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ARMAND FREMONT - Professor na Universidade de Caen A REGIAO, ESPACO VIVIDO Prof. Elvio FLG 1284 Teoria da Regiaio E Regionalizagao Texto _ Ww . LIVRARIA ALMEDINA cormmra ~ 1980 ‘) 5 Cépias CAPITULO IIT AS REGIOES 0 estudo precedente dos lugares vividos ¢ dos espagos sociais deve permitir precisar a ou as definigées que se podem dar da palavra «regio», A alternativa, hd que lembré-lo, ‘op6e definigSes de alcance muito geral, mas que permanecem ‘sempre vagas, e concepgGes muito mais exigentes nas suas precis6es, mas tais que a maior parte dos casos parece escapar & regra. De uma maneira geral a regio apresenta-se como um espaso médio, menos extensa do que a nagio ow o grande espago de civilizagio, mais vasto do que 0 espaso social de um grupo, ¢ @ fortiori de um lugar. Integra lugares vividos e espagos sociais com um mfnimo de coerénacia e de especificidade, que fazem dela um conjunto com tura prépria (a combinagio regional), ¢ que 2 por cértas representagSes na percepoio dos habitantes ou dos estranhos (as imagens regionais). A regio 6 menos nitidamente conhecida ¢ percepcionada do que do quotidian ou os espagos sociais da. fami Mas, na organizagio do espago-tempo vivido, constitui um 168 invéluero essencial antes do acesso a entidades muito mais abstractas, muito mais desconcertantes em relagio a0 hdbito... Seria a regio o espago que podemos visitar sem ‘nos sentirmos incomodados, um conjunto-regulagto de nivel superior na organizagio do espago de vida © na per- cepgfio e valorizago do espago vivido? Alguns psicélogos, como A. Moles ¢ E. Rhomer, incitam a adoptar uma tal definigso, apresentando a regiio como « conjunto dos lugares aonde © homem pode ir e vir em menos de um dia, quer dizer, sem dormir fora de casa, quer dizer ainda sem fazer reservas, logo planos antecipados, nogio de que as policias do mundo inteiro se deram conta perfeitamente» (18). 0 espirito da definigio parece excelente, Mas a sua formu- ago 6 demasiado europoctntrica ou americanocéntrica para poder ser plenamente adoptada. Com efeito, 0 que foi mostrado dos lugares vividos © dos espagos sociais confirma que, para além de uma definigdo bastante geral, a andlise nio se poderia bascar validamente num modelo tinico de regiéo, Os préprios elementos que compdem este conjunto tim formulagdes demasiado dispares para que a sua integragio numa enti- andlises precedentes extrai-se no entanto um fio condutor, que deve permitir assentar uma abordagem do problema ‘em trés modelos principais. G9 A, Mouss eB, Rome, op. eit, 1972 169 1. AS REGIOES FLUIDAS A) Concepeto geral ‘Na maior parte dos paises do Terceiro Mundo, o fend- eno capital do enraizamento campesino nfo existe ou manifest. reduzidos. Nestas condigdes, poder-se-ia concluir um pouco apressadamente pela auséncia de fixagio dos homens aos lugares e, por via de consequéncia, pela inanidade da nogio de regido. Uma outra solucio, muito frequentemente admi- ida pelos cconomistas ou pelos gedgrafos, consi rar como regides seniio conjuntos neos definidos por particularidades fisicas, as «regi6es natu- rais», ou entio, nas andlises das evolugdes recentes, tudo aquilo que se possa parecer com uma regionalizagio de tipo europeu, por exemplo «as regides polarizadas», ou ‘mesmo «as regides em vias de polarizagdon. Estas concep- ‘90es tém como inconveniente principal deslocar o problema, ‘mais do que tentar resolvé-lo procurando os elementos mais especificos. Os lugares existem... Lugares naturais: floresta, savana, colina, vertente, rio... Lugares humanizados: atroteamento, Percurso, acampamentos, aldeias tempordrias ou de implan- taco recente... Lugares vividos: bosque sagrado, floresta temida, acampamento familiar... Os homens existem tam- bém, unidos entre si por estruturas sociais euja coeréncia foi sublinhada. Mas entre os homens e os lugares, as rela- ges nfo parecem duravelmente fixadas, seja porque as 170 jmplantagdes pertencem a um passado préximo, seja porque ‘as migragdes continuam. Nestas condigées, a regio no pode de maneira nenhuma definirse num espago bem deli- titado, to nitido nos seus contornos como na sua duragio ‘A regito existe de facto, mas numa certa fluidez. Fluidez fem ligasio directa com a prevalecente nas relagBes que ‘nem os homens ¢ os lugares. Fluidez, quer dizer 0 eardo- facilmente deformavel, cil de captar. ter daquilo que, como u1 mével e cambiante, ¢ deste mo« (© estudo de um exemplo deveré permitir abordar melhor esta realidade. B) Um exemplo: o delta interior do Niger segundo Jean Gallais (19) 0 delta jaterior do Niger ocupa, no seio da Republica do Mali, uma superficie de 30 100km? (mais ou menos 100 kim de oeste a este, © 300 km de sudoeste a nordeste), Em 1959 contava corca de 400 000 habitantes. Aqui temos pois um conjunto sensivelmente mais vasto do que uma aldela ou mesmo do que um conjunto de aldeias. Mas ¢ também uma unidade nitidamente mais reduzida do que tum Estado, no entanto modesto, como a Repiiblica do Mali {em 1972, 1240000 km2, 5 260 000 habitantes) e, com mais raaio ainda, do que um grande espago continental. ‘Tra tarse-d de uma regio, € qual 6 essa regitio? (19) 5. Gattass, Le delta inéreur de Niger, 1 P.A.N., Dakar, 1967. tr Desde a introdugho, J. Gallais coloca perfeitamente © problema: ‘eA aproximaglo de uma certa paisagem natural ¢ das marcas ‘mumanas que nela se inscrevem constitui o exercicio de base da geo- grafia regional, No que diz respeito ao delta inter ‘no proporciona todas as satisfagBes intelectuais que se cerlas anilises compardveis. A nogao de uma regio n ‘com vigor €, apés uma observagdo mais pormenori fa de uma regido humana, mas a aproximagio nfo se faz, sem dis- cordancia.» A regito «natural» tranquiliza 0 especialista. Impde ‘a sua unidade e os scus limites, o seu relevo caracterizado por «uma planura sem montonia», 0 seu clima bem mar- cado pelo ritmo sazonal, a sua paisagem vegetal ¢ 2 sua hidrologia, os seus sub-conjuntos de bastante fécil distin~ ‘gio, Uma planicie, um delta interior onde reinam a agua © a erva, uma espantosa «transfiguracio sazonab, eis os tragos que permitem distinguir nitidamente esta regitio dos espagos vizinhos. «A planura impressionante das grandes paisagens do delta interior resulta de um aluviamento ‘duradouro numa regio que desempenha o papel de arma- dilha para sedimentos». Mas a planicie escapa A mono- tonia gragas & presenga das formas de piemonte, inselberg, abébadas couragadas, cones de acumulagiio, ¢ & justaposi- lo de varios deltas elementares no seio do grande delta. ‘A paisagem de ervas e gua transfigura-se ao ritmo das ‘cinco grandes estagdes destes confins sahelo-sudaneses: estagio das chuvas, de Julho a Setembro, «de cores cam- biantes e cheiros carregados»; estagio das inundagdes, de Outubro a Novembro, com o rio «fortements inchado. submergindo as planicies mais clovadas ¢ afundando as m pequenas bacias sob quatro ou cinco metros de profundi- daden; estagdo fria ¢ luminosa, de Dezembro a Janeiro; descida das dguas em Fevereiro e Marco; longa estacao seca de Abril a Junho, «o tempo confundido... no calor © na esperap. | ‘A regio «humana» € muito mais dificilmente delimi- tivel. O delta € com efeito povoado por uma justaposigo ou imbrieagio de etnias em que nenhuma é plenamente caracteristica da regifio: Peuls (35 % da populago totel), Marka (17 %, do mesmo grupo étnico dos Soninké, Sara- ¢ viérios outros grupos sem importinci nhuma etnia dispoe da supremacia no Nenhuma etnia se encontra espacialment Estes povos, além disso, dedicam-se a actividades muito diversas: os Peuls sfo sobretudo pastores; os Marka cultores ou comerciantes; 0s Bambara camponeses de al (08 Bozo sio pescadores, os Somono cbarqueiros do rio». Todos estes povos (eles proprios subdividi infetiores) se distinguem por uma histéria, por uma lingua, costumes, uma reparticio no espago ¢ um modo de repre- sentagiio do espaco. jo humana» parece escapar a qualquer unidade. Riz igada, agricultura seca a base de milho-middo, siado lassa e heteréclita para soldar 0 conjunto. Sem est sem economia mercantil (a niio ser marginal meios de locomogio eficientes num meio populagdes comunicam dificilmente entre si. A regio como conjunto nao 6 pois sentida pelos seus habitantes, ¢ nenum nome verndculo consagra a sua existéncia. E, 0 que é mais, 13 4 pequena regitio, a sub-regito, ¢ mesmo o espago aldesio escapam & clara percepeio dos homens, segundo J. Gallas. autor sublinha desde as primeiras péginas da marca humana, a precaridade das suas i 4 mobilidade das suas manifestagOes... Regio muito fluida, com efeito. Mas a regiio existe ou no? O mérit € 0 de nfo se ter esquivado a pergunta com uma resposta, ‘a. Com efeito, retomando a anélise pela base, sublinha como cada grupo de populagaio assimilou de facto uma certa organizagiio do espago... Neste quadro, a per- cepcio do espaco pode ser muito viva e extremamente rica em gradagdes. Os Peuls distinguem assim 0 ouro, antigo acampamento de palhotas provisérias e depois aldeia sedentarizada, 08 sete dendé, bairros, o bourgou, pastagem de savana a0 abrigo de uma duna ou de um depésito alu- vial, o leydi, espago mais vasto que refine os diferentes clementos da vida do criador de gado. Da reunitio dos leydi, J. Callais extrai uma organizagio superior, regional, interior € que 6 a projecgdo nesse espago ial dos Peuls. © estudo das outras etnias mos- traria outro tipo de relagdes com 0 espaco e visdes mais limitadas. Contudo, a cada etnia correspondem elos espe- cificos, um meio de adaptagio, uma natureza mudada em cultura, A regidio existe, Mas niio obedece ‘aos esquemas racionais de uma ciéncia transparente. E certo que a paisagem objectiva impde a sua unidade, a0 mesmo tempo que a sua grandeza, Mas os homens vivem-na & sua assimilando-a & sua propria orgenizacio com meios tecnicamente limitados e bastante diferentes consoante 8 grupos. Num grau médio da escala dos fonémenos geo- de J. Gallais, m™ sgrdficos, a regio é este encontro de um quadro «natural» ¢ de «culturas» que o interpretam. Fluida, é também rela- tiva, ©) Elementos de diferenciagiio © modelo «delta do Niger» adit el péprio muitas variantes. O exame da tese de J. Gi como estas podem resultar de factores iors a0 modelo, outros exteriores a ele, € fazendo-o evoluir para outros tipos. Se a fiuidez. dos constituintes & de regra, o equilibrio que os reiine na mesma combinagao pode revelar-se muito variado de regio para regio. 0 extraordindrio mosaico &tnico do delta interior é apresentado pelo préprio J. Gal- Iais como excepcional em Africa, notabilissimo para as exigéncias da demonstragdo, mas quase levado ao limite da complicacio. Algures apenas se encontrarao, imbricadas, duas ou trés vtnias, ou mesmo, ocupando incompleta ou precariamente o espago, uma 86. O equilibrio entre a ocupa- sdo humana ¢ as possibilidades naturais encontra-se bas- tante bem resumida pela nogio de densidade de populagio. A regio fluida implica bainas densidades. Para além de algumas dezenas de habitantes por quilémetro quadrado, impe-se uma agricultura intensiva que induz um certo ‘enraizamento campesino. Mas no quadro das baixas densi- dades, o desvio pode ser grande entre os povoamentos muito fracos (inferiores & unidade, ou de algumas unidades por ilémetro quadrado), um caso médio como o do delta interior, ou regi6es um pouco mais povoadas (quinze a ‘rinta habitantes por quilémetro quadrado). No primeiro caso, em yastos espagos, Amazénia, Sahara, colinas ¢ pla- a natureza parece apagar a presenga dos homens e a regitio. torma-se de tal modo flulda que nos achamos de facto ites de validade. No primeiro caso, em s © mais povoadas, bastante caracteris- 9m. Os seus terroirs € os seus finages. J. Gal- : «A organizagao humana do delta é dominada cada pela mobilidade, a instabilidade. A divisio em leydé nfo aperta 0 homem num campo estreito.» Também a regio 6 um compromisso. ‘Uma segunda série de diferenciagdes & fornecida pela sobre-imposigio das estruturas funcionais da economia mercantil as das regides fluidas. Pode-se assim observar que a cidade de Mopti, de criagdo no entanto muito recente ois tem apenas meio século de existéncia, exerce uma atrac- ilo erescente sobre os campos do delta interior do Niger, sendo a sua influncia comercial transmitida por uma rede de mercados hierarquizados. O fenémeno aparece ainda mais nitidamente em volta dos drenos regionais criados pela economia de tréfico colonial a pai grande metrépole portudria. A des. altera em nada este moviment A rede das cidades da América latina é em grande parte construida segundo este modelo, Em Africa, o Senegal & volta de Dakar (¢ do amendoim), a Costa do Marfim & volta de Abidjan (¢ do café, da madeira, do cacau...) so xceelentes exemplos de torritérios em vias de «regionali- 176 zaghon. Esta tiltima palavra deve ser comentada pois, fre- quentemente utilizada pelos gedgrafos, parece muito abu- se emprego. Com efeito, cregionalizagao» implica le regifio antes do desenvolvimento da economia c reduz a presenga de regides apenas aos espagos ios», Belo exemplo de curopo-centrismo e de assimilagio pelos cientistas apenas dos elementos das suas préprias culturas, De facto, as regides existem antes, mas silo diferentes, como tentémos mostrar. Muito pelo con- Iririo, a sobre-imposigio de uma nova armadura funcional dlesestrutura o velho edificio das resides fiuidas. Entre um © outta estabelece-se um compromisso duvidoso, que nio ¢ jd nenhum dos dois. Desenvolvem-se assim novos mons- {ros regionais. O estudo das regides senegalesas permitiria mostrar um belo exemplo disso. Polarizadas como regides curopeias, mas num desequilibrio exemplar, desde a metré- pole, Dakar (perto de um milhiio de habitantes em quatro es de senegaleses), a0s seus primeiros satélites, Saint: Louis, Thiés, Rufisque, Kaolak, cidades médias ¢ aos Tonginquos e pequenos centros-intermédios isolados do Norte e do Este, Matam, Bekel, Kédougu, Tambaconda. Mosaico de etnias a africana também, com 0s seus povos Ouolofs, Peuls, Séréres, Diolas, Mandingos, Toucouleurs, Sarakolé, amalgamados numa nova fluidez, desde as a € 05 acampamentos do mato até aos bairros de lata, mé ‘ou outros bairros de «abandonados» de Dakar e de Pikine. B a cidade que devora a Africa ou a Africa que reconquista a cidade? 2. AS REGIOES BNRAIZADAS fon tem sido empregado varias jores. Implica, essencialmente no © termo «enraizar vvezes nas paginas ant im quadro de civilizagdes campesinas, um certo tipo de rela~ ‘90es entre os homens e os lugares, Os lugares pertencem, ‘40s homens © os homens pertencem aos lugares. Daf um modelo de regio. A) Concepsao geral Ao ler K, Buchaman (20), somos impressionados pelas semelhangas que, apesar da distincia, aproximam o espago chinés do dos campos europeus, Nao afirma 0 autor desde as primeiras pAginas da sua obra: «paisagens tio humani- zadas, seja qual for a sua escala, apenas existem em duas nas duas extremidades da Eurdsia: na ental saida do mundo mediterranico ¢ na rea cultural chinesa... Os campos europeus, 0s campos chineses, so compardveis a palimpsestos, antigos manus- ctitos onde geragSes sem conta gravaram a poesia —e miséria — da vida quotidiana, e que s6 parcialmente foram apagadas pelos tragos mais marcados da posteridade seguinte, nessa sucesso ininterrompida de camponeses € citadinos...» A definigfo das dreas culturais por Buchaman parece um pouco restritive, Os campos ocidentais por certo que nio deve tudo apenas as difusdes da bacia mediter- Anica, tal como as planicies irrigadas da Asia das Mon- ‘s0es se no encontram apenas sob a dependéncia histérica ¢ cultural da China. Além disso, a Africa tem também 08 seus préprios finages ¢ terroirs as suas aldeias de enraf- zamento, mesmo quando parecem um pouco mais pre- cdtias do que as implantagdes dos campos europeus ou 9) K. BucHaNan, Lespace chinois, 1973 REew 178 asidticos: assim, valorizadas de modo descontinuo, as regides mo contacto da savana ¢ da floresta, ou as das lagunas litorais fecundadas pela rizicultura (21), Nas suas grandes linhas, a afirmagdo de Buchanan néo deixa por isso de ser valida. As grandes. civilizagdes campesinas (Mediterraneo, Europa, Asia das Mong6es, Africa das savanas) projectam no espaco os scus valores préprios, concedendo uma ime portancia muito grande A duragdo (a familia, a histéria), a renovagio da vida (a mic, o solo), & patriménio (a casa, o finage e terroir). A ter isso, Daqui resulta uma organizagio do espago assent cenraizamento, quer dizer, na ligago dos homens a terra, A ligagio dos homens do Oeste aos lugares da sua vida quotidiana nfo precisa jd de ser demonstrada, Exprime-se ‘a todos os niveis da hierarquia do espago. A casa familia, o mais das veres meio escondida num pitio por detris das sebes ¢ das macieiras; ¢ 0 dominio da mulher e das criangas. A propriedade ou as terras de exploracio fornccem a subsisténcia, ou os rendimentos; é af que tra- balham os homens, por sua conta, também eles ao abrigo das sebes, a maior parte das vezes. A vila reiine todas as (22) Ver nomeadamente Terroir afrcains et malgaches, op. cl, 1970, assim como os trabalhos de P. Paussiex sobre a Casamance ou © Bas-Ouémé. 1D semanas o§ irmios, os primos ¢ os vizinhos, em redor da missa ou do mercado; opera-se aqui uma ruptura no quo- tidiano, que assegura a renovagdo do grupo pelo esbocar dos casamentos © a transmissiio dos bens, A ligagio & casa, a propriedade familiar, ao campanirio da «regio» esprime- se numa paisagem fragmentada que mi 6s limites © 08 abrigos, as cercas ¢ as drvores, Mas niio desaparecerd esta entidade superior que & a regio, sob os particularismos, no esboroamento do espago vivido? Com efeito nem sempre 6 ficil de delimitar. Na Baixa-Normandia ¢ no Maine, proliferam os nomes de egies», alguns de pequenissima dimensfo. $6 0 depar- tamento do Calvados subdivide-se tradicionalmente em Regido d’Auge, Planicie de Caen, Planicie de Falsise, Bessin, Bocage virense, cinco subconjuntos para pouco ‘mais de quinhontos mil habitantes. Ainda que estes nomes exprimam, muito mais do que um espago vivido, uma hheranca cultural, uma comodidade administrative ou cien- tifica, Os esboroamento acentus-se ainda se a regional assentar no papel, muit nas ¢ médias. Estas, pela sua aa fungdes © pelas suas sociedades, participam muito i ‘mente na organizagdo do espago regional, As suas burgue- sias do séc. XIX compraram terras, edificaram fiibrieas, atraindo a mio de obra rural, langaram inovagdes agri. colas como a venda a Paris da manteiga, dos queijos, dos bois e vitelas. As suas lojas e servigos atraem todas as semanas ou meses os camponeses das comunas vizinhas, num raio de dez a trinta quilémetros, A descentralizacio industrial relanga por vezes novas actividades, para fazer 180 dlelas pequenos «pélos de desenvolvimento». Neste estidio existe de facto, por conseguinte, uma realidade regional ‘Mas & preciso constatar que se tratam de«pequenas rezides> (© departamento da Mancha oferece um exemplo pet~ feito deste esboroamento. Para a imensa maioria dos 450 000 habitantes deste departamento, as grandes cidades, Caen, Rennes, Paris, aparecem muito longinquas, mesmo quando constituem 0 escoadouro habitual da emigragio (Gnuito mais longinquas provavelmente do que Dakar para Quolof ou um Toucouleur). 0 espago vivide do quo~ 0 fecha-se em redor da ealdeia», quer dizer, o lugarejo ‘A regido, muito préxima das suas raizes originais, nfo ultrapassa o horizonte de o dezinhas, contando a mais povoada, Cherburgo, perto de 80.000 habitantes, ¢ as outras menos de 20 000 habitantes, é de Cherbur; Carentan, Saint-L6, Coutances, ; ‘Avranches, Saint-Hilaire... que hd que procurar as «regises» da Mancha. Regies muito vivas, com efeito, com as suas feiras ¢ mercados, fabricas leiteiras, servigos, (crédito- agricola, notdrios, licens e escolas primérias, bailes ¢ cine- mas), comerciantes, por vezes novas fabricas, clientelas rurais, ¢ notéveis que assoguram a ligacio entre estas © os centros superiores de decistio. Mas entre Paris ¢ Saint-Hillaire-du-Harcouét nfo se encontra nada? Limitar-se-ia a regio a estas eélulas redu- zidas que reiinem no miximo de 30 000 a 100 000 pessoas? E forgoso reconhecer-se uma subdivisio em dois niveis para captar convenientemente a realidade objectiva, assim como fa pereepsio que dela tém os habitantes. principio do século, R. Musset sé a muito custo con- igum crédito a uma regifio do Baixo-Marne, confun- 18 ida defacto com o departamento da Mayenne (#8). O depar- tamento, 6 certo que, agora antigo de quase dois séculos, adquiriu na maior parte dos casos uma verdadeira consistén- cia regional. Cria uma rede de servigos obrigatérios, os da administragdo. Retine & volte das prefeituras os notveis & procura de recomendagbes ¢ de subvengves. «Ser da Man- cha» ou «ser da Mayenne» tem pois um sentido, ¢ como tal & sentido pelos habitantes. Mas a este nivel, as relagdes 36 florescem plenamente quando uma grande cidade em desen- volvimento thes confere toda a forga de uma atracgio sufi- ciente, Nem Saint-L6 na Mancha, nem Alengon no Orne, nem Laval na Mayenne t&m, por diversas razées, esse peso. ‘A sua influéneia permanece inferior & area do seu préprio departamento. Ao contrdrio, Caen € Le Mans, eujos aglo- ‘merados contam perto de 200 000 habitantes, desempentiam plenamente esse papel. A fungio administrativa vm com feito juntarse um coméreio e servigos de nivel superior ¢, ‘mais ainda, grandes fibricas atraentes para a mio-de-obra regional. Assim se modelam uma regio de Caen ¢ uma regio do Mans, um tanto mais vastas que o departamento do Calvados ou que o da Sarthe, Mas estas novas entidades, ‘cada vez mais afastadas das aldeias ¢ dos finages, nfo esca- parti 20 enralzamento? De facto, camponescs ¢ citadinos permanecem ainda frequentemente ligados pelo parentesco, Os rurais vio dade para 0s servigos, 0 comércio, as distracg6es, a visita As criangas... Muitos cita- dinos permanecem ainda profundamente ligados aos valores R, Musser, Le Bas-Maine, 1917, 182 rurais, Na cidade, as casas-correnteza ou os pavilhies com 8 vezes 05 substitutos dos espacos perdidos. FIG. 9.—As regides da Baixa-Normandia ¢ do Maine rts asseios, nos caminhos escavados, as merendas, a pesca, a

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