literários.

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Referências

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A PRODUÇÃO DE RESUMOS DAS ÁREAS


DE JORNALISMO E EDUCAÇÃO: UM OLHAR
SOBRE A PLANIFICAÇÃO TEXTUAL E
O GERENCIAMENTO DAS VOZES
Fabiana Ramos (PROLING-UFPB/UFCG)
Iara Francisca Araújo Cavalcanti (PROLING-UFPB/UEPB)

Introdução

A elaboração de resumos, sejam eles orais ou escritos, faz


parte da realidade do ser humano, na sua vida cotidiana, pois a
cada momento somos solicitados a resumir, ou seja, a sintetizar-
mos, a sermos breves e objetivos no que falamos ou escrevemos,
em diversos contextos comunicativos. Diante desse fato, percebe-
mos que o resumo é um dos gêneros textuais dos quais mais nos
utilizamos na vida em sociedade.
No âmbito acadêmico, Machado (2002, p. 138) já havia sina-
lizado para o fato de que, no final da década de 70 e nos anos oi-
tenta, muitas pesquisas contemplavam “a questão da sumarização
e do ensino de produção de resumos como sendo essenciais para o
desenvolvimento da compreensão da leitura”, trabalhos resultan-
tes de investigações na área da Linguística Textual. Reconhecendo
o resumo como uma das produções textuais “de primeiríssima
necessidade no campo didático” (MACHADO, 2002), buscamos
contribuir com mais uma investigação nesta área de estudo, por
considerarmos que, apesar de já haver um número expressivo de
publicação na área, ainda há uma demanda de pesquisas que se
voltem sobre o tema.
Sendo assim, como colaboradoras do grupo de pesquisa
Ateliê de Textos Acadêmicos (ATA/PROLING/UFPB), que tem

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buscado investigar, em diferentes áreas do conhecimento de nível


superior, como se tem produzido o gênero resumo para periódicos
especializados, debruçamo-nos, neste estudo, sobre a produção do
referido gênero especificamente nas áreas de Jornalismo e Educa-
ção, por termos cada uma de nós, autoras, uma inserção profissio-
nal1 que nos conduz a trabalhar com textos das referidas áreas.
Nessa direção, partindo da perspectiva teórica de que não
existe um letramento, mas letramentos, corroboramos o posicio-
namento de Hewings e Hewings (2001 apud SILVA, 2012) de que,
na academia, de uma maneira geral, observando-se a escrita em
diferentes cursos, não há um letramento acadêmico homogêneo,
devido às variações de objetivos para com a escrita de um gênero
textual, em determinado curso. Assim, a escrita, nos diversos con-
textos acadêmicos, tem refletido maneiras diferentes de construção
e apresentação de conhecimentos. Sobre essas considerações, Silva
(2012, p. 102) afirma que “as práticas de letramento acadêmicas
teriam características e convenções variantes motivadas pelas ma-
neiras como as diferentes disciplinas descrevem, recortam e cate-
gorizam a realidade.”
Para justificar essa assertiva, Silva (2012) apresenta resulta-
dos de investigações desenvolvidas em diferentes áreas, a exemplo
das de Herrington (1994 apud SILVA, 2012) sobre a escrita de alu-
nos em dois cursos de Engenharia, em que ele chega à conclusão
de que, mesmo no interior de uma disciplina, há diferenças quanto
à abordagem de “papéis de escritores e de audiência [...] e propósi-
tos sociais etc.” (SILVA, 2012, p. 103), o que reforça seu posiciona-
mento de que na academia “as disciplinas constituem comunida-
des discursivas diferentes” e de que, assim, “os modos como os
gêneros se apresentam terão diferenças retóricas que refletem a
identidade disciplinar destes campos do saber.”

1 A professora Iara F. A. Cavalcanti dedica-se ao trabalho com textos jor-


nalísticos em projetos pedagógicos, na formação inicial e continuada no
Curso de Letras da UEPB. Por sua vez, a professora Fabiana Ramos tem
seu trabalho voltado para o trabalho com a língua materna no Curso de
Pedagogia da UFCG.

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 118

A partir dessas constatações, é possível afirmarmos que as


necessidades de escrita em um curso de Letras não são iguais às
necessidades de escrita no curso de Engenharia, de Pedagogia ou
de Jornalismo, por exemplo, ou seja, que cada curso tem demandas
diferentes e isso tem direcionado diferentes formas de organização
textual, chegando, assim, a fazer parte de cada área um uso especí-
fico, mais recorrente, de determinado elemento linguístico. Este
fato direciona nossa investigação para a observação da construção
do gênero resumo nas áreas de Jornalismo e Educação, partindo
da concepção de Russell (1994 apud SILVA, 2012) de que a escrita
faz parte de uma comunidade discursiva que está inserida em uma
atividade prática situada. Nessa perspectiva, buscamos observar
alguns objetivos e necessidades da linguagem na área de Jornalis-
mo e de Educação.
Na área de jornalismo, a escrita é marcada pela valorização
da informação, devendo esta ser precisa, clara e objetiva. Assim,
durante a escrita de determinado gênero, como a notícia, por
exemplo, os adjetivos são considerados desnecessários, pois o es-
critor não deve se posicionar a respeito do que informa, em outras
palavras, deve ser imparcial, demonstrar “neutralidade”. Segundo
Lopes (s/d), a linguagem jornalística tende a ser compreensível
pelo fato de ser direcionada a um público amplo. Além disso, ela
possui regras de escrita que são interiorizadas pelos profissionais
da área e, pelo fato de a comunicação ser destinada a um público
vasto e heterogêneo, a linguagem deve ser clara, tendo como ca-
racterísticas do uso da linguagem: “a) frases curtas; b) parágrafos
curtos; c) palavras simples (evitar palavras polissilábicas); d) uma
sintaxe direta e econômica; e) a concisão; e f) a utilização de metá-
foras para incrementar a compreensão do texto” (TRAQUINA,
2004: 84 apud LOPES, s/d p. 14).
O contexto de produção textual na área de Educação, por
sua vez, envolve a produção intelectual de pesquisadores na inter-
face com várias áreas disciplinares, devido ao envolvimento destas
áreas no trabalho pedagógico. Dessa forma, os textos publicados
em periódicos da área de Educação se configuram pela multiplici-
dade de temáticas em jogo, bem como por uma diversidade teórica
evidente, considerando a complexidade do estudo do fenômeno

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educativo. Nessa direção, muitos são os estudos publicados em


periódicos da área que envolvem a pesquisa de campo ou docu-
mental, como também a revisão de literatura, sob diferentes óticas,
direcionados, sobretudo, aos profissionais diretamente implicados
com as atividades de ensinar e educar (professores, gestores, su-
pervisores, psicólogos, assistentes sociais). A linguagem desses
textos costuma assumir traços como a objetividade e a neutralida-
de, características preconizadas para a linguagem utilizada no con-
texto acadêmico-científico.
A partir do estudo dos resumos nas duas áreas aqui em fo-
co, também pretendemos contribuir para as reflexões acerca de
como profissionais de diferentes áreas de estudo têm produzido o
gênero resumo. Assim, objetivamos analisar, a partir dos pressu-
postos do Interacionismo Sociodiscursivo (doravante ISD), resu-
mos acadêmicos nas áreas já referidas, buscando investigar, especi-
ficamente, os elementos que compõem o seu plano geral, bem co-
mo o posicionamento enunciativo neles presentes.
Para tanto, organizamos este artigo em quatro seções. A
primeira delas explicita os princípios teóricos do ISD que embasa-
rão a análise aqui proposta, incluindo a noção de gêneros textuais.
A segunda aborda o gênero textual resumo, foco deste trabalho. A
terceira apresenta a análise dos dados e, por fim, a quarta expõe
nossas palavras finais.

1. O Interacionismo sociodiscursivo e suas contribuições para o


estudo dos gêneros textuais

Muitos estudiosos têm se debruçado sobre os gêneros tex-


tuais, com diferentes perspectivas de pesquisa. Para Marchuschi
(2008), esse estudo data de uma observação sistemática desde a
época de Platão. Saliente-se que na tradição ocidental o termo “gê-
nero” estava associado aos estudos dos gêneros literários. Atual-
mente, refere-se não apenas à literatura, mas também a diversas
áreas do conhecimento e de investigação (Antropologia, Sociolo-
gia, Etnografia, Retórica e Linguística), que têm contribuído para o
estudo dos gêneros textuais numa perspectiva multidisciplinar.

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Nessa direção, sabemos que os variados modos como se fo-


caliza o gênero terminam por estabelecer diferentes abordagens
teóricas e metodológicas, como demonstram as pesquisas realiza-
das nessa área, podendo ser organizadas em três tendências domi-
nantes, conforme Marcuschi (2002 apud PEREIRA, 2005), a saber:
(i) a escola Norte - Americana (perspectiva sociológica), prevaleceu
nas décadas de setenta e oitenta, representada pelos pesquisadores
Werlich (1973), Van Dijk (1972/1977) e Heineman (1991). As inves-
tigações, nesta época, contemplavam as tipologias de gêneros, cen-
trando-se na análise formal e estrutural de gêneros predominan-
temente escritos, na perspectiva da linguística textual; (ii) a segun-
da, representada tanto pelos estudiosos da sociorretórica, perten-
centes à escola norte-americana, Miller (1984), Freedman (1994),
Bazerman (1991), quanto pelos do grupo de Sydney, com Hasan
(1985), Martin (1993), Halliday (1994) e Thoompson (1996), não se
preocupou com a classificação tipológica dos gêneros, focalizou,
de outro modo, o estudo dos gêneros, priorizando o contexto cul-
tural e situacional; (iii) a terceira tendência, representada pelo gru-
po de Genebra, através de Bronckart (1999), Schneuwly e Dolz
(1994/1996) teve sua atenção voltada para o estudo dos gêneros na
perspectiva do ensino de língua materna, com forte apelo didático.
Seu foco de estudo é a linguagem como forma de ação significati-
va, em outras palavras, ação consciente do humano, representada
por um agir comunicacional. Nessa tendência, a linguagem existe
através de práticas sociais heterogêneas e diversas, que estão em
constantes transformações, constituindo-se como práticas lingua-
geiras caracterizadas em gêneros.
Em virtude da amplitude de aspectos a serem observados
quando do estudo dos gêneros, delimitamos como foco de investi-
gação neste trabalho a análise do gênero na área da Linguística
Aplicada, contemplando o aporte teórico metodológico do Intera-
cionismo Sociodiscursivo.
Para o ISD, a atividade de linguagem constitui-se em uma
forma autonomizada de atividade social e, como toda ação huma-
na, torna-se objeto de avaliações coletivas, de caráter metadiscur-
sivo. Tais avaliações produzem ações específicas, as ações de lin-
guagem. A esse respeito, Bronckart (1999, p. 46) esclarece que

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as produções vocais iniciais são objetos de avaliações per-


manentes do meio social; e é a apropriação, pela criança, dos
critérios dessa avaliação que transforma as produções inici-
ais em ações de linguagem, ao mesmo tempo que ela se
transforma em agente verbal, capaz de gerenciar as inten-
ções e motivos de seu dizer.

A partir das colocações do referido autor, é possível dedu-


zir que a avaliação social é fundamental para o desenvolvimento
do homem como agente verbal capaz de agir por meio do seu di-
zer, pautado por intenções e motivos. Para tanto, segundo Bron-
ckart (1999), o homem deve dispor, como para outras ações, de um
conhecimento dos mundos representados, do qual se apropria
durante as interações sociais e verbais.
Conforme Habermas (apud BRONCKART, 2006), três tipos
de mundos podem ser distinguidos: o objetivo, o social e o subjeti-
vo. O primeiro refere-se aos aspectos do meio físico, isto é, aos
conhecimentos sobre o universo material produzido na sócio-
história do homem. O mundo social, por sua vez, relaciona-se aos
conhecimentos coletivos a respeito das regras, convenções e valo-
res construídos por um determinado grupo implicado numa ativi-
dade social. Já o mundo subjetivo está relacionado aos conheci-
mentos acumulados sobre as características de cada um dos indi-
víduos engajados em uma determinada tarefa.
Segundo Bronckart (1999, p. 188) os três mundos haberma-
sianos constituem-se como sistemas de coordenadas formais, em rela-
ção aos quais qualquer agir humano exibe pretensões à validade e a
partir dos quais se exercem avaliações e/ou controles coletivos.” Dessa
forma, para o referido autor, qualquer agir possui pretensões à
verdade dos conhecimentos, dada a sua produção acontecer no
contexto do mundo objetivo, o que implica uma dimensão deno-
minada de agir teleológico. Sobre tal dimensão, o autor ressalta que
pode transformar-se em um agir estratégico, quando a situação en-
volver participantes humanos a respeito dos quais é necessário ter
um conhecimento objetivo. Por outro lado, pelo fato de ser produ-
zido em determinado contexto social, todo agir se pretende em
conformidade com as regras e valores do mundo social, o que con-

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figura uma agir regulado por normas. Por fim, segundo o autor,
qualquer agir, por acontecer no contexto do mundo subjetivo, pre-
tende-se autêntico ou sincero em relação àquilo que as pessoas dão
a entender de si mesmas, originando a dimensão do agir dramatúr-
gico.
As ações de linguagem envolvem, portanto, conhecimen-
tos, que vão desde o aspecto sociossubjetivo (representações rela-
tivas às normas sociais e à imagem que convém mostrar de si
mesmo), passando pelo aspecto físico (representação dos parâme-
tros objetivos do ato verbal) até o aspecto verbal (conhecimento
que se tem sobre a língua e sobre os gêneros de texto em uso).
Constituem-se, dessa forma, em textos, materializados em gêneros
textuais que exibem características relativamente estáveis e estão
disponíveis como modelos indexados para as gerações contempo-
râneas e futuras (BRONCKART, 1999). Sobre o processo de elabo-
ração e materialização dos gêneros, interessa-nos o seu contexto de
produção e a organização textual.
O contexto de produção textual, conforme Bronckart (1999),
pode ser determinado pelo conjunto dos parâmetros que podem
influenciar o modo como um texto é organizado. Nesse sentido, o
autor apresenta dois conjuntos de fatores que exercem influência
sobre a organização textual: o primeiro relaciona-se ao mundo
físico e o segundo, aos mundos social e subjetivo.
Quanto ao contexto físico, no qual uma ação de linguagem
se desenvolve em um determinado espaço e tempo, quatro são os
parâmetros a serem considerados na produção textual: o lugar
físico da produção, o momento (extensão de tempo) da produção,
o emissor e o receptor do texto. Já no que se refere ao contexto so-
ciossubjetivo, deve-se considerar outros quatro parâmetros, relaci-
onados aos aspectos sociais (regras, valores, normas etc) e subjeti-
vos (imagem que se dá de si) da interação comunicativa: o lugar
social, a posição social do emissor, a posição social do receptor,
bem como o objetivo da interação.
Para Bronckart (1999), a organização textual pode ser con-
cebida como um folhado, cujas camadas superpostas são três: a
infraestrutura do texto, os mecanismos de textualização e os me-
canismos enunciativos. A primeira delas, a mais profunda, consti-

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tui-se pelo plano mais geral do texto, seus tipos de discurso, pelas
modalidades de articulação entre esses tipos de discurso e pelas
sequências que ele comporta. Os mecanismos textuais, que consti-
tuem a camada intermediária, por sua vez, são responsáveis, se-
gundo o autor, por criar séries isotópicas que contribuem para o
estabelecimento da coesão temática. Finalmente, na última cama-
da, estão os mecanismos enunciativos que contribuem em duas
frentes para orientar a interpretação do destinatário do texto: es-
clarecem os posicionamentos enunciativos e evidenciam as avalia-
ções sobre aspectos do conteúdo temático. No primeiro caso, são
as diferentes vozes que se expressam no texto que são responsá-
veis por revelar os posicionamentos enunciativos nele colocados.
No segundo, são as modalizações os mecanismos que traduzem as
avaliações em torno da temática tratada no texto.
Para este trabalho, interessa-nos, a infraestrutura textual,
no que diz respeito, especificamente, ao plano global do texto, que
se relaciona à organização do conteúdo temático no texto. Além
disso, temos como foco de interesse os posicionamentos enunciati-
vos materializados no gerenciamento das vozes nos resumos ana-
lisados.
As vozes, segundo Bronckart (1999, p. 326), “podem ser
definidas como entidades que assumem (ou às quais são atribuí-
das) a responsabilidade do que é enunciado”. Conforme o autor, é
a instância geral da enunciação que, em geral, assume diretamente
a responsabilidade do dizer, numa voz denominada por ele de
neutra.
No entanto, a instância da enunciação tem a faculdade de
colocar em cena outras vozes, que o autor classifica como: vozes de
personagens, que identificam os seres humanos ou agentes das
ações; vozes sociais representadas por determinada instituição soci-
al, grupos, prescrições e a voz do autor, que representa a voz do
próprio agente-produtor do texto / autor empírico, ou seja, aquele
que responde como o “agente da ação de linguagem” (PEREZ,
2011, p. 236). Essas vozes representam, evidenciam, legitimam e se
responsabilizam pelo o que é enunciado.
Uma vez expostos os pressupostos teóricos do ISD com os
quais trabalharemos em nossa análise, apresentamos na seção a

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seguir as referências teóricas que norteiam o nosso estudo do gê-


nero resumo.

2. O gênero textual resumo

O resumo é um gênero textual comumente definido como


uma condensação fiel de informações contidas em um determina-
do texto, de modo a conservar suas ideias essenciais, bem como a
progressão e o encadeamento de tais ideias (FIORIN; SAVIOLI,
2002). Sendo assim, a elaboração de um resumo exige o processo
de redução semântica ou sumarização. Segundo Machado (2002, p.
140), com base nos trabalhos de Van Dijk e Sprenger-Charolles,
por meio da sumarização, o leitor construiria “uma espécie de re-
sumo mental do texto, retendo as informações básicas e eliminan-
do as acessórias, chegando, ao final desse processo, à significação
básica do texto.” O termo “resumo”, dessa forma, segundo a mes-
ma autora, serviria tanto para indicar o processo de sumarização
como o resultado textual desse processo.
Durante a sumarização, Machado (2002) destaca que o lei-
tor utiliza, basicamente, dois conjuntos de regras/estratégias: o
apagamento e a substituição. Por meio do primeiro, são seleciona-
dos os conteúdos relevantes do texto, apagando-se informações
desnecessárias à compreensão ou redundantes. As regras de subs-
tituição, por sua vez, são responsáveis pela produção de novas
proposições, ausentes do texto original.
O gênero resumo pode figurar em diversas esferas comuni-
cativas, a exemplo da jornalística e da acadêmico-científica. Nesta
última, a produção do gênero se reveste de propósitos comunica-
tivos que vão desde a técnica de estudo, passando pela apresenta-
ção de propostas de trabalho a serem apresentadas em eventos
científicos, até o delineamento da estrutura de trabalhos integrais,
como é o caso dos resumos que antecedem artigos científicos, dis-
sertações ou teses, possuindo claramente a função de fornecer
elementos aos seus leitores para a tomada de decisão sobre a con-
sulta ou não ao texto original.

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Neste trabalho, dentre os resumos da esfera acadêmico-


científica, debruçamo-nos, especificamente, sobre os que precedem
artigos científicos publicados em periódicos especializados. Se-
gundo Motta-Roth e Hendges (2008, p. 94), tais resumos (ou abs-
tracts) têm o objetivo de “sumarizar, indicar e predizer, em um
parágrafo curto, o conteúdo e a estrutura do texto integral que
segue”, sendo assim utilizados para persuadir o leitor a ler esse
texto.
Machado (2002, p. 148) destaca que uma das características
mais diferenciadoras do abstract, a exemplo do que acontece com
os resumos de tese, é o fato de eles estarem “rigidamente subordi-
nados a normas acadêmico-científicas”, a exemplo do que ocorre
nas normas para publicação dos periódicos ou mesmo naquelas
para apresentação de resumos de diferentes congressos.
Conforme Motta-Roth e Hendges (2008), a estrutura básica
desse tipo de resumo deve refletir o conteúdo e a estrutura do tra-
balho que resume, podendo, assim, como o artigo acadêmico,
apresentar a forma de revisão de literatura ou experimental.
No caso dos resumos que antecedem artigos de revisão bibliográ-
fica, as autoras salientam que o objetivo é “situar o panorama atual
das reflexões críticas sobre os estudos teóricos aplicados de termi-
nologia” (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2008, p. 95), o que indica o
caráter teórico e não prático do texto original. Já nos resumos que
acompanham o artigo experimental, o objetivo é recuperar os dife-
rentes momentos que a pesquisa de natureza prática compreende.
Sendo assim, este resumo comporta a definição do problema, o
estabelecimento dos objetivos, a descrição do método, a apresenta-
ção dos resultados e a indicação da conclusão.
No que diz respeito à estrutura dos resumos, Araújo (1999),
ao estudar a organização textual em 12 resumos na área de Educa-
ção, especificamente, identificou a ocorrência mais frequente de
alguns elementos: a apresentação do tema ou problema, a indica-
ção do objetivo, a descrição da metodologia e a sumarização dos
principais resultados. Tal constatação conduziu a autora a concluir
que esses aspectos são encarados como obrigatórios na construção
do gênero resumo na área em foco. Por outro lado, a autora desta-

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ca que o elemento conclusão apareceu em 50% dos resumos anali-


sados por ela.
Para além da estrutura textual dos abstracts, Motta-Roth e
Hendges (2008) destacam como características linguísticas desse
gênero a utilização de verbos no pretérito composto e presente do
indicativo, da terceira pessoa do singular e da voz passiva. Além
disso, Graetz (1985 apud MOTTA-ROTH; HENDGES, 2008) pontu-
am a necessidade do uso de uma linguagem econômica, com sen-
tenças simples, evitando redundâncias e excesso de detalhes. Ma-
chado (2002), por sua vez, alerta para o fato de as características
linguístico-discursivas do resumo poderem sofrer variação, a de-
pender diretamente do seu próprio contexto de produção. Partin-
do dessa compreensão, a seguir apresentamos a análise dos resu-
mos que constituem o nosso corpus.

3. A análise dos resumos produzidos nas áreas de Jornalismo e


Educação

O nosso corpus de análise é composto por quarenta resu-


mos, sendo vinte da área de Jornalismo e vinte da área de Educa-
ção, coletados de quatro periódicos brasileiros diferentes de cada
uma dessas áreas, com Qualis A e B. A opção por esta classificação
de Qualis foi feita por acreditarmos que, em tese, ela asseguraria
um maior rigor quanto à produção textual do gênero em análise.
Cabe destacarmos que os resumos analisados foram produzidos,
entre 2011 e 2012, pelos próprios autores dos artigos que antecedi-
am.
Uma vez constituído nosso corpus, buscamos realizar uma
análise, nos resumos coletados, tomando como ponto de partida
características em comum ou não entre as duas áreas em foco, no
que diz respeito à sua planificação textual e ao gerenciamento das
vozes. Sendo assim, nossa análise está dividida em dois momen-
tos: primeiramente, a análise dos resumos da área de Jornalismo e,
em segundo lugar, os resumos da área de Educação.

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3.1 O que nos revelam os resumos analisados que antecedem


artigos científicos na área de Jornalismo?

Antes de partirmos para análise dos resumos propriamente


dita, salientamos que os periódicos da área de Jornalismo consul-
tados para a coleta dos resumos não constavam de direcionamento
para a escrita do gênero, salvo a indicação de quantidades de pa-
lavras no corpo do texto, o número de palavras-chave, tamanho de
letra e fonte. Em outras palavras, não foi prescrita a estrutura a ser
seguida, pelos autores, para a escrita dos resumos em nenhum dos
quatro periódicos pesquisados para este estudo, o que nos conduz
a crer que os autores desses resumos foram norteados pelos co-
nhecimentos adquiridos sobre a estruturação do gênero em sua
comunidade discursiva.
A planificação dos resumos da área de Jornalismo aqui
analisados assume formatos variados, envolvendo temas os mais
diversos, objetos de discussão dos artigos resumidos. Para melhor
visualizarmos o plano global dos resumos analisados, observemos
o quadro a seguir:

Quadro 1: Plano Global dos resumos analisados na área de


Jornalismo

Re- Qua- Con- Obje- Fund. Meto- Resultados


vista lis text. tivo Teórica dologia ou con-
clusão
R 01 B5 04 05 03 03 00
R 02 B2 05 05 03 02 02
R 03 A1 05 05 02 03 04
R 04 A2 03 04 01 03 00
Total - 17 19 09 11 06

Dos vinte resumos analisados na área de Jornalismo, cons-


tatamos que dezenove apresentam objetivos; dezessete, a contex-
tualização; onze, a metodologia; nove, o referencial teórico e seis,
os resultados obtidos. Sendo assim, a partir deste panorama, iden-

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tificamos que a ênfase nos resumos analisados se dá na contextua-


lização e nos objetivos dos artigos resumidos. Como exemplo des-
sa constatação, observemos o texto a seguir:

Exemplo 1:

O LABORATÓRIO DOS DESENHISTAS: SOCIABILIDADE


POLÍTICA ENTRE OS CARICATURISTAS ARGENTINOS
(1930-1960)

O objetivo consistirá em reconstruir o coletivo de artistas hu-


morísticos e as suas relações, assim como as suas filiações e
desenvolvimentos em publicações de diversas índoles. Toma-
remos como ponto inicial Tia Vicenta em agosto de 1957 e como
ponto final o lançamento de Primeira Planta, em Novembro de
1962 (mais seu passado de formação profissional em 1930 e
1940). Estes vínculos tinham a forma de uma rede, uma sociabi-
lidade ou o círculo artístico?

Nesse exemplo, é possível percebermos, logo em primeiro


plano, a apresentação do objetivo da pesquisa resumida, caracteri-
zando a preocupação do autor em situar o leitor a respeito de seu
propósito com o desenvolvimento do estudo. A seguir, vislum-
bramos a tentativa do autor, ainda que de forma parcial, de expor
aspectos referentes à metodologia do estudo. Por fim, o autor con-
clui seu texto, de forma inusitada, com o lançamento de uma ques-
tão, possivelmente norteadora de seu estudo, em vez de apresentar
resultados ou conclusões a que chegou ao final da pesquisa. Dessa
forma, a planificação deste resumo não cumpre plenamente com o
propósito comunicativo do abstract, que é esclarecer o leitor sobre a
conveniência de consultar o texto integral, visto que não indica os
resultados ou conclusões do estudo resumido.
A maioria dos resumos analisados evidenciou traços da
linguagem jornalística, ou seja, com forte caráter informativo, obje-
tivando “tornar o leitor ciente de novas informações científicas que
lhe possam ser úteis” (MACHADO, 2002, p. 145). Aparentemente,
os textos analisados não cumpriram o propósito principal de dire-

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cionar o leitor a consultar o artigo científico, mas o de apresentar


informações sobre a temática abordada. Essas informações, a prin-
cípio, aparecem no início ou logo após os objetivos, ou seja, em
uma parte do texto, por nós, denominada, de contextualização, em
que os autores situam o leitor sobre o objeto de estudo, como po-
demos observar no exemplo a seguir:
Exemplo 2:

CASO ELOÁ NO JORNAL DA RECORD: UMA LEITURA SE-


MIOLÓGICA

O Caso Eloá, de 13 a 17 de outubro de 2008, impactou o país.


Foi um sequestro, com morte de uma adolescente, que superou
100 horas de duração. Teve um final trágico. A sua representa-
ção, através dos discursos do Jornal da Record é o objeto de
estudo do presente ensaio. Para tanto, iremos disponibilizar
alguns pressupostos da Semiologia, de Roland Barthes, para
compreendê-lo e explicá-lo em sua produção de sentido.

No exemplo 2, a contextualização é o primeiro aspecto a ser


apresentado no texto: “O Caso Eloá, de 13 a 17 de outubro de
2008, impactou o país. Foi um sequestro, com morte de uma ado-
lescente, que superou 100 horas de duração. Teve um final trági-
co”. Nesta, há uma ênfase na informação, na qual percebemos a
estrutura típica do gênero notícia: o que “O Caso Eloá”, quando “
de 13 a 17 de outubro de 2008” e como “ Foi um sequestro, com
morte de uma adolescente... Teve um final trágico ”.
Inferimos, assim, que, pelo fato de os resumos publicados
nos periódicos da área de jornalismo estarem direcionados aos
leitores desta área, e também considerando que não havia prescri-
ção para a escrita destes, os escritores fizeram uso de característi-
cas específicas dos gêneros textuais que costumam redigir, caracte-
rizando sua inserção nessa área de conhecimento. Tais característi-
cas são expressas pelo uso de verbos no passado genérico, além de
outras marcas linguísticas que caracterizam a linguagem informa-
tiva jornalística, em especial a notícia.

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Ainda no exemplo 2, temos como parte integrante do re-


sumo a referência aos pressupostos teóricos da Semiologia, especi-
ficamente, ao teórico Roland Barthes. A indicação da referência
nos resumos aparece como um elemento recorrente em nove dos
vinte resumos analisados, delineando-se como uma característica,
se não predominante nos resumos na área de Jornalismo, mas co-
mo um elemento importante para o processo de produção do gê-
nero.
Nesse sentido, observamos ainda que a maioria dos autores
dos resumos analisados não costuma expor uma posição direta
sobre o resultado da investigação, o que pode evidenciar, de um
lado, uma característica da linguagem jornalística, que pretende
ser “neutra”, ou mesmo, por outro, a neutralidade do discurso
científico. Vejamos, nesse sentido, o exemplo a seguir:

Exemplo 03

ESPORTE E SOCIEDADE MIDIATIZADA: O FUTEBOL AR-


GENTINO SOB AS LÓGICAS POLÍTICAS E MIDIÁTICAS

Analisa-se, neste artigo, as ações que os campos político e midi-


ático exercem sobre o campo esportivo durante a implantação
do programa de Futebol para todos os contextos da sociedade
em processo de midiatização. Através da análise Semiológica,
foram avaliados títulos de reportagens do jornal Clarín entre 23
de julho e 22 de agosto de 2009 bem como discursos de Cristina
Kirchner e Julio Grondona publicados nos websites da Casa
Rosada e da AFA.

As escolhas linguísticas para apresentar os objetivos do


trabalho, expressos no resumo acima, tendem a não expor o pes-
quisador sobre o que será analisado ou constatado na investigação.
Essa evidência é caracterizada pelo uso dos verbos na voz passiva
Analisa-se e foram avaliados, direcionando o foco da análise, ex-
clusivamente para o objeto a ser investigado. Assim, nos resumos
da área de Jornalismo aqui analisados, o posicionamento enuncia-
tivo neutro é uma constante, considerando que as marcas de autor

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empírico (eu, nós) aparecem apenas em três, dos vinte resumos


analisados. Tal fato nos leva a pensar que há, claramente, uma
tendência dos autores dos referidos resumos de não se implicarem
de forma direta naquilo que produzem como conhecimento.
No exemplo 4, apresentado a seguir, também é possível
vislumbrar uma linguagem em que não há marcas enunciativas do
autor, evidenciando a sua não implicação. A ausência de marcas
enunciativas foi observada no uso do verbo no presente genérico
“Este artigo analisa as implicações... Ele explora a questão de sa-
ber se uma forma mais interativa ”. Vejamos o exemplo 4:

Exemplo 4:

TECNOLOGIA DIGITAL E JORNALÍSTICA: IMPLICAÇÕES


PARA A DEMOCRACIA

A tecnologia digital trouxe mudanças radicais ao jornalismo e


as instituições sociais que serve. Jornalismo historicamente
tem desempenhado um papel central em os EUA e outras de-
mocracias, servindo como fonte primária de notícias e infor-
mações para os cidadãos sobre questões de importância públi-
ca. Este artigo analisa as implicações destas mudanças para a
democracia. Ele explora a questão de saber se uma forma mais
interativa de jornalismo vai produzir um eleitorado mais empe-
nhado e informado.

Neste exemplo, novamente a informação é que fica em


evidência, expressa no item contextualização: “A tecnologia digi-
tal trouxe mudanças radicais ao jornalismo e as instituições soci-
ais que serve... servindo como fonte primária de notícias e in-
formações para os cidadãos ... ”. É interessante notarmos que esse
aspecto toma quase toda a extensão do texto, o que denota sua
importância para a composição do resumo aqui em análise.
Passemos, agora, à análise dos resumos na área de Educa-
ção, partindo dos mesmos critérios que utilizamos para a análise
dos resumos na área de Jornalismo.

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3.2 O que nos revelam os resumos analisados que antecedem


artigos científicos na área de Educação?

No que diz respeito às orientações para a produção dos


resumos aqui em análise, cabe salientarmos que, dos quatro perió-
dicos consultados na área de Educação, apenas um prescrevia de-
talhadamente a estrutura do resumo a ser produzido: “objeto, ob-
jetivos, quadro teórico considerado, tipo de pesquisa/estudo reali-
zado e as conclusões”. Os demais apenas indicavam a necessidade
de descrição das partes do estudo resumido, a extensão do resumo
e o número de palavras-chave, assim como observamos nas regras
para a produção do resumo dos periódicos da área de Jornalismo
anteriormente analisados.
Os resumos aqui analisados nesta área incluem a diversi-
dade de temas relacionados ao estudo do campo educacional. Para
melhor visualizarmos como se apresentam no que diz respeito à
organização textual, observemos o quadro a seguir:

Quadro 2: Plano Global dos resumos analisados na área de Edu-


cação
Re- Qualis Con- Obje- Fund. Meto- Resultados
vista text. tivo Teórica dologia ou conclusão
R 01 B3 02 05 02 03 04
R 02 A2 01 05 01 03 04
R 03 B2 01 05 0 03 04

R 04 B3 02 05 00 03 03
Total - 06 20 04 12 15

Observando o quadro acima, podemos observar que os


resumos examinados na área de Educação, em sua maioria, con-
templam em seu plano global os objetivos, a metodologia e os re-
sultados dos estudos resumidos. Por outro lado, referências ao
quadro teórico dos estudos foram pouco recorrentes no corpus es-
tudado, uma vez que apenas quatro dos resumos investigados
apresentaram tais referências. Tal ocorrência pode ter a ver com o
fato de as normas de publicação dos periódicos consultados, em

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sua maioria, não apontarem a explicitação das bases teóricas dos


estudos como parte integrante da organização textual do gênero
resumo. Os objetivos dos estudos, especificamente, figuram como
um aspecto indispensável ao resumo, aparecendo em todos os
textos analisados da área. Os resultados, por sua vez, aparecem
como o segundo aspecto mais importante, em quinze dos vinte
resumos analisados. Nesse sentido, vejamos os exemplos 5 e 6 a
seguir:

Exemplo 5

A EDUCAÇÃO TUTORIAL: REFLEXÃO DE DOCENTES SO-


BRE SUAS PRÁTICAS

Este estudo tem como objetivo identificar os diferentes signifi-


cados produzidos sobre a Educação Tutorial a partir da experi-
ência de docentes do Programa de Educação Tutorial (PET). Fo-
ram entrevistados todos os tutores da região metropolitana de
Porto Alegre, elegendo uma análise qualitativa dos dados. Co-
nhecendo a maneira com que cada um trabalha com seu grupo,
seus pontos em comum e suas diferenças, se abre o debate sobre
o que é ser tutor e, assim, se gera a possibilidade de agregar di-
ferentes práticas de ensino. As práticas de Educação Tutorial se
consolidam a partir de uma necessidade brasileira de um ensino
superior de qualidade. Segundo os participantes, se rompe com
o modelo tradicional e cientificista, abrindo espaço produtor
de diálogos e articulação de diferentes saberes.

Exemplo 6

ANÁLISE DO DISCURSO DOS ESTUDANTES DA UNIVERSI-


DADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: EDUCAÇÃO PA-
RA A EMPREGABILIDADE?

No mundo do trabalho, as mudanças organizacionais e tecnoló-


gicas proporcionadas pela reestruturação produtiva representa-
ram mutações na forma de produção. Tais mudanças forjaram

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um novo tipo de trabalhador, mais polivalente e qualificado.


Nesse sentido, este artigo visa apresentar a análise do discurso
de alguns universitários da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro acerca da importância do curso superior nos seus pro-
jetos de vida profissional, aferindo se é possível depreender
de suas falas indícios da ideologia da empregabilidade. A no-
ção de empregabilidade remete àquilo que o trabalhador tem a
oferecer no mercado de trabalho, de tal maneira a tornar-se atra-
ente para os em pregadores. Podemos afirmar que os entrevis-
tados entendem perfeitamente quais são “as regras do jogo” e
não ignoram que título do ensino superior seja muito impor-
tante em seus projetos de vida.

No exemplo 5, podemos constatar a preocupação do autor


em evidenciar, em primeiro lugar, os objetivos do estudo ao qual
se reporta, uma característica recorrente em muitos dos resumos
analisados na área de Educação. Esse é um aspecto comum entre
as duas áreas analisadas, Jornalismo e Educação, no que diz res-
peito à organização textual, o que denota a relevância da apresen-
tação do propósito da pesquisa para as duas áreas, assim como
para qualquer comunidade científica.
Também é possível constatarmos no mesmo exemplo a ên-
fase na metodologia adotada, com a menção aos sujeitos da pes-
quisa, seu instrumento e natureza: “Foram entrevistados todos os
tutores da região metropolitana de Porto Alegre, elegendo uma
análise qualitativa dos dados.”. Igualmente, os resumos da área
de Jornalismo também evidenciaram a preocupação de seus auto-
res em explicitar aspectos metodológicos dos estudos resumidos.
Na análise do exemplo 5, ainda verificamos a apresenta-
ção dos resultados do estudo, com a clara intenção do autor do
texto de predizer ao leitor aquilo que ele poderá encontrar como
resultado do estudo em apresentação. Considerando a preocupa-
ção dos autores em evidenciar objetivos, metodologia e resultados,
observamos, assim, que a estrutura dos resumos em foco na área
de Educação parece buscar refletir o modelo do texto integral, na
tentativa de adequar-se à função desse gênero, que é esclarecer o
leitor sobre a conveniência de consultar o artigo resumido.

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No exemplo 6, também podemos examinar a expli-


citação dos objetivos, nesse caso, precedida de uma contextualiza-
ção sobre o objeto de estudo do artigo: o discurso de alunos do
Ensino Superior sobre a importância dessa formação para a em-
pregabilidade. Entretanto, diferentemente do que ocorre com os
resumos de Jornalismo aqui analisados, a contextualização não
aparece na área de Educação como um aspecto recorrente, já que
só figura em seis dos vinte resumos analisados em periódicos des-
sa área. Acreditamos que o aparecimento da contextualização rela-
cione-se ao fato de que, nas normas para elaboração dos resumos
no periódico onde este texto foi publicado, havia a indicação clara
da necessidade de apontar o objeto do estudo. Assim, a contextua-
lização, neste caso, funciona como um elemento que situa o leitor
sobre o objeto de estudo apresentado.
Nesse exemplo, novamente encontramos a apresentação
breve dos resultados da pesquisa: “Podemos afirmar que os en-
trevistados entendem perfeitamente quais são ‘as regras do jogo’
e não ignoram que título do ensino superior seja muito impor-
tante em seus projetos de vida.”, o que ilustra a preocupação do
autor do resumo em oferecer um panorama da pesquisa desenvol-
vida em termos de resultados.
No que diz respeito ao posicionamento enunciativo, assim
como nos resumos na área de Jornalismo, observamos uma ten-
dência dos resumos analisados na área de Educação a adotarem a
impessoalidade como estratégia para marcar a neutralidade como
uma das características do discurso científico, uma vez que em
dezesseis deles encontramos essa marca, enquanto apenas em qua-
tro os autores usam a primeira pessoa do plural, evidenciando-se
como autores empíricos do texto. Nos exemplos a seguir, é possí-
vel observarmos tal tendência:

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Exemplo 7

ENSINO SUPERIOR E A POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PRO-


FESSORES A PARTIR DA LDB/1996

O presente estudo documental apresenta um resgate histórico


sobre os principais aspectos das políticas de formação docente
após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de
1996, ressaltando as influências exercidas dos organismos inter-
nacionais em nosso país. Também destaca as políticas e progra-
mas no campo de formação do governo Luiz Inácio Lula da Sil-
va. Analisa as relações transformadoras da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) como
agência reguladora da formação docente. Constata-se que tais
políticas têm engendrado nova organização do trabalho acadê-
mico que reflete um modelo regulador das demandas globais de
formação de professores.

Exemplo 8:

CURRÍCULO E GESTÃO CURRICULAR: UMA REFLEXÃO

Este trabalho tem como objetivo fazer uma reflexão inicial sobre
o projeto pedagógico do curso de Administração da Universi-
dade Federal de Tocantins (UFT). É parte de uma pesquisa rea-
lizada em Ciências da Educação, especialidade de Desenvolvi-
mento curricular do Instituto de Educação da Universidade Mi-
nho (Portugal), no nível de doutorado. O procedimento adotado
é uma análise documental e qualitativa da Resolução do Conse-
lho Nacional de Educação e da Câmara de Ensino Superior
(CNE/CES) nº 4/2005 – que trata das Diretrizes Curriculares
Nacionais do Curso de Graduação em Administração (bachare-
lado) – e também do projeto pedagógico do Curso de Adminis-
tração da UFT. Concluiu-se que esse movimento da universi-
dade de planejar o currículo, na busca de superar a fragmenta-
ção do conhecimento promovido pela lógica da estrutura disci-
plinar, ainda está em processo de discussão inicial, imprescindí-

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vel no mundo globalizado, e que os professores do curso de


Administração da UFT encontram-se no nível de construção de
um novo modo de gerenciar
a prática curricular.

Nos exemplos 7 e 8, observamos as escolhas linguísticas


para marcar a neutralidade de posicionamento enunciativo dos
autores: a terceira pessoa no presente do indicativo (apresenta,
analisa, é), bem como o uso da voz passiva, analítica (adotado) e
sintética (constata-se, concluiu-se).
Sendo assim, podemos concluir que os resumos nas duas
áreas em análise estão em convergência no que se relaciona ao
posicionamento enunciativo, indicando a voz neutra como uma
tendência, marcada pela impessoalidade em trinta e três dos qua-
renta resumos examinados neste estudo.

Palavras finais

Para finalizar nosso estudo, gostaríamos de ressaltar que,


em nossa análise de resumos de periódicos das áreas de Jornalis-
mo e Educação, evidenciaram-se alguns aspectos semelhantes, mas
também alguns outros que se constituíram marcadamente como
diferenças. Do ponto de vista das semelhanças entre os resumos
analisados nas duas áreas, no que diz respeito ao posicionamento
enunciativo dos autores, verificamos uma tendência à voz neutra,
marcada principalmente pela impessoalidade.
Já no que se refere à planificação textual, constatamos que
objetivos e metodologia são aspectos do plano do texto predomi-
nantes nas duas áreas. Por outro lado, constatamos como diferen-
ças que, na área de Jornalismo, a contextualização e o referencial
teórico são aspectos mais frequentes, enquanto que, na área de
Educação, a apresentação dos resultados e/ ou da conclusão é
mais recorrente.
Sendo assim, foi possível chegarmos, por meio de nossa
análise da planificação textual dos resumos nas duas áreas, a duas
principais constatações. A primeira é que na construção dos resu-

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mos dos artigos na área de Educação aqui analisados os autores


privilegiam a apresentação dos objetivos, a metodologia utilizada
na pesquisa e a indicação de resultados ou conclusões, o que deno-
ta, possivelmente, uma preocupação de conservar a estrutura do
texto integral do texto resumido, considerando que a esses elemen-
tos é dada uma ampla relevância, quando da escrita dos artigos
científicos. A nossa segunda constatação é que, na produção dos
resumos na área de Jornalismo em foco neste trabalho, privilegia-
se a contextualização do estudo e a exposição dos objetivos, o que
parece indicar uma preocupação com o propósito comunicativo
mais geral da área, que é o de informar sobre o tema abordado nos
textos.
Para além disso, destacamos ainda o fato de que, em ape-
nas um dos periódicos, dos oito analisados, havia indicação dos
aspectos que deveriam ser contemplados na estrutura dos resu-
mos. Tal fato nos leva a crer que, na ausência de uma orientação, a
planificação dos resumos, nos dois casos, toma como referência
aquilo que cada comunidade acadêmica/discursiva considera im-
portante para a produção do gênero resumo. Nesse sentido, cabe
lembrar que a pequena ocorrência de referências às bases teóricas
nos resumos analisados pode estar associada ao fato de as normas
para a publicação dos resumos, na maioria dos periódicos investi-
gados, não indicarem esse aspecto como algo que deva figurar na
composição dos textos.
Diante das constatações anteriormente apresentadas, cor-
roboramos a posição de Silva (2012) de que a escrita nos diversos
contextos acadêmicos tem refletido maneiras diferentes de cons-
trução e apresentação de conhecimentos. Isso porque, efetivamen-
te, “as práticas de letramento acadêmicas teriam características e
convenções variantes motivadas pelas maneiras que as diferentes
disciplinas descrevem, recortam e categorizam a realidade.” (SIL-
VA, 2012, p. 102).
Nesse sentido, a ausência de uma homogeneidade nas prá-
ticas de letramento em diferentes áreas do conhecimento no que
diz respeito à produção dos gêneros acadêmicos e, em especial, do
gênero resumo, explicaria a ênfase em um ou outro elemento na
composição de seu plano global, tornando tal gênero apenas “rela-

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tivamente estável” (BRONCKART, 1999). Dessa forma, para que,


de fato, a escrita do resumo se concretize como uma ação de lin-
guagem situada, é fundamental que o ensino voltado à produção
desse gênero considere o trabalho com as convenções ou regras
que o acompanham, dentro de seu contexto real de uso, vislum-
brando os autores como efetivos participantes de uma determina-
da comunidade acadêmica/discursiva, que possui um modo pró-
prio de produzir e difundir o conhecimento.

Referências

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do trabalho do professor construídas nos e pelos textos: a perspectiva
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A INFRAESTRUTURA TEXTUAL
EM RESUMOS ACADÊMICOS NAS ÁREAS
DE NUTRIÇÃO E ARQUITETURA:
CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS
Joelma da Silva Santos (PROLING/ UFPB)
Tatiana Fernandes Sant´ana (PROLING/UFPB/UEPB)

Introdução

Partindo do princípio de que os textos são escritos e/ou fa-


lados para um determinado interlocutor, com um contexto social
definido e que visamos atender a propósitos comunicativos, os
estudos linguísticos, há algumas décadas, vêm defendendo que
escrevemos a partir de gêneros textuais, que, por sua vez, existem
para ordenar nosso agir socialmente, isto é, “precisamos aprender
o gênero para agir em sociedade” (KLEIMAN, 2007, p. 9), tendo
em vista que não falamos nem escrevemos sempre do mesmo jeito,
mas de acordo com a situação comunicativa envolvida.
Nesse contexto, a perspectiva que norteia nosso estudo é a
interacionista socio discursiva (ISD), proposta inicialmente por
Bronckart (1999), a qual tem como foco o desenvolvimento huma-
no. Para este autor, o ser humano é visto não meramente como um
ser cognitivo, mas também social, cultural e afetivo, fatores que
implicam diretamente a sua produção textual, uma vez que todo
indivíduo mobiliza representações individuais e coletivas, constru-
ídas ao longo de sua vida em interação com pares sociais, de acor-
do com as necessidades de comunicação.
Compreendendo, portanto, a relevância social de que nossos
textos são situados, ou seja, atendem a uma ação de linguagem, é
nossa pretensão analisar a infraestrutura textual de oito resumos

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 142

constitutivos como abstract - pertencentes a dois periódicos nacio-


nais, sendo quatro na área de Nutrição (dois qualis A2 e dois, B4) e
quatro na de Arquitetura (dois qualis A2 e dois B4), - observando
como as normas de publicação interferem em seu processo de ela-
boração.
Selecionamos estas duas áreas por se inserirem, segundo os
dados da CAPES, nas áreas das Ciências Sociais Aplicadas e a de
Saúde. No que se refere à Arquitetura, faz parte da construção
social da humanidade, tendo em vista que o ser homem sempre
buscou formas de viver de acordo com suas necessidades atuais,
procurando abrigo como forma de sobrevivência1.
Esta área é resultado da junção de outras independentes, a
saber, Arquitetura e Urbanismo e Design, que possuem identida-
des e produções próprias, embora apresentem interseções entre si
em alguns aspectos. Sendo assim, a Arquitetura envolve o Urba-
nismo no sentido de planejamento social para construções de ci-
dades, regiões e territórios, a fim de que sejam ordenados, mas,
também, envolve Design (projeto), no que se refere à intervenção e
à construção humana, quanto às mudanças de mobiliário até às
paisagens naturais e/ou locais. No âmbito educacional, o ensino
da Arquitetura é formado a partir dos vários movimentos históri-
cos, surgindo no século XVII e se prologam até os dias atuais.
A área de Nutrição, por sua vez, também tem como objeti-
vo a relação social com o homem e seu desenvolvimento, porém
abrange processos biológicos em que os organismos (animais e
vegetais), utilizando-se de alimentos, assimilam nutrientes para a
realização de suas funções vitais. Uma das metas dessa área é in-
vestigar e controlar a relação do homem com o alimento para con-
trolar a saúde humana. É papel, portanto, do nutricionista selecio-
nar e programar uma alimentação saudável para o desenvolvi-

1 As informações referentes à área de Arquitetura foram retiradas de um


link da CAPES, disponível no seguinte endereço eletrônico:
http://posarq.ufsc.br/files/2010/11/Criterios_Qualis_2008_29.pdf.
Acesso em: 20-10-2013. Já os dados de nutrição encontram-se disponíveis
em: http://guiadoestudante.abril.com.br/profissoes/saude/nutricao-
687250.shtml

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mento social, cognitivo e afetivo do ser humano, podendo atuar


em diferentes instâncias sociais, como hospitais, restaurantes, ho-
téis, asilos, dentre outros.
Na área de ensino, o currículo de nutrição é formado pelas
disciplinas da área médica (fisiologia, anatomia e bioquímica),
sendo a maior parte do curso voltada à formação profissional, com
ênfase em aulas teóricas e, em sua maioria, aulas práticas. É nas
aulas práticas que os discentes aprendem como preparar, conser-
var alimentos e investigar como ocorrem as transformações sofri-
das pelos alimentos.
Dessa forma, partindo de áreas tão distintas, decidimos ob-
servar como o gênero resumo se apresenta validado, uma vez que,
no caso de um artigo a ser submetido a um periódico, o resumo
consiste no primeiro contato que o avaliador tem acerca do texto
como um todo, por isso, presume-se que suas ideias devem ser
claras, com objetivos e fundamentação bem definidos, sem impli-
car, necessariamente, uma reprodução de conhecimento (GUIMA-
RÃES SILVA; DA MATA, 2002).
Sendo assim, acreditamos ser relevante o estudo em foco,
haja vista apresentarmos e discutirmos como se configura a execu-
ção do gênero resumo, bem como por compreendermos que é
através da escrita que desempenhamos papéis sociais diversifica-
dos, ou seja, essa mesma diversidade se aplica ao resumo, que,
embora seja um gênero acadêmico de relativa estabilidade quanto
à estrutura composicional (BAKHTIN, 1979), pode apresentar ca-
racterísticas diferentes ou não, dependendo de quem, para quem e
como escreve (MACHADO; LOUSADA; ABREU-TARDELLI,
2004).
Para tanto, a discussão dos dados apresentados está apoia-
da na perspectiva do ISD (BRONCKART, 1999; 2006), que apresen-
ta como um modelo de análise de compreensão de produção tex-
tual um folhado, formado por três camadas superpostas: a infraes-
trutura geral do texto, os mecanismos de textualização e os meca-
nismos enunciativos, sendo o primeiro a ênfase deste nosso traba-
lho.
Este capítulo segue, portanto, organizado em quatro seções
temáticas: na seção (1), a seguir, procuramos refletir sobre o intera-

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cionismo sociodiscursivo e o plano global do texto; na (2), trare-


mos as discussões teóricas sobre o gênero acadêmico resumo abs-
tract; na (3), apontaremos o contexto da pesquisa; e, por fim, na
seção (4), apresentaremos e discutiremos o plano geral dos resu-
mos selecionados, seguido das considerações finais.

1. O interacionismo sociodiscursivo e o plano global do texto

Bronckart (1999), ao abordar a perspectiva do interacionismo


sociodiscursivo, considera a linguagem como uma condição humana
e social, fruto de um processo histórico. Para tanto, congregou vá-
rios estudos: o interacionismo social, proposto por Vygostsky; a
teoria dos signos, nos termos de Saussure; a teoria da linguagem,
fundamentada no círculo de Volochinov e Bakhtin; e o agir comu-
nicativo, defendido por Habermas.
Em relação a este último, o agir comunicativo é constitutivo
pelo aspecto social humano, tendo a linguagem como forma de
negociação transindividual, veiculada através de representações
coletivas do meio, conhecidas por mundos representados (conhe-
cimentos coletivos, acumulados e construídos através de uma se-
mântica própria), associados a três formas ou aspectos da ação
humana: ação teleológica – voltada para o mundo objetivo; ação
regulada por normas – voltada para o mundo social; e ação drama-
túrgica – voltada para o mundo subjetivo.
Para Bronckart (1999), os mundos representados conse-
guem, em determinado instante, sincrônica e historicamente cons-
truído, ter controle das atividades humanas através de coordena-
das formais, pois o indivíduo plenamente desenvolvido é aquele
que, no confronto com a natureza, é dotado de capacidades cogni-
tivas e comportamentais e pode agir objetivamente; no confronto
social, ocupa um papel, uma posição e pode reconhecer as normas
da sociedade (aderindo ou não a elas); e, no confronto consigo, tem
propriedades pessoais inferíveis do seu estilo particular, e pode
reconhecer sua própria subjetividade. Indo mais além, paralela à
construção dos mundos está a capacidade de o sujeito se reconhe-
cer como objeto dessa avaliação no que se refere às suas pretensões

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de validade, questionando-se quanto às ações do interlocutor atra-


vés dos seus conhecimentos pessoais.
Esses conhecimentos são vistos como referentes à “ação de
linguagem” que, de acordo com Bronckart (1999), consiste nas es-
colhas (não só linguísticas, como também psicológicas e sociológi-
cas) que o agente-produtor pode fazer, durante a ação verbal.
Apesar de poder ser definida como um recorte da atividade social
que se realiza numa dada comunidade e que é imputada no ser
humano, esta ação é considerada pelo autor, em nível psicológico,
consistindo nas representações internas que cada agente possui
sobre sua responsabilidade na ação social.
Nesta última concepção, o contexto de produção e o conte-
údo temático estão articulados numa mesma interação verbal e são
fundamentais no momento da escolha de um gênero. O contexto
de produção refere-se à situação de interação em que o agente-
produtor está inserido e às representações em que o texto é orga-
nizado. Em relação aos parâmetros do mundo físico, num contexto
imediato, destacam-se: o lugar físico e concreto, onde ocorre a pro-
dução; o momento, a duração de produção do texto; o emissor, o
produtor físico do texto oral ou escrito; e o receptor, o recebedor
físico, concreto, do texto (BRONCKART, 1999, p. 93). Já em relação
aos parâmetros do mundo sociossubjetivo, exercendo influências
das normas, dos valores e das imagens de si, numa dada interação
social, destacam-se: o lugar, ou a formação social em que foi de-
senvolvida a produção verbal; o enunciador, encarado como o pa-
pel social que ocupa o emissor; o destinatário, tido como o papel
social em que ocupa o destinatário e o(s) objetivo(s) da interação,
o(s) efeito(s) que a produção pode gerar em seu receptor social
(BRONCKART, 1999, p. 94).
O conteúdo temático, por sua vez, pode ser visto como
aquilo que está explicitamente no texto, cujas representações são
constitutivas do próprio agente, uma vez que os conhecimentos
estão na memória do produtor e são organizados de forma lógica,
hierárquica e simultânea. Logo, a distinção entre os três mundos
não tem qualquer relevância, já que o foco são os temas a serem
verbalizados.

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No que se refere à materialização de um texto empírico,


Bronckart (1999) sugere que esta seja realizada em três estratos
hierárquicos que compõem um folhado textual, de maneira sobre-
posta e interdependente: a infraestrutura textual, constituída pelo
plano global do texto, os tipos de discurso, o conteúdo temático e
as sequências; os mecanismos de textualização, representados pelos
níveis de conexão e de coesão (nominal e verbal); e os mecanismos
enunciativos, representados pelos procedimentos que indicam o
posicionamento do autor do texto em relação ao tema, como as
modalizações e as vozes.
A infraestrutura consiste no primeiro e mais profundo nível
do texto, sendo composta pelo plano geral (que é a organização
temática do texto); pelos tipos de discurso (que são as formas de
organização linguística presentes nos textos) e pelas sequências
que nele estão presentes (que designa as sequências intratextuais
do plano geral do texto).
Em relação ao plano geral do texto, foco do nosso estudo, “é
determinado pela combinatória específica dos tipos de discurso,
das sequências e das outras formas de planificação que aparecem
no texto2” (BRONCKART, 1999, p. 249). Ele é responsável pelo
planejamento geral do texto, ou seja, é a organização mental que o
produtor faz antes de redigir seu texto, considerando, para isso, o
conteúdo temático, encaminhando o texto de forma linear, para
que quem leia, perceba o percurso e o encadeamento das ideias
centrais, bem como atente para o gênero, o lugar social de quem
escreve e o lugar social de seu receptor.

2. O gênero acadêmico resumo abstract

Para Medeiros (1991), o resumo tem como objetivo


apresentar as ideias presentes no texto, visando fornecer elementos

2 Os scripts e as esquematizações, que constituem outras formas de plani-


ficação mais elementares. Juntos podem organizar a totalidade de um
segmento pertencente a um mesmo tipo ou podem aparecer justapostos a
sequências (BRONCKART, op. cit., p. 152).

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que dispensem a consulta do texto original, tornando-se um


instrumento indispensável para o trabalho de pesquisadores que
podem, com ele, reduzir seu tempo de pesquisa. Nesse sentido, tal
gênero assume um importante papel na vida dos alunos
universitários, que se iniciam no domínio acadêmico-científico,
pois se encontra presente na construção de outros gêneros que
fazem parte de tal domínio e que serão constantemente utilizados
por eles durante sua vida acadêmica, como é o caso da resenha, da
conferência, dentre outros.
Para produzir um resumo, é consenso afirmar que é extre-
mamente importante que se compreenda o conteúdo do texto ori-
ginal e essa compreensão dependerá da sua complexidade e da
proficiência do leitor/autor que se propõe a resumi-lo. Além disso,
recomenda-se, primeiramente, ler o texto de forma global, buscan-
do saber de que o texto trata, posteriormente, relê-lo para identifi-
car as partes mais complexas, que não ficaram claras com a pri-
meira leitura, compreendendo o sentido de cada palavra relacio-
nal. Numa terceira leitura, deve-se segmentar o texto em blocos de
temas que apresentem uma unidade de significação. Por fim, de
acordo com Platão e Fiorin, (2002), resumir com palavras próprias
as ideias centrais, condensando os segmentos do texto na sequên-
cia em que nele aparecem.
Entretanto, os resumos dos mais variados tipos (indicati-
vos, informativos, críticos) não fazem parte apenas do meio aca-
dêmico, mas também da mídia impressa e digital, estando cons-
tantemente presentes em nossas vidas, em revistas, de circulação
nacional, por exemplo, que abrangem um público amplo de leito-
res. No entendimento de Matencio (2002), com base nos dados de
Marcuschi (2001), é feita uma retextualização da escrita para a es-
crita, na qual o autor do texto-base cria condições para, através de
um saber-dizer, divulgar a funcionalidade de seu saber-fazer, en-
volvendo relações com a intertextualidade e com a interdiscursivi-
dade.
Neste contexto, priorizaremos o resumo constituído como
abstract, conhecido como resumo acadêmico de planejamento de
trabalho (GUIMARÃES SILVA; DA MATA, 2002), ou ainda como
resumo acadêmico-científico, trata-se de uma produção em que

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 148

apresenta os resultados de um texto maior, seja uma monografia,


um relatório ou mesmo um artigo escrito, pelo mesmo autor, em
primeira ou em terceira pessoa, elaborado para divulgar pesquisas
em uma área específica, sendo que o autor para atingir esses pro-
pósitos comunicativos faz uso não apenas do contexto sócio histó-
rico cultural, mas também de estratégias cognitivas (BHATIA,
2001).
De acordo com Motta-Roth e Hendges (2010), o resumo
tem a função de sintetizar as ideias de um texto original mais ex-
tenso, de forma que o leitor seja apresentado ao conteúdo de ma-
neira breve e objetiva, abordando aspectos como teoria, metodolo-
gia, objeto em foco e o objetivo do texto-fonte, para isso, segue
normas advindas do meio acadêmico, sejam elas originárias da
ABNT ou definidas por uma comissão de avaliação que emitirá
um parecer favorável ou não.
Porém, o que vai diferenciá-lo daquele enviado para anais
de um congresso é o propósito comunicativo, ou seja, o que é en-
viado para um periódico é elaborado após a conclusão de um arti-
go, por exemplo, com o propósito de apresentar, em linhas gerais,
as partes principais de sua produção, uma vez que a pesquisa já foi
concluída. Já o que é enviado como condição para submissão em
um evento, quase sempre, é elaborado com a pesquisa ainda em
andamento, enfatizando, entre outros aspectos, os resultados par-
ciais. Podemos, então, enquadrar o gênero estudo no conceito de
gênero secundário, tal como proposto por Bakhtin (2003), tendo
em vista que ele é originário de uma esfera científica, que tem co-
mo foco informar ao leitor do periódico, seja à comissão científica
ou aos leitores dos periódicos, os conteúdos gerais do artigo.
Um aluno da área de Linguagem e um aluno da área de
Exatas, ao produzirem um resumo para se submeterem a uma ava-
liação de um periódico ou de um congresso, dificilmente escreve-
rão com a mesma estrutura textual, haja vista o contexto de rele-
vância retórica que é típico em cada área, pois como qualquer ou-
tro gênero, quem escreve busca se enquadrar dentro do propósito
comunicativo exigido pelo contexto em que está inserido. De acor-
do com Bhatia, (2001, p. 2):

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Os gêneros se definem essencialmente em termos do uso da


linguagem em contextos comunicativos convencionados,
que dá origem a conjuntos específicos de propósitos comu-
nicativos para grupos sociais e disciplinares especializados
que, por sua vez, estabelecem formas estruturais relativa-
mente estáveis e, até certo ponto, impõem restrições quanto
ao emprego de recursos léxico-gramaticais.

Dessa forma, dada sua grande utilização e circulação, em


meios impressos e eletrônicos, buscamos, neste trabalho, verificar
a produção destes resumos, procurando averiguar quais os aspec-
tos são enfatizados, por autores das áreas de Nutrição e Arquitetu-
ra, melhor apresentados a seguir.

3. Contextualizando a pesquisa

Nossa investigação parte do paradigma quanti-qualitativo


que, segundo Moreira e Caleffe (2006, p. 73), possibilita a “explo-
ração das características dos indivíduos e cenários que não podem
ser facilmente descritos numericamente”.
A nossa pesquisa teve início ao participarmos do projeto
Ateliê de Textos Acadêmicos (ATA), vinculado ao Grupo de Estu-
dos em Letramentos, Interação e Trabalho (GELIT/UFPB), o qual
tem como macro objetivos: verificar as diferentes faces do letra-
mento acadêmico; analisar o processo de construção do conheci-
mento em relação à escrita de diferentes gêneros universitários e
identificar o lugar da teoria nas diferentes áreas de graduação. Na
primeira etapa, foi feito um levantamento deste gênero textual,
publicado em diferentes periódicos de divulgação nacional, nas
mais variadas áreas de atuação, dentre elas: saúde: publicações
vinculadas aos cursos de psicologia, medicina, odontologia e nu-
trição; humanas: aos de pedagogia, filosofia, literatura, direito,
linguística e jornalismo; e, por fim, exatas, aos de arquitetura e
matemática. Nós, como colaboradores do ATA, participamos deste
mapeamento, a partir do qual foi possível identificar o processo de
estruturação do gênero resumo abstract e elaborar um painel com
as características deste nas diferentes áreas pesquisadas.
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Em cada um desses cursos, constituíram-se como nosso ob-


jeto de análise vinte resumos, em quatro periódicos, dois entre A1
e B2 e dois entre B3 e C. Dentre estes, para efeito de análise, neste
capítulo, selecionamos um recorte de oito resumos, coletados ex-
clusivamente em periódicos eletrônicos, sendo quatro na área de
Nutrição (qualis A2 e B4) e quatro na área de Arquitetura (qualis A2
e B4), portanto, dois resumos em cada um dos periódicos nacio-
nais, assim distribuídos:

Área Qualis Características gerais dos periódicos selecionados

Nome do Ano Vo- Link de acesso


periódico de lume /
Publi- Nú-
cação mero
Nutri- A2 Metabolism: 2012 v. 61 http://www.metabolismjournal
ção Clinical and / .com/authorinfo
Experimen- n. 11
tal
Nutri- B4 Revista 2012 v. 37 http://revistanutrire.org.br/
ção Nutrire /
n.1
Arqui- A2 Revista 2011 v. 13 http://www.anpur.org.br/revis
tetu- Brasileira de / ta/rbeur/index.php/rbeur/artic
Ra Estudos n. 2 le/view
Urbanos e
Regionais
(ANPUR)
Arqui- B4 Revista 2011 v. 7 http://www.unisinos.br/_diver
tetu- Arquitetura- / sos/revistas/ojs/index.php/arq
Ra revista n. 1 uitetura/article/view
(UNISINOS)

Tabela I – Dados gerais dos periódicos selecionados para análise

3.1 Panorama geral das normas estabelecidas para as áreas de


Nutrição e Arquitetura

Antes de darmos início à análise da infraestrutura geral dos


resumos constitutivos como abstract selecionados, vamos apresen-
tar o que constam nos periódicos como normas de publicação nas
duas áreas.

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Em relação às normas da área de Nutrição, no que se refere


ao de qualis A2, verificamos que o periódico Metabolism: Clinical
and Expimental apresenta teorias/métodos, resultados e conclu-
sões, com no máximo 250 palavras. As normas enfatizam que não
devem ser incluídas as referências teóricas, e sim, abreviaturas de
forma resumida. Além disso, especifica que sejam citadas de três a
cinco palavras-chave, conforme mostra o quadro a seguir:

[...] todos os artigos, exceto para editoriais e comentários, devem


incluir um resumo estruturado de até 250 palavras. As informa-
ções relatadas no resumo devem resumir a lógica do estudo, os
métodos, os resultados principais e sua interpretação ou implica-
ções; ou fornecer um resumo sucinto no caso de mini-revisões. O
resumo deve ser dividido nas seguintes seções: Objetivo, Materiais
/ Métodos, Resultados, Conclusões. O resumo não deve incluir
referências e abreviaturas devem ser mantidas a um mínimo. Ao
final do resumo, 3-5 palavras-chave, que não aparecem no título
do artigo, devem ser fornecidas para fins de indexação e recupera-
ção de informação. Imediatamente após o resumo, uma lista das
abreviaturas, utilizadas no manuscrito, deve ser fornecida.

Quadro I – Normas gerais para os resumos da área de Nutrição, qualis A2

Já em relação ao periódico A2 da Revista Brasileira de Estu-


dos Urbanos e Regionais (ANPUR) as normas enfatizam apenas em
qual língua que deve ser escrito o resumo, sua extensão e quanti-
dade de palavras-chave, não mencionando a estrutura textual do
resumo, deixando, portanto, os autores “livres” quanto à organi-
zação do texto. Ver normas no quadro que segue:

Um resumo em português e outro em inglês, contendo entre 100


(cem) e 150 (cento e cinquenta) palavras, com indicação de 5 (cin-
co) a 7 (sete) palavras-chave.

Quadro II – Normas gerais para os resumos da área de Arquitetura, qua-


lis A2
Quanto aos demais periódicos, identificamos que: na área
de Nutrição, a Revista Nutrire, B4, as normas, exigem apenas que o

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resumo seja escrito em português e espanhol, como também de-


termina a extensão do resumo e a quantidade de palavras, diferen-
temente do periódico da revista de Nutrição A2, a qual aponta
para a estrutura textual do resumo (Objetivo, Materiais / Métodos,
Resultados, Conclusões).
No periódico B4, por sua vez, da área de Arquitetura, Re-
vista Arquiteturarevista (UNISINOS), as normas solicitam que o
resumo destaque um tema específico, assim como determina quem
pode submeter seus resumos para avalição em tal revista, consta-
mos também que a mesma não prioriza a organização textual do
resumo, conforme nos mostram as normas expostas no quadro a
seguir:

Qualis B4 - Um resumo em português e outro em inglês,


Nutrição contendo entre 100 (cem) e 150 (cento e cinquen-
ta) palavras, com indicação de 5 (cinco) a 7 (sete)
palavras-chave.
Qualis B4 – Reflexões sobre a arquitetura contemporânea;
Arquitetura publicações de doutores ou de mestrandos e seus
orientadores; publicação eletrônica; Publicações
em português, em inglês e em espanhol; Cada
parte é seguida da tradução em outra língua *
inglês; Resumo em até 20 linhas acompanhado
de pelo menos três palavras-chave; Abstract em
inglês, seguindo as mesmas normas do Resumo.

Quadro III: Normas gerais para os resumos de Arquitetura e Nutrição,


qualis B4

Após termos apresentado as normas exigidas para cada pe-


riódico que constitui nosso objeto de análise, assim como termos
contextualizado as duas áreas em destaque, passaremos a apresen-
tar e discutir como se constitui a estrutura textual dos resumos
selecionados.

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3. 2 Plano geral dos resumos selecionados

Passemos a analisar as convergências e divergências entre


os oito resumos selecionados, tomando como base a organização
textual do gênero, apresentada a partir das informações da tabela
II a seguir:

Periódi- RN13 RN2 RA3 RA4


cos
Objetivo; Objetivo; Contexto; Contexto;
Metodolo- Metodolo- Objetivo; Objetivo;
A2 gia; gia; Justificati- Teoria;
Resultados; Resultados; va; Justifica-
Conclu- Conclu- Palavras- tiva;
sões; sões; chave Palavras-
Palavras- Palavras- chave
chave chave

Objetivo; Contexto; Objetivo; Contexto;


Metodolo- Metodolo- Contexto; Metodo-
B4 gia; gia; Teoria. logia (ti-
Resultados; Resultados; Palavras- po de
Conclu- Conclu- chave pesquisa);
sões; sões; teoria;
Palavras- Palavras- Resulta-
chave chave dos;
Palavras-
chave

Tabela II – Convergências e divergências na organização textual dos


resumos selecionados

3 As abreviações referem-se a: RN1, resumo 1 na área de Nutrição; RN2,


resumo 2 na área de Nutrição; RA3, resumo 3 na área de Arquitetura;
RA4, resumo 4 na área de Arquitetura.

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A) Convergências entre os resumos

Conforme nos mostra o quadro V, os resumos A2, da área


de Nutrição, encontram-se estruturalmente elaborados de acordo
com as normas definidas para publicação, apresentando objetivo,
metodologia, resultados, conclusões e palavras-chave. Todos se-
guiram a estrutura textual exigida para submissão ao periódico.
Quanto aos demais resumos analisados, dos periódicos B4
da área de Nutrição e dos A2 e B4 da área de Arquitetura, tendem
a seguir semelhante estrutura dos resumos A2 de Nutrição, diver-
gindo, apenas, em alguns momentos em sua organização textual,
visto que às vezes eles omitem contexto, metodologia e/ou con-
clusões. O que ficou mais evidente ao analisarmos estes (B4 da
área de Nutrição, A2 e B4 da área de Arquitetura) foi o fato de as
normas destes periódicos não indicarem orientações específicas
para a elaboração do texto, como já mostramos nos quadros II e III,
mas, mesmo assim, os autores, ao assumirem o papel social de
emissores, fazem uso de conhecimentos que estão disponíveis em
suas memórias, os pré-construídos relativos ao gênero resumo, de
forma sequencial, organizada e simultânea.
Em outras palavras, a impressão que temos é que a estrutu-
ra do resumo abstract é apreendida implicitamente entre as áreas e
as normas não precisam ser, necessariamente, um critério de acei-
te, uma vez que os resumos selecionados foram aprovados e pu-
blicados. Este resultado nos permite pensar a noção de gênero co-
mo fenômeno que transcende as especificidades de uma determi-
nada área de conhecimento e apresenta uma natureza de organiza-
ção genérica é multidisciplinar.
Os fatores que envolvem tais produções estão além do con-
texto sociocultural, abrangem ou envolvem também o social. Daí,
decorrerem algumas variações, tais como o periódico B4 de Arqui-
tetura exigir resumos apenas escritos por orientandos mestrandos
ou doutores e o B4 de nutrição reportar-se a palavras-chave como
“descritores”, tendo em vista as convenções gerais de sua área.
Mas, de uma forma geral, os oito resumos trazem em comum co-
mo estrutura textual uma organização temática do texto, apresen-
tada por objetivo, metodologia, resultado e/ou conclusões.

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B) Divergência entre os resumos

Para salientarmos as divergências principais entre os pe-


riódicos, iniciemos comparando os resumos pelos periódicos A2 e,
em seguida, pelas áreas, de uma maneira geral. Para discutirmos a
estrutura textual, segue um exemplo de cada área (qualis A2):
Resumo na área de Nutrição Resumo na área de Arquitetu-
(qualis A2) ra (qualis A2)
Um padrão de baixo teor de DESENVOLVIMENTO, RE-
gordura na dieta e o risco de GIÃO E PODER REGIONAL:
síndrome metabólica em mu-
lheres na pós-menopausa: Um dos mais importantes eco-
Iniciativa de Saúde da Mulher nomistas brasileiros e o de
maior projeção fora do Brasil,
Objetivo Celso Furtado, deixou uma
A nutrição desempenha um obra significativa sobre a eco-
papel importante na etiologia nomia brasileira e latino ame-
da síndrome metabólica. Nós ricana. Ocupou-se ao mesmo
examinamos se a Iniciativa de tempo da questão regional,
Saúde da Mulher (WHI) teria especialmente do Nordeste
modificação dietética influen- brasileiro. O nosso objetivo é
ciado risco de síndrome meta- tratar da evolução da econo-
bólica. mia brasileira sob o prisma do
desenvolvimento das regiões
Materiais / Métodos do país, na visão de Furtado.
48.835 mulheres pós- Esse tema foi abordado pelo
menopausa com idade entre autor, principalmente em duas
50-79 anos foram randomiza- de suas obras, que focamos
dos para uma dieta baixa em particularmente: ‘Formação
gordura (20% de energia a par- econômica do Brasil’ e ‘Uma
tir de gordura) (intervenção) política para o desenvolvimen-
ou dieta usual (comparação) to do Nordeste’ (GTDN). Bus-
por uma média de 8,1 anos. camos na obra desse autor e
Pressão arterial, circunferência em sua visão macroeconômica
da cintura e do jejum medidas e macroespacial uma contri-
de glicose no sangue, o HDL- buição para que se possa esta-
colesterol e triglicérides foram belecer um contraponto com a

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medidos em uma subamostra abordagem hoje prevalecente,


(n = 2816) no início e ano 1, 3 e ancorada no desenvolvimento
6 pós-aleatorização. A regres- local.
são logística estima associações
da intervenção com o risco de Palavras-chave: Celso Furtado;
síndrome metabólica e uso de desenvolvimento regional;
medicamentos para baixar o poder regional; Nordeste; Bra-
colesterol e hipertensão. Re- sil.
gressão linear múltipla testada
associações entre a intervenção
e componentes da síndrome
metabólica.

Resultados
No ano 3, mas não anos 1 ou 6,
as mulheres do grupo de in-
tervenção (comparação vs)
tiveram um risco não estatisti-
camente significativa, da sín-
drome metabólica (OR = 0,83,
95% CI 0,59-1,18). Modelos de
regressão linear simultanea-
mente modelar os cinco com-
ponentes da síndrome metabó-
lica revelou associação signifi-
cativa da intervenção com sín-
drome metabólica no ano 1 (p
< 0,0001), mas não em anos 3
(p = 0,19) e 6 (p = 0,17). As
análises restritas a intervenção
aderentes participantes refor-
çada associações em anos 3 (p
= 0,05) e 6 (p = 0,06). Redução
do colesterol e uso de medi-
camentos de hipertensão foi
19% inferior a 1 ano de inter-
venção contra as mulheres
comparação grupo (ou = 0,81,

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95% CI 0,60-1,09). Durante


todo o julgamento, menos in-
tervenção contra participantes
de comparação utilizado estes
medicamentos (26,0 % vs
29,9%), embora os resultados
não foram estatisticamente
significativos (p = 0,89).

Conclusões
O WHI dieta de baixa gordura
pode influenciar o risco de
síndrome metabólica e dimi-
nuir o uso de hipertensão e
para baixar o colesterol medi-
camentos. Descobertas têm
potencial para tradução clínica
significativa.

Abreviaturas: WHI, Iniciativa


de Saúde da Mulher, WHI-
DM, Saúde da Mulher Iniciati-
va de Testes modificação dieté-
tica, QFA, Questionário de
Frequência Alimentar, MS,
síndrome metabólica, IMC,
Índice de Massa Corporal,
LDL, lipoproteína de baixa
densidade, HDL, lipoproteína
de alta densidade.

Palavras-chave: Ensaios
clínicos, envelhecimento, gor-
dura dietética, síndrome meta-
bólica.

Tabela VI – resumos das áreas de Nutrição e Arquitetura – qualis A2

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Como podemos perceber, o quadro VI reforça a diferença


estrutural entre os periódicos A2 das duas áreas, como por exem-
plo: o de Nutrição é todo dividido por seções - objetivos, materi-
ais/métodos, resultados, conclusões, abreviaturas e palavras-
chave -, atendendo o que solicitam as normas de publicação do
periódico. Esta forma como está estruturado e escrito parece se
constituir de recortes de um texto maior, o artigo completo, sem
elementos coesivos entre suas partes, podendo ser remetido ao
discurso teórico autônomo, sem indicadores dêiticos e sem menção
a autores teóricos. Seus períodos preferencialmente começam com
números e abreviaturas, aliás, este último aspecto consiste num
dado inusitado, pois, na penúltima parte do resumo, vem explícita
a lista de abreviaturas, contendo as siglas e seus significados, para
auxiliar o leitor na compreensão do conteúdo temático, sendo isso
também uma exigência para a publicação, uma vez que tal tendên-
cia se repete nos demais resumos das duas áreas.
Com relação ao resumo apresentado no quadro VI, da área
de Arquitetura, podemos mencionar que este diverge do de Nutri-
ção no que concerne a sua estrutura textual. Além da série linear e
isotópica, não fragmentado ou topicalizado, e sim, constitui um
texto de corpo único, como sugerem as normas da ABNT, por
exemplo, detectamos nele o objetivo, a contextualização, a justifi-
cativa, a teoria e as palavras-chave, fazendo lembrar do relato inte-
rativo implicado, com referências explícitas aos parâmetros de
situação material de produção, estabelecendo um diálogo com o
leitor. Logo, o resumo de Arquitetura traz referencial teórico em
seu texto, embora sem menção explícita aos autores, já o de Nutri-
ção não sugere isso.
Partindo para as divergências entre as áreas, de uma ma-
neira geral, detectamos que nenhum periódico delimita a quanti-
dade mínima ou máxima de autores. Nos de Nutrição, encontra-
mos publicações que variam de 03 a 11 autores, enquanto que na
área de Arquitetura o número máximo oscila entre 01 e 03. Com
isso, podemos deduzir que a escrita e a produção do gênero resu-
mo nos dois periódicos A2 parecem ter uma forma específica de
conceber a organização e estrutura, porém, sem comprometer a
infraestrutura deste gênero como um todo. Disso, decorre, talvez,
a popularidade do gênero em discussão, pois quanto mais se é
divulgado ou produzido um determinado gênero, maior é a sua
variação de infraestrutura textual que circula socialmente.

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Outra diversidade é a não-delimitação de pessoa em que os


resumos deveriam ser escritos. Detectamos textos escritos tanto na
1ª pessoa do plural, quanto na 3ª do singular. A princípio, poderí-
amos pensar que na área de Nutrição, por estar voltada mais a
pesquisas de laboratório, a tendência seria a predominância de
resumos usando a impessoalidade, entretanto, encontramos
exemplos cujos autores se assumem na pesquisa, escrevendo na 1ª.
do plural. Portanto, esta característica independe da área, do pe-
riódico ou da classificação qualis. Mediante esta instabilidade das
formas linguísticas, mais uma vez, podemos enfatizar a não-
uniformidade na escrita acadêmica desse construto teórico nos
periódicos analisados, pois, quem escreve o faz para atingir um
determinado objetivo social, atendendo, assim, a situação comuni-
cativa e a uma versatilidade própria de quem produz.

Considerações finais

Como alunos-pesquisadores da área de Linguística, res-


saltamos que não é pretensão nossa tomar o modelo adotado pela
ABNT como o “correto”, a diferença entre os resumos apresenta-
dos está associada, muitas vezes, ao periódico a que estão vincula-
dos e também às convenções da área. A particularidade, talvez,
seja o fato de a função social do avaliador do abstract ser muito
relevante, já que o resumo é o primeiro elemento a ser lido quando
da submissão à avaliação pelo periódico. Logo, parece não haver
um padrão pelo que foi analisado, e sim, uma diversidade de
normas, uma versatilidade entre os autores e uma não-imposição
de formas linguísticas.
Diante do exposto, podemos concluir que, considerando as
áreas aqui analisadas, muitas produções não seguem normas cien-
tíficas nem tampouco garantem uma clarificação acerca do contex-
to das pesquisas apresentadas. Resta-nos, apenas, refletir sobre a
necessidade de ampliação da discussão acerca deste gênero, em
especial, sobre como sua infraestrutura textual está sendo conside-
rada nos periódicos de divulgação nacional, a fim de que os exem-
plos apresentados na área de Letras ou como propõem as normas
da ABNT, por exemplo, não sejam vistos como certos, imutáveis
ou únicos.

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Referências

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http://www.revistadeletras.ufc.br/rl23Art18.pdf. Acessado em
01/10/2013.
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por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999.
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A. R., MATÊNCIO; M. L. L. (Orgs.) Atividade de linguagem, discurso e
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Leitura e Redação. 16. ed.. São Paulo: Ática, 2002.
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http://online.unisc.br/seer/index.php/signo/article/viewFile/242/196.
Acessado em 21/06/2013.
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TARDELLI, Lília Santos. Resumo. São Paulo: Parábola Editorial, 2004.
MACHADO, Anna Rachel. Revisitando o conceito de resumos. In: DIO-
NÍSIO, Angela Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxi-
liadora (orgs). Gêneros Textuais & ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002,
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escola. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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(re)textualização em práticas acadêmicas: um estudo do resumo. In:
SCRIPTA, v. 6, n.11, p. 109-122, 2002.
MEDEIROS, João Bosco. Redação Científica: a prática de fichamentos,
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MOREIRA, H.; CALEFFE L.G.. Metodologia da pesquisa para o profes-
sor pesquisador. RJ: DP&A, 2006.
MOTTA-ROTH, Désirée; HENDGES, Graciela H.. Produção textual na
universidade. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

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RESUMOS DE ARTIGOS CIENTÍFICOS:


UMA ANÁLISE DO GÊNERO NOS
PERIÓDICOS DO CAMPO DA PSICOLOGIA
Renata de Lourdes Machado da Costa

Introdução

Trabalhos em Linguística Aplicada apontam a análise de


gêneros enquanto reflexo do comportamento linguístico de comu-
nidades discursivas específicas (BHATIA, 2001; BRONCKART,
1999). Partindo dessa constatação e com foco na didatização da
escrita acadêmica nos diferentes contextos de produção do conhe-
cimento, este estudo integra as pesquisas desenvolvidas no interi-
or do projeto “Ateliê de Textos Acadêmicos – ATA”, notadamente
no eixo de análise das condições de produção e da infraestrutura
geral (BRONCKART, 1999) do gênero, no cerne das diversas disci-
plinas.
Nesse sentido, ante nosso papel social enquanto psicóloga e
pesquisadora do Grupo de Estudos em Letramentos, Interação e
Trabalho – GELIT/UFPB, atuamos como colaboradora com o obje-
tivo de investigar o processo de elaboração e constituição de re-
sumos de artigos científicos publicados em periódicos do campo
da Psicologia. No percurso metodológico, selecionamos quatro
revistas de divulgação científica com base na representatividade
dos estratos indicativos de qualidade utilizados pela Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES1, sen-
do dois avaliados entre A1 e B2 e outros dois qualificados entre B3
e B5. Por conseguinte, delimitamos um número de cinco exempla-
res do gênero por periódico, o que totalizou um corpus de vinte

1 Avaliação Qualis CAPES 2012.

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resumos investigados. Centramos nossas análises nos parâmetros


sociossubjetivos de produção textual e na infraestrutura geral do
texto, tal como preconizados por Bronckart (1999).
Deste modo, apresentaremos, inicialmente, uma contextua-
lização sobre a produção do conhecimento no âmbito da Psicolo-
gia, que contempla o comportamento linguístico e a forma particu-
lar desta ciência veicular o saber sistematizado. Em um segundo
momento, exporemos os pressupostos teórico-metodológicos inte-
racionistas sociodiscursivos que sedimentam nossa análise do gê-
nero para, em seguida, adentrarmos na apreciação dos exemplares
de resumo objetos de investigação desta pesquisa. Por fim, pontu-
amos nossas contribuições ao projeto ATA a partir dos resultados
alcançados.

1. Contextualizando a produção do conhecimento em Psico-


logia

Falar sobre a produção do conhecimento em Psicologia é


abordar a diversidade e abrangência dos problemas que, na socie-
dade contemporânea, reclamam respostas de uma abordagem psi-
cológica (TOURINHO; CARVALHO NETO; NENO, 2004). Sobre
essa afirmação, podemos pontuar três desdobramentos: primeiro,
que o universo da Psicologia é multifacetado, haja vista a diversi-
dade de seus conteúdos, que acabam por absorver demandas em
várias direções; segundo, que é um campo pluricêntrico que atua
em diferentes contextos sociais – a respeito das áreas de saúde,
educação, justiça, trabalho, esporte, trânsito; por último, que é um
saber com diferentes enfoques teórico-epistemológicos, cada qual
imprimindo uma forma particular de compreender, simbolizar e
intervir nos estados subjetivos e no comportamento humano.
Silva et al. (2012) pontuam, então, que, enquanto disciplina
situada entre as ciências humanas e naturais, torna-se inviável
uma unificação da Psicologia por meio de uma paradigmatização
em torno de apenas uma única alternativa. O que faz com que
Bock, Furtado e Teixeira (1999), assim como Padro Filho e Martins
(2007), tratem de Psicologias, deixando bem marcado o uso do ter-
mo no plural.

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Sobre isso, Ryle (1984 apud TOURINHO; CARVALHO


NETO; NENO, 2004, p. 23) escreveu:
O abandono do sonho da Psicologia como contrapartida da
ciência newtoniana... envolve o abandono da noção de que
“Psicologia” é o nome de uma investigação ou conjunto de
investigações unitário. Assim como “Medicina” é o nome de
uma associação bastante arbitrária de investigações e técni-
cas mais ou menos vagamente conectadas, uma associação
que não possui, nem precisa de uma declaração de progra-
ma logicamente boa, assim “Psicologia” pode ser convenien-
temente usado para denotar uma aliança de investigações e
técnicas parcialmente fortuita. Afinal, não apenas o sonho de
uma ciência para-newtoniana era derivado de um mito, co-
mo, ainda, tratava-se de um mito vazio achar que havia ou
haveria uma ciência unitária... do mundo externo.

Soma-se a essa condição, a vicissitude de constituir-se en-


quanto campo do conhecimento no cerne do qual se articulam in-
vestigações reflexivas, empíricas e aplicadas, conforme categoriza-
ção de Tourinho (2003), resgatada em Tourinho, Carvalho Neto e
Neno (2004). Tendo como referência, pois, essa leitura, a Psicologia
se apresenta como disciplina que envolve, concomitantemente: a)
uma reflexão, sobre o comportamento e os processos mentais da
natureza humana; b) uma ciência, voltada para a identificação de
evidências lógicas e empíricas que dão suporte aos sistemas expli-
cativos; e c) uma profissão, que atua na solução de problemas psí-
quicos em suas relações cotidianas com a realidade.
Essa tríade remonta ao que Machado, Lourenço e Silva
(2000) denominaram de triângulo epistêmico da Psicologia. Isso por-
que salientam que esses três tipos de investigação estão inter-
relacionados de modo que podemos visualizá-los como vértices de
um triângulo equilátero. Legitimando a analogia dos autores su-
pracitados, Tourinho (2003, p. 21) salienta que

[...] as produções psicológicas estão mais propriamente situ-


adas na área interna desse triângulo, em diferentes pontos,
às vezes mais aproximadas de um ou de outro vértice, mas
sempre vinculadas a sistemas conceituais ou reflexivos sobre

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o homem, a evidências empíricas (experimentais, clínicas, ou


de outra ordem) e à perspectiva de solução de problemas,
sempre reguladas por conteúdos que guardam relação com
cada vértice.

Poderíamos acrescentar, além disso, que cada ponto no


interior da representação geométrica, mais próximo de uma ou
outra extremidade, reproduz, indubitavelmente e ainda, um con-
teúdo temático específico, um contexto social e uma abordagem
teórica, subjugados estes a um quadro maior, que é a Psicologia.
Assim, por exemplo, é oportuno um trabalho mais conceitual que
reflita sobre delinquência infanto-juvenil, no âmbito da justiça, sob
o prisma da abordagem psicanalítica; ao mesmo tempo, há de ser
possível uma pesquisa pretensamente empírica, que, aderindo aos
métodos da ciência moderna, investigue sobre cognição, com foco
na práxis educativa, a partir das contribuições de Jean Piaget à
psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem; ou, por fim, é
admissível termos uma produção que se incline mais para o vérti-
ce das investigações aplicadas, factuais, discutindo sobre o trans-
torno obsessivo-compulsivo, na esfera clínica/da saúde (através
de um estudo de caso, talvez), à luz da perspectiva comportamen-
tal. Destarte, temos a Psicologia retratada enquanto filosofia, ciên-
cia e profissão, respectivamente.
A partir desses apontamentos, podemos concluir que há
inúmeras possibilidades de se divulgar conhecimento em Psicolo-
gia e que, consequentemente, as comunicações da área veiculam
essa complexidade que perpassa o saber sistematizado. Pensando
nessas peculiaridades inerentes à disciplina, a American Psycholo-
gical Association – APA, enquanto maior e mais antiga entidade
organizativa da profissão e do saber psicológico em nível mundial,
estabeleceu, através da publicação de um manual, um conjunto de
procedimentos, designados style rules2, para a escrita científica que
orbita nesse universo.
Desse modo, uma vez que o processo de comunicação da
ciência e, particularmente da Psicologia, possui interesses específi-

2 Regras de estilo (tradução nossa).

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cos, linguagem exclusiva e atinge um conjunto seleto de consumi-


dores, ele é amparado por práticas e padrões de operacionalização
e escrita, que o distingue das publicações populares e informais,
conferindo segurança e credibilidade ao texto. Sobre isso, Trzes-
niak e Koller (2009, p. 21, grifos dos autores) ponderam que “o
texto científico deve ser claro, objetivo, preciso, comunicativo e estar
em linguagem correta. Isso quer dizer que o texto científico deve
ser... cientifico, e não literário ou coloquial”.
Pois que, hoje em sua sexta edição, o “Manual da APA”,
como é conhecido no Brasil, transmite, objetivamente, orientações
para a escrita científica, para a institucionalização do conhecimen-
to e, logo, para o avanço de fronteiras, sendo amplamente utiliza-
do por aqueles que compõem o ramo do saber psicológico e con-
sultado por demais pesquisadores, em especial das ciências huma-
nas e sociais.
No que concerne à disseminação do conhecimento, suas
diretrizes ponderam: “Research is complete only when the results
are shared with the scientific community. [...] the traditional medi-
um for communicating research results is the scientific journal”3
(MANUAL OF THE AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIA-
TION, 2010, p. 9). Assim, identifica e pormenoriza as categorias
em que se apresentam os discursos compartilhados em revistas
científicas no âmbito da Psicologia e, de maneira mais geral, das
ciências sociais e humanas, que são de cinco ordens: 1) revisão da
literatura; 2) trabalho teórico; 3) artigo sobre método; 4) estudo
empírico; e 5) estudo de caso. Cabe ressaltar que, procurando não
engessar o conhecimento, o manual alude que pode haver outros
tipos de comunicação, extremamente menos frequentes no campo
psicológico.
Essa maneira de abalizar a escrita parece se coadunar com a
proposta do triângulo epistêmico, sobrescritamente apresentada. Os
estudos que se propõem a revisar a literatura acabam por alvitrar
uma discussão crítica sobre a bibliografia já publicada; os traba-

3“A pesquisa se completa apenas quando os resultados são compartilha-


dos com a comunidade científica. [...] o meio tradicional de divulgação
dos resultados de pesquisa é a revista científica” (tradução nossa).

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lhos ditos teóricos visam refinar, intercambiar ou instituir constru-


ções teóricas. Do mesmo modo, os artigos sobre método têm como
finalidade refletir sobre as abordagens analíticas dos dados ou
estabelecer novos métodos de apreensão da realidade, o que per-
mite que as três categorias possam ser enquadradas, com maior
propensão, como investigações reflexivas. Paralelamente, os estu-
dos empíricos objetivam relatar um processo de pesquisa ou inves-
tigação prática, estando, predominantemente, aproximados do
vértice das investigações empíricas. Já os estudos de caso são rela-
tos de situações materiais obtidos ao se trabalhar com um indiví-
duo, um grupo, uma comunidade ou uma organização, inclinan-
do-se, sobremaneira, para as investigações aplicadas.
Essa contextualização inicial se faz necessária, pois, decidi-
damente, as publicações no campo da Psicologia estão, em graus
variados de relatividade, perpassadas por essa forma de conceber
o texto e divulgar o trabalho científico. E isso se estende à compila-
ção do resumo como parte integrante e indispensável aos artigos.
O Manual da American Psychological Association (2010, p. 25-26)
assevera que

An abstract is a brief, comprehensive summary of the con-


tents of the article […]. A well-prepared abstract can be the
most important single paragraph in an article. Most people
have their first contact with an article by seeing just the ab-
stract, usually in comparison with several other abstracts, as
they are doing a literature search. Readers frequently decide
on the basis of the abstract whether to read the entire arti-
cle.4

Corroborando essa ideia, Sabadini, Sampaio e Koller (2009)


igualmente afirmam que deve-se formatar o resumo em frases

4 Um resumo é uma breve e abrangente compilação do conteúdo do arti-


go [...]. Um resumo bem escrito pode ser o parágrafo mais importante de
todo o texto. Muitas pessoas têm seu primeiro contato com o artigo ape-
nas lendo o resumo, geralmente em comparação com vários outros resu-
mos, quando elas estão fazendo pesquisa literária. Leitores frequente-
mente decidem, com base no resumo, ler todo o artigo (tradução nossa).

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reunidas em parágrafo único e, ainda, que pesquisadores elegem,


a partir do resumo, os textos que serão lidos na íntegra. Assim,
para que o interlocutor decida pela leitura do artigo, é necessário
que, apesar de sucinto, ele seja denso de informações. Desse modo,
embora reforce que cada periódico é digno de diretrizes específicas
aos autores, os direcionamentos da associação recomendam que
cada categoria de texto contenha propriedades singulares, confor-
me podemos vislumbrar no quadro a seguir.

Quadro 1 – Propriedades singulares do resumo


a partir da categoria do texto

Categorias Propriedades do resumo


textuais
Um resumo de um artigo de revisão da
literatura deve descrever:

Revisão da • o problema ou relação sob investigação;


literatura • os critérios de elegibilidade;
• os tipos de participantes incluídos nos
estudos primários;
• os resultados principais;
• as conclusões (incluindo as restrições); e
• as implicações para a teoria e/ou a
prática.

Um resumo de um trabalho teórico deve


descrever:
Trabalho teórico
• o fenômeno da teoria;
• como a teoria ou modelo funciona;
• os princípios em que se baseia; e
• as articulações com resultados empíricos.

Um resumo de um artigo que reflita sobre


método deve descrever:

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Artigo sobre • a classe geral do método que está sendo


método discutido;
• as características essenciais;
• a eficiência metodológica;
• a gama de aplicação do método
proposto; e
• as propriedades dos procedimentos
estatísticos, no caso de dados
quantitativos.

Um resumo de um estudo empírico deve


descrever:
Estudo empírico
• o problema sob investigação;
• a amostra, especificando suas
características;
• a metodologia utilizada;
• os resultados básicos; e
• as conclusões e as implicações ou
aplicações.

Um resumo de um estudo de caso deve


descrever:
Estudo de caso
• as características relevantes do indivíduo,
grupo, comunidade ou
organização em questão;
• a natureza do problema ilustrado;
• possíveis soluções para o problema; e
• as questões a serem abordadas em
pesquisas subsequentes.

(Cf. MANUAL OF THE AMERICAN


PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION, 2010).

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No mais, de acordo com o manual, os resumos, em todas as


categorias, devem seguir a orientação de uma escrita precisa, que
reflita corretamente o conteúdo e o propósito do artigo; não apre-
ciativa, que relate, exponha ou descreva, ao invés de ajuizar; coe-
rente e legível, que apresente linguagem coesa e clara; e concisa,
que seja breve, tornando cada frase maximamente informativa.
Esses mesmos critérios parecem estar contemplados em
Granja e Grandi (1995) quando destacam que um resumo precisa:
ter clareza e precisão, sem redundância; incluir termos relevantes;
e utilizar a voz ativa, sempre que possível, tornando as expressões
mais diretas. “A leitura da história de sua pesquisa precisa permi-
tir que seja identificado exatamente o que foi feito e como foi feito,
sem a possibilidade de dar margem à imaginação de seus leitores”
(TRZESNIAK; KOLLER, 2009, p. 21).
Desse modo, a escrita de um texto cientificamente correto
leva em consideração um conjunto de normas mutuamente com-
partilhadas, que acabam por convencionalizar o gênero. É unani-
midade entre os que publicam e os que consomem ciência que
algumas regras táticas são fundamentais para uma escrita científi-
ca de boa qualidade (BHATIA, 2001; BRONCKART, 1999; MAR-
CUSCHI, 2005; SABADINI; SAMPAIO; KOLLER, 2009). No tocan-
te ao projeto ATA, essa regularidade, em especial, amarra o eixo
que analisa os parâmetros de produção e a arquitetura textual
(BRONCKART, 1999) nas diferentes áreas do conhecimento – on-
de, objetivamente, nos situamos – ao segundo eixo, voltado ao
processo de didatização da escrita.
Com base no exposto, na seção seguinte, nos debruçaremos
sobre os pressupostos teórico-metodológicos da perspectiva inte-
racionista sociodiscursiva para análise de texto.

2. O modelo de análise de textos do Interacionismo Socio-


discursivo

O modelo de análise textual utilizado neste estudo tem co-


mo marco a obra Atividade de linguagem, textos e discursos: por um
interacionismo sociodiscursivo (BRONCKART, 1999). Enquanto cor-

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rente do interacionismo social, o Interacionismo Sociodiscursivo


(doravante, ISD) concebe as unidades linguísticas como represen-
tações das condutas humanas. Acredita-se, portanto, que as ações
situadas, imputadas a agentes singulares – denominadas “ações
significantes” –, dentre elas, as ações de linguagem, fundam-se no
contexto da atividade, a partir das interações sociais.
Nessa direção, a linguagem, bem como sua gênese e desen-
volvimento, é idealizada como atividade social, produto de um
processo histórico de acumulação de signos e textos cristalizados
por gerações anteriores (porém em constante reelaboração) no seio
da cultura dos grupos humanos. Assim, ao passo que constrói as
representações socialmente compartilhadas e que instrumentaliza
o meio, a linguagem também contribui para delimitar as ações das
pessoas, moldando-as no conjunto de suas capacidades propria-
mente psicológicas, em um caminho que vai do interpessoal ao
intrapessoal, conforme postulou Vygotsky (1991, 2000). Isso assi-
nala que os organismos humanos adquirem traços internos a partir
de suas interações, linguageiras e praxiológicas, com a realidade
circundante.
No nível dos pré-construídos, os gêneros textuais são ins-
trumentos constitutivos e reguladores das práticas enunciativas
concretas. Eles são formas culturais e cognitivas da ação social;
entidades poderosas que limitam nossas ações de linguagem, im-
pondo restrições e padronizações (MARCUSCHI, 2005). Pois que,
segundo Bronckart (2006), qualquer produção discursiva implica,
necessariamente, indexação a uma espécie de texto, com as reser-
vas linguísticas que lhes são peculiares. Ao agente, destarte, por
efeito de seu conhecimento intuitivo e parcial do arquitexto de sua
comunidade verbal, cabe realizar o duplo processo de adoção de
um gênero textual estabilizado pelo uso coletivo e de adaptação à
situação real de interação linguageira.
Ante o exposto, Lousada (2010, p. 12) refere que

O objetivo do ISD é o de analisar as condições de funciona-


mento efetivo dos textos, partindo do princípio de que os
gêneros textuais são os produtos de uma atividade lingua-
geira coletiva, organizada pelas formações sociais e visando

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adaptar os formatos textuais às exigências das atividades ge-


rais.

A fim de atingir o desígnio da proposta interacionista soci-


odiscursiva, Bronckart (1999) propôs um padrão de análise de tex-
to, designado folhado textual, composto pela: infraestrutura global
textual, dividida, por sua vez, em plano geral do texto, tipos de
discursos e sequências; pelos mecanismos de textualização, racio-
nados em conexão, coesão nominal e coesão verbal; e pelos meca-
nismos enunciativos, constituídos pelas vozes e modalizações pre-
sentes na ação de linguagem. Subjugados estes estratos às condi-
ções de produção que dão origem ao texto. Esse capítulo, todavia,
tentando abarcar aquilo que se apresentou como mais significati-
vo, restringe suas análises às condições de produção textual e à
infraestrutura global do texto, que passamos a detalhar.
A respeito das condições de produção, o contexto pode ser
definido como o conjunto de elementos que são capazes de exercer
influência sobre a forma como um texto é organizado (BRON-
CKART, 1999). Envolvem parâmetros do contexto físico: lugar de
produção, momento de produção, do agente-produtor e receptor; e
do contexto sociossubjetivo, no quadro de uma formação social e
de uma interação comunicativa que implica normas e valores cole-
tivamente partilhados (OLIVEIRA, 2012), que abrange: o lugar
social, os papéis sociais dos interactantes e o objetivo da interação.
Já o conteúdo temático pode ser determinado pelo conjunto de
informações que são apresentadas no texto, traduzidas pelas uni-
dades declarativas da língua (BRONCKART, 1999).
Na dimensão do folhado textual, a primeira camada é consti-
tuída pela infraestrutura global do texto, que compreende a orga-
nização de conjunto do conteúdo temático (isto é, o plano geral do
texto), os tipos de discurso e as sequências, presentes na ação de
linguagem.
Sobre os tipos discursivos, podem ser de duas ordens: nar-
rar e expor. Nesta, as coordenadas gerais que organizam o conteú-
do temático de um texto são conjuntas à ação de linguagem; naque-
la, são apresentadas como disjuntas do mundo ordinário (BARROS,
2012). Ademais, no que concerne às instâncias de agentividade,

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podemos ter uma relação de implicação ou de autonomia. Conforme


salienta Pereira (2009), no primeiro caso, o texto implica os parâ-
metros da ação de linguagem, havendo referências dêiticas expres-
sas integradas ao conteúdo temático; e, no segundo, há a ausência
desses elementos, sem comprometimento de sua interpretação. Da
combinação de pares cruzados advêm os quatro tipos discursivos:
expor implicado, expor autônomo, narrar implicado e narrar autô-
nomo ou simplesmente: discurso interativo, discurso teórico, rela-
to narrativo e narração, respectivamente.
A conceptualização de sequência baseia-se em Adam (1990)
e envolve a organização linear do conteúdo temático. Assim, se-
gundo Bronckart (1999), quando na (re-)semiotização de um texto,
o agente-produtor aciona estruturas sintáticas que garantem o eixo
sucessivo das ideias que, por sua vez, acabam por se organizar
através das macroestruturas: narrativa, descritiva, injuntiva, ar-
gumentativa, explicativa e dialogal, selecionadas a partir das re-
presentações sobre o destinatário e o fim que persegue.
Sobre a ideia-força ou a característica principal de cada
uma das macroestruturas, Bronckart (1999, p. 237-238) elenca:

as operações criadoras de tensão, para as sequências narrati-


vas; operações destinadas a fazer ver, para a sequência des-
critiva e a fazer agir, para a sequência injuntiva; operações
que visam a resolver um problema ou a convencer, para as
sequências explicativa e argumentativa; operações destina-
das a regular a interação, para a sequência dialogal.

Com essa apresentação do método, passamos à seção se-


guinte em que, efetivamente, adentrarmos na apreciação dos
exemplares de resumos objetos de investigação desta pesquisa.

3. O gênero “resumo de artigo científico” em periódicos de


Psicologia

Com base na proposta metodológica interacionista socio-


discursiva anteriormente apresentada, fizemos uma análise de

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resumos de artigos científicos, publicados entre os anos de 2011 e


2012, nos seguintes periódicos do campo da Psicologia: “Psicolo-
gia: reflexão e crítica”, publicação da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul – UFRGS, Qualis CAPES A1; “Estudos de Psicolo-
gia”, publicação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
– UFRN, Qualis CAPES A2; “Gerais”, publicação interinstitucional
da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Universidade
Federal de Juiz de Fora – UFJF, Universidade Federal de São João
del-Rei – UFSJ, e Universidade Federal de Uberlândia – UFU, Qua-
lis CAPES B3; e “Estudos Interdisciplinares em Psicologia”, publi-
cação da Universidade Estadual de Londrina – UEL, Qualis CA-
PES B4. Delimitamos, assim, um número de cinco exemplares do
gênero por publicação científica, o que totalizou um corpus de vin-
te resumos investigados.
Haja vista que o gênero apresenta-se na forma variante
escrita e, portanto, monologada, não temos indícios para tratar do
contexto físico de produção. Mas, no tocante ao contexto socios-
subjetivo, os autores dos textos analisados investiram-se do papel
social de docente, discente e/ou psicólogo, com envolvimento
acadêmico e/ou profissional na área da Psicologia e vínculo com
uma instituição de ensino superior, todos com, ao menos, um obje-
tivo comum de disseminar o conhecimento técnico-científico, ori-
ginário de estudo ou pesquisa e, consequentemente, fazer avançar
a ciência. Tendo em vista que o periódico científico é um veículo
de comunicação entre pares (MIRANDA; PEREIRA, 1996), conjec-
turamos que os trabalhos publicados nos periódicos em questão
vislumbraram, como público alvo, interlocutores da comunidade
psicológica.
Articulada a esse meio de inserção social, a seção de apre-
sentação dos quatro periódicos investigados subdividem os ma-
nuscritos em categorias que se alinham à analogia do triângulo
epistêmico da Psicologia, incitada por Machado, Lourenço e Silva
(2000), à categorização de Tourinho (2003), também contempladas
em Tourinho, Carvalho Neto e Neno (2004), e às categorias textu-
ais levantadas pelo Manual da American Psychological Associa-
tion (2010), anteriormente discutidas.

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Nesse sentido, a revista “Psicologia: reflexão e crítica” se


propõe a publicar trabalhos inéditos nas categorias: relatos de pes-
quisa, artigos teóricos ou de revisão da literatura, comunicações
breves de prática profissional e resenhas. De modo semelhante, a
revista “Estudos de Psicologia” publica produções científicas que
se enquadrem nas categorias: relatos de pesquisa baseada em da-
dos empíricos, estudos teóricos, revisões críticas da literatura e
relatos de experiência profissional. O periódico “Gerais” divulga
estudos na forma de: relatos de investigação empírica, estudos
teóricos, relatos aplicados de prática profissional, resenhas e notas
técnicas. Por fim, a revista “Estudos Interdisciplinares em Psicolo-
gia” se apresenta como um periódico que propaga relatos de pes-
quisa empírica, estudos teóricos/ensaios ou de revisão da literatu-
ra, bem como trabalhos práticos implicados no fazer profissional
do psicólogo e resenhas de obras recentes na área da Psicologia.
Esse quadro geral demonstra a influência do contexto soci-
al mais amplo, já contemplado neste capítulo, em que os fazeres
psicológicos contemporâneos se apresentam enquanto espaços de
reflexão, ciência e profissão (TOURINHO, 2003). Os periódicos da
Psicologia, logo, consideram essa complexidade, abalizando para
os pretensos autores as áreas internas ao triângulo nas quais pode-
rão se situar cientificamente.
Ao encontro desse saber multifacetado, os resumos não
deixam de retratar, igualmente, a multiplicidade de objetos que a
Psicologia procura abarcar, os diferentes contextos sociais em que
está inserida e as diferentes abordagens teórico-epistemológicas
que a compõem enquanto disciplina. A esse respeito, Bock, Furta-
do e Teixeira (1999) referem que se perguntarmos a um psicólogo
comportamentalista qual o objeto de estudo da Psicologia, ele cer-
tamente responderia que é o comportamento humano; se a palavra
for dada a um psicólogo psicanalista, ele dirá que é o inconsciente;
outros informarão que é a consciência, outros, ainda, a personali-
dade. Cada um dos enfoques traz definições específicas desse obje-
to, uma vez que cada um deles aborda o homem de maneira parti-
cular – homem-corpo, o homem-afeto, o homem-pensamento, ho-
mem-ação, que ganham identidade e síntese singular, na Psicolo-
gia, através do termo “subjetividade”.

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Pois que, no que tange ao conteúdo temático, as produções


investigadas ilustram a diversidade do universo da Psicologia.
Discorrem, por exemplo, sobre motivação, inteligência, vínculo
afetivo, dinâmica familiar ou religiosidade a partir do escopo de
uma das pluralidades de enfoques teóricos e/ou de um dos cam-
pos de atuação profissional que constituem essa área. Luna (1988,
apud TOURINHO, 2003, p. 39), confirmando esses apontamentos,
refere que

o referencial teórico de um pesquisador é um filtro pelo qual


ele enxerga a realidade, sugerindo perguntas e indicando
possibilidades. É tão improvável que um psicanalista cogite
os efeitos da estrutura cognitiva de uma criança sobre seu
desempenho, quanto um piagetiano procure levantar infor-
mações sobre a resolução do complexo de Édipo das crian-
ças que estude.

Sobre isso, Bronckart (1999) salienta que as informações


constitutivas do conteúdo temático são representações construídas
pelo agente-produtor que variam em função de sua experiência,
portanto, nesse caso, efetivamente a partir da posição teórico-
epistemológica a que se filia e do contexto social em que atua.
O conteúdo temático, ao mesmo tempo, é, também, um dos
fatores que distinguem os interlocutores do texto. Isso porque,
dentro da comunidade leitora do universo da Psicologia, existem
subcomunidades definidas, exatamente, em função da perspectiva
teórica para qual o indivíduo advoga e/ou de sua área de atuação.
A partir de nossas análises, pudemos perceber, contudo, que indi-
cadores de filiação a determinado referencial teórico não estão,
muitas vezes, explícitos no texto, aparecendo, todavia, de forma
velada.
Para que fique claro o que estamos pontuando, tomemos
como exemplo um dos resumos investigados, da revista “Estudos
Interdisciplinares em Psicologia”.

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A PERFORMATIVIDADE NOS QUATRO DISCURSOS

Resumo
Pretende-se demonstrar que a tese lacaniana segundo a qual o sujeito se
constitui como efeito da cadeia significante baseia-se em uma noção de
estrutura da linguagem que abarca a inscrição do sujeito em um laço social.
Uma vez que a constituição do sujeito pela linguagem (S1-S2) produz um
sujeito divido ($) e um resíduo denominado objeto a (a), veremos que estes
quatro termos se ordenam, compondo os quatro tipos de discurso. Para tanto,
retoma-se as noções de alienação e separação, a fim de assinalar que o dis-
curso do mestre pode ser extraído dessas operações e ser pensado como
gesto constituinte de todo laço social. A fim de destacar o modo particular
pelo qual Lacan elabora a noção de estrutura da linguagem nela incluindo a
possibilidade de produção do sujeito e de inscrição em um laço social, abor-
da-se também a noção estruturalista de linguagem e a noção de performati-
vo, oriunda da filosofia pragmática da linguagem.
Palavras-chave: sujeito, performativo, discursos.

Fonte: Mello (2011, p. 72).

Como vemos, não há referência, ao longo do resumo, nas


palavras-chave ou no título do artigo à abordagem psicológica a
que o texto se encosta – Psicanálise –, entretanto, os trechos em
itálico realçam aquilo que é socialmente partilhado na Psicologia, e
mais intimamente nas discussões psicanalíticas, a saber: Jacques
Lacan é discípulo de Sigmund Freud; articulador da interface Lin-
guística-Psicanálise; mentor da teoria dos quatro discursos, com-
partilhada no cerne da teoria psicanalítica; as noções de “sujeito
dividido ($)” e “objeto a (a)” são fundamentalmente lacanianas,
caras ao domínio psicanalítico.
Nessa perspectiva, esses dados, implícitos ao resumo, res-
tringem, em potencial, os interlocutores do artigo, pois, provavel-
mente, aqueles que se inclinam para um enfoque mais positivista
ou fenomenológico, por exemplo, refutariam tal leitura, do contrá-
rio, aqueles que simpatizam com as formulações psicanalíticas
estariam mais propensos a contemplar o artigo. Isso ratifica aquilo
que discutíamos anteriormente, a partir das afirmações contidas
no Manual da American Psychological Association (2010) e das

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palavras de Sabadini, Sampaio e Koller (2009), de que o leitor dire-


ciona, com base no resumo, aquele texto que lhe convém apreciar
na íntegra.
Importante ressaltar, porém, que, mesmo as orientações do
Manual da American Psychological Association (2010) – enquanto
instrumento de normatização acolhido e citado pelos quatro pe-
riódicos pesquisados – não incitam que o agente-produtor infor-
me, no resumo, o(s) enfoque(s) teórico-epistemológico(s) em que o
texto se apoia. Isso corrobora nossa evidência de que os exempla-
res do gênero analisados, em sua maioria, não apresentam a pers-
pectiva teórica que subjaz ao artigo. E, no nosso entendimento,
essa ausência de informação contradiz a premissa de que um re-
sumo necessita ser claro, preciso e reflexo do conteúdo do manus-
crito.
Adentrando, mais diretamente, no estrato da infraestrutura
global, todos os resumos foram formatados em parágrafo único,
conforme defende o Manual da American Psychological Associa-
tion (2010) e as indicações de Sabadini, Sampaio e Koller (2009).
Ademais, os quatro periódicos analisados abalizam a extensão
máxima – e, em alguns casos, a mínima – de palavras que o pará-
grafo-resumo deve conter para que se adeque às normas da revis-
ta. Nesse domínio, pudemos constatar que o comprimento do gê-
nero está atrelado à categoria na qual se apresenta o artigo. Assim,
a revista “Psicologia: reflexão e crítica” pontua que resumos de
qualquer natureza devem ter extensão máxima de 120 palavras,
exceto as comunicações breves de experiência profissional, que
precisam limitar-se a 100 palavras. Essa característica se repete no
periódico “Estudos de Psicologia”, haja vista que informa que o
resumo deve possuir o mínimo de 100 e máximo de 150 palavras
no caso de relatos de pesquisa, estudos teóricos e revisões críticas;
e conter de 50 a 100, no caso de relatos de experiência profissional
e notas técnicas. Do mesmo modo, a diferença entre categorias
também é acentuada pela publicação “Gerais” que orienta um má-
ximo de 150 palavras para relatos de pesquisa e estudos teóricos, e
100 palavras para relatos de experiência, notas técnicas e resenhas.
A publicação “Estudos Interdisciplinares em psicologia” é a única
que não fixa diferença de extensão de resumos entre categorias,

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estabelecendo apenas o limite máximo de 150 palavras para qual-


quer produção do gênero.
As disparidades entre a extensão de resumos de pesquisas
empíricas, estudos teóricos, revisão da literatura, de um lado, e
relatos de experiência profissional, notas técnicas e resenhas, de
outro, está atrelada, igualmente, à extensão geral do artigo. Numa
relação diretamente proporcional, aqueles que são dignos de uma
dilatação maior na compilação das informações do resumo, são,
também, artigos passíveis de maior extensão geral.
Assim sendo, o periódico “Psicologia: reflexão e crítica” ar-
razoa de 15 a 25 páginas para relatos de pesquisa baseados em
investigação experimental, artigos teóricos ou de revisão da litera-
tura; de 10 a 15 páginas para relatos de experiência profissional; e
de 3 a 10 páginas, para resenhas. Seguindo o mesmo entendimen-
to, a revista “Estudos de Psicologia” limita um máximo de 26 pá-
ginas para estudos empíricos, estudos teóricos e revisões críticas
da literatura e de 16 para relatos de experiência profissional. Já a
“Gerais”, restringe a, no máximo, 30 páginas os relatos de pesquisa
empírica e estudos teóricos; a 15 os relatos de experiência profissi-
onal e a 10 as notas técnicas e resenhas. Por último, mas não dife-
rente, o periódico “Estudos Interdisciplinares em Psicologia”, con-
quanto não tenha estabelecido dessemelhança quantitativa entre
categorias para a produção do resumo, normatiza de 20 a 25 lau-
das para os relatos de pesquisa empírica; de 15 a 20 para os estu-
dos teóricos ou de revisão da literatura; e de 5 a 7 para os relatos
de prática profissional.
Essa posição parece colocar em evidência a valoração da
experimentação e da teorização lógico-racional, como vias privile-
giadas do exame científico, em detrimento da experiência do cien-
tista sobre o evento estudado. A pesquisa experimental, em essên-
cia, ganha, pois, status diferenciado, e o trabalho conceitual apare-
ce como condição para o desenvolvimento da investigação empíri-
ca (TOURINHO, 2003). Desse ponto de vista, pode-se mesmo falar
da influência da epistemologia positivista clássica no modo da
Psicologia conceber a ciência. Assim sendo, as mensagens subja-
centes são de que, em ciência, mais vale o que pode ser mensurá-

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vel e, quanto mais distante um pesquisador estiver do even-


to/fenômeno estudado, mais próximo estará da verdade científica.
Trabalhos como os de Silva et al. (2012), Machado, Louren-
ço e Silva (2000) confirmam esse entendimento ao destacarem o
desequilíbrio demasiadamente desproporcional da produção psi-
cológica em prol de estudos empíricos, a despeito de pesquisas de
cunho essencialmente teórico e, mais acentuadamente ainda, de
trabalhos aplicados.
Os limites de extensão foram, então, rigorosamente respei-
tados nos cinco artigos dos periódicos: “Psicologia: reflexão e críti-
ca” e “Gerais”. Na revista “Estudos de Psicologia” duas produções
excederam o limite máximo e uma ficou aquém do limite mínimo
de palavras. Já no periódico “Estudos Interdisciplinares em Psico-
logia”, um único resumo extrapolou a orientação estrita de 150
palavras, no máximo. Isso espelha que, no que concerne a esta
normatização, há, sobremaneira, certa flexibilidade por parte des-
tes quanto a critérios de rejeição do artigo.
Ainda sobre a organização geral do resumo, a segunda e
última instrução, oferecida pelos periódicos avaliados, refere-se às
palavras-chave. Eles tratam de sua quantidade e apresentação no
texto. Todos indicam o mínimo de três e o máximo de cinco termos
para descreverem, de forma genérica, o conteúdo do manuscrito;
listados, obrigatória e imediatamente, abaixo do resumo. Por sua
vez, essa padronização foi objetivamente seguida pelos autores de
todos os resumos analisados.
Com o propósito de facilitar o acesso à informação através
das palavras-chave, Sabadini, Sampaio e Koller (2009) destacam
que a área de Psicologia conta com valiosos vocabulários controla-
dos ou estruturados que auxiliam na pesquisa do artigo. Conforme
advertem,

No Brasil, autores, bibliotecários e usuários contam com a


Terminologia Psi, disponível na Biblioteca Virtual em Saúde
– Psicologia (BVS-Psi, www.bvs-psi.org.br), que busca nor-
malizar os termos da área, assegurando a indexação e a re-
cuperação eficientes da informação psicológica. A Termino-
logia Psi apresenta o termo principal; a versão em inglês e

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espanhol; o termo que, embora equivalente, não deve ser


utilizado; o termo geral, o especifico e os termos relaciona-
dos (SABADINI; SAMPAIO; KOLLER, 2009, p. 129).

As quatro revistas “Psicologia: reflexão e crítica”, “Gerais”,


“Estudos de Psicologia” e “Estudos Interdisciplinares em Psicolo-
gia” fazem referência a esta base de dados. As duas primeiras in-
dicam que as palavras-chave devem ser, preferencialmente, deri-
vadas da Terminologia em Psicologia, da Biblioteca Virtual em
Saúde – Psicologia. As duas últimas asseveram que as palavras-
chave devem, obrigatoriamente, estar de acordo com essa base de
vocabulário controlado.
Como último aspecto a alvitrarmos no plano geral textual,
a maior parte dos resumos que compõem o corpus deste estudo
não observa as propriedades sugeridas no Manual da American
Psychological Association (2010) para cada categoria de texto
(Quadro I, apresentado anteriormente), apesar de esse editorial ter
sido adotado, pelos quatro periódicos investigados, enquanto re-
curso normatizador.
Não há, portanto, uma relativa padronização quanto aos
elementos indispensáveis ao gênero para que ele se torne suficien-
temente informativo e cumpra com sua função. No tocante a essa
questão, Bronckart (1999, p. 74) reforça que “o critério mais objeti-
vo que poderia ser utilizado para identificar e classificar os gêne-
ros é o das unidades e das regras linguísticas específicas que mobi-
lizam”. Bhatia (2001), corroborando essa afirmação, refere que o
gênero assegura sua integridade genérica através das regularida-
des de organização estrutural.
A título de ilustração, apresentamos dois dos resumos ana-
lisados, categorizados enquanto relatos de experiência profissio-
nal/estudos de caso, no âmbito das investigações aplicadas. O
primeiro, publicado no periódico “Psicologia: reflexão e crítica” e o
segundo, na revista “Estudos Interdisciplinares em Psicologia”.

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DIFERENTES OLHARES EM RELAÇÃO A


UMA CRIANÇA COM MÚLTIPLOS
DIAGNÓSTICOS: ESTABILIDADE OU
POSSIBILIDADE DE MUDANÇA?

Resumo
A atuação profissional voltada para crianças com problemas de origem orgâ-
nica, com prognóstico desfavorável, merece reflexão, por sua relação com o
desenvolvimento psicológico da criança. Foi realizado o estudo de caso de
uma criança com diagnósticos de problemas orgânicos e queixas de compor-
tamentos agressivos e competitivos. Analisou-se sua participação, durante
três anos, em projeto de intervenção em grupo, com foco em seus modos de
competê
participação e interações com parceiros. Foram identificadas ncias e modali-
dades cooperativas de participação, que se tornaram mais diversificadas e
complexas ao longo do período de observação. O estudo permitiu uma am-
pliação do olhar para as possibilidades e dificuldades da criança, sugerindo
análises mais abrangentes do desenvolvimento de crianças com múltiplas
queixas.
Palavras-chave: Desenvolvimento e Deficiência; Diagnóstico e Prognósti-
co; Estratégias de Intervenção em Grupo.

Fonte: Tsuji; Moysés; Batista (2011. p. 720)


.

EFEITOS DA HERANÇA PSÍQUICA NA OPÇÃO PELA


NÃO CONSTRUÇÃO DO VÍNCULO AMOROSO

Resumo
O presente artigo objetiva demonstrar a influência e importância da herança
psíquica familiar na opção pela não construção de um vínculo amoroso
compromissado, a partir da análise de um caso. Esse artigo baseia-se numa
pesquisa mais ampla que visou compreender esse tipo de opção pelo viés
sociocultural, econômico e psíquico-geracional, cujos resultados evidencia-
ram a dimensão deste último fator psíquico influenciando esse tipo de esco-
lha.
Palavras-chave: transmissão psíquica entre gerações, psicanálise, amor.

Fonte: Zanetti; Gomes (2012, p. 57).

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Com esse exemplo acreditamos deixar bem marcada a au-


sência de padronização das partes relevantes ou indispensáveis a
um resumo de artigo científico. Na primeira produção, é, inicial-
mente, apresentado o objetivo do estudo, seguido de informações
sobre a pesquisa originária da qual o trabalho deriva. No segundo
caso, temos inicialmente uma contextualização do tema, seguida
do método de pesquisa, resultados e conclusões.
Esse tipo de comportamento não apenas apareceu na com-
paração entre periódicos, mas, igualmente, em nível intra-
periódico. Abaixo, expomos dois resumos, de publicação do pe-
riódico “Estudos de Psicologia”, que se inscrevem na categoria dos
estudos empíricos.

SAÚDE MENTAL E ESPIRITUALIDADE/RELIGIOSIDADE:


A VISÃO DE PSICÓLOGOS

Resumo
A espiritualidade está sendo sempre mais pesquisada em sua relação com a
saúde mental. O objetivo da pesquisa é descrever como os psicólogos perce-
bem em suas práticas a relação entre espiritualidade/religiosidade e a saúde
mental. Trata-se de um estudo exploratório com abordagem qualitativa. A
amostra foi composta por 2 grupos de profissionais graduados em Psicolo-
gia. Um grupo foi formado por 5 psicólogos do Centro de Atenção Psicosso-
cial de São Leopoldo, o outro por 5 psicólogos de clínicas particulares, sele-
cionados segundo o método da “bola de neve”, pelo qual o primeiro é esco-
lhido por conveniência, este indica outro e assim por diante. Os dados foram
coletados através de entrevista semiestruturada e interpretados segundo a
análise de conteúdo, identificando três categorias temáticas: 1) Saúde mental
como equilíbrio e sentido da vida; 2) Espiritualidade/Religiosidade como
experiência; 3) Clínica como autoconhecimento e como autonomia.
Palavras-chave: psicologia; espiritualidade; saúde mental; clínica; psicopa-
tologia.

Fonte: Oliveira; Junges (2012, p. 469).

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EXPRESSÃO DO AFETO E BEM-ESTAR SUBJETIVO


EM PESSOAS CASADAS
Resumo
O objetivo deste estudo foi verificar as correlações existentes entre os domí-
nios do bem-estar subjetivo (BES) e a expressão do afeto. A amostra foi
composta por 106 pessoas casadas. Os instrumentos utilizados foram: Ques-
tionário Sociodemográfico, Escala Abipeme, Escala de Bem-estar Subjetivo
e Escala de Ajustamento Diádico. Os resultados da análise multivariada
evidenciaram que a expressão do afeto está correlacionada com afetos positi-
vos e negativos, mas significativamente relacionada apenas à categoria de
afetos positivos, a partir da seleção de variáveis pelo método stepwise (rho =
0,04; p = 0,01). Desse modo, quanto mais a pessoa se sente feliz, mais tende
a expressar sua afetividade quando está com o parceiro. A partir das contri-
buições da Psicologia Positiva, podemos compreender que o modo como
cada cônjuge se sente em termos individuais e se coloca em relação ao mun-
do e às diferentes experiências contribui para que se sinta seguro e possa
expressar a afetividade de maneira mais satisfatória.
Palavras-chave: bem-estar subjetivo, afetividade, ajustamento diádico,
relações conjugais, escalas.

Fonte: Scorsolini-Comin; Santos; Souza (2012, p. 321).

Destarte, no primeiro resumo, temos a seguinte sequência


encadeada: contextualização do tema, objetivo da pesquisa, meto-
dologia de pesquisa, descrição da amostra, instrumentos de coleta
e análise dos dados. No segundo resumo, já temos: o objetivo do
estudo, as características da amostra, os instrumentos de coleta dos
dados, os resultados e as conclusões. Portanto, como no exemplo
anterior, aqui também não observamos uma regularidade na apre-
sentação das partes que compõem o todo.
Sobre os tipos de discurso, percebemos que o gênero é ca-
racterizado pelo tipo de discurso teórico, ou seja, o conteúdo temá-
tico é conjunto ao mundo ordinário do agente, porém as instâncias
de agentividade estão em relação de autonomia no que tange aos
parâmetros físicos da ação de linguagem. Isso significa que, na
primeira situação, os fatos apresentados são acessíveis à realidade,
mas que, no segundo caso, não há referências dêiticas expressas
integradas ao texto que situem o agente-produtor ou o espaço-
tempo da produção de linguagem.

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Ratificando o caráter conjunto-autônomo do discurso teóri-


co, percebemos, em geral, a ausência de verbos na primeira e se-
gunda pessoa do singular e a presença de formas da primeira pes-
soa do plural; a ausência de unidades que remetam aos interactan-
tes, de dêiticos temporais e espaciais; bem como a nítida dominân-
cia do tempo presente na descrição dos resultados e conclusões e
do passado composto na descrição dos objetivos e das variáveis
manipuladas, dados que se coadunam com as orientações do Ma-
nual da American Psychological Association (2010), para uma es-
crita científica clara e coerente. Todavia, há maior frequência da
voz passiva, em detrimento da ativa, contrariando as indicações da
associação americana.
Enquanto discurso da ordem do expor, majoritariamente
organizado em forma de esquematizações (BRONCKART, 1999),
as sequências dos resumos foram organizadas de forma descritiva,
confirmando o que o Manual da American Psychological Associa-
tion (2010) orienta para a representação breve do conteúdo do ar-
tigo. Esse dado também se aproxima das colocações de Sabadini,
Sampaio e Koller (2009), quando informam que um resumo de
artigo científico deve descrever/apresentar as principais partes do
todo.
Diante de nossas constatações, encaminhamos, a seguir,
nossas conclusões, que abrangem os direcionamentos gerais dados
ao projeto ATA a respeito do conhecimento convencionado no
âmbito da Psicologia, notadamente, no que tange ao gênero em
estudo.

Conclusões e encaminhamentos

Nossas conclusões, então, se alinham às formulações de


Bhatia (2001) e Bronckart (1999) quando, sobre a interpretação e
uso do gênero, refletem que comunidades discursivas específicas
levam em consideração fatores socioculturais internos e estratégias
cognitivas particulares ao se utilizarem da linguagem da maneira
como fazem. Pois que, no campo da Psicologia, identificamos a
influência do contexto social na percepção e organização da escri-

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ta. Observamos as múltiplas faces com as quais a disciplina se


apresenta a partir de suas diversas áreas de atuação, de suas dife-
rentes perspectivas teóricas e de seus variados objetos de estudo.
Ressaltamos a influência do paradigma positivista no modo da
Psicologia conceber e fazer ciência.
Percebemos, igualmente, que há certa flexibilidade quanto
a uma padronização do plano geral do texto, em especial, das par-
tes que compõem o todo. O editorial normativo da APA, embora
alvitrado pelos quatro periódicos pesquisados, não é, sobremodo,
contemplado na produção do gênero e, em alguns casos, as pró-
prias regras específicas da revista também não são adotadas. As
produções, ademais, foram caracterizadas pelo discurso teórico e
pelas sequências descritivas, em função de seu propósito comuni-
cativo.
Esse estudo, portanto, contribui para o projeto ATA quan-
do expõe as nuances que envolvem o letramento acadêmico no
âmbito da Psicologia. Isso, logo, impõe um olhar diferenciado,
notadamente para essa área do conhecimento, uma vez que, num
eixo paralelo, o plano de trabalho do projeto contempla a didatiza-
ção do gênero, através de oficinas textuais, com alunos dos dife-
rentes cursos superiores.
Esperamos, todavia, que para além dos limites desse proje-
to, esta pesquisa seja, acima de tudo, um mote para novos traba-
lhos, outras reflexões, perseguindo seu fim de, também, contribuir
com o avanço da ciência.

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RESUMO ACADÊMICO DE MATEMÁTICA:


UM ESTUDO À LUZ DO ISD
Patrícia Barreto da Silva Carvalho
Bruno Salgado Cole

Introdução

O princípio acadêmico/científico das diversas áreas do co-


nhecimento parte de um pressuposto em comum: a validação de
uma “verdade universal” sobre a natureza de seus objetos de pes-
quisa. Apesar de ter em comum este argumento de extrema auto-
ridade em nosso contexto social, cada área do conhecimento siste-
matiza o conhecer de uma forma diferente, o COMO se diz essa
“verdade universal” acaba sendo uma marca de identificação da
área acadêmica, tornando-se um registro a ser perpetuado como
um estilo próprio daquela ciência.
Entender como se diz esse texto acadêmico na área da Ma-
temática, um dos campos de conhecimento onde a democratização
do saber parece não ser compartilhada com “os pobres mortais” de
outras ciências, será nosso grande desafio. Para entendermos como
o matemático sistematiza, linguisticamente, o conhecimento de sua
área, escolhemos um gênero textual bastante representativo deste
domínio discursivo: o resumo acadêmico. Por uma questão de
recorte, optamos por analisar apenas os resumos acadêmicos da
matemática (doravante, RAM) presentes em artigos científicos
(doravante, AC) publicados em periódicos desta área de pesquisa.
Assim, surgiram-nos os seguintes questionamentos:

• Quais são as principais características de um RAM


que compõe um AC?

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• Que estruturas linguístico-discursivas são recorrentes


neste texto?
• Como a objetividade, característica desta área de co-
nhecimento, é textualizada nestes Resumos?

Este trabalho vincula-se às pesquisas desenvolvidas no Ate-


liê de Textos Acadêmicos (ATA) e se inscreve no objetivo de iden-
tificar o processo de estruturação do gênero resumo na área da
Matemática à luz do ISD, oferecendo subsídios informacionais que
são relevantes para entender como se processa o texto acadêmico
matemático.

1. Linguagem: a relação entre o signo matemático e o signo lin-


guístico

Empiricamente, percebemos que o texto acadêmico matemá-


tico é bastante distinto dos textos da área de humanas, por exem-
plo, este fato acontece não só por uma questão temática, mas, prin-
cipalmente, por outros indícios que estão revelados no texto, mas
que nem sempre são conscientemente percebidos por quem os
produz. Devido à escassez de obras que demonstre a caracteriza-
ção da produção do texto acadêmico matemático, nossa discussão,
primeiramente, irá se pautar na busca por entender como se pro-
cessa a linguagem matemática. Nesse sentido, recorreremos a al-
guns conceitos sobre o que é a linguagem para podermos compre-
endê-la na perspectiva da matemática, acreditando que este pro-
cedimento inicial será vital para descrevermos que recursos fun-
damentam um texto matemático materializado linguisticamente.
Para Ricoeur, “a linguagem é onde o discurso humano inter-
naliza o ser no mundo” (1971, p. 24), ou seja, ela é como o meio por
onde a materialização histórica e dialógica do homem com o ho-
mem e com o mundo se realizam. A linguagem está ancorada nu-
ma questão antropológica de âmbito essencialmente sociocultural,
por meio dela podemos registrar de diversas formas nossa existên-
cia no mundo como seres singulares e coletivos, concomitantemen-
te, revelando uma característica eminentemente humana: a consci-

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ência. Seguindo estes pressupostos, Volochinov (2010 [1929]) nos


indicia que a linguagem pode ser a fonte (objeto) de análise de
diversas ciências, como a sociologia, a filosofia, a antropologia, a
psicologia, a linguística, entre outras, inclusive a matemática.
Quando nos reportamos à concepção de linguagem advinda
da filosofia analítica, assentada, especialmente na obra Tractatus de
Wittgenstein, temos a matemática como “um tipo de linguagem
com múltiplas aplicações e usos, revelando-se como uma mistura
“multicolorida” de técnicas de prova” (1968 [1921] p, 46), dessa
forma, podemos postular que esta linguagem é “como um conjun-
to de símbolos com significado” (GRASSECHI, 2001, p. 163), onde
há uma tentativa de eliminação de incongruências e uma busca
por fatos que sejam inquestionáveis e corretos. Colocando-se dia-
crônica e conceitualmente com relação aos estudos da linguagem
matemática, Vygotsky diz que:

parece que foi Descartes quem primeiro viu na matemática


uma forma de pensamento que tem suas origens na
linguagem, mas que, não obstante, a superou. Nós podemos
dizer apenas uma coisa: em sua oscilação e na incongruência
entre o gramatical e o psicológico, nossa linguagem, em
nossas conversações normais, encontra-se em um estado de
equilíbrio dinâmico entre os ideais da matemática e a
harmonia da imaginação. Ela está em um estado de
movimento contínuo que nós chamamos evolução
(VYGOTSKY, 1987b, p. 252-253, apud CRUZ, p. 6, tradução
da autora).

Para quem desconhece uma linguagem, qualquer que seja


sua modalidade, ao se ler um texto nessa linguagem tudo fica “va-
zio de sentido”, isso ocorre também na matemática, tendo um fa-
tor agravante, pois esta ciência exige um grande nível de abstra-
ção, as ideias matemáticas, algumas vezes, advêm de uma necessi-
dade prática, como contar maçãs, por exemplo, mas se eu tenho 5
maçãs, o símbolo 5 não se restringe a este caso, mas pode represen-
tar qualquer conjunto com 5 elementos. A ideia de quantidade é
uma ideia abstrata e, apesar de vir de algo prático, algumas vezes
a linguagem matemática é desenvolvida única e exclusivamente

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com argumentos matemáticos sem necessidade alguma da pratici-


dade, como os números imaginários que foram desenvolvidos
muito antes de se aplicar a algo concreto.
A matemática é capaz de converter conceitos advindos dos
signos linguísticos em símbolos que representam os signos
matemáticos com o objetivo de torná-los mais facilmente
manipuláveis e calculáveis. Este fato pode ser percebido através
do exemplo listado por Gómes-Granell (2002, p. 260):

• Formulação da época grega: “Encontramos um


segmento tal que, se ao quadrado construído sobre
ele se somar um retângulo construído sobre o mesmo
segmento, e sobre um segmento dado a, obtemos um
retângulo de área igual à de um dado quadrado
dado”.
• Formulação atual: “Resolver a equação x²+ ax = b²,
onde a é um segmento dado e b é o lado de um
quadrado”.

Existem duas vertentes sobre a definição da linguagem ma-


temática. Uma que defende o viés mais formalista ao postular esta
linguagem como

um conjunto de axiomas, definições e teoremas, isto é, ma-


nipulação de sinais escritos e fórmulas de acordo com de-
terminadas regras, que priorizam sua função formal e deno-
tam o caráter restrito dessa linguagem. (D’ANTÔNIO, 2006,
p. 30).

E outra, de caráter mais funcionalista, que apresenta a


linguagem matemática como simbólica, possuindo dois signifi-
cados

um deles, estritamente formal, que obedece a regras do pró-


prio sistema e se caracteriza pela sua autonomia do real, pois
a validade das suas declarações não está determinada pelo
exterior. E o outro que permite associar os símbolos mate-
máticos às situações reais e torná-los úteis para, entre outras

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coisas, resolver problemas (GÓMES-GRANELL, 2002, p.


264).

Nesta pesquisa, inserimo-nos na vertente mais funcionalista


por revelar que a linguagem matemática envolve mais do que
simplesmente regras ou cálculos: envolve “uma variedade de
métodos de prova, de argumentação e articulação, uma variedade
de máquinas” (WITTINGSTEIN, 1968 [1921] p. 117) com um
significado preciso que é associado a operações e a relações
funcionais. Assim, podemos afirmar que a linguagem matemática
opera em dois níveis: o sintático e o semântico.
Quando nos reportamos à proposição três do Tractatus de
Wittingstein, que versa sobre a figuração lógica do pensamento,
temos uma luz sob estes níveis de operações da matemática, o au-
tor expõe: “o que designa no símbolo é o que é comum a todos os
símbolos (nível semântico) pelos quais o primeiro pode ser substi-
tuído de acordo com as regras da sintaxe lógica (nível sintático)”
(WITTINGSTEIN, op. cit., p. 69, grifos nossos), sendo a lógica as-
segurada pela existência e coerência das partes constitutivas: o
sintático e o semântico.
Com base no que foi exposto, podemos afirmar que o signo
matemático, responsável pela materialização da linguagem mate-
mática, é constituído por um nível sintático, pois é regido por re-
gras internas – um sistema – e por um nível semântico, pois pode
ser referenciado no mundo. Assim, como teoriza Gómes-Granell a
respeito do signo,

seu problema reside no fato de que, embora as expressões


matemáticas façam, por um lado, referência à situação em
que aparecem relações quantitativas – portanto, podendo ser
matematizadas - , por outro, para que tais expressões per-
tençam ao domínio da matemática devem ser totalmente au-
tônomas em relação aos contextos e situações específicas de
referência. (GÓMES-GRANELL, 2002, p. 264)

Tomando como base os estudos desta autora, percebemos


que há uma inter-relação entre o signo matemático e o signo lin-
guístico, pois, quando nos remetemos aos pressupostos teóricos

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defendidos na obra Marxismo e Filosofia da Linguagem, temos a se-


guinte definição:

todo o signo [...] resulta de um consenso entre indivíduos


socialmente organizados no decorrer de um processo de in-
teração. Razão pela qual as formas do signo são condiciona-
das tanto pela organização social de tais indivíduos como
pelas condições em que a interação acontece. Uma modifica-
ção destas formas ocasiona uma modificação do signo. (VO-
LOCHINOV, 2010 [1929 ], p. 45).

Então, podemos definir o signo matemático e o signo linguís-


tico como elementos que são semiotizados nos enunciados e que
revelam uma autonomização dos mundos5. Dessa forma, de acor-
do com Saussure (2006), podemos atribuir-lhes, concomitantemen-
te, as seguintes características:

• social: por ser eminentemente constructo sócio-


histórico;
• interativo ou dialógico: por estabelecer interação do eu
com os outros, com o mundo e com o próprio eu numa
via de mão dupla;
• arbitrário: por ser uma convenção não democrática,
onde o controle do significante e do significado não é
estabelecido por um indivíduo, ou seja, onde o poder
singular tem severas limitações;
• imotivado: devido ao conceito e ao referente não pos-
suírem uma relação de traços, ou seja, a palavra ou o
símbolo matemático não apresentam traços do objeto a
que se refere, não havendo um motivo natural para de-
terminado objeto ser assim chamado;
• discreto: por estabelecer limitações e assim estabilizar
as unidades para que possam configura-se em siste-
mas;

5 Aqui se refere aos mundos objetivo, subjetivo e social de Habermas.

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• artificial: por ser uma criação virtual e não inata ao ser


humano.

Contudo, percebemos também que há caracterizações que


são apenas típicas do signo matemático como: o caráter dedutivo,
pois o signo terá seu valor significativo atrelado a condições de
relações dedutivas com o objetivo de transformar o complexo num
trivial através de associações simbólicas hipotéticas, a simbologia
universalizante, já que os símbolos compartilhados por esta ciên-
cia independem dos limites geográficos, e o desprendimento, qua-
se que total, dos parâmetros físicos da produção, tendo em vista
que a ancoragem no mundo contextual não é considerada como
variante significativa para esta ciência. Nestes elementos que são
particulares à simbologia desta linguagem ressoam características
que também são peculiares a esta ciência, pois a dedução, a uni-
versalização e o desprendimento dos parâmetros físicos, para se
concretizarem com sucesso, exigem um padrão de linguagem ab-
solutamente conciso e preciso, sendo estas as principais caracterís-
ticas da linguagem matemática.
O poder de síntese dos signos matemáticos pode ser expres-
so na seguinte sentença: imaginemos como seria resolver trinta e
quatro vezes cinquenta e sete, se não fossem os símbolos 3, 4, 5, 7 e
x, ou ainda a ideia desenvolvida do nosso sistema de numeração
decimal, onde contamos de dez em dez, e por fim, o algoritmo da
multiplicação. Imaginemos como seriam longas as resoluções de
equações sem os símbolos e suas ideias abstratas.
Quando vemos o algoritmo:
57
x 34

ele nos parece absolutamente natural, pois já estamos familiariza-


dos com todos os conceitos envolvidos, como a quantidade de ca-
da número, o que cada símbolo significa, como desenvolver este
algoritmo etc.. Os símbolos são absolutamente necessários para a
síntese, a clareza e a marcação de objetividade da matemática,
mas, à medida que nos aprofundamos nesta, a simbologia se mul-

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tiplica e a abstração se potencializa, como Gómez-Granell (2002, p.


265) explica: “a matemática tem um poder de abstração muito
maior que qualquer outro conteúdo a diferença se encontra nos
desenvolvimentos dos conceitos e teoremas matemáticos que são
feitos de forma dedutiva e não por indução”.
Através do processo de universalização, os signos matemáti-
cos tendem a não dar margem para diversas interpretações, pois
eles têm os níveis sintático e semântico compartilhados entre inter-
locutores provenientes de diversos contextos, este fato contribui
para a precisão dos símbolos já que não vão ter variadas formas e
sentidos, como acontece com o signo linguístico, pois 5 + 4 será em
todos os lugares igual a 9. Assim, podemos concluir que a concisão
e a precisão são características que fundamentam os signos mate-
máticos, independentemente do nível sintático ou semântico em
que eles operem. Sabemos que, como disse Wittingestein, “cada
linguagem simbólica correta deixa-se traduzir numa outra segun-
do tais regras: isto é tudo o que elas têm em comum” (1968, p. 69).
Nosso desafio agora é perceber se estas características são levadas
em consideração na produção de textos acadêmicos da matemática
que foram materializados em outra linguagem e, caso tenham sido
levadas, como podem ser indiciadas pelos signos linguísticos? É o
que pretendemos compreender.

2. Resumo Acadêmico de Matemática (RAM): um estudo à luz do


ISD

Para podermos compreender a interface entre a linguagem


matemática e a linguagem acadêmica geral dos matemáticos, pre-
cisamos delimitar o norte teórico que adotamos com relação à con-
cepção do texto, nosso objeto de estudo. Entendemos como texto
“toda a unidade de produção de linguagem situada, acabada e
autossuficiente – do ponto de vista da ação ou da comunicação”
(BRONCKART, 1999, p. 75), representando uma atividade humana
capaz de articular os interesses/necessidades do produtor ao fun-
cionamento social em que estes textos se inscrevem. Esta produção
está inserida em uma prática discursiva de gêneros textuais, “ins-

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trumentos que regulam as atividades de linguagem” (PEREIRA,


2005, p. 19). Todo o texto se insere em um gênero textual – formas
estrutural-enunciativas relativamente estáveis – e entender como
funciona esta engrenagem linguística possibilita as ações de lin-
guagem.
Na academia, um dos gêneros textuais mais utilizados pelos
estudantes é o resumo acadêmico (doravante, RA), apesar desta
“ampla” produção, muitas vezes ele é postulado como um tipo de
produção autodidata. Contudo, segundo Matêncio (2003, p. 113),
“a ação de resumir pressupõe selecionar macroproposições, relaci-
oná-las em função dos propósitos atribuídos ao autor do texto-
base ou dos propósitos de uma nova proposição”, ou seja, resumir,
de maneira geral, é uma atividade que, apesar de ser muito fre-
quente, inclusive no agir linguageiro cotidiano, requer um pleno
conhecimento da configuração e do funcionamento deste gênero.
A autora conclui a ideia indicando que

a ação de resumir um texto, além de implicar leitura, envol-


ve também a elaboração de um novo texto, isto é, uma retex-
tualização, tem-se a produção do gênero resumo. Depreen-
der as características desse gênero não é tarefa fácil, pois
seus traços mais relevantes dependem das funções atribuí-
das à atividade de retextualização. (MATÊNCIO, op. cit., p.
115)

Corroborando a ideia de Matêncio, temos os RA que acom-


panham os artigos, as dissertações, as teses como “um novo texto,
uma retextualização, que tem como função central descrever o
modo de realização do trabalho acadêmico e não necessariamente
sua estrutura” (op. cit., p. 116, grifos nossos). Então, entender o
resumo nos fornece elementos importantes para a compreensão do
modo de realização do texto acadêmico na área da Matemática.
Cada texto mobiliza unidades e regras linguísticas específi-
cas e são estes segmentos específicos que podem identificar a con-
figuração de unidades relativamente estáveis do gênero. Por
exemplo, para Bronckart (1999, p. 74), “um artigo científico pode
ser composto por um segmento principal no qual é exposta a teo-

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ria do autor e por segmentos intercalares que [...] relatam a crono-


logia das teorias concorrentes”. Estas caracterizações descritas pelo
autor nos indiciam elementos correspondentes a questões estrutu-
ral-discursivas que podem nos levar à identificação deste gênero,
porém, existem segmentos mais específicos materializados no tex-
to que podem nos fornecer informações relevantes não só com
relação ao gênero produzido, mas também com relação à área do
conhecimento a que pertence a produção.
Para analisarmos estes segmentos mais específicos do texto
RA, precisamos de algo que seja capaz de indiciar a “gênese do
funcionamento das operações mentais e comportamentais impli-
cadas na produção e no domínio dos textos” (BRONCKART, op.
cit., p. 67), para isso, utilizaremos como aporte teórico o folhado
textual bronckartiano. O autor concebe o texto como um folhado
onde três camadas são superpostas: a infraestrutura – responsável
pelo plano mais geral do texto, os mecanismos de textualização –
responsáveis pela coerência temática, e os mecanismos enunciati-
vos – responsáveis pelos posicionamentos enunciativos.
Dentre todos os constituintes do folhado textual, para este
trabalho, iremos nos deter na questão da coesão verbal por enten-
der que ela “colabora para a explicitação das relações de continui-
dade, descontinuidade e/ou oposição existentes entre os elemen-
tos de significação expressos pelos sintagmas verbais” (BRON-
CKART, op. cit., p. 273, grifos nossos). O verbo, unidade-fonte,
possui duas propriedades: uma externa – relacionada ao fator de
temporalidade – e uma interna – relacionada ao fator de aspectua-
lidade, ambas responsáveis pela demarcação da evolução do con-
teúdo temático que, por consequência, implica na progressão do
texto.
Recentemente, Bronckart6 divulgou pequenas mudanças
com relação aos constituintes do folhado textual propostos na obra
“Atividade de linguagem, textos e discursos”, justificando que o
modelo de 1999 foi “uma primeira abordagem da estrutura interna

6 Divulgação proferida em palestra no VII SIGET (Fortaleza/CE) e em


texto referenciado na nota 5.

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dos textos” (2013, p.8, tradução dos autores) 7. O autor propôs a


mudança da coesão verbal para o plano da infraestrutura, indi-
cando que o estudo verbal é componente que configura a descrição
dos tipos de discursos, devendo ser deslocada para o nível infraes-
trutural. Dessa forma, analisando as caraterizações do gênero re-
sumo acadêmico de maneira resumida, o folhado textual passa a
se configurar da seguinte forma:

Quadro 1 Caracterização do Gênero Resumo Acadêmico


Folhado Textual de Bronckart (2013)

Sendo assim, após esta nova configuração, nosso trabalho fo-


cará apenas no plano infraestrutural, apresentando de maneira
simples a questão de ordem temática e aprofundando elementos
de ordem discursiva. Colocaremos aqui como unidade-fonte deste
último tópico – ordem discursiva – a estrutura linguística que
chamamos de verbo. Se o verbo, unidade-fonte deste tópico, de-
monstra a evolução do tema e é um marcador da progres-
são/articulação do texto, então, talvez, ele seja capaz de nos reve-
lar a particularidade de COMO cada ciência configura o desenvol-
vimento de seu conhecimento acadêmico. Se uma ciência tem co-
mo proposta metodológica uma análise psicológica do objeto de
pesquisa, logo, os verbos presentes neste texto devem possuir ca-
racterísticas que corroborem esta ideia, não podendo, por exem-

7Activité langagière, textes et discours (1997) constituait une première approche


de la structuration interne des textes. (BRONCKART, 2013, p. 8)

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plo, indiciar questões de caráter resolutivo definitivo, pois estari-


am incompatíveis com a proposta dessa ciência. Por outro lado, se
a área apregoa como elemento fundador a concisão e a precisão,
como é o caso da Matemática, verbos que indiciem esse caráter
resolutivo definitivo seriam fundamentais para balizarem a pro-
gressão/articulação do tema de uma área científica com tais carac-
terísticas.
Para Bronckart, o verbo possui três classes gerais de signifi-
cado que são a temporalidade, a aspectualidade e a modalidade,

enquanto a marcação da temporalidade e da aspectualidade


usualmente se organiza em séries isotópicas de unidades
que contribuem para a manutenção da coerência temática do
texto, a marcação das modalizações efetua-se por ocorrên-
cias mais locais de unidades, que contribuem para a manu-
tenção de uma coerência de outra ordem, pragmática ou in-
terativa (BRONCKART, 1999, p. 274).

entender como esta coerência temática se desenvolve nos RAM


será nosso próximo momento, por isso, iremos conhecer de manei-
ra mais profunda a ordem discursiva do plano infraestrutural.
Após revisitar várias teorias que estudam o verbo, entre elas os
estudos de Co Vet (1980) e Reichenbach (1947), Bronckart (1999)
propôs analisar esta unidade linguística através de duas aborda-
gens: uma capaz de revelar três categorias de parâmetros da coe-
são verbal e uma capaz de revelar funções exercidas por esta uni-
dade, sendo a primeira chamada de abordagem de temporalidade
[externa] e a segunda de abordagem da aspectualidade [interna].
Quando falamos da temporalidade, estamos nos referindo à
duração do dizer que, na proposta bronckartiana, é posta numa
perspectiva tricotômica de parâmetros de controle, tendo os se-
guintes constituintes:

1. PROCESSO: a marcação do dizer através da unidade


linguística fonte que é o verbo.
2. DURAÇÃO: associação que é dada desta unidade ao ato
de produção.

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3. EIXO DE REFERÊNCIA: ancoragem desta unidade a um


tipo de discurso numa duração formal ou psicológica.

Quando falamos da aspectualidade, Bronckart (1999) nos


alerta que esta unidade possui uma complexidade de funções as-
pectuais, sendo este o fator principal das inúmeras controvérsias
dos estudos sobre o verbo. No entanto, o autor corajosamente se
arrisca a postular duas como as mais significativas que são os ti-
pos de processo e os graus de realização do processo. Assim, po-
demos dizer que o processo ou o lexema verbal possui as seguintes
funções:

1. lexical: indica a classe geral de significado, marcando a


ação do dizer nos tipos de verbo ou tipos de processo
produzidos. Estes verbos podem ser classificados, base-
ando-se, especialmente, no trabalho de Vendler (1967) e
propagado por Bronckart, em 4 tipos:
a. ESTADO: processos estáveis que excluem formas de
mudança, exemplo, verbo saber.
b. ATIVIDADE: processos dinâmicos que são durativos e
não resultativos, exemplo, verbo tentar.
c. REALIZAÇÃO: processos dinâmicos que são durativos
e resultativos, exemplo, verbo apresentar.
d. ACABAMENTO: processos dinâmicos que são não
durativos e resultativos, exemplo, verbo determinar.

2. morfológica: indica o modo como o verbo é processado,


fato que revela o grau de realização do processo, poden-
do ser:
a. REALIZAÇÃO TOTAL: totalidade do desenvolvi-
mento do verbo e de seu acabamento (BRONCKART,
op. cit., p. 280);
b. CONCLUSO: fim do desenvolvimento do verbo;
c. INCONCLUSO: o desenvolvimento está em curso.

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Abaixo, analisaremos um trecho retirado de um RAM para


entendermos melhor o funcionamento destas duas funções, veja-
mos o exemplo:

“Neste artigo, apresentamos um algoritmo [...]. Em cada


passo tenta-se encontrar as faces adjacentes de maior di-
mensão, na esperança de acelerar o processo. Uma prova de
corretude do método é fornecida.” (anexo III – RAM 03).

O texto começa com o verbo apresentar que marca a neces-


sidade de duas características aspectuais: uma voltada para a du-
rabilidade da ação do produtor de texto, pois o ato de apresentar
requer uma temporalidade maior do que, por exemplo, o verbo
determinar que é uma ação mais imediatista, ou seja, o verbo apre-
sentar está em desenvolvimento da ação, sendo inconcluso, por
isso, dizemos que ele é durativo, e outra voltada para a demons-
tração de um resultado, pois quando apresentamos algo, estamos
compilando um conjunto de ações para demonstrar onde chega-
mos com a temática abordada, por isso, este verbo é chamado de
resultativo.
Continuando a análise, temos o verbo tentar que é marcado
por duas características aspectuais: uma voltada para a durabili-
dade, já explicada acima, e outra voltada para a não resultativida-
de, pois tentar algo, não significa, necessariamente, chegarmos a
um resultado, o ato de tentar não define um resultado, apenas o
coloca num referente de possibilidade, por isso, consideramos o
verbo tentar como não resolutivo.
O verbo acelerar possui duas características aspectuais: uma
voltada para a não durabilidade, já que o ato desta ação é mais
imediatista, não requisitando uma temporalidade extensa para sua
concretude, ou seja, o verbo tem seu desenvolvimento concluso, e
outra voltada para a resultatividade, já que o conteúdo temático é
levado a um resultado, diferente dos verbos não resolutivos.
Quando avaliamos o verbo ser, percebemos que ele é bastan-
te diferente da caracterização dos que já foram analisados, pois,
enquanto os demais possuem a característica de dinamicidade,
este, por sua vez, apresenta a aspectualidade de estabilidade, ex-

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cluindo uma ação de mudança. Quando o produtor informar que


uma prova [...] é fornecida, há uma exclusão de mudança, a prova é
fornecida, não há dinamicidade, nem possibilidade e nem duração,
o que há é uma realização total da ação, não permitindo nenhuma
mudança neste fato, por isso, classificarmos este verbo de estado.
Dessa forma, ao relacionarmos as duas funcionalidades da abor-
dagem da aspectualidade do verbo, temos o seguinte quadro:

Tipos de processo Graus de realização dos proces-


sos
Durativos (inconcluso):
a. resultativos
Dinâmicos b. não resultativos
Não durativos (concluso):
a. resultativos
Estáveis Realização total

Quadro 2: Abordagem da Aspectualidade dos verbos

Tomando como fundamento epistemológico os princípios


teóricos expostos sobre a abordagem da aspectualidade do verbo,
analisaremos as funções lexicais e morfológicas dos verbos para
compreendermos como o produtor de artigos da área da Matemá-
tica materializa o conhecimento desta ciência. É importante salien-
tar que a apreciação do funcionamento e da organização do texto é
multifatorial e extremamente heterogênea, as análises que serão
feitas logo mais são apenas um recorte que pretende alcançar os
objetivos propostos para este trabalho, mas que, com toda a certe-
za, não são capazes de elucidar toda a complexidade envolvida na
produção textual deste campo de divulgação científica.

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3. Contextualização da pesquisa

Ao começarmos nossos estudos com os resumos produzidos


juntos aos artigos científicos, dissertações e teses, percebemos que
precisávamos dividir a área de conhecimento da Matemática, pois
os textos configuravam-se de maneira diferente e possuíam objetos
de estudo também distintos, por isso, dividimos esta ciência em
quatro subáreas:

1. Matemática Pura: é uma ciência cujo objeto de estudo é


pautado na própria ciência, sem a necessidade de uma
aplicabilidade. Ex: geometria esférica e números comple-
xos;
2. História da Matemática: é uma ciência cujo objeto de es-
tudo é o desenvolvimento da Matemática num aspecto
diacrônico, enfocando os autores, os fatos descobertos,
quais as ferramentas utilizadas por eles, em que circuns-
tâncias, tudo isso representado numa linha temporal. Ex:
o estudo dos livros de Euclides;
3. Ensino da Matemática: é uma ciência cujo objeto de estu-
do é pautado na relação entre o ato de ensinar e aprender
os conhecimentos matemáticos, funcionando para o de-
senvolvimento da abstração, do raciocínio lógico e de es-
tratégias nas resoluções de problemas. Ex: Como se pro-
cessa a aquisição da ideia de quantidade;
4. Matemática Aplicada: é uma ciência cujo objeto de estu-
do é desenvolvido a partir de necessidades práticas cor-
relacionadas a pressupostos matemáticos. Ex: Estatística.

Nesta pesquisa, iremos nos ater à subárea da Matemática


Aplicada, para isso, procuramos um periódico que obtivesse qualis
A ou B e que publicassem apenas artigos científicos da subárea
escolhida. Dentre os encontrados, optamos como base da constru-
ção do nosso corpus a Revista TEMA.
A Revista TEMA Tendências em Matemática Aplicada e
Computacional (TEMA) teve sua primeira publicação no ano de
1999, organizada pela Sociedade Brasileira de Matemática Aplica-

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da e Computacional (SBMAC), que foi criada no 1º Simpósio Naci-


onal de Cálculo Numérico no ano de 1978, está qualificada pela
Capes como B3 e desde 2000 publica 3 números por ano. O perió-
dico tem como proposta “servir de veículo de publicação de nú-
meros especiais contendo artigo sobre temas de interesse dos asso-
ciados da SBMAC” [http://www.sbmac.org.br/tema]. Nas orien-
tações prestadas para a submissão de trabalhos, não há nenhuma
referência em relação aos tópicos estruturais do artigo científico,
contudo, em todos os números, os artigos possuem um resumo e
palavras-chave logo no início do trabalho e os textos não ultrapas-
sam 12 páginas.
Nossas análises se pautarão nos RAM presentes em artigos
científicos (AC) desta revista publicados entre 2011 e 2012. Nestes
anos, a revista publicou um universo de 49 artigos científicos, on-
de, de forma aleatória, escolhemos 5 para fazer parte desta pesqui-
sa. Após a seleção dos AC, fizemos uma leitura de todo o texto e
recortamos apenas os RAM presentes em cada um deles. Para este
trabalho, pretendemos analisar os aspectos ligados à infraestrutura
dos textos, evidenciando as organizações:

• temática: nesta seção serão analisadas as questões li-


gadas ao universo semântico do texto, apontando os
temas e as expressões recorrentes, como o conteúdo
temático foi planejado e indiciando variáveis impor-
tantes para a construção do conteúdo temático, como
por exemplo os atores, os papéis sociais que eles
exercem enquanto produtores deste texto.
• discursiva: nesta seção serão analisadas as questões
ligadas à configuração do tipo discursivo e ao modo
de articulação existente por meio da coesão verbal.

4. Análises dos RAM

Começaremos este tópico relembrando os objetivos deste


trabalho que são pautados na identificação das principais caracte-
rísticas dos RAM pertencentes a Artigos Científicos, na análise das

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recorrências linguístico-discursivas deste texto e, por fim, no como


os atores materializam linguisticamente as duas principais caracte-
rísticas da linguagem matemática: a concisão e a precisão, identi-
dades desta ciência. Para maiores esclarecimentos, os resumos
analisados encontram-se na íntegra como anexos deste trabalho.

4.1 Organização Temática do RAM

Por se tratarem de textos que pertencem à mesma área e su-


bárea, o conteúdo temático dos RAM é bastante parecido, inserem-
se nos temas da Matemática e da Computação e são interligados
por serem pautados na ação de linguagem que denota a praticida-
de destas ciências na vida cotidiana, apesar de muitas vezes a in-
formação não ser acessível aos interlocutores de outras áreas.
Na questão estrutural, o conteúdo temático é organizado, na
maioria dos RAM, começando com a apresentação do problema,
depois partindo para a metodologia e por último revelando os
resultados. Assim, podemos dizer que estes resumos são estrutu-
rados com 3 dos possíveis constituintes de um texto deste gênero,
mas é importante salientar que apenas a metodologia esteve pre-
sente em todos os RAM analisados. Este fato nos demonstra a re-
levância deste procedimento científico para esta ciência, na medida
em que fica evidenciada com clareza a metodologia empregada,
que encurta o procedimento explicativo do texto que mistura sig-
nos matemáticos e linguísticos. Outro dado importante para se
ressaltar refere-se à questão lançada por Matêncio (2003), sobre o
entendimento do resumo acadêmico como uma retextualização
que indicia o modo de realização do artigo científico. Os RAM,
além de apresentarem este modo de realização, acabam também
indiciando a forma como os autores organizaram o artigo científi-
co, primeiramente apresentando um problema que, em seguida,
foi desmembrado em uma proposta metodológica que visa relatar
o resultado a que se chegou.
O problema, a metodologia e os resultados são desenvolvi-
dos usando-se em média 100 palavras divididas em 3 ou 4 perío-
dos com sentenças em ordem direta, apenas 1 período, dos 5 RAM

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analisados não seguiu esta organização. Com relação à marcação


da pessoalidade explicita, não podemos afirmá-la ou negá-la nos
RAM pesquisados, pois em nosso corpus houve uma oscilação com
relação a esta variante, fato sobre o qual só poderemos nos posici-
onar mais assertivamente quando ampliarmos o recorte estudado.
Com relação à autoria dos textos, percebemos que na maioria dos
RAM tínhamos mais de um autor, fato comum nesta área. Ao pes-
quisarmos o currículo lattes dos autores, percebemos que a maior
parte tinha a formação inicial na Matemática e formações de pós-
graduações em áreas afins, como a engenharia e a computação. A
grande maioria é vinculada a instituições federais brasileiras, exce-
to o Cunha (RAM 04), vinculado a UNICAMP e Ceniceros (RAM
05), vinculado a UCSB da Califónia- USA.

4.2 Organização Discursiva do RAM

Começaremos a análise da organização discursiva pontuan-


do que, no momento de produção de um texto, o autor “coloca em
interface as suas representações construídas sobre o gênero textual
e a sua situação de ação (motivos, intenções, conteúdo temático a
transmitir, etc)” (BONCKART, 1999, p. 137-138), portanto, pode-
mos dizer que o autor baseando-se nestes dois parâmetros – repre-
sentação de gênero e situação de ação – recorre a formas específi-
cas para materializar o enunciado, este, por sua vez, é constituído
por elementos linguísticos que são capazes de demonstrar a hete-
rogeneidade presente numa produção textual, a estes elementos
daremos o nome de tipos de discurso. Para Bronckart, “os tipos de
discursos traduzem a criação de mundos discursivos específicos,
sendo esses tipos articulados entre si por mecanismos de textuali-
zação e por mecanismos enunciativos” (op. cit., p. 149). Estes
mundos são operados por duas coordenadas, uma da ordem dis-
junta, onde o conteúdo temático se expressa distanciado das ações
linguageiras do mundo ordinário, o mundo do narrar, e outra da
ordem conjunta, onde este afastamento não é evidenciado, o mun-
do do expor.

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Quando nos voltamos aos RAM, constatamos que todos eles


pertencem ao mundo discursivo de ordem do expor, pois se anco-
ram em ações de linguagem provenientes do mundo real e suas
informações são postas para julgamento valorativo, geralmente,
associadas a graus de verdade, estas informações são expostas de
maneira monologada e autônoma a alguns parâmetros da ação da
linguagem.
Ainda podemos apontar como características recorrentes a
este tipo de discurso nos RAM:

• densidade verbal fraca, com cerca de 1 verbo a cada 12 pa-


lavras.
Ex: [...] uma equação diferencial determinística na qual
substituímos os parâmetros aleatórios por suas médias.
[L8-9, RAM 04]
• há, em média, cerca de 27 unidades-fonte[substantivos] em
cada RAM.
Ex: Simulamos a separação dos componentes de uma mis-
tura bifásica com a equação de Cahn-Hilliard. [L1, RAM
05]
• a referenciação teórica pautada em dois termos, um indi-
cando o método e outro indicando uma personificação, que
pode ser o autor do método ou quem o propagou.
Ex: [...] equação modificada de Helmholtz [L4-5, RAM 01]
[...] equação de Cahn-Hilliard [L 4, RAM 05]

As duas primeiras características apontadas acima contribu-


em para o aspecto de concisão e objetividade dos RAM, já que o
texto é marcado por vários nomes referenciados a poucos verbos,
não há a necessidade de uma explicação mais alongada da senten-
ça, logo, o enunciado torna-se mais conciso e objetivo. Passaremos
agora para a análise destes poucos verbos, para analisarmos sua
tipologia e se contribuem para algumas características específicas
deste gênero nesta área de conhecimento.
Quando partimos para a análise do modo de articulação
através do processo de coesão verbal, encontramos um fato muito
importante, no parâmetro quantitativo, temos a presença de 53

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verbos no total dos RAM, e destes, percebemos que a Abordagem


da Aspectualidade (AA) está percentualmente dividida da seguin-
te forma:

• verbos de acabamento (VAc): 37, 37%


Ex: Consideramos o problema inverso [L1, RAM 01]
• verbos de estado (VE): 30, 07%
Ex: [...] sinais cujos valores sejam números comple-
xos [L6-7, RAM 03]
• verbos de realização (VR): 26,41%
Ex: [...] resolvemos pelo método de Newton [L6-7,
RAM 01]
• verbos de atividade (VAt): 3,77%
Ex: Em cada passo tenta-se encontrar [L4, RAM 02]

Começaremos a discussão pelo baixo índice dos verbos de


atividade (VAt), acreditamos que o fato desta categoria exigir o as-
pecto não resultativo, como podemos observar também nos verbos
andar, escrever e tricotar, dificilmente ela será requisitada por pro-
dutores textuais que utilizam como princípio de escrita a referen-
ciação do signo matemático, extremamente marcada pela exatidão
e resultatividade, ou seja, a característica de não resolutiva deste
tipo de verbo pode ser a explicação de sua recorrência limitar-se a
duas aparições num universo de 53 verbos.
Ao analisarmos os verbos de Realização (VR), percebemos
que alguns deles exigiam apenas um papel temático de agente,
como é o caso do verbo resolver [L 6, RAM 01] que, na maioria dos
contextos, é classificado como intransitivo e só exige semantica-
mente quem pratica a ação, e outros exigiam a atribuição de dois
papéis temáticos ou argumentos sintáticos, um sendo o agente e o
outro o tema [complemento do verbo], como é o caso do verbo
considerar [L1, RAM 01] que em sua primeira aparição, no resumo
referenciado, utiliza o agente implícito, marcado na declinação
verbal, e tem o tema representado pelo termo “o problema”. Per-
cebemos também que este comportamento exemplificado do VR
que exigem dois papéis temáticos, mas que explicitamente só faz
uso de um, é recorrente dentre os demais VR que também exigem

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dois argumentos, isso nos leva a afirmar que, apesar do desmem-


bramento em dois subgrupos lexicais de um ou de dois papéis
temáticos, geralmente os VR são marcados explicitamente nos
RAM apenas com um argumento sintático, mesmo os que seman-
ticamente exigem dois argumentos. Acreditamos que este fato é
marcado nos RAM pela caracterização da concisão que tanto de-
marca esta área de pesquisa.
Quando analisamos os verbos de Estado (VE), responsáveis
por 17 das 53 ocorrências, percebemos o caráter de estabilidade
semântica que eles proporcionam, sendo algo que não sofrerá ne-
nhuma mudança, ou seja, há uma realização total do conteúdo
temático expresso. Esta ausência de mudança pode ser associada à
precisão que, como vimos, é característica marcante do texto ma-
temático.
Os verbos de Acabamento (VAc) trazem a necessidade tanto
semântica, quanto sintática da aparição de dois papéis temáticos
ou argumentos, um representa o agente e o outro o conteúdo te-
mático. Abaixo segue o RAM 04 e a grade temática dos VAc pre-
sentes no resumo:

Este trabalho objetiva analisar, através de alguns exemplos, a


influência de se considerar aleatoriedades na solução de equações
diferenciais com dados e/ou parâmetros aleatórios. Um compara-
tivo das médias das soluções das equações estocásticas com as
soluções das equações determinísticas simplificadas, nas quais
substituímos os parâmetros aleatórios por suas médias, é apresen-
tado. Estes exemplos mostram que a média da solução, que nor-
malmente é uma informação relevante em aplicações, pode ter
sido qualitativamente diferente da aproximação obtida pela solu-
ção de uma equação diferencial determinística na qual substituí-
mos os parâmetros aleatórios por suas médias. (Anexo IV)

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AGENTE VERBO CONTEÚDO


TEMÁTICO
Oração subordinada
trabalho objetiva objetiva indireta
reduzida de infini-
tivo
a influência considerar aleatoriedades
soluções substituímos os parâmetros
estes exemplos mostram a média das
soluções
uma equação substituímos os parâmetros
Quadro 3: Grade temática dos VAc – RAM 04

Analisando a grade temática, percebemos que tanto os agen-


tes como os conteúdos temáticos revelam léxicos que são proveni-
entes e recorrentes nesta área de conhecimento. Com relação aos
conteúdos temáticos dos VAc, dados como exemplo, percebemos
que podemos vinculá-los à questão do procedimento proveniente
da linguagem matemática, temas ligados ao procedimento opera-
cional [nível sintático] como os termos: parâmetros e média das
soluções, e temas ligados ao procedimento funcional [nível semân-
tico] como os termos: aleatoriedade e a oração indireta.
Observaremos mais uma grade temática advinda dos VAc
para comprovarmos se o fato evidenciado acima pode ser conside-
rado um fenômeno entre os verbos desta categoria, para isso, apre-
sentaremos um trecho do RAM 01 e a grade temática do VAc que
o corresponde:

Considerando o caso em que a fonte é uma função característica de


um intervalo obtemos um sistema não-linear e o resolvemos pelo
método de Newton. Duas simulações numéricas são apresentadas:
a primeira para ilustrar a eficiência do método proposto e a outra
para indicar sua aplicabilidade para obter aproximações para fon-
tes de suporte compacto. (Anexo I)

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AGENTE VERBO CONTEÚDO


TEMÁTICO
implícito obtemos um sistema
a primeira ilustrar a eficiência
a outra indicar sua aplicabilidade
sua aplicabilidade obter aproximações
Quadro 4: Grade temática dos VAc – RAM 01

Focando na questão do conteúdo temático, percebemos que


há um léxico ligado ao procedimento operacional, representado
pelo termo: um sistema e os demais temas estão ligados ao proce-
dimento funcional, representado pelos termos: eficiência, aplicabi-
lidade e aproximações. Dessa forma, confirmamos que os léxicos
que representam o conteúdo temático dos VAc estão ligados aos
procedimentos de operação e funcionalidade advindos desta ciên-
cia.

Considerações finais

Após as análises, podemos afirmar que os RAM têm como


principais características, na ordem temática, a estruturação bali-
zada na descrição do problema, da metodologia e dos resultados, a
baixa densidade verbal e a frequência significativa de substantivos
e, na ordem discursiva, a presença de verbos do tipo de Acabamen-
to (VAc) e Estado (VE), ambos os fatos materializam os pilares da
linguagem desta ciência que são: a concisão e a precisão, como
podemos observar no exemplo abaixo:

[...] determinar a solução numérica da equação de Cahn-Hilliard não


é uma tarefa fácil, principalmente em três dimensões. (Anexo V –
RAM 05)

No trecho, podemos evidenciar a baixa densidade verbal,


correspondendo neste período apenas a duas ocorrências grifadas
em negrito, e a grande presença dos substantivos, destacados em
itálico. Ainda temos a ocorrência dos 2 tipos mais frequentes de

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verbo, um verbo representando a classificação dos VAc – determi-


nar – e outro representando a classificação dos VE – é.
A objetividade destes textos pode ser comprovada pela
abordagem da aspectualidade dos verbos e acreditamos que, pelo
fato da caracterização dos temas provenientes dos tipos de verbos
mais recorrentes, os VAc, ser configurada em léxicos ligados ao
nível operatório [sintático] ou funcional [semântico] da Matemáti-
ca, isso torna o texto matemático pouco acessível a quem não co-
nhece a linguagem da área, e, em contrapartida, encurta a necessi-
dade de explicações para os participantes que comungam desta
ciência, já que os temas são léxicos epistemológicos da área. Espe-
ramos, com este trabalho, ter contribuído com os estudos iniciais
com relação a pesquisas das produções acadêmicas dos textos ma-
temáticos, tomando o ISD como orientação metodológica, já que,
conforme nossas pesquisas têm demonstrado, este objeto de estu-
do ainda é um campo acadêmico pouco explorado.

Referências

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em práticas acadêmicas: um estudo do resumo. SCRIPTA, Belo Horizon-
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SECCHIN, L.D. Um novo algoritmo para soluções ótimas locais do pro-
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SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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Anexos

Anexo I (RAM 01)

Identificação de Fontes para a Equação Unidimensional de Difu-


são-Advecção
D.M. DE SOUSA, Departamento de Matemática, ICEx - PUVR,
UFF - Universidade Federal Fluminense, 27213-145 Volta Redon-
da, RJ, Brasil.
N.C. ROBERTY, Programa de Engenharia Nuclear, COPPE, UFRJ -
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 21945-970 Rio de Janeiro,
RJ, Brasil.
Consideramos o problema inverso de identificação de fontes para
a equação unidimensional de difusão-advecção com coeficientes
constantes a partir de informações no bordo do domínio. É apre-
sentada uma formulação variacional do problema tendo como
espaço de funções testes as soluções da equação modificada de
Helmholtz homogênea. Considerando o caso em que a fonte é
uma função característica de um intervalo obtemos um sistema
não-linear e o resolvemos pelo método de Newton. Duas simula-
ções numéricas são apresentadas: a primeira para ilustrar a efici-
ência do método proposto e a outra para indicar sua aplicabilida-
de para obter aproximações para fontes de suporte compacto.

Anexo II (RAM 02)

Um novo algoritmo para soluções ótimas locais do problema


linear de dois níveis
L.D. Secchin, Departamento de Ciências Matemáticas e Naturais,
CEUNES, UFES - Univ Federal do Espírito Santo, 29932-540 São
Mateus, ES, Brasil.
Neste artigo, apresentamos um algoritmo para encontrar soluções
ótimas locais dos problemas lineares de dois níveis. A cada ponto
viável corrente, o método busca por melhores soluções no conjun-
to dos pontos que se encontram em suas faces adjacentes. Em cada
passo tenta-se encontrar as faces adjacentes de maior dimensão,

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na esperança de acelerar o processo. Uma prova de corretude do


método é fornecida, e testes computacionais foram realizados.

Anexo III (RAM 03)

Sinais e Sistemas Definidos sobre Aritmética Intervalar Comple-


xa
F.T. SANTANA, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnolo-
gia do Rio Grande do Norte, Currais Novos, RN, Brasil.
F.L. SANTANA, A.D. DÓRIA NETO, R.H.N. SANTIAGO, UFRN,
Cam- pus Universitário Lagoa Nova, 59078-970 Natal, RN, Brasil.
Neste trabalho, é feita a fundamentação para os conceitos de sinais
e sistemas intervalares complexos, fazendo-se o uso da aritmética
complexa retangular e do conceito de intervalo de números com-
plexos que é feito com auxílio da chamada ordem de Kulisch-
Miranker para complexos. É apresentado também o conceito de
representação intervalar e é definida a representação canônica in-
tervalar (CIR) de funções complexas. A partir de um sistema f que
opere sobre sinais cujos valores sejam números complexos, usan-
do a função CIR, encontra-se um sistema intervalar F o qual pre-
serva, no ambiente intervalar, as propriedades de f, tais como es-
tabilidade, invariância no tempo, aditividadade, homogeneidade e
linearidade.

Anexo IV (RAM 04)

Soluções de Problemas envolvendo Equações Diferenciais Sujei-


tas a Incertezas
F.A. DORINI, Departamento Acadêmico de Matemática, UTFPR -
Univ Tecnológica Federal do Paraná, 80230-901 Curitiba, PR, Bra-
sil.
M.C.C. CUNHA, Departamento de Matemática Aplicada, UNI-
CAMP - Univ Estadual de Campinas, 13083-970 Campinas, SP,
Brasil.
S.P. OLIVEIRA, Departamento de Matemática, UFPR - Univ Fede-
ral do Paraná, 81531-990 Curitiba, PR, Brasil

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Este trabalho objetiva analisar, através de alguns exemplos, a


influência de se considerar aleatoriedades na solução de equações
diferenciais com dados e/ou parâmetros aleatórios. Um compara-
tivo das médias das soluções das equações estocásticas com as
soluções das equações determinísticas simplificadas, nas quais
substituímos os parâmetros aleatórios por suas médias, é apresen-
tado. Estes exemplos mostram que a média da solução, que nor-
malmente é uma informação relevante em aplicações, pode ter
sido qualitativamente diferente da aproximação obtida pela solu-
ção de uma equação diferencial determinística na qual substituí-
mos os parâmetros aleatórios por suas médias.

Anexo V (RAM 05)

Simulação Tridimensional Adaptativa da Separação das Fases de


uma Mistura Bifásica usando a Equação de Cahn-Hilliard

R.L. NÓS, Departamento Acadêmico de Matemática, UTFPR,


80230-901 Curitiba, PR, Brasil.
H.D. CENICEROS, Department of Mathematics, UCSB, 93106 San-
ta Barbara, CA, USA.
A.M. ROMA, Departamento de Matemática Aplicada, IME, USP,
05311-970 São Paulo, SP, Brasil.
Simulamos a separação dos componentes de uma mistura bifásica
com a equação de Cahn-Hilliard. Esta equação contém intrincados
termos não lineares e derivadas de alta ordem. Além disso, a del-
gada região de transição entre os componentes da mistura requer
muita resolução. Assim, determinar a solução numérica da equa-
ção de Cahn-Hilliard não é uma tarefa fácil, principalmente em
três dimensões. Conseguimos a resolução exigida no tempo usan-
do uma discretização semi-implícita de segunda ordem. No espa-
ço, obtemos a precisão requerida utilizando malhas refinadas lo-
calmente com a estratégia AMR. Essas malhas se adaptam dinami-
camente para recobrir a região de transição. O sistema linear pro-
veniente da discretização é solucionado por intermédio de técni-
cas multinível-multigrid.

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II PARTE

PROCESSOS DE DIDATIZAÇÃO
DOS GÊNEROS ACADÊMICOS

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O PROCEDIMENTO DE ESQUEMATIZAÇÃO
COMO ESTRATÉGIA DE RECEPÇÃO E DE
CONSTRUÇÃO TEXTUAL
Raquel Basílio da Cunha Dias de Melo
Regina Celi Mendes Pereira

Introdução

O presente capítulo tem como objetivo refletir sobre as


ações desenvolvidas no projeto intitulado Ateliê de Textos Aca-
dêmicos-ATA. Focalizaremos nosso exame nas estratégias de dida-
tização do gênero resumo, em especial, na compreensão do proce-
dimento de esquematização do texto como estratégia de recepção e
de construção textual nas atividades de reescrita realizadas em sala
de aula com alunos do primeiro período do Curso de Letras da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB) na disciplina de Metodo-
logia do Trabalho Científico.
Introduzimos nossa reflexão nos debruçando nos princí-
pios teóricos que alicerçam nossa prática buscando compreender
os mecanismos de recepção textual e, ao mesmo tempo, dos “es-
quemas de interpretação suscetíveis de consenso tal como o saber
cultural; relações interpessoais ordenadas legitimamente, das
quais jorram solidariedade social; e estruturas da personalidade
individual decorrentes da socialização” (HABERMAS, 2012, p.
XXIII). Essa questão é problematizada ao partirmos do ponto de
vista inicial que nos impõe considerar tanto os mecanismos de
produção quanto os de recepção textual, simultaneamente, em
posição de autonomia e interdependência.
Em seguida, relataremos as estratégias de didatização do
gênero resumo por meio de atividade de reescritas, - inspiradas
nas atividades de sequenciação apresentadas por Bernard

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Schneuwly, Joaquim Dolz e colaboradores -, como criação particu-


lar de um espaço favorável de apropriação individual das práticas
sociais que envolvem a leitura e a escrita desse gênero acadêmico
específico (cf. VYGOTSKY), com o intuito de observar as relações
entre a produção e a recepção dos textos.

1. Breve quadro teórico

A noção de gênero que se faz presente neste trabalho é a de


gênero como prática de linguagem historicamente constituída,
cristalizada e reconstruída de forma progressiva no curso da histó-
ria. Como se pode ler nas páginas de Marxismo e Filosofia da Lin-
guagem (1988 [1929/1977]), toda a produção verbal decorre de um
gênero que está em relação de dependência das situações comuni-
cativas que o forjam, assim, os gêneros são compreendidos como
práticas fundamentalmente sociais. Em A estrutura do enunciado
([1930] 1981, p. 290), Volochinov apresenta uma definição mais
clara do termo gênero utilizada neste projeto, a saber:

[...] o enunciado, considerado como uma unidade de comu-


nicação e totalmente semântica, se constitui e se realiza exa-
tamente em uma interação verbal determinada e gerada por
dada relação de comunicação social. Dessa maneira, cada
um dos tipos de comunicação social que citamos organiza,
constrói e completa, de maneira específica, a forma gramatical
e estilística do enunciado, assim como a estrutura do tipo
que lhe dá origem: doravante, nós a designaremos sob o
termo de gênero.

Bernard Schneuwly (2004) parte dessa consideração para


metaforizar o gênero como um (mega) instrumento semiótico que
permite o desenvolvimento de capacidades de linguagem, con-
forme os conceitos de Vygotsky acerca do desenvolvimento do
pensamento consciente e do papel dos signos linguísticos na apro-
priação dos gêneros. Também vêm ao encontro dessa perspectiva
as proposições de Rabardel sobre a noção de instrumento como

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mediador que possibilita ao sujeito transformar suas atividades, a


si mesmo e, desse modo, ser um construtor de conhecimento.
A analogia parte, primeiramente, do locutor-enunciador
que age discursivamente numa situação de comunicação com o
auxílio de um instrumento que é o gênero. Esse gênero como ins-
trumento se constitui, por um lado, de um produto material exis-
tente fora do sujeito, o próprio sujeito e os esquemas de utilização
possíveis desse instrumento. Para funcionar como agente trans-
formador, o gênero/instrumento precisa ser internalizado pelo
sujeito, ou seja, o sujeito precisa se apropriar dos esquemas de uti-
lização que irá orientar e sustentar suas ações mediadas. Schneu-
wly (2004, p. 24-25) explica nos seguintes termos:

Os gêneros prefiguram as ações de linguagem possíveis: a


existência do romance, seu conhecimento, senão seu controle
pelo menos parcial, é a condição necessária da ação discur-
siva “escrever um romance”, assim como o conhecimento e
o controle do machado são condições necessárias da ação de
“cortar uma árvore”. [...] A ação discursiva é, portanto, ao
menos parcialmente, prefigurada pelos meios. O conheci-
mento e a concepção da realidade estão parcialmente conti-
dos nos meios para agir sobre ela.

Podemos, a partir da citação acima, pensar as possíveis im-


plicações dessa consideração. Nunca encontramos um enunciador
que age discursivamente sozinho. A natureza interacional da lin-
guagem, dos signos linguísticos e dos textos impedem que descon-
sideremos o agente-produtor de textos como agente-leitor, simul-
taneamente, de modo autônomo e interdependente, como já dito.
Nesse sentido, as sequências, vistas como o produto de uma rees-
truturação ou reconfiguração, organizados na memória do agente-
produtor, possuem uma dimensão interpretativa, ou seja, o mate-
rial “reconfigurado ou ainda clarificados, [...] constitui um material
na base do qual o destinatário é capaz de empreender uma tentati-
va de compreensão das questões da atividade humana” (BRON-
CKART, 1999, p. 234).
Entendemos, portanto, que a tese vygotskyana da emer-
gência da consciência humana mediante os signos linguísticos po-

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dem se configurar como ponto de partida para compreensão do


fenômeno de recepção textual ao lado do que Habermas denomina
de “problemática da compreensão de sentido nas ciências sociais”
(VYGOTSKY, [1928], 1986; SAUSSURE, [1916] 1996, [1876-1913]
2002; HABERMAS, 2012).
Ao assumirmos os conceitos oriundos do ISD, defendemos
que os mecanismos de recepção não são apenas uma imagem in-
vertida dos mecanismos de produção textual. Também assumimos
que se trata de um tema amplo que exige um cuidadoso estudo
que considere todos os aspectos sociais, cognitivos, históricos e
culturais envolvidos na atividade de recepção dos textos.
O ponto de partida dos trabalhos de reescrita do gênero re-
sumo como estratégia de didatização e de letramento acadêmico, -
o qual iremos descrever com mais detalhes posteriormente -, está
nos trabalhos de Schneuwly, Dolz e seus colaboradores. A propos-
ta de didatização dos gêneros acadêmicos funda-se sobre o postu-
lado de que comunicar-se oralmente e por escrito deve ser ensina-
do sistematicamente, por meio de estratégias didáticas. Dolz,
Schneuwly e Noverraz (2004) desenvolvem o conceito de sequência
didática, ou seja, módulos de ensino organizados conjuntamente
com o objetivo de melhorar uma determinada prática de lingua-
gem. Tais sequências visam instaurar a relação necessária entre um
projeto de apropriação de uma prática de linguagem e os instru-
mentos que facilitam tal apropriação. Ao confrontar os alunos com
as práticas de linguagem historicamente construídas, estes, por sua
vez, têm a possibilidade de se apropriar dessas práticas por meio
de processos de reconstrução e de internalização. Dessa maneira,
entram em jogo três fatores preponderantes: (1) as especificidades
das práticas de linguagem que são objeto de aprendizagem, (2) as
capacidades de linguagem dos aprendizes e (3) as estratégias de
ensino desenvolvidas nas sequencias didáticas propostas.
Apesar de considerarmos que os trabalhos desenvolvidos
no âmbito do ISD, até o momento, têm se ocupado primordialmen-
te da produção textual, em especial dos processos de didatização
dos gêneros, podemos perceber que seu arcabouço teórico-
metodológico nos permite a compreensão dos processos, estraté-
gias de didatização também voltados para mecanismos de recepção

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textual, objeto de nossa análise nesse capítulo. Nossa reflexão se


inicia com o relato das estratégias de reescrita do gênero resumo,
seus mecanismos de produção, como meio de observar implicita-
mente o fenômeno da compreensão. Depois focaremos nossa aten-
ção na produção de esquemas de leitura como uma estratégia de
recepção textual.

2. Momento inicial: estratégias de didatização do gênero resumo

Recuperamos nesse breve relato as etapas de concepção e


realização das estratégias de ensino do gênero resumo acadêmico
durante as aulas ministradas para alunos do primeiro período de
Letras na UFPB. O relato inicia com a descrição das orientações
apresentadas para os discentes. Em seguida, observaremos, em um
caso particular, o desenvolvimento das atividades propostas. Ao
final, esboçaremos, sob um ponto de vista macro, os resultados
parciais encontrados.

2.1 Contexto sociointeracional de produção

O processo de didatização do gênero resumo foi realizado


na disciplina de Metodologia do Trabalho Científico – 2012.1, Le-
tras – Habilitação Inglês; noturno. A disciplina é obrigatória, com-
põe a grade curricular do primeiro período do curso com carga
horária de 04 créditos.
A disciplina é a única ministrada em língua materna, as
demais são em língua estrangeira, de acordo com a habilitação do
aluno. A turma era constituída de 35 alunos, todos recém-
ingressos no ensino superior. As aulas foram ministradas em horá-
rio corrido, nas sextas-feiras de 19h às 22h. Sua ementa apresenta-
se estruturada da seguinte forma:

Ementa da disciplina- Objetivo: aprender pressupostos bá-


sicos de iniciação à pesquisa e do trabalho científico que
permitam realizar pesquisas científicas na esfera acadêmica
e trabalhos monográficos. Desenvolver postura científico-

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crítica, capacidade de abordar problemas sob a ótica científi-


ca e formalizar o conhecimento adquirido segundo as nor-
mas vigentes de redação de textos acadêmicos (ABNT).
Apropriar-se de diversos gêneros (orais e escritos) que circu-
lam na esfera científico-acadêmica, tais como: resumo, rese-
nha, fichamentos, relatório, exposições orais, abstract, artigo
científico, construção de projetos. Discutir questões ligadas à
ética e letramento digital.

A partir da ementa, organizamos o conteúdo programático


da disciplina em quatro eixos estruturantes: o saber científico (AL-
VES, 1993; LAVILLE, C.; DIONNE, J., 1999); o trabalho científico
(ALDRIGUE, A. C. S, 2008; CARVALHO, 1997; FURLAN,1997;
MACHADO, A.R.; LOUSADA,E.; ABREU-TARDELLI,L, 2004a;
2004b, 2005; MOITA LOPES, L. P, 1996; SEVERINO,A.J, 2007; SA-
LOMON, U, 1999 ); a pesquisa científica (BAGNO, 2002; BORTONI-
RICARDO, 2008) e as normas que regem as publicações científicas,
o trabalho e a pesquisa (ABNT).
Após a introdução teórica, iniciamos as atividades de rees-
crita com o objetivo de didatizar o processo de elaboração do gê-
nero resumo visando desenvolver no aluno a capacidade de lin-
guagem no eixo do relatar e do narrar, bem como exercitar a práti-
ca de identificar no texto as ideias principais e fazer inferências.
O lugar de produção inicial dos textos foi a sala de aula,
espaço físico organizado com cerca de 50 cadeiras, acústica, ilumi-
nação e climatização adequadas, onde as aulas eram ministradas
com auxílio do quadro branco. Porém, a maior parte das ativida-
des de reescrita foi realizada fora da sala de aula, provavelmente
na casa dos discentes, sem o auxílio do computador para digitação
dos textos.
A turma era composta de 24 alunos, no entanto, seleciona-
mos para compor o corpus apenas as produções que foram acom-
panhadas da esquematização do texto. Desse modo, consideramos
na análise os textos produzidos por nove agentes-produtores: João,
Fábio, Mateus, Maria, Ana, Marta, Felipe, Carla, Joana. Todos eles
possuem um perfil em comum, são pessoas entre 20 e 25 anos, não
trabalham, estão matriculados em um curso superior pela primeira
vez e estão no primeiro período do curso. João, Mateus, Ana, Mar-
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ta e Felipe residem na mesma cidade em que estudam e os demais


moram em outros municípios vizinhos, o que implica viagens diá-
rias para estar presente em sala de aula todas as noites.

2.2 A intervenção pedagógica

Primeiramente, a questão que se colocou diante de nós foi


bem simples: dentre os gêneros acadêmicos que circulam no con-
texto universitário, qual deles deveríamos eleger como objeto de
ensino? A ideia foi iniciar os trabalhos com o gênero resumo por
ele ser parte constitutiva de outros gêneros, como a resenha crítica,
por exemplo, e por, ao mesmo tempo, ser um gênero em que as
capacidades de produção e de inferência são mobilizadas pelo
agente produtor, capacidades que serão importantes ao longo de
toda a vida acadêmica dos discentes.
A etapa inicial consistiu em permitir que os alunos tives-
sem contato com o gênero e observassem o plano composicional, o
estilo, o conteúdo. A partir da exposição e análise de exemplares
do gênero, foi possível conversar sobre os seguintes aspectos: a) O
que é um resumo? b) Qual a sua composição (introdução, desen-
volvimento e conclusão)? c) Você já fez um resumo? d) Quais suas
dificuldades em fazer um resumo? e) Para que serve um resumo?
(estudar/memorizar/reelaborar).
Após essa apresentação geral do gênero resumo, solicita-
mos aos alunos a leitura do ensaio ‘Indicadores objetivos e subjeti-
vos da felicidade’ que está no livro Felicidade do filósofo E. Gianet-
te. A primeira leitura foi realizada em sala, individualmente. De-
pois o texto foi lido em voz alta, uma leitura coletiva e comparti-
lhada pelos alunos. Essa segunda leitura permitiu que a leitura
fosse interrompida ao surgirem dificuldades de compreensão e
que, a partir dessas pausas, pudéssemos intervir com perguntas e
esclarecimentos, auxiliando em aspectos específicos, a exemplo de
significado de palavras pouco conhecidas dos alunos, esclareci-
mento sobre o percurso enunciativo do texto, auxílio na leitura de
tabelas, estatísticas, e de teorias ainda não visitadas pelos alunos.
Além desses pontos, tivemos a oportunidade de apresentar o gê-
nero ensaio acadêmico (conteúdo temático, plano composicional,

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estilo, lugar de produção, agentes de produção e recepção etc.) em


comparação ao gênero resumo.
A escolha desse ensaio partiu da temática da disciplina,
Metodologia do Trabalho Científico, pois este permitia que os alu-
nos observassem a descrição de uma pesquisa científica, o trabalho
com dados estatísticos e as diferenças entre a pesquisa quantitativa
e qualitativa partindo das especificidades do objeto pesquisado, no
caso, o sentimento de felicidade. Um dos aspectos interessantes do
texto era o de propiciar o debate sobre os aspectos metodológicos
do fazer científico.
Apresentamos aos alunos algumas sugestões, após a leitura
e o debate em sala, que serviriam de orientações gerais para a pri-
meira produção do gênero por parte dos alunos como sugestão de
procedimento de trabalho. As sugestões incluíram os seguintes
pontos:

1. Ler e assinalar as ideias mais significativas;


2. Identificar o gênero;
3. Identificar a ideia principal;
4. Identificar a organização do texto (como ideias secundárias
se ligam à ideia principal);
5. Identificar ideias secundárias e agrupá-las em subconjuntos
(níveis de importância ou pontos em comum);
6. Identificar os recursos utilizados (exemplos, gráficos etc.) e
observar como eles apoiam as ideias do texto;
7. Esquematizar o resultado deste procedimento (auxilia na
construção do seu texto);
8. Redigir o texto a partir do esquema ou do procedimento
feito.

A sétima sugestão, - esquematizar o resultado deste proce-


dimento -, partiu do hábito particular da docente/pesquisadora de
construir esquemas de leitura e esquemas de produção do texto e
das definições sobre o procedimento apresentada por Lakatos e
Marconi (2007, p. 24). Muitos alunos afirmaram que não sabiam
construir esquemas, por isso, passamos uma aula (4h) apresentan-
do exemplos das diversas formas de construir esquema, scripts e

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organogramas. Deixamos a critério dos alunos a utilização dessa


sugestão e a forma de fazê-lo, como script, esquema ou organo-
grama. Como não obrigamos os alunos a utilizar esquemas, apenas
alguns desejaram utilizá-lo como ferramenta de leitura/escrita.
Falaremos mais profundamente desse aspecto adiante.
Ao recebermos as produções iniciais dos alunos, ficou evi-
dente a necessidade de um trabalho pontual com as estratégias de
coesão e coerência. Uma aula com atividades específicas sobre o
tema foi suficiente para que alguns alunos pudessem fazer corre-
ções significativas em seus textos.
O trabalho de reescrever os resumos foi guiado por uma
série de perguntas que serviram de base para discussão sobre a
necessidade de revisar o próprio texto:

• O conteúdo exposto no resumo feito corresponde ao


conteúdo do texto resumido?
• O resumo poderia ser compreendido por um leitor que
não tivesse lido o texto-fonte?
• O resumo está organizado com uma introdução, um
desenvolvimento e uma conclusão?
• Sobre a introdução: a) Apresenta brevemente o autor
e/ou texto fonte deixando claro que se trata de um re-
sumo? b) Faz referência à ideia principal do texto-
fonte? c) Apresenta as ideias secundárias do texto-
fonte?
• Sobre o desenvolvimento: a) Apresenta os argumentos
do texto na mesma ordem de importância? c) Deixa
clara a relação entre os argumentos e as ideias que fo-
ram apresentadas na introdução do resumo?
• Sobre a conclusão: a) Há um parágrafo conclusivo para
que o texto não finalize de forma abrupta?
• Sobre o enunciador do resumo: a) Constrói um enunci-
ador expositivo, quer dizer, um enunciador que, no re-
sumo, apresenta as ideias do autor e não a sua própria?
b) Mantém apenas uma voz no texto ou, no resumo,
começa-se falando em terceira pessoa e depois em pri-
meira?

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• Sobre os aspectos microestruturais do texto: a) A pon-


tuação, grafia e acentuação das palavras estão de acor-
do com as normas estabelecidas? b) Os conectivos estão
bem empregados facilitando a construção de sentido do
leitor e evitando graves contradições?

Antes da confecção da produção final solicitamos que os


discentes fizessem os exercícios presentes no livro Resumo (2004).
Houve uma correção em sala, no quadro, dos exercícios, pontuan-
do os aspectos já elaborados no resumo feito pelos alunos e abrin-
do oportunidade para que as dúvidas surgissem e os conhecimen-
tos fossem consolidados.
Tínhamos a necessidade de fixar os aspectos apreendidos e
de tornar explícitas aos alunos as habilidades que foram mobiliza-
das e internalizadas durante esse processo, como a de discernir as
posições defendidas num texto; de delinear a ideia principal subja-
cente aos argumentos elencados em um texto; de compreender as
relações de hierarquia entre os argumentos dispostos num texto;
de citar a palavra alheia; de distinguir lugares sociais e gêneros
distintos; enfim, as diversas práticas que envolvem as atividades
aos discentes nos levaram à última etapa. Desse modo, com o in-
tuito de capitalizar os conhecimentos, nos termos sugeridos por
Schneuwly, Dolz e Noverraz (2004), foi solicitada uma última revi-
são do texto que deveria seguir as orientações abaixo:

• Observe quais aspectos são corrigidos entre a primeira


produção escrita e sua reescrita, prestando atenção tanto
para o conteúdo como para a construção do resumo;
• Quais questões ainda poderiam ser corrigidas?
• Em geral, a reescrita resultou num resumo mais satisfatório
que o primeiro?
• Há citações diretas ao texto fonte? Que função estas cita-
ções têm no resumo? Poderiam ser retiradas?

As perguntas serviram de guia para que os alunos editasse seu


texto. Questões microestruturais puderam ser observadas, bem
como as normas de citação e referência. Essa última etapa permitiu

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que os alunos ganhassem autonomia diante do seu texto, sendo


capazes de observar pontos positivos e negativos dos diversos
níveis textuais/discursivos e corrigi-lo sem auxílio direto do pro-
fessor-corretor que aponta falhas no papel, em geral, com a caneta
vermelha tão conhecida dos alunos nos seus anos escolares inici-
ais.
Ao final, pedimos que os alunos espontaneamente partici-
passem de uma atividade de autoavaliação e de avaliação do pro-
cedimento de reescrita a que foram submetidos1, cujos resultados
também serão discutidos neste capítulo.

2.3 Refletindo sobre a experiência de reescrita e esquematização

A partir do trabalho descrito acima, o corpus aqui observa-


do inclui as produções textuais realizadas durante o procedimento
de didatização do gênero resumo e os depoimentos de autoavalia-
ção dos alunos ao final das atividades de reescrita. Inicialmente,
procedemos a uma avaliação quantitativa e qualitativa das propos-
tas de produção textual e reescrita do gênero resumo. As categori-
as de análise e a proposta de reescrita do gênero resumo acadêmi-
co seguiram os parâmetros de constituição e avaliação de textos
propostos por Bronckart (1999, 2006, 2007), a saber: situação de
ação de linguagem: os elementos associados a este nível referem-se
tanto ao contexto sociossubjetivo quanto às representações sobre o
conteúdo temático. Infraestrutura: engloba a estruturação geral do
gênero com seus elementos constitutivos (plano geral), os tipos de
discurso que o caracterizam (relativos ao mundo do narrar e do
expor), o conteúdo temático proposto e as sequências que consti-
tuem o texto (sequências narrativas, argumentativas, descritivas,
expositivas e injuntivas). Mecanismos de textualização: referente
às estruturas linguísticas que possibilitam a relação coesa entre os
enunciados e termos do texto para manter sua coerência temática.
Elas incluem as seguintes categorias: coesão nominal, verbal e co-
nexão. Mecanismos enunciativos: englobam tanto as vozes que
constituem o texto (vozes sociais, do autor, das personagens, do

1 Ver Anexo I.

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narrador), quanto as modalizações: avaliações do enunciador so-


bre valor de verdade, valores sociais, avaliações subjetivas e do
personagem em relação a sua ação.
Numa segunda etapa, descrevemos os esquemas produzi-
dos em busca de uma verificação de traços que elucidem o proces-
so de recepção/produção na esquematização do texto e, posterior-
mente, comparamos os resumos produzidos e os esquemas que
lhes antecederam a fim de verificar semelhanças entre as duas
produções. Ao final do processo de didatização do gênero resumo,
comparamos as análises realizadas com as autoavaliações como
forma de compreender o estatuto do esquema no processo de
apreensão do gênero.
Em vista das limitações do espaço deste capítulo, exempli-
ficaremos o processo de reescrita e didatização com os dados co-
lhidos de apenas um agente produtor que chamamos de Ana. Ini-
cialmente, observaremos suas produções, a saber, o esquema pro-
duzido, a primeira versão do resumo, a segunda versão e a edição
final realizada pela aluna. Ao longo dessa exposição, tentaremos
refletir sobre o processo de reescrita como estratégia de didatiza-
ção e de apropriação dos esquemas de utilização do gênero
(SCHNEUWLY, 2010, p.22), o que podemos denominar de letra-
mento acadêmico; bem como na construção de esquema de leitu-
ra/construção textual como estratégia de recepção do texto, na
medida em que há um movimento de reconfiguração do agir co-
municativo (HABERMAS, 2012; RICOEUR, 1977).
Observamos agora as produções textuais de Ana. A pri-
meira produção foi o esquema construído a partir da leitura do
ensaio de E. Gianette. Vejamos:

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Figura 1 – Esquema de Ana

No esquema acima observamos como Ana reconfigurou o


texto-fonte, reorganizando-o. Como nos ensina Bronckart (1999, p.
233-248), verificamos acima o produto de uma “reestruturação do
conteúdo temático já organizado na memória do agente-produtor
na forma de macro-estruturas”. O conteúdo temático, os temas
apresentados por E. Gianette no ensaio, lido em sala e individual-
mente, foram reorganizados conforme a motivação da agente-
produtora quando assume o papel inicial de destinatária do texto-
fonte. De acordo com os efeitos observáveis nas macro-estruturas
acima, podemos dizer que houve uma tomada de decisão de Ana,
agente-produtora deste esquema, orientada por suas representa-
ções sobre: (1) o ensaio lido, em todos seus aspectos discursivos;
(2) seu destinatário e (3) os efeitos pretendidos ao escrever seu
esquema. Assim, a natureza fundamentalmente interacional das
atividades linguageiras são recobertas nessa atividade de lingua-
gem específica.

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No esquema de Ana podemos observar a presença dos te-


mas/conteúdos principais articulados no ensaio: a felicidade, a
definição parcial do que são os indicadores objetivos (saúde, ren-
da) e subjetivos (experiência interna, aquilo que passa em sua
mente espontaneamente) da felicidade. No entanto, percebemos
que não há de forma exata a mesma configuração no ensaio e no
esquema. A tentativa de propor uma ligação entre os dois indica-
dores pode ser vista na esquematização (Sim = Felicidade; Não =
Infelicidade) como uma atitude de reestruturação dos te-
mas/conteúdos apresentados por E. Gianette. O esquema de Ana
apresenta uma conclusão que não se encontra diretamente no tex-
to-fonte, mas que, provavelmente, foi inferida a partir da apresen-
tação na pesquisa de uma relação entre os indicadores objetivos e
subjetivos do bem-estar.
Os acontecimentos narrados estão reconfigurados e possu-
em uma dimensão interpretativa das questões suscitadas no ensaio
lido, estando na ordem do narrar e do expor simultaneamente,
pois ao mesmo tempo em que apresenta os acontecimentos dispos-
tos em determinada ordem, informa mediante um procedimento
não convencional constitutivo de uma lógica casual.
Quando comparamos o resumo final escrito por Ana e o
esquema que lhe antecedeu, podemos destacar alguns aspectos.
No primeiro parágrafo do resumo há delimitação do tema, em
seguida, a descrição dos indicadores objetivos e subjetivos de bem-
estar, à guisa de conclusão, apresenta-se um questionamento. Essa
ordenação espelha a organização presente no esquema 2 permitin-
do compreendê-lo também como um orientador da construção
enunciativa, ao mesmo tempo em que sua reestruturação e distan-
ciamento do ensaio permitem observar, implicitamente, os proces-
sos de recepção textual que deram origem a produção do texto.
Ana, como agente de produção, selecionou as informações que
deveriam constar no seu resumo, consideradas por ela como es-
senciais e se responsabiliza por essa decisão. Isso implica uma to-
mada de decisão importante, pois exclui do seu resumo tudo que
considera de menor relevância para a compreensão do tema abor-

2 Ver Anexo II

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dado, ou seja, podemos dizer que a recepção textual foi essencial-


mente estratégica, visando uma posterior produção.
Agora observemos um pouco as atividades de reescrita rea-
lizadas após a construção do esquema. Elas se seguiram por duas
vias complementares, a primeira focalizou as perguntas que ser-
viriam de guia para a reescrita, - já citadas neste relato -, de cunho
geral. A segunda voltou-se para as intervenções diretas no texto
que tinham a intenção de oferecer uma orientação mais individua-
lizada, pontuando aspectos específicos de cada produção textual.
Acerca dos resumos produzidos por Ana, temos as seguintes ori-
entações e revisões concernentes ao primeiro parágrafo do seu
resumo3:

1ª versão 2ª versão 3ª versão


<rever introdução> <Na introdução Eduardo Gianne-
Qualquer deve ficar claro te,
que seja o propósito quem é o autor e que Professor integral
último da existência se trata na Ispe,
humana de um de um resumo de PhD em economia
ponto de vista cósmico, uma obra pela
uma coisa é certa: o específica> universidade
propósito A questão do segre- Cambridge,
terreno das pessoas de do da nos fala em seu
carne felicidade e do pra- texto
e osso em qualquer lu- zer na “Indicadores sub-
gar do melhor vida ao nos- jetivos e
planeta é alcançar a so Objetivos de bem-
felicidade e fazer o me- alcance tem ocupado estar” a
lhor alguns do melhores questão do segre-
de são capazes de suas (e piores) cérebros do da
vidas. da felicidade e do

3Todas as transcrições encontradas nesse capítulo seguem as convenções


definidas pelo campo da crítica genética: em primeiro lugar se indica a
procedência com as siglas do nome do autor, seguida da indicação da
ordem cronológica. As intervenções no texto estão em letras cursivas e
em parênteses angulares (< >) indicando que se trata de uma intervenção
manuscrita acima da linha. As palavras tachadas foram rasuradas pelo
autor.

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humanidade há prazer na
milênios. melhor da vida ao
nosso
alcance tem ocu-
pado
alguns dos melho-
res
(e piores) cérebros
da
humanidade há
milênios.
Quadro 1 - Versões

Podemos observar que, na primeira versão, a orientação


vaga que a docente oferece não é suficiente para ajudar Ana. Po-
rém, na segunda versão, a docente percebe a necessidade de ser
específica em suas orientações, o que resulta na inserção de infor-
mações desnecessárias sobre a biodata do autor na última versão.
Isso evidencia que Ana se esforçou para acatar as orientações e
conseguiu se aproximar do que se pretende com um primeiro pa-
rágrafo de um resumo, que é orientar o leitor sobre o assunto a ser
resumido, situando primeiro qual é a obra abordada.
Um dos pontos que nos chamou atenção no processo de
elaboração do texto acima se refere às alterações ocorridas no nível
dos elementos paratextuais, especificamente no cabeçalho que ini-
cia o resumo, que vai se modificando discretamente de uma versão
para a outra. Na primeira versão a discente escreve apenas o nome
da professora, já na segunda e terceira versões há o título “profes-
sora” antecedendo o nome. Mais do que apropriar-se de um gêne-
ro acadêmico, a discente apropria-se de uma postura acadêmica,
reforçando a tese volochinoviana do estatuto fundamentalmente
social dos gêneros.
Observando as três versões e o esquema produzido junto
com a primeira versão, podemos concluir que houve um desen-
volvimento na aluna concernente à capacidade de linguagem no
eixo do relatar e do narrar; a capacidade de identificar no texto as
ideias principais e fazer inferências, e ao domínio do gênero resu-
mo acadêmico e seus esquemas de utilização (SCHNEUWLY,
2010, p.19-34).

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2.4 A autoavaliação

Após finalizarmos as atividades de reescrita, solicitamos


aos alunos que respondessem ao questionário de autoavaliação e
avaliação da disciplina4. As perguntas tinham o objetivo de con-
duzir os alunos a um momento de capitalização dos seus conheci-
mentos e habilidades adquiridos durante o processo. Também
serviram de auxílio para a docente que estava exercendo pela pri-
meira vez esse papel e desejava compreender-se como uma profes-
sora. As respostas de Ana pareceram bastante reveladoras:

• Nas aulas de língua portuguesa no Ensino Médio você já havia passado


pela experiência de reescrita de sua própria produção textual? Não. E creio
eu, que a minha professora nem lia o meu texto.

• Como você avalia a proposta de reescrita das suas produções textuais nesta
disciplina? Positiva. Porque estimula a escrita da gramática correta, não só
a gramática como a produção textual. É uma boa forma de extrair o melhor
do aluno.

• Em que momento do processo de reescrita você sentiu mais dificuldade?


Fazer uma boa introdução e conclusão do texto.

• Os esquemas ajudaram a compreender mais o texto a ser resumido? Sim.


Com o esquema dá para sintetizar o texto e ter uma melhor compreensão.

• Os esquemas ajudaram a produzir mais facilmente o resumo do texto-


fonte? Sim. O esquema ajudava a escrever numa ordem.

• Você considera que seu esquema reflete o resumo que você fez? Sim. Com
o esquema ficava fácil saber as ideias principais do texto, entender o que o
autor queria falar e passar com o texto, e ao final entendendo bem o texto
podemos fazer uma boa reescrita.

Quadro 2- Avaliação e autoavaliação do processo de escrita de Ana.

4 Ver Anexo I

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As repostas da aluna nos revelam sua visão do processo de


reescrita e da produção do esquema como uma estratégia essenci-
almente de compreensão do texto-fonte. Quando ela afirma que
“com o esquema ficava mais fácil saber as ideias principais do tex-
to” e “ao final podemos fazer uma boa reescrita”, a aluna toma o
esquema como estratégia de leitura/produção textual ao mesmo
tempo em que se torna consciente de que se trata de estratégias
intencionais e situadas.
Inicialmente, levantamos a hipótese de que os esquemas
não tinham servido de auxílio na produção textual, constituindo-
se apenas como mais uma atividade proposta, quase de modo pa-
ralelo à elaboração do resumo. O fato de alguns alunos terem feito
o esquema, mesmo não sendo obrigatório, parecia, para a profes-
sora, tratar-se tão somente de uma evidência da consciência do
lugar de “autoridade” que o docente tradicionalmente tem ocupa-
do em sala de aula.
Essa compreensão negativa do processo foi consequência
da dificuldade da professora de compreender os processos de rees-
truturação textual como movimentos interpretativos, inferenciais e
também resultantes de sua insegurança, já que era a primeira vez
que estava lecionando. Para a professora/pesquisadora, um dos
dados mais relevantes presente nas avaliações dos alunos foi a
descrição da experiência positiva com os esquemas e de todo o
procedimento. Desse modo, após a leitura atenta e comparativa
entre os esquemas e os resumos, e em especial, da reflexão que os
próprios discentes possuem da atividade desenvolvida, podemos
dizer que, mesmo não interferindo na linearidade do texto, os es-
quemas serviram como orientação de leitura e interpretação, e
sendo assim, está implicado nos parâmetros sociossubjetivos, es-
pecialmente os referentes ao conteúdo temático.

3. Resultados parciais

Observemos agora os dados da turma, do ponto de vista


macro. A primeira constatação, talvez muito evidente, é que orien-
tações específicas, escritas pela professora no texto do aluno, cha-

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mando atenção para aspectos específicos do texto de cada aluno,


individualmente, ajudaram os alunos de forma mais eficaz no pro-
cesso de recepção e de produção textual do que as orientações ge-
rais. Ou seja, podemos dizer que orientações gerais não prescin-
dem de orientações individuais e específicas. No entanto, essa
constatação inicial não significa que as orientações gerais em sala,
antes da primeira atividade de escrever um resumo, e aquelas
apresentadas em sala para guiar o aluno em sua primeira reescrita
do resumo (levando em consideração as três camadas do folhado
textual) não sejam importantes.
Percebemos que as perguntas e pontos expostos no quadro
para a turma, guiaram a compreensão do texto, pois direcionavam
o aluno a questões fundamentais do processo de recepção textual:
Qual a razão de ler determinado texto? Quais efeitos de sentido
pretendidos pelo autor do texto? Quem? Quando? Em que lu-
gar/situação de comunicação? Por sua vez, as orientações docen-
tes escritas diretamente no texto do aluno parecem ter um peso
maior no processo de produção textual e, sendo mais detalhadas e
específicas, levam a resultados positivos na reescrita do aluno (Cf.
LEITE, 2012). Orientações generalizantes, a exemplo de, “reveja a
introdução”, não são de verdadeiro auxílio para o aluno mesmo
que, anteriormente, o professor tenha explicitado o que é uma “in-
trodução”.
Foi observado também que a leitura e discussão de vários
exemplares do gênero antes de escrevê-lo ajudam o aluno a com-
preender e a apropriar-se dos traços/características gerais de utili-
zação do gênero a ser produzido, aumentando a habilidade do
aluno em manusear o instrumento semiótico. O papel do professor
como orientador não anula o processo de autorreflexão do aluno,
mas, ao contrário, o incentiva. Isto fica evidente no momento de
autoavaliação, quando o aluno tem a capacidade de perceber o que
foi apreendido e em quais aspectos ainda precisa melhorar.
O material descrito indica que o procedimento de esquema-
tização pode, em alguns casos, funcionar como apoio na estrutura-
ção e compreensão do gênero por revelar ao leitor/produtor de
textos a camada da infraestrutura textual em sua relação de inter-
dependência com os mecanismos de textualização e os mecanis-

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mos enunciativos. Ainda não podemos afirmar que tal estratégia


se configure como um mecanismo de recepção textual propria-
mente dito, mas se constituiu como um instrumento semiótico
importante no favorecimento da compreensão dos textos. No qua-
dro abaixo apresentamos uma comparação entre as produções dos
alunos que participaram das atividades de reescrita posteriormen-
te à confecção dos esquemas:

Agente Resumos que refletem o Resumos que


produtor ensaio refletem parcial-
mente o ensaio
João x
Fábio
Mateus x
Maria x
Ana x
Marta
Felipe x
Carla x
Joana x

Quadro 3 – Comparativo: ensaio/resumo inicial com apresentação de


esquema.

Observamos que todos os nove alunos, após a produção do


esquema, produziram resumos que refletiam, mesmo que parcial-
mente, os conteúdos temáticos organizados no ensaio, texto-fonte
do resumo. Observamos nos resumos iniciais, antes das atividades
de reescritas, o produto semiotizado de uma reestruturação ou
reconfiguração, dos objetos discursivos organizados na memória
do agente-produtor. Estes possuem uma dimensão interpretativa
originada num processo de reconfiguração do material base, o
ensaio (BRONCKART, 1999, p. 234). Por esta razão, os resumos
frequentemente se afastam do texto-fonte evidenciando essa pos-
tura interpretativa que Bronckart sublinha. Nenhum dos resumos
apresentava trechos com as mesmas palavras do ensaio sem o uso

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de aspas, o distanciamento da voz do autor e da voz do resumidor


aparece adequadamente inscritas, o que se configura como uma
atitude discursiva positiva, evidenciando o processo de letramento
acadêmico desses alunos.
Ao analisar os resumos produzidos pelos 15 alunos restan-
tes, que não construíram esquemas antes de escrever seus resu-
mos, podemos constatar que houve uma tendência maior de repe-
tir as mesmas palavras do autor do ensaio, parágrafos inteiros sem
o uso de aspas. Também percebemos uma dificuldade específica
construção conclusão do resumo, em especial, em distanciar-se da
voz do autor, o que indicou para a professora a necessidade de
voltar-se com mais ênfase nesse aspecto do gênero resumo.
Vejamos algumas conclusões que apresentam essa dificuldade:

Agente Conclusão
Produtor
T.C.F. “Enfim, como dito no início do texto, a procura pela felicidade
sempre foi e será o final objetivo na vida de cada uma das pessoas
e essa pesquisa têm sido muito eficaz e vêm abrindo novas discus-
sões sobre o assunto.”
M. C. “A felicidade é a a finalidade da vida do ser humano. Resta saber
se com seu meio de vida pessoal e profissional, as pessoas estão se
conduzindo a tal fim”.
L.C.R. “A felicidade sempre foi e continua sendo um grande fim, a
finalidade suprema da qual se justificam escolhas na vida pública
e privada”
H.B. Ser rico e ser pobre, ambos podem ser muito felizes, basta saber o
que as satisfaz”.
D.M. “A pergunta é “será que a riqueza material é um bom indicador
de bem-estar?” Como faremos para interpretar esses dados diante
das anomalias que os estudos empíricos nos remetem a estudos
nos conduzindo a fins desejáveis”.
J. S.S. “A felicidade está na busca de uma satisfação e uma qualidade de
vida cada vez melhor”
S. “A felicidade sempre foi e continua sendo um grande fim, se não a
finalidade suprema, em nome do qual se justificam as escolhas na
vida pública e privada.”
M.L.G. “Enfim, buscamos viver intensamente atrás da felicidade e o que
ela nos oferece de melhor”

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D.C.D “Para muitos a felicidade consiste em adquirir bens ter um traba-


lho, ser conhecido por algo. A felicidade tem ainda significado de
bem-estar.

Quadro 4 – Conclusões dos resumos sem apresentação de esquemas

Destacamos que cinco resumos de agentes produtores que


não fizeram esquemas apresentam uma boa conclusão, com esco-
lhas lexicais diferentes do texto-fonte, utilizando recursos enuncia-
tivos que marcam o distanciamento da voz do autor do ensaio e do
autor do resumo.
Os números comparativos não são expressivos estatistica-
mente, por essa razão evitamos trazer um quadro com dados dessa
natureza. No entanto, do ponto de vista qualitativo, podemos di-
zer, inicialmente, que os esquemas, mesmo que não dessem conta
de todos os aspectos centrais do texto fonte, guiavam o aluno a
retomá-lo e a identificar as lacunas temáticas presentes no seu re-
sumo. Entendemos que o ato de pensar se o resumo refletia o tex-
to a ser resumido já se constitui como uma tentativa de compreen-
der até que ponto a função social do gênero resumo foi apreendida
e o papel da esquematização na leitura do texto-fonte.
A dificuldade em construir um resumo que refletisse o
mesmo percurso enunciativo do texto a ser resumido, talvez, possa
ser explicada pelas seguintes palavras de uma discente, quando
questionada na autoavaliação sobre o momento de maior dificul-
dade, ela disse: “no momento em que era necessário ser colocada a opi-
nião concordando com o autor. Porque eu nunca tinha lido textos desse
nível, então tinha hora que eu ficava um pouco desarmada, pensando: será
que isso tá certo? Ou será que está errado? Os textos do ensino médio
eram bem diferentes desses que eu trabalhei agora na Universidade. Mas
com as explicações e dicas, deu pra clarear bastante coisa”.
Importante assinalar que, de todas as autovaliações entre-
gues, apenas duas delas descreviam o trabalho de reescrita em
termos negativos, como cansativa e repetitiva. Já o trabalho de
esquematização foi descrito em tons positivos, como facilitador do
processo de leitura e de produção. Destacaram os benefícios do
processo, em especial, das orientações constantes que receberam.

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Um dos discentes escreveu: “farei isso com meus futuros alunos”,


evidenciado mais uma vez que o trabalho com os gêneros, vistos
como instrumento semiótico, vai além da apropriação das tradici-
onais “fórmulas” de leitura/escrita e das observações sobre a es-
trutura do enunciado.

Considerações finais

As atividades desenvolvidas no âmbito do ATA preten-


dem, em primeiro lugar, a partir do trabalho de didatização dos
gêneros acadêmicos, evidenciar como o processo de elaboração
dos textos-discursos se articulam com ações efetivas voltadas a
uma pedagogia da escrita. Sendo assim, todas as atividades pro-
cessuais envolvidas (produção e apreensão) não podem ser des-
consideradas nos processos de ensino-aprendizagem, mais especi-
ficamente naqueles que envolvem a elaboração textual, também no
ensino superior.
O segundo aspecto evidenciado no relato acima aponta pa-
ra os procedimentos de planificação do texto como meio ou estra-
tégia legítima de apreensão e recepção textual. O desenvolvimento
de uma metodologia específica para o tratamento da compreensão
e de desenvolvimento de orientações específicas para atividades
de leitura de textos acadêmicos são aspectos que não devem ser
negligenciados no processo de letramento acadêmico.

Referências

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les langues indo-européenes. Leipzig: B. G. Teubner.

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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MACHADO, A.R.; LOUSADA, E.; ABREU-TARDELLI,L. Resumo. São


Paulo: Parábola Editorial, 2004.
PEREIRA, Regina Celi Mendes. Do social ao psicológico: os caminhos que
conduzem à materialização do texto escrito. In: PREIRA, R. C. M e ROC-
CA, M. Del Pilar. Linguística Aplicada: um caminho com diferentes
acessos. São Paulo: Contexto, 2009.
______. Práticas de escrita e reescrita na sala de aula: Desafios para alu-
nos e professores. In: PEREIRA, Regina Celi M. (org.). Ações de lingua-
gem: da formação continuada à sala de aula. João Pessoa: Editora da
UFPB, 2010.
VOLOCHINOV, V. N. [1929/1977]. Marxismo e Filosofia da Linguagem.
São Paulo: HUCITEC, 1988.
______. ([1930] 1981). A Estrutura do enunciado. Tradução de Ana Vaz,
para uso didático, com base na tradução francesa de Todorov, T. (La
structure de l’énoncé), publicada em Mikhaïl Bakhtine. Le principe dialo-
gique, suivi de Ecrits du cercle de Bakhtine. Paris, Seuil.
VYGOTSKY, Lev Semyonovitch. [1930]. A formação social da mente. São
Paulo: Martins Fontes, 1984.
WITTGENSTEIN, L. Gramática Filosófica. São Paulo: Loyola, 2003.

ANEXOS

ANEXO I

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA


CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS E MODER-
NAS
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS
DISCIPLINA: Metodologia do Trabalho Científico
PROFESSORA: Raquel Basílio
ALU-
NO(A):____________________________________________________
AUTOAVALIAÇÃO E AVALIAÇÃO DA DISCIPLINA

IMPORTANTE:

A) Responda as questões, individualmente, em forma de texto.

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B) Justifique suas respostas com suas próprias palavras.


C) Seja sincero ao responder as questões.

1. Nas aulas de língua portuguesa no Ensino Médio você já


havia passado pela experiência de reescrita de sua própria
produção textual?

2. Como você avalia a proposta de reescrita das suas produ-


ções textuais nesta disciplina?

3. Em que momento do processo de reescrita você sentiu mais


dificuldade?

4. Qual a importância teve para você a construção de esque-


mas durante do processo de produção do resumo?

5. Os esquemas ajudaram a compreender mais o texto a ser


resumido?

6. Os esquemas ajudaram a produzir mais facilmente o resu-


mo do texto-fonte?

7. Você considera que seu esquema reflete o resumo que você


fez?

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ANEXO II

Quadro 1 – ANA: Esquema/Resumo


ESQUEMA RESUMO
Tema: Felicidade 1 Qualquer que seja o propósito último de exis-
tência humana de um ponto de vista cósmico,
uma coisa é certa: o propósito terreno das pes-
soas de carne e osso em qualquer lugar do pla-
neta é alcançar a felicidade e fazer o melhor de
que são capazes de suas vidas.
2 A busca do prazer e a aversão a dor não detém
o controle exclusivo das ações que conduzem à
felicidade, mas são guo guias indispensáveis na
realização deste fim.

Indicadores Ob- 3 O que torna as pessoas felizes? O primeiro


jetivos passo é constatar que o bem estar humano abar-
Saúde ca dois componentes básicos. Existe uma di-
Renda mensão objetiva, possível ser publicamente
apurada, observada e medida de fora, e que se
reflete nas condições de vida reais registradas
por indicadores numéricos de nutrição, saúde,
moradia, uso do tempo, renda per capita, desi-
gualdade, criminalidade, poluição e assim por
diante;

Indicadores Sub- 4e há uma dimensão subjetiva, que é a experi-


jetivos ência interna do indivíduo, ou seja, tudo aquilo
experiência inter- que se passa em sua mente de forma espontânea
na enquanto ele vai vivendo e agindo no decorrer
(aquilo que se dos dias e que volta e meia ocupa a sua atenção
passa em sua consciente nos momentos em que ele se dá con-
mente espontane- ta do que está sentindo e pensando ou reflete
amente) sobre a vida que tem levado.

Sim = Felicidade; 5 O grande desafio pra para quem se propõe a


Não = Infelici- analisar os determinantes da felicidade na vida
dade. e convivência humanas é obter informações e
dados empíricos confiáveis sobre a dimensão
subjetiva do bem-estar. Como então saber se as
pessoas estão se sentido felizes com a vida? A
SUMÁRIO saída encontrada foi perguntar a elas.
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PERSPECTIVAS DE AGIR E
CAPACIDADES DE LINGUAGEM
MOBILIZADAS NA EXPOSIÇÃO ORAL
Roziane Marinho Ribeiro

Introdução

A partir do enquadre teórico do Interacionismo Sociodis-


cursivo, podemos dizer que o gênero exposição oral se caracteriza
como um “modo de agir linguageiro” (BRONCKART, 2008, p. 87)
que se estabelece, fundamentalmente, em atividades acadêmi-
cas/escolares. Para Dolz et al. (2004, p. 118), é possível definir a
exposição oral

[...] como um gênero textual público, relativamente formal e


específico, no qual um expositor especialista dirige-se a um
auditório, de maneira (explicitamente) estruturada, para lhe
transmitir informações, descrever-lhe ou lhe explicar alguma
coisa.

Nesse sentido, a exposição oral é produto das configu-


rações e reconfigurações humanas no âmbito social, se constituin-
do como artefato sócio-historicamente pré-construído, portanto,
possível de ser mobilizado como ferramenta ou instrumento para
os sujeitos agirem em diversas situações de linguagem
(BRONCKART, 2006, 2008; CRISTOVÃO, 2013). Assumir essa
perspectiva significa defender a exposição oral como instrumento
agentivo, através do qual o sujeito falante é capaz de formatar suas
ações em práticas linguajeiras e, consequentemente, fazer emergir

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capacidades de linguagem que potencializam o seu desenvolvi-


mento humano.
Considerados o papel e a importância da exposição oral
como instrumento de ação, este gênero assume, consequente-
mente, valor significativo na esfera acadêmica, uma vez que,
através dele, se materializam várias ações linguajeiras de produção
e divulgação de conhecimentos legitimados por esta esfera
científico-social, possibilitando ao aluno o exercício de construção
e reconstrução do conhecimento, bem como o reconhecimento do
seu papel como produtor deste conhecimento. Estas ações estão
intrisecamante relacionadas às práticas de oralidade/letramento,
tão relevantes para a constituição do ser cidadão e do exercício
pleno da cidadania.
Mas, ao mesmo tempo em que a exposição oral se reveste
de importância, observamos na maioria das práticas acadêmicas o
desconhecimento por parte dos alunos das características formais e
funcionais deste gênero, resultantes, sobretudo, da ausência de
propostas sistemáticas de ensino que se estende progressivamente
desde a escola básica.
Se é bem verdade “que a escrita está atada desde suas
origens ao jogo de dominação/poder, participação/exclusão que
caracteriza ideologicamente as relações sociais” (TFOUNI, 2011, p.
2), o oral também traz estas marcas, estando associada ao desen-
volvimento cognitivo e cultural dos indivíduos e, portanto,
passível de transformar estes alunos em usuários conscientes, que
dominam e sabem fazer uso da língua para expor uma informação,
argumentar, justificar, explicar etc. Por isso, concordamos com a
autora supracitada, no sentido de que a escola, assim como a
academia, precisam restituir no aluno a vontade de falar, descons-
truindo a ideia de supremacia da escrita e de que somente através
desta é possível ser letrado.
Partindo desta breve reflexão, este artigo põe em discussão
alguns aspectos linguístico-discursivos e pragmáticos envolvidos
no gênero exposição oral. Analisamos recortes discursivos, extraí-
dos de exposições orais produzidas por 13 alunos do segundo
período, de uma universidade pública de Lisboa-PT. Estes alunos
fizeram parte como colaboradores no estágio pós-doutoral reali-

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zado, especificamente nas atividades docentes desenvolvidas no


componente curricular Práticas Textuais1. Nesta proposta de
atuação docente, foi possível realizar uma sequência didática
contemplando o gênero exposição oral. E, como resultado dessa
intervenção didática, os alunos produziram exposições orais, que
foram gravadas, transcritas2 e analisadas, com o propósito de
mostrar como se apresenta o agir desses alunos em circunstâncias
de comunicação acadêmica e as capacidades de linguagem mobi-
lizadas nessa produção textual. Esperamos, dessa forma, poder
contribuir para o acervo de discussões em torno do gênero expo-
sição oral e de questões relativas ao agir linguageiro que circun-
dam a relação oralidade/letramento no contexto acadêmico.

1. O caráter social, discursivo e interativo do agir linguístico

O agir linguístico tem sido alvo de muitas discussões filo-


sóficas, epistemológicas em Bronckart (2008), cuja abordagem
contempla uma ampla discussão sobre as bases filosóficas, socio-
lógicas e psicológicas que dão sustentação às ideias propostas pelo
Interacionismo Sociodiscursivo – ISD. O objetivo aqui não é resga-
tar toda esta discussão epistemológica, mas situar alguns aspectos
que consideramos como parâmetros para a nossa análise acerca
das ações, configuradas através do gênero exposição oral.
Na busca de uma definição para o agir discursivo,
Bronckart (2008) dialoga com vários pensadores, entre eles, Jürgen
Habermas, e, embora este autor esclareça que a teoria haberma-
siana não se mostra suficiente para explicar o estatuto e o papel
do agir linguístico, desse diálogo resulta o consenso de que o agir
linguístico/comunicativo se funda na linguagem, em atividades
linguajeiras, e que estas atividades são motivadoras do agir
individual e coletivo, portanto, também estão relacionadas com o

1 Estágio Pós-Doutoral (2013/2014), Universidade Nova de Lisboa – pro-


cesso 10537/12-0 – financiado pela CAPES/Brasil.
2 As transcrições seguem as regras do Projeto NURC/USP – Normas

Urbanas Cultas de São Paulo.

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“desenvolvimento humano” e a capacidade de “emancipação pela


linguagem”.
Ainda que esta teoria não satisfaça ao ISD, porque não
apresenta elementos de análise linguística que reflitam sobre os
signos da linguagem, nem sobre a organização linguística do agir
no nível dos textos/discursos (BRONCKART, 2008), ela traz
contribuições filosóficas e sociológicas importantes acerca das
ações de linguagem. Estamos nos referindo, especificamente, à
Teoria da Ação Comunicativa, a partir da qual Habermas (1987a,
1987b, 2002) explica as ações dos indivíduos sobre os outros e
sobre o mundo.

Os sujeitos capazes de linguagem e ação, do horizonte de


seu mundo da vida a cada vez compartilhado, devem poder
“se relacionar” “com algo” no mundo objetivo, quando
quiserem se entender entre si “sobre algo” na comunicação,
ou conseguirem “algo” nas relações práticas3 (HABERMAS,
2002, p. 39).

Esta teoria, que se abriga num pressuposto pragmático,


parte do princípio de que há uma relação entre a objetividade do
mundo e a intersubjetividade que marca o agir dos falantes,
considerando que o processo comunicativo se origina a partir de
situações reais, dos atos subjetivos (atribuição de sentido e cons-
trução de um sistema de referência) e das intenções de comunicar.
Assim, é no uso pragmático e interativo da linguagem, regulado e
mediado pelas práticas verbais, que se constituem as estruturas do
mundo e as ações comunicativas.
Destacamos, então, um dos conceitos básicos dessa teoria: o
conceito de racionalidade comunicativa, que corresponde à capa-
cidade de fazer acordos não coercitivos, de agir pelo diálogo e,
portanto, o contrário está suposto: quanto menor for o uso da
racionalidade comunicativa menor a capacidade de estabelecer
diálogo com o outro e maior a capacidade de utilizar a coerção, a
manipulação como mecanismo de ação, na fala habermasiana isto

3 Destaques do autor.

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representa a “manipulação instrumental da linguagem”. Esta


racionalidade pressupõe interlocutores que sejam competentes no
uso da linguagem, para agirem comunicativamente e alcançarem a
emancipação, portanto, a linguagem assume papel relevante neste
agir comunicativo emancipatório, considerando que somente
através dela o entendimento e o exercício crítico e reflexivo da
razão se estabelece.
Convergindo para este mesmo entendimento, de pensar o
agir como fator de desenvolvimento humano, Bronckart (1999,
2008), embasado, sobretudo, na pespectiva vigotskiana, amplia
essa discussão, tomando a linguagem como propulsora do desen-
volvimento de capacidades coletivas e individuais. Esse agir, que
se desdobra simbioticamente em ações (imputadas ao indivíduo) e
atividades de linguagens (objeto sociocultural), mobiliza signos e
processos semióticos, possibilitando a construção e reconstrução
de conhecimentos através dos textos/discursos e, ao mesmo tem-
po, potencializando níveis evolutivos das capacidades linguístico-
discursivas, capazes de levar o sujeito a exercer uma atitude
praxiológica, de ação e reflexão sobre o mundo. Nessa confluência
de sentidos sobre o agir humano/linguajeiro, o ator social é para
Bronckart o que o sujeito emancipado é para Habermas. E é na
imersão consciente nas atividades de linguagem, reguladas e
mediatizadas pela interação e pelos gêneros que circulam social-
mente, que este ator social se constrói.
Isso aponta para o importante papel dos gêneros como
instrumentos de ação. Sobre essa questão, Machado e Cristovão
(2006, p. 551) afirmam:

Os gêneros de texto se constituem como artefatos simbólicos


que se encontram à disposição dos sujeitos de uma determi-
nada sociedade, mas que só poderão ser considerados como
verdadeiras ferramentas/instrumentos para seu agir, quan-
do esses sujeitos se apropriam deles, por si mesmos, consi-
derando-os úteis para seu agir com a linguagem.

Nessa mesma perspectiva, Bronckart (2006, p. 143 – grifos


do autor) defende que “os gêneros de textos são produtos de configu-

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rações de escolhas entre esses possíveis, que se encontram


momentaneamente “cristalizados” ou estabilizados pelo uso”
(BRONCKART, 2006, p. 143 – grifos do autor) através dos quais se
concretizam ações de linguagem. Uma ação de linguagem,
segundo Machado (2005, p. 252-253), comporta um conjunto de
operações de linguagem, entre elas a adoção de um gênero, e
juntas, “constituem uma unidade e cujo resultado final é o texto”.
Sob a ótica do ISD, os gêneros constituem-se como objetos
pré-construídos disponíveis socialmente que regulam e, ao mesmo
tempo, são produtos das atividades linguageiras, impulsionando
as ações de linguagem e o desenvolvimento cognitivo humano4
(SCHNEUWLY, 2004). Dessa forma, as capacidades de linguagem
tornam-se de grande relevância como perspectiva de análise e
discussão de questões referentes à produção textual oral ou escrita,
tal como enfatizada pelas autoras supracitadas e por outros que
compartilham a mesma base teórica (BRONCKART, 1999, 2006;
DOLZ E SCHNEUWLY, 2004).
Discutindo sobre as condições de produção de um texto,
Bronckart (1999, 2005, p. 64-65) defende que uma situação de agir
linguístico só se torna operante a partir da mobilização de capa-
cidades de linguagem que o agente construiu ao longo das suas
experiências.
O primeiro conjunto dessas capacidades diz respeito às
representações relativas ao quadro físico da ação (identificação do
emissor, de eventual co-emissor e do espaço-tempo da produção);
às representações relativas ao quadro sociosubjetivo da ação
(identificação do quadro de interação, dos papéis do enunciador e
do destinatário e das finalidades em jogo) e às representações
relativas a outros aspectos do quadro situacional e aos conhe-
cimentos referentes à adoção de um gênero e à temática em pauta.
O segundo conjunto está relacionado às capacidades dis-
cursivas, que envolvem conhecimentos relativos à infraestrutura
textual: a) escolha dos tipos discursivos; b) composição temática; c)
organização do plano global de apresentação do texto. Esses

4Sobre a relação gênero, ação de linguagem e desenvolvimento cognitivo


humano, cf. Schneuwly (2004, p. 21-39).

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elementos resumem os conhecimentos sobre a organização do


conteúdo em um texto e sua respectiva forma de apresentação.
E, por último, nos referimos ao conjunto das capacidades
linguístico-discursivas, que englobam os mecanismos de textuali-
zação (processos de conexão e coesão verbal e nominal) e os
mecanismos enunciativos (gerenciamento de vozes, modalizações,
escolhas lexicais).
Nessa perspectiva, o agir linguístico/discursivo é resultado
de operações estratégicas de comunicação socialmente comparti-
lhadas entre os actantes, cuja materialização envolve uma dimen-
são referencial, que diz respeito ao conteúdo; uma dimensão
situacional, relacionada ao contexto; e uma dimensão pragmática,
referente ao processo sociointerativo. Desse modo, este agir é
social, situado, portanto, capaz de constituir outras ações objetivas
e intersubjetivas, bem como estabelecer formas de relações e
entendimento.

2. Sobre diferentes modos de agir e capacidades de linguagem


envolvidas no gênero exposição oral

Embora não seja alvo de ações sistemáticas de ensino, a


exposição oral representa um dos gêneros orais de grande circu-
lação no contexto acadêmico, seja em situações de ensino ou em
atividades de divulgação científica, como congressos, simpósios
etc.. Desse modo, configura-se num instrumento de ensino/
aprendizagem e de práticas de linguagem pelas quais se imple-
menta ações de transmissão e construção de saberes/experiências
e, ao mesmo tempo, representa o exercício social da fala.
Organizado a partir de um discurso predominantemente
expositivo, este gênero carrega em si marcas de um modelo
construído sócio-historicamente na atividade escolar/acadêmica,
cumprindo o propósito comunicativo de expor conhecimen-
tos/informações, por isso classificado como gênero da ordem do
expor (DOLZ; SCHNEUWLY, 2004). Sob o parâmetro teórico de
Bronckart (1999, 2008), o mundo do expor se divide em dois eixos
discursivos: expor implicado e expor autônomo. O primeiro pode ser

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entendido numa relação interativa com os parâmetros da ação de


linguagem (agente-produtor, interlocutor, espaço-tempo da pro-
dução); e o segundo apresenta uma relação de autonomia em
relação aos parâmetros de ação5. E é no mundo discursivo do
expor implicado que inserimos o gênero exposição oral, uma vez
que a sua produção envolve relações de agentividade entre o
produtor e o contexto de produção/recepção do texto.
E, seguindo a orientação bronckartiana, várias sequências
de planificação se entrecruzam neste domínio discursivo, dessa
forma, a exposição oral pode constituir-se de sequências argumen-
tativas, explicativas e descritivas/informativas. Isso porque o
enunciador mobiliza vários recursos pragmáticos, linguísticos-
discursivos e semióticos na tentativa de planificar e gerenciar o seu
texto, com vistas ao seu propósito comunicativo e ao melhor
entendimento do interlocutor, os falantes se entrelaçam numa rede
de significados e entendimentos, constituída por crenças, conheci-
mentos, comportamentos, suposições entre outros elementos,
gerando uma ação compartilhada de linguagem.
O expositor, utilizando-se da linguagem verbal e dos meios
não-linguísticos da comunicação oral6, bem como dos suportes
informativos/explicativos de que dispõe no momento da comuni-
cação (slides, cartazes, gráficos etc): explica, descreve, argumenta,
relata, dialoga..., construindo, simultaneamente, várias ações que
emanam da atividade de linguagem referente. Isso está relacio-
nado à complexidade dos textos, marcada pela grande diversidade
de modalidades e mecanismos de estruturação (BRONCKART,
2006) e, necessariamente, indicam a relação texto/gênero, que tem
a ver com unidades comunicativas globais, ou seja, com um agir
linguístico.
Considerando a heterogeneidade composicional da expo-
sição oral, podemos dizer que a multimodalidade é um traço
constitutivo deste gênero (DIONÍSIO, 2011), uma vez que ele se

5 Outros dois mundos discursivos constituem este quadro teórico de


Bronckart (1999, 2008): narrar implicado e narrar autônomo, entretanto não é
nosso propósito abordá-los aqui.
6 Cf. Dolz e Schneuwly (2004, p. 160).

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organiza a partir da articulação de várias formas de representações


verbais e não verbais: fala, escrita, gestos, imagens, ou seja, se
realiza no entrecruzamento com outras modalidades da língua que
propiciam a sua realização comunicativa. Ao planejar uma expo-
sição, o aluno atua previamente em outras atividades de leitura,
interpretação, tomada de notas, construção de resumos/ slides/
esquemas; e, no momento de realizar a exposição, a fala por si só
não dá conta de atender ao propósito comunicativo deste gênero,
buscando articular-se a outras modalidades da língua e recursos
semióticos, como gestos, imagens, gráficos, vídeos etc.. Desse
modo, podemos dizer que estas várias semioses envolvidas na
produção deste gênero vão requerer do agente produtor multi-
letramentos, o que significa ler e saber fazer uso de outros textos
multissemióticos ou multimodais, ultrapassando os limites da
leitura, compreensão e produção de textos (ROJO, 2013).
Na academia, a exposição oral caracteriza-se fundamental-
mente pela exploração de um tema, através da qual os agentes/
produtores assumem o papel de especialistas. Geralmente organi-
zada em função de um tema previamente escolhido e estudado a
partir de um texto- base, a exposição oral destina-se a um público
restrito à sala de aula e a sua planificação se estrutura em torno
dos seguintes elementos: a) apresentação do tema; b) apresentação
do objetivo da exposição; c) descrição do plano textual; d)
esplanação do conteúdo; e) conclusão da exposição. Mas é preciso
destacar que, nas práticas escolares, esta planificação se resume em
três elementos – apresentação do tema, esplanação do conteúdo e
conclusão da exposição, evidenciando marcas de oralização da
escrita. Obviamente que nesta planificação resumida também
estão presentes nas exposições produzidas na universidade, mas
nesta esfera de circulação o gênero assume um maior nível de
cientificidade e discussão e, consequentemente, os falantes
ampliam as capacidades de análise e síntese do texto base.
Ao saírem da escola básica e entrarem no universo
acadêmico, os alunos vão, gradativamente, descartando o modelo
de exposição oral aprendido na escola e incorporando o modelo
predominante nesta esfera científico-social. Nesse processo, ora
reproduzem as marcas das práticas escolares arraigadas em sua

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formação, ora mobilizam os novos conhecimentos incorporados


nas práticas acadêmicas. É preciso dizer que quando falamos em
modelos de gêneros não estamos entendendo o gênero somente
como forma, este modelo implica modos de agir socialmente.
Considerados estes aspectos gerais acerca da exposição
oral, passaremos agora a discutir sobre os dados resultantes do
nosso trabalho de cunho investigativo. Após o processo de inter-
venção didática, composto por uma sequência didática de estudos
teóricos, escuta, análise e produção de exposições orais, focaliza-
mos nosso olhar sobre as formas de realização deste gênero,
tentando caraterizar e entender e suas relações com as práticas
escolares e acadêmicas as quais os agentes estavam vinculados.
Para implementarem a ação de realizar uma exposição oral, os
alunos movimentaram-se no sentido de escolherem uma temática
e adotarem um modelo de gênero, considerando os conhecimentos
pré-existentes e outros que adquiriram a partir da mediação
formativa desenvolvida em sala.
A partir dos dados observados e respaldados no arcabouço
teórico do ISD, identificamos a existência de três modelos de
exposições orais, que incorporam diferentes formas de agir. O
quadro 1, a seguir, é demonstrativo da nossa análise interpretativa.

Quadro 1 – Modelos de exposição oral

MODELOS DE PERCENTUAL DE CARACTERÍSTICAS DA


AGIR EM ALUNOS EXPOSIÇÃO ORAL
SITUAÇÃO DE
EXPOSIÇÃO
ORAL
Exposição oral Texto oral organizado a
transmissiva 17 % partir da leitura de um
texto previamente
organizado ou pela
transmissão memorizada
de informações, definições
teóricas...

discurso organizado a

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partir de sequência
expositiva informativa.

Exposição oral 33 % Percepção do contexto


interativa físico e social da ação;

inserção de alguns
elementos da planificação
global do texto;

organização do discurso
em sequências informati-
vas e descriti-
vas/explicativas;

realização do texto oral em


função de leituras
explicativas de resumos,
esquemas, slides.

Exposição oral Planificação global do


interativo- 50 % texto;
discursiva
organização do discurso
em seqências exxpositivas
informativas, descritivas,
explicativas e
argumentativas;

realização do texto oral a


partir dos seguintes
elementos estruturais: a)
apresentação do tema; b)
apresentação do objetivo
da exposição; c) descrição
do plano textual; d)
esplanação do conteúdo; e)
conclusão da exposição;

percepção e valorização do
contexto físico e

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sociosubjetivo da ação;

predomínio de ações
metadiscursivas: além de
expor, o aluno comenta,
analisa, explica, questiona,
compara, propõe...

O modelo de exposição transmissiva regula o aluno para


um agir meramente informativo. Esse modelo significa uma
reprodução canônica das práticas escolares, nas quais este gênero
se traduz numa composição textual resumida ou esquema de
informações que poderão ser lidos ou repassados para um público
ouvinte. Alguns alunos (17%), embora tenham passado pelo
mesmo processo de formação, demonstraram uma relação de
dependência em relação aos saberes de referência trazidos da
escola, reproduzindo o modelo de exposição que predomina nesta
esfera.
O modelo de exposição interativa, representado por 33%
dos alunos colaboradores, se realiza em função de um expor
informativo/descritivo/explicativo, através do qual se entrecru-
zam marcas do modelo de exposição oral escolar e do modelo que
circula na esfera acadêmica. Neste modelo, embora haja uma
estrutura interativa de comunicação, ainda se baseia muito no
modelo transmissivo e quase não apresentam ações metadiscur-
sivas.
E a exposição interativo-discursiva está baseada no saber
dizer, no saber fazer, num agir praxiológico (MATÊNCIO, 2008;
BRONCKART, 1999, 2005, 2006) e representa um maior grau de
implicação do discurso do que os outros modelos apresentados
anteriormente, uma vez que as exposições orais produzidas
explicitam relações de agentividade com os parâmetros físicos da
ação (relação falante/ouvinte; lugar físico da ação, momento da
produção), além disso desenvolvem muitas ações metadiscursivas.
No exemplo 1, a seguir, podemos verificar um segmento de
fala no qual a aluna age tomando como referência o modelo de
exposição oral transmissiva.
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Exemplo 1
A2: (...) Então... ahn Avran Noam Chomsky nasceu a sete de
dezembro de 1928... é um linguísta... filosófofo e um ativista
político [incompreensível]... seu nome está associado à
questão da gramática gerativa... recebeu vários prêmios
entre eles o mais recente foi o prêmio Sydney da Paz em
2011... É também autor de vários trabalhos sobre as
propriedades automáticas das linguagens formais... sendo o
seu nome associado ao... à hierarquia de Chomsky (...)
[leitura do texto pela aluna]

Nesse exemplo, é possível perceber um agir linguístico


meramente informativo, através do qual a aluna realiza a leitura
de um texto, provocando um efeito ilusório de texto oralmente
realizado, e a escrita assume totalmente o papel de protagonista
nesta exposição. O agir, neste caso, revela-se predominantemente
teórico, numa relação de autonomia (BRONCKART, 1999) com o
contexto de produção, ou seja, sem marcas de agentividade do
sujeito falante ou pessoa do discurso.
Esse exemplo é indicativo do “modelo” ou parâmetro de
exposição oral construído pela escola, demonstrando uma corre-
lação com a concepção de oralidade, sobretudo com a concepção
dicotômica fala/escrita e o grafocentrismo predominantes nas
práticas escolares, que trazem implicações ao modo de agir dos
alunos. Uma delas é a dificulade do aluno de perceber que fala e
escrita representam dois modos de funcionamento da língua com
características próprias, bem como modos diferentes de textualizar
e produzir discursos e, ao mesmo tempo, perceber que em
algumas práticas linguísticas orais estas modalidades podem se
relacionar no processo de produção de um gênero formal.
No nível da infraestrutura textual, é possível perceber que
no processo de planificação são negligenciadas, pela aluna, a
situação comunicativa e a estrutura composicional do gênero, re-
velando uma preocupação apenas com o conteúdo a ser informa-
do. Ainda neste nível, analisamos que as ações retóricas ou
metadiscursivas, bem características de gêneros textuais como
este, não são percebidas, a aluna não faz referências, posiciona-se

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ou reporta-se ao que está expondo, ou seja, não há comentários ou


tomadas de posição em relação ao conteúdo abordado, o que
observamos é a mobilização de um discurso teórico-científico
generalizado, assumindo do ponto de vista enunciativo uma voz
neutra, que toma forma numa sequência informativa. Isso é
representativo da ideia de exposição oral como artefato informa-
tivo, através do qual se repassa conhecimento ao outro, reproduz o
modelo de agir transmissivo ainda tão comum nos espaços
educacionais, que se baseia na tríade ensino/conteúdo/
aprendizagem.
Percebemos também que a aluna não se comporta como
agente envolvido na ação, ainda não percebe com clareza o seu
lugar no processo comunicativo (CARNEIRO; LEURQUIN, 2011).
O texto produzido por ela representa uma exposição de fragmen-
tos teóricos tomados como empréstimo de outros autores, que ecoa
como se fosse sua própria voz. Embora saibamos da existência de
outras vozes discursivas implícitas no enunciado produzido, há
um apagamento dessas vozes provocando um efeito de identidade
autoral, o que nos leva a concluir que esta aluna ainda não
reconhece a academia como locus de produção do conhecimento,
nem o seu papel de autoria na produção de um texto acadêmico-
científico.
Assim, parece-nos que este modelo de exposição oral
reproduz a concepção de texto como instrumento de comunicação,
limitando as potencialidades de desenvolvimento do letramento/
oralidade, considerando que ele não propicia espaços de produção
discursiva.
Discutiremos, agora, uma outra perspectiva de agir, o
exemplo 2, a seguir, é demonstrativo de um modelo de exposição
oral interativa.

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Exemplo 2
Antes de iniciar a sua exposição, a aluna mostra à professora
pesquisadora uma folha dobrada que ela traz na mão e,
gesticulando com as mãos de forma ansiosa, pergunta:
A1: Professora... algum problema... posso consultar?... se por
acaso esquecer alguma coisa
PP: Não/ não... de forma nenhuma... pode utilizar
A1: Posso começar? [a aluna se dirige a professora, consulta
o papel que traz e inicia a exposição] Então/boa tarde/
minha exposição oral é sobre a terapia da fala/ o que é/ HUMM
[ruído provocado na garganta] e pra quem é... a terapia da
fala é (... ) o desenvolvimento das atividades [incompre-
ensível] o:::: [consulta o papel] envolve todas as funções que
tem haver com a nossa compreensão, com a nossa expressão
da linguagem oral e escrita (...) O terapeuta, como podem ver,
tem a função de... de prevenir, tratar, eles tratam
especificamente da comunicação (...)

Nessa perspectiva de agir, o discurso se estrutura não mais


somente a partir de sequências informativas, a estas aliam-se
sequências descritivas e explicativas, demarcando um espaço
interativo de comunicação. Esse modelo aponta para um outro
tipo de relação entre sujeito/texto e o contexto de produção que
não mais se restringe ao exercício amorfo de transmissão de
informações. Com isso, estamos dizendo que a produção de uma
exposição oral transforma e reescreve o conhecimento já produ-
zido, fazendo dele surgir um “novo” conhecimento.
No exemplo supracitado, é possível perceber que o aluno,
diferentemente do exemplo anterior, considerou os parâmetros
contextuais físicos e sociais da produção, demonstando domínio
de regimes de interação e preocupação com os aspectos contex-
tuais da produção, isso pode ser confirmado logo no início da sua
exposição (turno 3), quando o aluno situa o tema do trabalho,
demonstrando preocupação com o seu interlocutor. O discurso é
estruturado basicamente em função de sequências informativas,
embora ainda apareça uma sequência explicativa, na tentativa de
explicitar a função do terapeuta de fala.

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Como último ponto de análise, focalizaremos no exemplo


seguinte o modelo de exposição oral interativo-discursiva, caracte-
rizado como um instrumento de ação que implica a instauração de
múltiplas semioses e relações interativo-discursivas.

Exemplo 3
A3: O tema do meu trabalho é [aponta para os slides]
Linguagem e suas manifestações e... ao longo do meu trabalho
irei mostrar para vocês, abordar sobre o que é linguagem e
como esta se manifesta... as perguntas que eu espero reso...
as dúvidas que eu espero retirar... ahn::: ao final do trabalho
é ... que vocês fiquem com respostas para as seguintes perguntas:
[faz gestos de enumeração com as mãos] O que é
linguagem? Ahn::: Quais as suas formas de manifestação?
Ahn::: Vou fazer também um contraponto entre a linguagem
gestual e a linguagem verbal e... acho que é só... Em
primeiro lugar... o que é linguagem (...)

Este exemplo sinaliza para as marcas interativo-discursivas


que aparecem tanto no plano verbal (ao longo do meu trabalho irei
mostrar para vocês / é que vocês fiquem com respostas) quanto no plano
gestual (olhares para o público ouvinte, gestos de confirmação,
indicação dos slides). Este aluno, de fato, ocupa o lugar de expo-
sitor no processo de interação, assumindo o papel de autoria e de
especialista em relação à temática que escolheu para abordar.
Além disso, demonstra reconhecer as finalidades em jogo na ação
comunicativa, situando as informações no espaço/tempo da pro-
dução, com vistas à compreensão dos alunos ouvintes, confir-
mando uma relação direta entre o agir e as condições de produção,
e configurando a mobilização de capacidades de ação.
A apresentação do plano global de apresentação do con-
teúdo é outro aspecto demonstrativo da mobilização da capaci-
dade discursiva, como podemos confirmar: ao longo do meu trabalho
irei abordar sobre o que é linguagem e como esta se manifesta... /as
perguntas que eu espero reso... as dúvidas que eu espero retirar... ahn:::
ao final do trabalho é/ vou fazer também um contraponto entre a
linguagem gestual e a linguagem verbal. Estas são marcas indicativas

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do gerenciamento da infraestrutura textual, da seleção e organi-


zação do conteúdo do texto em exposição.
Embora seja possível identificar neste modelo de exposição
oral sequências descritivas, argumentativas e explicativas, estas
sequências orientam o interlocutor para a organização linear e
hierárquica do conteúdo exposto, bem como contribuem no
sentido de explicitar aspectos do contéudo e intenções do falante.
Destacamos, em seguida, segmentos de fala que demonstram a
presença de sequências descritivas e explicativas.

Exemplo 4
A4: Boa tarde (...) O que vou trazer pra vocês hoje é um
pouco do do projeto que a gente desenvolveu no... [omissão
do nome do país para não identificar a aluna] que eu tenho
desenvolvido há dois anos e algumas questões que a gente
foi levantando e e queria dividir um com vocês um
pouquinho... o título do meu trabalho é [omissão do título do
trabalho para não identificar a aluna] eu vou esclarecer um
pouquinho esse título e... é isso daí... em primeiro lugar eu queria
apresentar pra vocês o projeto/ é um projeto em Letras e esse
projeto conta com 15 bolsistas estudantes de graduação... é
orientado por uma professora do departamento de Letras, tem
parceria com duas escolas públicas (...) e aí só pra situar um
pouquinho o que a gente tem chamado de gênero eu trouxe
pra vocês duas definições/ é trouxe duas/ definições só pra
esclarecer um pouquinho e a gente entrar no trabalho...é a
primeira definição é do professor Luiz Antonio Marcuschi e
ele diz que os gêneros textuais são [ler a definição nos slides]
e aí Bazerman que é outro teórico dos gêneros textuais traz
que os gêneros não são apenas formas e eu queria focar
nisso só por conta de uma questão que a gente vai apontar
posteriormente os gêneros são lugares onde o sentido é
construído... tá?/ e aí a propósito dos gêneros multisistêmicos
que é uma terminologia que a gente tem usado o que que a gente
trata como gêneros multisistêmicos são gêneros que trazem não
apenas o contéudo verbal mas também imagético então a gente
tem trabalhado com tabelas com mapas com gráficos (...) pra
começar o nosso projeto o que que nós fizemos [descreve a
metodologia do projeto]

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Temos, no exemplo 4, um caso em que aparecem conjun-


tamente sequências descritivas e explicativas. No primeiro mo-
mento da exposição, o aluno age enumerando diversas caracte-
rísticas do projeto que descreve e, no segundo momento, age
acrescentando explicações suplementares ao conceito de gênero
anteriormente enunciado. Estas ações são projeções cognitivas,
porque os alunos já reconhecem que o uso dessas sequências na
planificação textual podem favorecer a qualidade organizacional
do texto e o nível de compreensão dos interlocutores acerca do que
está sendo exposto.
No exemplo 5, a seguir, assim como em outros exemplos
desse modelo de exposição, é possível identificar uma relação
discursiva de implicação entre o conteúdo enunciado e a situação
de produção, dessa forma, podendo ser enquadrado no que
Bronckart (1999, 2005, 2006) qualifica de “discursivo interativo” na
ordem do “expor implicado”.

Exemplo 5
A5: A minha apresentação é sobre uma classe gramatical...
especialmente irei abordar as conjunções adjeticas relativas...
inicialmente na minha apresentação irei fazer uma breve discussão
sobre as conjunções em geral pra não começar logo nas rela-
tivas e ter um ponto... e em seguida eu seguirei para as frases
relativas... portanto como todos nós sabemos em português nós
temos dois tipos de frases temos a frase simples e a frase
complexa a frase simples é aquela que só tem uma oração ou
seja um sujeito e um predicado... no entanto... de acordo da
citação de Inês Duarte ah... publicado em 2000 no seu artigo
“Língua Portuguesa: instrumento de análise” ela cita o
seguinte [leitura da citação pela aluna]

As marcas enunciativas deste tipo de discurso podem ser


percebidas quando os alunos usam ações indicativas do tempo
presente, articuladas ao uso da primeira pessoa e de pronomes
possessivos, fazendo referência a si próprios como agentes discur-
sivos (a minha apresentação é sobre uma classe gramatical; na minha
apresentação).

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O uso dos ordenadores de informação (em primeiro lugar,


e em seguida), com a intensão de sequenciar e organizar o tópico
discursivo é outro aspecto observado na exposição desta aluna.
Identificamos também um dos mais recorrentes conectores de
explicitação: ou seja, cuja função é tornar mais explícito ou enfa-
tizar o que foi dito. No processo de textualização, estes ordena-
dores de informação e os conectores cumprem funções impor-
tantes na exposição, no sentido de estabelecer coesão sequencial,
formulação prospectiva e sentido esclarecedor ao que está sendo
dito pelo falante, realçando o caráter interativo e coerente da
comunicação.
Podemos dizer que estes recursos linguístico-discursivos
são comuns em todos os textos falados, incluindo a repetição, a
hesitação, o parafraseamento e outras que aqui não tratamos, mas
eles não surgem aleatoriamente, estão diretamente relacionados à
situação comunicativa, por isso a presença recorrente delas na
exposição oral tem a ver com o propósito informativo e interativo
deste gênero, cuja carga de informatividade requer um planeja-
mento local que promova um movimento explícito e articulado do
fluxo discursivo, isso explica a presença também marcante dos
marcadores sequenciadores e interacionais nas exposições analisa-
das: e é isso daí/ tá?/ então/ anh/ como podem ver/ agora etc..
Esses elementos de significação e estruturação da exposição
oral aliam-se às escolhas lexicais na busca de coerência temática e
pragmática do agir comunicativo. Percebemos que os alunos, em
geral, demonstram uma preocupação com o uso de itens lexicais
que representem o mundo acadêmico-científico e os seus valores
de cientificidade, ou seja, com a adequação do léxico ao contexto
de produção. Essa preocupação dos alunos com o léxico sinaliza
para a mobilização da capacidade de ação, uma vez que expressa
preocupação com as questões pragmáticas do gênero, com o
interlocutor e o contexto de produção comunicativa.
Percebemos nos modelos de exposição oral interativa e
interativo-discursiva como os alunos fazem uso da língua formal,
demonstrando bom nível de conhecimento lexical e projetando
uma fala que representa a lógica e a formalidade do discurso

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teórico-científico que circula na academia, embora ainda não haja


um completo domínio da estrutura composicional do gênero.

Considerações finais

Nossa compreensão é de que as práticas de oralidade assu-


mem um sentido bem mais amplo no enquadre político e socio-
cultural, consequência das determinações linguísticas, discursivas
e sociais sobre as quais os gêneros orais e os discursos são produ-
zidos, pois, se a sociedade letrada exige cidadãos que saibam fazer
uso da leitura e da escrita em suas mais diversas possibilidades, é
bem verdade que a fala também assume um papel privilegiado
nesta mesma sociedade, já que estamos o tempo todo interagindo
através de textos e discursos em situações comunicativas orais. O
trabalho com a oralidade, compreendido como espaço de interre-
lacão entre os processos e práticas de letramento e de escrita, pode
ser uma dessas posssibilidades.
Cabem, então, à academia e à escola o papel de promover e
ampliar o espaço de circulação dos textos orais, sobretudo da ex-
posição oral, que é um gênero formal público, cuja produção
implica a mobilização de capacidades de linguagem e de conheci-
mentos possíveis de tornar os falantes mais capazes para agir nas
mais diversas situações comunicativas, dentro ou fora da acade-
mia.
Dessa forma, considerando a importância da exposição oral
como instrumento de ação no processo de formação do aluno e no
seu agir profissional futuro, buscamos evidenciar neste artigo
elementos linguísticos-discursivos e pragmáticos mobilizados na
produção deste gênero. Dessa forma, enfatizamos a importância
de possibilitar aos alunos condições de reconhecerem este gênero
como instrumento de ação sobre o mundo, mobilizando capaci-
dades de linguagem que favoreçam esse agir discursivo.
A partir dos diferentes modelos de exposição oral identi-
ficados nos dados analisados, posicionamo-nos favoravelmente à
exposição interativo-discursiva, uma vez que através dessa forma
de ação comunicativa se estabelecem relações discursivas, relações
de negociações entre os saberes produzidos e os saberes comuni-

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cados, propiciando espaços de informação, mas também de discus-


são, de argumentação, de questionamentos, cujas marcas enuncia-
tivas transpareçam a voz do expositor, como sujeito reflexivo
capaz de ação sobre os textos que produz e o contexto de produ-
ção.

Referências

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chado. São Pauo: Educ, 1999.
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Tradução de Ana Rachel Machado e Maria de Lourdes M. Matencio.
Campinas-SP: Mercado de Letras, 2006.
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interacções de desenvolvimento. In: MENENDEZ, F. M. Análise do Dis-
curso. Lisboa: Hugin, 2005, p. 37-79.
______. O agir nos discursos: das concepções teóricas às concepções dos
trabalhadores. Tradução de Ana Rachel Machado e Maria de Lourdes M.
Matencio. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2008.
CARNEIRO, Fabio Delano Vidal; LEURQUIN, Eulália Vera Lucia Fraga.
As dimensões sociais do desenvolvimento humano e o agir pedagógico:
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Porto Alegre, ano 14, n. 17, p.115-136, 2011.
DIONÍSIO, Angela Paiva. Gêneros textuais e multimodalidade. In:
KARWOSKI, Acir Mário; GAYDECZKA, B.; BRITO, K. S. (Orgs.).
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FÁVERO, Leonor; ANDRADE, M.; AQUINO, Zilda. A correção do texto
falado: tipos, funções e marcas. In: NEVES, Maria Helena M. Gramática
do português falado. Campinas: Editora da Unicamp, 1999.
HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. vol. I. Madrid:
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______. Teoría de la acción comunicativa. vol. II. Madrid: Taurus, 1987b.
______. Agir comunicativo e razão descentralizada. Tradução de Lucia
Aragão. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 2002.
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de Almeida. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 2003.

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MACHADO, Ana Raquel. A perspectiva interacionista sociodiscursiva de


Bronckart. In: MEURER, J. L. Bonini, Adair; Motta-Roth, Désirée (Orgs.).
Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola, 2005.
______; CRISTOVÃO, Vera Lucia L. A construção de modelos didáticos
de gêneros: aportes e questionamentos para o ensino de gêneros. In: Re-
vista Linguagem em (Dis)curso. Tubarão, v.6, n.3, p. 547-573, 2006.
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acesso em março de 2013.
TFOUNI, L. V. A escrita no oral; oral na escrita: ler vozes e ouvir letras.
Disponível
em:http://www.uft.edu.br/pgletras/revista/capitulos/1.pdf, acesso em:
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CONTRIBUIÇÕES PARA UM
MODELO DIDÁTICO DO GÊNERO
‘RESUMO DE COMUNICAÇÃO’
Florencia Miranda

Introdução

O estudo dos gêneros acadêmicos constitui um eixo que


atravessa diversas correntes das ciências da linguagem. Cada
corrente (a Sociorretórica, a Análise do Discurso de linha francesa
ou a Linguística Sistêmico-Funcional, por exemplo) aborda esses
gêneros procurando compreender como eles funcionam social-
mente e como se organizam semioticamente. Cada uma delas
utiliza um aparelho nocional próprio e avança aprofundando os
estudos anteriores que compartilham o mesmo quadro teórico-
epistemológico.
O Interacionismo Sociodiscursivo (doravante, ISD), que é a
corrente em que me situo (BRONCKART, 1997, 2006, 2007 e 2008,
entre muitos outros), também tem esse mesmo interesse teórico-
analítico em relação ao estudo dos gêneros1. Mas, além disso, o
estudo dos gêneros (acadêmicos ou não) nesse quadro pode incluir
também uma dimensão ou uma preocupação didática. De fato, a
própria teoria do ISD nasceu na sequência de motivações vincu-
ladas com o ensino das línguas (cf. BRONCKART, 2006, p. 13) e a
noção de gênero tem um papel central no desenvolvimento da
vertente pedagógica do ISD e na concepção/elaboração de instru-
mentos didáticos (ver, por exemplo, BRONCKART, 2004;
SCHNEUWLY; DOLZ 2004; SCHNEUWLY, 1994). Um desses

1Sobre o estudo dos gêneros textuais no ISD, ver Miranda (2012a), Ma-
chado (2005), Coutinho (2008).

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instrumentos, e, a meu ver, uma das contribuições mais interes-


santes surgidas no ISD, são os chamados “modelos didáticos dos
gêneros” (DE PIETRO; SCHNEUWLY, 2003).
O “modelo didático” de um gênero é uma caracterização
ou descrição que serve como ferramenta para o ensino do gênero.
Ou seja, o “modelo didático” implica a enumeração de traços
próprios de um gênero que podem constituir aspectos relevantes
para ensinar a produzir (ou compreender2) textos desse gênero.
No presente trabalho proponho identificar alguns “ingre-
dientes” de interesse para a elaboração de um modelo didático do
gênero “resumo de comunicação”. Esse gênero – também cha-
mado de “resumo de trabalho para congresso” ou “resumos de
comunicações científicas”, por exemplo (ver MENDONÇA, 2013;
BEHLING, 2008) – se vincula plena e exclusivamente com a
atividade de linguagem acadêmica3. Isso implica que se trata de
um gênero que apenas é conhecido e experimentado por quem
tem alguma relação próxima com as práticas acadêmicas (como
membro ativo ou observador: estudante, professor, pesquisador,
cientista, etc.). Produzir essa espécie de resumos é uma prática de
linguagem que atravessa a vida de todos os “acadêmicos” –
inclusive, em certos casos, desde muito cedo na carreira (ainda
como estudantes da graduação). Todavia, o “resumo de comu-
nicação” é provavelmente o gênero acadêmico menos estudado e,
por isso, menos conhecido. Ao mesmo tempo, é um gênero que
raras vezes é escolhido como objeto de ensino nos cursos univer-
sitários – onde se preferem outros como a resenha ou o artigo
científico.
Neste trabalho, defendo a necessidade de tomar o resumo
de comunicação como um objeto de ensino dos cursos univer-

2 Acrescento esse parêntese porque os modelos didáticos nascem como


intrumentos para o ensino da produção de textos. Porém, considero que
esse mesmo instrumento é válido (ou mesmo necessário) para o trabalho
didático de compreensão de textos.
3 Vale a pena sublinhar que essa ligação de exclusividade ou esse vínculo

estável entre atividade e gênero não é uma característica de todos os


gêneros. Sobre a relação entre gêneros e atividades de linguagem, ver
Miranda (2012b).

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sitários, porque se trata de um gênero que aparenta simplicidade


(pela extensão, por exemplo), mas envolve procedimentos de
produção e mecanismos linguístico-discursivos complexos. Além
disso, proponho refletir sobre a importância de se elaborar um
“modelo didático” que sintetize as principais características do
gênero, sem pretender construir um modelo fechado e acabado,
mas sugerindo uma primeira aproximação a possíveis “dimensões
ensináveis”. Assim, apresentarei um modelo preliminar e rudi-
mentar, porque não se pretende aqui dar conta de todos os
aspectos envolvidos na elaboração de resumos desta espécie, mas
antes compreender a dinamicidade e a versatilidade do gênero,
evitando uma visão rígida ou estática dele.
A seguir, comentarei brevemente a teoria do modelo
didático. Depois, apresentarei alguns elementos para um modelo
didático do resumo de comunicação. E, finalmente, farei conside-
rações sobre a didatização do gênero e a exploração do modelo
didático. Esse trabalho espera constituir um ponto de partida para
mais e melhores contribuições sobre o assunto.

1. Modelo didático do gênero: elaboração e características gerais

Em um artigo de enorme clareza, De Pietro e Schneuwly


(2003) consolidaram e sistematizaram a noção de “modelo didá-
tico do gênero”, sobre a qual já vinham trabalhando. Desse
trabalho, retomo agora algumas das ideias centrais para explicitar
a concepção do “modelo do resumo de comunicação” que aqui
apresento. Não desconheço o aporte de outros autores – particu-
larmente, de autores brasileiros, como Machado e Cristóvão
(2006) – que, retomando a mesma noção, avançaram mais tarde
alargando suas potencialidades para outros campos (como a
leitura ou o ensino de língua estrangeira). Mas é importante voltar
às bases da teoria dos modelos didáticos para compreender
algumas de suas fortalezas e debilidades. Antes disso, convém
explicitar que essa “teoria” foi proposta como forma de orientar a
prática de elaboração de modelos didáticos (DE PIETRO;
SCHNEUWLY, 2003, p. 32).

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Para definir o “modelo didático do gênero” é preciso


considerar que, tal como os autores indicam (ibidem), ele é, de
certa maneira, um objeto triplo: 1) é um produto que tem uma
determinada estrutura; 2) é o resultado de uma construção e 3) é
uma ferramenta de orientação para criar sequências 4 para o
ensino do gênero.
Como produto, o “modelo” tem uma estrutura com cinco
componentes:

1. Definição geral do gênero


2. Parâmetros do contexto comunicativo
3. Conteúdos específicos
4. Estrutura textual global
5. Operações de linguagem e suas marcas linguís-
ticas

Essa estrutura retoma o modelo de produção de linguagem


desenvolvido no quadro do ISD (ver BRONCKART et al., 1985;
BRONCKART, 1997, 2008, entre outros) e considera as dimensões
básicas que permitem descrever diversos aspectos da organização
e do funcionamento dos gêneros. É com esta estrutura que apre-
sentarei o “modelo do resumo de comunicação” no próximo item.
Como é evidente, a descrição de cada “ingrediente” do
modelo nunca poderá ser exaustiva nem completa. Além disso, é
preciso levar em conta sempre o objetivo da contrução do modelo:
servir de base para ser utilizado no desenho de atividades de ensi-
no. Em tal sentido, vale lembrar as palavras de Machado e Cristó-
vão (2006, p. 57, n. 4), quando, a propósito do fato de os modelos
poderem ser ecléticos em termos das teorias linguísticas convoca-
das para sua elaboração, explicitam que:

4 Faço referência aqui à noção de “sequência didática”, tal como se conce-


be de forma singular no quadro do ISD. Ou seja, como um “conjunto de
atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero
textual oral ou escrito” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 97-
98).

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[…] os modelos didáticos podem apresentar falhas ou la-


cunas, quando vistos do ponto de vista de uma teoria de
texto ou discurso qualquer. Mas, na verdade, os pesqui-
sadores que se envolvem na sua construção não estão
preocupados em esperar a construção científica ideal,
pois têm uma preocupação social imediata, que é a de
trazer subsídios para o trabalho docente e para a apren-
dizagem.

Esse objetivo de intervenção e de resolução de um proble-


ma social concreto – o ensino-aprendizagem do gênero em questão
– é, sem dúvida, um traço cartacterístico e fundamental dos mode-
los. Não se trata de descrições de gêneros aprofundadas para co-
nhecer todos seus promenores de uso e organização semiótica. São
descrições que procuram dar conta de traços recorrentes e distinti-
vos nos textos do gênero modelizado – aquilo que, em trabalhos
anteriores (MIRANDA 2007, 2010, 2012c, por exemplo) denominei
“marcadores de gênero”. No entanto, e apesar do necessário cará-
ter normativo dos modelos, tais descrições não podem mostrar
uma versão rígida e reificada dos gêneros. Porque os gêneros são
“relativamente estáveis”, fluidos, heterogêneos e variáveis. A meu
ver, estas características determinantes dos gêneros não podem ser
esquecidas em situações de ensino.
Talvez neste ponto seja preciso reconhecer – aliás como os
próprios autores admitem (DE PIETRO; SCHNEUWLY, 2003, p.
28) – que uma das debilidades da proposta poderia estar no em-
prego da palavra “modelo”, que é altamente polissêmica e,
portanto, perigosa. Contudo, é verdade que quando se ensina a
produzir um texto de determinado gênero, sempre se tem em
mente algum “modelo” mais ou menos formalizado ou sistema-
tizado que serve como orientação. Neste sentido, o modelo
didático tem força normativa (DE PIETRO; SCHNEUWLY, 2003, p.
32), e reúne as normas próprias do gênero em causa, mas, ao
mesmo tempo, tem o risco de mostrar um grau de abstração e
normatização excessivo. É por esse motivo que De Pietro e
Schneuwly (2003, p. 42) recomendam incluir nos modelos não

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apenas os traços recorrentes e estereotípicos do gênero, mas tam-


bém as possíveis variações5.
Levando seriamente estas observações, o “modelo do resu-
mo de comunicação” que aqui apresento inclui apenas uma sele-
ção de mecanismos e operações, para poder explicitar ou exempli-
ficar também certos margens de variação.
Considerado como resultado de uma construção, e conti-
nuando com a teoria de base, o modelo didático é elaborado (em
princípio, pelos didatas6), a partir de quatro fontes: 1) as práticas
sociais de referência; 2) a literatura (estudos teóricos) existente
sobre o gênero; 3) as práticas de linguagem dos alunos e 4) as
práticas escolares. Como indicam De Pietro e Schneuwly (2003, p.
39), as duas primeiras fontes asseguram a legitimidade do modelo,
enquanto as duas últimas garantem sua pertinência.
No caso dos elementos do modelo que apresento mais
abaixo, utilizo sobretudo as duas primeiras fontes. Por um lado,
me baseio nos resultados obtidos em duas pesquisas realizadas:
um estudo de pós-doutorado desenvolvido na Universidade Nova
de Lisboa (Portugal), em que analisei diversos gêneros textuais em
perspectiva comparada (dentre eles, o resumo de comunicação)7 e
uma pesquisa grupal efetuada no período de 2009 a 2013 na
Universidad Nacional de Rosario (Argentina), que analisou resu-
mos de comunicação em perspectiva comparada interlinguística
(em que o português era uma das quatro línguas do estudo, com o
francês, o inglês e o espanhol). É importante salientar que os
resumos observados nessas pesquisas estão todos vinculados a
três áreas acadêmicas que foram, também, consideradas na sua

5 Nas palavras dos autores: “les modèles doivent en particulier conserver un


certain degré de généralisation et se présenter clairement comme des abstractions
; ils gagnent en outre à inclure des variantes, à montrer diverses réalisations
d’un principe, d’un mécanisme ou d’une opération” (DE PIETRO;
SCHNEUWLY, 2003, p. 42).
6 Sobre a elaboração dos modelos didáticos como problema, ver Miranda

(no prelo).
7 O estágio de pós-doutorado foi realizado de janeiro de 2008 a dezembro

de 2013, com bolsa da Fundação para a Ciência e a Tecnologia de Portugal.

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singularidade: linguística, literatura e ensino de línguas8. Desses


estudos, vou retirar os dados específicos do corpus em português
brasileiro (já que também se analisaram textos produzidos em
português europeu) e que se situam nas áreas da Linguística e do
Ensino de Línguas (portanto, não considerarei os dados parti-
culares dos textos da área da Literatura). Eventualmente, farei
algumas observações com um olhar comparatista, a fim de de-
monstrar melhor a singularidade da produção de resumos no
contexto brasileiro – mesmo quando se trata de um gênero (apa-
rentemente) globalizado, por estar associado a uma atividade
coletiva que transcende fronteiras geográficas, disciplinares e
idiomáticas.
Por outro lado, além desses dados, recorro para a constru-
ção do modelo, e como é lógico, aos resultados obtidos por outros
pesquisadores e às reflexões de diferentes autores, a partir da
consulta da bibliografia disponível sobre o assunto.
Secundariamente, para este modelo, levo em consideração
alguns dados assistemáticos relativos a produções de alunos da
graduação. Para isso, diferenciei no meu corpus os textos (resumos
publicados em livros ou cadernos de eventos científicos) que são
assinados por alunos da graduação, por um lado, e os que são
assinados por alunos da pós-graduação e por professores/
pesquisadores com maior trajetória na carreira acadêmica, por
outro. Também utilizo dados retirados da experiência em sala de
aula na universidade, mas em situação de ensino de português
para hispanofalantes na Argentina.
Finalmente, considerando o modelo como ferramenta, ele
tem o papel de fornecer os dados para os professores desenharem
sequências didáticas adequadas ao contexto particular de ensino-
aprendizagem. De acordo com a teoria dos modelos didáticos, se
trata de um instrumento que oferece os potenciais para o ensino
do gênero. Sendo assim, o modelo tem uma força geratriz em duas

8 Este esclarecimento é de grande relevância, já que há estudos que de-


monstram que as diversas áreas científicas ou acadêmicas vão estabili-
zando características diferenciadas para os textos do gênero em análise
(cf. BOLÍVAR, 1999)

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dimensões: a) horizontalmente, permite criar propostas diversas


para um mesmo público-alvo (ou seja, de um mesmo nível de en-
sino); b) verticalmente, permite criar sequências de complexidade
crescente, acompanhando o desenvolvimento dos mesmos alunos.
De maneira que um mesmo modelo pode estar na base de sequên-
cias muito diversas, seja para diferentes turmas de um mesmo ní-
vel de ensino, seja para um mesmo grupo em diferentes níveis de
ensino (retomando e complexificando o já aprendido).
No caso do “modelo de resumo de comunicação”, se prevê
que possa ser utilizado como ferramenta para construir sequências
de ensino no nível universitário da graduação, mas também seria
possível retomar esse gênero no nível da pós-graduação. A parti-
cularidade deste gênero – a diferença de outros não escolares – é
que não se justificaria seu ensino em níveis anteriores da educação
(ou seja, no ensino fundamental). Isto é assim porque se trata de
um gênero que tem um âmbito de circulação restrito – a academia
–, o que implica que para entrar em contato com ele é preciso tem
um conhecimento experiencial (mesmo que introdutório) com a
vida acadêmica.

2. Um modelo do resumo de comunicação

Como já mencionei, o resumo de comunicação é prova-


velmente o gênero acadêmico com menor trajetória de estudos e
com exígua trajetória de ensino. A primeira questão – a escassez de
estudos teóricos – está vinculada, pelo menos, a duas razões: por
um lado, o fato de o gênero ser muitas vezes confundido com um
outro gênero próximo (o chamado abstract) e, por outro lado, o
problema de os resumos – tal como eles funcionam atualmente –
terem uma história breve, mal conhecida e carregada de prejuízos.
A segunda questão – a ausência no ensino – parece estar ligada,
por um lado, ao mesmo fato anterior (não sendo considerado
objeto de estudo, acaba não sendo considerado objeto de ensino) e,
por outro lado, em situações de ensino, pode existir um certo
menosprezo por um gênero que, por causa da curta extensão e por

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ter um objetivo mais pragmático do que científico, aparenta uma


falsa simplicidade.
Apesar disso, é preciso reconhecer que existe um crescente
interesse pelo gênero, tanto nas ciências da linguagem como nos
cursos universitários. Um exemplo interessante é a presença de
um par de artigos sobre esse gênero na Revista Ao Pé da Letra, que
reúne trabalhos de alunos da graduação9. Penso que o interesse de
alunos de Letras sobre este gênero demonstra a necessidade de seu
estudo e a pertinência de seu ensino.
É para ensinar a produzir textos desse gênero que precisa-
mos do modelo didático. De acordo com a teoria (DE PIETRO;
SCHNEUWLY, 2003; MACHADO; CRISTÓVÃO, 2006; etc.), esse
modelo é sempre provisório e lacunar. Além disso, há modelos
mais ou menos implícitos e outros mais ou menos consolidados ou
sistematizados. No caso do “resumo de comunicação”, não encon-
tramos antecedentes de modelos didáticos apresentados como tais.
Um exemplo recente é a proposta de sequencia didática de Men-
donça (2013, p. 75), publicada na mencionada Revista Ao Pé da Le-
tra, que coloca um breve modelo contendo cinco “características
do gênero”. Outro exemplo poderia ser o livro com propostas di-
dáticas de Motta-Roth e Hendges (2010), que contém um capítulo
sobre o resumo acadêmico. Porém, esse trabalho confunde (ou
funde como se fosse a mesma coisa) o resumo de trabalho congres-
so e o abstract introdutório de artigos científicos.
Acontece que, sem dúvida, o termo “resumo” pode remeter
para diferentes gêneros10. Notemos, a título ilustrativo, que o Dici-
onário de Gêneros Textuais, de Costa (2009), não inclui a definição do

9 Trata-se de uma revista on line, da Universidade Federal de Pernambu-


co, que publica textos sob as seguintes condições: “Os textos submetidos
devem resultar de trabalhos realizados em disciplinas e em projetos e grupos de
pesquisa e iniciação à docência na área de Letras”
(http://www.revistaaopedaletra.net/normas.html).
10 Para uma proposta didática sobre a diversidade de resumos a nível

universitário, recomendo o trabalho de Machado; Lousada; Abreu (2004).


Contudo, esse meterial didático não aborda o caso do “resumo de comu-
nicação”.

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gênero que aqui nos ocupa nem na entrada “resumo”, nem na en-
trada “abstract”.
Ora bem, a maior singularidade do “resumo de comunica-
ção” é que não se trata de um “resumo” de um texto temporal-
mente anterior (isto é, com existência prévia)11. Aliás, é isto o que
garante, pelo menos em parte ou idealmente, a originalidade do
trabalho que se quer apresentar. Como veremos na caracterização
do processo de produção, o autor do resumo não tem uma comu-
nicação pronta para, quando receber a informação de um congres-
so, sintetizar em um “resumo” e enviar. O circuito é diferente: um
acadêmico (estudante, professor, pesquisador, etc.) recebe a infor-
mação da realização de um evento de seu interesse (congresso,
jornada, encontro, etc.) e decide participar apresentando um traba-
lho. O “resumo” que ele envia é uma “proposta” – poderíamos
dizer até um “mini-projeto” – em que se pode retomar algum texto
anterior (uma parte de uma tese, por exemplo), descrever ou rela-
tar uma pesquisa já realizada ou em andamento, propor uma re-
flexão sobre um determinado tópico, prever um relato de experi-
ência, etc. O conteúdo e a composição do resumo dependerá fun-
damentalmente da área de conhecimento a que se associa 12, mas
seu processo de produção não se compara com a produção de ou-
tros “resumos” (resumo escolar, resumo de telenovela em um jor-
nal ou abstract/resumo introdutório de artigo científico, por exem-
plo) em que há sempre um processo de sumarização do conteúdo
de um texto anterior.

11 É curioso que no trabalho de Mendonça isto seja mencionado em nota


de rodapé como se fosse um fato infrequente e, de alguma maneira, cen-
surado ou censurável. Em palavras da autora: “Embora seja uma prática
pouco admitida, é comum encontrar resumos produzidos sem que haja um artigo
ao qual o autor se reporte. Nesses casos, os artigos são escritos a posteriori,
dependendo do parecer da comissão avaliadora” (Mendonça, 2013, p. 75, n. 2).
12 Em pesquisa realizada, verifiquei que existem diferenças significativas

na composição dos textos e na utilização dos recursos da língua até em


áreas próximas – como a linguística e a literatura –, e também em subá-
reas ou orientações dentro de um mesmo campo, como no caso do com-
plexo campo da linguística. Isto cria o que poderíamos chamar de dife-
rentes “estilos displinares” na construção dos textos.

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Em teoria, e se forem aprovados (ver infra), os resumos de


comunicação serão posteriormente expandidos (retextualizados,
aproveitando o conceito de MARCUSCHI, 2003b) na elaboração
das comunicações apresentadas nos congressos. Isto poderá ser
feito como texto oral, como texto escrito ou de ambas as formas,
quando se trata de uma comunicação oral que mais tarde se publi-
ca como trabalho escrito. De modo que estes “resumos” não são
pontos de chegada em uma corrente de textos, mas, geralmente,
pontos de partida. Pois é a partir do resumo que se geram os textos
posteriores, que podem ser dos seguintes gêneros: comunicação
oral (falada na hora a partir de um guia, que pode estar escrito em
papel ou em um powerpoint, por exemplo), comunicação escrita
para ser lida, comunicação escrita depois de ser apresentada oral-
mente (para publicar em anais, em livros ou em revistas). Esse
papel iniciador de uma corrente intertextual justifica que o gênero
seja seriamente considerado, em particular, em situações de ensino
na educação superior.
Vamos, então, explorar mais de perto algumas das suas ca-
racterísticas principais. Para isso, retomo a estrutura de cinco
componentes do modelo didático.

a) Definição geral do gênero


O gênero “resumo de comunicação” está associado à ativi-
dade acadêmica e tem duas funções principais, temporalmente
sucessivas: primeiro, submeter uma proposta a avaliação de um
comité para participar em um evento científico e depois, se apro-
vado, informar os assistentes do evento sobre o conteúdo da co-
municação que será apresentada.
É importante sublinhar que também existem “resumos de
conjuntos de comunicações”. São os que chamaremos de “resumos
de simpósio”.

b) Parâmetros do contexto comunicativo


O processo de produção de resumos de comunicação é
uma prática própria da atividade acadêmica; especificamente, da
situação comunicativa de participação em eventos científicos (con-
gressos, jornadas, simpósios, etc.). A produção de textos desse gê-

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nero é, geralmente, um requisito para aceder à participação nos


eventos.
Os participantes podem ter algum dos seguintes estatutos:
convidado ou autoproposto. Em cada caso, a produção do resumo
pode assumir objetivos e características diferentes. Assim, os parti-
cipantes convidados, geralmente pessoas com trajetória reconhecida
na área ou no tema do evento, enviam resumos que não serão ava-
liados e têm a função de servir como apresentação para os assis-
tentes. Os convidados raramente apresentam “comunicações indi-
viduais”, mas conferências, palestras, intervenções em mesas re-
dondas, minicursos, etc. Já os participantes autopropostos são pes-
soas que querem participar no evento com um trabalho individual
ou em coautoria (comunicação, pôster, oficina, etc.) e para isso
enviam uma proposta (um “resumo”) que será objeto de avaliação.
Essa avaliação é realizada por uma comissão científica constituída
por acadêmicos da área convidados para essa tarefa 13.
Além dessas situações, alguns eventos – sobretudo os de
grande convocatória de participantes – propõem alguma espécie
de suborganização (simpósios, colóquios, etc.). Esta classe de sub-
reunião é organizada por uma pessoa (ou pequeno grupo de pes-
soas) e pode implicar a existência de dois momentos de elaboração
de resumos. No primeiro momento, o responsável (individual ou
coletivo) da organização da subreunião (um simpósio, por exem-
plo) elabora um resumo relativo a toda essa atividade que, inte-
grada no evento maior, incluirá vários participantes individuais14.
Esse resumo – que podemos denominar “resumo de simpósio” –
pode ser submetido a avaliação (pela comissão científica) ou pode
responder a um convite e, portanto, não será objeto de avaliação
(nesse caso, equivale ao resumo de qualquer convidado). Ora, o
“resumo de simpósio” pode ter alguma das seguintes funções:

13 Em eventos pequenos, é possível que a avaliação/seleção seja feita pela


própria comissão organizadora.
14 A participações aqui chamadas de “individuais” podem ser trabalhos

feitos em coautoria.

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I. Ser um texto de convocatória para a apresentação de tra-


balhos individuais. Nesse caso, o resumo é divulgado
na comunidade científica para os interessados em parti-
cipar enviarem suas propostas (“resumos de comunica-
ção”).
II. Ser um texto de apresentação/introdução dos trabalhos
individuais. Neste caso, os trabalhos podem ter sido se-
lecionados pelo responsável do simpósio ou podem ter
sido submetidos à avaliação da comissão científica do
evento geral (que contém o simpósio ou subreunião).

Esclarecidas as diferenças globais entre os “resumos de


comunicação” e os aqui chamados de “resumos de simpósio”, vol-
taremos agora às características próprias do primeiro.
Geralmente, os textos do gênero em estudo têm um vínculo
intertextual constitutivo15 com textos de um outro gênero do âmbi-
to acadêmico: a “circular” ou convocatória. Esse texto prévio (que
pode ter um funcionamento independente e autônomo ou pode
ser um texto dependente ou uma parte de um site, por exemplo) é
importante para a produção dos resumos porque explicita as nor-
mas estabelecidas pelos organizadores do evento. Vejamos os se-
guintes exemplos:

NORMAS PARA ELABORAÇÃO DE PROPOSTAS DOS SIMPÓ-


SIOS (SOMENTE PARA COORDENADORES)
O resumo de proposta de Simpósio deverá conter:
a) Título.
b) Nome dos coordenadores, titulação, instituição de origem, CPF.
c) Resumo com 3000 a 4000 caracteres (com espaços).
d) Palavras-chave: 3 (três).
NORMAS DE ELABORAÇÃO DE RESUMOS DAS COMUNICA-
ÇÕES PARA OS SIMPÓSIOS

15 Chamo de “intertextualidade constitutiva” a uma forma de relação


específica entre dois textos empíricos: “há intertextualidade constitutiva
quando um texto só pode existir a partir da existência de um determinado texto
anterior” (MIRANDA, 2010, p. 186-187).

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O resumo de proposta de comunicação para os Simpósios deverá


conter:
a) Título.
b) Nome do (s) autor(es), instituição de origem, CPF.
c) Resumo com 1000 a 1700 caracteres (com espaços).
d) Palavras-chave: 3 (três).
Observação: alunos de graduação não poderão inscrever comunicações
nos Simpósios.
NORMAS DE ELABORAÇÃO DE RESUMOS DAS COMUNICA-
ÇÕES PARA ALUNOS DE GRADUAÇÃO PARTICIPANTES DE
PROJETOS DE PESQUISA FINANCIADOS POR AGÊNCIAS DE
FOMENTO (SESSÕES DE COMUNICAÇÕES)
O resumo de proposta de comunicação para as Sessões de Comunica-
ções deverá conter:
a) Título.
b) Nome do (s) autor(es), instituição de origem, CPF.
c) Resumo com 1000 a 1700 caracteres (com espaços).
d) Palavras-chave: 3 (três).
Observação: alunos de graduação não poderão inscrever comunicações
nos Simpósios.
Exemplo (1) – Fonte:
http://www.cielli.com.br/conteudo/46/Normas

NORMAS PARA ENVIO DE RESUMOS:

Os resumos para os Simpósios Temáticos deverão ser enviados


pelo site do evento obedecendo às datas apresentadas na seção
anterior. Acesse o site no seguinte endereço eletrônico
www.7siget.com e entre no link Inscrições para submeter o re-
sumo. O participante só pode ser autor de um trabalho e co-
autor de mais dois trabalhos, para apreciação da comissão cientí-
fica. Antes de submeter uma proposta de comunicação, leia no
site o resumo de cada Simpósio Temático.

Cada resumo deverá conter:

- mínimo 200 palavras e máximo 300 palavras;


- 3 palavras-chave, separadas por vírgula;

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- indicar no texto: tema, objetivos, quadro teórico-metodológico,


resultados (parcial ou final) e conclusão (se necessário).

O resumo deverá ser postado na ficha de inscrição no site do


evento, observando que há espaços específicos para inserir a
linha temática do trabalho, o título, nome do(s) autor(es), resu-
mo e palavras-chaves.

O resumo, acompanhado do título, poderá ser submetido em


uma das quatro línguas oficiais do congresso: português, inglês,
francês e espanhol.
Um participante pode ser autor de um trabalho e co-autor em
mais dois, totalizando três participações. O participante co-autor
de um trabalho deverá se inscrever no evento e validar a inscri-
ção quando tiver efetuado o pagamento para ter direito a mate-
rial, ter o resumo publicado no Caderno de resumos e certifica-
do.
Exemplo (2) – Fonte:
http://www.7siget.com/br/circulares.php?op=1

FORMA DE APRESENTAÇÃO DOS RESUMOS:


Os resumos deverão ser escritos em Word for Windows (.doc),
fonte Times New Roman, corpo 12, com, no máximo, 250 pala-
vras, contendo: problema, objetivos, justificativa, metodologia,
esboço de fundamentação teórica e resultados obtidos.
Em negrito, devem constar: na 1ª linha, centralizado, o título do
trabalho com letras maiúsculas; na 2ª linha, à direita, o nome do
autor e instituição a que pertence. Abaixo do resumo, devem ser
apresentadas três palavras-chave.
Os resumos que estiverem dentro dessas normas serão avaliados
pelos responsáveis Grupos de Discussão e pela Comissão Cientí-
fica do Evento.
Exemplo (3) – Fonte:
http://www.ippucsp.org.br/congresso_dados.html

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Normas para Elaboração e Submissão de Resumos - IV CLAFPL:


1. Os resumos deverão conter no mínimo 200 palavras e, no má-
ximo, 300 palavras.
2. Os autores não deverão se identificar no corpo do texto para
que o processo de avaliação não seja comprometido. Incluir até
três palavras-chave.
3. Os resumos devem conter as seguintes partes:
- contextualização
- objetivos
- revisão da literatura
- metodologia
- resultados
- conclusão
Exemplo (4) – Fonte:
http://pgla.unb.br/ivclafpl/images/programacao/1a%20circular
clafpl2012janversaofinal.pdf

Como vemos, os exemplos – tomados aleatoriamente de


um corpus extenso – mostram que as normas propostas são muito
diversas, mas que geralmente dizem respeito à extensão do texto,
ao conteúdo e ao plano do texto (voltaremos sobre isso mais tar-
de). Eventualmente, também se mencionam elementos da formata-
ção do texto, em que língua pode ser redigido, até quantos autores
o trabalho pode ter e também que formação acadêmica ou grau
(mestre, doutor, etc.) o autor deve ter para poder enviar seu traba-
lho. Avancemos, agora, sobre as características do autor.
O agente produtor do resumo de comunicação pode ser
um único sujeito, sendo uma produçaõ individual, mas o texto
pode também ser elaborado em coautoria por duas ou mais pesso-
as16. Os resumos são sempre “assinados”; ou seja, todos os textos
contêm o nome próprio do autor ou dos autores.

16No Brasil, e para determinados campos científicos, é frequente incluir o


orientador (de dissertação ou tese) como autor do texto. Isto não constitui
uma prática transversal ao âmbito acadêmico, já que não se verifica em
alguns domínios nem em todos os países.

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Na maioria dos textos, o(s) autor(es) assume(m) um papel


social profissional como membro(s) de uma instituição acadêmica
(universidade, centro de pesquisa, instituto, etc.). Isto é explicitado
na indicação peritextual17 que funciona como assinatura, e cuja
forma típica é “nome próprio / instituição”. Eventualmente, nessa
mesma seção, pode ocorrer algum outro tipo de informação sum-
plementar, por exemplo o papel de “doutorando”.
Portanto, quem escreve um resumo de comunicação assu-
me o papel de um pesquisador, um professor, um especialista em
determinado assunto. A menção institucional inscreve o sujeito em
um nós, um coletivo com certa identidade local, por isso a presença
do nome da instituição permite explicitar e, ao mesmo tempo, va-
lidar um espaço identitário ou de pertença.18
No interior do corpo do texto, o autor-enunciador pode
aparecer de modos diversos (primeira pessoa do singular, primei-
ra pessoa do plural, expressões autorreferenciais na terceira pes-
soa…), mas seu papel social (por exemplo, pesquisador ou profes-
sor) geralmente não surge em termos explícitos. Então, esse papel
social é contruído textualmente de modo mais indireto, por exem-
plo, quando se mencionam trabalhos anteriores próprios ou quan-
do o autor situa o âmbito do trabalho que quer apresentar (uma
pesquisa, uma experiência de aula, etc.).
Independentemente de quem é o leitor físico ou receptor
dos textos, o destinatário para quem se escrevem os resumos – que
nunca se materializa em marcas de interlocução explícitas (como
vocativos, formas de tratamento ou marcadores conversacionais) –

17 Utilizo a noção de “peritexto” introduzida por Genette (1987),


retomando a proposta de Jean-Michel Adam (1999, 2008, entre outros), e
que remete para as seções do plano de texto que se localizam nas
“fronteiras do texto”, por oposição ao “corpo do texto” (os títulos, notas
de rodapé, assinaturas, etc.).
18 Vale observar que o nome da instituição – que também indica um local

físico de procedência (grande ou pequena cidade, nacional ou estrangei-


ra, etc.) – não é um dado menor, nem para quem produz o texto, nem
para quem lê o texto. De fato, no âmbito acadêmico existem – como em
muitos outros – representações e pressupostos positivos ou negativos
associados a essa classe de informação.

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costuma ser concebido como um colega, que compartilha alguns


conhecimentos e pressupostos, mas que pode desconhecer outros,
tais como questões específicas do quadro teórico ou da realidade
em que a pesquisa ou a experiência se realiza. Neste sentido, o
texto oscila entre os saberes considerados comuns e a possibilida-
de de o outro desconhecer determinados aspectos.
Em relação ao suporte19 de produção e de circulação, os
textos deste gênero apresentam algumas singularidades. Como é
evidente, o suporte de produção inicial pode ser tanto um compu-
tador como um papel. Esse primeiro suporte é irrelevante para o
funcionamento social dos textos. Porém, um traço característico
deste gênero na atualidade é o “suporte de envio”. De fato, atual-
mente, os resumos são enviados aos organizadores do evento
através do e-mail ou de um formulário on line, devendo respeitar
as indicações que constam na convocatória. Mais tarde, se o resu-
mo for aprovado, o texto poderá circular em um caderno ou livro
(em papel ou virtual). No caso do Brasil, onde existe uma grande
centralização dos curriculos vitae, por causa da existência do sis-
tema Lattes que, de alguma maneira, uniformiza o modo de elabo-
rar CVs acadêmicos, a publicação de resumos em cadernos ou li-
vros conta como antecedente de produção acadêmica. Isto não se
verifica em outros contextos, já que em outros países (por exem-
plo, Portugal ou Argentina) os resumos não são considerados
“publicações”.

c) Conteúdos específicos
O conteúdo temático dos resumos de comunicação apre-
senta duas características fundamentais: por um lado, depende do
evento e, por outro lado, deve ter algum grau de originalidade ou
singularidade. Em termos gerais, esses dois aspectos são importan-
tes para os avaliadores dos textos e contam para os trabalhos se-
rem (ou não) aceites para participar no evento.
A dependência temática do evento, que é a primeira carac-
terística mencionada – implica que o tema global do texto deve

19Para a noção de “suporte”, ver Marcuschi (2003a) e Miranda (2010, p.


54-56), entre outros.

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estar de alguma maneira subordinado ao tema – ou ao campo dis-


ciplinar, teórico, epistemológico, etc. – que funciona como espaço
de convocatória. Assim, quando vemos o nome de um congresso,
por exemplo, podemos prever alguns conteúdos possíveis e tam-
bém podemos pensar em alguns temas que necessariamente ficari-
am excluídos do evento. Por outro lado, muitos eventos prevêm
um tema global e/ou eixos temáticos diversos. Isso pode estar ex-
plicitado nas circulares ou nos sites dos eventos (geralmente, ocor-
re como “eixos temáticos”) e é apresentado como uma enumeração
na forma de lista.
Ora bem, os textos, para serem aceites como trabalhos a
apresentar nos eventos, devem ter alguma singularidade temática.
Ou seja, os textos devem tratar sobre algum assunto que, pressu-
mivelmente, não será abordado por outros textos do mesmo even-
to. Essa singularidade vem dada pela “originalidade” da pesquisa
ou reflexão que está (ou estará) na base do trabalho. Assim, quem
apresenta um resumo está colocando um assunto que por alguma
razão (teórica ou metodológica) considera inovador.
Por outro lado, um aspecto que constitui uma característica
comum a todos e quaisquer resumos de comunicação é que os con-
teúdos devem estar ligados a áreas de conhecimento científico
(uma ou mais) e são previsivelmente conteúdos não ficcionais. Ou
seja, não se espera em um resumo que alguém fale, por exemplo,
sobre assuntos da esfera familiar, nem sería esperável (nem admis-
sível!) encontrar dados inventados. De maneira que todas as in-
formações apresentadas nos textos são percebidas como reais (rea-
lizadas ou realizáveis), localizadas no mundo ordinário. Assim,
todos os nomes (próprios ou comuns) mencionados nos textos
remetem para “objetos da realidade”.
Vinculada à organização temática dos textos, cabe mencio-
nar que o léxico utilizado nos resumos faz parte sempre de uma
área terminológica circunscrita. Isso está delimitado pelo campo
do saber com o qual o resumo se relaciona. Por exemplo, a própria
palavra “campo”, que acabei de utilizar, assume valores (signifi-
cados ou sentidos) diversos de acordo com a área científica. Pen-
semos na sociologia, na física, no esporte ou na geografia, entre
outras. É por este motivo que os teóricos dos gêneros acadêmicos

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 286

constumam dizer que observam o emprego de uma “linguagem


especializada”.
Outros aspectos lexicais que podem caracterizar os resu-
mos são a criação de neologismos, o emprego frequente de “colo-
cações” ou expressões ritualizadas, o emprego abundante de no-
minalizações, entre outros.
Finalmente, uma questão de particular interesse na organi-
zação do conteúdo temático dos resumos é que com muita fre-
quência os textos “tematizam” (ou falam sobre) ações. Podem ser
ações passadas (tarefas de uma pesquisa ou uma experiência já
realizada, por exemplo), ações futuras (a realizar na apresentação
da comunicação no evento) ou mesmo ações presentes (contempo-
râneas ao tempo da enunciação). Voltaremos a referir esta questão
no item e).

d) Estrutura textual global


Para descrever a estrutura global do texto é preciso consi-
derar o vínculo intertextual que este mantém com a circular do
evento, tal como mencionei na caracterização do processo de pro-
dução dos textos. Assim, o primeiro elemento a considerar é que
os organizadores dos eventos podem prever normas específicas de
estruturação dos textos.
Nos exemplos (1), (2), (3) e (4), reproduzidos acima, vimos
que as normas variam de evento para evento. O traço composicio-
nal que verifica maior grau de recorrência nos instrutivos é a ex-
tensão do texto (indicada em quantidade de caracteres ou pala-
vras). Essa extensão pode ser limitada com parâmetros de “míni-
mo” e “máximo”.
Em termos de composição dos textos, os únicos elementos
obrigatórios são os três seguintes: título, dados do autor (nome e
instituição)20 e corpo do texto. Esse seria, então, o plano do texto21
convencional dos resumos.

20 Como já referi, é possível que nos dados do autor (ou dos autores)
ocorram outras informações, tais como o estatuto (doutorando,
orientador, etc.). Além disso, há eventos em que se solicita explicitamente
o envio dos resumos sem nome do autor, para não afetar o processo de

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O título do resumo tem um papel de grande relevância, so-


bretudo durante o evento, já que terá a função de “convocar” os
possíveis assistentes. O título pode ser construído de formas vari-
áveis, com frases nominais ou verbais, com uma estruturação sim-
ples ou composta (contendo um subtítulo), utilizando frases asser-
tivas ou interrogativas, recorrendo a citações ou alusões, etc.
Dentro do corpo do texto – considerado como resumo pro-
priamente dito – podem ocorrer seções mais ou menos delimitá-
veis. Tais seções são elaboradas em função das instruções do even-
to. Comparemos o que se prevê nos quatro instrutivos antes ob-
servados:

Exemplo (1) Exemplo (2) Exemplo (3) Exemplo (4)


tema, objetivos, problema, objeti- - contextualiza-
quadro teórico- vos, justificativa, ção
metodológico, metodologia, - objetivos
(Sem in- resultados esboço de fun- - revisão da lite-
dicações) (parcial ou damentação ratura
final) e conclu- teórica e resulta- - metodologia
são (se necessá- dos obtidos. - resultados
rio) - conclusão

Tabela 1. Componentes do corpo do texto indicados nas circulares

Como vemos, em cada convocatória se propõem ou solici-


tam componentes diferentes para os corpos dos resumos. No
exemplo (1) a estruturação interna do corpo dos textos é livre, en-
quanto nos três exemplos restantes há uma enumeração precisa
dos elementos que devem estruturar os resumos.

avaliação que deve ser sempre anônimo. De qualquer maneira, o nome


do autor é um componente obrigatório dos resumos já aceites e
publicados nos cadernos para informação dos participantes do evento.
21 Sobre a noção de “plano do texto”, ver Adam 2004.

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Nos textos empíricos22, incluso nos que se enviam para um


mesmo evento, a organização desses elementos também varia:
podem estar em diferente ordem, podem ser introduzidos por ex-
pressões diversas e, até, podem ser complementados com outros
elementos que não foram solicitados na convocatória.
Vejamos alguns exemplos23:

Título LETRAMENTO VISUAL E FORMAÇÃO DE PRO-


FESSORES DE LÍNGUA PORTUGUESA: CON-
TRIBUIÇÕES E DESAFIOS POSSÍVEIS
Dados do au-
tor Adriana Rodrigues de Abreu (PUC - Rio)

Corpo do tex- A sociedade moderna, caracterizada pelo efeito da


to: globalização e das novas tecnologias digitais, tem
experimentado uma nova forma de conceber a leitura
Contextualização de textos. Viver em sociedade equivale a dar conta das
diferentes formas de linguagem que perpassam o
meio social. Sendo assim, é necessário que o aluno
desenvolva uma aprendizagem multimodal, isto é,
que ele seja capaz de aprender a ler palavras e ima-
gens ao mesmo tempo.
Objetivos
Portanto, o presente estudo surge com os seguintes
objetivos: 1- analisar como as imagens, mais especifi-
camente as histórias em quadrinhos, estão sendo tra-
balhadas por dois livros didáticos de língua portu-
Metodologia guesa; 2- investigar como se dá o processo de constru-
ção do letramento visual nos livros analisados; 3- dis-

22 A noção de texto empírico ou singular remete, na linha do ISD, a cada


texto efetivamente produzido (cf. BRONCKART, 1997, p. 79).
23 É importante fazer dois esclarecimentos: 1) os textos que aqui têm valor

ilustrativo foram selecionados aleatoriamente de um corpus extenso; 2)


os textos são apresentados com segmentações que não correspondem à
estrutura original (que era, em todos os casos, em um único parágrafo) e
servem apenas para identificar melhor os diferentes componentes do
corpo do texto que estamos observando.

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cutir a relevância da formação docente para o trata-


mento das imagens em sala de aula e, consequente-
mente, para a construção do letramento visual; 4-
Revisão da lite- trazer contribuições para a formação continuada do
ratura professor.

Serão examinados os enunciados dos exercícios pro-


postos com o intuito de observar quais elementos dos
quadrinhos estão relacionados com a atividade e
quais aspectos visuais precisam ser compreendidos
Resultados pelos alunos para poderem realizar o exercício.

Para tal, este trabalho contará com estudos sobre mul-


timodalidade desenvolvidos por Kress e van Leuween
Conclusão
(1996/2006), que entendem os textos multimodais
como sendo aqueles cujos significados são realizados
através de mais de um código semiótico. Além de
pesquisas acerca do letramento visual (Dionísio, 2005
e Braga, 2004), que abordam a importância do visual
em sala de aula.

Os resultados mostram que o espaço dedicado a lin-


guagem não verbal reduz-se a apresentação e explora-
ção de aspectos gramaticais, não havendo um trabalho
crítico de leitura e compreensão das imagens.

Desse modo, o visual ainda precisa ser encarado de


forma mais consciente e o professor, principalmente o
de língua portuguesa, pode contribuir desenvolvendo
estratégias diferenciadas para o tratamento das ima-
gens, apesar dos desafios.

Palavras-chave: letramento visual, multimodalidade e


formação docente.

Exemplo (5) Fonte:


http://pgla.unb.br/ivclafpl/images/programacao/1a%20circular
clafpl2012janversaofinal.pdf

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Este exemplo (5) é um resumo enviado (avaliado positiva-


mente e publicado) no quadro do evento cuja convocatória repro-
duzimos no exemplo (4). Vemos claramente que o texto respeita a
composição proposta na convocatória, modificando apenas a or-
dem de apresentação dos itens “metodologia” e “revisão da litera-
tura”.

Título AUTOBIOGRAFIAS NA FORMAÇÃO DE PRO-


FESSORES DE LÍNGUA ESTRANGEIRA: UMA
ANÁLISE DE TRANSITIVIDADE
Dados do
autor Cristiane Rosa Lopes (Universidade Estadual de Goi-
ás)
Corpo do
texto: Como orientadora de estágio supervisionado de lín-
gua inglesa numa universidade pública no estado de
Contextualiza- Goiás, tenho constatado que muitos/as alunos/as-
ção professores/as têm dificuldade no desenvolvimento
de reflexões críticas durante atividades propostas por
esse componente curricular. Falta-lhes uma compre-
ensão mais ampla de conceitos teóricos que funda-
mentam o processo de ensino-aprendizagem de uma
Revisão da LE.
literatura (1)
(problema)
Segundo Vieira Abrahão (2004), muitos/as alunos/as
interpretam esses conceitos à luz de crenças sobre o
ensino-aprendizagem de LE, algumas vezes equivo-
cadas, que trouxeram para a licenciatura em Letras.
Objetivos
Essas crenças operam como filtros de insumo, que
influenciam a construção da prática docente.

Neste contexto, este trabalho teve por objetivo anali-


Revisão da sar o uso da transitividade de narrativas autobiográfi-
literatura (2) cas como uma estratégia para ajudar os/as alunos/as-
professores/as na identificação de suas próprias cren-
ças.

Para o embasamento, são utilizados os seguintes su-


portes teóricos: pesquisa narrativa no ensino-

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Metodologia aprendizagem e na formação do/a professor/a de LE


(PAIVA, 2007; BARCELOS e PAIVA, 2008; ROMERO,
2010; SILVA, 2010 etc); crenças sobre aprendizagem
de línguas de alunos/as e professores/as de LE
(BARCELOS, 2004; 2006; VIEIRA ABRAHÃO, 2006
etc); o sistema de transitividade da Linguística Sistê-
mico-Funcional (HALLIDAY, 1994; EGGINS, 2004;
Resultados / HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004 etc).
Conclusão
É um relato de uma experiência, que foi realizada
com 17 alunos/as-professores/as, que consistiu na
análise linguística de suas próprias autobiografias, e
também de atividades e discussões realizadas nas
aulas de orientação para o estágio de língua inglesa.
A análise da transitividade possibilitou o mapeamen-
to do modo como os/as alunos/as-professores/as
representaram discursivamente suas experiências de
aprendizagem de LE. Ou seja, quais foram os/as par-
ticipantes e os papéis atribuídos a eles/elas, quais
processos foram escolhidos para representar os acon-
tecimentos da sala de aula de LE e quais circunstân-
cias foram vinculadas a esses processos.

Os resultados indicam que a análise da transitividade


de autobiografias pode ajudar alunos/as-
professores/as na identificação de suas próprias cren-
ças, o que favorece o desenvolvimento de reflexões
críticas.

Palavras-chave: transitividade; autobiografias; cren-


ças
Exemplo (6). Fonte:
http://pgla.unb.br/ivclafpl/images/programacao/1a%20circular
clafpl2012janversaofinal.pdf

O exemplo (6) também responde à convocatória reprodu-


zida em (4) e, como no caso anterior, realiza todos os componentes
indicados, com algumas fusões (como os “resultados” e a “conclu-
são”) ou cisões (como no caso da “revisão da literatura”).

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 292

É interessante comparar os dois últimos exemplos e obser-


var como em cada texto empírico se constrói uma mesma seção.
Tomemos, primeiramente, o caso da “contextualização”. Em cada
resumo, esse componente é realizado de uma forma singular: ora
remetendo a uma situação global (a vida na sociedade atual), ora
colocando uma situação local (as observações da autora acerca da
sua realidade imediata). Por outro lado, há seções em que se recor-
re a expressões mais ritualizadas. Por exemplo, o componente “re-
sultados” é introduzido em ambos os textos mediante expressões
próximas: “os resultados mostram que…” e “os resultados indicam
que…”. Estas expressões coincidem no fato de serem frases defini-
das introdutórias de período composto24. Voltaremos a essa ques-
tão mais à frente (no item “e” do modelo).
É previsível que os componentes mencionados nas convo-
catórias apareçam nos resumos. De alguma maneira, eles são ele-
mentos orientativos para a elaboração dos textos. Mas se trata de
elementos “mínimos” do plano do texto, já que, eventualmente, é
possível acrescentar outros dados que nos casos concretos podem
ser muito relevantes. Por exemplo, é importante mencionar se o
trabalho se inscreve em um projeto de pesquisa ou se surge de
uma tese, mesmo que essa informação não seja explicitamente so-
licitada na convocatória. Vejam-se os dois exemplos seguintes, que
são resumos enviados na sequência da convocatória reproduzida
em (3):

24Convém notar que, nesse contexto, o sintagma “os resultados” é inter-


pretado claramente como “os resultados do trabalho ou estudo”.

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Título LEHRBUCH DES BRASILIANISCHEN PORTU-


GIESISCH: UM OLHAR ESTRANGEIRO SOBRE
Dados do autor A LÍNGUA E A CULTURA DO BRASIL
Norimar Judice – (UFF)
O estudo dos materiais didáticos para o ensino de
línguas estrangeiras permite depreender represen-
Corpo do texto: tações de línguas e culturas, em diferentes tempos e
espaços, configuradas por autores nativos e não
Justificativa nativos e oferecidas aos aprendizes como amostras
da realidade.
Este trabalho faz parte do projeto de pesquisa Mate-
riais didáticos de Português do Brasil para Estran-
(contextualização) geiros editados no exterior: representações da iden-
tidade brasileira (em andamento) e
tem por objetivo analisar, recorrendo a pressupostos
da Análise Crítica do Discurso (Van Dijk,) e da Teo-
ria das Representações Sociais (Moscovici), em tex-
Objetivo + esboço
tos de material didático publicado em 1986, na
de fundamentação
Alemanha, intitulado Lehrbuch des brasilianischen
teórica + Proble-
Portugiesisch, de autoria de Erhard Engler, as amos-
ma + Metodologia
tras da língua e as representações da cultura do
Brasil oferecidas aos aprendizes, confrontando o
material linguístico e cultural apresentado pelo
autor em 37 textos (dialogados, narrativos, expositi-
vos e descritivos) com os usos efetivos do português
(Ação a realizar brasileiro e com o panorama sociocultural do país
na exposição do no período da publicação da obra.
trabalho) + Exemplificaremos com segmentos dos textos anali-
Resultados sados, que se revelaram como amostras não repre-
sentativas dos usos do Português do Brasil e como
veiculadores de imagens estereotipadas da identi-
dade brasileira.
Palavras-chave: Português para estrangeiros. Mate-
riais didáticos de Português do Brasil para estran-
geiros. Representações da identidade brasileira.
Exemplo (7) Fonte:
http://www.ippucsp.org.br/resumo_comunicacao.html

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Título AS COTAS SOB O OLHAR DE UMA REVISTA


DE CULTURA
Dados do autor Irene de Lima Freitas –
UNIUBE
Corpo do texto: Esta comunicação apresenta algumas reflexões e
alguns resultados obtidos em nossa pesquisa de
(contextualização) doutorado
que teve por objetivo discutir como se dá na mídia
impressa a construção do discurso sobre o sistema
Objetivo + Pro- de cotas no Brasil e como ele se insere no debate
blema sobre a exclusão/inclusão dos negros na sociedade
brasileira.
A partir da Lei nº 3.708, de 09 de novembro de 2001,
em que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro instituiu cotas de até 40% para as popula-
Justificativa ções negras e pardas no acesso à Universidade, a
questão das chamadas políticas afirmativas ganhou
destaque nos órgãos de imprensa e assumiu impor-
tância na sociedade brasileira.
Nesse sentido, analisamos textos da revista de cul-
Metodologia tura Caros Amigos, que sistematicamente se ocupou
do assunto, no ano de 2002 – período de efervescên-
cia do embate discursivo da exclusão, tendo como
pano de fundo o tema das cotas.
A perspectiva teórica e metodológica de base é a
Esboço de funda- teoria/análise dialógica do discurso, conforme de-
mentação teórica preendida dos trabalhos de M. Bakhtin e do Círculo,
especialmente no que se refere às noções de intera-
ção verbal, enunciado e formas de presença do dis-
curso de outrem.
Resultados Os resultados evidenciam mecanismos discursivos e
modos de apreensão e citação da palavra de outrem
reveladores de que a revista constrói seu posicio-
namento editorial diante do objeto do discurso, a
partir do valor que os interlocutores atribuem à sua
construção; os embates entre os interlocutores de-
terminam a construção dos enunciados; a polêmica
é constitutiva da linha editorial da revista.
Palavras-chave: cotas; enunciado; discurso de ou-
trem

Exemplo (8). Fonte:


http://www.ippucsp.org.br/resumo_comunicacao.html
Em ambos os casos, a “contextualização” não fazia parte
das dicas da convocatória. Porém, a inscrição do trabalho em um

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projeto de pesquisa (exemplo 7) ou em uma tese de doutorado


(exemplo 8) é um dado academicamente fundamental e, por isso,
tem um papel de relevância em termos argumentativos. Assim,
para os avaliadores dos resumos esse dado será importante, mes-
mo que não tenha sido solicitado pelos organizadores do evento.
Como vimos, a estutura composicional do corpo dos resu-
mos é variável e depende em grande medida do conteúdo solicita-
do na convocatória. Contudo, há seções que têm um alto grau de
recorrência: o tema/problema do trabalho, os objetivos, o enqua-
dramento teórico, aspectos metodológicos, resultados, etc., sendo o
item “objetivos” o componente com maior frequência de menção.
Também é possível que se incluam seções onde se prevê alguma
ação que se realizará durante a apresentação do trabalho. Isso é o
que se observa, por exemplo, no texto reproduzido em (7), onde
diz “Exemplificaremos com segmentos dos textos analizados…”.
Além das partes características dos resumos, um aspecto
interessante da composição é que, vistos globalmente, os textos
podem ter a forma de um “relato”, de uma “exposição” breve ou
de um “micro-projeto”. Cada caso se caracteriza pela ocorrência de
formas verbais próprias: relato com verbos no pretérito, exposição
com verbos no presente e micro-projeto com verbos no futuro 25.
Essas construções frequentemente se combinam dentro de um
mesmo texto. Veremos isso um pouco mais em detalhe no próximo
item.

e) Operações de linguagem e suas marcas linguísticas


Dentre as muitas características linguístico-discursivas que
poderíamos observar nesse gênero, seleciono, por razões de espa-
ço, apenas duas. Em primeiro lugar, e retomando o último comen-
tário do item anterior, veremos um aspecto da construção discur-
siva: o emprego dos verbos, a organização temporal e o valor dis-

25 Esta classe de construções pode ser analisada recorrendo à categoria


“tipo de discurso” tal como é entendida no quadro do ISD. Para uma
introdução a essa categoria, consultar Bronckart (1997) e Miranda (2008),
entre outros.

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cursivo. Em segundo lugar, observaremos uma dimensão da orga-


nização enunciativa dos textos: a responsabilização das ações.
Em relação ao emprego dos verbos e à construção discursi-
va, nos resumos é frequente que dominem as formas verbais no
presente. Nesses casos, se constrói uma “exposição” (um discurso
da ordem do expor, nos termos do ISD). Esta dominância do pre-
sente pode ser observada de maneira muito manifesta nos exem-
plos (5) a (8) antes apresentados. Todavia, nesses mesmos exem-
plos, é possível identificar segmentos dos textos em que se utili-
zam formas verbais no pretérito – exemplos (6) e (8) – e formas
verbais no futuro – exemplos (5) e (7). Como vemos, os textos re-
produzidos em (6) e em (8) combinam segmentos de exposição e
segmentos de relato (ou narração26). Já no caso dos textos (5) e (7),
vemos a articulação de segmentos de exposição e de micro-pojeto.
Na combinação exposição/relato, os resumos retoman aspectos de
algum trabalho já realizado, enquanto na combinação exposi-
ção/projeto, os resumos propõem alguns elementos da composi-
ção da futura comunicação. Ambos os tipos de construção discur-
siva são característicos do gênero “resumo de comunicação”.
Vejamos o caso do exemplo (5), que articula exposição e
projeto:

Exposição A sociedade moderna, caracterizada pelo efeito da globa-


lização e das novas tecnologias digitais, tem experimen-
Verbos no tado uma nova forma de conceber a leitura de textos.
presente Viver em sociedade equivale a dar conta das diferentes
(indicativo formas de linguagem que perpassam o meio social. Sen-
ou subjunti- do assim, é necessário que o aluno desenvolva uma
vo) + pretéri- aprendizagem multimodal, isto é, que ele seja capaz de
to perfeito aprender a ler palavras e imagens ao mesmo tempo.
composto
Portanto, o presente estudo surge com os seguintes obje-

26No âmbito do ISD, a diferença entre o relato e a narração diz respeito ao


funcionamento autônomo (na narração) ou não autônomo (no relato) do
discurso em relação aos parâmetros situacionais (tempo, espaço e sujeitos
da enunciação).

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tivos: 1- analisar como as imagens, mais especificamente


as histórias em quadrinhos, estão sendo trabalhadas por
dois livros didáticos de língua portuguesa; 2- investigar
como se dá o processo de construção do letramento vi-
Projeto sual nos livros analisados; 3- discutir a relevância da
formação docente para o tratamento das imagens em
Verbos no sala de aula e, consequentemente, para a construção do
futuro letramento visual; 4- trazer contribuições para a forma-
ção continuada do professor.

Serão examinados os enunciados dos exercícios propos-


tos com o intuito de observar quais elementos dos qua-
drinhos estão relacionados com a atividade e quais as-
pectos visuais precisam ser compreendidos pelos alunos
para poderem realizar o exercício.
Exposição
Para tal, este trabalho contará com estudos sobre multi-
Verbos no
modalidade desenvolvidos por Kress e van Leuween
presente
(1996/2006), que entendem os textos multimodais como
sendo aqueles cujos significados são realizados através
de mais de um código semiótico. Além de pesquisas
acerca do letramento visual (Dionísio, 2005 e Braga,
2004), que abordam a importância do visual em sala de
aula.

Os resultados mostram que o espaço dedicado a lingua-


gem não verbal reduz-se a apresentação e exploração de
aspectos gramaticais, não havendo um trabalho crítico
de leitura e compreensão das imagens.

Desse modo, o visual ainda precisa ser encarado de for-


ma mais consciente e o professor, principalmente o de
língua portuguesa, pode contribuir desenvolvendo estra-
tégias diferenciadas para o tratamento das imagens, ape-
sar dos desafios.

O que se observa claramente nesse texto é que os verbos no


presente dominam (geralmente, com valor de presente atual ou
com valor gnômico). Também ocorre um pretérito perfeito com-

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posto, que marcando o início da ação no passado, abrange um va-


lor temporal até o presente da enunciação. Os dois segmentos que
introduzem verbos no futuro funcionam como descrições de ações
que serão realizadas durante a apresentação do trabalho no even-
to. É por isso que este exemplo ilustra com grande evidência que
há “resumos” que não se referem a um trabalho anterior, mas que
funcionam como pequenos “projetos de fala”.
Já no exemplo (8), temos um caso de articulação entre ex-
poisção e relato. Vejamos:

Esta comunicação apresenta algumas reflexões e al-


Exposição guns resultados obtidos em nossa pesquisa de douto-
Verbo no rado
presente que teve por objetivo discutir como se dá na mídia im-
pressa a construção do discurso sobre o sistema de cotas
no Brasil e como ele se insere no debate sobre a exclu-
Relato são/inclusão dos negros na sociedade brasileira.
A partir da Lei nº 3.708, de 09 de novembro de 2001, em
Verbo no que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janei-
pretérito ro instituiu cotas de até 40% para as populações negras
e pardas no acesso à Universidade, a questão das cha-
madas políticas afirmativas ganhou destaque nos ór-
gãos de imprensa e assumiu importância na sociedade
brasileira.
Nesse sentido, analisamos textos da revista de cultura
Caros Amigos, que sistematicamente se ocupou do as-
sunto, no ano de 2002 – período de efervescência do
embate discursivo da exclusão, tendo como pano de
fundo o tema das cotas.
A perspectiva teórica e metodológica de base é a teo-
ria/análise dialógica do discurso, conforme depreendi-
Exposição da dos trabalhos de M. Bakhtin e do Círculo, especial-
mente no que se refere às noções de interação verbal,
Verbos no enunciado e formas de presença do discurso de outrem.
presente Os resultados evidenciam mecanismos discursivos e
modos de apreensão e citação da palavra de outrem
reveladores de que a revista constrói seu posicionamen-
to editorial diante do objeto do discurso, a partir do
valor que os interlocutores atribuem à sua construção;

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os embates entre os interlocutores determinam a cons-


trução dos enunciados; a polêmica é constitutiva da
linha editorial da revista.

A articulação entre exposição e relato permite criar um efei-


to diferente, quando comparado com os textos que articulam ex-
posição/projeto. Já não se trata apenas de uma proposta daquilo
que será feito, mas também de uma síntese de um trabalho (em
sentido prático, não textual) já realizado. É interessante observar
que existe uma distribuição dos verbos utilizados em função do
conteúdo proposicional. Assim, quando se fala sobre “a comunica-
ção” se utilizam os verbos no presente (geralmente, com valor de
futuro), enquanto que ao falar da pesquisa realizada se empregam
verbos no pretérito. Importa notar, neste caso, a ambiguidade do
verbo “analisamos”, que tanto poderia ser considerado um pretéri-
to quanto um presente. Essa ambiguidade temporal não afeta, po-
rém, o sentido do texto, já que ambos os valores seriam adequados
(remetendo para o passado da ação realizada na pesquisa ou como
um presente com valor de ação futura, ou seja, falando sobre o que
será feito na comunicação).
Quanto à organização enunciativa dos textos, há um caso
particular de gestão das vozes que é a responsabilização das ações.
Isto corresponde à tematização das ações que mencionei no item
c). Como já disse, os resumos costumam falar sobre ações já reali-
zadas, ações em curso ou ações futuras. O que veremos agora é
quem é responsável (ou responsabilizado) por essas ações. Neste
sentido, podemos distinguir (exemplificando rapidamente na Ta-
bela 2) seis mecanismos que se verificam nos resumos27 e que vão
das formas mais impessoais (emprego da terceira pessoa, voz pas-
siva, etc.) às formas em que a responsabilidade das ações é assu-
mida pelo próprio autor (através da primeira pessoa do singular).

27 Para uma apresentação mais aprofundada, ver Miranda (2013).

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Mecanismo 1: Terceira pessoa na voz ativa


Este trabalho analisa o uso do silenciamento pelo jornal “A República”
(Natal/RN - Brasil), hoje sem circulação, durante a cobertura da Se-
gunda Guerra Mundial.
O presente estudo tem por objetivo descrever e analisar o dispositivo
dialógico nas práticas linguageiras de uma equipe de saúde e acom-
panhantes de pacientes em um hospital público da cidade do Recife,
visando melhorar a qualidade dessa interação. (…)
Mecanismo 2: Voz passiva analítica e estruturas com “se”
O presente estudo tem por objetivo descrever e analisar (…). Foram
feitos registros em áudio e vídeo e aplicado o Método Clínico de Auto
Confrontação. Observou-se que o dispositivo dialógico promoveu a
expressão (…)
Apresenta-se neste trabalho análises de anúncios de coleções de livros
didáticos para ensino fundamental (…) O trabalho foi realizado duran-
te (…) Objetivou-se com a análise perceber (…) Esperou-se, ainda,
evidenciar a importância (…) Foram selecionadas coleções de três
editoras (…)
Mecanismo 3: Primeira pessoa do plural (um único autor)
Após a apresentação do quadro teórico (...) mostraremos algumas
possibilidades (...) Finalmente, apresentaremos (...)
Estaremos discutindo uma visão realista e semiótica da noção de Lin-
guagem Natural. Argumentaremos que, de um ponto de vista evoluti-
vo, as linguagens naturais e humanas são (...) Estaremos apoiados nas
concepções de (...)
(...) Como metodologia, utilizamos dois instrumentos que foram pre-
enchidos (...)
Mecanismo 4: Primeira pessoa do plural (dois ou mais autores)
Por tal motivo, propomo-nos analisar (...) Como instrumento de pes-
quisa para nosso trabalho (...) O resultado a que chegamos foi (...)
Para isso, descreveremos o conhecimento (...) Para tanto, considerare-
mos a perspectiva de (...) Por meio da observação (...) concluímos que
(...)
Mecanismo 5: Primeira pessoa do plural (explicitamente o autor e
outro/s)
Quando se trabalha com documentos orais em aulas de língua estran-
geira faz-se, em geral, dois tipos de transferências: gravação (sonora
ou em vídeo) e transcrição (que faz passar o documento do mundo
fugaz do tempo ao mundo estável do espaço). Em ambos os casos

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 301

paga-se um alto preço pois o objeto deixa de ser o mesmo. Nosso desa-
fio – meu e o do Prof. Paul Rivenc com quem desenvolvi esta pesquisa
– foi o de tentar situar nossa reflexão na rede de limitações que o tem-
po impõe aos atores da situação de interação: o sentido se constrói no
eixo tempo, em tempo real, progressivamente; e é assim que ele se
inscreve na memória.
Mecanismo 6: Primeira pessoa do singular (o autor)
A área de estudos da linguagem conta hoje, no Brasil, com mais de
1000 cursos de Graduação e mais de 60 Cursos de Pós-Graduação. (...).
Nesta exposição, vou me dedicar a três aspectos da questão: (...) Trago
aqui sugestões relativas tanto aos desafios de novas iniciativas, ao
financiamento e a uma política para sua ordenação.
Esta comunicação é, ao mesmo tempo, um relato e uma reflexão sobre
minha vivência como professora da Educação Básica (...). Consideran-
do minha participação no programa (...), relato as lições aprendidas,
mas levanto alguns questionamentos (...) É nosso objetivo refletir sobre
essas e outras questões.
Tabela (2). Mecanismos de responsabilização das ações nos resumos

A tabela (2) é demonstrativa da diversidade de formas de


responsabilização das ações que encontramos nos resumos. Isto é
importante porque quando se analisa a linguagem acadêmica pode
haver uma extrema simplificação desta classe de construções, já
que se assume que essa linguagem tende sempre para a imperso-
nalização. O que se verifica, na prática, é a coexistência desses vá-
rios mecanismos aqui exemplificados28. Desses mecanismos, o me-
nos frequente é o número 5, em que um autor singular fala de si
mesmo e de um outro, designando esse outro explicitamente. Já o
emprego do mecanismo nº 6 parece ser cada vez mais frequente,
embora tenha, provavelmente, menor tradição que os mecanismos
1, 2 e 3.
Esses três mecanismos são estratégias de impersonalização
muito frequentes na escrita acadêmica. No caso do primeiro meca-
nismo, se trata do emprego de um conjunto bastante estabilizado
de expressões que personalizam a “comunicação”, que acaba rece-

28 Os exemplos são segmentos dos textos do corpus analisado nas


pesquisas mencionadas.

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 302

bendo propriedades e atribuições do autor. Vejamos os seguintes


exemplos de expressões ritualizadas com alto grau de ocorrência
nos resumos, tomando apenas o caso da formulação dos objetivos:

Este trabalho tem por objetivo (analisar…)


Este trabalho tem o objetivo de (analisar…)
Este trabalho propõe-se a (analisar…)
Esta comunicação tem por objetivo (apresentar…)
Esta comunicação visa (apresentar e discutir…)
Esta comunicação objetiva (apresentar…)
Esta exposição tem o objetivo de…
Este estudo propõe (descrever…)
Este artigo propõe…
O presente trabalho tem por objetivo…
A presente comunicação tem por objetivo…
Essa comunicação tem como objetivo…
Esse trabalho tem como objetivo…
(A partir desse ponto de vista,) o objetivo deste trabalho
é…
(Nessa perspectiva,) o objetivo deste trabalho é…
(…)

Tabela (3). Algunas expressões ritualizadas do resumo de comunicação

3. Nota sobre a didatização do gênero

As diferentes questões apresentadas no modelo preliminar


abrem caminhos interessantes para explorar no ensino do gênero
resumo de comunicação. Como já mencionei, a especificidade do
gênero quanto à relação com a atividade acadêmica justifica que o
gênero seja objeto de ensino no nível superior (universidades,
institutos superiores, etc.). As sequências didáticas29 em torno

29O procedimento denominado “sequência didática” no âmbito do ISD,


prevê o planejamento de uma série de módulos em que se trabalham
diferentes características próprias do gênero textual em estudo. Antes
desses módulos é preciso realizar uma atividade de diagnóstico para

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 303

desse gênero poderiam abordar as várias características que fui


elencando e exemplificando nas páginas anteriores ou só algumas
delas.
A meu ver, alguns dos eixos mais relevantes para explorar
em situações de ensino são os seguintes:

1) A relação intertextual convocatória / resumo. Isso implica


compreender que a produção dos textos deve ser ade-
quada a uma série de condições prévias ou parâmetros
de produção. Como as condições mudam permanente-
mente, é importante que os produtores de resumos se-
jam capazes de redigir textos apropriados para as con-
dições específicas da situação comunicativa em que se
encontram. Portanto, essa é uma aprendizagem fun-
damental da prática acadêmica. Ou seja, não se trata de
aprender a produzir um gênero estável e rígido (por-
que isso, simplesmente, não existe!), mas de aprender a
“fluir com o gênero”. De maneira que em uma sequên-
cia didática para aprender a escrever resumos não de-
veria faltar um módulo específico para exercitar a rela-
ção entre a convocatória e o resumo.
2) Os “lugares de fala” ou “papéis socio-subjetivos”. Como
mencionei, a escrita de um resumo de comunicação
implica assumir um determinado papel enunciativo
(professor, pesquisador, estudante de graduação ou
pós-graduação, especialista em uma área ou um assun-
to, etc.). Por isso, um dos módulos da sequência pode
estar dedicado a explorar diferentes papéis, recorrendo
a expressões que permitam demonstrar esses lugares
(por exemplo, aludindo a trabalhos anteriores próprios,
situando o trabalho em uma pesquisa ou em uma situa-
ção de ensino, etc.).

avaliar que aspectos será mais apropriado trabalhar com a turma espe-
cífica. Isso se faz no quadro de um projeto global que justifica a produção
de textos do gênero em causa. Sobre este procedimento, consultar Dolz ;
Noverraz ; Schneuwly (2004).

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3) Os diferentes formatos discursivos. Um dos aspectos expli-


citados no modelo aqui apresentado é que os resumos
podem mobilizar três formatos discursivos diferentes,
que podem ocorrer de maneira articulada: a exposição,
o relato e o (micro)projeto. Estas possibilidades de es-
crita também podem ser exercitadas em um módulo
específico da sequência. A exploração deste tópico
permite abordar a relação entre conteúdos (de que se
fala?), discurso (como se fala?) e formais verbais (com
que recursos linguísticos?).
4) Os mecanismos enunciativos. Um dos vários mecanismos
enunciativos que poderiam ser objeto de trabalho didá-
tico em um módulo da sequência é o caso da responsa-
bilização das ações que referi mais acima. O estudo
dessa questão permite explorar diferentes atitudes de
responsabilização enunciativa, recorrendo a formas
com maior ou menor grau de envolvimento do autor
(ou dos autores) e exercitar a capacidade estratégica de
impersonalizar o discurso.

Considerações finais

O resumo de comunicação é um gênero que tem um papel


fundamental na vida acadêmica atual. Em todas as etapas da
carreira do pesquisador e, ainda, do professor das mais diversas
áreas, a participação em eventos científicos é um requisito inelu-
dível para atualizar seus conhecimentos e para compartilhar
problemas e experiências do seu campo. A produção dessa classe
de “resumos” exige um domínio de uma prática que tem singu-
laridades importantes. Não se trata da produção de um texto de
sumarização do conteúdo de um texto anterior (como nos “verda-
deiros” resumos), mas da elaboração de um texto cuja comple-
xidade tem a ver com outros elementos. O carácter complexo está
dado pelos traços próprios da situação de produção (a escrita
provocada por uma convocatória com dados particulares, o prazo
de produção e envio, o duplo objetivo de ser aprovado e funcionar
como informação atraente para os possíveis assistentes, etc.), mas
também pela especificidade linguístico-discursiva dos textos desse

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 305

gênero que não se reduz a operações de sumarização de um


conteúdo proposicional anterior. Assim, é preciso que o agente-
produtor dos textos seja capaz de compreender a função social do
gênero e conhecer os recursos de linguagem disponíveis para
produzir um texto do gênero adequado à situação particular.
O modelo didático aqui apresentado é, como já disse, inten-
cionalmente preliminar e provisório. Meu objetivo neste trabalho
foi, sobretudo, mostrar aspectos da complexidade do gênero e, ao
mesmo tempo, sugerir vias de abordagem para seu ensino. A
partir daqui, outros modelos didáticos do gênero resumo de
comunicação poderão (e deverão!) ser construídos. Nesse sentido,
considero importante insistir na ideia de “modelo didático” como
objeto histórico30.
Finalmente, convém lembrar que um modelo didático é um
instrumento da “engenharia didática” que tem por objetivo ofe-
recer elementos para o ensino de um determinado gênero. Mas o
modelo propõe um conjunto de dados que não devem ser simples-
mente levados para a sala de aula. Pelo contrário, é preciso realizar
uma seleção criteriosa e uma adaptação apropriada para cada
situação de ensino (características dos alunos, área de estudo, nível
de ensino, etc.). De fato, como indicam De Pietro e Schneuwly
(2003, p. 40, grifo meu), o modelo apresenta apenas “objetos po-
tenciais” de ensino:

Le modèle didactique du genre à enseigner nous fournit


donc en quelque sorte des objets potentiels pour
l’enseignement, d’une part parce qu’une sélection doit
être faite en fonction des capacités avérées des
apprenants, d’autre part parce qu’on n’enseigne pas le
modèle en tant que tel, mais bien certains éléments
sélectionnés à travers des tâches et activités diverses qui
les mettent en quelque sorte en scène dans un processus
de transposition qui les transforme nécessairement.

30Nas palavras dos autores que conceberam esse intrumento: “Un modèle
didactique est toujours aussi le produit des pratiques historiques précédentes,
une forme nouvelle de ce qui se faisait déjà avant”. (DE PIETRO;
SCHNEUWLY, 2003, p. 38.)

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ESCRITA ACADÊMICA NO ENSINO


SUPERIOR: UM ESTUDO EM
INTRODUÇÕES DE ARTIGOS CIENTÍFICOS
DE ALUNOS DE GRADUAÇÃO
Socorro Cláudia Tavares de Sousa

Introdução

A escrita acadêmica tem sido objeto de interesse em dife-


rentes tradições de ensino e pesquisa no cenário internacional.
Dentre essas vertentes, é possível citar Writing Across the Curricu-
lum (WAC) e Academic Literacies (ACLITS). A primeira originou-se
nos Estados Unidos no início da década de setenta, e a segunda
desenvolveu-se no Reino Unido durante a década de 90. Embora
tenham raízes históricas, pedagógicas e ideológicas diferentes,
ambas guardam similaridades. Uma delas é o contexto sócio-
histórico no qual estão relacionadas: a entrada massiva de sujeitos
outrora excluídos do ensino superior. Assim, essas tradições re-
presentam uma resposta a essa nova demanda. Segundo Russell et
al. (2009, p. 396), “[...] Os Estados Unidos tem tido por décadas um
sistema de educação massificatória, enquanto o Reino Unido está
apenas começando a ‘massificação’”. Outras semelhanças são: a
tentativa de superar os modelos de escrita acadêmica que se anco-
ram na ideologia do déficit e a presença de gêneros textuais, embo-
ra com concepções teóricas e utilizações divergentes (RUSSELL et
al., 2009).
Em relação à dimensão pedagógica, a vertente dos Letra-
mentos Acadêmicos (ACLITS) relaciona a apropriação de gêneros
pelos estudantes com questões de identidade acadêmica e empo-
deramento, como também com a ideia de que ensinamos os alunos

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a se resignarem ou a resistirem diante das diferentes ações retóri-


cas realizadas na comunidade acadêmica. De acordo com Russell
et al. (2009), essa tendência oferece possibilidade para o desenvol-
vimento de uma pedagogia da autonomia. Já Writing Across the
Curriculum (WAC) tem três principais abordagens no ensino da
escrita acadêmica. A primeira é denominada de “aquisição de gê-
nero” (genre acquisition) e consiste em ensinar explicitamente os
movimentos retóricos e as convenções dos gêneros. Essa aborda-
gem é muito comum no ensino de Inglês para Propósitos Específi-
cos e de Inglês para Fins Acadêmicos e tem em Swales um lídimo
representante. A segunda é denominada de “consciência do gêne-
ro” (genre awareness) e se caracteriza por levar os alunos a se mo-
verem do conhecimento de gêneros e contextos familiares para o
conhecimento de gêneros e contextos não familiares. A terceira
abordagem é a “nova retórica” (new rethorical) e tem como objetivo
ensinar não apenas os movimentos retóricos e convenções do gê-
nero, mas também a lógica subjacente à produção de gêneros, ou
seja, “por que”, “onde”, “quando”, “o que” e “como”. Ou seja, o
gênero é ensinado explicitamente, mas compreendido como uma
dada ação retórica realizada em situação recorrente.
Além dessas três abordagens, WAC também recebeu in-
fluências da pedagogia crítica e tem uma corrente que se caracteri-
za por defender a ideia da “[...] importância da linguagem não
acadêmica dos estudantes e seus gêneros especialmente aqueles
dos contextos de classe e étnicos, os quais em geral são excluídos
pelos gêneros acadêmicos” (RUSSELL et al., 2009, p, 411). Outra
ideia defendida é a que destaca a voz individual dos estudantes de
modo que o ensino dos gêneros textuais possa favorecer “[...] a
autoridade e a postura que eles necessitam para preservar e ex-
pressar uma voz pessoal, para afirmar a sua autoridade sobre os
gêneros disciplinares - e para simplesmente resistir à reprodução
das ideologias dominantes das disciplinas.” (RUSSELL et al., 2009,
p, 411). Como é possível observar, a influência da pedagogia críti-
ca promoveu convergências ideológicas entre a WAC e os “letra-
mentos acadêmicos”.
No cenário brasileiro, identificamos pesquisas nas duas di-
ferentes vertentes – WAC e ACLITS. Sem a pretensão de sermos

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exaustivos, podemos citar os trabalhos de Araújo e Bezerra (2013),


que examinaram as práticas de leitura e produção de gêneros aca-
dêmicos de alunos do curso de Letras; de Bezerra (2012), que in-
vestigou a relação entre a contribuição de cursos de pós-graduação
lato sensu no processo de letramento de estudantes em gêneros
acadêmicos; de Aranha (2009), que descreveu a escrita acadêmica
do artigo científico em inglês em um curso de pós-graduação stric-
to sensu para alunos de Genética e Odontologia; de Figueiredo e
Bonini (2006), que investigaram as concepções sobre ensino e
aprendizagem da escrita acadêmica em um grupo de alunos do
mestrado após participação em um curso de produção textual aca-
dêmica escrita, dentre outros.
Como é possível observar, a temática do(s) letramento(s)
acadêmicos(s) é bastante profícua. Considerando esse veio de pes-
quisas, o presente trabalho se insere dentro da tradição Writing
Across the Curriculum (WAC) e utiliza a abordagem de gêneros
proposta por Swales (1990, 2004) com o diferencial de que se des-
tina ao ensino de português para nativos com fins acadêmicos.
Nosso objetivo é investigar como se configura a seção de introdu-
ção de artigos de pesquisa produzida por alunos do curso de Le-
tras/Português da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) du-
rante a disciplina de Pesquisa Aplicada ao Ensino de Língua Por-
tuguesa (PAELP) nos semestres de 2012.2 e 2013.1, em dois mo-
mentos distintos – no início e no final da disciplina. Para atingir-
mos esse objetivo, realizamos uma análise de natureza qualitativa
em uma amostra de vinte textos, sendo dez produzidos no início
da disciplina e dez no final.
A escolha por seções de introdução tem sido objeto de mui-
tas pesquisas. Em geral, as análises investigam a materialização
desses textos em diferentes contextos disciplinares como é o caso
da Computação (ANTHONY, 1999), da Biologia (SAMRAJ, 2002),
da Física e da Psicologia Educacional (SWALES; NAJJAR, 1987),
dentre tantos outros. Consideramos importante examinar as seções
de introdução produzidas por membros periféricos da comunida-
de discursiva – os estudantes de graduação. Além desse aspecto, a
introdução é uma das partes do artigo de pesquisa que merece
bastante atenção, pois é a partir dela que o leitor terá razões ou não

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de seguir a leitura do texto, daí seu viés argumentativo. Swales e


Feak (1994) destacam que as introduções são problemáticas e se
constituem como tarefas difíceis tanto para nativos quanto para
não nativos.
Para fins de organização deste trabalho, o dividimos em
três partes afora as considerações iniciais e finais: na primeira,
exploramos a noção de propósito comunicativo oriunda de
Askehave e Swales (2001) e Swales (2004), e da releitura dessa
noção realizada por Bezerra (2006) e Biasi-Rodrigues e Bezerra
(2012); e, na segunda, descrevemos o contexto de produção desses
textos e o modelo Create a Research Space (CARS) que serivirá de
base para nossa análise; na terceira, discutimos os resultados
obtidos na análise do corpus. Considerando que o objeto de nossa
análise são os propósitos comunicativos e os movimentos retóricos
em introduções de artigo de pesquisa, deixamos explícita a
compreeensão de que a categoria propósito comunicativo é um
critério relevante não apenas para o reconhcimento de gêneros,
mas principalmente para o ensino e aprendizagem destes.

1. A noção de propósito comunicativo

Em sua obra Genre analysis: english in academic and


researching settings, Swales (1990, p. 58) apresenta uma noção de
gênero que tem a categoria propósito comunicativo como
elemento central de análise como é possível constatar a seguir.

Um gênero compreende uma classe de eventos comuni-


cativos, cujos membros compartilham um certo conjunto de
propósitos comunicativos. Esses propósitos são reconheci-
dos pelos membros especializados da comunidade discur-
siva original e desse modo passam a constituir a razão
subjacente ao gênero. A razão subjacente delineia a estrutura
esquemática do discurso e influencia e restringe as escolhas
de conteúdo e estilo. O propósito comunicativo é um
critério privilegiado que opera no sentido de manter o
escopo do gênero, conforme concebido aqui, estreitamente
ligado a uma ação retórica comparável. (Grifo nosso).

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Nessa perspectiva, a noção de gênero está imbricada com a


de propósito comunicativo de modo que é através dele que se
delineia a forma, o conteúdo e estilo de um gênero, como também
a noção de propósito está relacionada com a noção de comunidade
discursiva haja vista a comunidade ter em comum um conjunto de
propósitos comunicativos públicos para realizar diferentes ações
sociorretóricas. Ao revisitarem a categoria, Askehave e Swales
(2001) e Swales (2004) redimensionam seu papel no processo de
análise dos gêneros. Assim, o propósito comunicativo deixa de ser
um critério privilegiado e central, passando a ser uma etapa em
meio a uma série de outros procedimentos que permitirá ao
analista reavaliar suas investigações sobre o gênero em estudo.
Isso não quer dizer que a noção perdeu sua importância, mas que
não pode mais ser concebida como um critério apriorístico. A
reflexão dos autores faz sentido porque se o propósito é o critério
que determina se um texto pertence a um dado gênero, então o
pesquisador já poderia saber de antemão os propósitos comuni-
cativos dos textos. Outro aspecto que justifica essa revisão é a
possibilidade de um dado gênero ter múltiplos propósitos. Esses
questionamentos se colocam como suficientemente fortes para
reposicionar o papel da categoria no estudo dos gêneros.
Para ilustrar que a tarefa de identificar os propósitos
comunicativos não é tão óbvia, Askehave e Swales (2001) analisam
os propósitos das listas de compras, das cartas de recomendação e
dos folders empresariais. Essa investigação leva os autores a
concluírem que textos idênticos podem desempenhar diferentes
funções, podem conduzir propósitos particulares, ou, ainda, que
os propósitos comunicativos de um gênero podem se alterar, de
modo que o gênero não realiza mais dada função social a que se
propunha anteriormente.
Mas o que vem a ser o propósito comunicativo? Esse ques-
tionamento foi levantado por Bezerra (2006) tendo em vista a sua
ampla utilização em diferentes trabalhos e uma ausência de uma
definição explícita. Da revisão de literatura feita pelo autor, ele
constata que a noção de propósito carrega valores semânticos de
“função”, “objetivo”, “intenção” e pode ser socialmente reconhe-
cido como também ser identificado como particular. Contudo,
Bezerra (2006, p. 83) adverte que

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[...] o propósito comunicativo, portanto, não será algo


simplesmente imanente no texto como tal, visto que se trata
sempre de um processo de construção social desse propósito
ou propósitos, nem será uma realidade meramente psicoló-
gica, definível como ‘intenção do autor’, pois seria impe-
rativo questionar essa onipotência do autor sobre o texto e
sua recepção na sociedade.

Isso significa afirmar que a noção de propósito comuni-


cativo traz em seu bojo a dimensão social ao mesmo tempo em que
é questionada a “onipotência” do autor e do texto. Nessa pers-
pectiva, podemos compreender o propósito comunicativo como
objetivos comunicativos que são materializados, de forma explícita
e/ou implícita, em dado texto utilizado em uma situação retórica
recorrente, e que cumprem finalidades sociais (mas também
particulares) que podem ser reconhecidas pelos membros de uma
comunidade. Essa percepção coloca em cena a possibi-lidade de
um gênero materializar em maior grau propósitos comu-nicativos
socialmente explicítos e em grau menor (ou não mate-rializar)
propósitos comunicativos implícitos. Sobre estes, Biasi-Rodrigues
e Bezerra (2012, p. 236) destacam que

[...] reconhecendo-se que os gêneros, inseridos como são em


práticas sociais, não são produzidos de forma neutra e
desinteresada, é bem possível falar de intenções públicas e
intenções escamoteadas, [...] ‘Intenções’, portanto, de atores
e grupos sociais, e não dos textos em si, o que não implica
uma concepção meramente psicologizante de propósito
comunicativo. (Grifo nosso)

A nosso ver, a explicação fornecida por Biasi-Rodrigues e


Bezerra (2012) não soluciona a problemática da inserção de propó-
sitos comunicativos “escamoteados” nos gêneros, principalmente
se considerarmos que na noção de propósito é evidenciada a di-
mensão social, aspecto também reafirmado pelos pesquisadores
brasileiros. Por essa razão, não consideramos contraditória a afir-
mação de que os gêneros podem materializar em menor escala
propósitos particulares até porque os gêneros são versáteis e ma-

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leáveis e cada realização de um gênero o repete ao mesmo tempo


que o transforma. Outro aspecto que corrobora esse ponto de vista
é o fato de os membros experientes da comunidade discursiva
poderem inserir propósitos particulares (implícitos) ao produzir
um dado gênero.
Em 2004, Askehave e Nielsen, ao analisarem a homepage, fa-
zem reflexões acerca do modelo “tradicional”1 de gêneros desen-
volvido por Swales (1990), que parte do propósito comunicativo
do gênero e, consequentemente, dá conta da estrutura retórica do
gênero. Essa afirmação está ilustrada na figura 01.

Figura 01: Modelo de gênero de três níveis.

Propósito comunicativo
Realizado por
Movimentos retóricos
Realizado por
Estratégias retóricas

Fonte: Askehave e Nielsen (2004, p. 04).

De acordo com essa proposta teórica, os gêneros textuais


materializam um ou um conjunto de propósitos comunicativos, e
cada propósito é realizado por diferentes movimentos retóricos e
estes, por sua vez, se realizam através de estratégias retóricas
diversas. Para compreender essa estrutura esquemática do gênero,
faz-se necessário definir moves e steps, termos que ficaram
conhecidos no Brasil como unidades e subunidades retóricas. Para
Biasi-Rodrigues (1998, p. 125):

1Askehave e Nielsen (2004) usam o termo “tradicional” para se opor a


um modelo de análise de gêneros que dê conta dos gêneros multimodais.

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Uma unidade retórica é reconhecida como uma unidade de


conteúdo informacional dentro de uma estrutura hierárquica
de distribuição das informações na arquitetura física do
texto, com algumas formas opcionais de apresentação, que
podem ocorrer combinadas ou não, à escolha do autor. Essas
escolhas ou mecanismos de condução das informações em
cada unidade básica são denominadas, por sua vez, de
subunidades retóricas.

A explicação apresentada por Biasi-Rodrigues (1998) dá


conta da arquitetura textual do gênero, aspecto priorizado na
proposta inicial de Swales (1990), já a noção de propósito comu-
nicativo revisitado por Askehave e Swales (2001) e Swales (2004)
dá conta da dimensão social do gênero. Bezerra (2006) faz uma
releitura da proposta de Swales (1990), correlacionando propósito
comunicativo com movimento retórico e não diferenciando unida-
de retórica (move) de subunidade retórica (step). O autor justifica
sua opção embasando-se em Kaphpalia (1997)2, que subestimou
essa diferença, e em Bhatia (2004), que a eliminou. Em reflexão
posterior, Biasi-Rodrigues e Bezerra (2012) silenciaram a esse
respeito quando discutem a relação entre propósito comunicativo
e estrutura esquemática do gênero, aspecto que para nós precisa
ser mais bem explorado já que Swales (2004, p. 228) define poste-
riormente move como “[...] uma unidade discursiva ou retórica que
realiza, dentro do discurso escrito ou falado, uma função comu-
nicativa coerente”. Nessa definição, não estão evidenciadas apenas
as características linguísticas que sinalizam o conteúdo de um
gênero.
A categoria propósito comunicativo ainda pode ser um
critério capaz de agrupar gêneros ou, ainda, de diferenciá-los. No
primeiro caso, o propósito de introduzir/apresentar uma obra
acadêmica congregou diferentes gêneros (apresentação, introdu-
ção, prefácio, prólogo, nota biográfica e sinopse) em um agrupa-

2 Bezerra (2006) cita: KATHPALIA, S. S. Cross-cultural variation in pro-


fessional genres: a comparative study of book blurbs. World Englishes,
n. 3, v. 16, p. 417-426, 1997 e BHATIA, V. K. Worlds of written discourse:
a genre-based view. London, Continuum, 2004.

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mento denominado gêneros introdutórios propriamente ditos


(BEZERRA, 2006). No segundo caso, foi capaz de distinguir dife-
rentes tipos de chat (chat aberto, chat educacional, chat com convi-
dado, chat reservado, chat personalizado, chat privado, chat de
atendimento ao assinante), transformando-os em uma constelação
de gêneros3 (ARAÚJO, 2003). Essas possibilidades revelam a
complexidade da categoria propósito comunicativo, demandando,
portanto, pesquisas que explorem conjuntamente aspectos termi-
nológicos, conceituais e empíricos que envolvem a relação entre
gênero textual e propósito comunicativo, como é o caso das no-
ções de subgênero (BHATIA, 1993), colônia de gêneros (BHATIA,
1993), constelação de gêneros (ARAÚJO, 2003), moves e steps
(SWALES, 1990, 2004), afora o fato de que o propósito comunica-
tivo é uma categoria sensível às mudanças de áreas disciplinares,
ao contexto da tarefa, ao suporte textual, dentre outros fatores.
Neste trabalho, embora utilizemos o modelo CARS de
Swales (1990) como ponto de partida para a análise das introdu-
ções de artigo de pesquisa dos alunos do curso de Letras/
Português, não distinguimos moves de steps e correlacionamos os
propósitos comunicativos das introduções com os movimentos
retóricos, assim como o fez Bezerra (2006). Em nossa perspectiva,
consideramos que a introdução do artigo de pesquisa possui
propósitos comunicativos específicos compartilhados pelos mem-
bros da comunidade acadêmica e que tem diferentes materiali-
zações dependendo, por exemplo, da posição que os membros
ocupam em suas respectivas comunidades.

3 Segundo Araújo (2006, p. 306), “uma constelação de gêneros consiste em


um agrupamento de situações comunicativas em torno das quais gravi-
tam, em diferentes graus, características comuns à esfera de comunicação
que ambienta os gêneros da constelação, fortes características de sua
constituição genética, aproximando-os também quanto ao seu processo
formativo e, por último, mas não menos importante, uma teia de propósi-
tos comunicativos mais ou menos claros pelos quais os gêneros são reco-
nhecidos por seus usuários, distinguindo-os uns dos outros e servindo de
“guias” para a sua adequada utilização.”.

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2. O contexto de produção dos textos

Durante dois semestres (2012.2 e 2013.1), os alunos que se


matricularam na disciplina de PAELP do curso de Le-
tras/Português turno noturno enfrentaram o desafio de produzir
em pequenos grupos4 um artigo de pesquisa (empírico)5 durante o
decorrer da disciplina e ao final apresentar uma comunicação in-
dividual em um evento científico criado especialmente com o obje-
tivo de promover a divulgação dos resultados dessas pesquisas
realizadas pelos estudantes (Workshop de Pesquisa Aplicada ao Ensi-
no de Língua Portuguesa). A ementa da disciplina que está abaixo
descrita possibilitou a realização dessa atividade curricular.

Fundamentos gerais da pesquisa de campo: tipos de pesquisas


e instrumentos. Pesquisa em sala de aula: elaboração de um
plano de trabalho, realização da pesquisa em sala de aula e de
relatório dessa pesquisa.

Compreendendo que um artigo científico é um relatório de


pesquisa, destinamos toda a carga horária da disciplina (60 ho-
ras/aula) à produção desse gênero acadêmico. Assim, exploramos
em sala de aula cada etapa do processo de produção de uma pes-
quisa científica, desde a escolha do tema e sua delimitação até a
apresentação de uma comunicação individual no Workshop. Por
conta do escopo da disciplina, definiu-se que o objeto de pesquisa
que os alunos investigariam estaria necessariamente relacionado

4 Definimos em sala de aula que os grupos seriam constituídos de um


mínimo de 02 (dois) e um máximo de 04 (quatro) participantes. Ao final,
alguns grupos ficaram com apenas 01 (um) participante.
5 De acordo com Motta-Roth e Hendges (2010, p. 66-67), há artigo de revi-

são teórica que “[...] relata uma pesquisa que consiste em um levanta-
mento de toda a literatura publicada sobre um tema [...]”, há artigo expe-
rimental que “[...] relata um experimento montado para fins de testarem
determinadas hipóteses [...]” e há artigos científicos empíricos “[...] não
relatam uma pesquisa desenvolvida em um ambiente experimental con-
trolado, mas reportam a observação direta dos fenômenos conforme per-
cebidos pela experiência [...]”.

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ao ensino de Língua Portuguesa. Desse modo, vislumbramos pes-


quisas que versaram sobre a prática de reescrita, a coerência em
redações escolares, a interferência da escrita nas redes sociais nas
produções textuais, dentre outras. Nesses dois semestres, foram
produzidos e apresentados vinte trabalhos, sendo 10 em cada pe-
ríodo, e algumas dessas pesquisas foram posteriormente inscritas e
aprovadas em eventos científicos na área de Letras/Linguística
(e.g. Selimel, Abralin) para apresentação de pôsteres. Como é pos-
sível observar a produção de um artigo de pesquisa propiciou a
criação de um evento comunicativo, bem como mobilizou a reali-
zação de outros gêneros como a comunicação individual, o pôster,
dentre outros. É o que Swales (2004) definiu como cadeia de gêne-
ros, ou seja, para a realização de um gênero necessariamente ou-
tros gêneros anteriores se fazem presentes.
O processo de produção das introduções foi caracterizado
como uma atividade coletiva, haja vista que os estudantes eram
orientados a apresentarem para a turma suas produções e estas
estarem sujeitas a críticas tanto da professora quanto dos colegas
de classe.6 As críticas versavam sobre diferentes aspectos, tais co-
mo a adequação lexical, o discurso científico, o conteúdo informa-
tivo que faz parte dessa seção. A reescrita foi um processo funda-
mental nesse processo, pois cada parte do trabalho considerada
“finalizada” pela professora e pela equipe de trabalho significava
um percurso de muitas idas e vindas. Além da orientação na sala
de aula, os grupos tinham também orientações individuais. O tra-
balho foi bastante árduo, principalmente porque a maioria dos
estudantes jamais havia escrito um artigo de pesquisa, exceto pou-
cos que já haviam vivenciado essa experiência de escrita porque
ou eram alunos de iniciação científica ou estava cursando um mes-
trado acadêmico em outra área do conhecimento (apenas um estu-
dante). Contudo, o resultado foi bastante positivo, pois os estudan-
tes conseguiram compreender o percurso de realização de uma

6Referimo-nos especificamente às introduções porque as outras seções do


artigo embora tenham sido apresentadas pelos alunos em sala de aula,
foram expostas no formato de power point e não no formato do texto pro-
priamente dito como o foi a introdução.

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pesquisa científica e escrever um artigo científico buscando seguir


as restrições que esse gênero impõe. Elaboramos ainda um conjun-
to de normas a fim de que os artigos tivessem a mesma formatação
e orientação em relação ao número de páginas, formas de citação,
dentre outros aspectos.
Para a produção da seção de introdução foram realizados
os seguintes passos que estão resumidos no Quadro 01.

Quadro 01: Passos para a produção de introdução de artigos


de pesquisa
Passo 1: Exposição dialogada do Modelo Create a Research Space (CARS)
de Swales (1990). Para essa atividade, utilizamos como referência biblio-
gráfica o capítulo “Artigo acadêmico: introdução” de Motta-Roth e Hen-
dges (2010);
Passo 2: Realização de atividade em grupo que teve como objetivo identi-
ficar os propósitos comunicativos e os movimentos retóricos em introdu-
ções de artigo de pesquisa de membros experientes da comunidade dis-
cursiva;
Passo 3: Produção da introdução do artigo de pesquisa pelas equipes de
trabalho;
Passo 4: Apresentação para a turma das introduções produzidas, utili-
zando o retroprojetor; Comentários da professora e dos colegas de turma;
Passo 5: Rescrita dos textos e reapresentação das equipes de trabalho das
introduções considerando as colaborações advindas anteriormente.

A escolha do modelo CARS desenvolvido por Swales


(1990) justifica-se pelo fato de que é bastante utilizado na análise
de introduções de artigos de pesquisa (e.g. ARANHA, 1996;
GIBBON, 2012, dentre outros), como também foi o modelo exposto
no capítulo teórico indicado para a leitura dos estudantes de modo
que não servia apenas para a análise de gêneros, mas também para
o ensino destes.

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Figura 02: Modelo CARS de Swales.

Movimento 1: Estabelecer um território


Passo 1 – Asseverar a importância do assunto e/ou
Passo 2 – Fazer generalizações sobre o assunto e/ou
Passo 3 – Revisar itens de pesquisa prévia
Movimento 2: Estabelecer um nicho
Passo 1A – Apresentar argumentos contrários a estudos prévios ou
Passo 1B – Identificar lacunas no conhecimento ou
Passo 1C – Fazer questionamentos ou
Passo 1D – Continuar uma tradição
Movimento 3: Ocupar o nicho
Passo 1A – Esboçar os objetivos ou
Passo 1B – Anunciar a presente pesquisa
Passo 2 – Anunciar principais resultados
Passo 3 – Indicar a estrutura do artigo

Fonte: Motta-Roth; Hendges (2010, p. 83).

O primeiro modelo elaborado por Swales (1990) resultou


do exame de 48 (quarenta e oito) exemplares de artigos de pesqui-
sa em várias áreas do conhecimento (Ciências Físicas e Biológicas,
Ciências Sociais e Linguística). Posteriormente, o autor estendeu
sua análise para 110 (cento de dez) introduções, chegando a uma
representação da organização retórica recorrente em artigos de
pesquisa que está descrita na Figura 02. A utilização de uma metá-
fora ecológica para a nomeação dos moves visa a representar a
competitividade acadêmica de modo que o nicho é um contexto no
qual uma pesquisa específica torna-se particularmente importante
(SWALES; FEAK, 1994).
Embora não tenhamos a pretensão de nos aprofundar nas
diferenças entre o primeiro modelo e suas posteriores revisões
(SWALES; FEAK, 1994; SWALES, 2004), cabe destacar que a pro-
posta de 1994 tornou o modelo mais condensado, possibilitando,
portanto, seu potencial de utilização, principalmente, porque hou-
ve uma diminuição dos steps (ARANHA, 2005). Em nossa perspec-
tiva, a presença de diferentes steps no modelo de 1990 representou
um percurso mais didático na medida em que apresentamos aos
alunos diferentes possibilidades retóricas de escrever a seção de
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introdução. Já em 2004, por exemplo, Swales leva em consideração


as informações recorrentes em diferentes campos do conhecimento
de modo que no move 3 aparecem 03 (três) steps que são passíveis
de se realizar em apenas algumas áreas disciplinares, aspecto que
para a atividade que estávamos realizando não se apresentou co-
mo relevante.
Na seção a seguir, investigaremos como se configuram as
introduções de artigos de pesquisa elaboradas por estudantes do
curso de Letras em duas versões: a primeira e a última, comparan-
do essas realizações com o modelo CARS (SWALES, 1990). A cole-
ta dos dados ocorreu em novembro de 2013, quando solicitamos
por e-mail aos estudantes as duas versões das introduções de seus
trabalhos que interessavam para esta pesquisa. Com a finalidade
de preservar a identidade dos estudantes identificamos os textos
com a sigla AP que significa artigo de pesquisa, seguidos de nu-
merais arábicos e da letra I para indicar a produção inicial e F para
indicar a produção final (e.g. AP1I, AP1F...).

3. Introduções de artigos de pesquisa: as vozes dos estudantes do


curso de Letras/Português

Como foi apresentado na seção anterior, os membros da


comunidade discursiva acadêmica realizam três principais propó-
sitos comunicativos que são: estabelecer um território, estabelecer um
nicho e ocupar um nicho. Contudo, nas seções de introdução produ-
zidas por estudantes do curso de Letras/Português, identificamos
apenas a realização do primeiro e do último propósito comunica-
tivo que serão analisados nas subseções a seguir. A nosso ver, a
ausência de realização do propósito de estabelecer um nicho se ex-
plica pelo fato de que os estudantes se constituem membros peri-
féricos da comunidade acadêmica e ainda não conseguem situar as
suas pesquisas entre o que tem sido feito (Estabelecer um território) e
o que suas pesquisas vão realizar (Ocupar o nicho). Embora Swales
e Feak (1994) afirmem que esse propósito funciona como uma
“dobradiça” que conecta os demais e representa um propósito
comunicativo fundamental nas introduções, para os estudantes de

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Letras esse propósito não se configurou como informação relevan-


te em seus textos.

3.1 Estabelecendo um território

De acordo com Swales (1990), o propósito comunicativo de


estabelecer um território pode se realizar a partir de três movimentos
retóricos, a saber: asseverar a importância do assunto, fazer generaliza-
ção(ões) sobre o assunto e revisar itens de pesquisa prévia. Nas seções
de introduções elaboradas por estudantes do curso de Le-
tras/Português, observamos a materialização de cada um desses
movimentos tanto nas produções iniciais quanto nas produções
finais. Em nosso corpus, o movimento retórico de asseverar a impor-
tância do assunto não teve muitas realizações e apareceu em apenas
um exemplar de introdução. Essa constatação pode indicar que os
estudantes ainda não compreenderam que as introduções são es-
paços que revelam a competitividade da área, daí se caracteriza-
rem pela presença da argumentação para afirmar a importância do
assunto ou da pesquisa que será realizada. Nos excertos a seguir,
ilustramos a presença desse movimento retórico em dois momen-
tos de produção textual do AP6.

AP6I A partir daí, podemos ressaltar a importância de estudar o


texto argumentativo, pois através dele expomos e organi-
zamos nossas ideias, usamos da persuasão e do convenci-
mento para conquistar o leitor e convencê-lo a concordar
com nosso ponto de vista.7 (Grifo nosso)
AP6F “A escola tem um papel fundamental na formação de ci-
dadania e compete ao professor orientar seus alunos nesse
processo de transformação de um cidadão mais participa-
tivo e interativo na sociedade da qual ele faz parte”
(UBER, 2007). Sendo assim, faz-se necessário que o profes-
sor promova atividades que contribuam na construção de
opiniões e desenvolvam o ponto de vista dos alunos.
Conforme um dos objetivos do ensino fundamental que

7 Neste trabalho, transcrevemos os textos dos alunos sem nenhuma modi-


ficação a fim de preservar a autenticidade destes.

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estão indicados nos Parâmetros Curriculares Nacionais é


necessário para o aluno “posicionar-se de maneira crítica,
responsável e construtiva nas diferentes situações sociais,
utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de
tomar decisões coletivas (BRASIL, 1998, p. 07)”. Assim, é
importante que o aluno pense criticamente e saiba argu-
mentar de forma eficiente, contribuindo na sua formação
de cidadania. (Grifo nosso)

Os trechos acima fazem parte do AP6, que teve como obje-


tivo investigar como o professor desenvolve o ponto de vista dos
alunos do Ensino Fundamental no trabalho com o gênero artigo de
opinião e por isso apresentam argumentos para confirmar a im-
portância dessa temática. A apresentação desse movimento nos
dois fragmentos apresentam configurações diferentes, a saber: na
primeira produção, as autoras apresentam seus próprios argumen-
tos (“pois através dele expomos e organizamos nossas ideias, usa-
mos da persuasão e do convencimento para conquistar o leitor e
convencê-lo a concordar com nosso ponto de vista”; na última
produção, utilizam-se da voz de um autor (Uber) e das prescrições
dos documentos oficiais (Parâmetros Curriculares Nacionais). Essa
modificação parece indicar uma percepção das estudantes de que
a persuasão baseada no argumento de autoridade tem mais peso
do que aquela baseada apenas na ideia das autoras. Outro aspecto
que é possível destacar no excerto do AP6F é que o movimento
retórico de fazer generalização(ções) sobre o assunto pode ser utilizado
em função do movimento de asseverar a importância do assunto. Ou
seja, as generalizações sobre a “construção de um ponto de vista”
realizam-se em função de asseverar a importância do assunto.
Ao contrário do movimento retórico de asseverar a importân-
cia do assunto, o movimento retórico de fazer generalização(ões) sobre
o assunto apresentou-se como uma informação muito frequente8
nas seções de introduções produzidas pelos estudantes nos dois
momentos da produção textual, materializando-se com uma maior
ou menor extensão. As generalizações feitas pelos autores em seus

8Consideramos como frequente a informação que apareceu em mais da


metade dos textos analisados.

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textos ora baseavam-se em observações da realidade social (a sala


de aula de Língua Portuguesa), ora baseavam-se em conhecimen-
tos advindos da ciência. Os fragmentos a seguir ilustram realiza-
ções desse movimento retórico.

AP09I A influência da fala na escrita já é um processo empiricamen-


te comprovado por grande parte dos professores de língua
portuguesa da educação básica, principalmente no período
em que as crianças estão se apropriando da língua escrita.
Marcas de oralidade como o apagamento dos róticos em
posição de coda (em verbos no infinitivo, principalmente), os
rotacismos e as síncopes (a queda do “d” no gerúndio dos
verbos) são frequentes nos textos produzidos pelos alunos.
AP09F A influência da fala na escrita já é um processo empiricamen-
te comprovado por grande parte dos professores de língua
portuguesa da educação básica, principalmente no período
em que as crianças estão se apropriando da língua escrita.
Marcas de oralidade como o apagamento dos róticos em
posição de coda (em verbos no infinitivo, principalmente), os
rotacismos e as síncopes (a queda do “d” no gerúndio dos
verbos) são frequentes nos textos produzidos pelos alunos
(MOLLICA, 2000).

No AP9, os autores têm como objetivo investigar a influên-


cia da fala na escrita de alunos do Ensino Fundamental e iniciam
sua seção de introdução fazendo generalizações sobre o assunto. O
fragmento da primeira produção é praticamente idêntico ao texto
da última produção diferenciando-os apenas pelo acréscimo de
citação e pelo estabelecimento de dois tipos de generalizações -
uma baseada na realidade da experiência e outra baseada na reali-
dade da experiência e da ciência. Mais uma vez se observa a tenta-
tiva dos estudantes de tornarem seus textos reconhecidos e aceitos
incluindo a voz de outros pesquisadores.
Já o movimento retórico de revisar itens de pesquisa prévia
também foi considerado frequente nos textos dos estudantes, con-
tudo convém destacar que nem sempre nas produções iniciais essa
informação se fazia presente. Esse fenômeno pode se explicar pelo
fato de que as seções de introduções produzidas em diferentes

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momentos foram revelando textualmente o processo de apropria-


ção dos estudantes da escrita acadêmica e principalmente dos pro-
cedimentos de pesquisa. Ou seja, em uma etapa no processo de
ensino e aprendizagem do artigo de pesquisa os estudantes reali-
zaram a tarefa de encontrar pelo menos duas outras pesquisas que
já foram realizadas sobre o tema que cada grupo estava investi-
gando. Assim, à medida que os alunos entraram em contato com
esses trabalhos, foram inserindo informações dessas pesquisas em
suas introduções, porém isso não aconteceu em todos os textos,
pois identificamos introduções que não apresentaram o movimen-
to retórico de revisar itens de pesquisas prévias em nenhuma das eta-
pas de produção textual. O excerto abaixo ilustra a realização des-
se movimento retórico apenas na produção final no AP5F.

AP5F Assim sendo, Camillo (2007) analisou as concepções de lin-


guagem e as dificuldades que os professores de Língua Por-
tuguesa têm em trabalhar com a gramática, através de um
ensino integrado com a leitura e a produção. Conforme sus-
tenta Mendonça “não é possível ser neutro no ensino de lín-
gua e que uma concepção de linguagem deve ser adotada nas
relações de ensino”. (2000, p.239).

No AP5, as autoras tinham como objetivo investigar a prá-


tica pedagógica do professor no ensino de gramática, estabelecen-
do relações com as concepções de linguagem e de gramática, por
isso apresentaram informações oriundas de outros trabalhos (de
Camillo e de Mendonça) que estavam dentro do mesmo escopo de
investigação. Embora a presença do movimento retórico de revisar
itens de pesquisa prévia pudesse se configurar um importante ele-
mento de ligação entre o propósito comunicativo de estabelecer o
território e ocupar o nicho, as seções de introdução produzidas pelos
estudantes de Letras/Português não materializaram esse aspecto.
Na subseção a seguir, exploraremos como se configurou o propósi-
to comunicativo de ocupar o nicho.

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3.2 Ocupando o nicho

O propósito comunicativo de ocupar o nicho realizou todos


os movimentos retóricos previstos por Swales (1990), bem como
apresentou especificidades na medida em que materializou outras
informações não previstas no modelo do autor. O movimento retó-
rico de esboçar os objetivos da pesquisa apresentou-se como uma in-
formação frequente nas seções de introdução, tanto na produção
inicial quanto na produção final como está ilustrado nos fragmen-
tos do AP8.

AP8I Nessa perspectiva, a presente pesquisa tem como objetivo


investigar parte do interesse coletivo em refletir e pesquisar
sobre a prática de reescritura no ensino de língua portuguesa.
AP8F Nessa perspectiva, a presente pesquisa tem como objetivos
investigar a prática de reescrita no ensino de língua portugue-
sa, analisando como o professor pratica a atividade de reescri-
ta de textos com os alunos, sua concepção de escrita (se a en-
tende como produto ou processo) e quais aspectos prioriza na
reescrita.

Como é possível observar nos trechos destacados, houve


uma melhoria significativa na exposição do objetivo na produção
final haja vista que identificamos com maiores detalhes que aspec-
tos da reescrita serão analisados – a prática do professor, sua con-
cepção de escrita e os critérios priorizados por este. Esse aspecto
foi observado em muitas seções de introdução do nosso corpus.
Em relação ao movimento retórico de anunciar a presente pesquisa
que se configurou no modelo CARS como alternativo em relação a
esboçar os objetivos, identificamos em nosso corpus apenas uma se-
ção de introdução que apresentou concomitantemente os dois mo-
vimentos retóricos tanto na produção inicial quanto na final. O
excerto abaixo ilustra a materialização dessas informações no AP6
na produção final.

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AP6F Exploraremos nesse trabalho, o artigo de opinião visto


que, trabalhar com esse gênero, não só proporciona conhe-
cimento ao aluno em diversas temáticas e concepções de
mundo como o faz tornar-se crítico diante do mundo a sua
volta, acrescentando e obtendo novos conhecimentos.9
(Grifo nosso)

Nesse excerto, as autoras tentam anunciar a pesquisa identi-


ficando o gênero (artigo de opinião) já que o artigo tem como obje-
tivo investigar como o professor desenvolve o ponto de vista dos
alunos no trabalho com o gênero artigo de opinião. Mesmo não
conseguindo esboçar para o leitor o que será realizado na pesquisa
a partir desse movimento retórico, identificamos nesse trecho uma
tentativa de realizá-lo. Talvez seja por essa razão que as autoras
acrescentaram na introdução a informação sobre o objetivo da
pesquisa. Em relação ao movimento retórico anunciar os principais
resultados, este não se configurou como uma informação frequente
nos textos dos alunos visto que essa informação realizou-se em
apenas uma seção de introdução de nosso corpus. Os excertos a
seguir ilustram como esse movimento se materializou na produção
inicial e na produção final na seção de introdução do AP5.

AP5I Ao analisar os dados obtidos vimos que a prática pedagógica


do professor quanto ao ensino de gramática tem uma aplica-
ção regular de números de aula em relação aos conteúdos
programáticos e muitos dos professores ensinam a gramática
de forma tradicional e outros possuem uma prática voltada ao
contexto de gêneros textuais, observamos também que a gra-
mática é importante para o ensino de língua.
AP5F Ao analisar os dados obtidos observamos o quanto à prática
pedagógica do professor, em relação ao ensino de Língua
Portuguesa, enfatizam o ensino de gramática. Vimos que 60%
dos professores dedicam as suas aula/horas por semana ao
ensino voltado à gramática e a maioria preferem a normativa,
ou por falta de conhecimento de outras ou por não consegui-
rem ensiná-la tendo o texto como ponto de partida e chegada.

9Considerar como exemplo desse movimento retórico apenas o trecho


em negrito.

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Dentre os professores pesquisados, são poucos os que possu-


em uma metodologia voltada para a contextualização com
textos e menos ainda os que conseguem trabalhar a gramática
como apoio ao texto.

O que é interessante destacar nesses excertos é que a apre-


sentação dos resultados na produção inicial representou a hipótese
elaborada pelas autoras, enquanto que na produção final essa in-
formação é mais detalhada haja vista estar embasada nos resulta-
dos encontrados na investigação. E por fim, o movimento retórico
de indicar a estrutura do artigo se constitui uma informação frequen-
te nas produções finais dos alunos, já nas produções iniciais nem
sempre esse movimento se mostrou presente. Os fragmentos a
seguir ilustram a realização desse movimento no AP1 na produção
inicial e final.

AP01I O presente artigo se estrutura, além da introdução e conclu-


são, na divisão em quatro seções, na qual, a primeira seção
traz algumas concepções de teóricos sobre gêneros textuais
discursivos; na segunda seção traz a metodologia empregada;
na terceira seção traz a análise das tirinhas na coleção dos
livros estudada; e na quarta seção mostra os resultados obti-
dos na análise e algumas possíveis aplicações em sala de aula.
AP01F O presente artigo se estrutura, além da introdução e conclu-
são, em cinco partes. Na primeira seção, apresentaremos a
concepção de gêneros textuais a partir da visão de Marcuschi
(2007), relacionando-as às propostas dos PCN’s; na segunda
seção, apresentaremos uma breve descrição da história e ca-
racterização das tirinhas; na terceira seção, apresentaremos o
processo metodológico adotado; na quarta seção, analisare-
mos os dados obtidos a partir da investigação dos livros didá-
ticos escolhidos; na quinta seção, apresentaremos os resulta-
dos obtidos a partir da análise dos dados.

A partir da análise dos dois fragmentos acima, observamos


uma diferença no conteúdo da estrutura do artigo na produção
inicial e na produção final, bem como a inclusão de um autor
(Marcuschi) e dos Parâmetros Curriculares Nacionais como fun-
damentos teóricos do artigo na produção final. Em relação ao pri-

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meiro aspecto, a primeira introdução informa apenas para o leitor


que apresentará “concepções de teóricos sobre gêneros textuais
discursivos” sem defini-los, já na última produção esses teóricos
são definidos. Essa alteração no conteúdo do movimento retórico
revela o processo dinâmico que envolve a produção de uma pes-
quisa científica e a inclusão de autores no decorrer do trabalho.
Novamente, constatamos a necessidade dos alunos de inserir em
seus textos outras vozes além das suas. Observamos ainda em am-
bas as produções, inicial e final, a ausência de uma diferenciação
entre o conteúdo presente na quarta e na quinta seção, embora na
produção final já esteja mais claro para as autoras que elas não irão
abordar “possíveis aplicações em sala de aula” das tirinhas, aspec-
to que realmente as estudantes não realizaram no artigo final.
Afora as informações presentes no modelo CARS, as seções
de introduções produzidas pelos estudantes do curso de Le-
tras/Português apresentaram outros movimentos retóricos tanto
nas produções iniciais quanto nas produções finais, como por
exemplo: apresentar a metodologia, as hipóteses, as questões de
pesquisa, o corpus utilizado, o instrumento de coleta de dados,
dentre outros aspectos que categorizamos como descrever a metodo-
logia. Outros movimentos retóricos presentes são indicar novas pes-
quisas e apresentar contribuições da pesquisa. Consideramos que essas
diferentes estratégias de ocupar o nicho que apareceram nas seções
de introdução dos artigos dos estudantes se explicam pela influên-
cia da leitura de introduções de artigos de pesquisa que foram
trazidas para a sala de aula pela professora. Como foi exposto no
quadro 01, os estudantes analisaram diferentes introduções com o
objetivo de identificar os propósitos comunicativos e movimentos
retóricos e nesses textos utilizados em sala de aula continham esse
tipo de conteúdo informativo. Desses movimentos retóricos identi-
ficados, apenas apresentar a metodologia configurou-se como fre-
quente. Na verdade, os movimentos retóricos de indicar novas pes-
quisas e apresentar contribuições da pesquisa materializaram-se ape-
nas em um exemplar de introdução do nosso corpus tanto no mo-

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mento da produção inicial quanto no momento da produção final


como está ilustrado no excerto do AP0210.

AP02I Esperamos com esse artigo abranger e enriquecer as discus-


eF sões acadêmicas sobre o referido tema que causa tanta inquie-
tação e tira o “sono” nos novos e antigos professores de lín-
gua materna principalmente no que se refere a como adequar
a teoria à prática no cotidiano. (Apresentar contribuições da
pesquisa)11
Sabemos que esse assunto é muito amplo e por esse motivo
acreditamos que novos estudos podem ser desenvolvidos
para responder a outros questionamentos, bem como para
preencher possíveis lacunas deixadas por este. (Indicar novas
pesquisas)

Assim como foi a realização dos movimentos retóricos su-


geridos por Swales (1990) nas seções de introdução dos estudantes,
o conteúdo informativo da produção final no movimento retórico
de descrever a metodologia apresentou mais detalhes sobre o univer-
so da pesquisa, os sujeitos pesquisados, dentre outros aspectos,
bem como revelou um maior nível de maturidade do fazer científi-
co. Um exemplo interessante é a materialização desse movimento
no AP10.

AP10I Sabendo disto, levanta-se o seguinte questionamento: Se são


brasileiros e possuem conhecimento da língua portuguesa, por que
estes indivíduos são reprovados no exame de suficiência em língua
portuguesa?
AP10F Sabendo disto, levanta-se o seguinte questionamento: Se são
brasileiros e possuem conhecimento da língua portuguesa, que
competências linguísticas estes indivíduos ainda não dominam? E
que relação esses resultados estabelecem com o ensino de língua
portuguesa na educação básica?

10 Não houve modificação da informação textual em relação aos movi-


mentos retóricos de indicar novas pesquisas e apresentar contribuições da
pesquisa na produção inicial e final.
11 A identificação do movimento retórico apresentar contribuições da

pesquisa foi realizada realizado pela pesquisadora.

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Nesse artigo, o autor tinha como objetivo “analisar as com-


petências linguísticas dos estudantes do curso de Administração
da Universidade Federal da Paraíba, mediante a identificação des-
tas competências e análise do desempenho destes alunos na Prova
de Suficiência em Língua Portuguesa de 2012”. Como é possível
observar, na primeira produção, a questão é apresentada de forma
muito ampla e pouco objetiva, já na última produção fica claro
para o leitor que aspectos serão investigados para compreender-
mos o porquê das reprovações dos estudantes investigados no
Exame de Suficiência da UFPB.

3.3 Analisando uma seção de introdução

Nesta subseção, faremos uma breve análise de um exem-


plar de introdução, comparando os propósitos comunicativos e os
movimentos retóricos na produção inicial e na final a fim de que o
leitor possa ter uma visão global do desenvolvimento da escrita de
introduções por alunos de graduação. Selecionamos o AP3 para
ilustrar as diferentes mudanças ocorridas na condução de infor-
mações na versão inicial e na final (Texto 01 e 02 a seguir). Para
facilitar a identificação dos propósitos comunicativos nos textos,
marcamos o propósito de ocupar o nicho com negrito e o de estabele-
cer um território sem negrito.

Texto 01
Nos últimos anos, vários estudos vêm discutindo a importân-
cia de se trabalhar com gêneros orais no ensino de língua mater-
na, contudo, na prática, no livro didático e na sala de aula, as teo-
rias levantadas sobre esse assunto não são contempladas de for-
ma satisfatória. A ênfase do ensino de gêneros orais ainda tem
recaído sobre os gêneros escritos, porém a modalidade oral é tão
relevante quanto a modalidade escrita no processo de ensi-
no/aprendizagem para a formação dos discentes como sujeitos
críticos e, portanto, de fundamental importância nas abordagens
do Livro Didático (LD), tendo em vista que, muitas vezes, é o
único instrumento utilizado pelo professor em sala de aula.

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Mesmo com as significativas contribuições das pesquisas so-


bre os gêneros orais, a oralidade ainda é confundida nos LD’s e,
inclusive, por muitos professores de Língua Portuguesa, com a
fala (uso espontâneo da língua) e com a oralização da escrita (lei-
tura de textos em voz alta). Diante disso, este trabalho objetiva
analisar como os gêneros orais são abordados na coleção Tudo é
linguagem, destinada ao Ensino Fundamental II.
As questões que tentaremos responder neste trabalho são: a)
quais são os gêneros orais que aparecem nos livros didáticos da
coleção Tudo é linguagem e como eles são explorados? b) existe
coerência entre o que dizem os documentos oficiais, com rela-
ção aos gêneros orais, na coleção selecionada?
Neste estudo adotamos a concepção de linguagem como
processo de interação e nos baseamos nos postulados de Mar-
cuschi (2002) e dos genebrinos Dolz, Schneuwly e Haller (2004)
sobre gêneros orais. A metodologia da pesquisa será realizada
a partir da análise qualitativa dos LD’s da coleção em questão.
Para atingirmos tal objetivo, além desta introdução, dividi-
mos este trabalho em mais três seções. Na primeira seção, abor-
daremos os conceitos sobre gêneros orais propostos nos docu-
mentos oficiais e na visão da escola de Genebra. Na segunda
seção, faremos a exposição da análise da coleção em questão. E,
por fim, apresentaremos nossas considerações finais sobre nos-
sa pesquisa. (AP03A)

Texto 02
Nos últimos anos, vários estudos têm apontado a importância de se
trabalhar com gêneros orais no ensino de língua materna, contudo,
essa atenção dispensada à modalidade oral não é tão relevante quanto
à voltada para a escrita (MARCUSCHI, 2001b; FORTE-FERREIRA,
2012). De acordo com estas pesquisas, na sala de aula, no livro didáti-
co e no manual do professor, o ensino de língua oral não tem ocupado
o devido lugar, pois a ênfase recai, ainda hoje, sobre o ensino da escri-
ta, que é vista como o principal instrumento para o desenvolvimento
da competência linguística, esquecendo-se que o ensino-
aprendizagem da modalidade oral é tão fundamental quanto o da
modalidade escrita no processo de inserção do sujeito na sociedade
letrada. Conforme Marchuschi (2001b, p. 28):

[...] podemos adotar como indicador central a noção de que o indiví-


duo enquanto pessoa se constitui na relação dialógica. Essa relação dia-

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lógica tem na língua falada, particularmente nos modos de interação


face a face, sua matriz formadora. Daí a relevância de um maior co-
nhecimento da língua falada. A análise da interação verbal oral pode
ser tida, portanto, como uma contribuição para a compreensão do que
se entende quando se afirma que o homem é um ser social.

Diante disso, assim como Castilho (2000, p. 87) e Forte-Ferreira


(2012, p. 5), nos indagamos: “por que os manuais, as práticas escola-
res e as propostas para o ensino da língua deixam a oralidade em
segundo plano?”
A partir dessa problemática, este trabalho objetiva investigar qual é
o espaço concedido ao ensino de língua oral nos livros didáticos. Pa-
ra isso, analisaremos como se dá a abordagem dos gêneros orais na
coleção Tudo é Linguagem, da Editora Ática, destinada ao Ensino
Fundamental II.
As questões que tentaremos responder neste trabalho são: a) quais
são os gêneros orais que aparecem nos livros didáticos da coleção
Tudo é linguagem e como eles são explorados? b) existe coerência en-
tre o que dizem os documentos oficiais e a abordagem dos gêneros
orais realizada na coleção selecionada?
Neste estudo adotamos a concepção de linguagem como processo de
interação e nos baseamos nos postulados de Marcuschi (2001) e dos
genebrinos Dolz, Schneuwly e Haller (2004) sobre gêneros orais. A
metodologia da pesquisa será realizada a partir da análise qualitati-
va dos quatro livros didáticos (doravante LD) da coleção Tudo é Lin-
guagem. Primeiramente, avaliaremos o Manual do Professor (MP),
observando qual o embasamento teórico e quais as orientações fei-
tas aos professores para o trabalho com os gêneros orais. Em segui-
da, faremos uma análise específica das propostas das atividades
contidas em cada LD da coleção, visando perceber se existe ou não
adequação entre o que indica o MP e o que é proposto no contexto
do LD. Com base nisto, apresentaremos exemplos das atividades
mais representativas presentes nos LD.
Para atingirmos tal objetivo, além desta introdução, dividimos este
trabalho em mais três seções. Na primeira seção, apresentaremos a
definição de gêneros orais, trataremos dos Gêneros orais e o ensino
e abordaremos os conceitos sobre gêneros orais propostos nos do-
cumentos oficiais e na visão da escola de Genebra. Na segunda se-
ção, faremos a exposição da análise da coleção em questão. E, por
fim, apresentaremos nossas considerações finais sobre esta pesqui-
sa. (AP3B)

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A primeira diferença que se destaca entre as duas introdu-


ções é a extensão do texto, haja vista que na primeira versão foi
utilizado um total de 325 palavras e na última um total de 527 pa-
lavras. Esse dado já nos dá um indício de que os estudantes apre-
sentaram muito mais conteúdo informativo na produção final.
Constatamos que, nas produções finais, os estudantes ampliaram,
acrescentaram e transformaram movimentos retóricos, demons-
trando que houve mudanças significativas na construção dos pro-
pósitos comunicativos. Esses aspectos também foram identificados
no AP03 selecionado para análise. Nesse artigo, em relação ao
propósito de estabelecer um território, curiosamente observamos, na
comparação entre os dois textos, uma redução na quantidade dos
movimentos retóricos (de dois na produção inicial para um na
produção final), e um aumento e melhoria na qualidade do conte-
údo informativo apresentado no movimento retórico de revisar
itens de pesquisa prévia. Sobre a redução dos movimentos retóricos,
o que à primeira vista poderia parecer um retrocesso na escrita dos
estudantes, apresentou-se como um avanço, isso porque os alunos
apresentaram as vozes de outros autores nesse movimento (Mar-
cuschi, Forte-Ferreira), demostrando à sua audiência uma imagem
de pesquisadores que têm conhecimento do território em que estão
investigando. Desse modo, na primeira versão, a indicação dos
estudos prévios apresentou-se de forma bastante difusa (“vários
estudos”), enquanto, na última versão, os nomes de diferentes
pesquisadores foram apresentados. Os excertos abaixo ilustram
essa afirmação.

AP03I Nos últimos anos, vários estudos vêm discutindo a impor-


tância de se trabalhar com gêneros orais no ensino de língua
materna, contudo, na prática, no livro didático e na sala de
aula, as teorias levantadas sobre esse assunto não são con-
templadas de forma satisfatória. (Grifo nosso)
AP03F Nos últimos anos, vários estudos têm apontado a importância
de se trabalhar com gêneros orais no ensino de língua mater-
na, contudo, essa atenção dispensada à modalidade oral não é
tão relevante quanto à voltada para a escrita (MARCUSCHI,
2001b; FORTE-FERREIRA, 2012). (Grifo nosso)

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No que concerne ao fato de na primeira versão os alunos


terem apresentado o movimento retórico fazer generalização(ões)
sobre o assunto e na última versão terem retirado esse movimento
não significou uma perda no conteúdo informativo, pois eles
transformaram esse conteúdo informativo em revisar itens de pes-
quisa prévia. A nosso ver, o uso de citações representou uma tenta-
tiva de persuasão dos estudantes, pois estes optaram por retirar
uma informação generalizada de suas autorias para colocar essas
informações fundamentadas em estudiosos da área. Segundo Swa-
les e Feak (1994, p. 174), “[...] assim como as plantas que competem
por luz e espaço, os escritores de artigos de pesquisa competem
por aceitação e reconhecimento.”. Assim, ao fazer referência a ou-
tros pesquisadores, os alunos tornam seus textos autorizados pe-
rante a comunidade acadêmica.
Já no propósito comunicativo de ocupar um nicho, no AP03,
observamos, na última versão, uma maior diversidade de movi-
mentos retóricos, bem como um detalhamento na apresentação
dos movimentos retóricos. Sobre o primeiro aspecto, identificamos
na produção inicial os seguintes movimentos retóricos: esboçar os
objetivos, apresentar questões da pesquisa, apresentar a fundamentação
teórica, apresentar a metodologia e indicar a estrutura do artigo; na pro-
dução final acrescentamos a esses uma tentativa de desenvolver uma
problemática em torno do objeto de pesquisa selecionado pelos alu-
nos. O excerto abaixo ilustra essa estratégia retórica.

AP03F Diante disso, assim como Castilho (2000, p. 87) e Forte-


Ferreira (2012, p. 5), nos indagamos: “por que os manuais, as
práticas escolares e as propostas para o ensino de língua dei-
xam a oralidade em segundo plano?”

Sobre o segundo aspecto, ilustramos a exposição minuciosa


do movimento retórico de apresentar a metodologia na última ver-
são, indicando que os estudantes na produção inicial ainda não
tinham definido com clareza como atingir o objetivo pretendido na
pesquisa, ao passo que na produção final os autores apenas des-
crevem os procedimentos que foram utilizados no decorrer da
pesquisa. Ou seja, na primeira versão, a informação de que a pes-
quisa seria realizada através de uma abordagem qualitativa foi
ampliada de modo que, na segunda versão, foram descritos os

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passos percorridos pelos autores na realização de seu trabalho. Os


fragmentos a seguir exemplificam essa afirmação.

AP03I A metodologia da pesquisa será realizada a partir da análise


qualitativa dos LD’s da coleção em questão. (Grifo nosso)
AP03F A metodologia da pesquisa será realizada a partir da análise
qualitativa dos quatro livros didáticos (doravante LD) da
coleção Tudo é Linguagem. Primeiramente, avaliaremos o Ma-
nual do Professor (MP), observando qual o embasamento
teórico e quais as orientações feitas aos professores para o
trabalho com os gêneros orais. Em seguida, faremos uma
análise específica das propostas das atividades contidas em
cada LD da coleção, visando perceber se existe ou não ade-
quação entre o que indica o MP e o que é proposto no contex-
to do LD. Com base nisto, apresentaremos exemplos das ati-
vidades mais representativas presentes nos LD.

Em suma, podemos afirmar que o ensino explícito do arti-


go científico revelou-se uma proposta pedagógica produtiva, pois
todos os grupos apresentaram em seus textos finais não apenas
uma apropriação dos propósitos comunicativos e movimentos
retóricos, mas também uma apropriação do discurso científico,
principalmente na tentativa de construir um discurso autorizado
ancorado nos dizeres de outros autores.

Considerações finais

O presente trabalho teve como objetivo investigar como se


configura a seção de introdução de artigos de pesquisa produzidas
por alunos do curso de Letras/Português da Universidade Federal
da Paraíba (UFPB) durante a disciplina de Pesquisa Aplicada ao
Ensino de Língua Portuguesa (PAELP) nos semestres de 2012.2 e
2013.1, em dois momentos distintos – no início e no final da disci-
plina. Os resultados realizados na análise de vinte textos identifi-
cou similaridades em relação aos propósitos comunicativos e aos
movimentos retóricos apresentados por Swales (1990). No entanto,
as produções dos alunos apresentaram algumas peculiaridades: a
ausência do propósito comunicativo de estabelecer um nicho que

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não se materializou em nenhum exemplar do corpus e a presença


de movimentos retóricos específicos no propósito comunicativo de
ocupar o nicho, como foi o de descrever a metodologia. O quadro 2
ilustra a configuração retórica das seções de introdução dos alunos
do curso de Letras/Português, constituindo-se um modelo menos
complexo em comparação ao apresentado por Swales (1990) e
apresentando-se como uma variação da seção de introdução de
artigos de pesquisa.

Quadro 02: Configuração retórica das seções de introduções de graduan-


dos.
PROPÓSITO ESTABELECER UM TERRITÓRIO
COMUNICATIVO
Movimentos retóricos Fazer generalizações sobre o assunto
Revisar itens de pesquisa prévia
PROPÓSITO OCUPAR O NICHO
COMUNICATIVO
Movimentos retóricos Esboçar os objetivos
Indicar a estrutura do artigo
Descrever a metodologia

A análise dos dados também nos permitiu constatar melho-


rias nas seções de introdução dos alunos, seja porque observamos
a apropriação pelos alunos dos procedimentos de pesquisa, dos
propósitos comunicativos e movimentos retóricos caracterizadores
dessa seção e do discurso científico. A maior parte dos textos
apresentou diferenças significativas entre a produção inicial e a
final. Especificamente em um trabalho, o AP4, observamos que, na
versão inicial, não se configurou como uma introdução de artigo
de pesquisa, assemelhando-se muito mais à fundamentação teóri-
ca, enquanto, na versão final, os estudantes conseguiram construir
uma introdução. Daí, destacamos a importância do conhecimento
sociocognitivo dos propósitos comunicativos e de seus respectivos
movimentos retóricos pelos estudantes na produção das introdu-
ções de artigo de pesquisa.
A realização deste trabalho deixa clara a necessidade de
promover um ensino explícito dos gêneros acadêmicos no currícu-
lo dos cursos de graduação, de modo que a escrita desses gêneros
não se constitua como um “mistério” a ser decifrado pelos estu-
dantes no decorrer do curso. Nessa perspectiva, como membros da

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comunidade discursiva acadêmica os alunos precisam produzir


com eficiência alguns gêneros que circulam nesse meio a fim de
entenderem o funcionamento dessa comunidade e de realizarem
diferentes ações retóricas. Assim, defendemos a ideia de que o
ensino explícito dos gêneros acadêmicos deveria se constituir uma
atividade curricular fundamental em cursos de graduação. Deixa-
mos clara também a importância do professor no processo de em-
poderamento discursivo dos estudantes, já que os graduandos são
considerados membros iniciantes dessa comunidade. Acreditamos
que a experiência que realizamos com a escrita acadêmica na dis-
ciplina de PAELP na UFPB possa estimular outras ações de ensino
que busquem desenvolver o(s) letramento(s) acadêmico(s) dos
graduandos. Considerando ainda que o foco deste trabalho anco-
rou-se na análise dos propósitos comunicativos e movimentos re-
tóricos em introduções de artigo de pesquisa, fica aberta a possibi-
lidade de outros pesquisadores investigarem outros aspectos nes-
ses textos como a microestrutura textual, as sequências textuais,
dentre outros.

Referências

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SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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REPRESENTAÇÃO DA ESCRITA DE
DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA: O RESUMO
EM PERIÓDICOS DAS CIÊNCIAS SOCIAIS
QUALIFICADOS PELA CAPES

Alessandra Souza Silva


Linduarte Pereira Rodrigues

Introdução

Nos últimos anos, no Brasil, constatou-se um aumento con-


siderável no número de estudantes que se dedicam à pesquisa
científica, sobretudo no ambiente universitário, onde é grande o
número de possibilidades para que o aluno se engaje em projetos
dessa natureza.
O apoio e investimento do Ministério da Educação em pro-
jetos com base científica, através da Coordenação de Aperfeiçoa-
mento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Naci-
onal de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é um
dos fatores que levam o jovem universitário a se interessar pela
pesquisa. Entretanto, segundo Hartmann e Santarosa (2011), ainda
é baixo o percentual de estudantes que ingressam na universidade
com conhecimento e desempenho linguístico suficientes para atua-
rem em pesquisas, de maneira que saibam produzir gêneros escri-
tos comuns a esse meio, já que durante o ensino básico, em sua
maioria, as atividades de escrita são tratadas como práticas avalia-
tivas para obtenção de notas. Caberia, então, atentar para o desen-
volvimento de estratégias que auxiliem essa prática.
Pensando na deficiência mencionada pelos autores, no que
se refere à prática escrita de estudantes brasileiros, e que logo in-
gressam em cursos de graduação e pós-graduação lato sensu e stric-

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to sensu, operando (de forma muitas vezes não especializada) com


a escrita acadêmica, buscaremos despertar o leitor e produtor de
textos científicos para as estratégias utilizadas para a produção
acadêmica, com ênfase na escrita de resumos para artigos de di-
vulgação científica. Para tanto, abordaremos o gênero resumo aca-
dêmico, explicitando sua organização retórica, visando apresentar
seus objetivos comunicativos e diferenciando-o das demais tipolo-
gias de resumo, como é o caso da resenha crítica, gênero que tam-
bém circula na comunidade científica e chega a ser confundido
com o resumo acadêmico.
Para Biasi-Rodrigues (2009, p. 49), “a população acadêmica
escreve resumos para participar de um diálogo científico nacional
e internacional, já que esse gênero é veiculado em diferentes mí-
dias e pode compor bancos de dados no país e no exterior”. Dessa
forma, além de constituir-se como o primeiro contato entre pesqui-
sador/autor e entidades divulgadoras da pesquisa científica (pe-
riódicos e leitores de todo o mundo), o resumo acadêmico possui a
incumbência de representar o trabalho e persuadir o leitor a reali-
zar a leitura do texto na íntegra. Assim, a atividade de produção
escrita de um resumo acadêmico, que parece ser simples, segue o
cumprimento dos objetivos de comunicação que o gênero pretende
alcançar e ainda deve obedecer a uma séria de regras de formata-
ção impostas pelos periódicos científicos.
Diante do exposto, trataremos a questão da produção cien-
tífica a partir de resumos acadêmicos publicados em periódicos
qualificados pela CAPES. O corpus analisado é composto por 6
resumos publicados em revistas científicas voltadas para a área de
Ciências Sociais e com níveis distintos de estratificação Qualis. Uti-
lizamos a internet como campo para a coleta dos dados que com-
põem o corpus desta pesquisa. Todos os dados acerca dos periódi-
cos e do corpus foram pesquisados no mês de março de 2013.
Seguimos por uma pesquisa documental e bibliográfica de
abordagem qualitativa, não pretendendo esgotar as interrogações
presentes quanto ao desenvolvimento da produção escrita do gê-
nero resumo acadêmico e nem elaborar uma forma fixa como mo-
delo para sua produção. Buscamos provocar reflexões sobre as
estratégias de produção, bem como sobre seus suportes teóricos,

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os quais alicerçam os conceitos básicos de linguagem e escrita que


serão apresentados.
A concepção de escrita defendida é a Sociointeracionista,
que se baseia na premissa de que as ações de linguagem e a escrita
são realizadas através de sujeitos que interagem a fim de satisfazer
seus objetivos comunicativos. Desse modo, o embasamento teórico
que possibilitou o desenvolvimento deste trabalho se dá pelos es-
tudos linguísticos do texto e do discurso, com ênfase nas aborda-
gens semântica, pragmática e lexical.
Com foco na escrita (em seus aspectos superficiais [textua-
lidade], profundos [semânticos] e contextuais [pragmáticos]), di-
zemos que nos resumos examinados há o investimento num diálo-
go entre autor e leitor, em que ambos buscam a compreensão mú-
tua acerca do conteúdo escrito (RODRIGUES, 2009) mediante ade-
quação do texto ao gênero (resumo) e este ao suporte (periódico),
relação muitas vezes não linear como destacamos na análise do
corpus.

1. A escrita como atividade de interação

Ao longo dos anos, os estudos voltados à escrita vêm nos


apresentando aspectos que têm mudado consideravelmente a for-
ma de condução da prática escrita na escola e na academia. A ati-
vidade de produção textual que antes era realizada apenas com
fins avaliativos e tratada como um produto acabado, hoje é consi-
derada um processo em constante construção, no qual os sujeitos
autor/leitor têm a oportunidade de interagir socialmente e cons-
truir possibilidades diversas de interpretação acerca do texto.
No entanto, seria inviável falar da escrita numa perspectiva
interacionista sem julgarmos o importante papel que a leitura ocu-
pa na relação texto/leitor (RODRIGUES, 2009), já que ela é a res-
ponsável pela dinâmica dessa relação e é através dela que o leitor
cumpre a tarefa de se reportar aos seus conhecimentos prévios, em
prol de garantir um melhor diálogo com o texto. Diante disso, cabe
destacar Koch (2004, p. 27) para quem,

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Todo e qualquer processo de compreensão pressupõe ativi-


dades do ouvinte/leitor, de modo que se caracteriza como
um processo ativo e contínuo de construção – e não apenas
de reconstrução –, no qual as unidades de sentido ativadas,
a partir do texto, se conectam a elementos suplementares de
conhecimento extraídos de um modelo global também ati-
vado em sua memória.

Vê-se, assim, que a partir da perspectiva sociointeracionis-


ta, o texto é tratado como uma ponte para construção dos sentidos,
de forma que, a partir da ativação de seus conhecimentos prévios,
cada pessoa constrói um diálogo diferente com o texto, o que pres-
supõe que um mesmo texto, na ótica de diferentes leitores, seja
interpretado de maneiras distintas.
Para obtermos uma melhor compreensão acerca da teoria
interacionista, faz-se necessário explanar o conceito de língua pro-
posto por Marcuschi (2008a). Para ele, a língua é uma atividade
social, histórica e cognitiva, desenvolvida de acordo com as práti-
cas socioculturais e, como tal, obedece a convenções de uso funda-
das em normas socialmente construídas. Nesta perspectiva, a lín-
gua é a responsável pelas interações sociais, as quais acontecem
para satisfazer a determinados propósitos comunicativos dos sujei-
tos envolvidos. Já a escrita, representa as ações verbais de maneira
organizada e comedida, configurando-se como prática de intera-
ção que possibilita a dialogicidade entre sujeitos que buscam satis-
fazer a seus propósitos comunicativos.
Segundo Koch (2004), a coesão textual pode acontecer atra-
vés de dois processos distintos: a sequenciação e a referenciação. A
sequenciação está intrinsicamente ligada aos processos de conexão
textual através de elos coesivos, como conjunções e pronomes. Já a
referenciação se dá através de aspectos semânticos, é o que aponta
Marcuschi (2008a). Estudos recentes também destacam o processo
de referenciação como uma fusão dos processos de textualização,
já que este está relacionado ao sentido total do texto.
Enquanto a coesão está vinculada à continuidade textual, a
coerência está para o sentido do texto, no que tange à ativação dos
conhecimentos. Koch (2004, p. 46) assevera que “a coesão não é

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condição necessária nem suficiente da coerência, já que esta não se


encontra no texto, mas constrói-se a partir dele, numa situação
interativa”. Por manterem uma relação de interdependência para o
processo de textualização, muitos confundem coesão e coerência,
entretanto, cabe ressaltar que eles dizem respeito a campos textu-
ais distintos: forma e sentido; mas que se aproximam para garantir
a efetivação das práticas sociais de uso da linguagem, com desta-
que para a informatividade, elemento essencial para a relevância
dos resumos que figuram em artigos de periódicos científicos qua-
lificados pela CAPES.
O texto deve apresentar informações que sejam úteis ao lei-
tor. Para tanto, como bem aponta Koch (2004), um texto precisa
expor informações já conhecidas e informações inéditas. Isso por-
que um texto que contém apenas informações já conhecidas não se
torna atrativo aos olhos do leitor. O ineditismo das informações de
um texto é aspecto determinante para qualificar um resumo aca-
dêmico que busca sintetizar as informações do artigo científico,
mas também despertar o interesse do leitor para o texto de divul-
gação científica.
Um fator importante acerca do recurso da informatividade
na produção do texto acadêmico é que a sua presença revela ao
leitor se o autor tem conhecimento sobre o conteúdo abordado no
texto, bem como se ele (o texto) possui contribuições que possam
agregar mais conhecimento, mais informações ao leitor. Para Mar-
cuschi (2008b), o certo é que ninguém produz textos para não dizer
absolutamente nada. É evidente que, ao escrever um texto, tenta-
mos, ao máximo, externar nossas ideias, ainda que embasadas nos
conhecimentos de outrem, já que é assim que se processa a infor-
mação: utilizamos as referências alheias para dar suporte às nossas
produções de sentido.
Diante das contribuições das teorias interacionistas e da
linguística textual, temos que o conceito de texto, para muitos,
estritamente ligado à forma, foi se aperfeiçoando ao longo do tem-
po, de forma que texto deixou de designar a união de um amonto-
ado de frases que tratam de um mesmo conteúdo, para represen-
tar, em sentido mais amplo, o papel de comunicador. Diante disso,
a atividade de produção textual deixa de ser operação de lingua-

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gem com fim num produto para ser um processo em constante


construção, em que o sentido não está no texto, mas se constrói a
partir dele (KOCH, 2008) e das situações comunicativo-interativas.
O texto é constituído por imagens ou vocábulos (sinestésicos ou
acústicos) e exerce atividade sociocomunicativa, provocando a
construção de sentidos diversos no leitor.
Quando falamos em contexto de ação da linguagem em
práticas sociais de interação humana, não estamos nos reportando
apenas ao gênero textual. Saber situar um texto num gênero espe-
cífico tem se tornado uma tarefa quase que automática, já que nos
comunicamos através de gêneros diversos diariamente. O contexto
ao qual nos referimos está relacionado ao sentido, ao texto e ao
gênero, e estes às circunstâncias e/ou condições sociais, culturais,
históricas e políticas nas quais o texto se constrói. Fenômeno situ-
ado nos estudos pragmáticos e que sugerem que todos os textos
são, em alguma medida, “opacos” e como tal requerem o contexto
para sua interpretação (DASCAL; WEIZMAN apud MARCUSCHI,
2008b). Dessa forma, temos que saber relacionar o texto à situação
em que este se estrutura; é essencial para que se alcance a intera-
ção texto/leitor.

2. Resumo e resenha: semelhanças e divergências

O gênero resumo científico (ou abstract) vem sendo alvo de


discussões entre alguns teóricos que se dedicam ao estudo dos
gêneros. Ele se distingue dos demais resumos como, por exemplo,
os escolares, que se assemelham às resenhas, as quais apresentam
dados da obra, interpretações e avaliações, como aponta Machado
(2003).
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), atra-
vés da norma brasileira (NBR) 6028 (2003), define resumo como
uma “Apresentação concisa dos pontos relevantes de um docu-
mento” e classifica-o em três tipos: indicativo, informativo e críti-
co. O resumo indicativo “indica apenas os pontos principais do
documento, não apresentando dados qualitativos, quantitativos,
etc. De modo geral, não dispensa a consulta ao original”; resumo

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informativo “informa ao leitor finalidades, metodologia, resulta-


dos e conclusões do documento, de tal forma que este possa, inclu-
sive, dispensar a consulta ao original”; Já o resumo crítico é “redi-
gido por especialistas com análise crítica de um documento. Tam-
bém chamado de resenha. Quando analisa apenas uma determi-
nada edição entre várias, denomina-se recensão”.
Esta última classificação faz eco com as palavras de Severi-
no (2007, p. 204-205), que explica que o gênero resenha é

[...] uma síntese ou um comentário dos livros publicados fei-


to em revistas especializadas das várias áreas a ciência, das
artes e da filosofia. As resenhas têm papel importante na vi-
da científica de qualquer estudante e dos especialistas, pois é
através delas que se toma conhecimento prévio do conteúdo
e do valor de um livro que acaba de ser publicado, fundan-
do-se nesta informação a decisão de se ler o livro ou não, se-
ja para o estudo seja para um trabalho em particular.

Araújo (2009, p. 78) tem um conceito bem parecido com o


de Severino, inferindo que a resenha crítica é

[...] um gênero textual que tem como objetivo social descre-


ver e avaliar o conteúdo de um livro recentemente lançado
no mercado editorial e direcionado àqueles interessados na
contribuição da obra para determinado campo disciplinar. A
avaliação constitui a principal característica desse gênero que
culmina com a recomendação ou não do livro apreciado a
um leitor por parte do resenhista da obra. (grifos do autor)

Sendo assim, é notório que a classificação proposta pela


NBR 6028 (2003), a qual coloca a resenha como uma tipologia do
gênero resumo (o resumo crítico) é de caráter confuso, já que rese-
nha e resumo se configuram como gêneros distintos. A confusão
gerada acerca do gênero resumo não se encerra com a normatiza-
ção da ABNT. A resenha não deve ser fixada como uma subdivi-
são do resumo, mas como um gênero independente. Muitos auto-
res discordam da classificação postulada pela ABNT ou dividem
os resumos de maneira distinta. Conforme Medeiros (1991), que

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cria uma nova subdivisão, a qual ele chama de resumo indicativo-


informativo, o qual dispensa a leitura do texto fonte, como defen-
de o autor.
Severino (2002) também sugere outra subdivisão para o
gênero resumo: o técnico-científico. Consiste na apresentação con-
cisa do conteúdo de um trabalho de cunho científico (livro, artigo,
dissertação, tese etc.) e tem a finalidade específica de passar ao
leitor uma ideia completa do teor do documento analisado. Esta
classificação feita por Severino é semelhante a que estamos aqui
nomeando de resumo científico, mas também bem próxima da sua
própria definição de resenha já apresentada neste trabalho.
Hartmann e Santarosa (2011, p. 168) asseguram que “o gê-
nero resenha se define como o texto em que se apresentam, além do
resumo do conteúdo do objeto resenhado (livro, filme, peça de
teatro, artigo), comentários e avaliações a respeito desse objeto”
(grifos dos autores). A partir dessa conceituação, podemos enten-
der um pouco o porquê da confusão gerada com relação aos gêne-
ros resumo e resenha, já que este último representa um resumo
seguido por impressões e comentários pessoais do autor da rese-
nha.
Machado (2003, p. 148) alega que os resumos científicos
aparecem comumente inseridos em “artigos científicos e resumos
de teses que originalmente se constituem como parte destes textos
e que, portanto, são produzidos por seus próprios autores, em
primeira ou terceira pessoa”. Já as resenhas aparecem com mais
frequência em jornais e revistas com o propósito de divulgar obras
como livros e filmes e ainda de formar a opinião do leitor acerca
da obra resenhada, para isso, o resenhista faz apontamentos dos
pontos positivos e negativos da obra e deixa a sua análise crítica.
Atentemos, então, para as características funcionais ineren-
tes aos gêneros resumo e resenha: ambos fornecem conhecimento
prévio acerca de um conteúdo (o que podemos chamar de “si-
nopse”); atuam como vitrine (é um convite para que o leitor tenha
a curiosidade de ler todo o trabalho) e trazem avaliações a respeito
do trabalho que representa. No entanto, no que diz respeito à re-
senha crítica, um fator é determinante, Araújo (2009) explica que
as resenhas são estruturadas em três grandes blocos de informa-

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ção: introdução, descrição e recomendação, em que cada um des-


ses blocos é embasado por estratégias diferentes.
Diante disso, salientamos que a atividade de produção de
um resumo científico é uma atividade que necessita ser realizada
com objetividade e ainda obedecer a um conjunto de regras, as
quais compõem a sua estrutura. Dentre as exigências mais co-
muns estão: a quantidade de palavras, podendo variar entre 150 a
500; o tempo verbal que deve estar na voz ativa ou na terceira pes-
soa do singular, ou primeira do plural; ser escrito em um único
parágrafo; obedecer ao preenchimento dos tópicos: hipóteses, jus-
tificativas, métodos, informações teóricas, resultados, conclusões;
além da criação de pelo menos três palavras-chave, as quais de-
vem representar as principais ideias abordadas no trabalho.
Há teóricos que defendem uma organização retórica para o
resumo acadêmico, de modo que seja formado pelas seguintes
estruturas: apresentação da pesquisa, contextualização da pesqui-
sa, apresentação da metodologia, sumarização dos resultados e as
conclusões da pesquisa. Entretanto, Marcuschi (2006), ao falar da
estrutura dos gêneros, destaca o desapego à forma:

Existe uma grande variedade de teorias de gêneros no mo-


mento atual, mas, pode-se dizer que as teorias de gênero que
privilegiam a forma ou a estrutura estão hoje em crise, ten-
do-se em vista que o gênero é essencialmente flexível e vari-
ável, tal como o seu componente crucial, a linguagem. Pois
assim como a língua varia, também os gêneros variam,
adaptam-se, renovam-se e multiplicam-se. Em suma, hoje, a
tendência é observar os gêneros pelo seu lado dinâmico,
processual, social, interativo, cognitivo, evitando a classifi-
cação e a postura estrutural (MARCUSCHI, 2006, p. 24).

Sendo assim, podemos afirmar que estamos diante de um


gênero em crise? É evidente que os gêneros não devem ser produ-
zidos baseando-se apenas nos aspectos formais, entretanto, esta-
mos falando de escrita acadêmico-científica, que obedece a um
conjunto de normas técnicas, como afirma Machado (2003, p. 148):

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Uma das características mais diferenciadoras desses abs-


tracts e resumos é que estão rigidamente subordinados a
normas acadêmico-científicas, frequentemente explicitadas,
por exemplo, nas normas de apresentação de resumos de di-
ferentes congressos, em que se pede que os resumos apre-
sentem os objetivos, os pressupostos teóricos, a metodologia,
os resultados e as conclusões a que se chegou.

Para Severino (2002), a exigência de procedimentos meto-


dológicos e de estruturação se faz necessária quando se trata de
escrita acadêmica, sobretudo nos cursos de graduação, pois essas
regras têm importante papel para a formação técnica dos estudan-
tes. A esse conjunto de organização retórica responsável pelo pla-
no de estruturação dos textos, Bronckart (1999) denomina de infra-
estrutura, considerada em nossa análise.
É relevante ressaltarmos, acerca dos padrões de estrutura-
ção dos resumos, que não estamos querendo propor a aplicação de
uma “fôrma” para a produção textual de um resumo ou resenha,
mas destacar as estratégias utilizadas pelos produtores do texto
acadêmico que publicam seus textos/estudos em periódicos quali-
ficados. Para tanto, é preciso que compreendamos os resumos ci-
entíficos como ação de linguagem, desprendendo-nos das concep-
ções de cunho exclusivamente estruturalistas, como apontou Mar-
cuschi (2008a), pois, ao contrário dos resumos comuns, estes não
têm como função apenas representar um texto já existente, mas de
descrever a maneira e os procedimentos de realização de uma pes-
quisa científica.
A partir das informações arroladas a respeito do gênero re-
sumo científico, é importante ressaltarmos a impossibilidade de
desprezarmos a forma como este aparece disposto, seja em meio
impresso ou eletrônico, mas dar maior atenção para a funcionali-
dade que ele está representando, pois possuem, sem dúvidas, a
finalidade comunicativa e a função social de divulgar o conheci-
mento científico, sobretudo no âmbito do ensino superior, espaço
que se dedica constantemente à fundamentação de pesquisas em
prol do desenvolvimento humano.

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3. Procedimentos e análise do corpus

A fim de verificar o modo de escrita dos resumos dispostos


em artigos de revistas científicas publicadas online ou impressas, e
avaliadas pela CAPES, escolhemos, inicialmente, dois resumos
para cada estratificação Qualis, sendo o corpus final composto por
uma seleta de 6 resumos, pertencentes à área de Ciências Sociais1.
A pesquisa demonstrou que especificar uma revista, na área inte-
resse de nosso estudo, por um único estrato Qualis configura-se
tarefa impossível, haja vista que, dependendo da área de estudo
em que o periódico figura nas Ciências Sociais (Sociologia ou An-
tropologia), haverá oscilações de qualificação, como demonstra a
exposição do corpus: Cadernos Pagu (A1); Boletim do Museu
Paraense Emílio Goeldi (A2-B1); História (São Paulo) (B1-B2); Acta
Amazonica (B2); CAOS (B5); Antropos (B5-C).

Pesquisa WebQualis “Cadernos Pagu” – Versão 5.2.4/2013


Cadernos Pagu
ANTROPOLOGIA /
0104-8333 (UNICAMP. Impres- A1 Atualizado
ARQUEOLOGIA
so)
Cadernos Pagu
0104-8333 (UNICAMP. Impres- A1 SOCIOLOGIA Atualizado
so)
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

1 “Tão complexo quanto definir o que é a sociedade, é delimitar o estudo


das Ciências Sociais. Porém, em linhas gerais, trata-se do campo de inves-
tigação acadêmica que procura compreensão científica do mundo social.
A área é dividida em duas ramificações, Sociologia e Antropologia. A
primeira objetiva fornecer uma visão de conjunto dos vários aconteci-
mentos da vida em sociedade, sejam eles relativos à economia, à política
ou à esfera simbólica e cultural. Já a Antropologia procura descrever o
homem e analisá-lo com base nas características biológicas e culturais dos
grupos em que se distribui, enfatizando as diferenças e variações entre
eles” (Portal do Estudante da UnB – Disponível em:
http://www.unb.br/aluno_de_graduacao/cursos/ciencias_sociais).

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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Pesquisa WebQualis “Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi” –


Versão 5.2.4/2013
Boletim do Museu
ANTROPOLOGIA /
1981-8122 Paraense Emílio Goel- A2 Atualizado
ARQUEOLOGIA
di. Ciências Humanas
Boletim do Museu
1981-8122 Paraense Emílio Goel- B1 SOCIOLOGIA Atualizado
di. Ciências Humanas
Boletim do Museu
CIÊNCIAS SOCIAIS
1981-8122 Paraense Emílio Goel- A2 Atualizado
APLICADAS I
di. Ciências Humanas
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

Pesquisa WebQualis “História (São Paulo)” – Versão 5.2.4/2013


História (São CIÊNCIAS SOCIAIS
1980-4369 B1 Atualizado
Paulo. Online) APLICADAS I
História (São
1980-4369 B1 SOCIOLOGIA Atualizado
Paulo. Online)
História (São ANTROPOLOGIA /
1980-4369 B2 Atualizado
Paulo. Online) ARQUEOLOGIA
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

Pesquisa WebQualis “Acta Amazonica” – Versão 5.2.4/2013


Acta Amazonica ANTROPOLOGIA /
0044-5967 B2 Atualizado
(Impresso) ARQUEOLOGIA
Acta Amazonica
0044-5967 B2 SOCIOLOGIA Atualizado
(Impresso)
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

Pesquisa WebQualis “CAOS” – Versão 5.2.4/2013


CAOS. Revista Ele-
ANTROPOLOGIA /
1517-6916 trônica de Ciências B5 Atualizado
ARQUEOLOGIA
Sociais
CAOS. Revista Ele-
1517-6916 trônica de Ciências B5 SOCIOLOGIA Atualizado
Sociais
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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Pesquisa WebQualis “Antropos” – Versão 5.2.4/2013


Antropos (Ma- ANTROPOLOGIA / ARQUE-
1982-1050 C Atualizado
naus) OLOGIA
Antropos (Ma-
1982-1050 B5 SOCIOLOGIA Atualizado
naus)
Fonte: http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam

Cabe destacar que os resumos analisados foram publicados


entre os anos de 2012 e 2013, com possível atualização referente ao
ano de 2012, já que a atualização dos estratos que acontece anual-
mente ainda não havia sido publicada até o final da coleta de da-
dos desta pesquisa. É importante ressaltar ainda que a formatação
dos resumos não foi alterada, em nenhum aspecto, para tanto, os
arquivos foram salvos como figuras.
A compilação de dados para a pesquisa teve início com a
escolha das revistas a serem analisadas, todas em meio virtual
(mesmo aquelas que apresentam a forma impressa) e com o auxílio
da WebQualis (versão 5.2.4); passando, posteriormente, para a
seleção dos resumos.
Pensando no cumprimento das finalidades a que se destina
o gênero resumo científico, no que se refere às questões de ordem
pragmáticas, observando se os resumos atendem ao objetivo co-
municacional, nossa análise atentou para os seguintes critérios:
• A obediência às regras formais impostas pelas comissões
editoriais dos periódicos, referentes à organização da infra-
estrutura;
• A presença de itens lexicais que constroem um campo se-
mântico comum ao periódico e que norteia as discussões na
área de estudo (Ciências Sociais – Sociologia e Antropolo-
gia);
• E, partindo desses agrupamentos, observação de casos par-
ticulares e inquietantes, tais como questões de posiciona-
mento enunciativo, índices de pessoa nos resumos etc.

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 354

3.1 Organização infraestrutural

A revista Cadernos Pagu é da Universidade Estadual de


Campinas em São Paulo e é fruto de pesquisas realizadas pelo Nú-
cleo de Gênero Pagu, um centro interdisciplinar de pesquisas vol-
tadas para a problemática do gênero. O periódico, que atualmente
enquadra-se no nível A1 da classificação Qualis, possui publicação
semestral. A única exigência solicitada pelo periódico quanto à
produção escrita do resumo é que ele possua no máximo 7 linhas,
esteja acompanhado por palavras-chave, as quais não podem ul-
trapassar o número de 5.

Resumo 1 – Cadernos Pagu (A1)

Fonte:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010483332012000200013&script=
sci_abstract&tlng=pt

O resumo analisado é composto por 9 linhas, 113 palavras e


3 palavras-chave. Escrito por um autor, expõe a apresentação da
pesquisa, faz um breve comentário acerca da metodologia de pes-

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 355

quisa utilizada (pesquisa etnográfica) e as hipóteses que o estudo


pretende comprovar.
O Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi é um dos
mais antigos periódicos científicos brasileiros e atualmente publica
três edições por ano. Segundo informações apresentadas no site da
revista, sua comissão editorial segue critérios rigorosos para avali-
ar os trabalhos recebidos, a fim de publicar o conteúdo com a me-
lhor qualidade possível. As regras dispostas para a produção do
resumo são: texto em um único parágrafo, ressaltando os objeti-
vos, o método, os resultados e as conclusões do trabalho, com no
mínimo 100 palavras e no máximo 200, além das palavras-chave,
que podem variar entre 3 e 6 expressões.

Resumo 2 – Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi (A2-B1)

Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1981-
81222013000100006&script=sci_arttext

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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Escrito por dois autores, o resumo selecionado possui 151


palavras, 6 palavras-chave, em único parágrafo, sendo composto
por 9 linhas. No entanto, verificamos, apenas, a presença da intro-
dução, que especifica os objetivos e métodos utilizados para reali-
zação do trabalho. Restando incluir os resultados e as conclusões,
como orienta o periódico.
História (São Paulo) é um dos mais antigos periódicos pu-
blicados pela Universidade Estadual de São Paulo – UNESP. Cria-
do no ano de 1963, a revista é fruto dos dois Programas de Pós-
Graduação de História da UNESP, nos campi de Franca e Assis.
Com publicação semestral, tem como público-alvo estudantes uni-
versitários.
Algo curioso foi o fato de em nossa pesquisa a ferramenta
Webqualis ter apontado a revista História (São Paulo) como uni-
verso de divulgação de pesquisas realizadas nas Ciências Sociais e
Aplicadas, em Sociologia e Antropologia. Por essa razão, optamos
por mantê-la dentre o corpus selecionado para o nosso estudo.

Resumo 3 – História (São Paulo) (B1-B2)

Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-
90742012000100018&script=sci_arttext

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 357

A revista solicita que o resumo seja formado por uma mé-


dia de 100 a 250 palavras, não especificando a quantidade exata, e
máximo de 6 palavras-chave. Curiosamente, a amostra aqui anali-
sada possui apenas 86 palavras, dispostas em 8 linhas, e 3 pala-
vras-chave. O texto problematiza um aspecto da área (a “completa
historicização das homossexualidades”, “tomadas enquanto cate-
gorias identitárias”), apresenta os objetivos e algumas conclusões.
Um aspecto que chama a atenção é a forma de apresentar
os objetivos do estudo. Parte da negativa de uma possível aborda-
gem para expor, em seguida, o que motivou a pesquisa, algo tipi-
camente não observado no gênero objeto de nosso estudo, o resu-
mo acadêmico.
A revista Acta Amazonica foi fundada no ano de 1971 pelo
Instituto Nacional de pesquisas Amazônicas – INPA. Com caráter
multidisciplinar, publica trimestralmente trabalhos que visem dis-
cutir elementos relacionados à Amazônia como clima, população,
saúde etc. Quanto à produção de resumos científicos, a Acta Ama-
zonica solicita que deve conter até 250 palavras (150 para comuni-
cações breves) e explicar, de forma sucinta, o objetivo, metodolo-
gia, resultados e conclusões, enfatizando os aspectos importantes
do estudo. Expõe não ser pertinente a utilização de termos científi-
cos em latim ou outra língua, e nem usar referências. O periódico
expõe também as exigências para as palavras-chave, que devem
suceder o resumo, entre 3 e 5 palavras, sendo que as expressões do
título não devem ser repetidas como palavras-chave.

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Resumo 4 – Acta Amazonica (B2)

Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0044-
59672012000200003

A amostra aqui analisada apresenta 253 palavras e 5 pala-


vras-chave. São explicados no texto a contextualização temática, os
métodos, resultados e conclusões obtidas com a pesquisa. O obje-
tivo pode ser deduzido, mas não é explicitado pelos autores.
Mesmo não sendo permitido o uso de expressões estrangeiras no
texto do resumo, ele apresenta expressões como “buffers” e “sha-
pefile”, que dificultam a compreensão de pesquisadores da área de
Ciência Sociais, e também Humanas, não familiarizados com esses
jargões, o que deve ser evitado no texto de divulgação científica,
principalmente no texto do resumo, uma vez que é interesse da
Ciência que haja a compreensão da pesquisa realizada, sua circula-
ção e a adoção de resultados com vistas ao desenvolvimento da
área e melhoramento da sociedade.
A CAOS - Revista Eletrônica de Ciências Sociais da Uni-
versidade Federal da Paraíba, atualmente encontra-se inserida em
nível B5 da classificação Qualis. Ela é publicada desde o ano de
1999, possui periodicidade semestral e visa tornar públicos os tra-

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balhos de alunos da graduação do curso de Ciências Sociais da


UFPB.

Resumo 5 – CAOS (B5)

Fonte:
http://www.cchla.ufpb.br/caos/n22/8.%20uso%20da%20internet%20na
%20campanha%20eleitoral%20de%202010.%20Campos%20Leal%20e%20
Bastos.pdf

A revista solicita que, preferencialmente, os resumos sejam


elaborados com, no máximo, 150 palavras, e até 6 palavras-chave.
O resumo, tomado para análise nesta pesquisa, possui 113 pala-
vras e 3 palavras-chave. Destaca os métodos e objetivos do estudo.

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Como representante da última categoria de estratificação


Qualis (B5 e C) foi escolhido o periódico Antropos – Revista de
Antropologia, que publica os resultados das pesquisas elaboradas
pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Evangélica –
UNIEVANGÉLICA, de Manaus, com o apoio do Instituto Antro-
pos. A revista se empenha em publicar trabalhos que contribuam
para os estudos das Ciências Sociais e para a atualização dos co-
nhecimentos para a comunidade antropológica.

Resumo 6 – Antropos (B5-C)

Fonte:
http://revista.antropos.com.br/v3/index.php?option=com_content&vie
w=article&id=45:artigo-3-as-relacoes-interetnicas-dos-povos-indigenas-
isolados-e-de-recente-contato&catid=11:numero-05-maio-de-
2012&Itemid=5

A única especificação que a revista apresenta para produ-


ção dos resumos é que eles não possuam recuo de parágrafos, não
sendo, portanto, fixado um número de linhas, palavras, ou pala-
vras-chave. Dessa forma, o resumo da Antropos estudado é com-
posto por 246 palavras e 5 palavras-chave. Como é típico do gêne-
ro acadêmico em questão, verificamos no texto do resumo a pre-
sença dos objetivos, métodos, hipótese, levantamento de resulta-
dos, conclusões e sugestões; aspecto relevante para o nosso estudo,
haja vista não ter sido mencionado nenhum destes elementos nas
normas de submissão da revista.
No tocante ao modo de apresentação das sugestões, dife-
rentemente das orientações encontradas nos manuais de produção

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do texto científico2, o autor marca sua entrada no texto com a utili-


zação da expressão “sugiro”, primeira pessoa do singular. Sendo o
único caso observado no corpus analisado, em que a maioria dos
autores opta pela caracterização do texto em linguagem impessoal;
ou mesmo escrito na primeira pessoa do plural (nosso trabalho;
compreendemos; esperamos etc.), quando se leva em consideração
que o texto é fruto de um trabalho/estudo conjunto e autorizado
pelo poder institucional da academia.

3.2 Coesão nominal3

Nos Cadernos Pagu, verificamos a presença do item lexical


“Este artigo”, bastante comum na escrita de resumos científicos,
além da palavra “gênero” que confere valor de tensão dialética a
partir dos significados atribuídos aos termos “homem” e “mu-
lher”. Há ainda expressões como “heterossexualidade” e “família
patriarcal”, elementos de sentido que concentram as discussões
fomentadas pela inserção das questões de “sociabilidade” no
“mundo rural”, no “campo”. Fenômeno recorrente também no
Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, em que os itens lexi-
cais “movimento”, “política pública”, “pensamento social” e “an-
tropologia” formam um conjunto do léxico que desenha semanti-
camente o campo de pesquisa onde os trabalhos da revista científi-
ca examinada pretende alocar suas vozes.
Em História (São Paulo), por se tratar de uma revista que
reúne pesquisas nas áreas fronteiriças da História (Sociologia e
Antropologia), os itens lexicais que se destacam na superfície do
texto apontam para uma base semântica que concentra as relações
entre homem e mundo (cultura e sociedade). Por essa razão, ex-

2 Que sustentam a ideia de neutralidade científica, com escrita do texto


do resumo em linguagem impessoal, verbos na terceira pessoa (do singu-
lar ou do plural), geralmente acompanhados do pronome “se”: discute-
se; analisa-se; ou ainda “o presente estudo [...]”.
3 Para Bronckart (1999), os recursos da coesão nominal localizam-se no

nível intermediário do folhado textual, referente aos mecanismos de tex-


tualização e, entre outras funções, dão conta da relação entre o léxico e a
área do conhecimento em que figura.

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pressões como “identidade”, “homossexualidade”, “grupo social”,


“orientação sexual” e “estigmatização” se relacionam com os sen-
tidos centrais da revista mediante expressões como “história” e
“recepções culturais”, tensão dialética dos sentidos pertinente com
a proposta de publicação no periódico.
Acta Amazonica, pelo próprio direcionamento da revista,
busca discutir dados relacionados à Amazônia (clima, população,
saúde etc.). Na construção do texto do resumo, verificamos a pre-
sença de itens lexicais comuns ao universo sociocultural dessa área
geográfica do país. Para tanto, expressões como “poderes públi-
cos”, “projetos de assentamento”, “desmatamento”, “exploração
madeireira” e “perda de floresta”, mesmo não sendo frequentes
nas amostras das revistas de antropologia e sociologia consultadas,
são agenciados no texto para comporem um espaço consoante com
os sentidos singulares ao periódico em questão.
Quanto ao investimento de uma coesão nominal na tessitu-
ra do texto do resumo estudado da revista CAOS, destacamos as
expressões “período eleitoral”, “partidos políticos”, “eleitorado” e
“eleições de 2010”, que desenham o cenário sociocultural e históri-
co em que se inscreve a problemática estudada. Coerente com as
temáticas da Revista Eletrônica de Ciências Sociais, os autores des-
tacam as “estratégias de comunicação partidária” e a “relação ide-
ológica dos partidos políticos” num espaço contemporâneo de
interlocução social: a “internet”, como possibilidade de inserção
do texto no espaço de discussão que a revista busca promover em
seus números e volumes.
Outro aspecto verificado na escrita dos autores foi a adoção
de itens lexicais próprios da produção do texto acadêmico de di-
vulgação científica. Expressões como “variáveis de análise”4 e
“dados gerais” são observadas ao longo do resumo, operando sen-
tidos de forma consciente, em prol de um fazer científico que
aponta para o texto ao passo que atualiza a sua ação discursiva na

4 Estes são alguns termos mais recorrentes em artigos da área de Ciências


da Saúde, por se aproximarem mais de um paradigma positivista de pes-
quisa. Conferir o capítulo 1, neste livro, de autoria de Poliana Dayse Lei-
tão e Regina Celi M. Pereira.

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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superfície textual. Para tanto, ora o texto é dito “Este artigo” ora “o
presente trabalho” e ora “o artigo”. Uma adoção de linguagem que
sugere cientificidade pela impessoalidade, o que é próprio do dis-
curso científico.
Finalmente, partindo do plano de expressão para o plano
de conteúdo do resumo examinado da revista Antropos, verifica-
se a presença de um conjunto composto por elementos de lingua-
gem que, na superfície do texto, cooperam para a construção de
uma base semântica que endossa a abordagem dirigida pela revis-
ta no espaço de discussões em que o periódico se insere: as Ciên-
cias Sociais. Diante disso, expressões como “relações interétnicas”,
“povos indígenas”, “política”, “formação de identidade”, “encon-
tro de culturas”, “grupo étnico”, “políticas públicas”, “questão
fundiária” e “movimentos de expressão territorial” agenciam a
compreensão do texto para que ele se justifique no periódico. Essa
ação de linguagem sugere que o texto figura como uma ressonân-
cia de vozes que orbitam, enquanto pretendem discutir, acerca de
questões de ordem social em universo científico.

4. Discussão

4.1 Resumo científico: um gênero acadêmico

Por que tomamos o resumo como objeto de estudo nesta


pesquisa? Seria o resumo científico considerado um gênero textual
independente, no trânsito das trocas linguísticas/ideológicas em
que se situa o discurso científico? É notório que o resumo configu-
ra-se como gênero textual do discurso acadêmico. Entretanto, ain-
da pairam algumas dúvidas quanto à classificação dos resumos
(ou abstracts), já que estes compõem parte de outros gêneros, a
exemplo dos artigos, dissertações e teses, também considerados
suportes de textos.
Observamos no início de nosso estudo que este aspecto de
dualidade do resumo científico, quanto a sua classificação, pode
levá-lo a ser apontado como um gênero determinado, dependendo
do suporte ou do contexto em que figura, sendo mais, ou menos,

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 364

autônomo. Ele se constitui gênero autônomo em cadernos de re-


sumos, utilizados por revistas e anais de eventos científicos, exer-
cendo o papel de indicador: é através de suas informações que o
leitor decidirá ler ou não o trabalho completo. O que é confirmado
em estudos realizados por Biasi-Rodrigues (2009, p. 51), que infere:

Com a expansão dos sistemas informatizados de armazena-


mento e transmissão de informações, os resumos ganharam
independência e constituem peças genéricas disponíveis a
uma audiência que tende a se ampliar dia a dia. Esse fato co-
loca os produtores de resumos de dissertações e de outros
gêneros acadêmicos em outros circuitos comunicativos e
pode requerer maior atenção para organizar retoricamente
as informações de modo a obter eficácia comunicativa.

Marcuschi (2008a) reflete acerca da dúvida que ocorre em


relação aos gêneros, quanto a sua classificação. Segundo o autor,
muitas vezes o suporte é confundido com o gênero, mas o que
seria o suporte? “DEFINIÇÃO DE SUPORTE: entendemos aqui como
suporte de um gênero um lócus físico ou virtual com formato específico
que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como
texto” (MARCUSCHI, 2008a, p. 174) (grifos do autor).
Neste caso, seguindo a linha de raciocínio de Marcuschi,
seria viável considerarmos o artigo científico como um suporte
para o resumo? Ou a revista é que seria o suporte de texto? Julga-
mos que, quando inserido em um artigo, o resumo figura como
coadjuvante na ação de linguagem em que resulta o texto e passa a
ser um elemento constitutivo do artigo, gênero textual de produ-
ção de sentidos na academia. Entretanto, quando alocado em ca-
dernos de resumos, como destaca Biasi-Rodrigues (2009), e nas
revistas científicas, como buscamos observar em nosso estudo, o
resumo adquire uma personalidade autônoma, independente.
Neste caso, seriam o caderno de resumos e a revista suportes em
que se apresentam os resumos. Vê-se, assim, que a situacionalida-
de exerce valor significativo para determinar a função exercida
pelo texto, o que confere especificidade ao gênero que, mesmo
mantendo sua estrutura de origem fixa, ora figura como gênero,
ora como suporte.

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 365

Estando “anexado” ou não em outro gênero, o resumo


constitui um gênero textual típico da esfera do discurso científico.
Com função comunicativa e buscando contribuir para a dissemi-
nação da produção de conhecimento científico. O resumo, mais
especificamente, e os gêneros, de forma mais ampliada, comparti-
lham uma variedade de conceitos apresentados aleatoriamente
para definir aquilo que Bakthin/Medvedev (1992, p. 279) caracte-
riza como:

Formas estáveis de enunciados situados, que expressam in-


tenções, originários de esferas da vida social, distribuídos
pela fala e escrita, com um plano de composição estilística,
como instrumentos auxiliares de compreensão, como pos-
suidores de um conteúdo temático e como formas típicas de
se dirigir e construir um destinatário (natureza essencial-
mente dialógica).

Enfatizamos que as relações de comunicação se dão através


de gêneros, seja através da fala ou da escrita, e em formas que va-
riam dependendo da situação comunicativa, o que quer dizer que
nem sempre é o falante que escolhe o gênero no qual deseja se ex-
pressar, sendo a situação comunicativa a responsável por ditar o
estilo e a composição do gênero, como indica Soares (2010, p. 88),
ao inferir que “os gêneros de textos são determinados pelas neces-
sidades de comunicação de um determinado momento. São ma-
neiras específicas de ser dos textos”.
Nesta perspectiva, poderíamos sugerir que existem situa-
ções em que optamos pela escolha do gênero com o qual iremos
nos expressar, um exemplo é quando pretendemos produzir um
resumo para ser inserido em um artigo científico. Nesse caso, re-
corremos ao gênero resumo científico, de forma que buscamos
atender as suas estratégias de produção, atentando para a estrutu-
ra típica, assinatura interlocutiva do plano de enunciação em que
se insere esse enunciado/texto. Entretanto, o exame realizado nos
resumos componentes do nosso estudo revelou que este fato não
indica que, quando recorremos a um determinado gênero, estamos
procurando preencher um modelo já postulado, o que pretende-

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0


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mos é cumprir com a sua intencionalidade e oferecer as informa-


ções a que ele se presta, interessando também a ordem em que se
encontram as unidades retóricas que precisam ser atendidas, e o
cumprimento da função social a que o gênero se destina, pois os
gêneros não são simplesmente formas textuais, mas “formas de
ação social”, como afirma Carolyn Miller (apud MARCUSCHI,
2008a, p. 243).
Para Swales (apud BIASI-RODRIGUES; HEMAIS; ARAÚJO,
2009, p. 22), “um gênero compreende uma classe de eventos co-
municativos, cujos exemplares compartilham os mesmos propósi-
tos comunicativos”. No entanto, o autor afirma que nem sempre os
propósitos são identificados e, por esse motivo, recorremos à for-
ma na tentativa de identificar um gênero. Neste raciocínio, tería-
mos uma supervalorização da forma em detrimento do conteúdo.
Mas não foi isso que percebemos nos textos dos resumos
estudados. É preciso, portanto, que sigamos a visão interacionista
de considerar a linguagem como atividade que possui fins de ação
social e não como um modelo de estrutura textual que precisa ser
atendido. Por exemplo, quanto ao aspecto da coesão nominal, ca-
tegoria de análise utilizada em nossa pesquisa, verificamos que
houve um investimento recorrente num conjunto de léxicos que
sinalizam pertencimento ao espaço em que se dão as discussões de
âmbito científico. Um investimento da ordem dos sentidos, do
discursivo, do ideológico. Um apego, por parte dos autores, por
elementos de linguagem que caracterizam o universo temático das
discussões recorrentes na área em que se encontram publicados
amostras dos estudos realizados em Ciências Sociais. Operação de
sentidos em prol da manutenção da coerência entre texto e suporte
pela ação temática promovida pela linguagem como prática social.

4.2 Os desafios da escrita acadêmica

Frente ao fenômeno examinado, a produção de textos


acadêmicos com vistas à divulgação científica, cabe-nos refletir
acerca dos desafios a serem superados em âmbito educacional.
Qual o perfil dos produtores de textos acadêmicos? Para Hartman
e Santarosa (2011), o perfil dos estudantes que ingressam nas uni-

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 367

versidades atualmente é bastante distante dos que conseguiram


entrar no ensino superior há alguns anos. Muitos alunos não pos-
suem, ao término do Ensino Médio, os requisitos básicos, no que
tange ao ensino de língua portuguesa, propostos pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN), os quais asseguram que ao concluir
o Ensino Médio o aluno deverá estar capacitado a:

Considerar a Língua Portuguesa como fonte de legitimação


de acordos e condutas e como representação simbólica de
experiências humanas manifestas nas formas de sentir, pen-
sar e agir na vida social;
Analisar os recursos expressivos da linguagem verbal, rela-
cionando textos/contextos, mediante a natureza, função, or-
ganização, estrutura, de acordo com as condições de produ-
ção/recepção (intenção, época, local, interlocutores partici-
pantes da criação e propagação de idéias e escolhas);
Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes
manifestações da linguagem verbal;
Compreender e usar a Língua Portuguesa como língua ma-
terna, geradora de significação e integradora da organização
do mundo e da própria identidade (BRASIL, 2000, p. 20-22.).

Quanto a essas competências elencadas nos PCN, precisa-


mos ainda destacar que “a proposta não pretende reduzir os co-
nhecimentos a serem aprendidos, mas sim indicar os limites sem
os quais o aluno desse nível teria dificuldades para prosseguir nos
estudos, bem como participar ativamente na vida social” (BRASIL,
2000, p. 19-20.).
Conhecemos as metas textualizadas nos documentados ofi-
ciais, mas na prática tais metas nem sempre são alcançadas, propi-
ciando a entrada de alunos nas universidades com déficit de
aprendizado, principalmente no que se refere à produção de textos
especializados com vistas ao relato, à descrição e à síntese da pro-
dução do conhecimento científico desenvolvido na academia. O
agravante é que será cobrada aos estudantes universitários a pro-
dução de saberes, fazeres acadêmicos que são acompanhados da
produção escrita. Isso se agrava, principalmente quando se leva
em consideração a real situação da educação brasileira que está

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A t e l i ê d e G ê n e r o s A c a d ê m i c o s | 368

sendo promovida, em grande parte, pelo cumprimento de leis


propostas pelo mesmo órgão que criou os PCN, o Ministério da
Educação (MEC), quando propõe, na Lei das Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB), de 2011, que se deve encaminhar os
alunos às séries subsequentes, em vez de reprová-los. Dessa forma,
o aluno, em muitos casos, chega ao 3º ano do Ensino Médio sem
apresentar o desempenho esperado para realizar atividades sim-
ples de leitura e escrita, problemas que deveriam ser sanados nas
séries iniciais do Ensino Fundamental (do 1º ao 5º), que têm como
principal objetivo a aprendizagem da prática de leitura e escrita.
Hartmann e Santarosa (2011, p. 8) afirmam que “mesmo
não dominando conteúdos tradicionalmente tidos como indispen-
sáveis para o avanço escolar, tais como a norma padrão de escrita,
muitos alunos vêm sendo promovidos a níveis e séries mais eleva-
dos”. O resultado de todo esse sistema de promoção chega às uni-
versidades de forma bastante negativa, de maneira que afeta, em
muitos casos, o crescimento do aluno dentro da universidade e até
mesmo a promoção da ciência para o desenvolvimento nacional.
Constatado o problema, cabe buscar uma solução, mesmo
que seja revisitar a prática docente no Ensino Superior:

Se os alunos que chegam a esse meio não são proficientes


leitores e produtores de texto, há dois caminhos a percorrer.
Um é manter uma posição autoritária e excludente, cobran-
do deles o que não estão aptos a desenvolver, e consequen-
temente, reprovando-os. O outro é cumprir o que entende-
mos ser o papel do professor em qualquer circunstância
educativa e auxiliá-los na aquisição e no domínio dessa mo-
dalidade de linguagem. Em grossas linhas: se o aluno não
sabe, cumpre ao professor ensinar! (HARTMANN; SANTA-
ROSA, 2011, p. 9).

Encaremos as palavras de Hartmann e Santarosa (2011)


como um sério problema, visto que para ingressar em uma univer-
sidade o aluno passa por um processo de seleção, no qual terá os
conhecimentos de toda a vida escolar avaliados, medidos. Sendo
assim, espera-se que apenas os que estão habilitados consigam
uma vaga no ensino superior e, consequentemente, aqueles que

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têm acesso à universidade sejam indivíduos aperfeiçoados para o


desenvolvimento da ciência e da tecnologia, elementos caros para
a melhoria da vida em sociedade. Entretanto, há atividades que só
são apresentadas e/ou solicitadas ao aluno quando este inicia sua
vida acadêmica, porém se ele teve uma formação de qualidade
durante os ensinos fundamental e médio, o seu desempenho nes-
tas atividades provavelmente será satisfatório, caso contrário apre-
sentará dificuldades, sendo esta a realidade de muitos dos estu-
dantes que ingressam nas universidades brasileiras. Uma situação
desafiadora para esses alunos recém-chegados ao universo acadê-
mico, fenômeno também considerado em nosso estudo. Temos a
consciência de que eles são cobrados no que diz respeito à produ-
ção escrita (com o rigor dessa modalidade), em prol do aperfeiço-
amento de alguns gêneros, tais como o resumo, a resenha e o arti-
go, que fazem com que os estudantes se deparem com novas situa-
ções de uso da escrita, atividades de linguagem exigidas como
prática social eminentemente científica.
O primeiro grande desafio do estudante ao se defrontar
com essas novas situações de produção escrita está voltado às difi-
culdades que este já carregava consigo desde a formação básica.
Percebe-se que as noções de textualidade como coesão, coerência,
informatividade e situacionalidade, cobradas na produção do tex-
to, são as principais deficiências apresentadas.
Um segundo desafio reside na utilização dos gêneros como
meio para a produção escrita. Entender que eles atendem a deter-
minadas funções sociais e possuem estruturas específicas do gêne-
ro, bem como valor ideológico e operação discursiva, é essencial
para se alcançar as exigências das produções. “É refletindo sobre
como e por qual razão certo gênero é produzido que o aluno se
habilitará a lê-lo de forma crítica e a produzi-lo de forma mais
adequada quando isso lhe for solicitado” (SOARES, 2010, p. 92).
Segundo Lea e Street (apud OLIVEIRA, 2013), a escrita dos
estudantes universitários pode ser compreendida através de três
modelos: o estudo das habilidades, a socialização acadêmica e o
letramento acadêmico. O primeiro modelo visa desenvolver as
competências cognitivas dos estudantes a partir do meio universi-
tário, o que acaba excluindo as competências adquiridas antes do

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acesso ao meio acadêmico. Já o modelo de socialização acadêmica


trata o professor como o responsável por introduzir nos alunos
uma linguagem tipicamente acadêmica, de maneira que sejam
inseridos na cultura universitária, obtendo modo de fala, escrita,
interpretação e raciocínio exigidos nas disciplinas do curso. O mo-
delo de letramento acadêmico busca que o aluno alcance um am-
plo repertório linguístico, o qual lhe permitirá participar das di-
versas situações comunicativas presentes no ambiente universitá-
rio. Para tanto, recorre-se aos conhecimentos já dominados antes
da sua inserção na vida acadêmica. É importante salientarmos que
esses três modelos individualmente não apresentam resultados
significativos, por isso, é essencial que sejam postos em prática em
conjunto.
No entanto, não se cria uma estreita relação com a prática
escrita da noite para o dia, este é um processo lento. Produzir tex-
tos requer carga de leitura, ativação dos conhecimentos prévios,
noções de textualidade, conhecimento linguístico e interação com
o mundo que nos cerca. É através da interação que nos construí-
mos como sujeitos do discurso, que se inscrevem como falantes
produtores de textos e identidades (institucionalmente definidas),
em que a ciência se insere mediante a produção acadêmica.

Considerações finais

Consideramos que o resumo científico aqui analisado po-


de ser entendido como gênero autônomo, nunca uma subclasse,
mas ainda assim um elemento constitutivo do artigo, fator que não
altera em nada a sua estrutura e função, mudando apenas o supor-
te em que ele se encontra inserido. Sendo assim, independente-
mente do suporte, os seus propósitos comunicativos continuam os
mesmos. É o resumo que fica na parte inicial do artigo, além de
funcionar como apresentação fora do texto, com link de direciona-
mento que encaminha o leitor para o objeto de conhecimento dese-
jado: o artigo na íntegra.
Em linhas gerais, podemos inferir que nem sempre as re-
gras impostas para submissão dos resumos são respeitadas pelos

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autores, no que diz respeito ao plano de superfície do texto. Entre-


tanto, os textos são aceitos e publicados, o que permite interpretar
que as orientações postas como “regras” são, isto sim, indicações
desejáveis, mas nem sempre atendidas pelos autores, o que não foi
um problema para os autores da seleta de resumos que compõem
o nosso estudo, haja vista terem sido publicados seus estudos,
mesmo aqueles que utilizaram formatação diferente das orienta-
ções do periódico. O que é um fato relevante de ser observado,
uma vez que dos 6 resumos apresentados apenas em 1 não havia o
estabelecimento de regras para a quantidade de palavras, linhas
e/ou caracteres, isto é, para a estrutura formal do resumo.
Quanto ao que diz respeito aos itens constitutivos do gêne-
ro resumo: descrição dos objetivos, metodologia, aporte teórico,
linha de pesquisa, resultados e conclusões; foi possível observar
que nem todas as comissões editoriais impõem essa exigência para
a sua produção. Mesmo assim, os objetivos e a metodologia utili-
zada para realização da pesquisa foram apresentados em quase
todos eles. Os resultados e conclusões ocuparam espaço de apre-
sentação de menos da metade dos resumos. E, em geral, a maioria
não apresentou fundamentação teórica que serve de base para as
discussões suscitadas (poucos atentaram para essa característica),
além das linhas de pesquisa a que se dedicam para figurar como
promoção do desenvolvimento das Ciências Sociais.
Já no que diz respeito à presença de itens lexicais comuns
ao âmbito científico em que a revista circula, identificamos uma
maior preocupação por parte dos autores, uma vez que eles bus-
cam materializar os discursos concernentes ao plano de conteúdo
que compõe a temática de cada revista. Uma investida léxico-
semântica pela justificativa de adequação do texto ao espaço de
discussões (contexto científico) em que os sentidos negociados pela
revista são atualizados/aperfeiçoados pelo fazer científico, muitas
vezes, inclusive, buscando atender ao tema proposto para cada
número. Investida persuasiva com vistas à divulgação cientifica
em periódicos qualificados.
Diante do exposto, julgamos que a presença da síntese do
estudo sistematizado antes de artigos científicos é o que caracteri-
za, para muitos produtores de textos acadêmicos, um resumo cien-

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tífico, sendo o não cumprimento de todas as orientações expostas


no periódico um testemunho de tal afirmativa. Uma evidência é o
fato de alguns resumos, provenientes de periódicos com estratifi-
cação mais alta, não terem apresentado todas as condições cobra-
das pelos editores das revistas, no entanto, estes resumos descre-
vem a pesquisa de maneira que provoca o interesse do leitor pelo
conhecimento do estudo realizado (funcionalidade do gênero),
ação pragmática que sugere que o gênero conseguiu alcançar uma
de suas funções sociais: representar a pesquisa científica, buscando
o leitor ideal para cada leitura, como sugere Rodrigues (2009).
Por último, gostaríamos de destacar que o presente estudo
possibilitou a reflexão acerca não apenas da escrita do resumo ci-
entífico, mas também das funções sociais que estão reservadas ao
gênero acadêmico na vida do estudante universitário, uma vez que
o acesso a trabalhos publicados em periódicos acadêmicos é de
suma importância para a aquisição do conhecimento especializado
e salutar para a promoção do desenvolvimento da Ciência.

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DAS PRÁTICAS DE PLÁGIO


À AUTONOMIA TEXTUAL
Webert Cavalcanti Barros

“Aquele que apreende a enunciação de outrem não é


um ser mudo, privado da palavra, mas ao contrário
um ser cheio de palavras interiores.” (VOLOCHÍ-
NOV, 1979/2010.)

1. Introdução

Sabe-se que, na Antiguidade, conforme nos esclarece Mauri


Furlan (2001, p. 25), “o leitor romano podia considerar a tradução
um metatexto em relação com o original [grego, por exemplo]”.
Ela podia ter um caráter tanto explicativo quanto, e sobretudo,
retórico, de eloquência, persuasão. A arte tradutora então pratica-
da envolvia, por vezes, o uso de criatividade, o que implica, se-
gundo o autor, “um ato de ressignificação” (p. 21) do texto de par-
tida, em “defesa do texto de chegada” (p. 20). Valer-se das pala-
vras de outrem, tais como se encontram no original ou reelaboran-
do-as, por meio de paráfrases criativas, muito diz respeito ao mo-
do como o homem vem (re)construindo sua história. Isso diz res-
peito também às apropriações indevidas bem como ao desenvol-
vimento da autonomia, ao priorizar-se a busca pela autenticidade
nos textos elaborados. Essas noções revelam-se particularmente
importantes para o que se pretende ora discutir: o cuidado e res-
peito que se deva ter com os discursos que são integrados em no-
vos textos, dado o abuso das práticas de plágio que se tem perce-
bido com extrema frequência atualmente. A depender do modo
como o processo de desenvolvimento da escrita é erigido, o escri-
tor tende a se tornar um mero reprodutor, consciente ou não dos

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perigos ao utilizar como suas as palavras alheias, ou, na melhor


das hipóteses, um cidadão ético, capaz de deixar a sua marca, o
seu tom, nos textos que produz, ainda que referenciando tantos
outros autores.
Não se trata apenas de dizer o que outros disseram, mas
“como” dizê-lo. Além disso, não é tarefa nada fácil dizer de outro
modo o que já está posto e muitas vezes fazendo parte da memória
coletiva. Daí a emergência, ao menos, de apreender-se as possibi-
lidades de uso de citações. Foi pensando nisso que, no semestre
2012.2, de dezembro de 2012 a maio de 2013, na condição de pro-
fessor, objetivou-se despertar nos estudantes de três turmas que
então obtiveram aulas de português instrumental e produção tex-
tual na UFPB a consciência pelo trato ao manusear palavras de
outros autores em suas próprias produções, em particular, na es-
crita. Os diferentes perfis dos estudantes, em sua maioria do pri-
meiro período, pertencentes a cursos distintos como, por exemplo,
de Administração, Ciências da Computação, Contabilidade, Física,
Psicologia, Relações Públicas e Serviço Social, possibilitaram trocas
de conhecimento e, de maneira colaborativa, a apreensão dos con-
ceitos relativos aos usos de citações e responsabilidades em jogo ao
se produzir novos textos, o que acabou sendo igualmente instruti-
vo para o professor.
Em um dado momento, motivados pela ideia de obter mais
esclarecimentos acerca de como lidar com ideias alheias, sobretudo
das implicações resultantes de não fazer uso de tais ideias de for-
ma responsável, professor e estudantes se viram envolvidos em
exposições ou comunicações orais sobre plágio e autenticidade que
culminaram em relatos escritos acerca dessas exposições e do tema
em questão elaborados pelos demais estudantes que assistiram tais
comunicações. Embora os estudantes tenham elaborado outros
gêneros textuais acadêmicos, a exemplo de resumos críticos, a pre-
sente reflexão detém-se na força elocutiva presente nas comunica-
ções e nos relatos sobre plágio produzidos a partir dessas apresen-
tações, por acreditar-se que, nesse processo de produção textual e
trocas de conhecimento, esteja contida a centelha da tomada de
consciência da fronteira entre a mera cópia e reelaboração de um
pensamento. Ademais, esse pensamento é influenciado pelo aspec-

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to social, posto que o indivíduo só pode deixar a sua marca respei-


tando ou infringindo, mas, sobretudo, reconstruindo o conheci-
mento já compartilhado pelo meio social do qual faz parte.

2. Agir consciente e ações partilhadas

As ações empreendidas na sala de aula, para utilizar um


termo bakhtiniano, refletem e refratam a realidade da vida e da his-
tória do próprio homem. Dito isso, nada do que seja produzido
pelo ser humano escapa do que se pode conceber como sendo so-
cial, erigido do seio e em razão de uma coletividade. Difícil é, pois,
mensurar o que é próprio de um único ser em comparação ao que
pertence a uma memória coletiva. É o que também se pode depre-
ender das palavras do grande poeta romano Horácio:

Difficile est proprie communia dicere, tuque


rectius Iliacum carmen deducis in actus
quam si proferres ignota indictaque primus.
Publica materies priuati iuris erit, si
non circa uilem patulumque moraberis orbem,
nec uerbo uerbum curabis reddere fidus
interpres nec desilies imitator in artum,
unde pedem proferre pudor uetet aut operis lex.
(Ars poetica, vv. 128-135)

É difícil dar tratamento original a argumentos cediços, mas,


a ser o primeiro a encenar temas desconhecidos, ainda não
explorados, é preferível transpor para a cena uma passage
da Ilíada. Matéria pública se tornará de direito privado, se
você não se demorar aí pela arena vulgar, aberta a toda gen-
te, nem, tradutor escrupuloso, se empenhar numa reprodu-
ção literal, ou, imitador, não se meter numas aperturas de
onde a timidez ou as exigências da obra o impeçam de arre-
dar pé.

Ao fazer uso desses mesmos versos, Mauri Furlan (2001, p.


24) apresenta-nos o ponto de vista do autor Frederick Rener (1989,
p. 308), a saber, que, “nesta passagem, Horácio está distinguindo

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entre plágio (furtum) e a imitação. A imitação seria recomendada


se o poeta fosse competente, ou seja, capaz de dissimular a fonte e
incorporar o material emprestado numa nova e coesa criação”.
Esclarece-nos também que, “ao escrever esses versos, o poeta ro-
mano não se dirigia a tradutores, mas a escritores, aconselhando-
os a buscar originalidade não no que dizem, mas na maneira de
dizê-lo.” Evidentemente, os versos de Horácio devem ser compre-
endidos no âmbito literário, mas isso não impede que se faça, por
extensão, uma reflexão de uma tal postura de busca pela originali-
dade por escritores produtores de textos pertencentes aos mais
diversificados gêneros.
A intenção discursiva ou a vontade discursiva do falante pode
ser percebida, ainda que sutilmente, mesmo em gêneros elevados,
oficiais, os quais possuem um alto grau de estabilidade (BAKH-
TIN, 2003, p. 281, 284). Daí a relevância da compreensão, apreen-
são e, por conseguinte, dos modos de repassar ou criar a partir das
ideias apresentadas por outros autores. Daí também a afronta, por
vezes inconsciente, ao se apropriar dessas ideias, repassando-as
como suas. Dizer aos estudantes que devem “fazer uso de suas
próprias palavras” pode não surtir o efeito desejável se estes aca-
barem tratando certas ideias sem as devidas referências. É nesse
instante que, de maneira colaborativa, tomando o estudante como
o seu espelho, o professor acaba ressignificando sua própria ação:
é preciso deixar bem claras tais fronteiras entre a reprodução que
tende a culminar numa apropriação indevida e a criação de um
texto autêntico, fruto da organização do raciocínio lógico do pró-
prio estudante, que nem por isso nega a contribuição de eventuais
outras vozes possíveis e/ou necessárias à constituição desse novo
texto.
Numa época em que o ambiente virtual possibilita tantas
práticas de plágio e em que tudo já parece ter sido dito, ou seja, em
que há tanta carência de criatividade, torna-se urgente uma toma-
da de consciência, para que se, por ora, não se possa produzir tex-
tos contendo ideias mirabolantes, inovadoras, capazes de apresen-
tar soluções para assuntos específicos, que se faça jus, ao menos,
aos nomes dos autores cujas ideias se tomam por empréstimo.
Ainda assim, é possível crer no toque ou acabamento dado por

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cada indivíduo ao produzir um texto, no seu modo de dizer algo,


sua entonação expressiva (BAKHTIN, 2003, p. 284), ou tom que con-
fere a esse texto, de um ponto de vista outro, de maneira totalmen-
te diversa da que tenha sido utilizada por outras pessoas ao tratar
do mesmo assunto.
Pensando no agir comunicativamente (BRONCKART, 1999),
em que cada indivíduo assume um papel social, agindo a partir de
e sobre sua realidade, remodelando-a, professor e estudantes, nu-
ma perspectiva de coparticipação, acabam reconstruindo as práti-
cas de produção textual bem como de repasse de ideias já perten-
centes a toda uma tradição histórica, posto que do ponto que ocu-
pam, em seu momento histórico particular, acabam interferindo na
corrente ininterrupta dessas práticas sociais, contribuindo para a
sua transformação ao longo da história. Se, por algum momento,
passa-se desapercebidamente um modo indevido de uso de ideias
alheias, é porque também historicamente não tem sido fácil avali-
ar, em particular, por parte do professor, no momento em que ori-
enta a produção ou lê os textos de seus alunos. É de se imaginar
que o caráter investigativo faça parte de todo processo de ensino-
aprendizagem e, talvez, ou, porque não dizer, de todo processo de
desenvolvimento humano. No entanto, desse processo sempre fica
algo que, para o bem ou para o mal, acaba por conferir aos seus
participantes, não apenas um olhar investigativo, mas também a
construção de sua identidade, enquanto sujeitos imbuídos de um
papel social e enquanto sujeitos empíricos que perpetuarão certos
modos de se posicionar e de agir no mundo, inclusive por meio da
escrita.
A esse respeito, parece conveniente apresentar “a classifica-
ção dos escritores”, conforme o crítico Ezra Pound (1977, p. 10-11),
a partir da introdução de Augusto de Campos intitulada “As An-
tenas de Ezra Pound” contida na obra “ABC da Literatura”. Para
tal crítico, as duas primeiras classificações possibilitariam avaliar
qualquer livro, por extensão, entenda-se, no presente estudo,
qualquer produção textual:

Os escritores são por êle classificados nas seguintes categori-


as: 1 – Inventores. Homens que descobriram um novo pro-

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cesso, ou cuja obra nos dá o primeiro exemplo conhecido de


um processo; 2 – Mestres. Homens que combinaram um cer-
to número de tais processos e que os usaram tão bem ou me-
lhor que os inventores; 3 – Diluidores. Homens que vieram
depois das duas primeiras espécies de escritor e não foram
capazes de realizar tão bem o trabalho; 4 – Bons escritores
sem qualidades salientes (a classe que produz a maior parte
do que se escreve). Homens que fazem mais ou menos boa
obra em mais ou menos bom estilo do período. Sonetistas do
tempo de Dante, etc. “Ils n’existent pas, leur ambiance leur con-
fert une existence.”; 5 – Belles Lettres. Os que realmente não
inventaram nada, mas se especializaram numa parte parti-
cular da arte de escrever; 6 – Lançadores de modas. Aquêles
cuja onda se mantém por alguns séculos ou algumas déca-
das e de repente entra em recesso, deixando as coisas como
estavam. As duas primeiras categorias são – segundo EP
[Ezra Pound] – as mais definidas e a familiaridade com elas
torna possível avaliar quase que qualquer livro à primeira
vista.

Entre criar, ressignificar ou meramente reproduzir encon-


tra-se ainda a prática de se apropriar de algo, conferindo-lhe me-
nor valor ao inseri-lo em um novo contexto, como no caso de uma
ideia ou partes de um texto misturadas a outras palavras com as
quais não compartilham a mesma origem, ou simplesmente assu-
mindo indevidamente a autoria de um texto por completo. A di-
luição, a partir do que é colocado por Pound, e pensando nos gê-
neros acadêmicos, por vezes, pode ser compreendida como um
processo necessário, afinal, “só se desenvolve a escrita escreven-
do”. Em outras palavras, para se tornar um inventor ou um mes-
tre, a menos que seja possível já nascer assim, por vezes, trilha-se
um caminho árduo, de testes, ensaios e “diluições”, até que se pos-
sa produzir algo de qualidade mais elevada. Para tanto, também é
imprescindível ler, a respeito do que também se pode dizer: “só se
desenvolve a leitura lendo”. Certamente, o início, que envolve to-
do o processo de escrita, é “sofrível”, “cansativo”, “desgastante”,
porém, uma vez vencida essa barreira, aprende-se a lidar com as
palavras, a parafraseá-las, a resenhá-las. Por outro lado, construir
um texto que não passe de uma verdadeira “colcha de retalhos”,
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em que partes de diferentes textos sejam misturadas umas nas


outras de maneira descontextualizada, ou sem as devidas referên-
cias, pode vir a se tornar mais que um modo indevido de se ex-
pressar no papel, pode se tornar, sobretudo, um modo indevido de
ser no mundo.

3. O toque indelével do sujeito criador

Em Estética da Criação Verbal, conforme vimos acima, o filóso-


fo russo Mikhail Bakhtin (2003) apresenta-nos o conceito de “ento-
nação expressiva”. Isso é particularmente relevante enquanto su-
jeitos axiológicos preocupados com os modos de se posicionar a
partir e diante das ideias provenientes de outros autores. Por sua
vez, em Marxismo e Filosofia da Linguagem, Volochínov (1979/2010)
demonstra-nos os modos com que historicamente o homem, en-
quanto ser cultural, materializa os dizeres de outrem. Em geral,
pode-se retomar a fala de outro autor ora por meio do discurso
direto, ora por meio do discurso indireto ou mesmo por meio do
discurso indireto livre. Isso tem a ver, por assim dizer, com siste-
mas ideológicos, que refletem os modos de se expressar de certa
cultura:

Os sistemas ideológicos constituídos da moral social, da ci-


ência, da arte e da religião cristalizam-se a partir da ideolo-
gia do cotidiano, exercem por sua vez sobre esta, em retor-
no, uma forte influência e dão assim normalmente o tom a
essa ideologia (VOLOCHÍNOV, 1979/2010, p. 123).

Tal reciprocidade, ou pelo menos influência mútua, se dá no


âmbito da relação entre o “eu” e a “alteridade”. A constituição do
primeiro não se dá de outro modo que não sob a força com que o
“outro” lhe recai. O homem é, portanto, um ser social. E, ao ex-
pressar-se, direciona seus textos a um outro, ainda que virtual, a
um outro possível dentro de um quadro ou área de atuação.
Num diálogo, num contexto imediato, os enunciados se al-
ternam conferindo uma fronteira mais nítida entre a fala de um e

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de outros interlocutores. Essa fronteira também se torna mais clara


quando se trata da linguagem jurídica que “intrinsecamente assu-
me uma discrepância nítida entre o subjetivismo verbal das partes
num processo e a objetividade do julgamento” (VOLOCHÍNOV,
1979/2010, p. 159). Nessa linha de raciocínio, o autor nos diz que
“quanto mais forte for o sentimento de eminência hierárquica na
enunciação de outrem, mais claramente definidas serão suas fron-
teiras, e menos acessível será ela à penetração por tendências exte-
riores de réplica e comentário.” (op. cit., p. 159).
Assim, ao se levar em conta normas constantes da Associa-
ção Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), voltadas para produ-
ção textual acadêmica, bem como leis que tratam da publicação,
reprodução ou uso indevido de obras, não se poderá acrescentar
nada ou mesmo retirar, salvo por decreto. Contudo, é mesmo pos-
sível postular obras comentando tais leis, nas quais as fronteiras
entre o discurso empreendido pelo autor de uma tal obra e a pró-
pria lei comentada seria então mais facilmente percebida.
“O discurso citado é o discurso no discurso, a enunciação na
enunciação, mas é, ao mesmo tempo, um discurso sobre o discurso, uma
enunciação sobre a enunciação. (op. cit., p. 150 – grifo do autor). É
nesse sentido que corroboramos o modo como a cultura romana
percebia a arte de traduzir, como uma atividade metatextual. É
nesse sentido também que os textos e seus produtores refletem-se
e refratam-se. Conforme o autor esclarece:

O discurso citado é visto pelo falante como a enunciação de


uma outra pessoa, completamente independente na origem,
dotada de uma construção completa, e situada fora do con-
texto narrativo. É a partir dessa existência autônoma que o
discurso de outrem passa para o contexto narrativo, conser-
vando o seu conteúdo e ao menos rudimentos da sua inte-
gridade lingüística e da sua autonomia estrutural primitivas.
A enunciação do narrador, tendo integrado na sua composi-
ção uma outra enunciação, elabora regras sintáticas, estilísti-
cas e composicionais para assimilá-la parcialmente, para as-
sociá-la à sua própria unidade sintática, estilística e compo-
sicional, embora conservando, pelo menos sob uma forma
rudimentar, a autonomia primitiva do discurso de outrem,

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sem o que ele não poderia ser completamente apreendido.


(VOLOCHÍNOV, 1979/2010, p. 150-151 – grifo do autor).

Esse fenômeno, ainda segundo o mesmo autor, da “reação da


palavra à palavra” (p. 151) é sintomático à medida que analisamos
os textos erigidos pelos estudantes das referidas turmas de portu-
guês, levando em conta que, nas aulas, os estudantes tiveram aces-
so a outros textos que, conforme sinalizados, serviram para a re-
flexão das práticas de retomadas do discurso de outrem, a exem-
plo da ABNT e de leis sobre o uso de obras suas e de outros auto-
res.
Os relatos envolvendo o tema plágio que a priori deveriam
ter sido produzidos pelos estudantes revelaram ser, na verdade,
textos ou fragmentos retirados da internet. O estudante, seduzido
pela possibilidade de concluir seu trabalho com mais rapidez, nes-
te caso, o seu relato, ignora a probabilidade de ser descoberto pelo
avaliador, inserindo trechos coletados de outras fontes, a exemplo
do que, numa rápida busca pela internet, pode ser encontrado no
site significados.com.br, a partir do link: <http://www. significa-
dos.com.br/plagio/>:

Plágio significa copiar ou assinar uma obra com partes ou


totalmente reproduzida de outra pessoa, afirmando que é
sua, ou seja, “roubar” a ideia de outra pessoa é plágio. (Me-
lissa Maria Lima).
Plágio é a cópia não autorizada de informações, ou o ato de
apresentar uma obra autoral de qualquer natureza contendo
partes de uma obra que pertença a outra pessoa sem colocar
os créditos para o autor original. É considerado antiético, e
em vários países crime de violação de direito autoral. (Car-
los Daniel).
Plágio: Trata-se de um crime e consiste na violação do direi-
to autoral, é algo sério que pode se dar em qualquer mani-
festação artística como em livros, obras, filmes, músicas, etc,
ou até mesmo em simples trabalhos escolares. Está previsto
no código penal brasileiro na lei 9610. (Thiago).
Plágio significa copiar ou assinar uma obra com partes ou
totalmente reproduzida de outra pessoa, dizendo que é sua
própria, e é um termo oriundo do latim. O plágio pode ser

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de qualquer natureza, como em livros, música, obras, foto-


grafias, trabalhamos, e etc. O plágio ocorre quando um indi-
víduo copia o trabalho de alguém e não coloca os créditos
para o autor original.
O plágio é a cópia não autorizada de várias informações, e é
considerado crime, previsto no Código Penal Brasileiro, e na
lei 9610. O plágio é considerado uma atitude antiética em
vários países, e em vários é considerado como crime de vio-
lação de direito autoral. (Significados.com.br).

O que se percebe, ao se comparar os três primeiros fragmen-


tos ao último, encontrado pelo professor no site referenciado, é a
troca de palavras com significados muito próximos, a exemplo do
verbo “dizer” pelo verbo “afirmar”, no primeiro fragmento, ou
mesmo deslocamentos de frases inteiras, ou seja, antecipando tre-
chos que, na fonte consultada, aparecem posteriormente, ou inse-
rindo tais trechos a posteriori, conforme ocorre no segundo e ter-
ceiro fragmentos.
No segundo, o estudante desloca a referência à Lei 9.610 pa-
ra o fim do relato. No terceiro, o estudante inicia e conclui o relato
com termos muito semelhantes aos que se encontram no segundo
parágrafo da definição encontrada no site mencionado, enquanto
que no meio do relato, trechos como “obras autorais ‘de qualquer
natureza’” e “sem colocar os créditos” são visivelmente percebidos
no meio do primeiro parágrafo dessa definição.
Curiosamente, em outro estudo envolvendo práticas de plá-
gio, Silva (2008b, p. 360) apresenta-nos o relato de um estudante
que, entre risos revela ter plagiado 90% de seu trabalho e ter obti-
do 9,5. Isso é preocupante quando se pensa nos métodos de avalia-
ção, no quanto atualmente o professor se encontra numa posição
um tanto vulnerável acerca dessa questão.
Voltando-se aos relatos sobre plágio que ora analisamos,
essa prática pode se constituir num verdadeiro paradoxo: um de-
les, elaborado por estudante do Curso de Administração, foi apre-
sentado integralmente como um texto retirado do meio virtual
com um único detalhe a diferenciar: a substituição do nome do
autor original pelo do estudante.

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O plagiador, conforme Orlandi (2004, p. 72 apud SILVAa,


2008, p. 365):

[...] cala a voz do outro que ele retoma [...], toma o lugar do
outro indevidamente, intervém no movimento que faz a his-
tória, a trajetória dos sentidos (nega o percurso já feito) e nos
processos de identificação (nega a identidade ao outro, e, em
consequência, trapaceia com a própria).

Certo, o eu se constitui a partir do outro; a cópia de fato é


algo há muito praticado desde as bases da educação na sociedade
brasileira e, mesmo após tantas discussões acerca de como fazer
usos do discurso de outrem por meio, por exemplo, de citações,
como foi o caso das turmas mencionadas, evidencia-se um árduo
trabalho ainda por ser realizado em nossa cultura. Isto porque, em
parte, a prática da cópia pode ser tomada como um reflexo de co-
mo histórica e socialmente tal cultura tem reproduzido seus textos.

4. Mestre ou diluidor?

Os estudantes dos cursos de Ciências Contábeis e da Com-


putação, de Física e, sobretudo, de Administração compuseram
uma das turmas; os de Serviço Social, outra turma, e, os de Rela-
ções Públicas (que contou com a participação de uma estudante
concluinte de Psicologia), outra. Desta, emergiu uma comunicação
sobre o tema plágio que evidenciou o cuidado ao mencionar fontes
consultadas. Também foi a turma da qual mais se pode coletar
relatos sobre o tema plágio confrontado à apresentação de comu-
nicação que abordou esse tema (por essa razão, os trechos que
apresentamos a seguir, referem-se particularmente aos relatos ela-
borados por essa turma). Com o objetivo de despertar nos estu-
dantes uma consciência acerca das implicações resultantes de não
fazer uso das ideias de outros de forma responsável, a estudante
de Psicologia juntamente com outra de Relações Públicas encarre-
garam-se de apresentar a comunicação que envolveu o tema plá-
gio nesta turma. Assim como as comunicações realizadas por ou-

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tros colegas de classe, envolvendo outros temas, a exemplo de re-


sumos críticos, descritivos, informativos, ensaio, monografias etc.,
essa comunicação sobre plágio foi realizada em torno de vinte mi-
nutos, seguida por debate com a turma. O tratamento dado ao
tema pela equipe – não necessariamente pelo fato de que uma das
estudantes fosse concluinte, mas provavelmente por esta já ter
vivenciado mais práticas de escrita, ao longo de sua graduação – é
perceptível aos olhos de um dos estudantes que assistiu à comuni-
cação:

Umas das comunicações mais impactantes da noite foi sobre


Plágio. Através do exposto em sala de aula pelas colegas, as-
similamos que o ato de plagiar trabalhos acadêmicos de ou-
tros autores e agregar a um trabalho nosso sem as devidas
citações, configura crime à constituição brasileira. (SENHOR
EUFÊMICO)

Outros estudantes conseguiram conferir um tom mais parti-


cular aos seus relatos, evidenciando, assim, a sua voz:

O plagio gera inúmeros problemas relacionados à ética e


honestidade na escrita, é um desvio de autoria, pois quem
pratica o plagio se apropria de ideias e palavras que não são
suas sem dar os devidos créditos ao verdadeiro autor. É um
desrespeito ao verdadeiro autor, e ao leitor que estará lendo
uma copia. Plagio é crime e tem penas previstas por lei.
(ANA JULIA).

Já o plágio é um fato polêmico, pois essa prática é utilizada


por pessoas que deseja[m] facilitar sua vida com pensamen-
tos que não lhe pertencem, ou seja, o plagiador toma posse
do pensamento do autor da obra. (JOSY).

No exemplo a seguir, verifica-se o cuidado da estudante, ao


referenciar o autor consultado:

É importante frisa[r] que se entende, como Vasconcelos (s.d.)


expõe, que quando um sujeito transforma seus pensamentos

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e ideias em palavras, em frases, esta construção linguística é


de propriedade deste [...]. (SOFIA).

‘Quando um autor escreve uma determinada sequência de


palavras ou frases expressando uma determinada ideia, esse
autor, de fato, é dono de tais construções e ideias. Portanto, a
utilização de tais palavras sem a devida atribuição ao autor
se configura roubo.’ (VASCONCELOS, s.d.).

Outros estudantes, no entanto, por vezes, reproduziram em


seus relatos trechos recorrentes nas próprias leis ou textos que tra-
tam do assunto, conforme ilustrados no subtópico anterior. Nessa
mesma turma, devido à apresentação recorrente de citações retira-
das de fontes desconhecidas na internet, houve até um momento
para uma discussão sobre o valor dado, ainda que inconsciente-
mente, a tais textos e seus respectivos autores, em detrimento de
toda uma gama de pesquisadores que, a exemplo destes graduan-
dos, certamente levaram anos estudando numa universidade, por
vezes, conciliando trabalho com uma jornada de estudos para che-
gar onde chegaram, merecendo, portanto, respeito da academia e
de quem venha a fazer uso de suas ideias. Certamente, tal postura
conferiria mais confiabilidade e, por conseguinte, mais autentici-
dade aos textos acadêmicos.
Para tanto, uma vez mais, ressalte-se o papel da tomada de
consciência nesse processo envolvendo produções textuais. A dis-
cussão mencionada acima deve ter surtido algum efeito, levando-
se em conta que os fragmentos dos relatos sobre plágio ora apre-
sentados foram elaborados posteriormente à apresentação oral
envolvendo plágio, desenvolvida pelas colegas de classe.
Estabelecer uma fronteira entre o que possa ser considerado
como prática de plágio e o que provavelmente já faça parte de uma
memória coletiva, eis um desafio. Até que ponto termos como
“sem colocar os créditos” ou “previsto no código penal”, presentes
em alguns relatos, podem se configurar em práticas de plágio?
Muitas vezes não há como simplesmente deixar de utilizar certos
termos ou mesmo substituí-los por outros muito próximos. Con-
forme sinalizado, a questão então é conseguir distanciar-se das
fontes consultadas, a ponto de elaborar um texto que seja na reali-

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dade fruto do raciocínio do próprio estudante. Muito embora faça


uso de termos encontrados em outras fontes, tais palavras insur-
gem numa construção única, que evidencia o modo de pensar da
pessoa que elabora tal texto. Assim, não é apenas uma questão de
ideias ou termos idênticos ou semelhantes, mas como tais ideias
ou termos são tratados, expostos, apresentados.
O relato a seguir, serve de exemplo, uma vez que sugere
autenticidade:

Plágio é quando você fala que uma coisa é sua, e na verdade


não é, um artigo, por exemplo, a pessoa vai à internet e pega
um artigo seu e coloca o nome dela, isso é plágio, previsto
em lei pessoas que cometem tal ato podem ser penalizadas.
(Ana Nóbrega).

O estudante que faz uso de sua maneira própria de dizer as


coisas, certamente tem mais chances de se desenvolver na escrita,
mesmo que, inicialmente, esse texto não se apresente com uma
linguagem acadêmica típica.
Ademais, acredita-se que a oscilação entre referenciar, alte-
rando algumas palavras, e não modificar palavra alguma, sem as
devidas referências, num processo de aprendizagem colaborativa,
em que um estudante sirva de espelho para o outro, pode revelar,
nas produções textuais desses estudantes, esse despertar para o
cuidado ao lidar com ideias ou textos de outrem.
Conforme Authier-Revuz (2004, p. 69):

Todo discurso se mostra constitutivamente atravessado pe-


los “outros discursos” e pelo “discurso do Outro”. O outro
não é um objeto (exterior, do qual se fala), mas uma condição
(constitutiva, para que se fale) do discurso de um sujeito fa-
lante que não é fonte-primeira desse discurso.

É nessa inter-relação eu-tu, tanto entre o professor e os estu-


dantes quanto entre estudante(s) e estudante(s), que se advoga
neste trabalho a colaboração e a apreensão de conceitos tendo em
vista o uso devido do discurso do outro, favorecendo, inclusive, o
estabelecimento da fronteira necessária para que o “eu” então se
coloque, se posicione perante o outro e para si.
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5. Preciso é o tom

Em entrevista concedida ao jornal O Globo, em abril de


2008, o profissional da área de tradução, Ivo Barroso, ao comentar
certa fraude, envolvendo a prática de plágio, chega a apresentar as
seguintes palavras:

São casos incontestáveis, com repetições extensas demais pa-


ra serem coincidências. Na poesia isso é especialmente claro,
porque há questões como a escolha do adjetivo, da colocação
do verbo, do ritmo, da sinonímia, que já tornam difícil que
dois tradutores traduzam dois versos seguidos da mesma
forma. Quando você encontra então 160 versos iguais, não
tem como não ter certeza.

Essas palavras servem como um termômetro para mensurar


o grau de autenticidade perseguido/atingido pelos estudantes ao
elaborarem textos acadêmicos. Tem-se confundido o termo “fazer
usos de suas próprias palavras”, tomando-o literalmente, ou va-
lendo-se disso para fazer uso de ideias de outrem como suas,
quando tão simplesmente bastaria o uso de referências. Igualmen-
te, tem-se acreditado parafrasear, quando na realidade, a simples
troca de termos não tem conferido muito para uma autêntica res-
significação textual. Portanto, parafrasear tem que ver com “dizer
o que o outro disse”, porém, numa lógica de raciocínio que lhe seja
própria, e não conforme a do outro que está sendo parafraseado,
posto que cada ser tem um jeito de pensar, de se expressar, de ex-
pressar suas ideias e reconfigurar a dos outros.
A despeito dos poucos desvios em relação aos textos origi-
nais, alguns estudantes conseguem deixar sua marca nos textos
que elaboram. Quando não, uma única palavra do próprio estu-
dante acaba diluindo-se em meio às demais provenientes de outra
fonte, o que atesta, parafraseando o conhecido poeta português
Fernando Pessoa, que o tom é preciso, o produzir não é preciso...

Referências

AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Entre a Transparência e a Opacidade: um


estudo enunciativo do sentido. Porto Alegre: Edipurcs, 2004.

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BAKHTIN, Mikhail Mikhailovitch. Estética da Criação Verbal. Introdu-


ção e tradução do russo: Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo : Martins Fontes,
2003/1992 [1979]. 476 p.
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de Linguagem, textos e discursos:
por um interacionismo sociodiscursivo. Tradução: Anna Rachel Machado
e Péricles Cunha. São Paulo : EDUC, 1999. 353 p.
CAMPOS, Augusto de. As Antenas de Ezra Pound. In: POUND, Ezra.
ABC da Literatura. 3. ed. São Paulo: Editora Cultrix, 1977. p. 10-11.
FURLAN, Mauri. Brevíssima História da Teoria da Tradução no Ociden-
te: I – Os Romanos. In: Cadernos de Tradução. Florianópolis : NUT, 2001,
v. 2, n. 8, p. 11-28.
HORÁCIO. Arte Poética. In: A Poética Clássica. Trad. por Jaime Bruna.
12. ed. São Paulo: Editora Cultrix, 2005. p. 59.
O GLOBO. Muito em Comum: tradutores brasileiros denunciam plágios
em série e organizam movimento de protesto. Caderno Prosa & Verso. 19
abr 2008.
QUINTO HORÁCIO FLACO (65 a 8 a. C.). Ars Poetica. Disponível em:
<http://www.thelatinlibrary.com/horace/arspoet.shtml>. Acesso em:
05 ago 2013.
SILVA, Obdália Santana Ferraz. Entre o Plágio e a Autoria: qual o papel
da universidade? In: Revista Brasileira de Educação, v. 13, n. 38,
maio/ago 2008.
VOLOCHÍNOV, V. N. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Trad. de
Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 14. ed. São Paulo : Hucitec,
1979/2010. 203 p.

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Sobre os autores

Alessandra Souza Silva é Mestre em Linguagem e Ensino no Con-


texto de Língua Materna (2016/UFCG) e Graduada em Letras-
Português com ênfase em escrita acadêmica (2014/UEPB). Atua na
educação básica com o ensino de produção textual.

Bruno Salgado Cole é Mestre profissional em Matemática (2013)


pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e
Graduado em Licenciatura em Matemática (2005) pela Univer-
sidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente é professor efetivo,
com dedicação exclusiva, junto ao Instituto Federal de Educação,
Ciências e Tecnologia do Piauí (IFPI), Campus Parnaíba, onde atua
nos cursos de Licenciatura em Química e Física.

Evandro Gonçalves Leite é Graduado em Letras Português


(UERN), especialista em Linguística Aplicada (UERN), especialista
em Ebducação Profissional Integrada à Educação Básica na Modal-
idade Educação de Jovens e Adultos (IFRN), mestre em Linguísti-
ca (UFPB) e doutor em Letras (UERN), com tese premiada com
Menção Honrosa no Prêmio CAPES de Tese - Edição 2020, na área
de Linguística e Literatura. Atua como professor de Língua Portu-
guesa e Literatura no IFRN – Campus Pau dos Ferros.

Fabiana Ramos é Doutora em Linguística (2015) e Mestre em Lín-


gua Portuguesa (1999) pela Universidade Federal da Paraíba
(UFPB). É professora adjunta do curso de Pedagogia da Unidade
Acadêmica de Educação e do Programa de Pós-graduação em
Educação (PPGEd) da Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG). Atualmente, orienta pesquisas voltadas para o ensino de
leitura, a abordagem do texto literário infantil e a formação do
professor. É também membro do Grupo de Estudos em Letramen-
tos, Interação e Trabalho (GELIT/UFPB).

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Florencia Miranda é Doutora em Linguística (Especialidade de


Teoria do Texto) pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas,
Universidade Nova de Lisboa (UNL), 2007. Fez pós-doutorado na
UNL de 2008 a 2013, com bolsa da FCT (Portugal). Professora Titu-
lar na Licenciatura em Português da Universidad Nacional de Ro-
sario (UNR, Argentina), desde 1996. Professora do Doutorado em
Linguística e Línguas da UNR. Foi Presidente da Associação Ar-
gentina de Professores de Português e é Coordenadora do Núcleo
PELSE da AUGM. Pesquisadora e líder de projetos de pesquisa do
Centro de Estudos Comparativos da UNR.

Francisco Edson Gonçalves Leite é Graduado em Letras Inglês


(UERN), Mestre em Letras (UERN) e Doutor em Letras (UERN). É
professor Adjunto II da UERN, na área de Teoria da Literatura.

Iara Francisca Araújo Cavalcanti Doutora em Linguística pelo


PROLING/UFPB (2015), Mestre em Ciências da Sociedade pela
UEPB (1999), Especialista em Língua Portuguesa pela UFPB (1995)
– Campina Grande – PB, e Graduada em Letras Português/Inglês
pela UEPB (1992). É professora titular da UEPB, do curso de Letras
Português e, atualmente, coordena o respectivo curso, no campus I
- Campina Grande - PB. Desenvolve pesquisas na área de
Linguística Aplicada, com o foco na formação de professores de
línguas, Estágio Supervisionado e Letramentos. Coordena o PIBID
(2017/2018) e (2020/2022) e o Idiomas sem Fronteiras (IsF) da IES
onde leciona. É membro dos Grupos de pesquisas GELIT/Proling
– UFPB e do LITERG na UEPB.

Joelma da Silva Santos é Doutora pelo Programa de Pós-


Graduação em Linguística (PROLING) da Universidade Federal
da Paraíba (UFPB), Mestre em Linguagem e Ensino pela Univer-
sidade Federal de Campina Grande (UFCG), graduada em Letras
Português pela UFPB, pedagoga pela UFCG e professora efetiva
da rede municipal de ensino da cidade de Campina

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Grande. Atualmente atua como assistente à Docência pela UFPB


EAD.

Linduarte Pereira Rodrigues é Doutor em Linguística


(2011/UFPB), mestre em Linguística e Língua Portuguesa
(2006/UFPB) e professor do Departamento de Letras e Artes e do
Programa de Pós-Graduação em Formação de Professores da Uni-
versidade Estadual da Paraíba (Campus I). Atua com ensino e
pesquisa em estudos semântico-pragmáticos, discursivos e
semióticos, bem como em práticas de letramento mediadas por
gêneros textuais com ênfase na formação docente. É líder do grupo
de pesquisa Teorias do sentido: discursos e significações (TE-
OSSENO-CNPq/UEPB).

Patrícia Barreto da Silva Carvalho é Doutora em Linguística pela


UFPB, professora de Língua Portuguesa do IFPE, vencedora dos
Prêmios: Educadora Nota 10 (2019), Melhor Projeto de Educação
do Brasil pela Fundação Victor Civita (2019) e Prêmio Alpha Lu-
men em Criatividade Educacional (2020). Atua na Educação Fed-
eral Profissional (Educação Básica e Pós-graduação) com Ensino,
Pesquisa e Extensão. É professora convidada do ProfLetras da
Universidade de Pernambuco.

Poliana Dayse Vasconcelos Leitão é Pós-Doutora pelo Programa


de Pós-Graduação em Linguística (PROLING) da Universidade
Federal da Paraíba. Atuou como pesquisadora do Projeto Ateliê de
Textos Acadêmicos (ATA) e do Grupo de Pesquisa Letramento,
Interação e Trabalho (GELIT). Tem experiência profissional em
Educação Infantil, Educação Básica, Educação de Jovens e Adultos
e no Ensino Superior. Suas produções acadêmico-científicas cen-
tram-se nos temas: formação de professores, letramento científico,
construção de conhecimento e autoria. Atualmente, é professora
da disciplina Língua Portuguesa na Rede Municipal de Ensino de
João Pessoa.

Raquel Basílio da Cunha Dias de Melo é Doutora em Letras pela


UFPB (2010) onde atua como docente no Departamento de Língua

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Portuguesa e Linguística (DLPL-UFPB). Possui experiência na área


de Linguística Teórica e Aplicada com interesse nos estudos sobre
a interação escrita e o ensino de línguas mediado por tecnologias
digitais. Atualmente está vinculada ao Projeto Ateliê de Textos
Acadêmicos (ATA) onde realiza pesquisas voltadas para a di-
datização dos gêneros acadêmicos.

Regina Celi Mendes Pereira é Doutora em Letras pela Univer-


sidade Federal de Pernambuco (UFPE/2005), professora Associada
IV do Departamento de Língua Portuguesa e Linguística da Uni-
versidade Federal da Paraíba (DLPL/UFPB) e atua no programa
de Pós-Graduação em Linguística (PROLING) e no Mestrado
Profissional (MPLE). É pesquisadora 1D do CNPq, líder do
GELIT/CNPq, membro do grupo Análise da linguagem, trabalho
e suas relações (ALTER/USP) e editora da Revista Prolíngua e
Coordenadora da sede da Cátedra UNESCO de Leitura e Escritura
no Brasil.

Renata de Lourdes Machado da Costa é Licenciada (2004) e


Graduada (2005) em Psicologia pelo Centro Universitário de João
Pessoa (UNIPÊ). Mestre (2014) e Doutora (2018) pelo Programa de
Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal da Paraí-
ba (PROLING/UFPB). É psicóloga na Clínica-Escola de Psicologia
da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Desenvolve pesquisas
e publica na interface Linguística-Psicologia/Psicanálise.

Roziane Marinho Ribeiro é Doutora em Linguística, com pós-


doutorado pela Universidade Nova de Lisboa. Atua como profes-
sora da Graduação e Pós-Graduação, na Universidade Federal de
Campina Grande/PB, estando vinculada à Unidade Acadêmica de
Educação e ao grupo de pesquisa Práticas Educativas e Letramen-
tos (UFCG/CNPq). Desenvolve trabalhos de ensino e pesquisa
com foco nas práticas de letramento, gêneros textuais e ensino da
oralidade. É autora de artigos e livros, entre eles, A construção da
argumentação oral no contexto de ensino, publicado pela Editora
Cortez.

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Socorro Cláudia Tavares de Sousa possui mestrado e doutorado


em Linguística pela Universidade Federal do Ceará (2004, 2009).
Professora do Departamento de Língua Portuguesa e Linguística
(DLPL/UFPB) e do Programa de Pós-Graduação em Linguística
(PROLING/UFPB). Tem interesse nas áreas de Linguística de Tex-
to e Política e Planejamento Linguístico. É líder do Núcleo de Es-
tudos em Política e Educação Linguística (NEPEL).

Tatiana Fernandes Sant´ana é Graduada (2001), Mestre (2004) em


Letras e Doutora em Linguística pela Universidade Federal da
Paraíba (2016); vinculada do grupo de estudos GELIT/PROLING-
UFPB; experiência na área de Linguística Aplicada; professora da
Universidade Estadual da Paraíba, no curso de Letras-Português,
desde 2006; pesquisa principalmente sobre os temas: prática de
letramentos (escolar e acadêmico), estágio supervisionado,
formação de professor (inicial e continuada), construção de iden-
tidades e trabalho docente.

Webert Cavalcante Barros é Doutor e Mestre em Linguística


(2011), pelo PROLING/UFPB. Graduado em Letras-Francês (2011)
e em Línguas Vernácula e Inglesa (2007), pela UFPB, onde atuou
como Professor Temporário de Português, pelo DLCV, em 2012, e,
desde 2010, como tutor a distância no curso de Letras Virtual.
Atuou como professor de Português e aplicador do Exame de
Proficiência em Língua Portuguesa (Celpe-Bras), no Programa
Linguístico-Cultural para Estudantes Internacionais (PLEI), na
UFPB, de 2005 a 2012.

SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-084-0

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