CAMÕES - Poesia Lírica

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CAMÕES (1524-1580)

CAMÕES_ POESIA LÍRICA (a expressão poética dos sentimentos)


Medida Velha: ritmo; sonoridade; jogos de palavras; recursos estilísticos; versos de redondilha menor e
maior.
Temática: preferencialmente o amor, também associado ao tema da saudade.
Estrutura: mote (pequena estrofe inicial) + glosa ou voltas (desenvolvimento): VILANCETE – mote de
2/3 versos e glosa de 7; CANTIGA – mote de 4/5 versos e glosa de 8, 9 ou 10 versos; ESPARSA – uma
estrofe com 8 a 16 versos.
VILANCETE CANTIGA
Descalça vai para a fonte Verdes são os campos,
Lianor pela verdura; De cor de limão:
Vai fermosa, e não segura. Assim são os olhos
Do meu coração.~
Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata, Campo, que te estendes
Cinta de fina escarlata, Com verdura bela;
Sainho de chamelote; Ovelhas, que nela
Traz a vasquinha de cote, Vosso pasto tendes,
Mais branca que a neve pura. De ervas vos mantendes
Vai fermosa e não segura. Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Descobre a touca a garganta, Do meu coração.
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado, Gados que pasceis
Tão linda que o mundo espanta. Com contentamento,
Chove nela graça tanta, Vosso mantimento
Que dá graça à fermosura. Não no entendereis;
Vai fermosa e não segura. Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
ENDECHAS Pretos os cabelos, ESPARSA
a Bárbara escrava Onde o povo vão
Perde opinião Os bons vi sempre passar
Aquela cativa Que os louros são
No mundo graves tormentos;
Que me tem cativo, belos.
Porque nela vivo E para mais me espantar,
Já não quer que viva. Pretidão de Amor, Os maus vi sempre nadar
Eu nunca vi rosa Tão doce a figura, Em mar de contentamentos.
Em suaves molhos, Que a neve lhe jura Cuidando alcançar assim
Que pera meus olhos Que trocara a cor. O bem tão mal ordenado,
Fosse mais fermosa. Leda mansidão, Fui mau, mas fui castigado:
Que o siso acompanha; Assim que só para mim
Nem no campo flores, Bem parece estranha, Anda o mundo concertado.
Nem no céu estrelas Mas bárbara não.
Me parecem belas
Como os meus amores. Presença serena
Rosto singular, Que a tormenta
Olhos sossegados, amansa;
Pretos e cansados, Nela, enfim, descansa
Mas não de matar. Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Ua graça viva, Que me tem cativo;
Que neles lhe mora, E. pois nela vivo,
Pera ser senhora É força que viva.
De quem é cativa./

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CAMÕES (1524-1580)
CAMÕES_ POESIA LÍRICA (a expressão poética dos sentimentos)
Medida Nova: dolce stil nuovo, um novo tipo de composição que, desde o séc. XII se cultivava já em
Itália.
Estrutura: soneto (14 vv. distribuídos em 2 quadras e 2 tercetos); versos decassílabos; rima
geralmente abba nas quadras; combinações de 2 ou 3 rimas no grupo dos tercetos.
Temática: a natureza (locus amoenus); amor platónico; ideal de beleza petrarquista (mulher idealizada,
inatingível, divina; Petrarca, poeta e humanista italiano, 1304-1374) + desconcerto do mundo; reflexão
sobre vida pessoal.

Um mover de olhos, brando e piedoso, Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,


Sem ver de quê; um riso brando e honesto, Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Quasi forçado; um doce e humilde gesto, Todo o mundo é composto de mudança,
De qualquer alegria duvidoso; Tomando sempre novas qualidades.

Um despejo1 quieto e vergonhoso2; Continuamente vemos novidades,


Um repouso gravíssimo e modesto; Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
Uma pura bondade, manifesto
E do bem (se algum houve) as saudades.
Indício da alma, limpo e gracioso;
O tempo cobre o chão de verde manto,
Um encolhido ousar; uma brandura; Que já coberto foi de neve fria,
Um medo sem ter culpa; um ar sereno; E em mim converte em choro o doce canto.
Um longo e obediente sofrimento3:
E afora este mudar-se cada dia,
Esta foi a celeste fermosura Outra mudança faz de mor1 espanto,
Da minha Circe4, e o mágico veneno Que não se muda já como soía2.
Que pôde transformar meu pensamento.
1.maior; 2. costumava
1.desembaraço; 2.recatado; 3.paciência;
4.feiticeira da mitologia grega.

A fermosura desta fresca serra Oh! como se me alonga, de ano em ano,


E a sombra dos verdes castanheiros, a peregrinação1 cansada minha!
O manso caminhar destes ribeiros, Como se encurta, e como ao fim caminha
Donde toda a tristeza se desterra; este meu breve e vão2 discurso humano3!

O rouco som do mar, a estranha terra, Vai-se gastando a idade e cresce o dano4;
O esconder do sol pelos outeiros, perde-se-me um remédio, que inda tinha;
O recolher dos gados derradeiros, se por experiência se adivinha5,
Das nuvens pelo ar a branda guerra; qualquer grande esperança é grande engano.

Enfim, tudo o que a rara natureza Corro após este bem6 que não se alcança;
Com tanta variedade nos of’rece, no meio do caminho me falece7,
Me está, se não te vejo, magoando. mil vezes caio, e perco a confiança.

Sem ti, tudo me enoja e me aborrece; Quando ele foge, eu tardo; e, na tardança,
Sem ti, perpetuamente estou passando, se os olhos ergo a ver se inda parece8,
Nas mores alegrias, mor tristeza. da vista se me perde e da esperança.

1.longo percurso; 2.inútil; 3. Passagem pela vida;


4.sofrimento; 5.se a experiência permite prever o
futuro; 6.felicidade; 7.falta; 8.aparece.

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