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Brincar e Jogar - Dimensões Teóricas e Práticas (LK)
Brincar e Jogar - Dimensões Teóricas e Práticas (LK)
(Organizador)
2021
Fortaleza - Ceará
Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida
(Organizador)
2021
Fortaleza - Ceará
Brincar e Jogar: Dimensões Teóricas e Práticas
© 2021 Copyright by Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida.
Todos os direitos reservados.
ISBN 978-65-89027-02-7
21-66193 CDD-371.397
MARCOS TEODORICO
PINHEIRO DE ALMEIDA
CAPÍTULO 20......................................................307
CAPÍTULO 15......................................................223 A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E
O XADREZ PEDAGÓGICO: PROPOSIÇÕES EPISTE- BRINCANTES
MOLÓGICAS E METODOLÓGICAS Isabella de Moraes Ribeiro
Rogério de Melo Grillo Natasha Moutinho Geada
Regina Célia Grando Maria Vitória Campos Mamede Maia
9
CAPÍTULO 33......................................................405
O BRINCAR NO ISOLAMENTO HOSPITALAR PEDIÁ-
TRICO
Stéfany Bruna de Brito Pimenta
Sandra de Fátima Barboza Ferreira
CAPÍTULO 34......................................................413
O BRINCAR NOS ESPAÇOS ESCOLARES: UMA ANÁ-
LISE SOB A PERSPECTIVA DOS DIREITOS HUMANOS
Brunella Poltronieri Miguez
Ana Karyne Loureiro Furley
Hiran Pinel
CAPÍTULO 35......................................................422
O ENSINO LÚDICO DE CIÊNCIAS ATRAVÉS DE EXPE-
RIMENTOS DE BAIXO CUSTO
Milena Lira Rocha
Breno Aragão dos Santos
Nicolas Rui Cruz da Silva
CAPÍTULO 36......................................................434
O FUTSAL COMO MEIO DE PROMOÇÃO DA SAÚDE
EM UM PROJETO SOCIAL
Namir da Guia
Lídia Andrade Lourinho
CAPÍTULO 37......................................................443
PURPOSYUM: DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA A
JUSTIÇA
Gilson Schwartz
CAPÍTULO 38......................................................451
RECORDAR É VIVER AS BRINCADEIRAS DE INFÂN-
CIA: UM RESGATE DA CULTURA POPULAR
Maria Cícera dos Santos Barbosa
Maria José de Brito Araújo
11
P
refácio
Federal do Ceará, coordena projetos de extensão
focados na ludicidade, como o Laboratório de
Brinquedos e Jogos (LABRINJO) e o projeto de
Apresentação
direito básico da criança. Seguindo os objetivos
da Declaração Universal dos Direitos da Criança
em 1959, aprovada nas Nações Unidas (ONU).
´
morar e celebrar o Dia Internacional do Brincar
através de diálogos científicos com estudiosos,
experts e pesquisadores sobre o tema. Além dis-
so, alguns objetivos específicos foram abordados:
O Livro BRINCAR E JOGAR: DIMENSÕES
i) Compartilhar informações teóricas e estudos
TEÓRICAS E PRÁTICAS aborda a temática do
científicos, além de experiências em torno do brin-
lúdico dentro de diferentes fatores, mas o valor
car; ii) Favorecer o desenvolvimento dos vínculos
principal da obra é abordar o brincar enquanto um
afetivos e sociais positivos, condição única para
direito básico e necessário para todos. O brincar
que possamos viver em grupo, de forma pacífi-
e o jogar favorece o multiculturalismo, a diversi-
ca; iii) Promover experiências e vivências lúdicas
dade, a inclusão, a sociabilidade, enriquece o uni-
com os participantes do encontro. iv) Favorecer
verso informacional infantil, fomentando a cultura
o multiculturalismo, a diversidade, a inclusão, a
da não violência.
sociabilidade, fomentando as relações pacíficas;
O livro foi dividiodo em duas partes: Parte 1 -
v) Construir valores aproximando as pessoas e
temos os capítulos dos palestrantes e convidados
emancipando pensamentos; vi) Divulgar o brincar
do 4º Encontro Cientifico do Dia Internacional
como direito básico de todos.
Brincar e na Parte 2 – Trabalhos aprovados e
Sabemos que o brincar, em suas diferentes for-
apresentados no 4ºECDIB. Este evento foi pro-
mas, certamente desempenha papel essencial na
movido, realizado e organizado pelo Instituto Ne-
construção das relações pacíficas, contribuindo
xos e o Museu do Brinquedo de Fortaleza no for-
positivamente para o desenvolvimento humano
mato online nos dias 27, 28 e 29 de maio de 2021.
pelas diferentes formas com se apresenta, seja
O 4ºECDIB foi um evento de natureza científi-
nos jogos tradicionais mais simples ou nos mais
ca para discussões e reflexões sobre o brincar e a
sofisticados, nos jogos de construção, nos jogos
infância em comemoração ao Dia Internacional do
de faz de conta, nos jogos e brinquedos educati-
Brincar. Este dia foi criado pela ITLA (International
vos e nas diferentes brincadeiras, nos jogos co-
Toy Library Association), já há alguns anos o mês
operativos ou competitivos, nas mais variadas
de maio tem sido consagrado à comemoração lú-
manifestações culturais e até mesmo na elabora-
dica e à valorização do brincar em diferentes paí-
ção dos materiais lúdicos sejam eles estruturados
ses do mundo, inclusive no Brasil. O Brincar é um
15
ou não estruturados. Apesar de constituírem um cem. Ao brincar, a criança poderá desenvolver ca-
avanço, as atividades lúdicas e culturais, do brin- pacidades e despertar habilidades. O brincar traz
car livre, do brincar pelo prazer de brincar, ainda muitos benefícios para a criança:
não tem a devida importância dos diferentes ato-
res que compõem o cenário brasileiro. Atualmente 1. Estimula a atenção e a concentração;
este evento é uma referência para as universida- 2. Aumenta a memória;
des, escolas, prefeituras, famílias e a comunidade 3. Desperta a imaginação, a fantasia e a imi-
como um todo, e principalmente, que seja visto tação;
como um dia de descoberta, fantasia, aprendiza- 4. Convida à exploração, à criatividade e ao
gem, inclusão, cidadania, interações e ludicidade. conhecimento;
Para nós, uma criança que brinca é uma criança 5. Ajuda a criança a expressar-se e a melho-
feliz. Porque brincar é um direito. rar a sua linguagem;
Assim, consideramos que o jogo, a brinca- 6. Ajuda a criança a fazer amigos e a conviver;
deira e o brinquedo podem ser englobados em 7. Aumenta a autoestima e a autoconfiança;
um universo maior, chamado de Cultura Lúdica. 8. Proporciona autonomia e sentido crítico.
Não queremos engessar os termos e sim ampliar 9. Ensina a compartilhar, a colaborar e traba-
a perspectiva lúdica em diferentes contextos e lhar em equipe;
saberes sem limitar o ato de brincar na hora da
10. Ensina a competir e cooperar.
experiência lúdica. Sabemos que a linguagem
cultural própria da criança ontem, hoje e amanhã
Acreditamos que todo ser humano deve ter tem-
é o brincar. A criança comunica-se através dele e
po para estudar, para comer, para dormir. como
por meio dele irá ser agente transformador, sendo
também para brincar. O brincar é um direito essen-
o lúdico um aspecto fundamental para se chegar
ao desenvolvimento integral da criança. cial e uma necessidade básica dos indivíduos. O
O brincar é uma das atividades mais comuns brincar é a forma mais completa que a criança tem
da infância. O brincar diverte, educa, valoriza, so- de comunicar-se com os outroa, o meio ambiente
ciabiliza e influi positivamente no comportamento e consigo mesma. Por isso é tão importante que a
e na formação das crianças. A essência do Brin- experiência lúdica também tenha o seu espaço e
car começa na infância, todas as crianças, desde o seu momento durante o dia. Para brincar não é
que nascem, brincam naturalmente. Brincar não necessário ter brinquedos caros ou grandes quan-
só diverte como também educa as crianças. Os tidades de materiais lúdicos, o mais importante é a
brinquedos e as brincadeiras são conteúdos per- intensidade, a qualidade, o tempo e o espaço das
feitos para estimular os bebês, desde que nas- interações e das experiências lúdicas.
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A melhor brincadeira ou brinquedo são os que Para nós, uma criança que brinca é uma crian-
convidem as crianças a explorar ou que as permi- ça feliz. Porque brincar é um direito! Negar o di-
tam expressar-se através do seu corpo, dos seus reito de brincar é negar o direito de viver, brincar
gestos, sentidos e da sua imaginação, estimu- é sinônimo de vida. Brincar é VIDA!
lando assim a sua criatividade e curiosidade. As
melhores brincadeiras são as que não custam di- Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida
nheiro e que mais divertem e chamam a atenção Organizador
das crianças. E o mais importante: “é através do
brincar a criança pode aprender o que mais nin-
guém lhe pode ensinar”. O ato de brincar lhes en-
sina valores morais e culturais que muitas vezes
não reside nos exemplos dos pais, professores ou
instituições. É através da atividade lúdica que as
crianças se preparam para a vida. Além de tudo
isso, o brincar pode:
FREUD, S. (1920) Mas alla del principio del placer. In: PIAGET, J. (1923) Le langage et la pensée chez l’en-
FREUD, S. Obras Completas. Trad. De Luiz Lopez- fant. 3. ed. Neuchâtel-Paris: Delachaux et Niestlé, 1948.
30 1
______. (1926) La représentation du monde chez l’en-
INTRODUÇÃO
Alain
CAPÍTULO 2
tivas “alternativas”, o jogo é interditado na escola.
Zaim-de-Melo, Santos Rodrigues e Grillo (2021)
corroboram ao alegar que o jogo ainda permaneça
denegado na escola institucionalmente, contudo,
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
temologia) e de ensino- aprendizagem (didática), faz referência a uma pedagogia do jogo que co-
torna-se o mediador do conhecimento escolariza- meça, passe e termine no próprio jogo. Não é o
do (pedagogia). caso aqui de demonizar as pedagogias do jogo
De forma bem genérica, pode-se afirmar que a para o esporte, lutas, teatro, xadrez etc., ao in-
mediação se refere a um elemento intermediário vés, intentamos evidenciar a necessidade de uma
entre dois elementos, conectando-os numa rela- pedagogia do jogo pelo/para o jogo, como apon-
ção triádica e, entrementes, inibindo uma relação ta Grillo (2012; 2018). Ademais, Michelet (1985)
direta entre eles (DOMINGUES, 2010). De acordo sugere que para a necessária pedagogia do jogo
com Pino (1991; 2003; 2005) e Oliveira (1993), é fundamental uma formação docente condizente
a epistemologia (possibilidade do conhecimento) com a complexidade do tema. Diante disso, para
se dá por dois tipos de mediadores: instrumentos uma efetiva mediação do jogo é preciso estudar
e os signos. No âmbito educacional (socialização as teorias de jogo e lúdico, as funções, implica-
do conhecimento), além da mediação instrumen- ções, derivações e os papel do jogo na educação.
tal (trabalho) e por signos (semiótica), há a me- O objetivo do presente capítulo é avultar o de-
diação pedagógica onde professor se torna o elo bate sobre as competências para uma formação
entre o conhecimento escolarizado (selecionado, docente condizente com uma pedagogia do jogo
organizado, problematizado e avaliado) e os sa- pelo e para o jogo. De maneira mais específica
beres das experiências dos estudantes. Segun- discutimos a noção de consciência de jogo a par-
do Grillo (2012; 2018), um dos conhecimentos tir do aporte teórico da fenomenologia e as bases
pertinentes à educação escolarizada é o jogo e de uma didática de jogo pelo e para o jogo, avul-
o lúdico, entrementes, esse conhecimento ainda tando, desse modo, as competências necessárias
não é “levado a sério” na escola, incidindo, deste para lidar didaticamente com a noção de consci-
modo, na formação de professores atinente à pe- ência e pedagogia do jogo.
dagogia, didática e mediação de jogo (GRILLO;
NAVARRO; SANTOS RODRIGUES, 2020). O conceito de consciência na tradição fe-
Na visão de André Michelet (1985, p. 123): “Si nomenológica
se quiere introducir el juego en la escuela, hay que
proceder necesariamente a la reestructuración de O jogo só pode ser realmente compreendido e
una pedagogía que se nutra de esos aportes e vivenciado na sua totalidade por quem se deixa
interrogantes, lo que exige una nueva formación tomar por ele.
del personal docente.” Os aportes e interrogações François Euvé
33 2
A fenomenologia remete à Antiguidade grega, tanto, da confluência entre o sujeito que percebe
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
foi um termo citado por pensadores da enverga- e o objeto da percepção, logo, um encontro que
dura de Kant e Hegel, mas é com o matemáti- se materializa numa vivência. Destarte, é a partir
co e filósofo Edmund Husserl (1859-1938) que da intencionalidade imbricada na perspectiva da
logra um lugar de especial destaque na história vivência (experiência viva) que emerge o conceito
do pensamento filosófico ocidental (DARTIGUES, de consciência como um modo de ser-no-mundo
1973). Resumidamente, pode-se dizer que o pro- propriamente humano.
jeto husserliano foi a proposição de uma filosofia Para Silva (2009), a consciência husserliana é
com rigor de ciência (MERLEAU-PONTY, 2006) entendida como: i) “entrelaçamento das vivências
que, ademais, impactou o pensamento de auto- psíquicas empiricamente verificáveis numa uni-
res como Heidegger e Fink, na Alemanha; Sartre dade de fluxo de vivência”; ii) “percepção interna
e Merleau-Ponty, na França; Buytendijk e outros, dessas próprias vivências”, e; iii) “designação de
na Holanda (SANTOS RODRIGUES; NAVARRO; todas as vivências intencionais”. Essas definições
GRILLO, 2021). Um dos conceitos basilares da estão entrelaçadas e, deste modo, podemos en-
fenomenologia husserliana é o de intencionalida- tender a consciência como o processo intencional
de que, por sua vez, está concatenado ao concei- de estar direcionado ao mundo, às coisas e aos
to de consciência. outros, constituindo a vivência. Coelho Jr. (2002)
alega que Merleau-Ponty (1908-1961), filósofo
O princípio da intencionalidade é que a consci-
ência é sempre “consciência de alguma coisa”, francês de meados do século XX, é quem apro-
que ela só é consciência estando dirigida-para fundará no estudo da consciência, sem deixar de
um objeto (sentido de intentio). Por sua vez, o incorporar alguns “recuos críticos”, como denomi-
objeto só pode ser definido em sua relação com na Depaz (2011).
a consciência, ele é sempre objeto-para-um-su-
Segundo Coelho Jr. (2002), Merleau-Ponty assi-
jeito (DARTIGUES, 1973, p. 24, grifos do autor).
nala que a consciência intencional de Husserl em-
Nesse sentido, a consciência não é um estado bora evidencie a interdependência do sujeito com
ou condição que o sujeito adquire, é, por outro o mundo e vice-versa – dado em que a consciência
lado, a própria condição ontológica humana em é sempre consciência de (alguma coisa, em rela-
relação ao mundo e às coisas. Para Santos Ro- ção ao mundo) –, ele ainda flerta com o Idealismo.
drigues (2014) a intencionalidade refere-se a um Dito em outros termos: “[u]ma consciência como a
vetor na direção daquilo que é percebido ao mes- proposta por Husserl ainda correria o risco de ‘fu-
mo tempo em que o objeto percebido se doa à gir’ do mundo e assim transformar o mundo em um
percepção daquele que a percebe, trata-se, por- simples correlato do pensamento, das representa-
34 2
ções, retornando assim, a uma filosofia idealista” podem contribuir com a Educação Física. Seguin-
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
(COELHO JR., 2002, p. 99). O Idealismo foi uma do o exemplo exposto, a noção de consciência
perspectiva já superada, entre outros, pelo mate- no viés da Fenomenologia pode contribuir com a
rialismo histórico-dialético de Marx. mediação pedagógica de jogo e, de igual modo,
De modo a evitar a perspectiva idealista, Merle- com a formação de competências docentes para
au-Ponty (2006) avança em direção à consciência mediar o jogo.
perceptiva, pois, para o autor francês a percep-
ção mantém a consciência no plano corpóreo, por Consciência de jogo, sobre o jogo, sobre o
consequência, o corpo a mantém inteiramente em jogar e para além do jogo/jogar
diálogo com e no mundo. Assim, Merleau-Ponty
(2006) afirma que a consciência é percepção e It’s unbelievable how much you don’t know
a percepção é consciência. Diante disso, pode- about the game you’ve been playing all your life.
mos afirmar que a consciência se dá nos diversos - Mickey Mantle.
atos da percepção. Aparentemente, o educador Moneyball
brasileiro a Paulo Freire (1979) também notou a
riqueza teórica dessa noção o que lhe fez apontar Nos estudos de jogo e lúdico, o debate a res-
para os diferentes graus de consciência humana peito do jogo ou comportamento lúdico como algo
derivado dos diversos modos de perceber e se que transcende a condição humana e se encon-
perceber no mundo. tra, também, no mundo animal é algo que mobi-
Essa concepção de consciência como atos lizou estudiosos diversos. Sem adentrar nos por-
de percepção pode ser um aporte teórico impor- menores desse debate que têm a participação de
tante para os estudos no âmbito da educação, autores célebres como, por exemplo, Karl Groos
como sugerem Betti et al (2007), ao tratar das (1898), Buytendijk (1935), Huizinga (2012), entre
implicações da Fenomenologia merleaupontyana tantos outros, nos baseamos na Antropologia de
na Educação Física. O citado texto de Betti et al jogo de Buytendijk (1977) que marca a distinção
(2007) aborda, em linhas gerais, como as noções entre o jogo humano e dos animais. Em poucas
de intencionalidade temática e intencionalidade palavras, o autor holandês assinala que aquilo
operante depreendidas como reflexão sobre a que marca a distinção do jogo humano do com-
experiência já vivida (saber do objeto e saber so- portamento lúdico animal é a consciência do jo-
bre o saber) e a visada em ato, “em exercício” e gador em relação ao jogo, embora, ele, o jogador,
anterior à reflexão (“pré-reflexiva”), um amálgama não saiba que o ser do jogo é o próprio jogo, como
espaço-temporal, respectivamente; e como elas argumentam Buytendijk (1977) e, posteriormente,
35 2
Gadamer (1997) como a ideia de “assenhoramen- Essa capacidade humana de distinguir a fan-
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
to do jogador”. tasia, ilusão ou aparência da realidade cotidiana,
Conforme Santos Rodrigues, Navarro e Grillo racional e objetiva, noutros termos, a capacidade
(2021), Buytendijk (1977) marca o princípio da humana para distinguir o que é a intencionalidade
consciência de jogo como noção basilar para a de jogo em contraste à intencionalidade cotidiana
concepção do jogo humano. Para apreender a é uma construção social. Na esteira de pensa-
argumentação do autor holandês, é preciso en- mento de Buytendijk (1935; 1977), tal capacida-
tender que a epistemologia na vertente fenome- de depende de fatores biopsicológicos e sociais
nológica difere de outras concepções, pois ela e emerge na criança por volta dos quatro anos de
se baseia na premissa de múltiplas realidades na idade, embora, autores na linha de pensamento
qual o cotidiano é, tão-somente, a realidade mais de L. S. Vigotski afirme que a capacidade sim-
evidente ou aquela que “bate mais forte” (está aí, bólica depende de fatores atrelados à filogênese
à disposição) na nossa percepção, por isso que (história da espécie), ontogênese (história do in-
ela é denominada de “realidade” (BERGER; LU- divíduo), sociogênese (história dos processos de
CKMANN, 1985). Nesse sentido, o jogo está numa produção ou trabalho do grupo social) e microgê-
realidade distinta do cotidiano, ele se encontra no nese (história pessoal do processos psicológicos
entremeio entre a fantasia e o real do cotidiano. e das experiências vividas de cada indivíduo) dos
O “ingresso” para o jogo (espaço transicional en- sujeitos (OLIVEIRA, 1993). Em síntese, a cons-
tre fantasia e realidade) é o movimento lúdico ou ciência do jogo que o reconhece como fantasia
vaivém lúdico que para Buytendijk (1977, p. 67) (aparência) e o distingue da realidade (essência),
consiste em “[...] um movimento pendular contí- também é uma construção social, logo, permeada
nuo entre o jogo e a vivência da realidade”. Diante pelo ensino-aprendizagem.
disso, Santos Rodrigues, Navarro e Grillo (2021, Outro ato da percepção sobre o jogo, distinto
p. 28) destacam: da consciência de que o jogo como espaço tran-
sicional entre a fantasia e a realidade, trata-se da
[...] o jogo é um intermediário entre a fantasia e a
realidade da vida cotidiana. Em contraste, o esta- consciência de uma estrutura de jogo. Embasa-
do lúdico consiste na alternância (movimento) da do em autores como Benveniste (1947), Parlebas
aparência à realidade. À vista disso, depreende- (2008), Grillo (2021) e outros, pode-se indicar que
mos que o vaivém lúdico dos animais só permite a estrutura dos jogos diz respeito à ordem condi-
a entrada num “impulso lúdico”, isto é, na ação
cionada pelo objetivo e pelas regras que, comen-
vital do movimento físico. Somente no humano
há uma alternância ou dialética entre a aparência ta Duflo (1997), diz muito mais sobre o que não
e a realidade (princípio da consciência de jogo). se deve fazer do que sobre o que se pode fazer.
36 2
Numa concepção estruturalista dos jogos, Parle- DO, 2006; GRILLO, 2012; 2018), dado que eles
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
bas (2008) apresenta o conceito de lógica interna implicam em atos de consciências distintos que,
referente ao sistema de relações estruturadas e porventura, podem ser concatenados.
estruturantes das condutas dos jogadores. Esse A noção de lógica interna de jogo, embasada
sistema é definido pelas regras e objetivos que em Parlebas (2008), dá azo para se pensar nas
constituem os jogos, embora as condutas dos jo- lógicas externas ao jogo e as implicações da pri-
gadores (lógica de ação) não sejam aprioristica- meira na segunda e, também, da segunda na pri-
mente estruturadas pela lógica interna. meira. Como destaca Freire (2005, p. 99):
O ato de percepção ou consciência de jogo
nesse contexto está atrelado àquilo que é estru- Nada garante que o jogador habilidoso transfira
da situação de jogo para outras situações a inte-
tural no jogo específico que é ou está sendo joga-
ligência que pratica tão bem no campo. [...] Falta
do pelo jogador ou jogadores. Ou seja, nesse ato algo, falta consciência da própria ação, que é
de percepção o centro da questão é saber como por onde devem passar as ações, os conheci-
se joga, sob quais regras e visando qual objetivo, mentos, para serem generalizáveis a campos
embora nem sempre seja possível definir com a não muito vizinhos da ação prática original.
clareza necessária o objetivo ou a lógica interna
Para haver esse princípio de transferência de
do jogo. Isto implica dizer que é possível jogar um
aprendizagem parece ser necessário a intencio-
jogo, ser ou estar consciente de que se trata de
nalidade direcionada àquilo que é suscitado no
um jogo (uma realidade distinta do real do coti-
jogo e mobilizando a memória do jogador (expe-
diano) e, ainda assim, não conhecer com clareza
riência e aprendizagem) que possa transpor, por
a lógica interna desse jogo, portanto, assumindo
uma posição alheia àquilo que é o imperativo das exemplo, para o real da vida cotidiana. É nesse
regras e do objetivo da atividade. princípio da “transferência de aprendizagem”, em-
A situação exemplifica anteriormente permite bora ela não seja direta, que se baseia a perspec-
aventar outro ato da percepção que se distingue tiva do jogo educativo mencionado, entre outros,
pela intencionalidade. Pode-se dizer que a cons- por Freire (2005) e Grillo (2021). Assim, aventa-
ciência da lógica interna de um jogo representa a mos a consciência das implicações do jogo/jogar
consciência direcionada ao “saber sobre o jogo” para além do próprio jogo, isto é, para outras ativi-
(intencionalidade temática) enquanto a consciên- dades que podem ser outros jogos (por exemplo,
cia dirigida ao “saber jogar” implica numa inten- a transferência do arremesso do jogo de “quei-
cionalidade operante, em ato, no jogo. Neste sen- mada” para o jogo de handebol) ou mesmo para
tido, há que se distinguir um ato de “saber jogar outras atividades fora da realidade fantasiosa dos
bem” em contraste ao “saber jogar certo” (MACE- jogos, como a realidade.
37 2
Depreendemos que a falta de clareza sobre ou seja, embora haja menções e alguns indica-
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
esses diferentes modos de consciência pode le- tivos, não há indícios de um reconhecimento do
var professores e educadores a equívocos em jogo como um conhecimento pertinente à escola.
suas ações pedagógicas (mediação), como, por Grillo (2018), destaca que os documentos curricu-
exemplo, não diferenciar uma situação lúdica de lares em relação ao jogo, o concebe tão somente
uma situação de violência e vice-versa, a perda como uma “prática pela prática” (jogo pelo jogo ou
do estado lúdico durante o jogo, a criação de jo- jogo livre) e/ou como “prática utilitária” (jogo dire-
gos e situações lúdicas dentro dos “jogos educa- cionado para o aprendizado de outro conteúdo).
tivos” (jogos dentro do jogo e subversão do ob- Ademais, explanam que tais documentos sugere
jetivo pedagógico), o jogar fora da lógica interna uma natureza educativa imbrincada no próprio
(“café-com-leite”) etc. Portanto, faz-se necessário jogo, secundarizando a mediação e a intencio-
indicar o estudo e compreensão dessa noção de nalidade pedagógica. Não obstante, Grillo (2018,
consciência de jogo pode ajudar professores no p.81) propõe outra perspectiva:
seu processo de mediação de jogo para tanto
Defendemos que é fulcral analisar que o jogo
o professor ou educador possa potencializar as precisa ser intencionalmente planejado e orga-
suas intervenções pedagógicas quanto oferecer nizado para ser utilizado em um contexto educa-
recursos para que seus estudantes possam me- tivo. Com isso, a exploração das possibilidades
lhor se apropriar desse conhecimento histórico- e potencialidades pedagógicas dos jogos está
nas ações intencionais do professor (interven-
-cultural que é o jogo e o lúdico.
ções, variações de jogo e problematizações) e
não nas próprias situações de jogo (isso, por
Uma proposta didático-pedagógica pelo e exemplo, justificaria uma “prática pela prática”
para o jogo na Educação Física escolar com o Jogo).
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
nas para se pesquisarem essas possibilidades proposta em que os estudantes escolhem “livre-
didático-metodológicas para o referido tema, tais
mente” os jogos para serem jogados sem a in-
como o papel do professor na organização da
situação social de ensino (ambiente de aprendi- tervenção do professor ou educador (análogo à
zagem), as formas de mediação semiótica que “aula livre”). Os objetivos da proposição deste
emergem do jogo/brincadeira, quais objetivos, processo podem ser: observação das relações
conteúdos e conhecimentos de que trata o jogo/ sociais dos estudantes, análise dos elementos da
brincadeira na Educação Física escolar. As for-
cultura lúdica do grupo escolar, mapeamento dos
mas de avaliação e valorização da cultura lúdica
das crianças e jovens-estudantes, bem como,
jogos, brincadeiras e comportamentos lúdicos do
de seu contexto histórico-cultural (GRILLO; NA- grupo etc. Deste modo, é vital ressaltar que em-
VARRO; SANTOS RODRIGUES, 2021, p. 410) bora seja uma proposta sem intervenção docente,
ela não é ausente de intencionalidade pedagógi-
Diante da lacuna supramencionada, algumas
ca no sentido de uma consciência dos objetivos a
questões precisariam ser aventadas para con-
serem logrados com esse momento de aula. É im-
cretizar uma proposta de pedagogia e didática
portante não confundir o “jogo livre” com a prática
do jogo pelo/para o jogo que possa ajudar a con-
nomeada como “rola bola” ou “desinvestimento
catenar tanto as diferentes consciências de jogo
pedagógico”. De resto, vale apontar que a “livre
na formação docente. Grillo (2018) aponta como
escolha” dos estudantes também depende de al-
pontos de atenção: o tempo de aprendizagem,
gumas circunstâncias que condicionam a escolha
o estudo e organização didático-pedagógico do
dos jogos tais como a disponibilidade material, a
jogo, a definição de objetivos e recursos didáti-
cultura lúdica na qual os estudantes estão anco-
cos, procedimentos metodológicos (momentos,
rados, os valores escolares que imitem práticas
intervenções, variações etc.), meios e métodos
que possam ocasionar prejuízos à integridade fí-
de avaliação, estratégias didáticas e a mobili-
sica e moral dos estudantes.
zação afetiva para o jogo (aprender a gostar de
No momento do jogo pelo jogo a proposta é
jogo/jogar).
que o professor ou educador engendre as condi-
Em face do que foi exposto, Grillo (2018; 2021)
ções para a vivência de jogos com intervenções
descreve uma proposta para jogo visando sanar
mínimas do professor, apenas para garantir a
as lacunas apresentadas. Para tanto, o autor or-
possibilidade de vivência. O docente, portanto,
ganiza a proposta em cinco movimentos: i) jogo
é o proponente do jogo, mas não tem por intuito
livre; ii) jogo pelo jogo; iii) jogo problematizado; iv)
problematizar o jogo junto às crianças. A inten-
jogo construído; e, jogar com competência.
cionalidade refere-se à vivência, familiarização,
39 2
compreensão da lógica interna (regras e objeti- O movimento denominado de jogo constru-
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
vos) e das possibilidades de ação no jogo (lógica ído, diz respeito ao processo de recriação do
de ação). Isto é, a consciência de jogo está volta- jogo vivenciado no contexto escolar. Em poucas
da para um jogo em específico, sua lógica interna, palavras, trata-se de devolver às crianças a pos-
seu funcionamento etc. sibilidade de criar, recriar e inventar seus jogos e
Na proposta do jogo problematizado o papel ampliar os elementos da sua cultura lúdica. Como
da mediação de jogo é ainda maior, pois o profes- afirma Grillo (2018, p. 86) “[o] ‘Jogo Construído’
sor ou educador pode intervir na proposição dos trata-se de um momento, o qual as crianças se
jogos, mas, sobretudo, nos momentos de reflexão envolvem em situações de construção de jogos,
e problematização das situações de jogo. As pro- a partir dos jogos vivenciados.” Depreendemos
blematizações de jogo podem ser de duas natu- que para alcançar esse processo é preciso uma
rezas: direta ou indireta. As problematizações di- consciência compartilhada de jogo como espaço
retas são dirigidas aos estudantes e podem ser: transicional em que jogo não se confunde com a
questionamento sobre o entendimento de regras, realidade mundana ou mesmo outras manifesta-
a criação de estratégias, problematização de ções lúdicas que não são jogos e/ou brincadeiras
conceitos e valores, documentação de planos ou pertinentes ao contexto escolar.
estratégias de ação, socialização de ideias etc. O movimento de jogar com competência, em
Quanto às problematizações indiretas são inter- síntese, corresponde ao retorno ao jogo. Quer di-
venções orientadas ao jogo, como alteração de zer, é um movimento em que as crianças retornam
regras, variações de jogo, alteração de elementos às situações de jogo vivenciadas anteriormente,
da lógica interna (por exemplo, reduzir o campo sem qualquer tipo de mediação ou intervenção
de ação, o tempo de jogo, as metas etc.). É funda- pedagógica do professor (ou com a mediação
mental nesse processo diferenciar a consciência minimizada). O escopo é analisar quais conhe-
de jogo dos jogadores e a consciência de jogo do cimentos as crianças produziram, após terem vi-
professor/educador, pois é essa distinção que po- venciado o jogo de xadrez de variadas maneiras.
derá constituir o jogo como educativo (aprender
mais do que o próprio jogo). Também se faz ne- ALGUMAS REFLEXÕES
cessário indicar a articulação do jogo problemati-
zado com o “jogo pelo jogo” visando proporcionar O jogo é, talvez, a melhor maneira de preservar
a oportunidade de os estudantes incorporar as a expressividade humana na escola.
problematizações à vivência dos jogos, possibili-
Jean Vial
tando, assim, sua ressignificação.
40 2
Considerando tudo o que foi debatido no pre- pedagógicas do jogo está nas ações intencionais
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
sente texto, iteramos que a nossa proposta pe- do professor (intervenções, variações de jogo e
dagógica indica uma organização didático-peda- problematizações) e não nas próprias situações
gógica para o jogo, de tal modo que transponha de jogo (isso, por exemplo, justificaria uma “prá-
a simples “prática pela prática” com o jogo (jogo tica pela prática” com o jogo). Sob essa perspec-
pelo jogo ou do jogo passatempo) ou a “prática tiva, propugnamos que um dos grandes proble-
utilitária” com o jogo (jogo voltado para outros mas, no que se compete ao jogo no âmbito es-
conteúdos). Nesse entendimento, ainda que haja colar, trata-se dos discursos e práticas que não
alguns estudos e projetos que possuam algumas observam a qualidade do papel do professor em
contribuições, por outro lado, não sistematizam sala de aula.
metodologias de ensino e métodos de avaliação De acordo com Grillo (2018), para se concre-
que fundamentem a prática do professor com o tizar uma proposta didático-pedagógico com o
jogo no contexto da Educação Física escola, ob- jogo, no âmbito da Educação Física escolar, faz-
jetivando à mediação semiótica, às problemati- -se peremptório analisar:
zações e variações de jogo, ao processo de pla-
nejamento, à estruturação das aulas, objetivos, • Tempo pedagogicamente necessário para
recursos didáticos e procedimentos de avaliação. o processo de apropriação e construção do
Ademais, muitos estudos e documentos curri- conhecimento pelos alunos (crianças e jo-
culares não compreendem ou explicitam o jogo vens-estudantes).
não é educativo por si só, dado que para se ter • Estudo e organização dos conteúdos de
esta conotação é basilar que se tenha uma “in- ensino quanto ao jogo.
tencionalidade pedagógica”. Essa intencionali- • Objetivos que se quer atingir.
dade parte da relação didática entre o professor • Recursos didáticos a serem utilizados nas
e o jogo, pelo fato de o professor ser o sujeito aulas.
responsável por organizar as ações pedagógi- • Procedimentos metodológicos (momentos
cas com o jogo. de jogo, intervenções pedagógicas, varia-
Em vista disso, defendemos que é essencial ções de jogo).
analisar que o jogo, na Educação Física escolar, • Formas de avaliação.
na condição de unidade temática, precisa ser in- • Uso de estratégias intentando motivar/mo-
tencionalmente planejado e organizado para ser bilizar os alunos durante as aulas.
utilizado em um contexto educativo. Com isso, a • Valorização e exploração de formas diver-
exploração das possibilidades e potencialidades sificadas de mediação semiótica (conver-
41 2
sação, explicação, problematização, expo- (unidade intelectual-afetiva); à produção de co-
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
sição de problemas, questionamento por nhecimentos e possibilidades de emancipação.
intermédio da fala, demonstração, mode-
los, esquemas teóricos, gestos coaduna- REFERÊNCIAS
dos com a fala, criação de situações-pro-
blema etc.). ALAIN. Reflexões sobre a educação (por) Émile
Chartier. Tradução de Maria Elisa Mascarenhas. São
• Construção de Ambiente de Jogo e Am-
Paulo: Saraiva, 1978.
biente de Aprendizagem. Em outras pa-
lavras, é viabilizar situações que promo- ALVES, R. Conversas com quem gosta de ensinar.
vam um ambiente de jogo que valorize o São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1980.
lúdico, ou seja, aulas no contexto do jogo
e do lúdico. Pari passu, promover um am- BENVENISTE, É. Le Jeu comme structure. Deuca-
lion, n.2, p. 161-167, 1947.
biente de aprendizagem que intencione à
mobilização de saberes e habilidades, à BERGER, P.L.; LUCKMANN, T. A construção social
socialização de ideias, à construção de co- da realidade: tratado de sociologia do conhecimento.
nhecimentos matemáticos e enxadrísticos. Tradução de Floriano de Souza Fernandes. Petrópolis:
Quer dizer, explorando o jogo no contexto Vozes, 1985.
da sala de aula.
BETTI, M.; KUNZ, E.; ARAÚJO, L.C.G.; GOMES-DA-
• Relação professor-alunos e alunos-alunos
-SILVA, E. Por uma didática da possibilidade: impli-
(afetividade e relação com o saber).
cações da fenomenologia de Merleau-Ponty para a
educação física. Revista Brasileira de Ciências do
À vista disso, findamos o presente texto, defen- Esporte, v.28, n.2, p.39-53, 2007.
dendo que é precípuo idear o jogo na Educação
Física escolar, como uma importante manifesta- BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
ção histórico-cultural, em que seu valor educativo, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
para crianças e jovens-estudantes, concerne à Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/
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valorização da expressividade (lúdico), da leitura
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relações entre as funções psíquicas e motoras
42 2
BUYTENDIJK, F.J.J. O jogo humano. In: GADAMER, GRILLO, R.M.; NAVARRO, E.R.; SANTOS RODRI-
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nalmente publicado em 1938).
Gilson Santos Rodrigues - rcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Rogério de Melo Grillo
CONSCIÊNCIA E PEDAGOGIA PARA O JOGO: BALDRAMES PARA UMA FORMAÇÃO DOCENTE
chael De Luca; Rachael Horovitz; Brad Pitt. Roteiro:
Steven Zaillian; Aaron Sorkin. Distribuição: Columbia
Pictures, Estados Unidos. Idioma: inglês, colorido, 113
min, 2011.
INTRODUÇÃO
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
suas tecnologias, representada pelas disciplinas sável em âmbito local, regional e global; (EM13L-
de Educação Física, Língua Portuguesa, Artes e GG305) Mapear e criar, por meio de práticas de
Língua Estrangeira. linguagem, possibilidades de atuação social, po-
A competência específica de linguagens e lítica, artística e cultural para enfrentar desafios
suas tecnologias para o ensino médio utilizada contemporâneos, discutindo princípios e objetivos
para o estudo foi: “Utilizar diferentes linguagens dessa atuação de maneira crítica, criativa, solidá-
(artísticas, corporais e verbais) para exercer, com ria e ética (BNCC, p. 493).
autonomia e colaboração, protagonismo e auto- A aplicabilidade do estudo desenvolveu-se na
ria na vida pessoal e coletiva, de forma crítica, disciplina de Educação Física e baseou-se na
criativa, ética e solidária, defendendo pontos de competência específica para o ensino fundamen-
tal: Planejar e empregar estratégias para resolver
vista que respeitem o outro e promovam os Di-
desafios e aumentar as possibilidades de apren-
reitos Humanos, a consciência socioambiental e
dizagem das práticas corporais, além de se envol-
o consumo responsável, em âmbito local, regio-
ver no processo de ampliação do acervo cultural
nal e global” (BNCC, p. 490). Essa competência
nesse campo (BNCC, p. 223).
apresenta-se fundamentada nas seguintes habi-
Com isso, chegamos nas unidades temáti-
lidades: (EM13LGG301) Participar de processos
cas da Educação Física, segundo a BNCC, são
de produção individual e colaborativa em diferen-
elas: Brincadeiras e Jogos; Esportes; Ginásticas;
tes linguagens (artísticas, corporais e verbais),
Danças; Lutas; e Práticas Corporais de Aventura.
levando em conta suas formas e seus funcio- Centralizamos nossa pesquisa na utilização dos
namentos, para produzir sentidos em diferentes jogos no processo educacional, que assume o
contextos; (EM13LGG302) Posicionar-se critica- papel de elo entre as disciplinas da área de Lin-
mente diante de diversas visões de mundo pre- guagens e suas tecnologias. Assim, objetivamos
sentes nos discursos em diferentes linguagens, com a investigação criar e validar um jogo de Ro-
levando em conta seus contextos de produção leplaying Game (RPG), que promova: a Interdisci-
e de circulação; (EM13LGG303) Debater ques- plinaridade, a contextualização das competências
tões polêmicas de relevância social, analisando socioemocionais; e avaliação da aprendizagem
diferentes argumentos e opiniões, para formular, sobre a unidade temática: brincadeiras e jogos.
negociar e sustentar posições, frente à análise de O jogo Role-playing game, também conhe-
perspectivas distintas; (EM13LGG304) Formular cido como RPG (em português: “jogo narrativo”,
propostas, intervir e tomar decisões que levem “jogo de interpretação de papéis” ou “jogo de re-
em conta o bem comum e os Direitos Humanos, a presentação”), é um tipo de jogo em que os joga-
46 3
dores assumem papéis de personagens e criam LULA), do Instituto de Educação Física e Espor-
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
narrativas colaborativamente. O progresso de um tes (IEFES), da Universidade Federal do Ceará
jogo se dá de acordo com um sistema de regras (UFC), na pessoa do professor Doutor Marcos
predeterminado, dentro das quais os jogado- Teodorico Pinheiro de Almeida, para obtermos
res podem improvisar livremente. um parecer sobre as três fases essenciais para
As escolhas dos jogadores determinam a dire- validação do jogo criado pela professora de Edu-
ção que o jogo irá tomar. Os RPGs são tipicamen- cação Física e alunos de uma escola pública da
te mais colaborativos e sociais do que competi- rede Estadual de ensino do Ceará.
tivos, embora muitos deles sejam competitivos.
Um jogo típico une os seus participantes em um INTERDISCIPLINARIDADE E A BASE NA-
único time que se aventura como um grupo. Um CIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC):
RPG ocasionalmente tem ganhadores ou perde- TECENDO ELOS ENTRE AS DISCIPLINAS
dores. Isso o torna fundamentalmente diferente DE LINGUAGENS E OS TEMAS TRANS-
de outros jogos de tabuleiro, jogos de cartas co- VERSAIS
lecionáveis, esportes, ou qualquer outro tipo de
jogo. Como romances ou filmes, RPGs agradam A Interdisciplinaridade é um assunto bem dis-
porque eles alimentam a imaginação, sem, no en- cutido atualmente por estudiosos, assim defende-
tanto, limitar o comportamento do jogador a um mos conexões entre as disciplinas e não a hie-
enredo específico. rarquização das mesmas, no ambiente formal de
Existem várias formas de RPG. A forma ori- educação, a escola. A ideia da fragmentação do
ginal, às vezes chamada de RPG de mesa (ta- conhecimento deve ser superada o mais breve
bletop RPG em inglês), é conduzida através de possível para conseguirmos alcançar os verda-
discussão, enquanto que live-action RPG (LARP) deiros anseios e necessidades do nosso público
os jogadores executam fisicamente suas ações alvo, os alunos. Compreendemos também, que o
de personagens. Em ambas as formas, um arran- conhecimento não pode ser algo fragmentado e
jador chamado mestre de jogo geralmente decide nem isolado no processo educacional.
as regras e configurações a serem usadas, atu- A necessidade de contextualizarmos e unir-
ando como árbitro, enquanto cada um dos outros mos os elementos essenciais para compreender-
jogadores desempenha o papel de um único per- mos fenômenos isolados, passa a ser o foco em
sonagem. questão. As partes precisam se unir para formar
Contudo, buscamos a parceria do programa o TODO, o que possibilita novos conceitos sobre
Centro de Estudos sobre Ludicidade e Lazer (CE- a realidade. Segundo Darido (2005, p.81), as or-
47 3
ganizações dos conteúdos escolares podem ser údos relevantes de cada disciplina, independen-
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
baseadas a partir das disciplinas e classificados temente de sua área de atuação. Por isso, con-
como: multidisciplinar, interdisciplinar, transdisci- cordamos que a fragmentação do conhecimento,
plinar, pluridisciplinar, etc. Zabala (2002), confor- por ações isoladas, enfraquece a articulação en-
me citado por Darido (2005, p. 81), conceitua as tre as disciplinas e prejudica uma aprendizagem
organizações em: significativa. A fragmentação do conhecimento,
até então tida como verdade absoluta, cede lugar
Multidisciplinar (como organização somativa
dos conteúdos escolares, que são apresentados às práticas inovadoras que promove o reconheci-
por matérias independentes umas das outras); mento e o desejo de unificar os saberes na forma-
interdisciplinares (como a interação entre duas ção plena do processo de ensino e aprendizagem
ou mais disciplinas, que podem ir desde a sim- que permeiam o âmbito educacional. Isso ocorre
ples comunicação de ideias até a integração re-
porque muitos professores acreditam que quanto
cíproca dos conceitos fundamentais e da teoria
do conhecimento, da metodologia e dos dados mais especialistas forem em sua área de atuação
da pesquisa); transdisciplinar (que é o grau má- melhor será o desenvolvimento individual de suas
ximo de relações entre as disciplinas). (ZABALA atribuições educativas.
2002, apud DARIDO, 2005, p. 81). A escola, nos dias atuais, precisa de uma vez
Neste contexto o professor deve assumir por todas buscar compreender os interesses dos
uma postura de mediador do processo de ensi- alunos, para que a formação integral tão bem de-
no e aprendizagem para que o aluno seja prota- fendida pela interdisciplinaridade possa ser efe-
gonista em sua formação e que consiga ter uma tivada de forma plena. A Base Nacional Comum
aprendizagem significativa. Para que tal feito seja Curricular (BNCC, 2018, p.471) defende que a
munida de êxito faz-se necessário conteúdos formação integral do aluno do ensino fundamen-
contextualizados e relevantes para todos envolvi- tal para o ensino médio deve ser preservada. As-
dos no ensino formal. Quanto mais a curiosidade sim, o conjunto de competências e habilidades
e desafios forem instigados, pelos professores, necessárias para o ensino médio deve favorecer
mais o alunado buscará um sentido ao seu pro- ao desenvolvimento das competências gerais da
cesso formativo e compreenderá o contexto so- Educação Básica, levando em consideração o
cial ao qual encontra-se inserido, tendo bagagem projeto de vida em consonância com os princípios
suficiente para intervir de forma precisa e coeren- da justiça, da ética e da cidadania.
te em sua realidade. Para que isso ocorra, algumas ações base-
Quando o conhecimento é algo adquirido de adas em metodologias tradicionais, o conheci-
forma integral ele perpassa por todos os conte- mento centrado no professor por exemplo, de-
48 3
vem dar lugar para metodologias que foquem no xual, trabalho e consumo, citados nos Parâmetros
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
protagonismo juvenil, no caso nos referimos às Curriculares Nacionais (PCNs/Brsail 1997, 1988)
metodologias ativas, que salienta a relevância de e a autora afirma que existe a possibilidade de
centramos nas necessidades de aulas mais atra- encontrarmos outros temas de interesse que ne-
tivas e dinâmicas. A BNCC (2018, p.471) também cessitam ser discutidos e refletidos entre os com-
ressalta que o foco da área de Linguagens e suas ponentes da comunidade escolar. Diante de tal
tecnologias deve estar centrado na autonomia, no necessidade a disciplina de Educação Física não
protagonismo, na identificação e na crítica aos di- poderia eximir de suas responsabilidades sociais.
ferentes usos das linguagens, na participação em Então defendemos que não devemos trabalhar só
diversas manifestações artísticas e culturais, e no as regras esportivas, por exemplo, devemos focar
uso criativo das diversas mídias. numa formação ampla que fomenta conteúdos
Atualmente percebemos as dificuldades exis- contextualizados e que promova uma reflexão crí-
tentes, na escola, com relação ao fluxo das re- tica, fortalecendo assim, a PRÁXIS EDUCATIVA,
lações integrativas entre as disciplinas, que for- união entre a teoria e prática e não aceitarmos
taleçam a não fragmentação do conhecimento. tudo que é imposto socialmente.
Tal feito, não é comtemplado na BNCC, pois sua Defendemos que as escolhas dos conteúdos
composição é dividida em áreas do conhecimento devam ser pautadas nas dimensões conceituais
e não em componentes curriculares o que favo- (informação), procedimentais (ação) e atitudinais
rece a interdisciplinaridade, através de um traba- (reflexão), para que o processo de ensino e de
lho integrado entre as disciplinas. Para que isso aprendizagem possa ser significativo. Podemos
ocorra necessitamos desenvolver ações ou até citar o exemplo de uma aula de iniciação esportiva
mesmo projetos integradores que possam rece- sobre o futebol. Iniciamos com as informações so-
ber contribuições de todas as disciplinas, fortale- bre as regras, depois vivenciamos (aula prática) e
cendo assim os vínculos e mostrando ao aluno finalizamos coma reflexão sobre algumas atitudes
que um complementa o outro, são os chamados e as consequências de cada ato desenvolvido. Na
de temas transversais. verdade, precisamos sempre inovar nas aulas e
Os temas transversais segundo Darido (2012) quando se tem a decisão de implementar tais te-
são problemas que a sociedade brasileira enfren- mas nos conteúdos, resulta num trabalho a mais
ta e que por apresentar dificuldades para encon- ao professor, o que muitas vezes os impedem de
trar soluções cabíveis são levados para escola promover mudanças de atitudes, regadas de ex-
para ser tematizados, são eles: ética, meio am- clusão, preconceito, dentre outros.
biente, pluralidade cultural, saúde, orientação se-
49 3
JOGO, MITO E RITO nal, subjugada ao trabalho, que assume a principal
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
forma de integração social. Percebemos assim, o
O ato de jogar se faz presente ao longo da his- caminho para um enfraquecimento da dimensão
tória humana, em diversas sociedades e diferen- lúdica do homem, quando esse aspecto sociopsi-
tes temporalidades. Essa prática é tão significante cológico é negligenciado ou menosprezado.
para a cultura que Huizinga (2005) cunhou o ter- Para além do lado lúdico, o ser humano é
mo homo ludens para definir nossa espécie, con- capaz de criar jogos e praticá-los devido a sua
siderando a capacidade lúdica como um elemen- capacidade de idealizá-los e dar-lhe um sentido,
to de grande importância para se compreender o ou seja, significá-los. Na antiguidade o jogo era
conceito de humanidade, ao lado da capacidade inclusive, parte integrante das atividades rituais,
de raciocinar (homo sapiens) e de fabricar uten- muitas cerimônias de iniciação eram compostas
sílios (homo faber). Com a passagem do tempo por jogos e nesses momentos ele era “fundador
e as mudanças socioculturais, essa atividade foi de um tempo próprio, por meio da evasão da vida
adquirindo conotações distintas, mas ainda man- real, abolindo a história por meio de um retorno
tendo suas características basilares. Conforme contínuo, pela repetição do ato cósmico, pelo
aponta Huizinga: ‘mais uma vez’” (RETONDAR, 2003, p.239). Con-
(...) o jogo é uma atividade de ocupação volun-
figurava-se então um ato criativo, cosmogônico e
tária, exercida dentro de certos limites de tempo mitológico por natureza.
e de espaço, segundo regras livremente con- Os mitos eram considerados histórias sagra-
sentidas, mas absolutamente obrigatórias, dota- das capazes de realizar curas e provocar a liga-
do de um fim em si mesmo, acompanhado de ção com outros mundos, imaginários e sagrados.
um sentimento de tensão e de alegria e de uma
Campbell (1990, p.4) considera que os mitos “têm
consciência de ser diferente da “vida quotidiana”
(HUIZINGA, 2005, p.33) a ver com os temas que sempre deram sustenta-
ção a vida humana, que construíram civilizações
Nas sociedades arcaicas não existia uma se- e formaram religiões através dos séculos”. Dessa
paração nítida entre trabalho e lazer, então o jogo forma poderíamos pensar nos mitos como mode-
fazia parte do cotidiano social como qualquer outra los sociais e tradutores simbólicos do que ocorre
atividade cultural. Por exemplo, nas grandes caça- no íntimo do indivíduo, oferecendo para estes e
das ou manifestações religiosas que diversos po- os agrupamentos sociais diretrizes de funciona-
vos ancestrais realizavam, unindo lazer, jogo e tra- mento. Nesse sentido,
balho. São as sociedades modernas que tendem a
[...] o pensamento mítico pode ser visto como
marginalizar o jogo, tratando-o como atividade ba-
uma força positiva de figuração e de imaginação
50 3
que é concreta para os homens e balizadora de da amarelinha não se distinguem, formalmen-
Luana Caetano de Medeiros Lima - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Dmitri Antoniewsky Silva Gadelha - Jeferson Antunes
EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
suas vidas, na medida em que constrói um mun- te, do templo ou do círculo mágico (HUIZINGA,
do de significação e lhes fornece um modelo de 2004, p.23).
totalidade explicativo onde os indivíduos sen-
tem-se co-pertencentes daquela comunidade Pelo fato de durante as sessões de jogo os
viva (RETONDAR, 2003, p.197). participantes se deixarem levar pela fantasia e
manterem um exercício constante de imaginação
Com o decorrer do tempo, os elementos rituais
é inerente a um espaço de criação simbólico, o
do jogo foram se transformando e seus significa-
“círculo mágico” apontado por Huizinga, que o
dos originais, substituídos por outros. A mitologia
tempo flua de forma diferente do cotidiano. É o
e o símbolo, fontes de toda a organização social,
tempo do ato criativo que por si só pode ser con-
foram sendo marginalizados. O pensamento mí-
siderado um espaço sagrado e transformador.
tico sofreu uma depuração e as narrativas orais
perderam força e sua genuinidade.
ROLEPLAYING GAMES: EVOLUÇÃO HIS-
Diversos tipos de jogos surgiram e outros se
TÓRICA
modificaram, de acordo com novos padrões cul-
turais. Na sociedade contemporânea a competiti-
A primeira versão do RPG surgiu em 1974, nos
vidade foi se tornando uma característica funda-
Estados Unidos, com o ainda hoje famoso Dun-
mental dessas atividades. O RPG constitui uma
geons & Dragons (“Masmorras & Dragões”, em
das mais recentes manifestações do fenômeno
tradução livre), também conhecido como D&D. O
do jogo na atualidade e contrasta com o ideário
jogo possui uma ambientação medieval inspirada
de jogo competitivo e mecânico, pois sua consti-
na literatura de fantasia, como as obras de Robert
tuição baseia-se na cooperação, na fantasia e na
E. Howard (criador de Conan, o Bárbaro) e J.R.R.
criação de histórias.
Tolkien (autor da trilogia O Senhor dos Anéis). Os
Devido à utilização da fantasia como principal
criadores de D&D, Dave Arneson e Gary Gygax,
ferramenta e sua característica eminentemente
resolveram adaptar elementos dos populares jogos
criativa, poderíamos pensar no RPG como uma
de tabuleiro (boardgames) e jogos de estratégias de
possibilidade de resgate do mito e dos ritos em
guerra (wargames) para criar uma nova modalida-
sua dimensão simbólica, pois, para Huizinga,
de, onde os jogadores criam e interpretam o papel
De um ponto de vista formal, não existe diferen- de heróis de fantasia, protagonistas de uma jornada
ça alguma entre a delimitação de um espaço inserida em um cenário organizado para tal, ao in-
para fins sagrados e a mesma operação para vés de somente manejarem pinos e miniaturas de
fins de simples jogo. A pista de corridas, o cam-
um exército sobre uma mesa ou tabuleiro.
po de tênis, o tabuleiro do xadrez ou o terreno
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Na introdução do livro Dungeons & Dragons Além da modalidade tradicional de RPG, ou
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Player’s Handbook, encontramos a seguinte de- “RPG de mesa”, existem diferentes formas de pra-
finição: ticar o jogo, dentre as quais podemos destacar as
seguintes modalidade: “livro-jogo”, também conhe-
Ele tem muita semelhança com as brincadeiras
infantis de faz de conta. Como elas, D&D tam- cido como aventura solo, é uma forma de literatu-
bém é guiado pela imaginação. Trata-se basica- ra interativa, onde o leitor-jogador decide os rumos
mente de visualizar um castelo imponente sob o que a narrativa vai seguir; “ação ao vivo”, onde os
céu de uma noite tempestuosa, e imaginar como jogadores se vestem como os personagens e os in-
aventureiros de um mundo de fantasia reagiriam
terpretam em um evento semelhante a uma repre-
aos desafios que essa cena apresenta. [...] Ao
contrário das brincadeiras de faz de conta, D&D sentação teatral espontânea; e “RPG online”, onde
dá mais estrutura às histórias, de modo que se os jogadores utilizam aplicativos que simulam uma
possa determinar as consequências das ações sala virtual, onde podem rolar dados, visualizar ma-
dos aventureiros. Os jogadores usam dados pas e demais funções inerentes ao RPG. Para efei-
para descobrir se os seus ataques acertam ou
tos práticos, quando usamos o termo RPG nesse
erram, se seus personagens conseguem esca-
lar um penhasco, se escapam de um relâmpago artigo, estamos nos referindo ao “RPG de mesa”.
mágico ou se realizam qualquer outra tarefa pe-
rigosa. Tudo é possível, mas os dados tornam RPG NO BRASIL
alguns resultados mais prováveis que outros
(MEARLS, 2019, p.5). Aqui no Brasil, estima-se que o RPG teve seus
No início, as histórias geralmente se limitavam primeiros praticantes em meados da década de
a “invadir ruínas, derrotar monstros e acumular 1980, com material apenas em inglês, geralmente
tesouros”, mas com o passar do tempo, outros como um novo hobby entre estudantes universitá-
temas foram sendo adaptadas ao jogo (ficção rios de classe média com acesso à língua inglesa,
científica, cyberpunk, horror, supers, anime/man- mas se tornou mais conhecido e editado em por-
gá e contextos históricos), diversificando cada tuguês apenas nos anos 1990. A partir de então
vez mais as possibilidades de se jogar RPG, com angariou muitos adeptos e projetos genuinamen-
novas ambientações, sistemas de regras e pro- te brasileiros foram surgindo, como Tagmar, em
postas narrativas. Dessa forma, surgiram jogos 1991, também baseado em fantasia medieval, e
como os clássicos Vampiro: A Máscara, GURPS Desafio dos Bandeirantes, em 1992, baseado em
e O Chamado de Cthulhu, para citar apenas três uma versão fantástica do Brasil colonial.
dentre as centenas de títulos disponíveis no mer- Ainda hoje o RPG continua a ser bastante di-
cado atualmente. fundido no Brasil por seus adeptos e conta com
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inúmeras produções de sucesso, como Tormenta imaginação dos jogadores e mestres é o limite,
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20, A Bandeira do Elefante e da Arara, Old Dra- desde que sejam respeitadas as características
gon e 3D&T Alpha. Além disso, o jogo figura como da ambientação e as regras do jogo.
um importante elemento da chamada cultura pop, Sobre as habilidades físicas, sociais e mentais
sendo constantemente retratado na literatura fan- dos personagens, o que eles podem fazer, os li-
tástica, quadrinhos, produções audiovisuais e vi- mites são estabelecidos de acordo com um siste-
deogames, além de possuir produtos derivados ma de regras que coordenam o processo criativo
nessas formas de linguagem. de mestres e jogadores, obedecendo a lógica do
No RPG, o jogador interpreta um personagem cenário para o qual ele está sendo criado, afinal,
criado por ele, que deve atuar na aventura imagi- RPG ainda é um jogo e como tal, precisa ser re-
nária. O personagem e os elementos da aventura gido por regras bem definidas e indispensáveis,
devem ser criados dentro de um cenário previa- conforme apontado por Huinziga (2004).
mente escolhido, que pode ter diferentes tipos de O sistema de regras tem a função de organizar
ambientação: medieval, ficção científica, terror, a ação dos personagens no jogo, determinando
cyberpunk, velho oeste e o que mais a imagina- o que pode ou não ser feito com a finalidade de
ção conseguir alcançar. Os personagens de cada simular uma realidade no jogo. Além dos livros e
cenário são criados de acordo com as “raças” criatividade, para jogar RPG utilizam-se dados
(equivalente a sua espécie), e “classes” (equiva- (configuram o elemento de aleatoriedade do jogo,
lente a sua ocupação profissional) disponíveis na- que define se um jogador conseguiu ou não re-
quele cenário. alizar determinada ação pretendida), fichas dos
Por exemplo, ao jogar um RPG situado em uni- personagens (um tipo de “curriculum” que contém
verso de fantasia medieval ao estilo O Senhor dos seus atributos qualitativos e quantitativos), den-
Anéis, os jogadores poderiam desenvolver perso- tre outros complementos e acessórios opcionais
nagens pertencentes às raças elfo, anão, huma- (miniaturas, mapas, tabuleiros, etc.) a variar de
no e hobbit, enquanto poderiam escolher entre as acordo com o RPG escolhido pelo grupo.
classes guerreiro, guardião, explorador e sábio. Outro elemento fundamental no RPG é o “mes-
Já em uma ambientação de ficção científica es- tre do jogo”. Também conhecido como narrador ou
pacial ao estilo Star Wars, os personagens pode- mediador, é um participante que possui atuação
riam ser humanos, alienígenas, droids e clones, diferenciada na prática do RPG, pois no desenro-
pertencentes a ocupações como soldados, pilo- lar do jogo, atua como condutor da narrativa e juiz
tos, contrabandistas e jedi. Esses exemplos são responsável pelo cumprimento do sistema de re-
apenas os mais comuns, pois, como já foi dito, a gras. Pode-se dizer que o mestre tem várias fun-
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ções, é ele quem apresenta o cenário e fornece o turas, animais ou outros seres. Estes são deno-
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contexto para as ações dos personagens, criando minados de NPC (no player character). É de vital
uma história para os seus jogadores. Essa aven- importância para aquele que exerce a função de
tura é como um roteiro aberto onde se associam a mestre a leitura dos livros de RPG devido à neces-
criação do narrador e as ações criativas dos per- sidade de que o mestre conheça bem as regras do
sonagens em seu desenvolvimento, sendo umas sistema e a ambientação do cenário de jogo esco-
das principais características do RPG a criação lhido. Não para “comandar” o jogo através de seu
de histórias de forma coletiva. conhecimento, mas para moderar de forma justa e
Quando o mestre começa a narrar a aventura imparcial as interações dos personagens dos joga-
para os jogadores, estes, interpretando os seus dores com a ambientação do jogo e com os outros
personagens, falam o que farão dentro da história. personagens existentes na narrativa.
Então, de acordo com a reação de cada jogador, Um livro de RPG contém basicamente a descri-
o mestre continua a contar a história, sempre em ção do cenário e o sistema de regras. Como não
determinados momentos apresentando desafios existe apenas um tipo de cenário e nem um único
aos personagens, para que estes possam esco- sistema de regras as possibilidades de jogos de
lher suas ações. Forma-se um ciclo constante de RPG crescem exponencialmente. Além dos livros
criação e recriação por ambas as partes, produ- e criatividade, para jogar RPG utilizam-se dados
zindo uma história conjuntamente. Percebemos (elemento de aleatoriedade do jogo que define se
assim a valorização e o resgate da tradição oral um jogador conseguiu ou não realizar determi-
proporcionado pelo RPG, quando reúne pessoas nada ação), fichas dos personagens (contém os
para criar uma história coletiva utilizando a pala- atributos qualitativos e quantitativos deles), den-
vra falada como elemento primordial. tre outros complementos e acessórios opcionais
(miniaturas, mapas, maquetes, etc.).
O principal elemento é a conversa, com o media-
dor narrando a situação e os participantes des- O principal objetivo do jogo não é ter vence-
crevendo as ações de seus personagens. O me- dores, mas sim contar uma história. Seu suces-
diador conduz a história, e as decisões tomadas so nasce da criação coletiva de uma narrativa,
pelos participantes definem os rumos que essa capaz de representar a fantasia dos jogadores.
história tomará (KASTENSMIDT, 2017, p. 13).
Não há um vencedor propriamente dito por que
Outra função do mestre é interpretar outros per- ao desenvolver a narrativa em conjunto, todos
sonagens que participam da aventura e que não os participantes ganham. Quando uma dessas
são os criados pelos jogadores, geralmente são histórias (chamada de aventura) chega ao fim,
antagonistas, os coadjuvantes, e eventuais cria- ela pode levar a uma continuação, se assim qui-
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serem o mestre e os jogadores. Isso gera arcos como fazem os atores. Diferente de um jogo de
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narrativos contínuos e interligados (chamados de estratégia, você não luta contra um adversá-
campanhas) que podem perdurar por meses ou rio específico, mas vive aventuras em um mun-
anos, onde os jogadores vão reutilizar seus per- do imaginário. Diferente do teatro, você não se-
sonagens (ou criar outros), seguindo a evolução gue um roteiro, mas age pelo seu personagem
de suas competências, personalidades e relações com liberdade de ação, limitado somente pelo
com aquele mundo imaginário (MEARLS, 2019). conjunto de regras do sistema em questão.
O RPG é um jogo necessariamente cooperati- Um grupo de RPG pode ter de duas a dez pes-
vo, com capacidade de integração e socialização soas, às vezes mais. Não existe um número es-
evidenciadas por ser uma atividade grupal. Essa pecífico, embora a maioria dos grupos tenha uma
é uma de suas diferenças marcantes em relação média de 4 até 6 integrantes. No RPG, existem
a outros tipos de jogos da atualidade, que comu- dois tipos básicos de participantes muito bem de-
mente possuem viés competitivo. finidos: O primeiro tipo é o jogador personagem,
normalmente chamado apenas de “jogador”, do
RPG NA ESCOLA: DA INTERPRETAÇÃO À Inglês “Player”. Ele é quem cria um persona-
REALIDADE gem fictício, seguindo as regras do sistema es-
colhido por seu grupo, e controlará esse mesmo
O RPG é um jogo pouco convencional quan- personagem pelas aventuras do jogo. (Em alguns
do comparamos aos jogos habituais. No teatro, Jogos de Interpretação, jogadores podem con-
você interpreta uma personagem de ficção, se- trolar mais de um personagem simultaneamente,
guindo o enredo definido em um roteiro; já em embora seja incomum.)
um jogo de estratégia, você está seguindo um O segundo tipo de jogador é o narrador, mes-
conjunto de regras onde, para vencer, você pre- tre ou GM (Game Master). Será ele quem criará
cisa vencer desafios impostos por seus adver- a história e julgará as ações de todos os persona-
sários – cada partida é única, já que é impossí- gens do jogo. O narrador normalmente não pos-
vel prever seus movimentos durante o jogo. No sui um personagem próprio, mas controla todos
RPG, esses dois universos se unem. Como em os personagens não-jogadores da aventura – que
um jogo de estratégia, há regras que o definem, seriam os coadjuvantes da peça de teatro. En-
e guiam aquilo que o seu personagem pode ou quanto o jogador tem uma atuação assemelha-
não fazer. A esse conjunto de regras chama- da àquela de um ator de teatro, o narrador seria
-se sistema. Como no teatro, cada personagem o diretor e roteirista, aquele que define o cenário,
tem uma história, e deve ser interpretado assim figurantes, ambiente e tudo mais.
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Por isso mesmo, o narrador é aquele que terpretarão seus personagens, e momento histó-
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deve conhecer as regras mais profundamente, rico onde a história acontecerá. Os ganhadores
e deve ser o mais experiente do grupo, normal- serão aqueles que conseguirem desvendar os
mente seguindo um sistema de regras pré-de- mistérios da aventura. O jogo de RPG é como um
terminado que o ajudará com os eventuais pro- “livro”, onde alo ocorrerá, envolvendo assim seus
blemas e dúvidas que venham a surgir. Apesar personagens numa trama, e que objetiva a reso-
do narrador seguir as regras de um sistema, ele lução de problemas relevantes pelos mesmos.
pode quebrá-las, ignorá-las ou mudá-las em prol Sendo o RPG essencialmente um “jogo de
de uma fluidez no andamento da partida, base- contar histórias coletivamente”, há uma necessi-
ando-se para isso no seu bom senso. Conhe- dade de esforço criativo e planejamento para sua
cer o máximo possível sobre o sistema facilita prática. Tanto jogadores quanto mestres costu-
esse processo e evita arbitrariedades. mam estar sempre às voltas com livros e blocos
de notas (físicos ou digitais), lendo, escrevendo
RPG E NARRATIVA e pensando na maneira mais inventiva de inse-
rir seus personagens e elementos narrativos na
O RPG é um jogo de interpretações de papéis, história que desenvolverão em conjunto ao seu
onde narrativas são compartilhadas entre seus jo- grupo de jogo. Isso aproxima os autointitulados
gadores. Os mesmos são divididos em: mestre e RPGistas de produtos da literatura ficcional, o que
personagens. O primeiro citado é responsável por chega a ser quase “natural”, haja visto que desde
ensinar as regras; mediar a condução da aven- sua origem o RPG já possuía relação clara com
tura; lançar desafios aos participantes; propor fio obras de fantasia.
narrativo; e improvisar diante das escolhas dos Essa dinâmica de leitura, interação, partilha e
jogadores. Já os segundos, são responsáveis em imaginação gera um fenômeno peculiar, interno
fazer a história ocorrer e sobre as decisões que e externo, social e cognitivo, onde os indivíduos
os participantes irão fazer e dizer na aventura. interagem entre si, mas também consigo mes-
As narrativas são formadas por desafios que mos. Ao ler e criar, evocam aspectos particulares
precisam ser solucionados de forma colaborativa do que lhe formam enquanto indivíduos, parte de
pelos personagens que de certa forma precisam uma sociedade contemporânea pautada em va-
estabelecer sua origem, identidade, crenças, clas- lores próprios. Ao imaginar e interagir, vestem-se
se social e suas relações com os outros e com os de uma capa ficcional pertinente aos universos
ambientes. O RPG também precisa ser claro com fantásticos inerentes ao jogo. Esse movimento
relação ao cenário, local onde seus jogadores in- ocorre com frequência dentro dos grupos de RP-
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Gistas, geralmente formados por adolescentes e lhança e lógica devem se aplicar, afinal, os es-
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jovens, que acabam, gerando elementos identitá- forços criativos de cada membro de um grupo de
rios entre si, conforme suas preferências de jogo, RPG se unem para formar narrativas imaginárias
temas e ambientações, tal qual podemos enxer- que precisam fazer sentido, mesmo que situadas
gar na formação de outros agrupamentos sociais. em universos de fantasia. Isso se aplica tanto
Conforme aponta Rodrigues (2004), o fascí- para aqueles que escrevem os cenários de RPG
nio exercido pelos elementos narrativos fantás- e desenvolvem suas regras (os game designers)
ticos também proporcionados pelo RPG adentra quanto para aqueles que os colocam em prática
uma lacuna deixada pela escola, biblioteca e (os jogadores), afinal, ambas as atividades cria-
demais espaços formais que deveriam cumprir tivas são interdependentes e apenas se comple-
o papel de iniciação à “grande arte”. Isso não é tam quando atreladas uma à outra através da ex-
uma novidade do tempo presente, mas um fe- periência do jogar.
nômeno observado também em outros contextos A expressão da oralidade presente no RPG o
históricos, seja na forma de publicações baratas aproxima do que Machado (2015) chama de “arte
do século XIX e início do XX (penny dreadfuls da palavra e da escuta”, que ela define como
e pulp fictions) ou em narrativas mitológicas de uma prática de narrar histórias oralmente, onde
séculos atrás. Ela explica: um narrador se utiliza da fala como principal ins-
trumento para estabelecer vínculo com o público
Isto se deve à presença de arquétipos, de tipos
modelares, heróis, super-homens enfrentando que o assiste. Diversos tipos de performances
monstros ou inimigos. Esta é a marca principal narrativas e/ou teatrais (narração de histórias,
das personagens de RPG, como foi antes a do adivinhas, trava-línguas, histórias cantadas, den-
folhetim histórico e, antes ainda, da epopéia tre outros) se enquadrariam nessa modalidade.
(RODRIGUES, 2004, p.154).
No RPG, seus praticantes utilizam fundamen-
A possibilidade de consumir e produzir narra- talmente a palavra falada como o elemento ge-
tivas ficcionais de maneira não profissional confi- rador de uma narrativa imaginária, transfigurando
gura um dos atrativos do RPG, sobretudo para os seu conteúdo inerte em imagens vivas em suas
jovens, que encontram no jogo um espaço livre mentes. A diferença do RPG para outras práticas
e democrático onde podem se reunir com seus narrativas orais é que nele não há apenas um in-
semelhantes para desenvolver potencialidade divíduo que domina a narrativa e a “repassa” a
criativas fora de padrões, rótulos ou tabus que um público passivo. Ao contrário, todos os parti-
normalmente lhes são impostos pela sociedade. cipantes de uma sessão de RPG são coautores
Ainda assim, regras como coerência, verossimi- da narrativa, que está incompleta quando o jogo
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começa e só chega a uma conclusão à medida mas de nível moral também. Nas aventuras, os
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em que os jogadores, juntamente com o mestre, personagens assumem papéis específicos frente
contribuem para o seu desenvolvimento, através às demandas do grupo, na tentativa de alcançar
das ações tomadas pelos personagens, que por a melhor maneira de solucioná-las, cada um vai
outro lado, tem suas consequências determina- utilizar suas habilidades específicas de forma a
das pelo mestre. auxiliar o grupo frente aos desafios propostos
Ao estabelecer esse vínculo entre os partici- pelo mestre.
pantes, o RPG proporciona a eles uma experiên- É no embate com as situações inusitadas
cia singular, tanto criativa quanto comunicativa, que verificamos a capacidade criativa de cada
ainda em consonância com o que Machado afir- jogador/personagem na busca de saídas. Nos
ma sobre a arte da palavra: diálogos durante uma sessão fica claro a intera-
ção entre os jogadores com o intuito de alcançar
A arte da palavra, oral e escrita, permite a
transformação de um mundo de pensamentos, uma resolução adequada para o grupo como um
percepções, perguntas, intuições e afetos em todo. Várias negociações são travadas entre os
comunicação. É manifestação expressiva que participantes diante da necessidade de optar por
uma pessoa dirige a si mesma e ao outro, que uma ação que tenha em vista o objetivo comum
estabelece contatos. A arte da palavra requer o
do grupo, mas também a finalidade essencial do
exercício da capacidade de transmutar imagens
internas em configurações de linguagem, orde- RPG, que é desenvolver coletivamente uma nar-
nadas poeticamente. Tal ordenação é fruto de rativa imaginária.
um longo processo de descoberta de palavras
que podem ser encadeadas para fazer sentido, RPG NA EDUCAÇÃO
para conferir significação à experiência de vida
de outra pessoa (MACHADO, 2015, p.16).
RPG na Educação é uma ferramenta educacio-
Diante do que já foi exposto e pode ser obser- nal que pode auxiliar o processo de ensino e de
vado em grupos de RPGistas, sabemos que tanto aprendizagem dos professores e alunos, fortale-
os jogadores quanto os seus personagens pos- cendo assim, os vínculos e ajudando, através de
suem objetivos em comum. Segundo o mestre, interpretações, na compreensão ou até mesmo so-
cada jogador cria a ficha de seu personagem com lução de alguns temas transversais pertinentes na
sua história, suas virtudes, fraquezas e objetivos. sociedade ao qual os participantes estão inseridos.
Além do objetivo geral de narrar uma história co- Possibilitar situações desafiadoras e que ressalta
letiva, existem os objetivos de desenvolvimento a responsabilidade que todos devem assumir dian-
de cada personagem, não só de nível de jogo, te de tais desafios sociais é uma forma de mos-
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trar, principalmente aos alunos, que os problemas Contudo, a disciplina de Educação Física não
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sociais é responsabilidade de todos. E quando poderia deixar de utilizar como ferramenta peda-
estamos envolvidos em situações desafiadoras, gógica um de seus conteúdos tão atrativo aos alu-
precisamos fazer uma análise crítica e encontrar nos, o jogo. Muito estudos já abordam conceitos
mecanismos que possibilitem sua superação e não ou conteúdos de história, por exemplo, em sua
nos deixar levar muitas vezes pelo desespero. idealização. Mas não encontramos jogos de RPG
Ao tratarmos de forma coletiva de determi- que se fundamentam: na promoção da interdis-
nados assuntos como o suicídio, por exemplo, ciplinaridade entre as disciplinas pertencentes à
descobrimos os reais motivos que levaram o área de conhecimento Linguagens e suas tecno-
causador a ter determinadas atitudes, podemos logias; na abordagem das unidades temáticas da
fazer uma análise crítica e fazermos uma per- disciplina de Educação Física: Esportes, Danças,
gunta clássica no momento da análise da situa- Lutas, Ginásticas, Brincadeiras e Jogos e Práti-
ção: E se fosse comigo, o que eu faria? Discutir cas Corporais de Aventura; na utilização das com-
criticamente e promover uma reflexão sobre os petências socioemocionais que se encontram na
temas transversais já faz parte da rotina escolar BNCC; e que abordem os temas transversais: éti-
de muitas escolas. O diferencial do RPG nesse ca, saúde, pluralidade cultural, orientação sexual,
contexto é a dinamicidade que o jogo promove meio ambiente e trabalho e consumo. Mediante
em seus adeptos. a tudo isso, ressaltamos a necessidade da dis-
Diante do exposto acreditamos que a utilização seminação dos resultados encontrados com a in-
do RPG nas aulas presenciais ou remotas é um vestigação proposta, pois acreditamos em nossa
grande aliado na promoção de motivação, pois os responsabilidade na criação de um mundo melhor
envolvidos no processo se sentem desafiados em e mais favorável para práticas inovadoras e atra-
solucionar os mistérios que o jogo aborda. Cada tivas que fortalecem o processo de ensino e de
narrativa idealizada é fundamentada nas expe- aprendizagem.
riências anteriores de seus participantes, assim
inúmeras possibilidades, de possíveis soluções, RPG: UM JOGO COOPERATIVO DE CRIAR
podem ser relatadas. Por tudo citado anterior- HISTÓRIAS
mente percebemos e defendemos a necessidade
de que as disciplinas escolares possam desenvol- Em português, fazemos essa distinção entre
ver de forma contextualizadas tais assuntos que jogar e brincar. Em inglês, essa diferença não
interferem diretamente no processo educacional existe: brincar, jogar, atuar, interpretar um per-
de cada integrante da comunidade escolar. sonagem é to play. O RPG, ou role-playing
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game, é tanto jogo, quando brincadeira, quanto Unindo jogo e narrativa, a prática do RPG (ro-
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interpretação. É uma mistura de jogo, brincadei- leplaying game) consiste em um encontro lúdico
ra e teatro. Eu prefiro explicar o RPG de uma
onde os participantes criam coletivamente uma
forma mais simples ainda. O RPG é uma brinca-
deira de criar e contar histórias coletivamente. história. A narrativa vai tomando forma durante
(RICON apud ZANINI, 2004, p.15) as sessões de jogo e cada um dos participantes
imprime nela um pouco de si, das suas aspira-
Desde as épocas mais remotas o homem se ções e fantasias, assim vão dando vida a essa
reúne para contar histórias à beira do fogo. Povos jornada imaginária.
paleolíticos registravam narrativas através de pin-
turas rupestres nas paredes de suas habitações Neste jogo, não há ganhadores ou perdedores.
O objetivo do jogo encontra-se justamente em
nas cavernas, repletas de significados ainda hoje
desenvolver uma narrativa, em desenvolver
debatidos. O bardo é um exemplo de contador de ações que abram os caminhos da trama propos-
histórias e mitos que detinha um prestígio social e ta pelo mestre (PAVÃO, 2000, p.19).
simbólico junto à cultura celta. Usando a palavra
Do ponto de vista cultural, podemos considerar
contada, os xamãs de diversas sociedades acre-
o RPG como uma importante ferramenta para o
ditavam ser capazes de trazer de volta a alma de
resgate de uma tradição oral muitas vezes engoli-
pessoas doentes ou resgatar através da narrativa
da pela supervalorização dos modernos meios de
ritual do mito, um tempo primordial, que por si só
interação e entretenimento, cada vez mais difun-
já era curativo e gerador de um novo começo, um
didos na contemporaneidade.
ato criativo e cosmogônico.
O ato de jogar também pode ser rastreado [...] a arte de narrar caminha para o fim. Torna-
até a aurora da humanidade, presente em so- -se cada vez mais raro o encontro com pessoas
que sabem narrar alguma coisa direito. É cada
ciedades de todos os continentes habitados. É
vez mais freqüente espalhar-se em volta o em-
um fenômeno cultural intrínseco à humanidade, baraço quando se anuncia o desejo de ouvir
repleto de aspectos sociais, psicológicos e sim- uma história. É como se uma faculdade, que nos
bólicos que se manifestam em uma trama inter- parecia inalienável, a mais garantida entre todas
ligada pelo elemento lúdico. Características do as coisas seguras, nos fosse retirada. Ou seja: a
jogo se manifestam nas mais diversas áreas, de trocar experiências (BENJAMIN, 1979, p.57).
como direito, guerra, religião e poesia. Os tor- Essa troca de experiências, considerada por
neios medievais, por exemplo, eram tratados por Benjamin em declínio na civilização industrial
seus praticantes como um jogo de simulação bé- em que estamos inseridos, é proporcionada pelo
lica, tão mortíferos quanto. RPG aos participantes, através do ato criativo de
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narrar histórias. Pelo fato de ser jogado em grupo, dora através dessa prática lúdica. Para tanto, nos
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tem um grande poder de integração entre os indi- utilizaremos de alguns conceitos de diversas áre-
víduos e valorização do discurso, da tradição oral, as do conhecimento – literatura, game design, pe-
do diálogo e da troca de ideias. dagogia, psicologia, filosofia e mitologia – e seus
Nesse sentido, buscamos ao longo do artigo teóricos para embasar a importância da criação,
dissertar a respeito do RPG, através dos se- da palavra e da imaginação não só para o jogo
guintes tópicos: “Sobre os roleplaying games”, em si, mas para o homem como sujeito.
onde apresentamos um breve histórico do RPG,
desde sua criação até os dias de hoje, dando IMAGINAÇÃO E RPG
exemplos de seus títulos e modalidades de jogo;
“Como funciona o RPG”, onde apresentamos o Como já foi dito anteriormente, uma das princi-
exemplo prático de uma sessão de jogo, retra- pais ferramentas do RPG é a fantasia. Através da
tando seus elementos e sujeitos partícipes em imaginação são construídas inúmeras possibilida-
uma típica situação narrativa; “RPG e narrativa”, des de jogo. Para mostrarmos a importância disto,
onde apresentamos o processo de construção buscaremos antes com base na psicologia analíti-
coletiva das histórias no RPG e o relacionamos ca de Jung, entender a importância da imaginação
com produções ficcionais e narrações orais, ba- para o desenvolvimento da mente humana.
seado nos apontamentos de Sonia Rodrigues e Em Jung a noção de imaginação ocupa o lugar
Regina Machado quanto a essas estruturas nar- central, uma vez que para ele psique é imagem.
rativas; “Jogo, mito e rito”, onde analisamos his- O que ele chama de imagem é a realidade, ou
toricamente os conceitos de jogo, mito e rito de seja, a imaginação corresponde à realidade do
indivíduo – porque o indivíduo só tem acesso à
Johann Huizinga e Joseph Campbell, observan-
imagem. A atividade psíquica, em sua concep-
do como o RPG pode estabelecer pontes com ção, é a própria fantasia. A realidade é sempre
esses fenômenos culturais; “Imaginação e RPG”, uma realidade em nós, “um esse in anima”, e o
onde abordamos os conceitos de imaginação e que dá intensidade à impressão viva e sensí-
fantasia para Carl Gustav Jung, como elementos vel das coisas e, ao mesmo tempo, dá força às
idéias, é a fantasia. A síntese em nós entre a
inerentes à psique humana e em constante estí-
intensidade viva do real e sua respectiva elabo-
mulo na prática do RPG. ração intelectual é obra da imaginação. Esse fe-
Assim, buscamos apresentar o RPG e estabe- nômeno que se dá incessantemente é a manifes-
lecer sua relação com as diversas formas narra- tação da imaginação através de atos incessantes
tivas, fazendo um esboço sobre a importância da de criação, pois ela é um processo vital, uma ati-
vidade autônoma. Ela comporta e liga todas as
fantasia como ferramenta criadora e transforma-
61 3
funções e os opostos, é a geradora de todas as Para iniciar uma campanha e dar continuida-
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possibilidades. Tudo que tiver resposta emergirá de a ela, os participantes precisam idealizar per-
daí. Jung vê a imaginação como criadora desse
sonagens, criar e recriar constantemente o mun-
modo: o elemento vivo de ligação e a corrente de
criação contínua. (PERRONE, 2007, p.4) do habitado por estes e as diversas situações de
aventura vividas dentro deste ambiente. Dessa for-
A fantasia assume então o papel de mediadora ma podemos levantar a questão de que em todo
entre o indivíduo e a realidade, é como um cata- esse processo, levando em conta o ato da fantasia
lisador entre os potenciais arquetípicos e os ele- como elo entre o interior e o exterior, os indivíduos
mentos exteriores que servem de matéria prima envolvidos produzem significados para cada ação
para ela. Nas palavras de Jung: realizada dentro do jogo, simbolizando-as, sendo o
A psique cria a realidade todos os dias. A úni- jogo em si um processo de simbolização.
ca expressão que me ocorre para designar esta Pereira (1995) afirma que “é na interação da
atividade é a fantasia. [....] Às vezes aparece em realidade objetiva com a realidade imaginária que
sua forma primordial, às vezes é o produto últi- consiste a capacidade de criação do homem”. No
mo e mais audacioso da síntese de todas as ca-
RPG o jogador tem uma gama enorme de possi-
pacidades. Por isso, a fantasia me parece à ex-
pressão mais clara da capacidade específica da bilidades de criação, de modos diferentes de ser,
psique. [...] A fantasia sempre foi e sempre será mas no final acaba sendo ele mesmo, já que toda
aquela que lança a ponte entre as exigências expressão criativa revela o que há de mais verda-
inconciliáveis do sujeito e objeto, da introversão deiro no indivíduo. É importante lembrar o papel
e extroversão. (JUNG, 1991, p. 73)
da imaginação como criadora de realidade e doa-
O RPG utiliza a capacidade de imaginação e dora de sentidos, como fomentadora de um espa-
interpretação dos participantes para criar narrati- ço de criação simbólico e transformador. Através
vas lúdicas. A criação de seus personagens e dos da imaginação e de seus recursos simbólicos, os
cenários está intimamente relacionada com quan- jogadores buscam soluções criativas que trans-
to os participantes se identificam com a fantasia formam a configuração atual em outra que não
do jogo e de quanto a sua própria fantasia pode exclui a anterior, mas a modifica, em um processo
ser representada nesse espaço lúdico. É possí- constante de criação e ressignificação.
vel então visualizar no RPG a dinâmica da fan-
tasia da forma que Jung especificava, como um COMO FUNCIONA O RPG
elo entre os processos internos do indivíduo e os
elementos externos a ele, que tem a função de Para uma melhor visualização de como acon-
constelar e representar a realidade mais íntima. tece na prática uma sessão de RPG tradicional,
62 3
segue no Quadro 1 um exemplo de jogo, onde
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Ed, o mestre de jogo: “Enquanto conversavam distraí-
seus elementos básicos são retratados. O jogo dos, vocês nem perceberam que do meio das largas ár-
escolhido para a demonstração foi Dungeons & vores da floresta, uma criatura se esgueirava até o local
onde estavam. Vocês ouvem o farfalhar das folhas e quan-
Dragons, já apresentado anteriormente.
do se viram, notam um ser humanoide de braços longos
Quadro 1 e pele verde cheia de verrugas avançando contra vocês!
Ele levanta uma clava tosca feita com um tronco de árvo-
DUNGEONS & DRAGONS re e emite um grunhido que dói nos ouvidos, fazendo os
João, Pedro, Ana e Ed se reuniram para jogar D&D. João pássaros voarem ao longe. Vocês reconhecem a criatura
escolheu interpretar um anão guerreiro, Pedro escolheu como um troll, monstro conhecido por emboscar viajan-
um elfo arqueiro e Ana escolheu uma humana maga. Ed tes para devorá-los. E agora, o que vocês fazem?”
é o mestre de jogo. João, o anão guerreiro: “Eu levanto meu machado e es-
Ed, o mestre de jogo: “Vocês estão andando pela floresta. cudo e corro para cima do monstro com um grito de guer-
A caminhada já perdura por longas horas e vocês sabem ra na língua dos anões!”
que deveriam ter chegado à aldeia antes do anoitecer. No Pedro, o elfo arqueiro: “Eu vou me pendurar em um ga-
entanto, já está escuro e vocês notam que o caminho está lho distante do monstro, aí saco meu arco e flecha e pre-
diferente do que vocês se lembram. Parece que estão per- paro a mira pra um disparo certeiro.”
didos. E então, o que vocês fazem?”
Ana, a humana feiticeira: “Eu corro pra me proteger
João, o anão guerreiro (falando como seu personagem): atrás de uma árvore e conjuro as palavras mágicas para
“Maldição! Acho que pegamos a trilha errada. Sabia que disparar uma bola de fogo contra a fera.”
era melhor ter ficado na estrada principal. Agora vamos
demorar muito mais pra chegar na vila. Eu estava so- Ed, o mestre de jogo: “Ok. Peguem os dados e vamos ao
nhando com um belo pernil de porco e cerveja preta.” combate!”
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narrando a aventura. sentes na BNCC. Justifica-se a escolha do estudo
Ao longo do jogo, à medida em que os perso- com a pretensão em conseguir despertar: a mo-
nagens se aprimoram e evoluem suas capacida- tivação dos alunos; a interdisciplinaridade entre
des pessoais, suas ações poderão desencadear Educação Física, Artes e Língua Portuguesa; a
consequências capazes de influenciar o mundo à revisão dos conteúdos desenvolvidos nas aulas
sua volta de forma mais drástica, ou por escolha de Educação Física; e a instigar o interesse dos
do próprio jogador ou por determinação do mes- alunos na criação de jogos.
tre. Em semelhança às jornadas dos heróis mito- Para o presente estudo centraremos olhares
lógicos, os personagens criados por jogadores de ao primeiro jogo criado pela professora de Educa-
RPG, ao vivenciar grandes aventuras, alcançam ção Física juntamente com alunos e sob a orien-
uma escala épica, “aquilo que supera em muito tação dos especialistas do Programa Centro de
o mediano, especialmente em tamanho, escala Estudos sobre Ludicidade e Lazer (CELULA), do
e intensidade. Algo épico tem proporções heroi- Instituto de Educação Física e Esportes (IEFES),
cas.” (MCGONIGAL, 2012). da Universidade Federal do Ceará (UFC), no ano
de 2021, segundo ano de atividades escolares re-
AVENTUCORP: DESVENDANDO OS MIS- motas, ocasionada pela Pandemia do vírus CO-
TÉRIOS NA EDUCAÇÃO FÍSICA VID-19. Compreender o contexto ao qual todos os
envolvidos estão inseridos também passou a ser
O AVENTUCORP, sigla originária da união dos relevante, pois os encontros respeitaram todas
nomes: aventura com corpo e que apresentam o as orientações sobre o isolamento social. Deno-
desejo de desvendar os mistérios que perpassa minamos o primeiro jogo de AVENTUJOG, funda-
em seu contexto nas temáticas da disciplina de mentado nos conteúdos de brincadeiras e jogos e
Educação Física. AVENTUCORP são seis jogos apresenta como tema transversal saúde.
que utiliza os conteúdos didáticos da educação O jogo criado apresenta como cenário os es-
física escolar, baseado nos jogos de RPG, com o tabelecimentos que são referência aos alunos
intuito de promover a interdisciplinaridade, refle- por estarem presentes no bairro onde está inse-
xão e criticidade dos adolescentes, diante de pro- rida a escola dos mesmos. Os alunos envolvidos
blemas enfrentados diariamente. Apresenta em na criação do jogo são de escola pública e que
sua fundamentação teórica, estudos centrados objetivavam deixar um LEGADO, para todos os
em: jogos de RPG; unidades temáticas da discipli- representantes da comunidade escolar: alunos,
na de Educação Física, segundo a BNCC; temas professores, gestão escolar, funcionários e fami-
64 3
liares. Para todos que de certa forma se permitam muitos profissionais temem em abordar que é a
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a refletir sobre problemas sociais que “batem em prática do suicídio, por se tratar de um assunto
nossa porta”, quando menos esperamos e nos tão desafiador.
obrigam a reagir diante dos acontecimentos. O presente estudo não deseja resolver as cau-
Acreditamos que essa busca por debates so- sas que levam ao suicídio e nem fazer qualquer
bre tais temas na escola, poderiam ter evitado tipo de julgamento, objetivamos levantar algumas
muitas ações desenvolvidas de forma muitas ve- hipóteses que promovam a conscientização que
zes impensadas e realizadas pelos impulsos ou temos fases desafiadoras em nossas vidas e que
momentos de desespero, sem saber lidar diante precisamos ser resilientes e que quanto mais pra-
de determinadas provações. O AVENTUJOG é ticarmos a empatia mais podemos evitar ações
um jogo que aborda os temas sobre obesidade preconceituosas e que de certa forma pode ma-
e suicídio. A aventura conta a história de Maria goar quem está ao nosso redor. Queremos enfa-
uma adolescente de 15 anos, que morava com tizar que todas as ações resultam numa consequ-
seus pais e que estava obesa. Mediante a tan- ência e que muitas vezes pode ser fatal.
tos conflitos internos e por sofrer muito bullying e
cyberbullying dentro e fora da escola, conheceu METODOLOGIA
um grupo pela internet e que desafiava os seus
integrantes a praticarem o suicídio, com o intuito Mediante a tal cenário, o presente estudo as-
de resolver seus problemas de uma vez por to- sumiu uma estrutura para que fosse desenvolvi-
das, através do suicídio. do, atendendo as normas de segurança para os
Tentamos abordar temas pertinentes à fase do envolvidos no processo. Com isso, utilizamos as
desenvolvimento dos adolescentes, que é a faixa tecnologias a nosso favor, seja ela via celular; ou
etária dos alunos da escola e contextualizamos encontros pelo Google Meet; ou até mesmo pelo
de acordo com o olhar dos criadores mediante ao grupo de Whatsapp criado com todos os alunos
contexto que estão inseridos. A obesidade é um envolvido na investigação. Com isso, o estudo uti-
tema bem discutido nas aulas de educação física lizou tais ferramentas para o êxito dos objetivos
e a reflexão sobre mudanças de hábitos alimen- previamente estabelecidos.
tares e a relevância da inserção de práticas de A pesquisa apresenta-se com uma abordagem
atividades físicas no dia a dia dos alunos são as- qualitativa e do tipo pesquisa-ação. De acordo
suntos pertinentes para discutirmos. Além de tal com Minayo (2004) a pesquisa qualitativa respon-
tema precisamos refletir também sobre um tema de a muitas questões particulares e se preocupa
que requer muita cautela em sua discussão e que com um nível de realidade que não pode ser con-
65 3
templada só com os aspectos pertinentes aos re- Quadro 2
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sultados obtidos com a pesquisa quantitativa. MO-
AÇÕES
MEN- RESULTADO
Com isso, surge o desejo de criarmos o pri- DESENVOLVIDAS
TOS
meiro dos seis jogos de RPG que atendam os
- Apresentação do que Esclarecimento de
objetivos previamente estabelecidos nesse estu- é o RPG dúvidas e elaboração
do. O mesmo foi denominado de AVENTUJOG
1 - Apresentação da pro- do cronograma de en-
(aventura + jogo) e baseia-se no mistério que posta do jogo contros.
Escolha das temáticas Obesidade, Suicídio
existe no caso da morte de uma adolescente de
para serem abordadas 3ª série do Ensino
15 anos, Maria. na criação do jogo Médio;
A proposta inicial do jogo criado foi de promo- Criação do nome do Aventura + Jogo =
ver sua idealização e conseguirmos realizar um jogo AVENTUJOG
playtest que valide sua utilização durante o final Criação da estrutura
2 do jogo (cenário, dado, Estrutura geral do
de cada bimestre escolar com os alunos da tercei-
perguntas, contexto, fi- jogo
ra série do ensino médio. Com isso, criamos três cha dos personagens)
fases: primeira fase fundamenta-se no conheci- Construção do enredo Criação da história do
mento prévio sobre o desejo dos alunos sobre a 3 do jogo jogo
relevância do brincar no contexto escolar do en- Realização do play Vivência on-line do
4 teste do jogo criado jogo AVENTUCORP.
sino médio; a segunda fase resulta na criação do
grupo de estudos, da escola, e do jogo de RPG Fonte: Autores.
que traduz os objetivos previamente estabeleci-
dos pelos idealizadores; e a fase três, busca a Contudo, as ações previamente estabelecidas
validação e a avaliação dos especialistas sobre a iniciam-se com a criação de um grupo, formado
aplicabilidade e relevância do jogo para toda co- por adesão dos participantes ao projeto. Conta-
munidade escolar. mos com a participação de 18 alunos, a profes-
Com isso, o desejo de deixarmos um LEGADO sora de Educação Física e os parceiros. Assim,
para toda comunidade escolar de uma escola pú- apresentação da fase foi realizada por meio de
blica em 2021, foi nossa maior motivação. Assim, um encontro on-line com os envolvidos e os acor-
os encontros foram divididos em quatro momen- dos foram estabelecidos.
tos como verificamos no Quadro 2. O perfil dos alunos participantes traduz-se em:
faixa etária entre 16 a 18 anos de idade; dentre
eles a maioria eram do sexo masculino e de vá-
rias séries, da escola; alguns já tinham experiên-
66 3
cias com jogos; acreditavam ser algo relevante as samentos sobre o olhar do protagonista e outro
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ações que estavam desenvolvendo; a maioria já olhar de quem estar inserido no mesmo contex-
conhecia a proposta do RPG, mas nunca haviam to, propícios a passarem por essa situação e que
criado um jogo. A proposta foi tão instigante aos afetam diretamente ao seu processo de ensino e
alunos que tivemos o interesse de uma aluna de- de aprendizagem.
ficiente visual em estar contribuindo com a cons- O jogo consiste na criação de equipes que bus-
trução e efetivação do AVENTUCORP. cam encontrar pistas para desvendar os mistérios
que embasam a morte de Maria. É um jogo ba-
RESULTADOS E DISCUSSÃO seado no lançamento de dados e que apresenta
algo a ser realizado, cada número no dado repre-
O AVENTUCORP foi criado pelos envolvidos senta uma ação: números 1 e 6 a equipe receberá
no projeto e que desejavam de alguma forma uma competência socioemocional que deve ser
contribuir com as fases de criação e testagem do contemplada na história criada; quando sair os
mesmo, para que possa ser vivenciado por ou- números 3 e 5 o mestre deve fazer uma pergunta,
tras turmas que cheguem ao último ano do ensino às equipes, sobre o conteúdo de jogo, estudados
médio da escola. A criação do jogo de RPG que nas aulas de Educação Física (por exemplo: O
aborda uma das unidades temáticas para disci- que são jogos eletrônicos?), caso a equipe acerte
plina de Educação Física (brincadeiras e jogos), a pergunta poderá escolher um local, do cenário
presente na BNCC, resultou numa experiência do jogo, para receber outra pista; e se no dado
única e relevante aos envolvidos no processo, sair os números 2 e 4 os grupos logo escolhem
pois a construção foi coletiva e mesmo à distância um local, que ainda não obteve uma pista. Ganha
possibilitou uma interação entre todos, por causa o jogo a equipe que conseguir chegar mais per-
da meta coletiva comum. to da verdadeira história sobre a morte de Maria,
Contudo, foi criado um grupo de Whatsapp através de sua produção textual.
para um contato mais rápido com todos os partici- Iniciamos o playtest, com a realização de um
pantes e envios de documentos. Logo depois foi encontro on-line entre todos os participantes,
realizado um encontro virtual para a apresenta- onde foi realizado a apresentação de como seria
ção geral das etapas que deveríamos seguir para a vivência e todos deveriam participar de cinco
alcançarmos o objetivo central: criar um jogo na momentos: o primeiro foi geral, com a participa-
estrutura de RPG que aborde temas relevantes ção de todas as equipes, para as considerações
ao público destinado e que os façam refletir quais iniciais; o segundo momento foi de forma indivi-
suas atitudes diante da situação, elaborando pen- dual, entre as equipes para organização das fun-
67 3
ções e escolha de seu personagem no jogo; o muito com minhas emoções, foi algo bem desa-
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EDUCAÇÃO FÍSICA ATRAVÉS DO RPG: PROMOVENDO A INTERDISCIPLINARIDADE EM LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
terceiro momento, pautou-se na vivência do jogo fiador, mas a proposta se faz necessária à forma-
em si, para que as equipes acumulassem o maior ção integral dos alunos. Mexe com nossos ideais
número de pistas para ajudar na construção de também”.
sua história; e o quatro foi necessário para que as Portanto, o presente estudo faz-se contextuali-
equipes formulassem seu texto, que deveria con- zado e promove um aprendizado significativo aos
ter todas as informações e competências socioe- envolvidos no processo. Cada participante apre-
mocionais acumuladas durante o momento três; e sentava embasamento em seus argumentos por
o quinto e último momento centra-se no encontro estarem inseridos no contexto, assumindo assim,
coletivo entre todas as equipes para compartilha- um sentido na construção e conexões com algo
rem suas produções textuais que desvendem o bem maior que seus entendimentos.
mistério que ronda sobre a morte de Maria.
Todas as escolhas foram efetivadas num pro- CONSIDERAÇÕES FINAIS
cesso democrático e mediado pela investigadora.
Contudo, o jogo AVENTUJOG, foi idealizado por O Roleplaying Game, enquanto prática lúdica e
um grupo de alunos, uma professora de Educa- fenômeno cultural contemporâneo, pode ser inse-
ção Física de escola pública e os parceiros es- rido no nicho da chamada cultura pop, dialogan-
pecialistas. O grupo desejava contribuir de forma do, inclusive com suas outras linguagens, como
relevante, construindo assim um LEGADO, para cinema, videogames e quadrinhos. Porém, por se
sua escola. sustentar na palavra falada, na criatividade e na
De acordo com os resultados obtidos compre- imaginação como seus elementos fundamentais,
endemos que a criação e vivência do jogo criado se conecta com a literatura de fantasia e, sobretu-
se apresenta bem relevante aos participantes. do, com uma tradição oral que remete a séculos.
Conseguimos alguns depoimentos dos alunos O RPG possibilita, através dos processos cria-
participantes: “Que jogo massa! Quero participar tivos em grupo, um espaço simbólico que utiliza
do grupo de estudos para criar mais jogos”; “Tia a fantasia como importante ferramenta de intera-
foi muito legal, pois ficamos unidos, com muitas ção e desenvolvimento sociocognitivo. A criação
ideias, e quase conseguimos descobrir”; “Quero de histórias em conjunto e de forma cooperativa
jogar mais vezes, amei o jogo”. Alguns depoimen- que o jogo estimula assume o papel de uma jor-
tos dos idealizadores: “Que proposta interessante nada fantástica, através de uma dinâmica capaz
e relevante para o processo educacional”; “Criar de atualizar os referenciais simbólicos e imaginá-
um jogo baseado em experiências reais mexeu rios dos sujeitos.
68 3
Quando participamos de um bom jogo – ou esta- dades pessoais, tornando-se assim, mais conec-
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mos enfrentando obstáculos desnecessários –, tados com outras pessoas e à realidade em que
nos movemos em direção à extremidade positi-
estão inseridos.
va do espectro emocional. Ficamos intensamen-
te envolvidos, e isso nos deixa com a disposição Percebemos que o estudo conseguiu articular
mental e a condição física adequadas para ge- as unidades temáticas da disciplina de Educação
rar todos os tipos de emoções e experiências Física (Esportes, Danças, Ginásticas, Lutas, práti-
positivas. Todos os sistemas neurológicos e cas corporais de aventura e Brincadeiras e Jogos)
fisiológicos que estão na base da felicidade –
com os temas transversais, oriundos do contexto
nossos sistemas de motivação, nossos centros
de emoção e memória – são inteiramente ativa-
que a escola e seus componentes (gestão escolar,
dos com os jogos (MCGONIGAL, 2012, p.37). professores, alunos, funcionários e familiares) es-
tão inseridos, buscando promover a interdisciplina-
Aos construir personagens heroicos e viven- ridade entre as disciplinas que compõem a área do
ciar situações épicas em narrativas imaginárias conhecimento Linguagens e códigos (Educação
desenvolvidas coletivamente, os jogadores de Física, artes, Língua portuguesa e Língua estran-
RPG resgatam temas e estruturas narrativas e as geira), sempre incentivando a leitura, a escrita, e a
ressignificam, conforme criam seus personagens produção textual dos envolvidos no jogo.
e aventuras a partir de seus conteúdos internos e Através de práticas inovadoras, buscan-
experiências externas, em um processo de inte- do estimular a idealização de novas pesquisas,
ração sociopsicológica, pautado na fantasia e na mostrando assim, ser possível sua execução. A
imaginação ativa, criando assim um sentido pró- curiosidade e o desejo de contribuirmos de forma
prio e múltiplo. significativa com a comunidade escolar, que aten-
O sentido que cada um atribui à sua prática demos deu “asa” a imaginação e o sonho tornou-
jogando RPG definitivamente será diferente de -se realidade. Acreditamos e defendemos que ao
indivíduo para indivíduo, de acordo com seus desenvolvermos ações inovadoras que busquem
conteúdos inconscientes, suas relações sociais trabalhar as competências socioemocionais na
e vivências. Porém, como percebemos, a sen- escola, possibilitam aos alunos reconhecerem e
sação de fazer parte de um esforço coletivo, re- compreenderem suas emoções diante de situa-
alizar proezas grandiosas e construir um mundo ções desafiadoras que possam surgir diariamen-
melhor, mesmo que momentaneamente, em um te, o que pode influenciar diretamente no proces-
ambiente imaginário, tem o potencial para fazer so de ensino e de aprendizagem.
dos jogadores de RPG indivíduos mais inclina- Com base nos resultados obtidos, entendemos
dos a criar laços sociais e aprimorar suas habili- que a criação do jogo AVENTUCORP, por meio da
69 3
Educação Física escolar, pode favorecer atitudes Ao criarmos um jogo cujo o enredo é basea-
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positivas nos discentes em situações de jogo. Os do em fatos reais nos remetem a compreender
alunos participantes acreditam na relevância que de fato sua relevância, motivo que nos moveram
tais desafios, em situação de jogo, favorecem: ao para disseminar atitudes preventivas, que muitas
processo de ensino e de aprendizagem; ao forta- vezes podem amenizar certos danos causados.
lecimento de vínculos; ao trabalho em equipe; a
prática da empatia e à cooperação. REFERÊNCIAS
A maioria dos participantes enalteceram, em
seus comentários, a alegria que se manifestou BENJAMIN, Walter. O narrador. in: Textos escolhidos.
São Paulo: Abril Cultural, 1979. [coleção Os Pensadores].
diante das experiências adquiridas ao longo do en-
sino médio, durante as aulas de educação física. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Co-
Para uma das alunas participantes: “O jogo em mum Curricular. Brasília, 2018.
si trás assuntos vivenciado no cotidiano que afe-
ta muito na vida das pessoas ao mesmo tempo CAMPBELL, J. O poder do mito. São Paulo: Palas
é um jogo que lhe tira da sua zona de conforto ti Athena, 1990.
fazendo querer descobrir, pensar, se sentir real-
mente dentro do jogo, tornando um determinado DARIDO, Suraya Cristina. Educação Física e temas
assunto interessante, fácil de aprender e dinâmi- transversais na escola. Campinas: Papirus, 2012.
co.” Já para uma segunda aluna que vivenciou o
jogo ressalta: “Bem empolgante, a experiência é DARIDO, Suraya Cristina. Educação Física na esco-
de entrar completamente na história, aamei pq o la: implicações para prática pedagógica, Rio de Janei-
último eu ganhei e tava desproporcional minha ro: Guanabara, 2005. 293 p.
equipe mas mesmo assim ganhamos”. Uma ter-
ceira fala que “Achei muito legal, pois eu nunca
HUIZINGA, J. Homo Ludens, o jogo como elemento
participei de um jogo e tinha muita vontade de
da cultura. 5ª Ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 2004.
participar de um jogo, só que eu vi que é muito
legal, então vou participar mais vezes, porque
JUNG, C.G. Tipos psicológicos. Petrópolis, Vozes,
eu adorei jogar, muito legal”. Para um dos alu-
nos idealizadores afirma que “Então tia pra mi- 1991.
nha primeira experiência nesse tipo de jogo eu
achei muito legal msm! Ate msm pelo fato de eu KASTENSMIDT, Christopher. A bandeira do elefante
não ter costume com esse tipo de jogo eu gostei e da arara: livro de interpretação de personagens. São
bastante! E tambem pelo fato de nos ajudarmos Paulo: Devir, 2017.
bastante uma ideia aqui outra ali e assim o jogo
foi se formando acho que assim como eu todo MACHADO, Regina. A arte da palavra e da escuta.
mundo ficou muito feliz com resultado! São Paulo: Editora Reviravolta, 2015.
70 3
MCGONIGAL, Jane. A realidade em jogo. Rio de Ja-
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neiro: Best Seller, 2012.
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 4
Logo, faz-se necessário entender como tal as-
sunto é colocado nos documentos nacionais de
referência da educação, para enfatizar a impor-
tância destas abordagens. Quando analisa-se
RESULTADOS E DISCUSSÃO
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes ne- LEITE, S.R.M.; BARROS, M.S.F. Ludicidade e infân-
cessários à prática educativa. 53a ed. São Paulo: Paz cia: a importância das oficinas pedagógicas. XI Con-
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Acesso em: 29 jun. 2021. https://www.hindawi.com/journals/jna/2011/904750/.
Acesso em: 9 nov. 2021.
82 4
OLUSOGA, Y. Nós não brincamos assim aqui: pers- sional e tecnológica. Instituto Federal de Educação, Ci-
SEGURANÇA NAS ATIVIDADES ternas. Entre 1998 e 2012, estima-se que lesões
ocorridas durante brincadeiras em playgrounds
INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
KISHIMOTO, T.M. Jogos infantis: o jogo, a criança e LEÃO JUNIOR, C.M.; LAZIER, T.R.; CARVALHO, J.
a educação. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. E. New technologies associated to leisure activities:
from online gaming till practicing offline. In: XII WORLD
LEÃO JUNIOR, C.M. Manual de jogos e brincadei-
LEISURE CONGRESS, Rimini, 2012. Book of Abs-
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la. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2013.
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(Mestrado em Ensino) – Centro de Ciências Humanas aventura nos videogames. VII congresso brasileiro
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José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
mento, e interação entre as pessoas e proporcio-
nando o desenvolvimento de competências úteis
para o crescimento do indivíduo. Família Escola
Se o homem é um animal social, ele também
JOGOS
é um animal que precisa e gosta de jogos para
desenvolver sua sociabilidade e construir o seu
bem-estar social e desenvolver habilidades cogni-
tivas. Principalmente, se esses jogos ajudarem a Comunidade
potencializar suas virtudes e habilidades que favo-
reçam a socialização, com a valorização da con-
Figura 1 – Jogo e suas interações.
fiança, da comunicação, motivação, bem como, Fonte: elaboração própria, 2021.
Figura 1 – Jogo e suas interações.
no ensino da colaboração e de práticas culturais e Fonte: Embora
elaboração própria,
os jogos 2021.
tenham a dimensão da ludicidade, no âmbito pedagógico, os jogos
ganham uma intencionalidade e técnica, que objetivam desenvolver habilidades pessoais e
educacionais que possam ser sustentáveis. interpessoais, que se externalizam, no modo de ser e fazer atividades que envolvam raciocínio
O jogo como instrumento de aprendizagem Embora
estratégias, os jogos
memória, táticas de ação etenham a dimensão da ludi-
tomada de decisões.
Nos jogos educacionais remotos, os alunos interagem utilizando computadores e/ou
que pode envolver em suas atividades, a colabo- cidade,e outros
smartphones no âmbito
dispositivospedagógico, os jogos
digitais, com o objetivo ganham
de estimular os comportamentos de
ração, a cooperação, as regras e restrições, situ- uma Este intencionalidade e técnica, que objetivam
colaboração, criatividade, comunicação, confiança, iniciativa e estratégia.
artigo, trata da dimensão pedagógica e andragógica dos jogos e em seus aspectos
incorporar e aprende os seus hábitos motores interagem utilizando computadores e/ou smar-
envolver os alunos e oferecer maior dinâmica na resolução de problemas e aprendizagem de
conteúdo. Pode ser que alguns professores não utilizem, por não conhecerem a conexão dos jogos
o processo deeensino-aprendizagem,
comtphones outros dispositivos digitais, com o ob- que pode se
havendo um potencial para transformação
(jogo de exercício), as necessidades do eu (jogo explorado à medida que passa a ser conhecido. Esse é um dos motivos que torna a pesquisa sobre
simbólico) e as demandas das relações sociais jetivo
jogos de estimular
educacionais e sua divulgação oscomocomportamentos
modo de elucidar questões dee subsidiar
cola- a didática do
ensino para professores das diferentes áreas do conhecimento.
(jogo de regras). boração, Almeidacriatividade,
et al (2021, p. 207), comunicação, confiança,
vés de suas relações e interações com o ambiente dragógica dos jogos e em seus aspectos comuni-
conforme objetivos e interesses (GOMES, 2003, tários e famíliares. Para isso, é importante saber o
p.120). Os jogos podem ajudar na aprendizagem que os acadêmicos do curso de pedagogia, futuros
nas dimensões familiar, escolar e da comunidade. professores, percebem e conhecem sobre os jogos
132 9
digitais, e como estão sendo utilizados no contexto sobre o que motiva ou as formas mais atrativas
José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
da pandemia da Covid-19, que se iniciou no Brasil que os impulsionam a sanar a curiosidade dos
envolvidos no processo educacional passa a ser
em 2020 e se prolonga ao longo de 2021.
um dos objetivos primordiais dos educadores
Os jogos e materiais pedagógicos funcionam que estão abertos ao novo.
como recursos de “pluralização” das modalidades
de aprendizagem e são voltados muitas vezes, Nesta primeira seção, tem-se por objetivo
aos desenvolvimentos cognitivos e de habilidades apresentar a importância dos jogos para a so-
voltados ao aprimoramento do jogador das diver- ciabilidade das pessoas; na Figura 1 acima, há
sas formas da inteligência (BARBOSA, 1997). a apresentação de relações entre comunidade e
Nesse contexto, de aulas remotas, a utilização família por meio das estruturas dos jogos, e prin-
de jogos é uma opção efetiva para envolver os cipalmente dos jogos digitais,
alunos e oferecer maior dinâmica na resolução de Na segunda seção, coloca-se os jogos como
problemas e aprendizagem de conteúdo. Pode ser recurso pedagógico nas diferentes áreas das ci-
que alguns professores não utilizem, por não co- ências; na terceira seção, mostra-se os procedi-
nhecerem a conexão dos jogos com o processo de mentos metodológicos da sondagem acerca da
ensino-aprendizagem, havendo um potencial para percepção de alunos de graduação do curso de
transformação que pode ser explorado à medida pedagogia da Universidade Federal do Ceará so-
que passa a ser conhecido. Esse é um dos motivos bre a utilização de jogos nas práticas pedagógi-
que torna a pesquisa sobre jogos educacionais e cas, contou-se com a participação de 21 alunos.
sua divulgação como modo de elucidar questões
e subsidiar a didática do ensino para professores OS JOGOS COMO INSTRUMENTOS DE
das diferentes áreas do conhecimento. MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA
Almeida et al (2021, p. 207),
Os jogos, no contexto educacional, buscam Como exemplificação, citamos o caso descrito
de forma fidedigna possibilitar a absorção do por Grillo et al (2021) que estudou o jogo de Xa-
conhecimento através da ludicidade, indepen- drez como mediador para a construção de conhe-
dentemente de seu público-alvo. Cada jogo de-
cimento matemático. Segundo Grillo et al, houve
senvolvido na escola, de forma contextualizada
pode facilitar o processo de ensino e de aprendi- uma construção de soluções criativas nas situa-
zagem, pois o alunado acaba vivenciando outras ções apresentadas durante o jogo.
formas de adquirir conhecimentos diferentes de Segundo Grillo et al (2021, p. 134) descreve que:
aulas baseadas exclusivamente em metodolo-
gias tradicionais. Assim, o conhecimento prévio
133 9
as ações dos alunos corroboraram com a produ- onça. A onça é mais forte e possui habilidades.
José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
ção de conhecimentos matemáticos, especifica- O(s) jogador(es) que representa(m) a onça tem
mente, nos momentos de levantamento e apre-
que utilizar essas habilidades e força de modo a
sentação de hipóteses, de (re)formulação e de
comunicação de procedimentos, nos momentos escapar das armadilhas dos cães ao mesmo tem-
de análises das possibilidades de jogadas, inter- po que capturar os cinco cachorros; do outro lado,
pretação e conjecturas, e, enfim, nas argumen- o(s) jogador(es) que representa(m) a matilha tem
tações sobre as resoluções. que imobilizar a onça utilizando estratégias de
caça e defesa ao mesmo tempo.
Um ponto interessante, no caso acima, é que
Abaixo, citamos alguns exemplos de jogos que
os alunos não perceberam “os erros” nas jogadas
mediam de forma pedagógica conteúdos das dis-
como algo negativo, mas como situações que se
ciplinas como: geografia, português, matemática
deve analisar e aprender. O erro é um evento na-
e economia.
tural em se tratando de aprendizagem tanto nos
jogos como também na vida. O papel do professor
também ficou evidente, nos processos de organi- Quadro 1 – Jogos pedagógicos.
José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
Quadro 2 – 7 tipos de jogos educativos para ensinar.
Ajuda os estu-
dantes da pré-es-
cola e dos anos TIPO DESCRIÇÃO
iniciais do ensino De construção usados para explicar alguma coisa
fundamental a existem de todos os tipos e são mais prá-
WEB: alfabetizacao. Online
GRAPHOGAME aprender a ler as ticos e de fácil acesso
mec.gov.br/grapho-game
primeiras letras,
sílabas e pala- são mais estratégicos, ajudam a criança
vras, com sons De tabuleiro a pensar melhor, achar soluções e tomar
e instruções em decisões
português ajudam os pequenos a se expressarem
Corporais e
A criança apren- melhor, a perder timidez, na coordena-
dinâmicos
de noções sobre ção motora e relações sociais
educação finan- ajudam na memória. No caso das crian-
BANCO Em lojas de brinquedos
ceira, trabalhan- De treinamento ças de até 5 anos, o mais indicado é o
IMOBILIÁRIO e jogos
do as questões quebra-cabeça
práticas de per- ajudam na rapidez de raciocínio, na lógi-
das e ganhos. Perguntas e respostas
ca e na memorização.
É um jogo de introduz a criança no mundo dos núme-
tabuleiro para Matemáticos
ros desde pequenos.
adolescentes e
adultos. Ajuda Fonte: canaldoensino.com.br/blog/7-jogos-educativos-para-ensinar-
a desenvolver -brincando, 2021.
JOGO DA
dimensões Em lojas de brinquedos
VIDA COM
psicossociais e jogos
APLICATIVO
como: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA
socialização,
raciocínio,
SONDAGEM SOBRE A PERCEPÇÃO DOS
estratégia e ALUNOS DO CURSO DE PEDAGOGIA SO-
atenção. BRE A UTILIZAÇÃO DOS JOGOS COMO
Fonte: elaboração própria, 2021. MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA
Quanto ao tipo de jogos educativos, apresen- Nesta seção aborda-se a metodologia da pes-
tamos a seguinte classificação, no Quadro 2, ex- quisa, tratando-se portanto de uma pesquisa ex-
posto a seguir. ploratória e bibliográfica, pois buscou-se na lite-
ratura tais como: artigos, revistas, sites diversos,
dentre outros, informações e fundamentação teó-
rica para a realização da mesma. Gil (2010, p. 27)
esclarece que:
135 9
A pesquisa exploratória tem como propósito pro- das respostas, além de assegurar o anonimato ao
José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
porcionar maior familiaridade com o problema, interrogado. Pesquisa de abordagem Qualitativa,
com vistas a torná-lo mais explícito ou construir
que tem o ambiente natural como fonte direta de
hipóteses”, o que nos permite entender que fa-
vorece a checagem de hipoteses e proporciona dados e o pesquisador como seu principal instru-
maior aproximação do pesquisador com a coleta mento. A pesquisa Qualitativa supõe o contato di-
dos dados para a investigação que estar sendo reto e prolongado do pesquisador com o ambien-
objeto de estudo. te e a situação que está sendo investigada via de
regra, por meio do trabalho intensivo de campo.
Pesquisa de abordagem quantitativa e qua-
Para Minayo (2002), a pesquisa qualitativa tra-
litativa, a qual foi realizada durante a disciplina
balha com o universo de significados, motivos, as-
de informática educativa do curso de Pedago-
pirações, crenças, valores e atitudes, o que corres-
gia 4° semestre da Universidade Federal do Ce-
ponde a um espaço mais profundo das relações,
ará (UFC), turma esta composta por 24 alunos.
dos processos e dos fenômenos que não podem
Para a realização da pesquisa foi elaborado
ser reduzidos à operacionalização de variáveis. A
um questionário contendo 9 questões no Goo-
pesquisa terá também uma abordagem Quantita-
gle Forms, sendo estas mescladas entre ques-
tiva, pois recorrerá à linguagem matemática para
tões objetivas e subjetivas, aplicadas na turma
quantificar dados e condensação deles para pos-
a partir da disponibilização do link do referido
terior análises. A utilização conjunta da pesquisa
questionário via Google Classroom, ambiente
Qualitativa e Quantitativa permite recolher mais
no qual estar acontecendo o desenvolvimento
informações do que se poderia conseguir isolada-
e acompanhamento das atividades realizadas
mente. Conforme Minayo (2002), “o conjunto (Qua-
pela turma. O fato de termos optado pelo ques-
litativa-Quantitativa) não se opõem, ao contrário se
tionário no Google Forms, deve-se ao fato de
complementam”, pois segundo a autora a realida-
que neste contexto de pandemia da COVID-19
de abrangida por elas interagem dinamicamente,
inviabiliza o ensino presencial, estando o mes-
excluindo assim qualquer dicotomia.
mo acontecendo de forma remota.
A pesquisa quantitativa centra-se na objetivi-
Marconi e Lakatos (2011, p. 88) definem o
dade, influenciada pelo positivismo, considerando
questionário estruturado como uma “série orde-
que a realidade só pode ser compreendida com
nada de perguntas, respondidas por escrito sem
base na análise de dados brutos, recolhidos com
a presença do pesquisador”. Assim, por meio de
o auxílio de instrumentos padronizados e neutros.
perguntas padronizadas, objetivas e subjetivas,
A pesquisa quantitativa recorre à linguagem ma-
possibilitou-se a interpretação dos respondentes,
temática para descrever as causas de um fenô-
facilitando assim a comparação e condensação
136 9
meno, as relações entre variáveis, etc. A pesquisa
José César Pontes Moreira - José Rogério Santana - Fredson Rodrigues Soares
JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
quantitativa, que tem suas raízes no pensamento
positivista lógico, tende a enfatizar o raciocínio de-
dutivo, as regras da lógica e os atributos mensu-
ráveis da experiência humana. (POLIT, BECKER
E HUNGLER, 2004, p. 201).
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JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
“Os jogos educacionais online são de grande valia no âmbito edu-
cacional virtual, eles permitem ao professor repassar seu conteúdo conectividade eletrônica do que a geração dos
de maneira didática e divertida para a maiorias dos discentes. En-
tretanto por vezes o aparelho ao qual o aluno utiliza não suporta professores. Na perceção dos alunos responden-
tais jogos por ser muitas vezes obsoleto ou não possuir um acesso tes, os jogos com conteúdos educacionais poten-
ideal de internet. Quando utilizados os materiais virtuais trazem
cializa os trabalhos em equipe, gerando maior
grande interesse por parte dos alunos e complementam a captação
do conteúdo estudado, se sanadas as dificuldades técnicas.” aprendizagem e auto-motivação.
“Acho que é uma excelente ferramenta para manter a atenção dos Abaixo, segue algumas respostas com relação
alunos mesmo fora da sala de aula e para mostrar que aprender
a questão 3, acima discutida.
pode ser divertido e interessante”
“Acredito que seja muito importante, pois proporciona o apren- Quadro 4 – respostas questão 3.
dizado de maneira mais leve e prazerosa para o estudante, princi-
palmente nesse momento de pandemia.”
“Confeção com a geração atual, ferramenta interativa, nova visão
“Os jogos podem ser bastantes enriquecedores durante o período de abordagem de conteúdo.”
de pandemia, desde que sejam jogos de qualidade e utilizados de
Eles introduzem os alunos em um ambiente tecnológico e os fa-
forma bem planejada e com intencionalidade pelos professores.”
miliarizando com o virtual pode-se explorar diversos programas
“Muito importante para facilitar o processo de aprendizagem. e aplicativos que irão incentivar e aprimorar conteúdos estuda-
Além disso, é uma forma divertida de aprender, entrando na rea- dos. Os jogos educacionais despertam o interesse da maior parte
lidade da criança” dos alunos e quando estão imersos no novo e divertido mundo
“Os jogos educacionais no atual contexto pandêmico, são de virtuais aprendem com mais facilidade.
grande importância, pois podem ser um recurso motivador da Aumento do foco, sensação de recompensa e opção de repetir.
aprendizagem”
Permitir o aluno aprender brincando, estimular a criatividade e
“No atual período que estamos, teoricamente deveríamos estar raciocínio lógico.
isolados em casa e assim utilizando dos mais diversos recursos
Facilitam a aprendizagem e a associação do conhecimento ad-
para a distração da mente. Os dispositivos estão inseridos em
quirido com a vida diária.
quase todas as atividades, jogos educacionais ajudam a dinami-
zar o aprendizado e não cair no tédio de você e uma tela apenas Aprender brincando/jogando, desenvolver o respeito, a empatia, etc.
ouvindo e tendo que armazenar as informações.”
“São de extrema importância, pois reduzem a distância entre os
conteúdos e o dia a dia” A quarta questão tratou sobre cinco tipos de
jogos: de ação, memória, de estratégia, de lógica
A terceira questão apresentada aos participan-
e de aventura. Quais foram os tipos vivenciados
tes da pesquisa, foi quanto aos benefícios dos jo-
pelos respondentes em sua formação pedagó-
gos educacionais. As respostas apontam que há
gica? As respostas obtidas estão representadas
vários benefícios para alunos e professores. Para
no gráfico 02.
os alunos é um método dinâmico de aprender
brincando, onde se pode aprender com os erros e
retro-alimentar de forma positiva. A realização de
jogos se encontra mais próxima da vivências, já
138 9
trabalham a concentração, o pensamento rápido
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JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
diante de uma situação inesperada, o reflexo men-
tal e a coordenação motora. Os jogos de aventu-
ra, ficaram em último lugar. Geralmente, utilizam
a simulação de vivências e cenários, trabalham a
empatia, a autonomia e a curiosidade. Somente,
4,8% dos participantes não usaram jogos durante
a formação pedagógica e no período de pandemia.
Gráfico 2 – Resposta da questão dos cinco tipos de jogos abaixo
Na quinta questão, foi apresentado a turma
descritos. Marque quais você já vivenciou/utilizou em sua formação
pedagógica. o seguinte questionamento: quais os jogos edu-
Fonte: Produzido pelos autores, 2021. cacionais que você utilizou ou utilizará em suas
práticas pedagógicas? Os participantes respon-
Em primeiro lugar, com 66,7% de retorno por deram de forma satisfatória, apontando vários jo-
parte dos alunos, os jogos de lógica, estes são gos, quais sejam: software GeoGebra usado por
mais populares, pois são utilizados em várias do 4 alunos participantes, Geompris, Childsplay, Dr.
conhecimento, pois desafiam a mente e trabalham Geo, GeoNext, Stellarium, Duolingo, Grassho-
a classificação, ordenamento e análise de padrões pper, show do Milhão, Sudoku, Brain Test, Josos
de um sistema de eventos. Os jogos de memória, de lógica, Jogos de memória, xadrez virtual, Can-
também são populares, e tiveram um percentural dy Crush, Farm heroes saga, Bubble witch saga,
de uso elevado, com 57,1%; refere-se ao desen- dominó, palavras cruzadas, pega varetas, Tan-
volvendo de habilidades de percepção e memória. gram virtual, Futebol e Kahoot.
Os jogos de estratégias, são interessantes e 38,1% Importante notar que o software GeoGebra, foi
dos respondentes responderam ter vivenciado du- o que apareceu com maior frequência, isso pode
rante a trajetória acadêmica, embora o percentual ser resultado das inúmeras aplicações que o geo-
não seja insignificante, mas já aponta para uma gebra possibilita, principalmente, no campo da ma-
certa deficiência na utilização desse tipo de jogo temática, que segundo os alunos é a matéria mais
que é tão importante para exercitar a tomada de difícil aprendizagem apontada pelos alunos.
decisões assertivas e estabelecer planos de traba- O GeoGebra é uma junção de geometria com
lho e trajetórias para alcançar objetivos. álgebra, foi criado na Universidade de Salzburg,
Em quarta posição, os jogos de ação, com Áustria. O GeoGebra é a ferramenta que está
33,3% de participantes que vivenciaram em sua disponível em português e dar acesso livre para
formação pedagógica, é o tipo de jogo que auxilia utilização, permite que o usuário possa desenhar
no desenvolvimento psicomotor. Os jogos de ação figuras com pontos, vetores e curvas. Pode-se
139 9
equações matemáticas e fazer representação de Na sétima questão, busca-se saber sobre a
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JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
funções em gráficos. percepção dos alunos sobre a dificuldade de apli-
O GeoGebra possui uma plataforma interativa cação de jogos em sala de aula. As respostas co-
que propicia a aprendizagem da matemática de locadas foram claras ao definir os seguintes pon-
modo simples e lúdico. Pode ser utilizado por alu- tos que dificultam a utilização dos jogos em sala
nos em qualquer grau de ensino. Disponibiliza 4 de aula:
tutores básicos: Learn GeoGebra Classroom, Le-
arn Graphing Calculador, Learn Calculator Suite e 1. quanto ao aspecto formal, há uma neces-
o Learn GeoGebra Classic. sidade de atualizar a matriz curricular do
Na sexta questão da pesquisa, tratou-se do pro- curso de pedagogia de modo a contemplar
cesso de formação pedagógica. Fez-se a seguinte o letramento educacional em jogos e infor-
pergunta: quantas disciplinas você experimentou mática. Os professores precisam ser capa-
para a formação de utilização de jogos educacio-
citados para ensinar os alunos a utilizarem
nais como proposta efetiva de aprendizado.
os jogos como recurso pedagógico.
Somente, 28,6% dos respondentes da turma
2. quanto ao aspecto logístico, dificuldade de
de 21 alunos cursaram disciplinas que de alguma
acesso a Internet, aparelhos e materiais que
forma ensinavam a utilizar os jogos como propos-
facilitem a utilização de jogos em sala de
ta de mediação pedagógica. As respostas encon-
aula. Há uma necessidade de computado-
tram-se apresentadas no gráfico 03. Somente um
res e de aparelhos compatíveis com a ope-
aluno não teve contato com disciplina que ensina
racionalização dos jogos, pois geralmente
a utilização de jogos como recurso pedagógico.
requerem maior capacidade de memória e
um sistema operacional mais rápido.
3. há uma ausência de políticas de inclusão
digital, tanto nas universidades quanto nos
ambientes comunitários, de modo a disponi-
bilizar Internet com qualidade e equipamen-
tos adequados para a operacionalização de
jogos de modo mais acessível a todos.
Gráfico 3 – Resposta da questão no processo de sua formação 4. aspecto familiar, há uma certa dificuldade
pedagógica. Quantas disciplinas você experimentou a formação
dos familiares entenderem que os jogos
para a utilização de jogos educacionais como proposta efetiva de
aprendizado são ferramentas para desenvolver habilida-
Fonte: Produzido pelos autores. des mentais (exemplo: memória e lógica)
140 9
e psicomotoras. Os pais dos alunos preci- A última questão da sondagem realizada, foi
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JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
sam entender que os jogos não são, unica- quanto a dificuldade de operacionalização dos jo-
mente, atividade de divertimento, mas que gos no ambiente virtual. As respostas se repetem,
envolve habilidades mentais como capaci- por isso, condensamos. As dificuldades dos alunos
dade de análise, tomada de decisão, lógica no ambiente virtual, quanto ao aspecto da utilização
e utilização de princípios de várias áreas dos jogos pedagógicos, são as seguintes: acesso
do conhecimento humano. à Internet e dispositivos com memória que permita
5. a distração no ambiente virtual. Os alunos operações digitais rápidas; falta de dispositivo ele-
são “bombardeados” com uma série de in- trônico para todos, ou seja, inclusão digital; falta de
formações e atrações que podem reduzir dispositivo eletrônico nas escolas e universidades
ou até mesmo impossibilitar as atividades atender as demandas de todos; os alunos não pos-
pedagógicas virtuais. suem smartphone e conexão compatíveis; e, por
ultimo, segurança no ambiente virtual.
Abaixo, apresentamos algumas respostas da- No Quadro 6, abaixo, estão relacionadas algu-
das pelos alunos, quanto a esse ponto. mas respostas que sintetizam as perceções dos
alunos respondentes à pesquisa.
Quadro 5 – Dificuldades de jogos na sala de aula.
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JOGOS EDUCACIONAIS E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
“Muitas vezes as limitações principalmente do professor em
relação ao manuseio das tecnologias.” ção dos professores e alunos em letramento de
“...nem todos os alunos possuem recursos para usufruir de tais jogos nos mais diversos tipos: memória, de estra-
meios.”
tégias, de aventura, de ação, de exercício sensó-
“Limitação da qualidade da Internet e aparelhos que possam su-
portar as plataformas digitais.” rio-motor, de lógica e de simulação.
“O acesso à internet e dispositivos com boa memória.” Os jogos como mediadores pedagógicos são
“Nem todos terem acesso por não haver dispositivo eletrônico instrumentos que reforçam, motivam e potenciali-
para todos.”
zam o aprendizado.
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ZAIM-DE-MELO, R.; GODOY, L.B.; BRACCIALLI, F.
INTRODUÇÃO
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gir com qualquer personagem, ou constituir parte Fonte: Acervo da autoria.
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INTRODUÇÃO
Edmara Bazoni Soares Maia - Carolline Billett Miranda - Fabiane de Amorim Almeida
O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
principalmente quando são hospitalizados, é mui- tegral, que considera preocupações e angustias.
to diferente do seu cotidiano, além de ter que li- A ambiência, por sua vez, não deve ser somente
dar com a dor, a limitação física, a passividade, o considerada como espaço físico, mas também
sentimento de culpa, medo da morte e a punição. um lugar social, interacional, confortável, que
Nesse sentido, os profissionais de saúde podem deve promover a privacidade e a afetividade entre
contribuir sobremaneira para tornar esse momen- as pessoas. Já a perspectiva da Clínica Ampliada
to menos traumático e estressante, ao garantir prevê a necessidade de ultrapassarmos o cuida-
as condições ideais para que o brincar aconteça do biológico para o cuidado integral considerando
(MAIA, SOUZA, MELO, RIBEIRO, 2021). a pessoa e sua subjetividade no centro do cuida-
Existem diferentes atividades lúdicas que podem do (BRASIL, 2004).
ser desenvolvidas pelo profissional com a criança, Essas diretrizes iluminam os caminhos para
adolescente ou adultos durante o cuidado prestado, que o brincar e suas práticas sejam protagonistas
não apenas no hospital, mas em qualquer ambiente e mobilizadores de uma relação empática e lúdica
de assistência à saúde, como ambulatórios, salas entre clientes e profissionais.
de vacinas, serviços de coleta de exames laborato- Discutiremos, a seguir, sobre as diversas pos-
riais e realização de exames de imagem, entre ou- sibilidades de se desenvolver atividades lúdicas
tros. Sempre há lugar para o brincar. no contexto de saúde, desde as transformações
Contudo, embora as práticas lúdicas aconteçam da arquitetura hospitalar com ênfase na humani-
há muito tempo no cuidado em saúde, foi a partir zação e na ludicidade, as práticas lúdicas que tem
da Política Nacional de Humanização (PNH) do Mi- sido destaque na literatura atual, como a arte dos
nistério da Saúde, instituída no ano de 2004, que clowns, o uso da a música, a pet terapia, a artete-
estas ações ganharam maior visibilidade e impor- rapia, o brinquedo terapêutico, a distração, o uso
tância. Passaram a ser implementadas no cuida- dos fantoches, robôs e a realidade virtual.
do em saúde norteadas por essa política nacional,
que tem como pressuposto valorizar os diferen- DESENVOLVIMENTO
tes atores do sistema, usuários, trabalhadores e
acompanhantes e suas dimensões subjetivas, cul-
turais e clínicas. Entre suas diretrizes que norteiam As transformações da arquitetura hospitalar
as práticas lúdicas destacamos, o acolhimento, a
ambiência e a clínica ampliada (BRASIL, 2004). Os hospitais entre outros locais de atendimen-
O acolhimento deve reconhecer o que o outro to à saúde são espaços cujo design deve consi-
traz como legítima e singular necessidade de saú- derar o efeito do ambiente físico sobre o bem-es-
176 12
tar das pessoas que transitam por eles, quer seja nível para o acesso dia, noite e fins de semana,
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
pacientes, famílias e equipe médica. Neste sen- projetam pinturas nas paredes refletindo o univer-
tido as artes visuais tem sido destaque como um so infantil e assim, ofereça maior alegria e des-
elemento que pode melhorar a qualidade estética contração. Ainda, desejam espaços ao ar livre,
e simbólica desses locais, com impacto positivo como solários, com flores, árvores, parquinhos in-
na experiência da família e do cliente e promoção fantis e por fim, sala de música para compartilhar
de seu bem-estar. (ULLAN, BELVER, 2021). com amigos, distrair e aliviar o fato de estarem
Segundo Ullan e Belver (2021) esses recursos hospitalizados. (CASSEMIRO, OKIDO, FURTA-
são concebidos como uma estratégia privilegiada DO, LIMA, 2020).
para a promoção de uma cultura de atenção à saú- No Brasil, a organização dos espaços físicos
de do paciente, que presta atenção especial às ne- de atendimento a criança em regime hospitalar
cessidades emocionais dos clientes e suas famílias ou ambulatorial ganhou uma nova perspectiva, a
durante os processos de doença e cura. Nos am- partir do ano de 2005. Neste ano, foi promulgada
bientes físicos dos hospitais, recursos artísticos e a Lei Federal n. 11.104/2005, que tornou obriga-
lúdicos podem melhorar a qualidade dos processos tória a presença de brinquedotecas em ambientes
de comunicação se puderem transmitir suporte e hospitalares, o que foi uma valiosa conquista de
significados positivos aos usuários. Quando se trata cunho humanizador na assistência às crianças
de crianças, esses recursos podem promover hu- doentes e hospitalizadas (BRASIL, 2005).
mor, brincadeira, distração, imaginação e tornam-se As brinquedotecas como espaços lúdicos pos-
aliados para promover uma experiência mais positi- sibilitam às crianças a socialização por meio do
va de ida aos cenários de cuidado em saúde. brincar e jogar com seus pares e assim, é um es-
O olhar diferenciado e valorizador das ne- paço potente para a preservação e recuperação da
cessidades das crianças, tem provocado inicia- saúde emocional dos mesmos. Tem como objetivo
tivas importantes dos profissionais na busca de preparar a criança para situações novas que irá
melhorar esses espaços, como ouvir os desejos enfrentar, quando por meio da brincadeira e explo-
das crianças e o que consideram importante so- ração de materiais, brinquedos, roupas e instru-
bre o design de hospitais infantis. Estudo eviden- mentos hospitalares previstos no acervo da brin-
ciou que as crianças e adolescentes projetam um quedoteca, podem familiarizar-se com os mesmos
espaço hospitalar de dupla função, de cura e de que são, em geral, desconhecidos e amedrontado-
interações sociais e, portanto, idealizam espaços res. Este espaço permite ainda, dar sentido de nor-
lúdicos destinados a recreação que esteja dispo- malidade a vida e continuidade para que a criança
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continue a se desenvolver brincando, apesar da A arte do palhaço
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
doença e hospitalização (CUNHA, 2020).
Reconhecer a criança como ser lúdico e conse- A presença do palhaço no ambiente de saúde
quentemente, interagir com ela dessa forma, tem traz inúmeros benefícios para crianças, adultos e
mobilizado pesquisadores a buscar alternativas idosos, dentre eles a construção de vínculos e a
para melhorar sua experiência por meio das prá- melhora no bem-estar (BRITO, SILVEIRA, MEN-
ticas lúdicas, como por exemplo, a implementa- DONÇA, JOAQUIM, 2016; DIONIGI, CANES-
ção do uso de carrinhos infantis motorizados para TRARI, 2016). Palhaços buscam criar um elo com
transporte da criança ao centro cirúrgico, momen- o paciente, seus acompanhantes e também com
to que é considerado de risco para aumentar a a equipe de saúde, estabelecendo uma relação
ansiedade pré-operatória. Os minis carrinhos mis- de confiança mútua. Desse modo, as pessoas
turam-se com o colorido e os desenhos das pare- desenvolvem suas potências por meio de cenas
des, o que amplia a energia lúdica do local. teatrais criadas a partir da lógica do palhaço pro-
Liu e colaboradores (2018) verificaram que o fissional em consonância com os acontecimentos
transporte de crianças pré-escolares da enferma- hospitalares (BRUM, PORPINO, 2017).
ria para o centro cirúrgico, em um hospital chinês, As visitas de “palhaços hospitalares” promo-
por meio de um carrinho de brinquedo motorizado, vem alegria e descontração no ambiente, alivian-
reduziu significativamente a ansiedade pré-opera- do o estresse de pacientes e acompanhantes, es-
tória. Este modo de transporte mostrou-se seme- pecialmente nas unidades pediátricas, trazendo
lhante ao efeito ansiolítico da medicação midazo- tranquilidade para as mães das crianças interna-
lan, um sedativo de uso oral utilizado como rotina das. Ainda contribuem para o enriquecimento das
no pré-operatório de crianças que são submetidas relações entre profissionais e estudantes com os
a cirurgia. Outra pesquisa koreana corrobora os pacientes e, ainda, dos pacientes entre si (SATO,
achados de que o transporte de crianças em va- RAMOS, SILVA, GAMEIRO, SCATENA, 2016).
gões específicos, de aspecto lúdico, podem ser No universo do palhaço, utilizam-se diferentes
uma boa alternativa para reduzir a ansiedade pré- estratégias com o intuito de modificar a rotina hos-
-operatória das crianças, além de ter a vantagem pitalar, ajudando crianças e seus acompanhan-
da simplicidade em seu uso. (PARK et al, 2020) tes, ao proporcionar momentos de distrações e
subversão da lógica hospitalar, por meio de criati-
vidade, imaginação, humor e ressignificação das
emoções (LINGE, 2013).
178 12
No contexto hospitalar, Michael Christensen, O uso da música
Edmara Bazoni Soares Maia - Carolline Billett Miranda - Fabiane de Amorim Almeida
O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
diretor do Big Apple Circus de Nova Iorque, uma
organização circense norte-americana, foi o pio- Como visto anteriormente, as crianças quando
neiro em atuar sistematicamente e de modo es- ouvidas sobre suas expectativas quanto à arqui-
truturado como palhaço, apresentando-se em tetura hospitalar projetam salas de música e defi-
1986 para crianças internadas, realizando paró- nem esse espaço como local de relaxamento e de
dias médicas (MASETTI, 2001). interações sociais.
Surgiu, então, o Clown Care, um programa De fato, a música tem sido utilizada como uma
destinado a levar palhaços para o contexto hos- estratégia para ajudar as pessoas a melhorar ou
pitalar e colocar em prática um método diferen- manter sua saúde. Pode ser utilizada como uma
ciado, utilizado para crianças hospitalizadas. No estratégia para promoção de um momento rela-
Brasil, Wellington Nogueira fundou o grupo “Dou- xante durante um atendimento em saúde, provo-
tores da Alegria”, em 1991, após nove anos de cador de ansiedade e preocupações ou ainda,
trabalho com Michael Christensen (BRUM; POR- como terapia e neste caso, há a necessidade de
PINO, 2017; MASETTI, 2001). um profissional especializado, com formação em
Mais recentemente, algumas universidades da Musicoterapia (YINGER, 2016).
saúde têm introduzido a linguagem do palhaço No campo da imunização infantil, pesquisado-
em seus currículos, com o objetivo de aprimorar res tem utilizado a música para distrair a criança
as habilidades socioemocionais de futuros pro- no momento da aplicação da vacina e encorajar
fissionais, muitas vezes subestimadas no ensino os pais a cantarem junto as canções que são sele-
tradicional. A literatura mostra que essas vivên- cionadas conforme as preferências das crianças.
cias se revelam transformacionais, contribuindo O estudo demonstrou que cantar com a criança
para que profissionais se tornem mais empáticos, durante o procedimento de aplicação de vacinas
sensibilizando-se às necessidades do outro (AL- e incluir instrumentos reais como violão clássico,
MEIDA; LOURO, 2021). maracas de plástico, tambores, pandeiros, casta-
Embora os benefícios dessa prática hospitalar nholas e tambores tem o potencial de normalizar
estejam consolidados na literatura, ressaltamos a e humanizar um ambiente potencialmente ame-
importância de se conhecer como as crianças rea- açador, melhorando a experiência das crianças,
gem a presença dos palhaços, uma vez que, mui- seus pais e membros da equipe de saúde (YIN-
tas delas, a depender da faixa etária e de suas ex- GER, 2016; ORTIZ et al, 2019).
periências, demonstram medo e resistência a sua Em outros cenários como o atendimento às
presença, o que deve ser acolhido e respeitado. emergências em saúde, a música no ambiente ou
179 12
aplicada por um instrumento interativo têm apre- observado na prática diária e deveria ser consi-
Edmara Bazoni Soares Maia - Carolline Billett Miranda - Fabiane de Amorim Almeida
O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
sentado efeito na redução da percepção de dor e derada na prescrição médica, especialmente para
integração da consciência mental e corporal. Um pacientes em unidades de terapia intensiva. Os
estudo envolvendo a parceria dos profissionais autores sugerem mais estudos para investigar o
Child Life e musicoterapeuta com o objetivo de tipo, número e tempo das sessões de música.
preparar a criança para a punção venosa no aten-
dimento de emergência e ajudá-la no momento A presença de animais em ambientes de
da punção por meio da música foi potente na re- cuidado em saúde
dução do seu sofrimento, medo e possibilitou o
aumento no nível de cooperação, conforto e tran- A presença de animais nos serviços de saúde
quilidade. Os instrumentos utilizados para a inter- tem contribuído significativamente para amenizar
venção musical foram um piano elétrico, violão e o impacto da doença e da hospitalização na vida
instrumentos de percussão (ORTIZ et al, 2019). das pessoas. Há algumas décadas, esta ativi-
Além de setores como a emergência, há evi- dade era vista como totalmente inapropriada ao
dências cientificas benéficas sobre os efeitos da ambiente hospitalar, pela crença de que poderia
música em pacientes críticos hospitalizados em aumentar o risco de infecção para os pacientes.
terapia intensiva. Esta promove a modulação efi- Entretanto, a relação entre ser humano e ani-
caz das respostas do organismo frente ao estres- mal existe desde os primórdios da civilização e a
se, reduzindo os sinais e sintomas de ansiedade, presença de animais em ambientes terapêuticos é
promoção do relaxamento e redução nas medi- descrita desde o século XVII (MANDRÁ, MORET-
das fisiológicas marcadoras desses eventos (UM- TI, AVEZUM, KUROISHI, 2019; IAHAIO, 2013).
BRELLO et al, 2019). A inserção dos animais nos serviços de saú-
A revisão sistemática realizada por Umbrello de podem ocorrer de diferentes maneiras, sendo
e colaboradores (2019) aponta a música como uma delas a Terapia Assistida por Animais (TAA),
uma ferramenta barata e de fácil administração, um tipo de intervenção direcionada por profissio-
com provavelmente nenhum efeito adverso e que nal habilitado, individualizada e com critérios es-
pode reduzir a ansiedade e sedação em com- pecíficos, cujo animal é parte integrante. Todavia,
paração com o cuidado usual, sem o uso desse observa-se com frequência na prática o desenvol-
recurso, tanto em pacientes que são ventilados vimento de atividades com animais apenas volta-
mecanicamente e aqueles que não são. No en- das ao entretenimento e à recreação (MANDRÁ,
tanto, apesar dos efeitos benéficos, este tipo de MORETTI, AVEZUM, KUROISHI, 2019; ALMEI-
intervenção não farmacológica é ainda raramente DA, NASCIMENTO, DUARTE, 2019).
180 12
São inúmeros os benefícios da presença de expressão, capaz de promover o alívio da tensão
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
animais em ambientes de saúde, principalmente não apenas para crianças e adolescentes, mas
em hospitais, com efeitos positivos independen- também para adultos e idosos. A comunicação
te do gênero e faixa etária (MANDRÁ, MORETTI, mediada pela arte favorece a expressão mais di-
AVEZUM, KUROISHI, 2019). Destaca-se o impac- reta de conteúdos emocionais, por não sofrerem
to de suas visitas para crianças hospitalizadas, a ação da racionalização que acompanha o dis-
como uma experiência extremamente prazerosa, curso verbal (REIS, 2014).
contribuindo para melhorar a interação destas No contexto da educação, a arte estimula a
com os profissionais e as outras crianças. Estu- criatividade da criança, desenvolvendo a imagi-
do evidencia que após receber as visitas de cães nação por meio do emprego de formas e cores e
as crianças se mostraram mais felizes, relaxadas auxiliando na expressão oral e escrita, na medida
e confiantes, cooperando muito mais durante os em que ela conta a história de seu desenho (YA-
procedimentos (VACCARI, ALMEIDA, 2007; AL- VORSKI, 2019).
MEIDA, NASCIMENTO, DUARTE, 2019). Em brinquedotecas hospitalares ou qualquer
A redução da dor e do desconforto é outro be- outro espaço destinado ao brincar nos serviços
nefício identificado, pois os animais atuam como de saúde, pode-se utilizar recursos expressivos
estratégia de distração, desviando a atenção e aplicá-los em atividades lúdicas pré-elaboradas
do foco da dor, além de descontrair o ambiente ou espontâneas com pacientes pediátricos. Estas
(VACCARI, ALMEIDA, 2007). Para os profissio- atividades promovem prazer e alegria, tornando-
nais, a comunicação com a criança torna-se mais -se viáveis especialmente para crianças que não
efetiva durante as visitas dos animais, que provo- podem sair do leito ou que se encontram em pre-
cam uma mudança significativa no clima do am- cauções de isolamento, não podendo frequentar
biente, que se torna mais divertido e descontraído a brinquedoteca ou locais compartilhados com
também para eles e para os acompanhantes das outras crianças (PIZZO, KIYAN, 2020).
crianças internadas (ALMEIDA, NASCIMENTO, Considerando a pandemia por COVID-19, o
DUARTE, 2019). emprego destes recursos expressivos com crian-
ças internadas foi bastante utilizado como forma
A arteterapia de tornar o cuidado mais humanizado, uma vez
que não era possível o compartilhamento de brin-
Entende-se por arteterapia o uso de diferen- quedos e as brinquedotecas mantiveram-se fe-
tes formas de expressão artística com uma fina- chadas neste período. Destaca-se o uso do dese-
lidade terapêutica. A arte é um meio genuíno de nho e da pintura por algumas equipes de brinque-
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distas e profissionais de saúde na construção de o aprendizado. Devem ser organizados a partir
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
atividades lúdicas previamente elaboradas, com do objetivo a ser alcançado pelo profissional, por
materiais descartáveis, oferecidas às crianças exemplo, se a meta for ensinar a criança a fazer
diariamente, como ocorreu na unidade pediátrica a auto aplicação de insulina, os materiais e brin-
do Hospital Israelita Albert Einstein em São Paulo. quedos devem atender os passos para o ensino
dessa intervenção. Em geral, usa-se bonecos e
O uso do Brinquedo Terapêutico materiais hospitalares reais para a dramatização
do procedimento inicialmente pelo profissional e
O Brinquedo Terapêutico (BT) é uma tecnolo- depois pela criança (MELO et al, 2021).
gia de cuidado, que envolve a proposta de uma A literatura especializada destaca a impor-
brincadeira estruturada, planejada pelo profissio- tância do BT para a criança hospitalizada, au-
nal de saúde para proporcionar a criança um meio xiliando-a a enfrentar as dificuldades, a dor e o
seguro para expressar seus sentimentos, dúvidas estresse gerado por essa experiência e recomen-
e anseios decorrentes de situações desconheci- da que esta estratégia lúdica faça parte da assis-
das e ou ameaçadoras. É indicado também, quan- tência de enfermagem (LI, CHUNG, HO, KWOK,
do o profissional quer informar a criança a neces- 2016). Tendo em vista todas as funções que pos-
sidade de algum procedimento, ensiná-la sobre sui e os seus diferentes tipos, e buscando tornar
as estratégias para enfrentamento do medo e da o seu uso rotineiro uma realidade, foi elaborado
dor e tirar suas dúvidas a respeito, tornando algo um projeto de implementação do BT no setor de
mais familiar e menos amedrontador. (MELO et pediatria de um hospital de grande porte na ci-
al 2021; MAIA, SOUZA, MELO, RIBEIRO, 2021) dade de São Paulo. Dentre as várias iniciativas
Por meio da brincadeira com brinquedos do- deste projeto, destaca-se a criação de um Gru-
mésticos, materiais reais hospitalares, materiais po interdisciplinar denominado “BrinqueEinstein”,
artísticos para desenhar e colorir, massinhas para que exerce um papel fundamental em motivar os
modelar, entre outros, as crianças têm liberdade profissionais envolvidos a tornar a realização do
para fazer escolhas e tomar decisões com auto- BT uma prática diária nesta instituição, garantin-
nomia, apoiada por um adulto que aceita suas do o direito de a criança brincar e contribuir para
decisões enquanto brinca. Essa é a riqueza das melhorar a experiência da criança que necessita
sessões de BT! ficar hospitalizada.
Os materiais escolhidos para as sessões de Assim, neste projeto o BT é utilizado de dife-
BT podem ser os mais diversos possíveis, para rentes maneiras, explorando todas as suas pos-
facilitar a expressão de sentimentos e favorecer sibilidades, seja na modalidade de BT dramático,
182 12
ao propiciar a criança vivenciar suas experiências e a medida vai mostrando as páginas do livro, o
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
no hospital enquanto brinca, como na modalida- profissional vai contando a história para a criança.
de instrucional, quando o profissional lança mão O livro também permite a realização do BT
da brincadeira para explicar a criança o que está dramático, visto que, em uma de suas páginas,
acontecendo ou o que será feito com ela. Ou, ain- a criança encontra vários materiais utilizados no
da, o emprego do BT como capacitador de função hospital como medicamentos, seringas e termô-
fisiológica, por exemplo, para otimizar a função metro, entre outros. E em outra página, há uma
respiratória, quando uma atividade terapêutica boneca que ela pode dramatizar as situações vi-
é transformada em brincadeira, favorecendo de venciadas durante a hospitalização. Ainda na pá-
maneira significativa o engajamento da criança gina final, são disponibilizados “dedoches” que a
que, de outra forma, não se mostraria tão cola- criança também pode utilizar para a dramatização
borativa (MAIA, SOUZA, MELO, RIBEIRO, 2021). e criar sua própria história.
Na prática assistencial, uma das situações mui- A função interativa do livro estimula o raciocí-
to frequentes em pediatria é a punção venosa, que nio, a criatividade, a imaginação e a coordenação
demanda um cuidado especial dos profissionais no motora da criança, além de desenvolver a percep-
sentido de tornar a experiência menos traumática ção de cores, formatos e texturas. As peças po-
e dolorosa (BIRNIE et al, 2018). E o BT atende ple- dem ser removidas e encaixadas, formando uma
namente essa necessidade. Na tentativa de criar história e dando a ela liberdade para criar. Esta
experiências cada vez mais inovadoras no con- experiência estimula a participação e iniciativa,
texto do brincar, foi criado, por duas enfermeiras possibilitando-lhe construir a sua própria história
que atuam nesta unidade pediátrica e compõem e refletir a respeito enquanto brinca. Já a função
o grupo “BrinqueEinstein”, o livro “Fiquei dodói e educativa, proporciona à criança entender um
agora?” tendo como base os princípios do BT. pouco mais sobre o processo da hospitalização, a
A escolha pelo formato de livro deu-se pelo necessidade da realização dos procedimentos e
fato de que a contação de histórias é uma prática o papel de cada profissional, desmistificando pen-
lúdica que faz parte do universo infantil, favore- samentos errôneos que possam existir.
cendo a comunicação entre o adulto e a criança. O projeto do livro idealizado pelas enfermeiras
Além do mais, o livro atua como um guia, pois foi executado por uma artesã, que também é uma
o profissional de saúde realiza a sessão de BT enfermeira aposentada. O livro possui oito pági-
instrucional, explicando para a criança sobre a nas e sua estrutura foi construída em pano, de
hospitalização e os procedimentos que serão re- modo a acomodar diferentes peças em miniatura,
alizados com ela, dentre eles a punção venosa, que são higienizadas a cada uso.
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Na primeira página do livro, a figura do hospital Nas páginas 3 e 4, encontra-se a figura do pro-
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
representa o momento da internação da criança fissional da saúde e um armário com máscara,
que pode ser de ambulância, permitindo que ela luva, óculos e touca que podem ser destacadas
brinque com a ambulância móvel (Figura 1). e colocadas na boneca. É uma oportunidade de
apresentar os equipamentos de proteção para
que a criança se familiarize e não tenha medo
desse contato (figura 3).
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uma boneca no leito e, nesse momento, podem ser
utilizados os materiais da maleta para conversar
sobre a punção venosa, permitindo que ela reali-
ze o procedimento na boneca. Ao lado, estão fa-
ces representando as reações esperadas durante
a realização do procedimento, reforçando que a
Figura 5 - Por quê precisam do meu sangue?
criança pode chorar, gritar, ficar triste, com raiva,
explicando sobre a importância de se expressar,
no entanto, reforça-se para não movimentar o bra-
ço no momento da punção (Figura 4).
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super-heróis, representando que a criança agora criança para algo atraente, divertido e interessan-
está forte, recebeu alta e pode voltar para casa. te, geralmente por meio de uma ação lúdica pre-
(Figura 8). judica a capacidade de perceber estímulos dolo-
rosos, reduzindo ou amenizando a dor, angústia e
ansiedade. (BIRNIE et al, 2018; KOLLER, GOLD-
MAN, 2012)
Pode ser considerada uma estratégia de en-
frentamento que redireciona passivamente a
atenção da pessoa ou a envolve ativamente em
um assunto ou uma tarefa. Possibilita oferecer
uma outra alternativa que é mais positiva e diver-
Figura 8 - Estou mais forte.
tida, dando a criança a possibilidade de partici-
par da atividade brincando, promovendo senso
O livro teve grande aceitação por parte das de controle sobre o ambiente enquanto o proce-
crianças, famílias e dos gestores da instituição, dimento está sendo realizado (KOLLER, GOLD-
que apoiaram a divulgação e replicação deste ma- MAN, 2012).
terial para ser usado em unidades de pronto aten- A distração tem se destacado como um méto-
dimento e de coleta de exames. Essa iniciativa foi do efetivo, simples, viável e sobretudo apresenta
premiada na Exposição da Qualidade e Segurança relação custo benefício sustentável. Pode ainda,
do Hospital Israelita Albert Einstein (1º lugar), no ser aplicada por profissionais de saúde em parce-
1 Simpósio Internacional da Associação Brasileira ria com os pais e não requer treinamento especia-
de Brinquedotecas e 3º Simpósio do Grupo de Es- lizado (BIRNIE et al, 2018)
tudo do Brinquedo (Menção Honrosa). Na prática, a distração tem sido aplicada de
forma ativa, quando as crianças são envolvidas
O uso da distração como medida não far- nas atividades, como por exemplo, assoprar bo-
macológica linhas de sabão ou um catavento enquanto sua
veia é puncionada pelo profissional. Neste caso,
A distração é uma estratégia cognitiva ou ensinar a criança a respirar profundamente antes
comportamental, não farmacológica, que afasta de assoprar tem um efeito relaxante associado.
a atenção da criança dos estímulos nocivos da Na modalidade ativa, vários instrumentos são in-
dor (FELLUGA et al, 2016). Seu uso se baseia no dicados como brinquedos musicais, brilhantes,
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vibrantes, livros interativos, bolas ante estresse ídos pela própria criança e usados com ou sem
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O IMPACTO DAS PRÁTICAS LÚDICAS NO CUIDADO EM SAÚDE
para que a criança aperte e foque sua atenção cenários específicos. Independentemente do tipo
no movimento e ainda, brincadeiras de contar, de fantoche usado, as evidências mostram bene-
cantar, fazer adivinhação, imaginar entre outros. fícios semelhantes para a experiência da criança.
Já as formas passivas incluem atividades como Sua utilização tem mostrado efeitos positivos
ouvir músicas, ler um livro, assistir desenhos e fil- na prática clínica, como recurso para expressão
mes por meio da televisão, ipads, celulares entre de sentimentos, redução de medo e ansiedade
outros. (MAIA, SOUZA, MELO, RIBEIRO, 2021; em crianças, favorecimento do enfrentamento da
KOLLER, GOLDMAN, 2012) doença, hospitalização e cirurgias e ainda, como
As evidências cientificas colocam a distração importante estratégia para promoção de saúde e
em posição privilegiada dentre as medidas não conhecimento das preferências e necessidades
farmacológicas para o manejo da dor, ansiedade das crianças. Além disso, é um recurso diverti-
e estresse frente a procedimentos dolorosos e por do, oferece a possibilidade de escolhas, respeita
isso, devem ser valorizadas pelos profissionais. a autonomia da criança e a incentiva a aprender
Seus resultados são satisfatórios e elevam o brin- enquanto brinca (BURS-NADER, HERNANDEZ-
car como uma pratica lúdica de distração emer- -REIF, 2016).
gencial no cuidado às crianças que passam por Pesquisas que utilizaram os fantoches como
procedimentos potencialmente dolorosos (BIR- estratégia para a coleta de dados com crianças
NIE et al, 2018). reforçam o quanto essa forma de comunicação
facilitou a expressão, permitindo maior aproxima-
Os fantoches ção e vínculo entre o pesquisador e a criança, o
que também pode ser utilizado para facilitar a in-
O uso de fantoches como prática lúdica tem teração durante o tratamento de crianças doentes
sido destacado como um instrumento efetivo para ou hospitalizadas. No entanto, quando o objetivo
interagir, apoiar e mediar a comunicação com a de seu uso é a coleta de dados, o entrevistador
criança e sua família. São pequenas figuras se- deve ser qualificado e ter habilidades para a con-
melhantes a bonecos, que podem representar dução da entrevista com os fantoches, adequan-
seres humanos ou animais, manipulados pelas do-a a faixa etária investigada (LEITE et al, 2019).
mãos e podem ser usados para dramatização na Embora os fantoches possam ser usados de
forma de teatros (LEITE et al, 2019). forma criativa, devem ser consistentes com a fun-
Existem vários tipos, por exemplo, fantoches ção motora, cognitiva e o desenvolvimento emo-
de mão, de dedos, com varas, cordas ou constru- cional das crianças, respeitando sua autonomia.
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Dessa forma, os profissionais de saúde podem Contudo, há escassez de evidências empíri-
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usar os fantoches ou marionetes para simular ce- cas do uso de fantoches pelos serviços de saú-
nários da vida real, facilitando a aprendizagem das de, apesar de múltiplas recomendações de que
crianças e suas famílias sobre o cuidado em saú- é uma técnica de sucesso (TILBROOK, DWYER,
de. Ao brincarem juntos, o uso de bonecos e fanto- REID-SEARL, PARSON, 2017).
ches proporcionam um excelente recurso para pro-
fissionais de saúde compreenderem as reações e Os robôs interativos
sentimentos manifestados pelas crianças, além de
estreitar o relacionamento entre ambos. A robótica socialmente assistida ou o uso de
As evidências até o momento sugerem que robôs interativos na área da saúde representa ou-
o teatro com fantoches é uma ferramenta útil e tra oportunidade lúdica, inovadora, com potencial
pode ser utilizado em uma variedade de contex- para melhorar a experiência de pessoas que ex-
tos. Essa forma de brincadeira é uma importan- perimentam a hospitalização, sofrimento e dor du-
te ferramenta para preparar crianças para hos- rante procedimentos médicos. Por meio de uma
pitalização e/ou procedimentos potencialmente interação divertida e afetiva, os robôs tornam-se
dolorosos ou angustiantes, como por exemplo, ferramentas úteis para ajudar as pessoas a en-
a punção venosa periférica, um dos procedi- frentarem e superarem os desafios por determi-
mentos mais aterrorizantes na perspectiva das nadas condições de saúde.
crianças. (TILBROOK, DWYER, REID-SEARL, Nos ambientes hospitalares os robôs estabe-
PARSON, 2017). lecem a comunicação e criam um relacionamen-
Fantoches representando os animais de es- to que envolve expressividade, personalidade,
timação são uma forma de dar voz às crianças dialogo, empatia e habilidades de adaptação.
com algo que é conhecido e afetivo, ainda mais Eles podem ser programados para envolverem
quando ela é o operador, podendo usar o fanto- as crianças por meio de uma fala encorajado-
che como uma ferramenta para agir contra seus ra, com reforços para comportamento positivos
medos e ansiedade. Ressalta-se que, indepen- e guia-las por meio de exercícios de respiração
dentemente de quem seja o operador, criança profunda para relaxar e distrair durante um pro-
ou o profissional de saúde, essa conexão lúdica cedimento. Ainda não se sabe os mecanismos
ajuda a minimizar as relações hierárquicas entre que produzem as mudanças comportamentais e
as crianças e os adultos no ambiente hospitalar, fisiológicas resultantes de tal interação, no en-
deixando as crianças mais confortáveis e seguras tanto revela-se benefícios promissores (JIBB et
na interação (LEITE et al, 2019). al, 2018).
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Em ambientes de cuidado em saúde de ido- para recreação, distração ou até mesmo associa-
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sos, os robôs têm sido utilizados para melhorar as do ao brinquedo terapêutico, como forma de pre-
habilidades cognitivas em pacientes com Alzhei- parar a criança para a realização de procedimen-
mer, reduzindo sentimentos de solidão e depres- tos hospitalares, entre outras finalidades.
são. Já em cenários pediátricos estes tem sido Embora tenha chegado ao Brasil recentemen-
amplamente explorados no contexto do diagnósti- te, os óculos de realidade virtual têm sido usados
co e terapia do Autismo e demonstrou aumentar a cada vez mais durante a coleta de sangue e vaci-
verbalização, a socialização e a expressão emo- nação em alguns laboratórios e serviços de saú-
cional (JIBB et al, 2018). de, melhorando significativamente a experiência
Crianças que foram submetidas a punção veno- da criança frente a procedimentos que geram dor
sa e puderam interagir com o robô durante o pro- e, consequentemente, medo e apreensão.
cedimento, relataram que ele as ajudou a expres- Um estudo realizado com a aplicação da reali-
sar sentimentos e a sentir menos dor, demonstra- dade virtual como técnica não farmacológica para
da pelo auto relato e por medidas de escore de alívio da dor durante a punção venosa em crianças
dor menores no grupo que participou da atividade com câncer apontou resultados positivos desta es-
(TROST, CHRYSILLA, GOLD, MATARIC, 2020). tratégia lúdica como forma de distração. Além de
A robótica socialmente assistida é um campo se mostrarem mais colaborativas no momento da
promissor, com inúmeras aplicações potenciais punção, as crianças também consideraram a expe-
para a saúde infantil. Uma revisão de escopo ve- riência como muito divertida (ATZORI, HOFFMAN,
rificou o potencial dessa intervenção para a re- VAGNOLI, ALHALABI, MESSERI, GROTTO, 2018).
dução do sofrimento em crianças em ambientes Crianças queimadas atendidas em um Cen-
médicos, contudo concluem que ainda não há tro de Tratamento ao Queimado (CTQ) do Sul
uma base de evidências suficientes para apoiar do Brasil também se beneficiaram com o uso da
quaisquer recomendações clínicas atuais e novos realidade virtual, verificando-se diminuição da
estudos são necessários a partir da união de dis- intensidade dolorosa referida por elas durante a
tintas áreas como a engenharia, ciências sociais troca de curativos. Além da maior colaboração da
e medicina (TROST et al, 2019). criança durante o procedimento, a realidade virtu-
al contribuiu para minimizar o estresse da equipe
O uso da realidade virtual de saúde, pois o procedimento transcorre de for-
ma mais tranquila e em menor tempo (SCAPIN,
A realidade virtual constitui-se em uma exce- ECHEVARRÍA-GUANILO, FUCULO JUNIOR,
lente opção lúdica para crianças no hospital, seja MARTINS, BARBOSA, PEREIMA, 2017).
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A realidade virtual também tem sido emprega- dado lúdico e tornem-se competentes para essa
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da na reabilitação de crianças na área da fisiote- utilização desde as práticas acadêmicas. Das ins-
rapia. Os seus efeitos no equilíbrio e no desempe- tituições de saúde espera-se que o brincar seja
nho motor de crianças com paralisia cerebral são reconhecido e promovido nos ambientes de cui-
descritos na literatura, contribuindo no tratamento dado, aprimorando suas práticas e que gestores
de forma inovadora com o uso de jogos lúdicos assumam seu papel na gestão, capacitação dos
virtuais (PEREIRA, SANTOS, BRANDÃO, SILVA, profissionais e promoção de um ambiente lúdico
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193 12
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Edmara Bazoni Soares Maia - Carolline Billett Miranda - Fabiane de Amorim Almeida
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zembro de 2019. ISSN: 2448-0959, Link de acesso:
https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/
arte-terapia-na-educacao
Quadro 1
ESTRUTURA PARA MAPEAR AS RELAÇÕES ENTRE OS ELEMENTOS DE JOGO
Dimensão Características da dimensão
O contexto é a rede social, cultural, econômica e tecnológica em que o jogo ocorre. Comporta a infraestrutura física,
material e sociocultural para a ocorrência dos jogos. Contém valores, determina comportamentos e o senso comum.
A dimensão do contexto trata de “quando” e “onde” o jogo pode ocorrer, bem como, o “porque” da sua ocorrência.
O contexto está associado à ideia de metajogo, ou seja, o que não faz parte do jogo, mas o influencia. Esta dimen-
são é composta por estudos centrados no contexto social inaugurado por Johan Huizinga (2001) que posicionou o
CONTEXTO
jogar (play) no âmbito da cultura. Bjork e Holopainen (2003) fazem referência a “componentes holísticos” do jogo.
Salen e Zimmerman (2004) chamam esta dimensão de esquema contextual e resumem na palavra “Cultura”. Jull
(2005) chama de “resto do mundo”. Jarvinen (2008) especifica o “contexto” como um elemento comportamental. A
dimensão do contexto antecede o jogar, pois antes da sessão de jogo começar é necessário combinar a possibilidade,
o momento, o local, o equipamento e os participantes.
199 13
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Figura 8 – Sugestões de APPS e Plataformas para professores.
Fonte: https://partilhagenial.blogspot.com.(adptada) Estamos esperando ansiosos para voltar à ro-
tina, ao ambiente escolar, trabalho e de laser por
O Brincar na Pandemia inteiro, porém as pesquisas cientificas apontam
pelas mídias socias que ainda não é animador
O brincar resiste a tudo inclusive o confina- esse retorno, porém estamos caminhando cien-
mento causado pela pandemia da COVID-19, por tificamente para vencer essas barreiras ocasio-
tanto o ato de brincar e um direito de todos e não nadas pela presença e letalidade do vírus Sar-
deve ser excluido em função dessa necessidade s-CoV-2 causador da pandemia da Covid-19 no
sanitária. Para Carneiro (2002) o brincar é difí- mundo, precisamos retomar nossas atividades de
cil defini-lo, mas fácil identificá-lo, pois só quem modo seguro, embora alguns países já tenham
brinca sabe que o está fazendo. É um momento retomando gradualmente suas atividades, ainda
ímpar que envolve descoberta, liberdade, intera- não podemos descuidar dos protocolos de bios-
ção, conhecimento de seus próprios limites e de segurança principalmente no Brasil onde ainda
207 13
temos que lhe dar com muita desiguale social. BRASIL. DIRETRIZES PARA DIAGNÓSTICO E TRA-
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CONTA? AS RELAÇÕES ENTRE suas atividades, em especial, àquelas que são re-
lativas ao brincar e à ação corporal infantil. Mes-
O JOGO E A AÇÃO CORPORAL mo que este ciclo de ensino seja mais promissor
MAKIDA-DIONÍSIO, Cristiane; MARTINS, Ida Carneiro; SANTOS, Fábio Xavier; MARTINS, Ida Carneiro; GI-
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Universidade Estadual de Campinas. zação do desenvolvimento psíquico: atividade domi-
222 14
nante e a formação das funções psíquicas superiores.
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 15
proposta pedagógica que considere o xadrez
uma importante manifestação histórico-cultural,
cujo valor educativo, para crianças e jovens-estu-
dantes, concerne à valorização da expressividade
INTRODUÇÃO
BENTO, J.O. Desporto discurso e substância. Edi- MACIEL, M.G. Lazer corporativo: estratégias para
tora Campo das Letras, Porto. 2004. o desenvolvimento de recursos humanos, São Paulo:
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CHIAVENATO, I. Iniciação à organização e controle. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010. (Coleção Brinquedo, Edu-
São Paulo: McGraw-Hill, 1989. cação e Saúde).
255 16
OVEJERO, A.B. Efeitos da globalização no trabalho.
AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA larização básica e, muitas vezes, tem lhe sido
dado menor importância. Em relação à afirmação
INFANTIL podemos citar como exemplo as casas que são
adaptadas para serem “escolinhas” ou a neces-
sidade imposta pelos órgãos governamentais em
Rogério Zaim-de-Melo alfabetizar a criança cada vez mais cedo.
Iris Costa Soares Nas escolas observamos os professores re-
Ida Carneiro Martins
gentes preocupados com o Pacto da Alfabetiza-
ção na Idade Certa (PNAIC), levando cada vez
257 17
menos a criança a brincar, e quando ela brinca ria de 0 a 6 anos, deve permitir que os mesmos
ser a juíza da prova. Bastou dar o sinal da largada Fábula: O Canguru que saltava para trás
para a lebre disparar na frente a toda velocidade.
Autor: Desconhecido
A tartaruga não se abalou e continuou na disputa.
Local de acesso: http://www.metaforas.com.br/infantis/can-
A lebre estava tão certa da vitória que resolveu guru.htm 08/10/2010
tirar uma soneca. Habilidade Motora saltar na horizontal, correr,
“Se aquela molenga passar na minha frente, é Capacidade Física velocidade, agilidade e força
só correr um pouco que eu a ultrapasso”.
Num país muito longínquo, nasceu um dia
A lebre dormiu tanto que não percebeu quando
um canguruzinho que tinha uma qualidade muito
a tartaruga, em sua marcha vagarosa e constan-
curiosa. Saltava para trás, ao contrário de todos
te, passou. Quando acordou, continuou a correr
os outros animais de sua espécie. Isso fazia dele
com ares de vencedora. Mas, para sua surpresa,
alvo da zombaria dos outros.
a tartaruga, que não descansara um só minuto,
O canguruzinho, que era muito sensível, sofria
cruzou a linha de chegada em primeiro lugar.
muito e, todas as noites, chorava desconsolado,
Desse dia em diante, a lebre tornou-se o alvo
sem que ninguém visse. Um dia, o mocho, sábio e
das chacotas da floresta. compreensivo, aproximou-se dele, dizendo:
Quando dizia que era o animal mais veloz, to- Mocho: De nada adianta ficar chorando pelos
dos a lembravam de uma certa tartaruga... cantos. Se você se esforçar e treinar um pouco
Moral: Quem segue devagar e com constância será capaz de saltar para frente como os outros
sempre chega à frente. cangurus. É uma questão de perseverança.
O canguruzinho compreendeu que o mocho
tinha razão. Nessa mesma noite, começou a pra-
ticar no seu cantinho. Progredia rapidamente e,
num belo dia, no meio da admiração geral, o can-
guruzinho deu uma autêntica exibição de saltos
para frente.
Satisfeito e orgulhoso, o canguruzinho passou
a considerar-se igual aos demais. Mas, na reali-
dade, ele era mais capaz que os outros, porque
A lebre e a tartaruga
Fonte: acervo dos autores era o único que sabia também saltar para trás!
Moral: Não adianta chorar, é preciso se esfor-
çar para conseguir o que quer.
263 17
Leão caiu numa armadilha. Como os caçadores
Ganguru
Fonte: acervo dos autores
FÁBULA 3
com medo de você só porque você pensa que é Fábula: O cachorro e o burro
rei? Disse ele altivo e, em seguida, voou para o Autor: La Fontaine
leão e deu uma picada ardida no seu focinho. Local de acesso: http://fabulasdiversas.blogspot.
Indignado, o leão deu uma patada no mosqui- com/2013/07/o-cachorro-e-o-burro.html
to, mas a única coisa que conseguiu foi arranhar- Habilidade Motora
correr, engatinhar, saltar hori-
zontal
-se com as próprias garras. O mosquito continuou
picando o leão, que começou a urrar como um Capacidade Física
força, agilidade, coordenação
motora ampla
louco. No fim, exausto, enfurecido e coberto de
feridas provocadas por seus próprios dentes e Na fazenda viviam muitos bichos: patos, por-
garras, o leão se rendeu. cos, galinhas... além de um burro e um cachorro.
O mosquito foi embora zumbindo para contar a Todos eles ficavam esperando a hora em que o
todo mundo que tinha vencido o leão, mas entrou dono voltasse do trabalho. No entanto, quando
direto numa teia de aranha. Ali o vencedor do rei ele chegava, somente o cachorro corria para lhe
dos animais encontrou seu triste fim, comido por dar as boas-vindas e fazer festa. O dono passava
uma aranha minúscula. a mão na cabeça de seu fiel amigo.
Moral: Muitas vezes o menor de nossos inimi- Mas o burro, olhando a cena, pensava com
gos é o mais temível tristeza:
Burro: Meu dono não liga para mim! Ele só
acaricia o cachorro!
Um dia, querendo receber carinho, o burro fi-
cou à espera do dono para também recebê-lo com
festas. Assim, quando o homem chegou, o burro
relinchou festivamente e, para imitar o cão, ergueu
as patas. O que aconteceu foi um desastre: desa-
jeitado, ele acabou derrubando o dono no chão.
O homem, surpreso, deu ordens para que o
burro fosse amarrado na cerca. E ficou pensando:
Leão 2 Homem: Afinal, o que deu nesse bicho? Ficou
Fonte: Acervo dos autores louco? Está achando que é cachorro?
No dia seguinte, ele precisou do burro para le-
var cestos de verdura à feira. E então, passando
265 17
a mão carinhosamente na cabeça do animal, dis- sonagem era o leão, esse foi o papel que todos
CRUZ, Maria Nazaré da. O brincar na educação infan- FONTANA, R.; CRUZ, N. Psicologia e Trabalho Pe-
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268 17
MARTINS, I.C.; VENÂNCIO, S. Salvando a Rapunzel:
INTRODUÇÃO
RELAÇÕES COM ESTADOS DE logar e refletir sobre a importância dos jogos e ga-
mes e suas relações com estados de bem-estar
BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO no contexto da pandemia COVID-19. Acreditamos
que o lúdico é um impulso da vida e também uma
CONTEXTO DA PANDEMIA representação social e humana. O brincar é uma
Lúcia Maria Gonçalves Siebra possibilidade de compreender, conviver e estimu-
Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida lar a interação entre iguais. O lúdico é um refe-
Flávio José Wirtzbiki de Almeida rencial para a socialização e integração humana,
além de promover a aprendizagem de valores e
1 Termo em inglês que se refere aos jogos que podem ser jogados em
diferentes plataformas como: celulares, computadores, notebook,
convivência. No lúdico estimulamos as diferentes
smartphones, tablets e similares. Para este artigo iremos usar o ter- linguagens e potencializamos o amadurecimento
mo “Games” no sentido dos jogos eletrônicos, virtuais e videogames.
270 18
das estruturas do desenvolvimento humano, esti- Game Brasil (PGB, 2020), o mercado de jogos é
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
mulamos a imaginação e inovamos os conceitos o que mais cresce em entretenimento online. O
da nossa realidade. mercado global de mídia e entretenimento deve
Sabendo do relevante impacto dos jogos na vida faturar US$ 2,6 trilhões até 2023, com um cres-
humana, o nosso trabalho nos leva a uma reflexão cimento médio de 4,3% ao ano entre os anos de
sobre o tema “Play on lockdown”, suscitando im- 2019 e 2023, segundo dados da pesquisa Global
portantes reflexões acerca da implementação dos entertainment and media outlook 2019-2023, da
jogos considerando as mais distintas modalidades consultoria PwC (2020). (SANTOS, H.R., 2021)
e possibilidades de acesso frente ao cenário de Esses dados apresentados mostram que o mer-
distanciamento social da pandemia da COVID-19, cado gamer se manteve aquecido e não parou por
como também os novos cenários da cultura lúdica. motivo algum. Ultimamente os jogadores querem
Percebemos durante a pandemia que os vi- cada vez mais otimizar suas peças de hardware
deogames clássicos, jogos online, analógicos e em seus PC’s e por outro lado a venda de consoles
híbridos passaram a ser aliados e ajudaram mui- aumentou em mais de 100% no varejo.
ta gente a superar esse momento de isolamento Durante o isolamento social a interação dos
social de forma mais leve, equilibrada e criando jogos com a saúde aumentou significativamente,
proximidade entre os familiares e amigos. Além trazendo assim, contribuições positivas no bem-
disso, com o fechamento das escolas e de ou- -estar dos players (jogadores) através das expe-
tras instituições, os jogos ganharam ainda mais riências lúdicas.
relevância como instrumento educacional e social Ultimamente as pessoas vem buscando os
(mesmo remotamente). Sabemos que os jogos/ jogos/games como uma maneira de desligar um
games são fundamentais para o desenvolvimento pouco da realidade e imergir em um mundo to-
cognitivo, social, motriz, afetivo e cultural do ser talmente diferente e com coisas novas a serem
humano. Durante a pandemia, os jogos se fortale- descobertas, esse é um dos motivos que mais
ceram como uma experiência importante no am- cativa os jogadores a comprarem ou se tornarem
biente familiar e nos espaços da casa. jogadores de um jogo.
No período de isolamento social o mercado de No universo dos games temos infinitas possibi-
games aumentou significativamente na economia lidades para brincar em casa. Um exemplo muito
brasileira e mundial. De acordo com a Super Data bom, são os jogos FPS2, ou First Person Shooter
os gastos com jogos no ano de 2020 ultrapas-
saram a marca dos US$ 10 bilhões de dólares. 2 A maioria dos jogos FPS são jogados como jogos de co-up, jo-
gos multiplayer, e alguns são jogos de um jogador. Muitos jo-
Segundo dados de pesquisa da Newzoo (2020), gadores hardcore jogarão os três tipos, mas algumas pessoas
Super Data Research (SDR, 2020) e Pesquisa jogarão apenas um tipo. O seu desempenho no jogo dependerá
do desempenho do seu rato quando jogar estes jogos.
271 18
(Tiro em primeira pessoa) onde cada vez mais e absorva as estruturas mais antigas das experi-
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
jovens se reúnem para jogar em time e criarem ências humanas. Neste sentido, o brincar permite
suas próprias estratégias para vencer o time ini- maior contato com as fontes criadoras da poesia,
migo, que geralmente são grupos de 5 pessoas. dos sentidos, do mito, dos sonhos.
Ou mesmo os jogos MOBA3, ou melhor muti- O lúdico é um conteúdo modelo e permanente
player online battle (arena de batalha online para para estimular nossa compreensão sobre o jogo,
vários jogadores), que são League of Legends o brinquedo e brincadeira. O impulso lúdico está
(jogo da Riot Games) ou o game da Valve DOTA4 intimamente ligado ao impulso da vida. O ato de
(Defense of the ancients), que também tem um brincar é uma manifestação da vida, negar o di-
universo enorme de campeões que você pode reito de brincar seria negar o direito à vida. O im-
jogar e se divertir, jogo que também é munido pulso lúdico necessita de interações e de convi-
por estratégias para chegar até o objetivo final vência para que possa expressar o mais puro e
(NEXUS - última torre, e mais importante). Jogar genuíno comportamento humano, que é, viver em
com esses tipos de jogos foi o que muitos players sociedade. No impulso lúdico caminhamos para a
fizeram desde os jogos como Atari até jogos ul- evolução e para a criatividade, e, nele promove-
trarrealistas como Fly simulator. mos a inclusão de cada um e de todos sem igno-
O jogo, em suas diferentes formas, certamente rar as diferenças, sem homogeneizar e sempre
desempenha papel essencial na construção das afirmando as identidades.
relações pacíficas, contribuindo positivamente
para o desenvolvimento humano. O jogo é uma GAME E JOGO – CONCEITOS, SIGNIFICA-
atividade humana, que sempre fez parte de todas DOS E POSSIBILIDADES
as civilizações, sociedades e culturas, sendo uma
manifestação que foi e é capaz de estimular a Para iniciar nossas reflexões vamos começar
cognição, a sensibilidade, a criatividade, a afetivi- com o pensador Johan Huizinga (1872-1945) pes-
dade e a emoção humana. O jogo faz com que o quisador holandês extremamente importante e seu
indivíduo e em especial a criança sinta, conheça livro “Homo Ludens”, até nos dias atuais, é uma
referência para todos os estudiosos sobre games.
3 MOBA é um gênero de jogos eletrônicos que mistura elementos
Em Homo Ludens, Huizinga (2001) discute que o
de ação, estratégia e RPG (Role Playing Game). A sigla MOBA “jogar” é um elemento nuclear de formação da cul-
vem do inglês “Multiplayer Online Battle Arena” que significa “are-
na de batalha online para vários jogadores”, nas quais os joga- tura humana e observa como os elementos lúdicos
dores dividem-se em times e disputam partidas que duram em
estão presentes na política, na guerra, no amor, na
média entre 30 minutos à 1 hora.
4 Defense of the Ancients (DotA) no qual os jogadores devem se poesia e em tantas outras facetas do humano.
enfrentar online em acirradas batalhas entre equipes.
272 18
Partindo destas características elementares, fora dos arquétipos (padrões de comportamento).
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
Huizinga (2001) apresenta o conceito de “círculo Os jogos possuem elementos como regras,
mágico”, onde mostra que quando se participa de conflitos, objetivos, definição de pontos e tomadas
algum tipo de atividade de entretenimento entra- de decisões e estes elementos são constituintes
-se nesse círculo deixando para trás os proble- da vida humana em geral. O jogo é um objeto de
mas, preocupações e aflições do cotidiano, mer- entretenimento como cinema, literatura e televisão
gulhando em outro universo. em que o sujeito se diverte de várias formas. Entre-
Os jogos, na melhor de suas possibilidades, tanto se difere dos demais, pois, apresenta aspec-
proporcionam experiências altamente interativas tos como: interatividade, agência e transformação.
e sociais. Sabemos que nem todos os jogos apre- A ideia do jogo é impactar no comportamento
sentam todas as características citadas anterior- do jogador de forma que gere respostas e alcance
mente e nem todos os jogos são bons, no jogo transformações no ambiente do jogo e no contex-
temos virtudes e pecados. Uma coisa é certa, se- to cognitivo e afetivo do próprio jogador. Assim,
jam as crianças, ou sejam os adultos, todos ado- o material lúdico utilizado para jogar é um objeto
ram os jogos, de corpo e alma. evocativo que desperta no jogador – no jogo e
Os jogos, por sua vez, são o resultado das para com o jogo – emoções, pensamentos, com-
inter-relações entre o jogo e a interação lúdica, portamentos e uma capacidade de inserção no
sendo o primeiro um sistema no qual os partici- mundo da fantasia (uma propriedade que é po-
pantes se envolvem na resolução de situações tencializada no jogo analógico e digital).
problemas, proposto pelas regras e metas do É fundamental e urgente realizar um debate
jogo, que resultam em algo que possa ser valora- sobre o potencial dos jogos digitais/videogames e
do. O segundo surge na relação entre o jogador e os benefícios que o uso moderado destes tipos de
o desfecho do próprio jogo, de suas regras, onde jogos traz. Sabemos que este tema já é bastante
só é significativa quando a relação entre as ações comentado por diferentes estudiosos (ALMEIDA,
e os resultados são discerníveis e integradas ao M.T.P., 2021; WIRTZBIKI, F.; ALMEIDA, M.T.P.,
contexto (SALEN & ZIMMERMAN, 2012). 2020; SPERHACKE, 2019; MCGONIGAL, 2012;
Sabemos que a nossa forma de jogar pode mu- PRENSKY, 2012; SALEN & ZIMMERMAN, 2012;
dar o mundo para melhor ou para pior. O jogar é SCHELL, 2011; SCHUYTEMA, 2011; ADAMS,
tão essencial quanto a comida, o ar e tudo que nos 2009; HUIZINGA, 2001).
mantêm vivos. Além disso, o jogar é terapêutico, Sabemos também, que mesmo com as adver-
engaja o cérebro e põe o corpo e a mente em har- tências sobre os efeitos negativos associados aos
monia. Os jogos devem incentivar o pensamento videogames e jogos digitais, as crianças e ado-
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lescentes ainda passam muito tempo na frente do tamentos similares nas pessoas enquanto ati-
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
console ou computador. vidades que proporcionam prazer e bem-estar,
estas características ocorriam no momento em
É de nosso conhecimento que há muitos
que o participante julgava estar em Flow. O au-
preconceitos sociais quando tratamos de videoga- tor apresenta, a partir desta análise sete sinais
me, jogos virtuais e jogos eletrônicos, o que aca- presentes quando se está em Flow, são eles:
ba tornando fundamental buscar o conhecimento foco e concentração, êxtase; feedback; habilida-
e ter informações, para compreender e entender des; crescimento; perda da sensação de tempo;
motivação intrínseca.
sobre o tema e desmistificar alguns tabus. Com
os jogos digitais aprendemos a cada momento, Observando estas colocações, a pergunta que
eles ensinam a resolver problemas relacionados se dirige aos diferentes contextos da educação é:
com uma tarefa específica e a tomar decisões; Como então atingir o Flow nas atividades educa-
incentivam a criatividade; desenvolvem perspec- cionais? Como atingir o Flow em nossa vida con-
tivas objetiva e subjetiva da cognição; facilitam a tidiana? Bem, o que se pode dizer a este respeito
construção de conhecimento; proporcionam inte- é que não há uma “receita de bolo”, até porque
ração lúdica; tudo está intimamente relacionado aquilo que proporciona prazer e bem-estar para
com o jogo simbólico, que é de grande importân- uma pessoa pode não proporcionar para outra, no
cia no desenvolvimento do ser humano. entanto, há uma combinação de fatores externos
Segundo Saraiva et al (2021, p.249), o eleva- e internos que levam à esta disposição (CSIKS-
do estado de atenção e bem-estar ao qual nos ZENTMIHALYI,1990).
referimos é denominado pelo psicólogo húngaro As sensações de bem-estar de acordo com
Mihaly Csikszentmihalyi como ‘Flow’. Saraiva et al (2021, p.250),
Para o autor o referido estado é “a forma como apoiados nos trabalhos de Mihaly Csikszent-
as pessoas descrevem seu estado de espírito mihalyi (1990) passamos a entender, que alguns
quando a consciência está harmoniosamen- elementos quando integrados contribuem para a
te ordenada e elas querem seguir o que estão identificação do momento em que estabelece a
fazendo para seu próprio bem” (CSIKSZENT- chamada ‘experiência ótima’ ou ‘experiência má-
MIHALYI, 1990). Com base nesta definição, o xima’. No entanto, o elemento central pode ser
conceito de Flow é descrito como um estado de apontado como o ajuste perfeito entre desafio e
envolvimento em dadas atividades, a um ponto habilidade, este posicionado no momento exato
em que os demais elementos ao redor não mais tende a cooperar para que a pessoa alcance o
apresentam importância, pois a experiência em estado de Flow. Outro aspecto muito marcante
si, proporciona bem-estar, felicidade e prazer. que o autor revela, é que além da sensação de
Os dados analisados das pesquisas de Mihaly bem-estar as atividades que dispõe desta com-
Csikszentmihalyi (1990) identificaram compor-
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binação trazem um caráter de descoberta que tais e analógicos como jogos híbridos, porém
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
transportam aqueles que dela participam a uma esse tipo de jogo engloba muitas tecnologias
nova dimensão da realidade. diferentes e por isso recebe muitos nomes: per-
vasivos, de realidade aumentada, de realidade
O jogo digital, videogames e virtual, analógi- mista, locativos etc. (KANKAINEN; ARJORAN-
cos e principalmente os jogos híbridos fazem TA; NUMMENMAA, 2017). Os jogos que unem
parte das discussões feitas por estudiosos que componentes analógicos (físicos) e digitais em
um novo contexto devem utilizar esses ele-
procuram entender o jogo, o lazer e a diversão. A
mentos de forma a auxiliar e fortalecer o outro,
partir das teorias abordadas neste artigo, compar- não apenas substitui-lo. Arjoranta, Kankainen e
tilhamos reflexões, análise e olhares com outros Nummenmaa (2016) argumentam que existem
pesquisadores, que na atualidade e em especial outras misturas de elementos que também po-
durante a Pandemia da COVID-19, buscam revi- deriam ser consideradas como jogos híbridos,
como a junção de habilidade e sorte, ou quan-
sar seus conceitos acerca do que é lúdico. Como
do um jogo mistura características conhecidas
manter o lúdico na vida cotidiana na sociedade dos Eurogames e dos Ameritrashes (estilos de
atual, favorecendo que seja esta uma opção de jogos de tabuleiro que possuem características
lazer no tempo livre ou disponível, gerando uma próprias e, em alguns casos, antagônicas).
sensação de bem-estar?
O mesmo autor comenta que
Para Junior (2021, p. 262) a evolução e o de-
senvolvimento de diferentes produtos lúdicos se (...), Jogos Híbridos são aqueles que misturam
devem aos elementos digitais e aos sistemas tec- diferentes domínios conceituais de jogos. Domí-
nio conceitual diz respeito a um tipo de metá-
nológicos cada vez mais portáteis e interativos
fora que a nossa cognição assimila e aprende,
quando se fala de jogos analógicos e híbridos. relacionando este domínio com o elemento que
devido ao grande sucesso atual do mercado de proporcionou o aprendizado. A mistura de dois
jogos de tabuleiro (BUTILHEIRO, 2019), o de- domínios conceituais cria um domínio novo, no
senvolvimento deste tipo de produto começou qual o indivíduo consegue utilizar seus conheci-
a utilizar os benefícios dos elementos digitais e mentos dos domínios anteriores para assimilar
sistemas computacionais cada vez mais portá- o novo ambiente misturado. Porém, esse novo
teis e interativos (ALEGRE, 2016). A evolução domínio também possui características pró-
tecnológica constante e a grande popularidade prias, que surgem da combinação dos domínios
dos dispositivos como celulares e tablets pos- anteriores. (p.263).
sibilitaram que os jogos de tabuleiro usassem
esse potencial computacional sem precisar
Jogos analógicos e digitais despertam e in-
inseri-los dentro da caixa do jogo. Atualmente centivam um comportamento de curiosidade e
consideramos jogos que unem elementos digi- necessidade de informações, além de permitir ao
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jogador vivências de situações que não seriam clo sem fim, onde nunca podemos parar, sempre
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
possíveis ou permitidas no mundo real. O jogo é “precisamos” de mais e mais.
uma ponte ou janela entre a realidade e a fantasia Somos bombardeados o tempo todo por “ne-
possibilitando o “Círculo Mágico” e o estado de cessidades”, muitas vezes imaginárias, criadas
“Flow” criando estados de bem-estar. pelo mercado de consumo. A felicidade, um con-
Nos tópicos posteriores iremos abordar com ceito abstrato, relativo e de significado próprio
mais profundidade o contexto da pandemia e para o sujeito, tornou-se algo concreto, “alcan-
sua relação coma a saúde mental. Além disso, çável facilmente” através da aquisição de bens e
traremos algumas discussões sobre o bem-es- serviços, a casa, o carro, a viagem, a roupa, o
tar e suas abordagens para a qualidade de vida. celular, a bebida, e outro carro, outra viagem, ou-
Acrescentamos em nosso trabalho estudos rela- tro celular....Será?
cionados aos jogos/games e suas implicações na A vida se tornou uma gestão complexa de pro-
saúde mental e no bem-estar de jovens e idosos cessos, não nos damos conta, mas isso toma todo
em especial durante o período pandêmico. nosso tempo. Recebemos e respondemos uma
infinidade de e-mails e mensagens todos os dias,
SAÚDE MENTAL E BEM-ESTAR – NOVAS terceirizamos todos os serviços possíveis e ainda
(VELHAS) PRÁTICAS NA PANDEMIA assim, não temos tempo. Muitas das “necessida-
des” criadas talvez nem sejam reais. A simplicida-
O processo civilizatório da humanidade trouxe de deixou de fazer parte das nossas referências, a
conhecimento, progresso, transformações e uma palavra simples quase não faz parte do nosso vo-
infinidade de criações fantásticas. Os Séculos XIX, cabulário e, quando faz, nem sempre é bem vista.
XX e XXI foram responsáveis por profundas mu- Nossa sociedade é reconhecida como Socieda-
danças no planeta, na Geopolítica, na Economia, de do Consumo, este (o consumo) é um processo
na Medicina para destacar apenas algumas áreas. fundamental de um sistema econômico capitalista.
As Ciências avançaram e muito dos esforços acu- Para Bock et al (2019, p.219) “na sociedade narcí-
mulados fazem hoje parte do nosso dia a dia. sica, em que é cultivada a satisfação plena de cada
Construímos grandes cidades, criamos indús- um dos seus membros, a felicidade é uma obses-
trias, inventamos “coisas”, adaptamos a vida aos são. Está associada particularmente com a capaci-
novos hábitos e adotamos um estilo de vida nem dade de consumir objetos, produtos e serviços”.
sempre saudável. Ao mesmo tempo que adota- Investimos nosso tempo, energia e esforços
mos uma série de comodidades facilitadoras para adquirindo símbolos de status, nunca temos tem-
nossas vidas, nos tornamos escravos de um ci- po de parar e pensar, é isso mesmo? A vida é
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isso? Correr para ter, acumular, participar eterna- como um constructo de natureza subjetiva, for-
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
mente dessa competição? temente influenciado pela cultura. A OMS define
saúde mental como “um estado de bem-estar no
Aí o mundo parou. O ano 2020 ficará na nossa
qual um indivíduo percebe suas próprias habili-
memória e na história. A Pandemia da Covid 19 dades, pode lidar com os estresses cotidianos,
nos obrigou a parar. Passado o primeiro momento pode trabalhar produtivamente e é capaz de
de incredulidade, começamos a sofrer, fomos en- contribuir para sua comunidade”.
tendendo que não ia passar tão cedo, estávamos
Cada pessoa viveu/vive essa pandemia de
agora em casa com o trabalho remoto (aqueles
maneira única, subjetiva, às vezes absolutamente
que podiam), as aulas remotas, os contatos pes-
solitária. Por outro lado, do ponto de vista coletivo,
soais e sociais remotos. A palavra de ordem era
fomos capazes de sentir empatia, sofremos pes-
“remoto”. Pararam as atividades sociais, de lazer,
soalmente e sofremos com o outro. Uma parcela
os encontros familiares, as festas, as viagens. Pa-
da população investiu tempo e energia para aju-
raram até os cuidados médicos, adiamos consul-
dar outros mais prejudicados, mais vulneráveis,
tas, exames, tratamentos e prevenções.
mais sofridos. Para alguns houve a descoberta de
Mas não demorou muito e voltaram as pres-
que estamos todos sujeitos a essa nova ordem e
sões profissionais. Voltaram muito rápido, reuni-
não superaremos o problema se as soluções não
ões remotas, cobranças remotas, e os níveis de
forem por e para todos.
estresse cada dia mais altos. Nossos diferentes
Mas o fato é que o contexto da pandemia levou
papéis sociais, antes vivenciados separadamen-
muitas pessoas a buscarem novos (velhos) cami-
te, se misturaram numa rotina maluca. Ansiedade
nhos para enfrentar o turbilhão de emoções com
e medo, da doença, de perder o emprego, de per-
mais equilíbrio, compreendendo a importância da
der a casa; tristeza e medo de adoecer, de morrer,
saúde física e mental.
de perder alguém.
Nesse contexto, aumenta a busca por práti-
A Saúde Mental se tornou tema diário nas con-
cas de bem estar e muito mais se passa a fa-
versas, notícias e depoimentos das pessoas em
lar em qualidade de vida. E afinal, como falar de
qualquer oportunidade e através de diversos canais.
qualidade de vida vivendo uma pandemia sem
Sobre os conceitos de bem-estar e saúde
precedentes? Como pensar em bem-estar viven-
mental da OMS - Organização Mundial de Saúde,
do um confinamento? Mas a humanidade tem
Gaino et al. (2018, p.110) comentam que:
caminhado sempre em busca de soluções e ago-
O termo ‘bem-estar’, presente na definição da ra não seria diferente. Para além das pesquisas
OMS, é um componente tanto do conceito de e produção das vacinas, as sociedades, grupos
saúde, quanto de saúde mental, é entendido
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e pessoas se mobilizaram e foram em busca do canais e formas de comunicação, como ativida-
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
que estava ao seu alcance para enfrentar a rea- des/práticas promotoras de bem-estar nesse mo-
lidade que estava imposta. mento específico, caracterizado pelo isolamento
A Teoria do Bem-Estar, desenvolvida por Mar- social, pelas restrições ambientais e pelo stress
tin Seligman e apresentada em seu livro Florescer da experiência de uma pandemia.
– Uma Nova Compreensão sobre a Natureza da Importante pontuar que uma prática, uma ati-
Felicidade e do Bem-Estar (2012) critica os traba- vidade, ou mesmo um momento de ócio pode ser
lhos anteriores do próprio autor sobre a felicidade. produtor de estados de bem-estar quando para
Adota a partir daí o termo Bem-Estar como central aquele indivíduo aquilo fizer sentido. Precisamos
na sua teoria. descobrir o que faz sentido para cada um de nós,
A Teoria do Bem-Estar é composta por cinco às vezes é preciso passar pela experiência para
descobrir, pois estamos falando de sensações,
elementos: emoção positiva, engajamento, senti-
emoções e não só de pensamentos e racionali-
do, relacionamentos positivos e realização. Cada
dade. Estamos falando de corpo e mente, de uma
um dos elementos, somente será considerado
forma absolutamente integrada.
como tal se, individualmente, possuir três pro-
Vamos destacar apenas alguns segmentos,
priedades: “1. Ele contribui para a formação do
entre tantos outros, que geraram mudanças de
bem-estar; 2. Muitas pessoas o buscam por ele
hábitos e comportamentos como: atividades fí-
próprio, e não apenas para obter algum dos ou-
sicas regulares, práticas em saúde mental, há-
tros elementos; 3. É definido e mensurado inde-
bitos alimentares/nutricionais, lições ambien-
pendentemente dos outros elementos (exclusivi- tais aprendidas e cuidados com o lar.
dade)”. (SELIGMAN, 2012, p.14). As atividades físicas regulares, já praticadas
Considerando nosso contexto atual, vamos por uma razoável parcela da população, seja em
apenas nos inspirar na Teoria do Bem-Estar e, ao academias e clubes, seja em espaços públicos,
mesmo tempo, vamos focar mais no que denomi- foram adaptadas à nova realidade. Praticantes
namos de Práticas de Bem-Estar. Estamos mais criaram alternativas em casa, organizaram es-
atentos ao sentido de observação ativa da reali- paços, buscaram aplicativos e soluções on line.
dade. As reflexões se pautam no período pandê- Outros, que não conseguiram criar alternativas,
mico vivido a partir de março de 2020 no Brasil. sentiram efeitos da falta de atividade física como
Sendo assim, elencamos algumas atividades aumento de peso, falta de disposição, dores, en-
que têm sido destacadas pelas pessoas em geral, tre outros sintomas.
por formadores de opinião e por especialistas em A prática de atividades físicas regulares é am-
entrevistas, vídeos, lives, podcasts, entre outros plamente recomendada por médicos devido aos
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efeitos preventivos quanto a saúde em geral, in- tha Yoga, Mantra Yoga e Kundaliní Yoga. Cada uma
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
clusive melhorando a imunidade dos pacientes, delas propõe um caminho direcionado, a maioria
quando não há contraindicação específica. tem em comum a busca da autorrealização.
Em artigo publicado pelo OBS - Observató- No Brasil, a Hatha Yoga foi amplamente di-
rio Socioeconômico da Covid-19, Daronco et al vulgada pelo Prof. Hermógenes. Segundo o au-
(2021, p.9) aconselham “a manutenção da práti- tor, “a sabedoria hindu, fundamento filosófico da
ca de atividades físicas, respeitando-se as regras Hatha Yoga, ensina que o espírito e o corpo não
de distanciamento social e ocupação de espaços são mais que aspectos diferentes de uma mesma
fechados, visando manter o efeito preventivo que unidade essencial; por isso, não é o corpo me-
a prática de atividades físicas apresenta”. Ainda nos digno de cuidados e reverência” (HERMÓGE-
segundo a publicação, os profissionais da área de NES, 2017, p.34).
Educação Física estão habilitados a adaptarem O Yoga trabalha posturas físicas, respiração,
as atividades às circunstâncias propostas pelas meditação e relaxamento, trata-se de uma prática
autoridades no período da pandemia. que coloca o sujeito em contato consigo mesmo,
Em um sentido amplo, consideraremos como possibilitando momentos verdadeiros de encontro
práticas em saúde mental, atividades, ferramen- com o corpo e a mente. No período da pandemia,
tas e práticas, que possam colaborar para que as onde as escolas e estúdios de Yoga precisaram
pessoas se sintam acolhidas, conscientes, otimis- parar as atividades, práticas on line e através de
tas, tranquilas e equilibradas. Entre tantas possibi- aplicativos, inclusive gratuitos, foram alternativas
lidades, e considerando que para cada sujeito, po- viáveis para os praticantes e novos interessados.
derá haver uma prática com a qual se identifique, Considerando que aqui vamos falar mais das
vamos destacar aqui o Yoga e o Mindfullness. práticas do que das teorias, um bom começo
Para Brown (2009, p.9) o Yoga é um “estado para a prática de Mindfullness é um programa
mental”. Tem como propósito aquietar a mente e de oito semanas desenvolvido por Williams, M. &
busca realizar esse objetivo inicialmente através Penman, D. (2015) denominado Atenção Plena:
do corpo, das posturas e da respiração, para en- como encontrar a paz em um mundo frenético.
tão alcançar o estado de quietude mental. Esse programa está baseado nos estudos Jon
De acordo com Packer (2009, p.25) “o Yoga é Kabat-Zinn, criador do mindfullness e que assi-
um caminho que se abre diante de nós na busca na o prefácio do referido livro. A obra traz ainda
profunda de nossa real natureza”. Segundo a au- um CD com oito meditações guiadas. Para os
tora, existem sete escolas clássicas do Yoga: Rãja Williams, M. & Penman, D. (2015, p.19): “A aten-
Yoga, Jñãna Yoga, Karma Yoga, Bhakti Yoga, Ha- ção plena nos encoraja a romper com os hábitos
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de pensamento e comportamento que nos impe- Políticas de Segurança Alimentar e Nutricional –
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
dem de aproveitar plenamente a vida.” OPSAN/UnB) no qual ela apresenta resultados da
Na perspectiva a que chamamos de práticas pesquisa “Comensalidade em tempos de pande-
de saúde mental, são muitas as possiblidades, in- mia por Covid-19”.
clusive os grupos ou comunidades terapêuticas, A pesquisa teve como objetivo identificar quais
as terapias individuais, tradicionalmente mais fa- as mudanças que ocorreram nas práticas de co-
cilmente associados ao tema da saúde mental e mensalidade5 e como foram vivenciadas algumas
que também precisaram ser reestruturados du- atitudes também relacionadas a essas práticas.
rante o período de isolamento social, passando a Como principais resultados a pesquisa destacou:
fazer uso do modelo remoto no atendimento. 1. Comer em companhia e cozinhar foram práti-
A preocupação com o desenvolvimento de no- cas que aumentaram no grupo de participantes
vos hábitos alimentares/nutricionais tem sido da investigação; 2. Comer em companhia teve
demonstrada também nesse período de pan- como segmento mais presente a família. Outras
demia. A busca pela saúde e pelo aumento da opções como solicitar comida por aplicativos e
imunidade nos coloca diante de um paradoxo: 1. diretamente em estabelecimentos também foram
Por um lado, uma preocupação maior com a ali- citados como opções. De acordo com Rizzolo
mentação e melhor nutrição: a compreensão de (2021) a investigação concluiu que:
que se alimentar de maneira saudável é também
as práticas de comensalidade produzem signi-
importante para a imunidade e aquisição de no- ficados, identidades e pertencimento social, e
vos hábitos como cozinhar em casa; 2. Por outro a necessidade de isolamento e distância social
lado, estamos vendo uma parcela importante da pode ter provocado nas pessoas a percepção
população sem acesso mínimo à alimentação, da importância dos encontros e das trocas, e
assim, a função social e coletiva da alimentação
são moradores de rua, desempregados, morado-
pode ter ganhado uma outra expressão e uma
res de comunidades sem acesso a renda, enfim, ressignificação do bem viver em sociedade.
pessoas para as quais não chegam as políticas
5 “Comensalidade deriva do latim “mensa” que significa convi-
públicas, e que têm sido assistidas por grupos de ver à mesa e isto envolve não somente o padrão alimentar ou
voluntários de diferentes origens e configurações. o quê se come mas, principalmente, como se come. Assim, a
comensalidade deixou de ser considerada como uma conse-
O Observatório Brasileiro de Hábitos Alimenta- quência de fenômenos biológicos ou ecológicos para tornar-
res – OBHA compartilha em seu site (https://obha. -se um dos fatores estruturantes da organização social. A ali-
mentação revela a estrutura da vida cotidiana, do seu núcleo
fiocruz.br/?p=916) um vídeo com a Profa. Anelise mais íntimo e mais compartilhado. A sociabilidade manifesta-se
sempre na comida compartida (6;7)”. Moreira, Sueli Apareci-
Rizzolo (professora da Universidade de Brasília da. Cienc. Cult. vol.62 no.4 São Paulo Oct. 2010. Disponível:
e Pesquisadora Associada do Observatório de http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0009-67252010000400009
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As lições ambientais aprendidas não podem paços de moradia, para os cuidados com o lar.
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
ser consideradas exatamente como práticas de Inicialmente, imaginamos que o período de iso-
bem-estar, quem sabe seja muito mais um processo lamento social duraria pouco tempo, talvez 15 dias
de conscientização a respeito da nossa relação com ou um mês. A realidade mostrou que não seria
o planeta. Talvez alguns fenômenos observados bem assim, e os prazos foram sendo postergados.
pelo mundo, no período de lockdown em diversos Parte das pessoas encara as atividades do-
países, tenha despertado uma nova consciência em mésticas como algo pesado composto por tare-
alguns de nós. Assistimos nos jornais, lemos maté- fas desagradáveis, muitos continuarão pensan-
rias e já temos documentários abordando os efeitos do e sentindo assim. Outros, conseguiram atri-
positivos dessa parada obrigatória com a queda dos buir novos significados e se adaptaram ao novo
índices de poluição do ar em grandes cidades. momento. Limpeza, organização, compras on
line, estabelecimento de novas rotinas e distri-
Segundo levantamento do Projeto Carbono Glo-
bal, organizado pelas Nações Unidas, a emis- buição de tarefas na família.
são de dióxido de carbono diminuiu 7% mun- Os locais de moradia se transformaram, ao
dialmente. Essa foi a maior queda já registrada. mesmo tempo, em espaços: de trabalho, de es-
(FADDUL, Juliana. CNN Brasil, 11.12.2020). tudos, de estreita convivência familiar, de lazer
Esses dados são referentes ao período de lo- e de práticas de exercícios físicos. Novos signi-
ckdown vivenciado pelos países em 2020, com ficados em nossas relações com os espaços da
a parada das indústrias, dos transportes e das casa e novas aprendizagens com a permanente e
viagens. Ainda segundo a matéria, os cientistas intensiva convivência familiar.
recomendam que algumas aprendizagens do Sobre o home office ou trabalho remoto, de
período podem ser incorporadas no pós-pan- acordo com a pesquisa Gestão de Pessoas na
demia, como as reuniões on line e o trabalho Crise Covid-19, da Fundação Instituto de Admi-
remoto, evitando viagens e deslocamentos des- nistração (FIA), o trabalho em casa foi adotado
necessários. Somente esse exemplo trazido na por 46% das empresas durante a pandemia no
publicação citada, pode impactar positivamente Brasil. (LEODOVICO, M., 2021)
o planeta com a economia de combustível, me- Na mesma matéria referida, o consultor do
nos poluição do ar e a melhoria da mobilidade no Sebrae - SP Éder Max citado por Leodovico, M.,
trânsito das grandes cidades. (2021) relata que:
Outra atividade que pode ter impactado positi- O mercado vinha de altos e baixos, mas, quan-
vamente as pessoas no enfrentamento da pande- do chegou a pandemia, os empreendedores do
mia foi um olhar para dentro de casa, para os es- setor se assustaram. Praticamente todo mun-
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do teve o mesmo pensamento, de que haveria Segundo dados da Pesquisa Mensal do Comér-
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estagnação, o que não aconteceu. Passando cio (PMC), do IBGE, o segmento de materiais de
mais tempo em casa, as pessoas começaram construção é um dos que mais crescem desde
a perceber detalhes que antes não observavam março, início da disseminação do novo corona-
por causa da rotina e isso motivou reformarem vírus no país. (Disponível:https://veja.abril.com.
o espaço onde vivem. Eu mesmo fui um desses br/economia/pandemia-mudou-relacao-com-lar-
conta Max, que adaptou todo seu escritório para -e-estimulou-reformas-diz-ceo-da-telhanorte/)
continuar atendendo os clientes a partir de sua
casa. (Disponível:https://exame.com/pme/com- Na matéria referida, o entrevistado Juliano
-o-home-office-empresas-de-reforma-crescem- Ohta, CEO da Telhanorte Tumelero, afirma que:
-40-na-pandemia/. Acesso em 10/10/2021.)
Pandemia mudou relação com lar e estimulou
Os espaços precisaram ser modificados, fez- reformas...Nosso faturamento tem crescido
-se necessário estruturar um cantinho que fosse entre 30% e 40% em relação ao que vendía-
mos antes da pandemia. O consumidor pegou
para o home office, outro cantinho para as crian-
o hábito de comprar pela internet. Ele gostou
ças e jovens em idade escolar com computador e dessa conveniência. (Disponível:https://veja.
conexão de internet, no mínimo. Cada um sabe o abril.com.br/economia/pandemia-mudou-rela-
quanto teve que se virar para que tudo funcionas- cao-com-lar-e-estimulou-reformas-diz-ceo-da-
se junto e misturado. Haja resiliência. -telhanorte/)
Foi preciso aprender a partilhar tudo, es- Infelizmente, para muitos a realidade foi diferen-
paço, equipamentos, tempos, silêncios. Im- te, perderam o emprego, a casa, e sua luta foi a
pressionante a capacidade de adaptação que busca pela sobrevivência. Ficaram desassistidos.
muitos de nós demonstramos. Estruturamos, Outra parcela ainda da população buscou
dividimos, juntamos, reestruturamos, criamos novos espaços de moradia. No período do iso-
regras, modificamos regras e fomos trans- lamento social, pessoas que podiam ter acesso
formando, como podíamos, nossos lares. Os a ambientes próximos à natureza, fizeram essa
cuidados com o lar, como denominamos aqui, opção. Buscaram viver fora dos grandes cen-
fizeram parte das práticas que podem ter im- tros, em ambientes abertos, arborizados, praias,
pactado positivamente a saúde mental de uma montanhas, zona rural.
parcela da população. Certamente para alguns Silva et al (2020, p.5), em estudo realizado
o que houve foi uma sobrecarga de trabalhos, sobre a “Influência das condições de bem-estar
especialmente quando não há o envolvimento domiciliar na prática do isolamento social duran-
de todos os membros da família. te a pandemia da Covid-19”, apontam que:
De acordo com a Revista Veja (13.10.2020),
282 18
A possibilidade de ter acesso, em suas residên- Para Bock et al (2019, p.99)
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
cias, a áreas abertas ou verdes, com condições
que facilitem a prática de atividades físicas e o que interessa aos estudiosos dos grupos, sejam
com condições de um descanso e sono ade- eles de convivência diária (relações face a face),
quados parecem contribuir para a redução dos de rua ou pela internet, são os processos grupais,
incômodos gerados pela necessidade de um pe- ou seja, tudo aquilo que acontece quando os sujei-
ríodo prolongado de quarentena. tos se sentem pertencendo a um conjunto de pes-
soas com o objetivo de partilhar objetivos, tarefas,
Já vimos que é muito provável que uma práti- resultados, hábitos, costumes e valores.
ca/atividade diferenciada traga benefícios positi-
Os processos grupais vividos nos jogos virtu-
vos e promova estados de bem-estar, elencamos
ais podem promover socialização, disputas, pla-
algumas poucas, entre tantas. O mais importante
nejamento grupal e compartilhamento de valo-
é que cada um de nós encontre a(s) sua(s) prá-
res comuns. Os jogadores e seus personagens
tica(s), incluindo hobbies, clubes (de leitura, de
(quando é o caso) são transportados para dentro
jogos etc.), trabalho voluntário, engajamento em
do ambiente virtual do jogo, criando um processo
causas sociais, e tantas outras possibilidades.
de grupo que também produz emoções e desafios
Somos seres complexos, precisamos nutrir nosso
como nas experiências de jogo presenciais.
corpo e nossa mente, e cada um pode encontrar
Como comenta Coutinho & Alves (2016) atual-
seu próprio caminho de equilíbrio e bem-estar.
mente fazemos parte de uma “Cultura Gamer” e
Vamos a seguir apresentar pesquisas realizadas
vivemos em um contexto onde o jogo cria comuni-
com jovens e idosos acerca do uso de jogos e vide-
dades lúdicas que interagem visando a promoção
ogames e sua relação com estados de bem-estar.
de suas necessidades de jogar, da construção e da
oportunidade de compartilhar suas experiências
JOGOS E VIDEOGAMES E SUA RELAÇÃO
para evoluírem no jogo, bem como jogarem juntos.
COM ESTADOS DE BEM-ESTAR DO JOVEM
Muito se tem discutido e pesquisado sobre
os jogos e videogames, especialmente sobre os
Desde os primórdios, os jogos tem sido cria-
efeitos adversos que o uso excessivo de tempo
dos e utilizados principalmente como atividade
dedicado a eles poderia trazer. Além do tempo
de lazer, o que por princípio tem como objetivo
de uso, questões como agressividade e impactos
o entretenimento, o prazer e o bem-estar. Ainda
negativos na saúde mental de jogadores tem sido
que tenhamos disponíveis muitos jogos para uso
amplamente discutido por pais, educadores e le-
individual, é no uso em grupo que eles assumem
gisladores, sem dúvida temas de importância no
maior protagonismo, sendo meio de interação so-
momento atual.
cial entre jogadores parceiros e/ou competidores.
283 18
Fazendo um contraponto aos possíveis efeitos relatada, duas escalas validadas. A primeira de-
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
negativos dos jogos virtuais na saúde mental dos nominada Escala de Experiências Positivas e
jogadores, acreditamos que vale a pena compar- Negativas (SPANE) mede a dimensão afetiva do
tilhar uma pesquisa realizada em plena pandemia bem-estar; e, a segunda, denominada Escala de
da Covid-19 em 2020, e publicada em 2021 por Experiência e Satisfação das Necessidades
um grupo de pesquisadores da Universidade de dos Jogadores (PENS) que mede senso de au-
Oxford que traz como resultado a correlação po- tonomia, competência, relacionamento, motiva-
sitiva entre jogo de videogame e bem-estar. ções extrínsecas e intrínsecas (prazer).
Johannes, N., Vuorre, Matti & Przbylski, A.K. Enfim, a pesquisa realizada por Johannes, N.,
(2021. p.2) investigaram “a relação entre o tempo Vuorre, Matti & Przbylski, A.K. (2021, p.4) investi-
real que as pessoas dedicam a jogar um jogo e gou “as relações entre os videogames e a saúde
sua sensação subjetiva de bem-estar”. O público mental positiva, nomeada bem-estar afetivo dos
investigado na pesquisa era composto por joga- jogadores (doravante denominado bem-estar)” e
dores de dois videogames amplamente conheci- apontou os seguintes resultados que avaliamos
dos: Plants vs. Zombies: Battle of Neighbourville como mais relevantes para o nosso artigo.
e Animal Crossing: New Horizons. Na Figura 1 encontramos uma pequena rela-
O estudo foi realizado em colaboração com as ção positiva entre o tempo de jogo e o bem-estar
empresas Eletronic Arts e Nintendo of America, para ambos os jogos.
fabricantes dos jogos e responsáveis pelo for-
necimento de dados de telemetria (frequência e
tempo de uso do jogo) dos jogadores que partici-
param do estudo.
Ao se referirem à importância dos dados de
telemetria dos jogadores fornecidos pelas empre-
sas, os autores afirmam que:
os dados nos permitiram explorar a associação
entre tempo de jogo objetivo e bem-estar, entre-
gando uma exploração muito necessária da rela-
ção entre comportamento lúdico medido direta- Figura 1 – Histogramas de variáveis centrais. O eixo y indica con-
mente e saúde mental positiva (JOHANNES, N., tagens de respostas em cada compartimento, dimensionado para
VUORRE, Matti & PRZBYLSKI, A.K. 2021, p.4). o compartimento com maior número de respostas. As frequências
superiores indicam as respostas dos jogadores PvZ, as frequências
inferiores indicam as respostas dos jogadores AC: NH. Triângulos
Os pesquisadores utilizaram como medidas, pequenos indicam médias.
Fonte: JOHANNES, Niklas; VUORRE, Matti e PRZYBYLSKI, An-
além da telemetria e da experiência de jogo auto drew K. (2021, p. 6)
284 18
Podemos observar na Figura 2 as associações
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
entre o tempo objetivo (dados da telemetria) para
jogar e o bem-estar foram maiores do que do que
o tempo auto relatado para jogar e o bem-estar.
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
mais importantes, os comportamentos objetivos
dos jogadores, não são usados em pesquisas
científicas...Estamos otimistas de que colabora-
ções desse tipo fornecerão as evidências neces-
sárias para avançar nossa compreensão do jogo
humano e fornecer aos formuladores de políticas
os insights sobre como eles podem moldar, para
o bem ou para o mal, nossa saúde.
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
uma taxa de 3% ao ano. A população acima de 60
anos de idade deverá mais que duplicar até 2050,
e deverá mais que triplicar no final do presente
século, devendo passar dos 962 milhões em 2017
alcançando 2,1 bilhões em 2050 e 3,1 bilhões em
2100. Percentuais semelhantes deverão ser dar
com as pessoas com 65 anos ou mais, especial-
mente em países em desenvolvimento, o que su-
gere idosos em situação de pobreza. Ao mesmo
tempo, o número de pessoas com 80 anos ou
mais deverá triplicar até 2050 passando de, 137 Figura 5 – Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
milhões, em 2017, para 425 milhões em 2050.
Avalia-se que este fenômeno está relaciona- No entanto, o aumento da expectativa de vida,
do ao aumento da expectativa de vida em todo óbvia pelo consequente aumento da qualidade de
o mundo, desigual e de acordo com suas res- vida na maioria dos países do mundo, vem acom-
pectivas situações econômicas e de qualidade panhada, em regra, de muitas fragilidades, ou
de vida oferecida a seus cidadãos. De acordo seja, e, ironicamente, de pouca qualidade de vida.
com o Instituto Brasileiro de Geografia6 e Estatís- Veras, R.P. (2012, p. 3) aborda essa questão
tica (2018) em 2017, o Brasil contava com 28 mi- afirmando que
lhões de pessoas nessa faixa etária, e se estima
as transformações sociais e econômicas das úl-
que em 2050 serão 90 milhões. timas décadas e suas consequentes alterações
nos estilos de vida das sociedades contempo-
râneas como mudanças dos hábitos alimenta-
res, aumento do sedentarismo e do estresse e
a maior expectativa de vida da população cola-
boraram para o aumento da incidência das do-
enças crônicas, que hoje constituem um sério
problema de saúde pública.
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
ganha em problemas de custos em saúde. Fraser regular é um dos principais componentes de um
et al (2015, p. 413) afirmam que “a expectativa estilo de vida saudável. Está associada a um me-
de vida de idosos com doenças mentais é pior lhor funcionamento físico e cognitivo na vida adulta
do que a da população em geral e se deve em e ao aumento da expectativa de vida.
grande parte ao mau estado de saúde física e, Muitos autores, como veremos a seguir, sus-
portanto, é importante e necessária a prática de tentam a necessidade do exercício física, como
exercícios físicos”. No mesmo sentido, Van Baal uma ferramenta fundamental e não medicamen-
(2016, p.81), afirma que a tosa para um envelhecimento bem-sucedido,
quer em se tratando de aspectos relacionados às
prevenção da demência por meio da atividade
física, aumenta a expectativa de vida e diminui qualidades físicas, quer naqueles relacionadas às
os gastos com saúde e assistência social. Se a funções cognitivas.
prevenção for direcionada aos fisicamente inati- A relação entre incapacidades físicas, espe-
vos, a economia nos custos direcionados à de- cialmente na marcha e no equilíbrio como indica-
mência, supera os gastos adicionais em anos de
dores de problemas mentais é muito íntima como
vida ganhos.
podemos concluir em Aguiar e Assis (2009) que
A relação entre vários níveis de comprometi- encontraram, utilizando o MEEM (Mini Exame do
mento cognitivo e mortalidade foi pesquisada por Estado Mental), presença de déficits cognitivos
An, R.P. e Liu, G.G., (2016) em chineses com 80 em 52% maior na população que sofreu queda,
anos de idade ou mais no período entre 1998 e ou seja, trata-se de uma relação direta muito for-
2012. A relação entre a gravidade do comprometi- te. No mesmo sentido, Da Cruz, D.T. et al., (2015)
mento cognitivo e o índice de mortalidade foi evi- complementam e reforçam essa relação ao afir-
dente, de modo que o comprometimento cognitivo mar que os sistemas sensoriais e motor são inter-
básico foi inversamente associado à longevidade ligados por processos neurológicos, que são fun-
entre os chineses mais velhos. damentais para o planejamento motor, necessário
Segundo Hernandez, D.C. e Johnston, C.A. para que se tenha atenção na execução em dupla
(2017, p. 21), “a pedra angular para o envelheci- tarefa e respostas às circunstâncias do ambiente.
mento bem-sucedido é a manutenção de uma roti- Assim, idosos com declínio cognitivo apre-
na consistente de atividade física e dieta saudável. sentam maior lentidão nos movimentos e menor
Esses aspectos são particularmente importantes tempo de reação aos desequilíbrios impostos.
para preservação da independência em adultos Isso significa que qualquer diminuição na veloci-
mais velhos”. No mesmo caminho, Gomes, M. et dade e/ou desequilíbrio da marcha já representa
288 18
e identifica algum prejuízo cerebral no idoso como as habilidades cognitivas e protegendo o cérebro
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
podemos verificar a seguir. contra processos neurodegenerativos.
Sob o mesmo aspecto, considerando que a mo- E com relação aos Games? Depois de suas prá-
bilidade reduzida não só indica uma vulnerabilida- ticas entre os jovens serem tão combatidas, questio-
de aumentada por declínio fisiológico associado ao nadas e provocarem tanta polêmica, será que ido-
envelhecimento, mas ainda ao comprometimento sos os praticam? Existem pesquisas e publicações
cognitivo e à depressão em chilenos mais velhos, sobre seus eventuais benefícios como acabamos
Albala, C. (2017), afirma que, o risco de morte é de ver com a prática de exercícios físicos? Se sim,
maior para pessoas mais frágeis, mas que o com- há benefícios para a aptidão física, funções cardio-
prometimento cognitivo subjacente é um compo- vasculares, funções cognitivas, para a coordenação
nente-chave da menor taxa de sobrevivência. motora, para o equilíbrio, por exemplo?
Em situações como essa, o exercício físico é As respostas são “sim” às perguntas acima. Isso
capaz de recuperar o dinamismo metabólico, di- também significa que sob certas e específicas con-
minuindo a vulnerabilidade e o comprometimento dições, os benefícios da prática de games podem
cognitivo subjacente, aumentando assim a taxa ser os mesmos dos exercícios físicos (por exemplo:
de sobrevivência. Exergames), o que coloca nas mãos da saúde, da
Clark, C. et al (2019) estabelecendo as rela- Educação Física e da Psicologia, por exemplo, op-
ções entre exercício aeróbio, função cognitiva e ções que facilitam a abordagem de saúde, qualida-
a microestrutura da substância branca no enve- de de vida e longevidade saudável dos idosos.
lhecimento, afirmam que declínios precipitados
na microestrutura da substância branca, como
geralmente ocorrem no envelhecimento, foram
associados ao declínio cognitivo e ao aumento do
risco de doenças neurodegenerativas como de-
mência vascular e doença de Alzheimer.
Danos à microestrutura da substância resultam
em parte, de fatores de risco vascular e o exer-
cício físico, especialmente o exercício aeróbio, é
muito promissor na prevenção, ou mesmo rever-
são, desse dano e suas consequências. Assim, o
exercício aeróbio seria capaz de aumentar a mi-
Figura 6 – Imagem tudocelular.com 19.12.17.
croestrutura da substância branca, aumentando
289 18
Antes de expormos e discutirmos os resulta- há outros benefícios já comprovados com os
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
dos das pesquisas aos sites científicos de busca jogos de videogame. O videogame interativo
investimos na leitura de alguns periódicos para disponibiliza à pessoa idosa a oportunidade de
melhora do condicionamento físico, da força, do
verificar as abordagens e reações ao tema. En-
equilíbrio e desenvolve também o lado social e
contramos no ano de 2015 (Revista do Serviço cultural. Assim, permite que o idoso possa exer-
Social do Comércio-Sesc), dois artigos sobre ga- citar-se através dos movimentos típicos de cada
mes Terra (2015) e Souza e Felix (2015), onde esporte simulado nos jogos dos videogames.
são consideradas, com muita propriedade, as
Souza e Felix (2015, p.3), sobre suas experi-
qualidades dos games para os idosos.
Sobre os sinais mais evidentes do processo de ências com idosos na prática de videogames, re-
envelhecimento do cérebro que são a redução da latam o seguinte:
velocidade de absorver novos conhecimentos, da Com os chamados Exergames, games con-
velocidade dos reflexos e da coordenação moto- trolados com movimentos corporais e que pri-
ra, Terra (2015, p. 2), afirma: vilegiam a prática de exercícios físicos, foram
apresentadas pontualmente questões como o
Durante anos, os médicos acreditavam que isso equilíbrio, coordenação motora, ação e reação
se devia à perda de neurônios. Pesquisas re- e treinamento cardiovascular. Além de demons-
centes apontam em outra direção: a queda do trar a possibilidade da prática de exercícios
número de sinapses. Por sorte, ao identificarem de maneira lúdica, tivemos a preocupação em
o problema, os cientistas também apontaram a apontar o relacionamento dos videogames com
solução. Em qualquer idade, a criação de novas tais aspectos relacionados à saúde e bem-estar.
sinapses é uma decorrência do esforço que se
exige dos neurônios. Trata-se de um processo De acordo com Crespo et al (2016), assim
similar ao do fortalecimento dos músculos em como a terapia e a atividade física, que ajudam
resposta à intensificação de atividades físicas. a melhorar a saúde e o bem estar dos idosos,
Assim, a leitura com reflexão, o aprendizado de
melhorando a qualidade de vida e trazendo lon-
uma nova língua, o convívio social, a informá-
tica, a realização de exercícios físicos, a reali- gevidade, os jogos de wii tiveram um impacto po-
zação de palavras-cruzadas, jogos de memória sitivo no bem estar geral dos idosos. Cardoso et
e mais modernamente os jogos de videogame al (2017, p.14) nas considerações finais de uma
induzem a novas conexões entre os neurônios. revisão sistemática sobre o uso de jogos eletrôni-
Sem contar a melhora cognitiva, da função cos como ferramenta de intervenção no declínio
executiva no cérebro, necessária para memória, cognitivo, afirma observar-se
atenção, percepção e resolução de problemas,
Terra (2015, p.2), afirma ainda que
290 18
que os jogos eletrônicos são capazes de gerar jogatina com os filhos e netos “um momento para
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
aprimoramento cognitivo tanto em idosos sau- a família”.
dáveis, como em idosos com declínio cognitivo.
Para os pesquisadores da GWI que entrevista-
Ainda não se sabe ao certo se estes benefícios
são idênticos em quantidade e qualidade em to- ram 19.500 pessoas de várias regiões do mundo,
das as faixas etárias. Os jogos eletrônicos utili- a pandemia da covid-19 pode ter aumentado os
zados como treinamentos e intervenções cogni- números, mas é improvável que seja responsável
tivas precisam ser estudados dentro de todas as por todo o crescimento. Durante a Covid-19 os
faixas etárias, pois é possível que alguns jogos
videogames foram utilizados até na recuperação
eletrônicos aprimorem melhor a cognição de de-
terminada faixa etária do que outros.
física de idosos. Imersos nas experiências lúdi-
cas, ficam distraídos pela animação ao intera-
Assis et al (2015, p. 2) nas considerações fi- gir com as imagens, sofrendo menos para fazer
nais de uma revisão sistemática sobre efeitos do exercícios recomendados pelos fisioterapeutas.
treino com videogames na cognição de idosos, Segundo Hugo Tourinho Filho, professor da
afirma que Escola de Educação Física e Esporte de Ribei-
o treino cognitivo com uso de jogos de video- rão Preto no seu artigo “Videogames (ativos)
game como uma modalidade de intervenção e pandemia” em tempos de combate ao Sars-
cognitiva, apresentou efeito positivo em dife- -CoV-2 (COVID-19), o isolamento social mostra-
rentes domínios da cognição, com destaque em -se como uma das estratégias mais eficazes e
funções executivas, atenção e velocidade de
importantes para se buscar o controle dessa epi-
processamento. Esses benefícios cognitivos po-
dem ter impacto na vida do idoso, melhorando demia; no entanto, não se pode negar a preocu-
seu desempenho em diferentes atividades roti- pação com o avanço do sedentarismo provocado
neiras. Para esse efeito na cognição é preciso por essa nova modalidade de vida imposto pelas
empenho no treino, porque o efeito depende da atuais circunstâncias pandêmicas.
intensidade de ocorrência da atividade cognitiva
em um período de tempo suficiente para resultar Nesse sentido, os videogames ativos, também
em plasticidade neuronal. conhecidos por exergames, podem ser uma al-
ternativa interessante para ser usada durante o
De acordo com estudo feito pela Global Web isolamento social na luta contra o sedentarismo
Index (GWI), empresa que trabalha com pesqui- que caracteriza este nosso “novo estilo de vida”
sas de marketing, nos últimos três anos, houve – a vida em quarentena. (FILHO, Hugo Tourinho
JORNAL USP, em 13/08/2020. https://jornal.
alta de 32% entre os jogadores da faixa etária de
usp.br/artigos/videogames-ativos-e-pandemia/
55 e 64 anos. Outro dado importante do estudo é Videogames. Acesso em: 30/10/2021)
que 24% dos pais e avós estão considerando a
291 18
Sabemos que estudos desta natureza permitem sendo realizada a partir do acompanhamento dos
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
trazer evidências científicas da importância dos processos vivenciados pelas sociedades e apre-
exergames como uma ferramenta fundamental de sentados diariamente nos diversos meios de co-
combate ao sedentarismo e que pode ser usado municação.
neste momento de isolamento social não só como Para esse trabalho focamos em dois públicos
forma de exercício físico, mas também como diver- específicos, os usuários de jogos e games nas
são e envolvimento social com toda a família. categorias: 1. jovens e, 2. idosos.
Por fim, e, necessariamente, será preciso fa- A Pandemia trouxe incertezas, medos, e per-
zer algumas inevitáveis considerações, tendo em das significativas. Esse estado de sofrimento co-
vista que quando nos referimos ao ser humano, letivo não poderia se instalar de forma definitiva,
há aspectos relacionados à individualidade bioló- pois aí sim, sucumbiríamos. Para dar conta dessa
gica, à individualidade psicológica, assim como, nova realidade, as pessoas buscaram de diversas
aspectos de natureza funcional e muitas outras formas a superação da insegurança, do medo, da
especificidades, sem as quais não se pode fazer instabilidade, do desconhecimento e, do grande
abordagens científicas. Tampouco, deixar de con- sofrimento trazido pela pandemia com as mortes,
siderar as diferenças que todo ser humano tem o perdas e incertezas a respeito do futuro.
direito de exercer e, nossas prescrições, o dever A busca por práticas de bem-estar foi aconte-
de respeitar, em função dos resultados que preci- cendo “naturalmente” à medida que as angústias
samos conquistar. iam se instalando e paralisando parte considerá-
vel das populações. Possivelmente, muitos esfor-
CONSIDERAÇÕES FINAIS ços não foram em vão e, podem ter significado
(para muitos) uma mudança de estilo de vida para
Esse artigo buscou refletir sobre as relações levar para a vida toda.
dos jogos e games com estados de bem-estar, Os jogos e games tem papel fundamental na
considerando o contexto excepcional da Pande- vida dos jovens, sendo assim, vimos na pesquisa
mia da Covid 19. de Johannes, N., Vuorre, Matti & Przbylski, A.K.
Para tanto, buscamos referências na literatura (2021) que foi identificada uma pequena relação
sobre o tema dos jogos e games, da saúde física positiva entre o tempo de jogo e o bem-estar dos
e mental e dos estados de bem-estar. Por outro jovens usuários de games, além de que condicio-
lado, parte das reflexões estão pautadas na ob- nada ao tempo de jogo, a satisfação da neces-
servação da realidade a partir de março de 2020, sidade de autonomia e de relacionamento, bem
quando teve início o período de isolamento social, como o prazer estiveram positivamente relacio-
292 18
nados ao bem-estar. Além disso, identificaram a rior, rede fronto parietal, lobo temporal e regiões
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JOGOS E GAMES E SUAS RELAÇÕES COM ESTADOS DE BEM-ESTAR: REFLEXÕES NO CONTEXTO DA PANDEMIA
relação entre comportamento lúdico medido dire- insulares. Os efeitos dos jogos estimularam fun-
ções mentais de atenção, movimento, emoções,
tamente e saúde mental positiva.
memória, planejamento e tomada de decisões.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) in- Houve benefícios nas funções cognitivas e de
centivou os idosos a jogar videogame em tempos aprendizado com melhorias da arquitetura neu-
de coronavírus. A OMS preocupada com a propa- ronal e diminuição da distração.... Conclusão: A
gação do coronavírus (COVID-19) e com o bem- prática regular de jogos eletrônicos mostrou ser
eficiente na reabilitação física e contra o enve-
-estar mental das pessoas, lançou uma campa-
lhecimento devido ao estímulo e melhorias das
nha, incentivando a jogar videogame com o lema funções mentais. Foram verificados benefícios
“Play apart together”, que significa “Joguem se- em várias funções cerebrais em geral, podendo
parados e juntos”. Segundo a OMS ter contribuído com maior plasticidade funcional
e neuronal.
A #PlayApartTogether está sendo divulgada nas
redes sociais por iniciativa da OMS, para que as Por fim, sem minimizar todas as dores vivi-
pessoas se socializem jogando online. Uma ma-
das pelas sociedades e cidadãos do mundo com
neira prática, divertida e saudável, de manter o
contato entre amigos e parentes, mesmo estan-
a Pandemia da Covid 19, destacamos algumas
do separados fisicamente por conta do corona- aprendizagens em curso, vamos dizer assim, no
vírus. Essa é uma excelente maneira de comba- que se refere à: 1. busca do autoconhecimento:
ter o sofrimento emocional causado pelas me- 2. consciência quanto à existência de limites e a
didas preventivas do isolamento. (OMS, 2020. necessidade de respeitá-los; 3. redescoberta de
OMS incentiva a jogar videogame em tempos
práticas de bem-estar, quer sejam apaziguado-
de coronavírus (estacaonerd.com). Acesso em:
20/10/2021) ras, quer sejam lúdicas. Tudo isso com o objetivo
de produzir nas pessoas estados de bem-estar
No estudo da plasticidade neuronal com o uso e benefícios para a saúde física e mental. Como
de jogos eletrônicos, Pessini, R.A. et al (2018, p. meio para tudo isso destacamos a tecnologia, que
25) apresentaram os seguintes aspectos dessa tão importante papel exerceu, e exerce, de inter-
relação, cujo estudo embora não tenha sido di- mediação das relações, das aprendizagens, nos
recionado especificamente aos idosos, suas con- processos vitais a todos nós. O cuidado está na
clusões lhes interessam assim como àqueles que medida do uso, os meios tecnológicos estão aí
com eles trabalham: para nos ajudar a viver melhor, não para nos es-
O treinamento com jogos eletrônicos proporcio- cravizar. E por enquanto, ainda nada supera um
nou aumento de atividade em regiões cerebrais abraço apertado, um piquenique no parque, um
como córtex pré-frontal, córtex cingulado ante- banho de mar, ao vivo, a cores e em tempo real.
293 18
REFERÊNCIAS nal of Geriatric Psychiatric, https://doi.org/10.1002/
Lúcia Maria Gonçalves Siebra - Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida - Flávio José Wirtzbiki de Almeida
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parte
2
298
APRESENTANDO O CENÁRIO...
Segundo Furley; Pinel (2020) essa casa de Posto isso, como possibilitar a essa criança e
apoio dispõe em suas instalações de uma brin- adolescente, o acesso não apenas ao direito do
quedoteca hospitalar em espaço não hospitalar, brincar enquanto verbo, mas o direito do brincar
por estar em consonância com as regulamenta- em uma totalidade que representa o existir vivi-
ções conforme orientações da Agência Nacional do na finitude da vida e suportando no sentido na
de Vigilância Sanitária (ANVISA). carne? Brincar é mais que necessário! É urgente.
A brinquedoteca hospitalar tem a finalidade de
tornar a estadia da criança no hospital menos Nossas bases de sustentação...
traumatizante e mais alegre, possibilitando as-
sim melhores condições para sua recuperação Dialogando com as obras de Cunha (2011),
(CUNHA, 2001, p. 96).
Lindquist (1993), Pérez-Ramos; Oliveira (2010)
De acordo com os dados do site da instituição, Gimenes; Teixeira (2011), Furley; Pinel (2020)
no ano de 2019, 3.294 pessoas tiveram acesso faz-se evidente a partir dos relatos apresentados
a esse espaço, e consequentemente acesso ao nesse artigo que o espaço da brinquedoteca hos-
brincar e a tudo o que ele representa. Com a pan- pitalar da ACACCI perpassa a concepção de uma
demia da covid 19 esse espaço foi fechado, e o sala colorida e cheia de brinquedos.
301 19
Esses estudos citados apresentam a impor- Dialogar com as autoras Ivonny Lindquist e
3. 4. REFERÊNCIAS
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INTRODUÇÃO
Isabella de Moraes Ribeiro - Natasha Moutinho Geada - Maria Vitória Campos Mamede Maia
A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
adulto e criança. não a invada de forma intrusiva e destrutiva. Para
o autor base de nossa pesquisa, Winnicott, este
DESENVOLVIMENTO manejo entre o mundo interno e subjetivo de uma
criança e o mundo real e objetivamente percebi-
A afetividade aparece como fator central da pes- do por ela, na idade certa e no momento certo, é
quisa, pois é a partir deste conceito que é possível intermediado por um objeto transicional. O objeto
compreender a expressividade corporal da criança mantém a ideia daquele adulto, no qual ela con-
como uma linguagem. E os conceitos que se ligam fia, presente por um tempo. Esta área é denomi-
a afetividade e serão explicitados ao decorrer do nada pelo mesmo autor como área de manobra,
texto, são: criança, linguagem, corpo e brincar. uma área transicional que faz emergir formas de
Utilizamos como referência para falar sobre lidar com esses dois espaços-tempos separados,
criança, o autor base do LUPEA, D. W. Winnicott, porém, paradoxalmente juntos. (WINNICOTT,
psicanalista e pediatra inglês, pesquisador sobre 1975). Destaca-se, aqui, a fundamental importân-
desenvolvimento infantil do século XX. O autor cia desta transição, visto que a mesma possibilita
nos traz que “é essencial encarar a criança como a construção de um vínculo entre o objeto e o su-
um ser humano que começa com todos os sen- jeito, transmitindo uma sensação de segurança e
timentos intensos dos seres humanos, embora estabilidade, que também pode ser estabelecida
sua relação com o mundo esteja apenas princi- com um ser humano, caso a criança permita.
piando” (WINNICOTT, 1964, 1982, p. 62). Dessa Buscando refletir sobre a sensação de segu-
forma, se faz necessário compreender a criança rança e estabilidade na criança, é necessário
no seu próprio estado, não a transformando num compreender de que maneira isto pode ser es-
pequeno adulto, mas sim, entender que é um ser tabelecido e de como a criança demonstra a pre-
humano se constituindo e necessita de um adul- sença ou a ausência deste ambiente seguro por
to para a auxiliar nessa caminhada. Por isso, é meio da comunicação, que é subjetiva e própria
fundamental a instauração da confiança de um da mesma. A criança estabelece uma comunica-
adulto para com ela, porque, só dessa maneira, ção com o meio a partir do seu corpo e revela pis-
o seu aprendizado se tornará mais efetivo e se tas acerca de suas necessidades e experiências
transformará em um saber próprio. (WINNICOTT, adquiridas ao longo do processo. Estas pistas
1986, 1999). são observadas, por exemplo, no ato de brincar,
Além da confiabilidade humana, a criança tam- nas brincadeiras escolhidas e em como a criança
bém necessita ter um intermediário entre o seu cria uma relação com estes fatores. Assim, po-
309 20
demos ressaltar o brincar como uma linguagem esta imobiliza o corpo infantil para fazer valer os
Isabella de Moraes Ribeiro - Natasha Moutinho Geada - Maria Vitória Campos Mamede Maia
A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
característica da infância, um ato que representa seus interesses, ainda que os desejos relativos
as subjetividades da criança, que transforma em ao movimento corporal existam e sejam por ela
símbolo as experiências vividas com o seu corpo reprimidos. Exemplo disto são as crianças consi-
(GARANHANI, 2004). deradas por este ambiente como “agitadas”, por
Sendo, a partir do exposto, o corpo o principal não se encaixarem no padrão disciplinador que a
meio pelo qual a criança se comunica, podemos escola apresenta. O ato de querer brincar nas au-
destacar os conceitos que Arenhart (2018) desen- las, levantar constantemente da cadeira e correr
volveu: o corpo brincante e o corpo oprimido. são mecanismos de resistência da criança para
O corpo brincante é aquele que se movimenta perpetuar e manter vivo este corpo brincante.
e que encontra, nele mesmo, a “possibilidade de Já o corpo oprimido é consequência deste ces-
experienciar-se como brinquedo” (ARENHART, sar impositivo ao corpo demandado pela escola,
2018, p.66), como podemos observar no contexto que rotula e categoriza cada vez mais aqueles
escolar. A escola é marcada por questões cotidia- que se encaixam em seus moldes e aqueles que
nas tais como: a presença da rigidez de discipli- não se encaixam, os agitados e os comportados,
nas e o formato de ficar sempre sentado, estando os que brincam muito e os que são mais disci-
o espaço do brincar somente reservado para as plinados. Montessori (s/d) discorre acerca desta
horas vagas em intervalos ou recreio. O brincar limitação do corpo como um fator que impossibili-
e a aprendizagem ainda são fatores polarizados ta a criança de se conectar com este, o que pode
atualmente, onde o corpo e suas expressões são gerar problemas no desenvolvimento infantil. Para
vistos como menos importantes do que os conte- a pediatra italiana, os movimentos do corpo não
údos escolares, como se ambos não se misturas- servem somente para as funções orgânicas, mas
sem. A relevância da linguagem corporal não é re- sim são fatores essenciais “para a elaboração da
conhecida pelas instituições escolares, que aca- inteligência, que se alimenta e vive de aquisições
bam por cessar ou impedir que a criança vivencie obtidas no ambiente exterior” (MONTESSORI,
suas experiências corporais de forma mútua com s/d, p. 109), conforme foi anunciado acima por
os conteúdos, o que acarreta uma série de ques- esta pesquisa.
tões no processo de ensino-aprendizagem em Montessori traz uma reflexão muito interessan-
relação às dimensões afetiva, cognitiva, relacio- te sobre a movimentação do corpo, principalmen-
nal e contextual. Diante deste cenário de impedi- te porque se relaciona diretamente com o concei-
mentos, Arenhart (2018) afirma que a criança cria to de corpo oprimido. A autora reflete sobre o sen-
uma forma de resistência à cultura escolar, pois tido da palavra ‘animal’, sendo que a mesma traz
310 20
um sentido de animação, os diferenciando dos “um relacionamento vivo entre duas pessoas que
Isabella de Moraes Ribeiro - Natasha Moutinho Geada - Maria Vitória Campos Mamede Maia
A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
vegetais. Estes são fixos na terra, sem a possi- abre espaço ao crescimento” (1964, 2005, p. 47).
bilidade de movimentação por conta própria, dife- Esse espaço só se abrirá com o tempo, pois a
rente dos animais, feitos para se animarem. Com criança precisa de alguém que esteja por ela e
essa reflexão de que os seres humanos necessi- propicie esse ambiente suficientemente bom.
tam do movimento, a autora questiona: “como é Uma vez o ambiente instaurado e a seguran-
possível querer impor restrições à atividade moto- ça estabelecida, a criança consegue viver cria-
ra da criança?” (MONTESSORI, s/d, p.112). tivamente, abrindo dentro de si o que Winnicott
Dessa forma, não é possível cessar os movi- (1975) denomina de espaço transicional, que é
mentos da criança, até porque é impossível para a uma “transição/transposição entre a realidade in-
mesma conseguir fazer isso, pois se ela é privada terna e a realidade compartilhada, [...] um espaço
no qual todo ser humano vive grande parte do seu
de seus movimentos, perde totalmente a conexão
tempo quando está se divertindo” (MAIA, 2007,
do seu corpo (MONTESSORI, s/d). Por isso, acre-
p. 66). Ou seja, é um espaço em que a criança
ditamos que o brincar permite que essa movimen-
pode utilizar para ficar só na presença de alguém,
tação não cesse e, assim, impeça de acontecer
ficar consigo mesma, caso ela não queira ou não
algo ruim no desenvolvimento da mesma. A brinca-
tenha sido possível estar comungada com a reali-
deira é algo essencial para qualquer ser humano,
dade compartilhada do mundo que a cerca, que é
mas para a criança tem um valor muito maior. Des-
a convivência com os outros sujeitos.
tacamos três tópicos importantes que conversam
Dentro desse espaço, a criança se sente pro-
com o brincar: o ambiente suficientemente bom, a tegida e pouca coisa do exterior pode interromper
transicionalidade e a criatividade. Falaremos agora o que a criança faz ou deixa de fazer dentro dele.
sobre esses conceitos winnicottianos para bem po- Maia et al (2014) afirma, a partir dos estudos fei-
dermos nos aprofundar na questão da afetividade tos sobre a teoria winnicottiana, que a criança se
nas relações corporais e brincantes sente, no espaço transicional, aconchegada, pois
O ambiente suficientemente bom é caracteri- ela “pode modificar as experiências e vivenciar a
zado por ter um adulto que transmite confiança raiva e a dor sem efetivamente atuar na realidade
e permite que se instaure um ambiente em que a externa esses sentimentos” (MAIA et al, 2014, p.
criança se sinta segura e consiga brincar de ma- 22). Quando a criança sabe que pode modificar
neira saudável (DAVIS & WALLBRIDGE, 1982). as suas experiências, mesmo que seja sem exter-
É de suma importância que o adulto proporcione nalizar, ela está sendo criativa, pois estará apta a
esse ambiente, porque só assim a criança irá se ter em si a “capacidade de produzir ideias novas”
sentir segura. Segundo Winnicott (1964, 2005), é (MAIA & VIEIRA et al, 2020, p. 146).
311 20
Winnicott, segundo Abram (2000, p. 113), pressões corporais e brincantes pode ocasionar
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A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
descreve a criatividade como “ver o mundo com problemas sérios, sendo um deles descrito por
novos olhos o tempo todo”. Sendo assim, o ato Montessori (s/d): a depressão infantil. Winnicott
criativo é inerente a cada ser humano, ainda mais (1982) também enfatiza sobremaneira a impor-
factível e perceptível para aqueles que obtiveram tância do brincar, sendo este sempre considerado
um ambiente seguro e confiável. Todos os seres como algo saudável para a criança:
humanos possuem a capacidade de serem criati-
que estimulemos a capacidade de brincar da
vos, porque a criatividade não está ligada somen- criança para que ela possa lidar com todas es-
te à área artística e tampouco pode ser ensinada sas dificuldades e não desenvolva nenhum pro-
por alguém (MAIA & VIEIRA et al, 2020), mas sim, blema grave. Porque para ele, se uma criança
deve ser encarada “como um valor social que é ne- brinca imaginativamente, ela será capaz de de-
senvolver um modo de vida pessoal e finalmen-
cessário desenvolver” (TORRE, 2005 apud MAIA
te converter-se num ser humano integral, dese-
& VIEIRA, 2020, p. 147), ou seja, a criatividade se jado como tal e favoravelmente acolhido pelo
aprimora enquanto o ser humano se desenvolve. mundo em geral, mesmo que urine na cama,
O sujeito brincante é, antes de tudo, o sujeito que gagueje, demonstre explosões de mau humor,
possui a certeza de que seu gesto espontâneo ou repetidamente sofra de ataques biliosos ou
depressão. (p.147)
dirigido ao mundo e ao outro será acolhido e sig-
nificado. O valor da autoria de pensamento e da Com a ausência do acolhimento, o fato de vi-
autonomia fica neste ser que brinca, diferente do venciar a criatividade, que “é a base do estar vivo
ser com corpo oprimido ou paralisado, fica assim e do viver a vida de forma digna” (MAIA, 2007, p.
assegurado e posto. 89), se torna difícil e acaba se direcionando para
a agressividade ou o ato antissocial (MAIA, 2007).
CONCLUSÃO Por isso, é imprescindível que esta base esteja
consolidada, principalmente no indivíduo que
Objetivando compreender a afetividade como pode viver em um ambiente, considerado por si
o cerne dos processos que ocorrem na infância mesmo, suficientemente bom, seguro e confiável.
e sobretudo no brincar, cabe destacar que esta Dessa forma, a afetividade, que de acordo
deve ser vista como uma possibilidade para o cor- com Cunha (2017, p. 19) é uma “atitude que se
po brincante emergir, principalmente no contexto reveste em um estímulo para o aprendizado, dan-
escolar. Se o corpo oprimido está presente con- do clareza e entendimento à consciência”, facilita
sequentemente a afetividade não o acompanha. a construção de vínculo entre o adulto e a criança.
A ausência de um acolhimento afetuoso das ex- Sem o afeto, não é possível constituir um ambien-
312 20
te suficientemente bom, muito menos permitir que GARANHANI, Marynelma Camargo. Concepções e
Isabella de Moraes Ribeiro - Natasha Moutinho Geada - Maria Vitória Campos Mamede Maia
A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
a comunicação aconteça de forma efetiva. práticas pedagógicas de educadoras da pequena
Portanto, reiteramos que a afetividade precisa infância: os saberes sobre o movimento corporal da
criança. 2004. 155 f. Tese (Doutorado em Psicologia)
ser o centro de todas as relações, para que o in-
- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São
divíduo se desenvolva de forma saudável e pos-
Paulo, 2004.
sa também estender esse afeto para o próximo.
No ambiente escolar, local onde são observadas DAVIS, Madeleine, WALLBRIDGE, David. Limite e es-
diferentes expressões corporais, é essencial que paço: uma introdução à obra de D.W. Winnicott. Rio de
exista um olhar de respeito do adulto para a crian- Janeiro: Imago, 1982.
ça, a considerando um sujeito de fato e de direito
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pes-
e não inferior a ele, mas que precisa sim de sua
quisa (4ª ed.). São Paulo: Atlas, 2002
presença afetiva, sua escuta e a compreensão de
seus diferentes atos corporais, já que estes refle- MONTESSORI, Maria. A criança (s. ed.). (s.l): Círculo
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Isabella de Moraes Ribeiro - Natasha Moutinho Geada - Maria Vitória Campos Mamede Maia
A AFETIVIDADE NAS RELAÇÕES CORPORAIS E BRINCANTES
do. (5ª ed.). Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
vernamental que acolhe crianças e adolescentes petência federativa. (BRASIL, 2018).
em tratamento oncológico e hematológico. Apresentamos, nesse espaço tempo, não ape-
Mediante o conhecimento da importância do nas da Classe Hospitalar (CH), mas também o
supracitado projeto para os estudantes que se en- espaço da Brinquedoteca Hospitalar. Diante dis-
contram em ambiente hospitalar, a ASEE/SEDU, so, Cunha (2011, p. 13) descreve esse ambiente
manifestou-se favorável a cessão do profissional como “um espaço criado para favorecer a brinca-
com formação específica da área de licenciatura deira” e garantindo pela lei federal nº 11.104/05
em Educação Física, para atuação neste espaço, (BRASIL, 2005), que:
a ser contratado por meio de edital.
As pesquisadoras se reúnem periodicamente Art. 1º Os hospitais que ofereçam atendimento
pediátrico contarão, obrigatoriamente, com brin-
como grupo de estudo acadêmico diante o fato que
quedotecas nas suas dependências.
todas estão incluídas em programas de mestrado
e doutorado e o campo da educação está em con- Parágrafo único. O disposto no caput deste ar-
tigo aplica-se a qualquer unidade de saúde que
sonância com a temática das três pesquisadoras.
ofereça atendimento pediátrico em regime de
Durante um desses encontros foi apresentado ao internação (BRASIL, 2005).
grupo a aprovação da lei nº 9. 221, sancionada no
Estado do Rio de Janeiro no dia 23 de Março de Isto posto, cabe ressaltar que a educação bá-
2021, que “cria o programa pedagógico hospitalar sica segue normas obrigatórias constantes pelas
destinado a crianças e adolescentes hospitaliza- secretarias estadual e municipais, com vistas ao
dos” (ALERJ, 2021). Esse direito é garantido atra- planejamento curricular das escolas e dos siste-
vés da Lei nº 13.716/ 2018, que alterou o Artº 4º da mas de ensino, norteada pela Base Nacional Co-
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional mum Curricular (BNCC). Assim como esses es-
(LDB), para assegurar “atendimento educacional paços que seguem normas específicas, as brin-
ao aluno da educação básica internado para trata- quedotecas e classes hospitalares também pos-
mento de saúde em regime hospitalar ou domiciliar suem normativas no que tange o espaço físico, a
por tempo prolongado” (BRASIL, 2018): seleção de recursos pedagógicos, a segurança,
os protocolos da Agência Nacional de Vigilância
Art. 4º-A. É assegurado atendimento educacio-
Sanitária (ANVISA), a formação e capacitação
nal, durante o período de internação, ao aluno
da educação básica internado para tratamento para atuarem nesses espaços, dentre outras.
de saúde em regime hospitalar ou domiciliar por Na linha dos ensinamentos de Freire (2003,
tempo prolongado, conforme dispuser o Poder p. 47), no sentido de que “ensinar não é trans-
322 22
ferir conhecimento, mas criar possibilidades para Sim, é devastador!
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
sua própria produção ou a sua construção”, ve- Uma luta diária com a quimioterapia, com a
radioterapia, com os fármacos e ainda as vezes
rifica-se que a utilização de diversas linguagens
precisam encarar as amputações de membros,
(corporais, verbais e artísticas) e competências a perda da oralidade, a perda da visão
específicas para que o/a aluno/a possa exercer A vida é finita, no entanto ainda é vida
codificações e significações sociais inseridos no Não só a delas, mas a minha e a sua
âmbito da cultura para uma consciência de cuida- É um choque de realidade ver a alegria repre-
sentada pelo brinquedo em meio ao silêncio, a
do de si e do outro desenvolvendo uma autono-
dor física e emocional
mia para a sua participação na sociedade. A criança brinca quando está triste
Também brinca quando está feliz
INICIANDO NOSSO DIÁLOGO... Tampouco, não deixa de ser feliz só porque
não sorri
Ancorados nos estudos de Cunha (2011), Lovi- Quando a criança sorri e brinca, seu sorriso
parece ter poderes mágicos de iluminar o brin-
saro (2011), Mattos (2018), Oliveira; Solé; Fortuna
quedo
(2010); Dantas; Castanho (2019), Brites (2020) E quando não consegue sorrir, a mágica do
enfatizamos aqui-agora, nesse tempo presente, brincar a transporta para bem longe e acolhe
que o brincar torna-se extensão do ser, inerente seu ser infantil
a condição humana e desvelado em meio a ima- Que brincar mais triste, não é?
ginação e a ludicidade. Através de estudos em Engano! Puro engano achar que o brincar pre-
cisa ter sorriso e conversa
pesquisas realizadas por capixabas que estudam
Forças físicas não são a essência do ser criança,
a temática, dentre eles, Trugilho (2003), Furley; a essência é sua totalidade, não um fragmento
Pinel (2019), Miguez (2020) percebe-se o espaço Tempo de descanso também é tempo de exis-
das CHs como um espaço de direitos que sem tência
dúvida, faz a diferença na vida escolar das crian- E na infância...
Áh doce infância do brincar!
ças e adolescentes que passam por ele, a curto
Brincando a criança se mostra ao outro e a si
ou longo prazo. mesmo
Furley (2019) nos revela um aluno enquanto Através do brinquedo percebe o mundo e pro-
sujeito de direitos, que me meio a finitude da vida, jeta-se ali enquanto ser no mundo, entregando-
precisa ser acolhido, respeito e dignamente ga- -se ao vivido
Silencia-se por vezes e divide consigo mesma
rantidos, donde:
a dor, a perda, a superação a resiliência de
A criança ou adolescente com câncer não dei- mais um dia vivido
xa de ser criança ou adolescente por ter câncer Nesse silêncio comunica-se através de gestos,
323 22
de toques, de olhares, de um sorriso preso na presente no espaço da brinquedoteca, garantindo
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
face, mas ela está ali, no espaço tempo do o componente curricular língua portuguesa. Por
brincar.
que não garantir também o componente curricular
Corporeidade, experiência e percepção indisso-
ciadas tendo o corpo como elo de existência educação física?
Corpo como possibilidade de sentidos, de Diante disso, apontamos aqui a importância e
conduta, de intencionalidade em benefício da a necessidade da pré-sença desse profissional de
expressão e de simbologia das coisas da vida e educação física para além da (in)clusão curricular,
das coisas do brincar
apenas como conteúdos. Faz-se necessário, pen-
A criança desvela-se quando brinca,
Torna-se “herói” e mesmo que tenha como es-
sarmos o aluno “na sua globalidade: corpo, cogni-
cudo e espada, apenas seu corpo e o brinque- ção, emoção, criando, agindo, vivendo, aprenden-
do, segue a batalha encarando o percurso e a do a aprender”. (LOVISARO, 2011, p. 13). Como
chegada mesmo que distante isso seria possível? O que precisamos garantir?
Ser criança é ser criança e isso deve ser res- Falamos aqui agora, da estruturação do esque-
peitado (FURLEY; PINEL, 2020, p. 225-227).
ma e da imagem do corpo para a organização do
Nesse liame, destacamos a obra de Furley; esquema corporal e da importância do desenvol-
Pinel (2020) que descrevem o espaço da brinque- vimento psicomotor para o aprendizado. As prá-
doteca hospitalar da Associação Capixaba Contra ticas psicomotoras em decorrência das funções
o Câncer Infantil (ACACCI) e salientam a inter-re- terapêutica e preventiva foram trabalhadas na
lação dos espaços da brinquedoteca hospitalar e obra Lovisaro (2011) por meio do Projeto Floresta
da classe hospitalar a partir de projetos lúdicos Encantada no qual “a unidade integradora foi ofe-
pedagógicos mediados pela contação de histórias recida pelo caráter lúdico que a investe, motivada
e ações pontuais norteados pela BNCC e conse- pela história que a compõe” (p.22).
quentemente registrado na organização curricular Destacamos que projetos como esse traba-
dos conteúdos e das atividades desenvolvidas lham o jogo dramatizado e por meio dele desen-
pelo professor e aluno. volvem atividades que potencializam o equilíbrio
Partimos da premissa que essa criança ou corporal; o equilíbrio corporal e o salto; as disso-
adolescente é um sujeito de direitos, mesmo dian- ciações dos movimentos corporais; o equilíbrio
te da finitude da vida. Direito esse, também ga- corporal nas diversas posições; a lateralidade; o
rantido pelo currículo escolar. Se atividades como equilíbrio corporal parado e oscilando; o equilíbrio
o desenvolvimento de contação de histórias e corporal e a percepção do espaço; a noção de
interpretação textual são desenvolvidas interse- volume corporal; o arremesso e precisão; o equi-
torialmente, possibilitando por meio da ludicidade líbrio, o arremesso e a precisão; o equilíbrio, a
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atenção e a coordenação; a percepção visual e de sua vivência, sejam potencializados a sua par-
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
marcha; a percepção do espaço-corporal; o reco- ticipação no lazer e na saúde. Neste caso, fica
nhecimento e representação do corpo; a ausência evidenciada a vivência da prática como geradora
e a presença do movimento corporal; o equilíbrio de novos conhecimentos sobre a cultura corporal.
corporal e ritmo; a coordenação viso-motora; a Para tanto, faz-se necessário problematizar e res-
percepção das formas; a coordenação motora, significar a cultura do corpo em movimento como
equilíbrio e autoexpressão; equilíbrio temporal, leitura e produção do indivíduo.
espaço e temporalidade; o desenvolvimento viso- O brincar espontâneo ou o brincar dirigido,
-motor; a coordenação de movimentos; a laterali- enquanto atividade lúdica envolve a oportunida-
dade; a coordenação de movimentos; o equilíbrio de da descoberta e possibilita dentre muitas, o
e presteza; o ritmo e movimento; a locomoção e desenvolvimento da coordenação motora e das
equilíbrio; as habilidades psicomotoras; as revi- habilidades cognitivas, aspectos indispensáveis
sões das coordenações motoras. para a vida adulta. Embora os estágios do desen-
No decorrer da história sociocultural, os movi- volvimento humano, dentre eles: Período sensó-
mentos corporais ganharam destaque, apontando rio (0 a 2 anos), Período das operações concretas
para estudos e pesquisas, culminando na institu- (2 a 12 anos), Período das operações formais (12
cionalização da disciplina Educação Física como anos em diante) nos aponte características a se-
componente curricular, que visa oportunizar aos rem trabalhadas, é importante destacarmos que
estudantes conhecimentos relativos aos movi- embora semelhantes cada criança possui sua in-
mentos corporais e espacialidades; desenvolven- dividualidade.
do consciência no cuidado de si e do outro, bem As fases do brincar devem ser observadas
como adquirir autonomia para apropriação da cul- mediante ao processo de maturação corpórea, do
tura corporal promovendo sua participação ativa desenvolvimento psicomotor e das relações so-
na sociedade. ciais/meio em que está inserida, na elaboração de
Portanto, conforme preconiza a Base Nacional atividades direcionadas como aliado a motivação
Comum Curricular – BNCC, o componente curri- e interesse, e não como meios de exclusão.
cular Educação Física, compreende aquisição de
saberes corporais, experiências estéticas, emo- PERCORRENDO O CENÁRIO...
tivas, objetivando a orientação e as práticas pe-
dagógicas na escola. A funcionalidade da Educa- A Brinquedoteca “é um espaço criado para
ção física está pautada em desenvolver práticas favorecer a brincadeira” (CUNHA, 2011, p. 13).
corporais que permitem que os estudantes, além Sendo assim, brincando a criança aprende a ma-
325 22
nipular, a explorar, a descobrir, a xeretar, a se Hospital da Polícia Militar (HPM) como extensão
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
relacionar, a compartilhar o brincar. Esse espaço do atendimento da CH do HINSG no espaço das
deve ser alegre, organizado, limpo, seguro, pos- enfermarias; na Associação Capixaba Contra o
suir profissionais capacitados a fim de promover Câncer Infantil (ACACCI) e no Hospital Infantil e
a inventividade. Nesse ínterim, promover ativida- Maternidade Dr. Alzir Bernardino Alves (HIMABA).
des que envolvam também o direito ao compo- Nesse liame, ressalta-se que a este atendimento
nente curricular Educação Física. Para tal, faz-se assenta-se sob a base legal da legislação Nacio-
necessário um planejamento mediante reuniões nal 13716/2018, a legislação Estadual, sendo a
multidisciplinares visto que crianças e adoles- Portaria Nº 168-R, de 23 de Dezembro 2020 e as
centes em tratamento e/ou internação hospitalar, Diretrizes operacionais para a Educação Especial
possuem peculiaridades, dentre elas: (SEDU, 2021). Portanto, cabe destacar que esse
profissional é contratado mediante edital e deve-
Os professores apontaram que, em muitos ca-
sos, têm de retomar novamente todo o conteú- rá atuar em ambos os espaços mediante plane-
do ministrado na última aula, porque a criança jamento com a equipe pedagógica perfazendo a
não obteve rendimento satisfatório em virtude, carga horária de 25 horas/semanais.
por exemplo, de medicações. Assim, não raras A Educação Física, possui uma singularidade
são as vezes em que o professor não consegue
de favorecer a expressão corporal, as quais evi-
avançar com o conteúdo, tampouco lecionar o
que planejou para o dia. Além disso, os docen- denciam-se nas multiplicidades de sentidos e sig-
tes da classe têm ciência de que é preciso rea- nificados dos grupos sociais, sendo manifestada
lizar uma triagem antes de iniciar o atendimento como cultura corporal que possibilita articulação
dos alunos internados para avaliar se é possí- com área da Linguagem cultural favorecendo o
vel dar continuidade ao conteúdo ou retornar a
desenvolvimento da leitura e escrita.
matéria que foi dada anteriormente (MIGUEZ,
2020, p.127). Atividades pedagógicas teóricas aliadas ao
uso dos Recursos tecnológicos (RTs) permitem
Assim sendo, as atividades a serem desenvol- uma aproximação (maior) entre professor e aluno
vidas pelo professor de educação física na brin- no contexto hospitalar, proporcionando ao profes-
quedoteca hospitalar devem ser pensadas para sor práticas inovadoras através de instrumentos
um dia, com início, meio e fim. Vale ressaltar que digitais como celulares, computadores e outros
além da brinquedoteca, temos as classes hospi- favorecendo a prática pedagógica inclusiva.
talares no Estado do Espírito Santo (ES) locali- Corroborando com Oliveira, Solé, Fortuna
zadas nos hospitais da grande Vitória: no Hospi- (2010, p.17) que enfatizam o brincar com o ou-
tal Infantil Nossa Senhora da Glória (HINSG); no tro, o brincar com os pares, e brincando somos
326 22
envolvidos pelo aprendizado, onde “[...] aprender origem, isso é inclusão, é pertencimento.
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
supõe, portanto, trocar ideias, discutir, investigar, O adoecimento representa para a criança a
criticar, perceber que há varias formas, diferentes penetração compulsória em um estranho mundo
meios de se chegar a um fim, descobrir a riqueza asséptico: o hospital. Em contrapartida, a libe-
de usar a imaginação e criar algo e também para ração deste mundo, sinaliza pela alta hospitalar,
se enfrentar desafios. [...]”. aciona o medo do enfrentamento da condição de
Nestes termos, jogos e brincadeiras possibili- normalidade (ORTIZ; FREITAS, 2002, p.1 apud
tam uma construção coletiva no estabelecer cri- DANTAS, CASTANHO, 2019, p.41). Dessa ma-
térios específicos para momentos e grupos cultu- neira, ser professor de Educação Física em Clas-
rais diversos, o que vêm enriquecer o patrimônio se e Brinquedoteca Hospitalar requer humaniza-
cultural ao ter conhecimento das brincadeiras e ção, requer humanizar, dando condição humana
jogos populares. Essa proposição desenvolvida a uma situação posta que por vezes, está centra-
em ambiente hospitalar coaduna com a proposta da na cura.
desenvolvida no âmbito escolar. Quando esse ser-professor é incluído não é
A utilização Tecnologia Assistiva (TA), também apenas mais um professor, não é apenas mais
é um recurso que pode ser utilizado pelo professor um componente curricular que está sendo inseri-
de Educação Física como ferramenta pedagógica do ao espaço escolar, seja ele formal ou extra-es-
no processo de ensino-aprendizagem. As tecno- colar. Desejamos apresentar um ser de relações
logias assistivas são dispositivos, equipamentos, que sustenta um saber transversalizado por um
recursos, estratégias, metodologias, práticas e currículo rizomático que, como raízes se retroali-
serviços, tem como finalidade promover a aplica- mentam por meio de múltiplas conexões nas rela-
bilidade, relativa à participação e à atividade e da ções socioeducativas. Lima; Brito (2012) pontuam
pessoa com deficiência ou com mobilidade redu- o currículo como rizoma, quando ele é “aberto e
zida, visando à sua independência, autonomia, múltiplo, não possui ponto de partida e nem de
qualidade de vida e inclusão social. chegada, mas, múltiplos “nós” de conexão, numa
Isto posto, com a interlocução setorial em um teia de mestiçagem, um emaranhado de saberes,
trabalho pedagógico multi (disciplinar) as autoras cujo poder é plural, diluído em toda a parte”. Esse
do projeto pensam ser possível estabelecer um currículo nos permite enquanto pedagogos, pro-
currículo que garanta a pré-sença desse profis- fessores, educadores a abertura para as experi-
sional para além da (in)clusão curricular, garantin- ências vividas, a abertura para a escuta, a abertu-
do também a integralidade no que tange ao retor- ra para a humanização curricular.
no desse aluno da educação básica a escola de Diante da fragilidade vivenciada, o jogo, o brin-
327 22
quedo e o brincar tornam-se não apenas instru- a inclusão da disciplina no Plano de Desenvolvi-
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
mentos culturais de linguagem, mas de (re)signifi- mento Institucional (PDI) da classe hospitalar da
cação corpórea por meio de uma relação eu-cor- instituição e garantindo o acesso ao currículo por
po e eu-mundo. Nesse emaranhado de (re)signifi- meio da ludicidade.
cações esse corpo atingido pelo câncer, também
percebe a perda de sua vivacidade motriz. Nesse REFERÊNCIAS
contexto, de saúde, brincar e inclusão evidencia
a necessidade do desenvolvimento de projetos BRASIL. Base Nacional Comum Curricular/Minis-
tério da Educação. Secretária de Educação Básica.
e atividades que envolvam as interlocuções se-
Diretoria de Currículos e Educação Integral. Brasília:
toriais, desde o professor de educação física, o
MEC, 2017.
brinquedista, o professor da classe hospitalar, o
fisioterapeuta, a família e o ser brincante. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular/Ministé-
rio da Educação. Lei Nº 13.716, de 24 de setembro de
CONCLUSÃO 2018. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996
(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
A observação nos revela a importância da
CUNHA, Nylse Helena Silva. Brinquedoteca: Um
presença do profissional de educação física pela
mergulho no brincar. São Paulo: Aquariana, 201.
competência no desenvolvimento de ativida-
des que possibilitam o desenvolvimento da psi- DANTAS, Márcia Alves Simões; CASTANHO, Marisa Ire-
comotricidade tão necessária ao longo de nos- ne Siqueira. Psicopedagogia nos (com)textos hospi-
sa existência, seja para falar, andar, melhorar a talares e de saúde. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2020.
autoestima na compreensão do limite do corpo,
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes
habilidades sociais e emocionais desenvolvidas
necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Ter-
através do jogo funcional, jogo construtivo, jogo
ra, 1996.
faz-de-conta, jogo de formas com regras, visando
o desenvolvimento integral do estudante. Tam- FURLEY, Ana Karyne Loureiro; PINEL, Hiran. Por uma
bém possibilita por meio de jogos e brincadeiras fenomenologia do brincar. Curitiba: Appris, 2020.
a interação entre os pares nos espaços extraes-
LIMA, Tatiane de Lucena; BRITO, Luzia Maria de Aze-
colar, uma vez que esta temática emerge da cul-
vedo. O currículo como teoria rizomática do conheci-
tura popular. Conclui-se que projetos como esse
mento na prática da educação on line. Anais XVI Co-
possibilitam a presença do profissional de educa- lóquio Internacional Educação e Contemporanei-
ção física em espaço extraescolar, favorecendo dade. São Cristovão- SE. 2012.
328 22
LOVISARO, Martha. A psicomotricidade aplicada na
Luiza Elena Candido de Almeida - Sirlei Anacleto Martins - Ana Karyne Loureiro Furley
BRINCANDO COM PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NAS BRINQUEDOTECAS E CLASSES HOSPITALARES: A (PRÉ)SENÇA PARA ALÉM ...
escola: guia prático de prevenções das dificuldades
de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2011.
INTRODUÇÃO
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337
INTRODUÇÃO
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
o físico, o cognitivo e o social, isto é, desenvolve
o sujeito como um todo. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, do tipo
Desta forma, os jogos são recursos metodoló- exploratória e descritiva. O trabalho foi realiza-
gicos de grande relevância para ajudar o media- do em um hospital pediátrico, especificamente na
dor no processo de construção do conhecimento. Unidade de Terapia Renal Substitutiva. O estudo
Construir jogos não é uma tarefa fácil, requer todo se deu com a participação de 15 pacientes com a
um planejamento acerca dos objetivos que corro- idade de 1 a 18 anos.
boraram com a aprendizagem. Foram construídos cinco jogos que contribuí-
A utilização do lúdico como recurso para o ram para o atendimento pedagógico realizado na
atendimento pedagógico possibilita que a criança unidade acima citada. Para realização da pesqui-
sa foi necessário estreitar a relação com os pa-
e/ou adolescente aprenda de uma forma menos
cientes da Unidade de Terapia Renal Substitutiva
rígida, e sim mais tranquila e prazerosa, possibili-
por meio da observação participativa, que acon-
tando o alcance dos diversos níveis do desenvol-
teceu, de segunda a sexta-feira, durante um perí-
vimento. Cabe assim, uma estimulação por parte
odo de aproximadamente uma hora. A estagiária
do adulto para a criação de ambiente que favore-
de pedagogia propunha atividades lúdicas aos
ça a propagação do desenvolvimento infantil, por
pacientes ligados à máquina de hemodiálise para
intermédio da ludicidade (RIBEIRO, 2013).
realização do procedimento.
Desta forma, este trabalho tem como objetivo
Somente após dois meses de convivência es-
demonstrar a importância de construção e utiliza- treitaram-se os laços entre a estagiária e os pa-
ção dos jogos para o atendimento pedagógico na cientes. O que permitiu que as atividades lúdicas
Terapia Renal Substitutiva. fossem trabalhadas de forma eficaz. Todas as
A presença de um profissional da educação no atividades desenvolvidas pela estagiária foram
ambiente hospitalar pode favorecer aos pacien- planejadas a priori, e não foram utilizados apenas
tes no que tange os aspectos sociais e cogniti- jogos construídos para fins pedagógicos, várias
vos, pois estes não se contentaram apenas com atividades foram desenvolvidas para ajudar no
os materiais lúdicos industrializados, mas criaram desenvolvimento desses pacientes, como conta-
seu próprio material, levando em consideração as ção de histórias, brincadeiras, datas comemora-
questões da realidade que se encontra o pacien- tivas e outros. Para coleta dos dados foram re-
te, permitindo assim para facilitar a aquisição de alizados registros internos por meio de relatórios
conhecimento do paciente. mensais realizados no período de 12 meses entre
o ano de 2019 a 2020.
339 24
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ção, e na aprendizagem escolar (como na es-
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
crita, leitura, interpretação de texto e contexto,
As atividades lúdicas foram utilizadas como resolução de operações matemáticas, sistemas
recurso para aproximação dos pacientes da Uni- numéricos, raciocínio lógico, noção espacial, en-
dade de Terapia Renal Substitutiva (TRS). A prin- tre outros). Doravante, sendo necessário realizar
cípio as crianças e adolescentes apresentavam atendimentos pedagógicos para estimular e re-
vergonha, timidez, tristeza, traumas sociais e/ou forçar essas carências.
escolares. Por esses motivos muitos tinham re- É importante salientar que muitos desses
sistência em conversar um com os outros na sala atrasos cognitivos ou de aprendizagem escolar
durante o tratamento e com os multiprofissionais ocorrem devido à falta estimulação em casa, de-
que trabalhavam no setor. sinteresse em comparecer na escola ou dar se-
A partir dessa observação alguns jogos indus- guimento aos estudos, problemas familiares ou
trializados foram oferecidos (jogo da memória, relacionados a patologia. Cada paciente tem sua
dominó diversos, cara a cara, entre outros) para singularidade relacionada a dificuldades, tem-
estreitar a relação entre a estagiária de pedago- po e jeito de aprender e o lúdico foi fundamental
gia e os pacientes. Desta forma, essa interação para que tivessem o encantamento e o prazer em
tinha o objetivo de aproximar e criar um vínculo de aprender e que não se perdessem a ludicidade
confiança entre os pares. Os jogos duravam para introduzida desde o início da interação.
cada atendimento cerca de 15 a 20 minutos. Com Pensando nisso, foram criados e construídos
o tempo, após esse contato individual passou-se jogos para utilizar nos atendimentos pedagógicos
a ter atividades lúdicas coletivas para que hou- para isto foram levados em consideração a idade,
vesse a interação de todos. Vale ressaltar que as a dificuldade escolar, o desenvolvimento cogniti-
idades dos pacientes variam, bem como o nível vo, a condição física e emocional. A partir desses
cognitivo, sendo necessário realizar adaptações critérios estabelecidos para criação dos jogos, fo-
para que todos participem das brincadeiras. ram planejados cinco jogos.
Após dois meses de convivência com os pa- O primeiro jogo confeccionado foi denomina-
cientes, estes já demonstravam maior abertura na do “Colheres de Aprendizagem” que foram cria-
relação interpessoal, os mesmos conversavam, se das para ajudar os pacientes que apresentavam
animavam para comparecer e realizar o tratamento. dificuldades em reconhecer o alfabeto, sílabas
Percebemos no período de observação que simples e complexas e os números; cores secun-
os pacientes apresentavam algumas dificulda- dárias e primárias. Este jogo foi aplicado aos pa-
des cognitivas, na linguagem, memória e aten- cientes a partir de 4 anos.
340 24
desenvolver também o raciocínio lógico, mas isto
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
apenas para pacientes a partir de 08 anos.
O nível de dificuldade era variável de acordo com
cada participante. Foi observado que os pacientes
com idade superior a 7 ou 8 anos apresentavam
as mesmas dificuldades que os pacientes menores
quando utilizavam as operações de multiplicação
e divisão. Nesse caso, foram reforçadas as opera-
ções de maior dificuldade, trabalhando individual-
mente para que o paciente pudesse ter o seu tem-
po e pudesse tirar as dúvidas para aprender sem
timidez e vergonha independente da resposta. Este
Figura 1 – Jogo Colheres de Aprendizagem
jogo em especial, foi um dos prediletos dos pacien-
tes, apesar de precisarem de várias partidas para
Neste jogo os pacientes demonstravam ani- finalizar o jogo, a dificuldade intrigava os pacientes
mação e curiosidade pois a cada conteúdo, as e isto deixava a brincadeira interessante.
Colheres de Aprendizagem eram confecciona-
das de acordo com a necessidade sendo usado
como jogo da memória; jogo palavra secreta que
compara entre figuras-palavras/sílabas, além de
usar as colheres em canções como “Abecedário
da Xuxa”, “Patinho Tuga - Os números”, “Mundo
Bita - Magia das cores” e outros.
O segundo jogo criado foi o “Picolés da Mate”
planejado para pacientes com idade a partir de 6
anos. Para confecção foram utilizados palitos de
picolé que contém na sua estrutura as quatro ope-
rações matemáticas em que o jogador terá como
Figura 2 – Jogo Picolés da Mate
objetivo vender mais picolés. Porém o jogo não
é tão simples quanto parece, existem níveis de O outro jogo criado foi o “Dados da Leitura” em
dificuldade com relação a operação que está dis- que o paciente joga os dois dados, um dos dados
tribuído nos palitos de picolé. A intenção do jogo é possuía diferentes cores e o outro dado era tradi-
341 24
cional, assim que joga o dado e obtém o resultado, vel os níveis de dificuldade alternavam e o resul-
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
é necessário transferir a resposta na tabela e ler a tado foi satisfatório. Havia leitura das palavras e
palavra sorteada. Existem dois níveis de dificulda- sempre sugeria formular frases para incentivar na
des e estão relacionadas ao tipo de escrita, havia escrita e na leitura.
palavras escritas em bastão e outras em cursiva. O Vale destacar que no período de permanência
jogo foi planejado para pacientes a partir de 7 anos na Terapia Renal Substitutiva alguns pacientes re-
de idade, principalmente para os que precisavam alizaram transplante e tiveram alta do tratamento,
de reforço na escrita e na leitura de palavras. surgindo outros pacientes, mas dessa vez eram
pacientes menores de 4 anos de idade. A partir
daí foi necessário planejar alguma atividade lúdica
para ser desenvolvida com essa nova realidade.
O quarto jogo criado foi o “Pote da Calma”,
este pote foi confeccionado para crianças de 1
a 5 anos, é uma ferramenta proposta no método
Montessoriano que tem a função de acalmar as
crianças quando estão em momentos de choro,
birras e agitações. Durante o tratamento, essas
crianças tendem a ficar estressadas, com medo,
Figura 3 – Jogo Dados da Leitura inquietas e que acabam chorando e ficando
agressivas quando um profissional de saúde se
Este jogo era utilizado em momentos diferen- aproxima para realizar algum procedimento.
tes, no primeiro momento os pacientes tinham Quando é oferecida essa ferramenta a crian-
mais dificuldade em ler as palavras escritas em ça fica mais tranquila, pois o glitter, os objetos
letra cursiva. Alguns adolescentes não conse- coloridos dentro do pote, prendem a sua aten-
guiam ler palavras que continham sílabas com- ção. Enquanto observam o objeto, a respiração
plexas, apenas as palavras que tinham figuras e o temperamento da criança se alteram, além
eram possíveis obter uma resposta. Semanal- de ajudá-la a regular suas emoções. O Pote da
mente o “dado da leitura” era utilizado para aju- Calma pode proporcionar benefícios aos pacien-
dar esses pacientes que tiveram dificuldade na tes em tratamento na TRS, já que estimula a
leitura das palavras. atenção e isso faz com que a criança aos pou-
Com o passar do tempo, foi possível perceber cos se desconecte daquilo que está causando
uma melhora ao utilizar o jogo, sempre que possí- irritação ou agitação.
342 24
Uma brincadeira muito conhecida mundial- vo. Cada etapa está relacionada a um tipo de ati-
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
mente que se chama “Esconde/achou” em que o vidade lúdica que se sucede da mesma maneira
bebê é desafiado a lembrar quem está escondido para todos os indivíduos.
e a esperar que a pessoa se revele, é um jogo No decorrer da atividade lúdica o paciente pre-
muito divertido que pode ser realizado utilizando cisa de concentração para realizá-la. Muitas das
a ferramenta “pote da calma”, assim é só usar a vezes, no atendimento pedagógico poucos dos
criatividade para esconder. pacientes atendidos tendem a ter dificuldade em
O quinto e último jogo construído foi o “Saco prestar atenção, mas os que têm, sempre é algo
Sensorial”, é um tipo de estimulação que auxilia relacionado ao ambiente que estão inseridos pois
os sentidos sensoriais internos e externos das contém muitas pessoas, conversas paralelas, som
crianças. Foram confeccionados dois sacos sen- da televisão que acabam levando a distrações, de-
soriais que continham objetos para reforçar os sentendimento e prolongação nas atividades.
quatro sentidos: olfato, audição, visão e tato. O uso do brinquedo/jogo educativo com fins pe-
Nesta brincadeira é possível estimular a coor- dagógicos remete-nos para a relevância desse ins-
denação motora fina enquanto a criança manipula trumento para situações de ensino-aprendizagem
os sacos sensoriais, além de desenvolver a con- e de desenvolvimento infantil. Se considerarmos
centração contribuindo para o desenvolvimento que a criança pré-escolar aprende de modo intui-
neurológico. Foram utilizados para pacientes de tivo adquire noções espontâneas, em processos
8 meses a 5 anos. interativos, envolvendo o ser humano inteiro com
Em todas as atividades lúdicas desenvolvidas cognições, afetivas, corpo e interações sociais, o
na TRS, a estagiária de pedagogia esteve pre- brinquedo desempenha um papel de grande rele-
sente e foi a mediadora para que todos os objeti- vância para desenvolvê-la” (KISHIMOTO, 1997)
vos dos jogos fossem alcançados. Por fim, ao longo do atendimento pedagógico,
Na Unidade de Terapia Renal Substitutiva, há houve vários momentos em que foi trabalhado a
uma variação de quatro a cinco atendimentos de função executiva, uma habilidade cognitiva que
pacientes por dia. Cada paciente era atendido in- permite controlar e regular pensamentos, emoções
dividualmente ou quando havia uma oportunidade e ações. Friedmann (1996), afirma que é necessá-
era proposto uma interação coletiva. No decorrer rio dar atenção especial ao jogo, pois as crianças
da atividade alguns pacientes demonstraram difi- têm o prazer de realizar tarefas através da ludicida-
culdades em manter o foco no jogo. de. E quando isto acontece vive o mundo imaginá-
Para Piaget (1973), ludicidade é a manifesta- rio e assim se afasta da sua vida habitual.
ção do desenvolvimento da inteligência que está O jogo é instrumento de grande importância
ligada aos estágios do desenvolvimento cogniti- para aprendizagem no desenvolvimento infantil,
343 24
pois se a criança aprende de maneira espontânea, criatividade, assim, o jogo contribui para a aquisi-
Viviane Lima dos Santos - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
CONSTRUÇÃO DE JOGOS PARA O ATENDIMENTO PEDAGÓGICO NA TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA
o brinquedo passa a ter significado crucial na for- ção de conhecimento.
mação e na aprendizagem (KISHIMOTO, 1997).
REFERÊNCIAS
CONCLUSÃO
FRIEDMANN, A. Brincar: crescer e aprender. O res-
O objeto deste estudo foi a construção de jo- gate do jogo infantil. São Paulo: Moderna, 1996.
gos para atendimento pedagógico na Unidade de
Terapia Renal Substitutiva que contribuíram no FROTA, M.A.; VASCONCELOS, V.M.; MACHADO,
desenvolvimento cognitivo e social, além de aju- J.C.; LANDIN, F.L.P.; MARTINS, M.C. [Life quality
dar na aquisição de conhecimento dos pacientes. of children with chronic renal failure]. Esc Anna Nery
O jogo pode possibilitar a aprendizagem, esti- [Internet]. 2010;14(3):527-533. Available from: http://
mular a criatividade, o raciocínio, a socialização www.scielo.br/ pdf/ean/v14n3/v14n3a14 Portuguese.
e interação dos envolvidos. Além disso, por meio
KISHIMOTO, T.M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a
dos jogos é possível que a criança e/ou adoles-
educação. São Paulo: Cortez, 1997.
cente tenha uma dimensão de tempo, quantida-
de e compreensão da sequência, servindo como PIAGET, J. A formação do símbolo na criança. 3ª
equilíbrio entre a realidade que a criança está in- ed. Rio de Janeiro: ed. Zahar, 1973.
serida e o mundo imaginário.
Desta forma, a criação de jogos para ser utili- RIBEIRO, Suely de Souza. A Importância do Lúdico
zado em atendimentos pedagógicos não é uma no Processo de Ensino-Aprendizagem no Desen-
tarefa fácil. Precisa-se conhecer a realidade do volvimento da Infância. 2013. Disponível em:https://
paciente e quais as dificuldades que precisam ser psicologado.com/atuacao/psicologia-escolar/a-importan-
trabalhadas para ajudar na sua aprendizagem. cia-do-ludico-no-processo-de-ensino-aprendizagem-no-
No ambiente hospitalar pediátrico o profissional -desenvolvimento-da-infancia. Acesso em: 22 jun. 2021.
que constrói jogos pode demonstrar ao paciente
SCHULTZ, S.; MULLER, Cristiane; DOMINGUES, A.A
que há uma preocupação com suas necessida-
ludicidade e as suas contribuições na escola. Jornada
des, que não é apenas um jogo industrializado e Educação. Centro Universitário Franciscano. C3, v.
que será utilizado sem um fim específico, pelo 87, p. C3, 2006.
contrário, existe uma valorização por parte dos
pacientes para com que está sendo proposto. UEHARA, E.; LANDEIRA-FERNANDEZA, J. Um pano-
A construção e utilização de jogos no ambien- rama sobre o desenvolvimento da memória de traba-
te hospitalar possibilita desenvolver habilidades, lho e seus prejuízos no aprendizado escolar. Ciência
além da imaginação, espontaneidade, atenção, e Cognição, Rio de Janeiro, v. 15, n.2, ago. de 2010.
344
INTRODUÇÃO
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
http://desidades.ufrj.br/wp-content/uploads/Desida-
des-6-PORT2.pdf. Acesso em 24 abril 2021.
INTRODUÇÃO
Em ‘Brincar para Todos’, material produzido Reiterando a importância do olhar para a infân-
pelo Ministério da Educação, é reforçada a im- cia já nos primeiros meses de vida e compreen-
portância da brincadeira, sendo esta considerada dendo o brincar como essencial no processo de
“a vida da criança e uma forma gostosa para ela formação humana, o trabalho aqui apresentado
movimentar-se e ser independente. Brincando, a busca compartilhar essas perspectivas. E o guia
criança desenvolve os sentidos, adquire habilida- mais precisamente, visa atingir a este público de
des para usar as mãos e o corpo, reconhece obje- mães, pais e acompanhantes que por vezes des-
tos e suas características, textura, forma, tamanho, conhecem a importância de tais interações jun-
cor e som”. Ao brincar, “a criança entra em contato to a seus bebês ou até mesmo não se sentem
com o ambiente, relaciona-se com o outro, desen- confiantes para conduzir tais práticas. A intenção
volve o físico, a mente, a auto-estima, a afetivida- é ter um material instrucional, porém contar com
de, torna-se ativa e curiosa”(SIAULYS, 2005). o aporte profissional da equipe de saúde para a
Kishimoto (2010) além de colocar o brincar mediação e orientação adequados, sendo o guia
como algo que a criança gosta, destaque o fato (Figura 1) uma referência e estímulo para esta
de que brincar é também um de seus direitos e prática do brincar com o bebê de 0 a 18 meses.
reforça que:
373 28
a oportunidade de desenvolver um material nesta
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
ANTONOVSKY, Aaron. Unraveling the mystery of STEINER, Rudolf. A pratica pedagógica: segundo
health: how people manage stress and stay well. San o conhecimento cientifico-espiritual do homem. 2 ed.
Francisco: Jossey-Bass, 1987. São Paulo: Antroposófica, 2013.
INTRODUÇÃO
tar nesta ordem sequencial e também podem ser Narizinho = Narizinho é uma per-
sonagem fictícia da obra Sítio do
encontrados com outros nomes, sendo: Picapau Amarelo de Monteiro Lo-
bato, criado em 1920 no livro da A
Menina do Narizinho Arrebitado.
Etapa 1: A preparação: O Inocente – O Órfão Chama-se Lúcia, tem 7 anos, mas é
– O Guerreiro – O Caridoso conhecida mesmo como Narizinho, e
ganhou esse apelido por conta de seu
Etapa 2: A Jornada do Herói: O Explorador – O
nariz arrebitado. Mora com sua vovó
Destruidor – O Amante – O Criador e tia Nastácia no Sitio.
393 31
INTRODUÇÃO
Patrícia Lamounier Rêgo - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
O BRINCAR NO AMBIENTE HOSPITALAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOS BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE PARA A CRIANÇA COM LONGO ...
nar mudanças, principalmente no ambiente hos- litativa, do tipo relato de experiência. Foi utiliza-
pitalar, sendo um catalisador no tratamento da do como instrumento metodológico a observação
criança durante sua hospitalização. Neste sen- participativa e os registros internos dos momen-
tido, o ato de brincar proporciona recursos para tos de interação entre a paciente e a pedagoga.
elaborações afetivo-cognitivas que podem auxi-
liar na saúde psicológica da criança hospitaliza- BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE NA HOSPI-
da. Esses benefícios se dão devido à modificação TALIZAÇÃO INFANTIL
do cotidiano e da rotina hospitalar, refletindo no
humor e na diminuição do estresse durante sua Devido a condição da paciente que se en-
estadia no local (ÂNGELO E VIEIRA, 2010) contrava no leito de isolamento em decorrência
Este trabalho tem o objetivo de relatar os be- do tratamento de saúde, não podia sair para na
nefícios da ludicidade para a criança com longo brinquedoteca da internação. De acordo com a
período de hospitalização. resolução nº41/95 dos Direitos da Criança e do
Entender que a alegria é uma sensação saudá- Adolescente Hospitalizados, toda criança tem o
vel, pois o sentimento de felicidade provoca a ma-
direito de usufruir de alguma forma de recreação
nifestação de potencialidades, desperta coragem
no ambiente hospitalar, por isso as brincadeiras
para enfrentar desafios e motivação para criar um
e brinquedos são essenciais e obrigatórios nesse
fator imprescindível para a operatividade. Com o
processo de hospitalização.
brincar as crianças e os adolescentes hospitaliza-
Percebendo a necessidade de brincar dessa
dos podem ter momentos mais alegres, o que é um
criança, foram oferecidos brinquedos no leito.
fator positivo para a recuperação (CUNHA, 2008).
Com o passar do tempo, os brinquedos estavam
voltando da mesma forma que eram entregues,
MÉTODO
ou seja, a paciente não tocava e nem se interes-
O trabalho foi realizado em um hospital público sava pelos brinquedos que estava recebendo.
pediátrico, na cidade de Brasília - DF, ao perce- Foi necessário antes de qualquer estratégia e/
ber a situação de uma paciente do sexo femini- ou planejamento estreitar a relação entre a pacien-
no, com 7 anos de idade, que devido à introdução te e a pedagoga, nos primeiros encontros, ocor-
de uma nova medicação experimental, teria um riam apenas conversas para entender quais eram
longo período de permanência. Isso se deu nos suas preferências, como era sua rotina fora do
meses de fevereiro, março e abril de 2021, diaria- hospital, além de buscar informações como: quais
mente no turno matutino. jogos gosta, o que gosta de fazer em casa, com
401 32
quem gosta de brincar e outros assuntos que fo- demonstrava mais alegria, interesse, dinamismo,
Patrícia Lamounier Rêgo - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
O BRINCAR NO AMBIENTE HOSPITALAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOS BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE PARA A CRIANÇA COM LONGO ...
ram surgindo, porém, as respostas eram sucintas. comunicação, abordando sobre vários assuntos,
Com o tempo a paciente começou a abrir-se entre eles o gosto pelos animais, e em conhecer
ao diálogo e informou quais os seus principais in- novos jogos, porque gostava de aprender. Gos-
teresses com assuntos referentes a jogos, dese- tava de mostrar alguns vídeos que ensinavam
nhos favoritos, vídeos que ensinavam a desenhar como desenhar.
e outros. A partir daí a pedagoga elaborou uma Assim, o brincar funciona como um espaço de
estratégia para utilizar a ludicidade como princi- socialização e interação com outros indivíduos, per-
pal ferramenta para minimizar os efeitos negati- mitindo a criação de uma rede social e a possibilida-
vos que a internação estava causando à criança. de de sair do isolamento que a internação provoca.
Outro fator observado foi a condição física, emo- Tem grande importância na socialização da criança,
cional e educacional, bem como o espaço físico pois é brincando que o ser humano se torna apto a
que estava internada. viver numa ordem social e num mundo culturalmen-
Durante esses momentos de conversa, ofere- te simbólico (ÂNGELO E VIEIRA, 2010).
cia brinquedos e jogos, mas a paciente se mos- A partir do momento que tanto os pais quanto
trava sempre quieta, indisposta ou não estava à a equipe multiprofissional perceberam mudanças
vontade para conversar. Após muita insistência a positivas na condição física e emocional da pa-
paciente resolveu aceitar brincar, porém a brin- ciente, e que isso se deu com a inserção do brin-
cadeira não durava muito tempo, pois a paciente car no dia-a-dia da criança, ou seja, os momentos
logo sinalizava cansaço. de brincar acarretaram benefícios significativos
As semanas foram passando e a mãe da pa- no tratamento dessa paciente. E isto foi perceptí-
ciente comentou que percebia a filha mais dis- vel após a equipe multiprofissional avaliar a pos-
posta principalmente no período vespertino, sen- sibilidade de continuar o tratamento na sua casa,
do que a própria criança perguntava quando iria sendo que no início da internação não havia uma
brincar de novo, com a mãe ou com a pedagoga. previsão de alta hospitalar para a criança.
Um certo dia houve uma grande surpresa, É importante destacar que os jogos utilizados
pois, a criança estava arrumada usando uma tia- nas visitas foram estabelecidos conforme as solici-
ra na cabeça, usava batom, sombra nos olhos, tações da paciente, como: dominós (tradicional, das
entusiasmada e disse: “estou pronta para jogar, e sombras, frutas e verduras, dos animais), jogos da
eu vou ganhar tudo” e o mais importante ela esta- memória, Pizzaria Maluca, era seu preferido, Cara
va sentada na mesa e bem-disposta para iniciar a a Cara, Genius, Imitatrix, Batata Frita, quebra-cabe-
brincadeira. A partir daí, era nítido que a paciente ças com diferentes tamanhos e imagens.
402 32
mento adequado do processo e de acordo com
Patrícia Lamounier Rêgo - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
O BRINCAR NO AMBIENTE HOSPITALAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOS BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE PARA A CRIANÇA COM LONGO ...
as necessidades e características do paciente.
O jogo nessa ocasião ofereceu oportunidade de
mais interação, tranquilidade e confiança de que
o tratamento estava dando certo, e foram muitos
relatos acerca da positividade que os momentos
de recreação estavam proporcionando.
Além dos jogos foram disponibilizados mate-
riais como massinha de modelar, balões, folhas
para desenhar, desenhos para colorir e outros que
ficavam à disposição para que fossem utilizados
conforme a vontade e criatividade da criança. As
massinhas de modelar com forminhas de animais
e criar desenhos eram seus momentos preferidos,
pois podia enfeitar o quarto com suas atividades.
Figura 1 – Jogos utilizados nas primeiras visitas com a paciente Assim, para Paula et al. (2007), os brinquedos
devem estimular a curiosidade, a imaginação, de-
Foi percebido que durante a brincadeira com senvolver as capacidades que as crianças podem
os jogos preferidos ela conseguia se abrir para apresentar e explorar seus sentidos.
falar das brincadeiras que mais gosta, das comi- Os jogos são recursos que despertam as fun-
das preferidas e situações vivenciadas no seu ções cognitivas colocando-as em atividade, pois
dia-a-dia. Por exemplo, ao brincar com o jogo de faz parte do jogo a competição, o ganhar e o per-
pizzaria maluca, ela confidencia que adora comer der, o obedecer às regras direcionadas. Podem
pizza, mas que apenas pode comer o que a mãe ser adaptados de acordo com a realidade social
faz. O tempo da brincadeira sempre era respeita- de cada indivíduo, o ambiente que se encontra
do a disposição e vontade pelo brincar da criança, e tem aqueles que se mantêm inalterados desde
caso se sentisse cansada a brincadeira era en- sua origem até os dias de hoje. Para Visca (1996),
cerrada e combinamos para o próximo dia. as operações exigidas nos jogos não são distintas
Weiis (2015) diz que o jogo é usado no traba- das requeridas na vida cotidiana e consequente-
lho terapêutico em diferentes situações, em di- mente das que se estimulam nos tratamentos, por
versas faixas etárias de pacientes, da criança ao isso que os jogos são tão úteis para o desenvolvi-
adulto ou idoso. O importante é o seu uso no mo- mento e a recuperação.
403 32
tivamente no tratamento de saúde, proporcionan-
Patrícia Lamounier Rêgo - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
O BRINCAR NO AMBIENTE HOSPITALAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOS BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE PARA A CRIANÇA COM LONGO ...
do benefícios e mantendo o vínculo com a vida
que ocorre fora do hospital. Outros benefícios
estão relacionados ao desenvolvimento físico,
de habilidades e coordenação, além de propi-
ciar imaginação, criatividade, memória, identificar
suas emoções e assumir o ponto de vista do ou-
tro, entre outros pontos positivos.
CONCLUSÃO
Patrícia Lamounier Rêgo - Wilka Lara da Silva Rocha - Suely Nascimento de Lemos
O BRINCAR NO AMBIENTE HOSPITALAR: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOS BENEFÍCIOS DA LUDICIDADE PARA A CRIANÇA COM LONGO ...
com a equipe multiprofissional. o direito de brincar, seu funcionamento e acervo. In:
Portanto, podemos afirmar que a ludicidade CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 7.; En-
contro Nacional sobre atendimento Escolar Hospitalar,
é fundamental para o bem-estar da criança, pois
5., 2007, Curitiba. Anais. Curitiba: Educere, 2007. p.
por meio deste ocorreu resultados positivos em
1399-141. Disponível em: http://www.pucpr.br/eventos/
relação ao tratamento, ou seja, ficou nítido que o
educere/educere2007/anaisEvento/arquivos/CI-195-
momento de brincar foi o mais esperado pela pa- 12.pdf. Acesso em: 27 de maio de 2021.
ciente. Foram momentos de descontração e pra-
zer melhorando a qualidade de vida da paciente VISCA, Jorge colaboracion Tuli Visca. Introduccion a
no ambiente hospitalar. lon juegos lógicos em El tratamento psicopedagó-
gico – su historia, reglas y significado psicopedagógi-
co. Buenos Aires: Arg., 1996.
REFERÊNCIAS
WEISS, Maria Lucia Lemme. A Intervenção Psicope-
ÂNGELO, T.S., VIEIRA, M.R.R. (2010). Brinquedoteca
dagógica nas Dificuldades de Aprendizagem Esco-
hospitalar: da teoria à prática. Arquivos de Ciências
lar. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2015.
da Saúde (Online), 17(2), 84-90. Recuperado em 01
de junho, 2014, de http://repositorio-racs.famerp.br/ PÉREZ – RAMOS, Aidyl M.; OLIVEIRA, Vera Barros
racs_ol/vol-17- 2/IDO4_%20ABR_JUN_2010.pdf de. (Org.) Brincar é saúde: o lúdico como estratégia
preventiva. In: OLIVEIRA, Vera Barros de. O brincar
BACELAR, V.L. da E. Ludicidade e educação infan-
da criança hospitalizada e a família: o que dizem os
til. Salvador: EDUFBA, 2009. Disponível em: < https://
trabalhos? Rio de Janeiro: Editora Wak, 2010. p. 41-76
repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/23789/1/Ludicidade-
Educa%C3%A7%C3%A3oInfantil_VeraL%C3%BA-
ciaDaEncarna%C3%A7%C3%A3oBacelar_EDUFBA.
pdf>. Acesso em: 27 de maio de 2021.
INTRODUÇÃO
DIREITOS HUMANOS (que vai até os seis anos de idade) que a criança
irá receber os primeiros estímulos e, em contra-
partida, irá desenvolver as primeiras funções cog-
Brunella Poltronieri Miguez nitivas, bem como aspectos da personalidade,
Ana Karyne Loureiro Furley hábitos alimentares e perfil emocional.
Hiran Pinel Além disso, é na infância que as crianças pas-
sam a ser consideradas como atores sociais de
414 34
sua própria história e, não bastasse isso, também Por isso, é fundamental que a escola com-
INTRODUÇÃO
Milena Lira Rocha - Breno Aragão dos Santos - Nicolas Rui Cruz da Silva
O ENSINO LÚDICO DE CIÊNCIAS ATRAVÉS DE EXPERIMENTOS DE BAIXO CUSTO
prescindível: serem os mediadores desse proces- docentes de muitas instituições de ensino, tendo
so de aprendizado munindo-se de atividades lúdi- em vista que estas, na maioria das vezes, não
cas que garantam às crianças e aos adolescentes provêm de recursos materiais nem de infraestru-
o contato direto com experiências, brincadeiras e tura para realização adequada de atividades prá-
materiais que promovam a assimilação de diferen- ticas experimentais.
tes saberes, tornando o processo de aprendiza- Dessa forma, o presente trabalho objetiva o re-
gem mais prazeroso e atrativo (MATOS, 2013). lato de uma experiência vivenciada pela equipe
Nesse contexto, os experimentos científicos do Sesc Ciência (Sala de Ciências – Fortaleza/
surgem como estratégias eficientes para con- CE) durante um curso de Formação Pedagógica
tribuir com o processo de aprendizagem, tendo que proporcionou estudo e desenvolvimento de
em vista que a abordagem experimental facilita experimentos científicos lúdicos utilizando mate-
a compreensão de fenômenos e transformações riais de baixo custo.
que ocorrem constantemente ao nosso redor.
Além disso, a experimentação é capaz de motivar MARCO TEÓRICO
e atrair os alunos na direção de construir conhe-
cimentos através de problematizações, observa- Ensino de Ciências
ções e interações com mediações feitas pelos
docentes, tornando o processo de aprendizagem O Ensino de Ciências é uma vivência cotidiana
mais dinâmico e significativo (TAHA et al., 2016). dos docentes, em que o conhecimento científico é
A implementação de experimentos científicos baseado nos fenômenos naturais observados no
que agregam ludicidade ao Ensino de Ciências, dia a dia, de forma abstrata, passando a ser nota-
estimula nos alunos maior interesse pelos conhe- do como efetivo e significativo dentro da realidade
cimentos científicos, tendo em vista que a prática de todos, desde os anos iniciais do Ensino Funda-
interligada com a teoria contribui com uma apren- mental até Ensino Médio (CAMARGO; BLASZKO;
dizagem mais contextualizada, divertida, atrativa UJIIE, 2015). No entanto, caracteriza-se, ainda,
e compreensível. Além disso, os estudantes têm por ser praticado através da individualização das
a oportunidade de alcançar os conteúdos espon- áreas da Ciência, baseada na memorização e,
taneamente, desenvolvendo habilidades que não consequentemente, a não compreensão dos con-
são possíveis somente a partir de aulas teóricas. teúdos abordados (LEITE; GRADELA, 2017).
Numa perspectiva de custos, a utilização de ma- Em 1946, pelo Decreto Federal nº 9.355, foi
teriais de baixo custo para a realização dos expe- implantado na sociedade brasileira o Instituto Bra-
424 35
sileiro de Educação, Ciências e Cultura (IBECC), profissional (LIBÂNEO, 2007 apud BLASZKO;
Milena Lira Rocha - Breno Aragão dos Santos - Nicolas Rui Cruz da Silva
O ENSINO LÚDICO DE CIÊNCIAS ATRAVÉS DE EXPERIMENTOS DE BAIXO CUSTO
localizado na Universidade de São Paulo, em que SILVA; UJIIE, 2017).
sua função era proporcionar ao Ensino de Ciên-
cias o desenvolvimento de atividades práticas Formação continuada de professores
associadas à teoria, além de atualizar os livros
didáticos utilizados na época. Contudo, apenas A formação continuada de professores se dá
na década de 50, o Ensino de Ciências se solidi- logo após sua formação inicial, a qual tem como
ficou no Brasil, sendo regido de forma expositiva, objetivo sempre manter o graduado atualizado,
com materiais didáticos obsoletos, baseados em proporcionar qualificações para novas funções,
textos internacionais e sem a abordagem das ati- ressaltando, ainda, que esse processo é perma-
vidades práticas (LOREZ, 2008 apud SILVA-BA- nente e de aprimoramento contínuo dos saberes
TISTA; MORAES, 2019). necessários à atividade profissional (CHIMEN-
Carvalho e Rezende (2013) ao pesquisarem TÃO, 2009). Portanto, a formação deve ser en-
sobre o Currículo de Ciências do Ensino Médio, carada como um processo de desenvolvimento
evidenciaram que a maioria dos professores re- profissional e trabalhar com ideias autônomas,
lataram que a prática docente era inoportuna, em que o profissional estará totalmente cativado
devido à ausência de estímulo aos profissionais (TOZETTO, 2017).
e ao número reduzido de aulas. Conforme Demo Candau (1997) apud Chimentão (2009), apre-
(2010), existe uma linha tênue em ministrar maior senta três aspectos fundamentais para o processo
quantidade de aulas e com isso ser mais efeti- de formação continuada de professores: a escola,
vo no Ensino de Ciências. No entanto, o fato da como locus privilegiado de formação; a valorização
maior carga horária de aula não implica na ga- do saber docente; e o ciclo de vida dos professo-
rantia do aprendizado de conteúdo, mas sim na res. O que nos leva a crer que os três pontos ado-
reprodução das mesmas. tados e citados estão ligados, primeiramente, às
Neste contexto, os docentes em Ciência ne- vivências do cotidiano escolar, em seguida é pre-
cessitam estar constantemente atualizados nas ciso reconhecer o conhecimento do docente e por
práticas educacionais vigentes na atualidade. fim unir a teoria e a prática.
Dessa forma, a formação continuada é o prolon- No contexto da formação continuada de profes-
gamento da formação inicial, visando o aperfei- sores, a progressão dentro das vivências, sobre-
çoamento profissional teórico e prático no próprio tudo na inovação docente sempre será constante.
contexto de trabalho e o desenvolvimento de uma Desse modo, a atividade desenvolvida dentro do
cultura geral mais ampla, para além do exercício contexto escolar deve proporcionar uma partici-
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pação ativa e sobretudo curiosa da parte dos dis- camente no último momento da aula visando a
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centes, a qual desempenha uma postura crítica, comprovação do que antes foi desenvolvido no
capacidade de observação e análise da realidade estudo teórico ou a demonstração de conceitos
em que vive (OLIVEIRA, 2017). (TAHA et al., 2016), para que assim o aluno com-
preenda com mais facilidade o que lhe foi apre-
Atividades práticas experimentais sentado naquele momento (SALES et al., 2019).
Semelhante à investigação científica, a expe-
As atividades práticas, sobretudo as experi- rimentação do tipo “investigativa” propõe-se a fa-
mentais, permitem aos alunos melhor compreen- zer coleta de dados, desenvolver interpretações
são dos conteúdos de Ciências abordados, em sua e análises, além de observar e colher resultados.
maioria, teoricamente em sala de aula, permitindo Nessa situação, o aluno necessita de um aprendi-
a participação ativa dos discentes na construção zado prévio de determinado conteúdo para poder
dos processos do experimento (SILVA, 2017). executá-la com clareza (TAHA et al., 2016; SA-
No entanto, ressalta-se que as atividades prá- LES et al., 2019).
ticas experimentais podem ser abordadas de di- Por fim, temos a experimentação do tipo “pro-
versas maneiras a depender do objetivo que se blematizadora” que é a mais extensa para ser em-
deseja alcançar (TAHA et al., 2016). pregada na vivência do discente. Fundamenta-se
A experimentação do tipo “show” objetiva na pedagogia problematizadora de Paulo Freire,
despertar o interesse dos alunos pela Ciência, que fala que “o professor deve suscitar nos estu-
motivando-os através de experimentos conside- dantes o espírito crítico, a curiosidade, a não acei-
rados bonitos, que apresentam cores (TAHA et tação do conhecimento simplesmente transferido”
al., 2016), sendo empregada apenas para fins de (FREIRE, 2005 apud SALES et al., 2019). Além
apresentações sem relação acadêmica como o de promover a investigação, esse tipo de experi-
conhecimento contextualizado em sala pelo pro- mentação visa instigar uma curiosidade mais am-
fessor. Portanto, durante a abordagem desse tipo pla nos alunos, promovendo o despertar da critici-
de experimento, o professor é responsável por dade em relação à transferência de conhecimento
contextualizá-lo e problematizá-lo, uma vez que (TAHA et al., 2016).
aquele deve ser trabalhado como fonte de cons- As diferentes classificações de experimenta-
trução de conhecimento (SALES et al., 2019). ção permitem ampla abordagem dos conhecimen-
A experimentação do tipo “ilustrativa”, ge- tos científicos, permitindo, ainda, ao professor uti-
ralmente, ocorre após a abordagem teórica do lizar-se da ludicidade no momento do desenvolvi-
conteúdo de Ciências, sendo utilizada estrategi- mento de atividades práticas experimentais. A lu-
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dicidade no Ensino de Ciências está diretamente possibilitam a interação humana, dispondo aos
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ligada às diversas possibilidades na abordagem mesmos a busca pela liberdade. Sem liberdade
dos diversos assuntos da Ciência. A ludicidade é não há ludicidade e sem o lúdico perdemos um
inerente à criança, atuando no contexto educa- elemento educativo potencial (ALMEIDA; LIMA;
cional como uma forma de transitar em direção a RODRIGUES, 2015) que deve ser vivenciado nas
algum conhecimento que se reorienta na compo- diversas práticas educacionais.
sição do pensamento individual em permutações A motivação através da ludicidade beneficia
constantes com o pensamento coletivo (FILHO; a conduta e a autoestima do aluno, permitindo
ZANOTELLO, 2018). que o processo de ensino-aprendizagem ocorra
de forma positiva. Além disso, colabora com as-
LUDICIDADE NO ENSINO DE CIÊNCIAS pectos de suas vivências, como aprendizagem,
desenvolvimento pessoal, social e cultural, contri-
A ludicidade é uma estratégia que irá entusias- buindo também com a saúde mental, a socializa-
mar o engajamento dos alunos, tornando a par- ção, a comunicação, a expressão e a construção
ticipação dos mesmos, durante a construção do de conhecimentos (SOARES et al., 2014).
conhecimento, significativa à medida que incita a
mudança de atitude e aumenta a motivação em METODOLOGIA
participar das atividades propostas. No que lhe
concerne, o ensino passa a ser mais atrativo e Este ensaio trata-se de um estudo de caso de
menos exaustivo, uma vez que o discente cons- abordagem qualitativa, uma vez que, de acordo
trói o seu conhecimento e brinca ao mesmo tem- com Severino (2017), “se concentra em um caso
po (SOARES et al., 2014). particular, considerado representativo de um con-
O lúdico pode ser utilizado como promotor da junto de casos análogos, por ele significativamen-
aprendizagem, nas práticas escolares, possibili- te representativo.”
tando a aproximação dos alunos com o conheci- O curso de Formação Pedagógica foi de-
mento. Portanto, deve estar bem claro os motivos senvolvido pela equipe do Sesc Ciência (Fortale-
e os objetivos pelos quais a atividade está sendo za/CE) na esfera da Sala de Ciências - Fortaleza/
realizada, respeitando também os níveis de desen- CE, no ano de 2020. As inscrições para o curso
volvimento dos alunos, além de sempre estar aten- de formação ocorreram através do preenchimen-
to ao tempo da atividade (SOARES et al., 2014). to de formulário virtual. A transmissão do curso foi
A ludicidade está diretamente associada à li- realizada na modalidade remota, através da pla-
berdade, aos ambientes que proporcionam e taforma do Google Meet.
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A Formação Pedagógica foi conduzida quarto copo. Por fim, com o auxílio de uma pipeta
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com o auxílio de slides interativos, abordando os de pasteur, transferiu-se cerca de 2 mL da solu-
principais aspectos que circundam o Ensino de ção de repolho roxo para cada copo.
Ciências atualmente, seguido da apresentação
dos experimentos científicos utilizando materiais Experimento 2: Luz através da água
de baixo custo, evidenciando quais conteúdos Os materiais utilizados para o desenvolvimen-
podem ser relacionados com cada experimento e to deste experimento foram:
onde estes conhecimentos científicos podem ser a) garrafa PET;
encontrados no cotidiano humano. Ao todo, foram b) canudo de plástico;
abordados 4 experimentos, sendo eles: c) pistola de cola quente;
d) água;
Experimento 1: Indicador natural ácido-base e) apontador laser;
Os materiais utilizados para o desenvolvimen- f) bacia.
to deste experimento foram: g) tinta spray marrom.
a) folhas de repolho roxo;
b) copos transparentes; Antes de iniciar este experimento, perfurou-se
c) vinagre; uma garrafa PET (aproximadamente na metade
d) água; de sua altura) na espessura de um canudo de
e) amônia; plástico, onde o mesmo foi acoplado com o au-
f) hidróxido de sódio; xílio da pistola de cola quente. Em seguida, pin-
tou-se a garrafa com tinta spray marrom (proce-
Inicialmente, preparou-se uma solução de re- dimento necessário visando o não espalhamento
polho roxo a partir da extração de substâncias do feixe de luz na garrafa), deixando um pequeno
(antocianinas) presentes neste vegetal, mergu- espaço sem pintar paralelo ao canudo de plástico
lhando algumas de suas folhas em aproximada- acoplado, atrás da garrafa PET. Após a completa
mente 1L de água fervida. Reservou-se 4 copos secagem da garrafa, vedou-se a parte exterior do
transparentes, em que no primeiro copo foi adi- canudo acoplado à garrafa para que fosse possí-
cionado cerca de 10 mL de vinagre, no segundo vel enchê-la de água por completo e tampou-se
50 mL de água, no terceiro 10 mL de amônia e com a tampa. Por fim, colocou-se a garrafa fecha-
no quarto 1 colher de chá de Hidróxido de Sódio da dentro de uma bacia rasa.
(sólido). Em seguida, acrescentou-se aproxima-
damente 50 mL de água no primeiro, terceiro e
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Experimento 3: Líquido não newtoniano CE) obteve um total de 56 inscritos, dentre eles:
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Os materiais utilizados para o desenvolvimen- estudantes de graduação, pós-graduação e pro-
to deste experimento foram: fessores, alcançando, dessa forma, 13 diferentes
a) prato raso; estados do Brasil.
b) amido de milho; Inicialmente, uma abordagem teórica foi reali-
c) água. zada com o auxílio de slides interativos, eviden-
ciando-se a problemática do Ensino de Ciências
Neste experimento, utilizou-se amido de milho, (quais fatores influenciam na aprendizagem dos
água e um prato raso. Primeiramente adicionou- conteúdos de Ciências? Como a abordagem
-se 5 colheres de sopa deste ingrediente no prato destes conteúdos podem ser melhorados?) e os
e, em seguida, adicionou-se água em pequenas desafios encontrados pelos docentes durante o
quantidades, até formar uma mistura com aspec- processo de aprendizagem de crianças e jovens.
to fluídico (que apresenta fluidez). Durante a abordagem, enfatizou-se os tipos de
experimentos científicos (show, ilustrativo, inves-
tigativo e problematizador) (TAHA et al., 2016),
Experimento 4: Lente Mágica
evidenciando, dessa forma, as diferentes formas
Os materiais utilizados para o desenvolvimen-
de abordagem e discussões que podem ser de-
to deste experimento foram:
senvolvidas durante a realização de atividades
a) recipiente transparente;
práticas envolvendo experimentos científicos.
b) água;
Durante todo o momento de formação, os par-
c) folha de papel branca.
ticipantes interagiram através do chat do Google
Meet através de perguntas, relatos de dificulda-
Utilizou-se para este experimento, um reci-
des em realizar atividades práticas experimentais
piente transparente com água até a metade de
na sala de aula e também sobre desafios de atrair
seu volume e 1 pedaço de papel, em que neste
a atenção dos alunos.
estava escrito a palavra “ANULA”. Cada papel foi
colocado atrás do recipiente transparente conten-
Experimentos e Ludicidade
do água para observação do fenômeno.
Experimento 1: Indicador Natural Ácido-Base.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A alteração da coloração em cada copo, de-
A Formação Pedagógica realizada pela equi-
veu-se à presença de substâncias ácidas ou
pe do Sesc Ciência (Sala de Ciências - Fortaleza/
429 35
básicas encontradas nos líquidos utilizados. Isso
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ocorre, pois, as antocianinas presentes no extra-
to do repolho roxo interagem de diferentes formas
na presença de substâncias ácidas ou básicas, de
modo a modificar a cor dos líquidos em cada copo,
como pode ser observado na Figura 1 abaixo.
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Figura 3 - Líquido Não Newtoniano com aspecto fluídico.
Figura 4 - Palavra lida sem a Lente Mágica (1), palavra lida através
Experimento 4: Lente Mágica. da Lente Mágica (2).
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Alguns participantes sugeriram o desenvolvimen- ou laboratórios de Ciências, impulsionando-os em
to das atividades experimentais das quatro ma- abordá-las durante as aulas, promovendo o de-
neiras apresentadas (show, ilustrativa, investiga- senvolvimento de novas aptidões e habilidades,
tiva e problematizadora), como está evidente no além de proporcionar momentos divertidos que
comentário abaixo da participante P., atraem a curiosidade e interesse dos alunos em
conteúdos de Ciência, como é visto nos comen-
“Eu acredito que qualquer experimento pode tários de P. e A., respectivamente, “Nossa, esse
ser utilizado para trabalhar as quatro ideias apre- experimento vai deixar os alunos loucos de curio-
sentadas [...], depende dos objetivos que se quer sidade” e “Os alunos adoram.”
atingir com os alunos. Se for apenas fazer uma
demonstração, ou trabalhar um conceito, ou che- CONCLUSÃO
gar a uma conclusão.”
Atividades práticas experimentais apresen-
indicando as diversas maneiras como o docen- tam-se como estratégias que permitem às crian-
te pode utilizar a prática experimental. ças vivências com fenômenos que são apresen-
Outros comentários, ainda, evidenciam como
tados em sala de aula apenas através da teoria.
a ludicidade está presente na realização dos ex-
A abordagem lúdica de experimentos científicos
perimentos propostos, como é notório no comen-
permite o desenvolvimento da imaginação de
tário da participante C., ao declarar que é possível
quem os contempla, além de proporcionar mo-
mentos de diversão.
“[...] brincar de Ciência”, tonificando o papel da
Portanto, visando a necessidade de levar ex-
ludicidade no processo de aprendizado dos alu-
perimentos científicos de fácil realização para a
nos, ao completar com “brincar e aprender.”
sala de aula (ou qualquer outro ambiente que fa-
A apresentação de experimentos científicos voreça a aprendizagem na esfera da instituição
que requerem materiais de baixo custo mostrou- de ensino), o curso de formação para professo-
-se enriquecedora na bagagem de conhecimento res desenvolveu um conjunto de experimentos
já pertencente aos docentes, visto que parte des- que demandam materiais de fácil aquisição,
sas atividades não faziam parte de suas realida- além de possibilitar ao docente a demonstração,
des pedagógicas diárias. ilustração, problematização e investigação de fe-
A estratégia da utilização de experimentos nômenos cotidianos com seus alunos, de forma
científicos aliados à ludicidade motiva os docen- lúdica e dinâmica.
432 35
Diante disso, conclui-se que a experimentação tal. In: EDUCERE: XII CONGRESSO NACIONAL DE
Milena Lira Rocha - Breno Aragão dos Santos - Nicolas Rui Cruz da Silva
O ENSINO LÚDICO DE CIÊNCIAS ATRAVÉS DE EXPERIMENTOS DE BAIXO CUSTO
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24. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez, 2017. E-book.
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perior) AVM - Faculdade Integrada, Universidade Cân-
dido Mendes, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: <ht-
tps://www.avm.edu.br/docpdf/monografias_publicadas/
posdistancia/54358.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2021.
434
INTRODUÇÃO
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Figura 2 - Fundamento de condução de bola abordando o tema da Atividade Física, saúde e vacinação
vacinação.
CAPÍTULO 37
PURPOSYUM: DESAFIOS DA
EDUCAÇÃO PARA A JUSTIÇA Figura 1 - Alunos da ETEC Parque da Juventude, São Paulo, co-
-criaram roteiro e mecânicas do jogo com estudantes da USP sob a
coordenação do laboratório “Cidade do Conhecimento”.
Gilson Schwartz
A iniciativa teve início em 2017 quando a ONU
realizou a chamada internacional United Nations
Office on Drugs and Crime (UNODC), um concur-
so de jogos não-digitais educativos para comuni-
dades com eletricidade e internet precárias que
promovessem a consciência crítica sobre direi-
tos humanos, racismo, porte de armas, guerras,
444 37
violência de gênero, corrupção e uso de drogas. Um grupo de alunos da Escola Técnica Esta-
Gilson Schwartz
PURPOSYUM: DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA A JUSTIÇA
Foram selecionados 10 projetos de jogos no mun- dual (Etec) Parque da Juventude (situado onde
do todo, entre eles, o Purposyum, Challengers of outrora existiu o presídio do Carandiru) aceitou o
Justice, que serão distribuídos mundialmente em desafio de resgatar a popularidade dos jogos de
escolas associadas à UNESCO em 2019. tabuleiro no ambiente escolar. Em parceria com a
A expectativa é que o projeto desempenhe Universidade de São Paulo (USP), os estudantes
impacto real e seja um instrumento inovador que participaram ao longo de um ano de oficinas de
dissemine a universalização da tolerância. Para a criação de jogos não digitais para abordar direitos
comunidade da USP, o desejo do núcleo de pes- humanos e justiça.
quisa é aproximar pessoas apaixonadas por ga- O próprio contato com a direção da escola foi
mes e jogos, ampliando a rede de conhecimento feito por um ex-aluno da ETEC e graduando no
e fomento. O horizonte comum está no desafio Curso Superior do Audiovisual da USP, Luigi Riz-
de criarmos jogos integrados a processos audio- zon. A proposta era atuar no desenvolvimento do
visuais que transformem nossa sociedade, mobi- projeto aprovado no concurso de jogos não digi-
lizando para a justiça e a igualdade essa força de tais para incentivar a consciência crítica sobre as-
futuro que são nossas crianças e jovens. suntos como direitos humanos, racismo, porte de
armas, guerras, violência de gênero, corrupção e
uso de drogas.
Inicialmente 25 estudantes do Ensino Técnico
Integrado ao Médio foram divididos em dois gru-
pos, realizaram reuniões após as aulas regulares
para desenvolver os jogos, sob a orientação de
alunos e professores da USP.
Elvirley de Oliveira, conhecido como “Elvis”, foi
o professor e coordenador na ETEC, reforçando
junto aos alunos a importância da abordagem dos
direitos humanos como uma temática historica-
mente importante para a continuidade na trans-
formação do local onde a escola está localizada:
o Parque da Juventude abrigou o Complexo Pe-
Figura 2 - Purposyum, Challengers of Justice “Purposyum - Desafios nitenciário do Carandiru. A opção de fazer jogos
da Justiça”.
não digitais também promoveu a interação ‘cara a
445 37
cara’ entre os alunos e permitiu discussões impor- sal e nacionalismo individual foram trabalhadas, e
Gilson Schwartz
PURPOSYUM: DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA A JUSTIÇA
tantes sobre questões sociais. perguntas como “Salvar a todos ou salvar a mim
mesmo? A minha nação é mais importante que as
DESENVOLVIMENTO outras? Quais são os conflitos que perpetuam a
rivalidade entre algumas nações?” surgiram para
Desde, o início do desenvolvimento do jogo foi nortear o design do jogo.
feito o diálogo com as escolas públicas e parti- Ficou evidente que é possível aprender, brin-
culares, com a ajuda do mediador Luigi Rizzon, cando, sobre justiça, igualdade, respeito e reco-
bolsista do grpo de pesquisa Cidade do Conhe- nhecimento, estado de direito, tolerância, diversi-
cimento (www.cidade.usp.br). Ex-aluno da ETEC dade. Claramente os desafios são temas mons-
Parque da Juventude, Rizzon fez a conexão com truosos. Mas brincar não é também aprender a
a escola para que os alunos criassem um jogo de matar monstros? Os obstáculos de integrar temas
tabuleiro. O grupo inicial de 25 estudantes chegou complexos em uma lógica não tão exata, mas lú-
a quatro ideias diferentes de jogos. Além disso, dica, tornam-se claros na discussão entre os alu-
estudantes da Faculdade de Direito e uma parti- nos. É preciso também enfrentar a dificuldade
cipante da Universidade Aberta à Terceira Idade, de transformar o sistema pedagógico tradicional
matriculados na disciplina Seminário Temático, a partir de uma visão orientada por plataformas
participaram do processo criativo do projeto. criativas, diversificadas e empreendedoras, em
Christian Alexsander Martins, aluno do Departa- que o objetivo seja ampliar horizontes ao invés de
mento de Artes Cênicas (CAC), foi um dos orienta- condicionar os alunos ou simplesmente “fazer a
dores do projeto na ETEC. O desafio foi enfrentado cabeça” da garotada.
por meio de pesquisas e brainstorms, deixando os A concepção dos projetos é baseada na meto-
estudantes livres para desenvolver o projeto. dologia das game jams – reuniões nas quais pes-
Uma das ideias iniciais era de um jogo em que soas de diferentes áreas de conhecimento criam
as nações podem se unir para construir uma má- um jogo em torno de um tema específico, em um
quina juntas e salvarem a órbita dos planetas do tempo predeterminado. Nesse contexto, a equipe
sistema solar, impedindo que o sol consuma tudo, de apoio deu voz à experiência de cada aluno,
ou uma nação, separadamente da outra, pode jun- além de resgatar memórias de jogos e brincadei-
tar seus artefatos e maquinarias, criar uma outra ras para que as ideias tomassem corpo.
máquina e simplesmente se safar, sozinha, dessa Os estudantes chegaram a quatro protótipos:
situação de destruição. Por meio do processo de o Jogo da Consciência, o Diário de Dandara,
criação do jogo, a noção de comunidade univer- o PlanIt e o CourtSymulator. A partir daí teve iní-
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cio um trabaho de consolidação dos protótipos o grau de consciência desse problema que pode
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para chegar a uma versão final, encaminhada à ser solucionado apenas superando os egoísmos.
agência da ONU. Cada time propõe, por meio de planejamento
A criação de jogos é uma dimensão essencial e trabalho em equipe, iniciativas ou soluções aos
da alfabetização midiática e informacional. Criar riscos sistêmicos, os Desafios de Justiça. Fenô-
jogos é estar preparado a decifrar e atuar em sis- menos como racismo extremo, genocídios, “fake
temas, digitais ou não, que são vitais e nos dão news” em larga escala e em todos os setores da
muitas vezes uma sensação de controle, sobe- vida (não apenas na política), liberalização irres-
rania e conhecimento que é apenas superficial. trita do porte de armas de todos os tipos, aque-
O projeto ficou pronto em 2019 e foi contou com cimento global e dependências comportamentais
apoio da Reitoria da USP para uma primeira edi- as mais variadas tornaram-se epidêmicas, amea-
ção de 5 mil exemplares já em circulação, ape- çando a natureza e as culturas, a humanidade e
sar das dificuldades decorrentes da pandemia de sua evolução no Cosmos.
Covid19. Além do jogo em portugês, há versões
disponíveis online para inglês e árabe.
A partir do momento em que exercitamos uma
pedagogia lúdica, seja qual for o tema do jogo,
seus recursos retóricos ou mecânicas de ‘jogabi-
lidade’, estamos reconhecendo o direito do outro
jogar. Com isso, aceitamos que toda a diversida-
de é possível, tolerável e respeitável.
Desenvolvemos ao longo de milhares de anos
um conhecimento da natureza e uma diversidade
de culturas, uma capacidade de controle tecno- Figura 3 - O jogo foi lançado em Londres em janeiro de 2020, sema-
nas antes do “lockdown”, como atividade da bolsa CAPES-PRINT-
lógico e uma percepção de que existem experi-
-USP 2019-2020 em parceria com o King´s College de Londres em
ências comuns. Como usar esses recursos para seu Departamento de Humanidades Digitais.
aumentar a consciência em cada indivíduo das
experiências e desafios dos outros? MARCO TEÓRICO
Em “Purposyum”, o reconhecimento de direi-
tos é uma experiência individual e coletiva em Não basta criar e alimentar redes digitais se
cada um dos Desafios da Justiça. Ao ativar os elas atendem a objetivos de homogeneização de
Desafios, é preciso encarar o problema, aumentar comportamentos. O jogo não digital abre essa
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oportunidade para uma crítica do desenvolvimen- -se partes de um processo dinâmico de formação
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to de redes sociais dominadas por agendas que de redes abertas foi desde o início um pressu-
não exigem real participação política dos envolvi- posto do projeto da “Cidade do Conhecimento”,
dos. Mais que nunca a dimensão lúdica precisa que surgiu como projeto em resposta a um con-
estar associada à necessidade de fazer pontes curso público do Instituto de Estudos Avançados
entre o desenvolvimento econômico, social e cul- da USP, em 1999.
tural de uma comunidade. Ao longo de mais de 20 anos, o projeto evoluiu
Estamos na era da “iconomia”, ou seja, a eco- para tornar-se um grupo de pesquisa com foco na
nomia dos ícones. Para que possamos avançar, experimentação com novas mídias e grande ênfase
é urgente uma nova perspectiva teórica, novos na dimensão lúdica do aprendizado, conectando as
conceitos de educação profissionalizante, uma tecnologias de informação e comunicação a áreas
nova prática nas áreas de cultura e extensão na aplicadas de humanidades e empreendedorismo.
universidade, uma aproximação não apenas en- É um laboratório de redes, sempre voltado para
tre áreas do conhecimento, mas também entre a inovação e a formação de parcerias estratégi-
práticas sociais no setor privado, no setor público, cas com outros grupos e diferentes unidades na
na academia e no chamado terceiro setor. USP e fora do campus, no Brasil e internacional-
Ainda estamos presos no Fla-Flu dos discursos mente, como a rede “Games for Change”. Desde
de ódio em torno da propriedade privada, de um 2005, o grupo está associado ao Departamento
lado, e do aparelhamento ideológico do Estado, de de Cinema, Rádio e TV da Escola de Comunica-
outro. A mudança cultural e prática ocorre aos pou- ções e Artes da USP e a partir de 2010 integra-se
cos e, sempre é bom lembrar, com recuos, fracas- ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar
sos e desvios. O anjo da história avança olhando Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades da
para trás; o progresso se faz a contrapelo. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Huma-
Além da questão teórica e política, o Brasil está nas (FFLCH).
muito atrasado no investimento em infraestrutura O propósito essencial é transformar a própria
tecnológica e formação profissionalizante voltada experiência de produção de conhecimento univer-
para a emancipação digital (ou seja, a inclusão sitário projetando desafios e soluções em redes
digital que gera riqueza, identidade e conheci- estratégicas de cooperação e inovação que pas-
mento, não apenas oportunidade de consumo de sam, mas não se limitam à esfera digital.
máquinas ou serviços de massa). O futuro da educação está na ampliação des-
A busca de um marco teórico através do qual sas redes, consagrando uma metodologia par-
a educação, a tecnologia e a cidadania tornam- ticipativa e com prioridade para a diversidade,
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algo que se conhece como multistakeholderism e escola pode e precisa ser transformada, o pro-
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PURPOSYUM: DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA A JUSTIÇA
poderia ser bem traduzido como pluralismo. Não fessor tem um papel de liderança e mentoria, e
basta criar e alimentar redes se elas atendem a estudar pode ser não apenas divertido, mas em-
objetivos de homogeneização de comportamen- polgante e inseparável de nossos sonhos, proje-
tos. Dessa perspectiva, as ditas redes sociais do- tos e atitudes.
minadas por agendas que não exigem real parti- Criatividade é o nome do jogo. Fala-se muito
cipação política dos envolvidos é um horizonte de em educação a distância como principal horizonte
liberdade superficial. da convergência entre tecnologia e educação. É
Trata-se de uma perspectiva inovadora, com- uma visão parcial, que privilegia a massificação,
prometida com a crítica social e com a crítica à ou seja, o aumento no acesso ao conteúdo, po-
chamada “cultura gamer”. Tornou-se urgente pro- rém geralmente como forma de reduzir custos do
mover oficinas e cursos de game design, orienta- lado da oferta, sem necessariamente tornar mais
ção para professores sobre uso de games e ativi- criativa a participação dos alunos.
dades especiais para crianças e adolescentes em Os profissionais de design instrucional pode-
escolas, ONGs e empresas. O objetivo é formar rão ampliar significativamente a participação cria-
pessoas com capacitação para colocar o Brasil no tiva dos alunos quando integrarem suas platafor-
mapa global dos games com foco em criatividade, mas ao universo dos games. Jogar, brincar, fazer
cultura, política, economia e cidadania. a imersão em mundos virtuais é ir muito mais lon-
Para entender a emergência dos games como ge do que a mera transmissão em larga escala
forma cultural, como atividade econômica e até de conteúdos pré-gravados, de conteúdos dispo-
como estratégia para mudar o mundo, é preciso ter níveis em ambientes como o Moodle etc.
consciência das relações entre o virtual e o real. O O professor deixa de ser um mero gerente de
foco é digital, mas a abordagem é interdisciplinar e plataformas de massificação da distribuição de
tem como horizonte a chamada internet das coisas conteúdo para participar, literalmente, do jogo, ar-
conectadas, ou seja, a criação de um novo mundo bitrando, mediando, promovendo e organizando
em que as conexões entre máquinas, pessoas e a brincadeira.
lugares contribuem para melhorar a sociedade e O principal desafio está na criação de empre-
aprimorar nossa vida individual e coletiva. go, renda e novos circuitos de geração e acumu-
Tem gente que acha que a escola é uma ins- lação de capitais que traduzam práticas de mer-
tituição falida, que o professor é um personagem cado na economia da cultura, do audiovisual e do
ultrapassado e que estudar é para quem não tem conhecimento digital. Um novo capitalismo surge
mais o que fazer. Vamos jogar em outra linha: a no século 21 animado por uma redução radical
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nos custos de coordenação numa variedade im- sas globalizadas, quem ficar fora da “mesh” será
Gilson Schwartz
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pressionante de atividades humanas. A colabora- incapaz de competir por não saber compartilhar.
ção no mercado chegará a níveis inéditos, privile-
giando o acesso compartilhado em detrimento da CONCLUSÃO
propriedade pura e simples.
O capitalismo se reinventa valorizando uma A decodificação das mensagens propositais a
nova forma de coletivismo. No entanto, em oposi- partir das cartas de “Purposyum” envolve a coo-
ção ao coletivismo totalitário que predominou até peração na compreensão dos recursos de cada
a queda do Muro de Berlim, trata-se a partir de planeta do Sistema Solar e também na sua apli-
agora de um novo modelo de relacionamento hu- cação a cada Desafio da Justiça. Não há mági-
mano que busca inspiração na cooperação livre e cas, azar ou receitas, mas busca de consensos.
na criatividade responsável. Para superar os bloqueios, resistências e pre-
No centro dessa nova formação social e eco- conceitos necessários para uma atitude positiva
nômica está a “mesh”, ou seja, um tipo de cola- diante dos Desafios da Justiça, é importante que
boração que se torna viável e ganha potência por todos os indivíduos vivenciem, pelo diálogo, pe-
meio da rede digital, das tecnologias de informa- las narrativas e pelas decisões individuais e co-
ção e comunicação (a “network assisted sharing”). letivas, essa confiança no tempo necessário para
A coordenação, privada ou pública, substituirá a que aconteça uma autêntica e sustentável supe-
propriedade privada de um número enorme de ração das injustiças que impedem a evolução da
ativos por parte dos indivíduos, das famílias e das espécie humana no Cosmos.
empresas. É algo que passa, mas não se esgota A principal dificuldade para quem está interes-
no que, hoje, se conhece popularmente como “re- sado numa atitude crítica no mundo dos games
des sociais”. está na cultura ora bacharelesca, ora paternalista
A “mesh” revoluciona profundamente a ativida- de quem fala e propõe mudanças sociais. De um
de humana gerando disrupção na maior parte das lado, há uma turma de intelectuais e tecnocratas
indústrias e instituições, não apenas na chamada que acredita na transformação social como resul-
indústria cultural ou economia criativa. Para os tado de decisões geniais adotadas de cima para
empreendedores criativos será uma oportunidade baixo. De outro, há muita gente que ainda asso-
histórica sem precedentes para gerar valor rein- cia transformação social a filantropia, caridade
ventando setores e abrindo novas fronteiras de ou, pior, demagogia.
mercado. Do jovem que ainda está nos bancos Para jogar o jogo da mudança, é preciso
da faculdade aos dirigentes das grandes empre- evoluir para uma cultura em que todos façam
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parte do jogo da mudança. É um jogo de ga- ZAMBARDA, P. Projeto da USP lança, com parcerias
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nha-ganha, enquanto as visões tecnocráticas globais, o game Purposyum Challengers of Justice.
ou paternalistas partem do pressuposto de que 2020. Disponível em https://dropsdejogos.uai.com.br/
noticias/exclusivo-projeto-da-usp-lanca-com-parcerias-
uma parte da sociedade está pronta e apenas o
-globais-o-game-purposyum-challengers-of-justice/.
“resto” precisa mudar.
Vamos mobilizar pessoas, empresas e institui-
ções para fazer do vídeogame, dos jogos sociais
e das interfaces digitais uma fronteira tecnológica
comprometida com a mudança do mundo e a su-
peração da violência que, gostemos ou não, quei-
ramos ou não, habita cada um de nós como um
risco potencial, recorrente e inevitável.
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