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Portugués | 12.° ano Pedro Silva- Elsa Cardoso: Susana Ribeiro Nunes LCS em dia Kit Exame em dia indice Provencccunersovis i | Educagao Literdria 12 a z Eco one + Representagdes do sentimento amoroso a2 + rica social “a3 + Mudanga “4 + Humor sétiraeironia 45 + Sentimento nacional eexisténcia coletiva 45 + Imaginério épico 46 + Sebastianismo a7 + Refloxdo existencial 48 + Arte posta ¢ Figuragées do posta 9 + Representagao do contemporéneo 50 + Letra a letra Glossério ~ Poesia trovadoresca 51 + Letra a letra - Glossério - Crénica de D. Joao |, Fernao Lopes 53 54 + Capitulo a capitulo ~ Sintese ~ Crdnica de D. Jodo |, Fern Lopes I A * Letra a letra - Glossério— Farsa de Inés Pereira, Gil Vicente 56 + Letra a letra - Glossério— Rimas, Lu's de Camées 59 + Letra a letra - Glossério— Os Lusiadas, Luis de Camoes 62 + Roflexdo a reflexdo - Sintese - Os Lusiadas, Lu's de Camoes 64 * Letra a letra - Glossério~ Sermo de Santo Anténio, Padre Anténio Vieira n + Capitulo a capitulo - Sintese - Sermo de Santo Anténio, Padre Anténio Vieira 74 + Letra letra - Glossério— Frei Lufs de Sousa, Almeida Garrett 78 + Ato a ato Sintese~ Frei Luis de Sousa, Almeida Garrett 381 + Letra a letra - Glossério- Amor de Perdi¢ao, Camilo Castelo Branco a5. + Capitulo a capitulo - Sintese ~ Amor de Perdi¢go, Camilo Castelo Branco a7 + Letra a letra - Glossério~ Os Malas, Ega de Quelrés 90 + Capitulo a capitulo - Sintese ~ Os Maias, Ega de Queirés 94 + Letra a letra - Glossério- Sonetos Completos, Antero de Quental 100 tra a letra — Glossario — Canticas do Realismo, Cesario Verde 102 * Letra a letra - Glossério - Fernando Pessoa orténimo 104 + Letra a letra - Glossério— Alberto Caeiro 105 + Letra a letra - Glossério— Ricardo Reis 106 + Letra a letra - Glossério- Alvaro de Campos 107 * Letra a letra - Glossério— Mensagem 108 + Poema a poema- Sintese - Mensagem 110 + Letra a letra - Glossério- Contos 126 + Letra a letra ~ Glossério~ Poetas contemporaneos 129 + Letra a letra ~ Glossério- Memorial do Convento, José Saramago 130 + Capitulo a capitulo - Sintese ~ Memorial do Convento, José Saramago 134 * Letra a letra - Glossério— 0 Ano da Morte de Ricardo Reis, José Saramago 140 * Capitulo a capitulo - Sintese ~ 0 Ano da Morte de Ricardo Reis, José Saramago 144 + Glossério de Educagao Literdria 150 Tem osebastinismo em Mensagem : Fe Luis de Sousa ferindo uma manifestagao significativa do sebastianismo em cada uma delas: = uma conclusdo adequada ao desenvolvimento do tema. ee {pelo menos) és pargratos tem adapta de Brame Pt Necona de Prt, 2022.1 Fase, AVE “ee (qaticanent demarcadse AOE devdamente proprcionaos ou ej, “Tila de conto: Sebastansmo ; aa chon ede ae Mensagem Frei lus de Sousa fungi + Milo — oo inspiradora + Histra — cenga no retro de » iodo, + Creneumesiniceoregtesso —_D.Sebasto Baia cde um salvador nacional + Figo — personagens sebastanistas ~omeusin eantiregreso de D. Joo Para a elaboragao da resposta, atenta nas indicacées fornecidas pelo enunciado, ‘Além dos aspetos de conteuido, 0 teu texto deve estar escrito com corregae linguistica, Lu Sugestie de resposta: ° A figura de D. Sebastido, rei desaparecido na batalha de Aleécer Quibir em 1578, ocupaum = S lugar de destaque quer em Mensagem, de Fernando Pessoa, quer em Frei Luis de Sousa, de & Almeida Garrett Na obra épicovlirica de Pessoa. 0 sebastianismo, de impossivel concretizagao histérica em pleno século XX, ultrapassa a crenga no regresso do rei vivo e adgquire contornos de mito. Assim. ‘© monarca assume-se como a figura inspiradora de uma regeneracdo nacional, icone da sloucuras positiva que fecunda a realidade e promove o renascimento do pais, decadente ¢ perdido no snevoeiror descrito no iltimo poerna da obra. Em sentido distinto, em Frei Luis de Sousa 0 sebastianismo emerge numa perspetiva histdrica. A peca recria 0 contexto de Portugal sob o dominio filipino, em que subsiste a crenca nacional de que D. Sebastiéo ndo morreu na batalha de Alcdcer Quibir e ha de regressar, devolvendo ao pals a independéncia e a liberdade perdidas. Tal crenga € expressa por diversas personagens fortemente sebastianistas, como Telmo, que, vinte e um anos passados sobre a fatidica batalha, mantém a esperanca de que 0 seu antigo amo, D. Jodo de Portugal, estja vivo eregresse, 0 que significaria que D.Sebastido poderia também regressar. Deste modo, a Histéria alia'se & fegdo e explora-se, com a chegada do Romeiro ¢ as suas consequéncias catastroficas, 0s possivels efeitos da concretizagao da mensagem sebastianista Desenvolvimento Em conclusdo, embora o rei desejado assuma uma presenca significativa em ambas as obras, essa presenca corresponde a dimensdes distintas, evoluindo da vertentehistérica, ficcionalmente explorada, em Frei Luis de Sousa, para a vertente mitica em Mensagem. a Conclusée aS Item de resposta restrita - Exposi¢ao sobre um tema Exercicios orientades - Escrita Praticar + +0 que coloca Fernao Lopes fora de toda a comparacao na nossa literatura e talvez em todas as literaturas é 0 modo como ele dé vida as multiddes alvoracadas» [APA M origues Lapa 190. Lies de Literatura Portuguesa Fpoce Medieval $d. Coimbra: Coimbra Féitor, 0, | Lopes, escreve uma breve exposi¢ao sobre a emergéncia de uma consciéncia _énetaetual coletiva do povo portugués. Baseando-te na tua experiéncia de leitura da Crénica de D, Jodo |, de Fernao i 5 ‘Atua exposigao deve incluir: LO Tema = uma introdugao ao tema; = um desenvolvimento no qual refiras diols momentos em que as «mult agadas» revelem 0 desabrochar de uma consciéncia c = uma concluséo adequada ao desenvolvimento do tema. letiva; Item etopicos ce eontesdo adaptados de Exame Fn Nacional de Portugués, 2029.1 Fase, IAVE orespetivos Cities de Classicagdo Tépicns de conte, ‘Aconscincia clea enquant vlorieao da identdade nacional eda vontae pop, facet ameca de pera da utonamia plc (morte dD. Fernando pretenso ao tron dD. Jodo | de Castel cise de 1383-1385). Momentas de revelago da consiécia cletivanaCcnca de Jd ~ quando cule a noticia de que o Mestre de Avs core perigo de vida, uma muito mavimenta-se em deco oo Pago, em ‘grande agitogo para proteger aquele que pode goant « independénca de Prtugo ~ quando planeiaassatar o Pac da nha, opovn de iso insurge-se contra aregente Dona Lenn acusando-a de ser tradora/ealeivasa, por defender os intressescastehanos, ~ quando do cerc de Lisboa, todas se unem para guarnecer as muralhas €asseguraro transporte de mantimentas para dentro da cidade permitindo a resstncia ao invasorcostelhana. Para a elaboragao da resposta, atenta nas indicagées fornecidas pelo enunciado relativamente ao género a produit, tema ¢ estrutura do texto. ' Assegura-te de que ' + escreves um texto de cardcter demonstrativo, ou seja, que expde o teu conhecimento sobre a Crénica de D. Jodo |, comprovado com factos e/ou exemplos da obra: * defines uma estrutura textual tripartida: introdugo, desenvolvimento e concluséo. Estas trés partes devem distinguir-se, graficamente @ em termos de assunto, ¢ devem ser devidamente proporcionadas, isto 6, ter uma extenso apropriada a sua fungdo, A introdugdo ea conclusa0 | coneretizam-se num paragrafo breve, nunca mais extenso do que o desenvolvimento, ' + garantes a progressdo tematica do texto, itroduzindo a informagaio de forma gradual e pertinente; + rediges com corregdo linguistica, atentando na ortografia (incluindo acentuacdo, translineagao & Uso apropriado de letra maidscula cu de letra mindscula), na pontuaco, nas normas de citagao e de referéncia a titulos, assim como na estruturagao sintatica do discurso, 20 Praticar + Item orientado ‘Ao longo da vida, 0 ser humano é sistematicamente confrontado com 0 medo, procurando lidar eficazmente com esse sentimento, ‘Omedo condiciona o comportamento humano? Num texto de opiniéo bem estruturado, com um mi imo de duzentas e um maximo de trezentas e cinquenta palavras, defende uma perspetiva pessoal sobre a questdo apresentada. No tou tex = explicita, de forma clara e pertinente, 0 teu ponto de vista, fundamentando-o em dois argumentos, cada um deles ilustrado com um exemplo significativo; = formula uma conclusao adequada & argumentagao desenvolvida; ~ utiliza um discurso valorativo {juizo de valor expiicito Item de resposta extensa - Texto de opiniao ‘Tea 0 meso eo compartaenta humana Género textual «produit ~ Texto de opinido texto argunentativ, qe apresenta 4 pespetva do autor sabe um tema oo fact, sustentada por argumentase exempios, Estrutura riparia — ts momentos = (bel mencs)tés prdgates(rafcamente demaveaes edevidamentepopoconas, ou seg com una etensioadequada& sua fungi) + inodugo(ponto de vist) + desenvolvimento (ergumentos e exempls), ‘ou implicito), i » conciustio. Para a elaboragao da resposta, atenta nas indicagSes fornecidas pelo enunciado. ‘Além dos aspetos de contetido, 0 teu texto deve estar escrito com corregae linguisti Sugestio de resposta: 3 A quesizo rete para aposibildade deo medo lmitar a apo humana, ponto de vista face ao qual apresentamos uma Tatese efetvamente de uma emocto aut em determinadas cveunstoncies bade Ataumento conuicionm sionifcativarente o nose comportamenta ievando-nos ano ast 2 0 sssumizuma perspetva ouando tomaruma decsde Analisemos.atituledeexemole,e. Exemele eandar deevide Estemeled E 2 dries 3 Porém, numa orientagdo oposta, o medo pode também, enquanto reflexo defensivoda — Argumento 3 nossa mente, constitute como ui far fundamental de beneetar ox. no Hints d sabrevincia Aocaminhermes.porexemelo pete dum penhescoperesemesaue dois Exel nte, te perspetiva perfeita para uma fotografia de sonho. Te medo. prudente impede-nos_ de avancar. Trocamos uma fotografia unica pela nossa Emsuma, entendemos que omedo podeafirmar-se como um sentimentocondicionante, emsentido negativo, mas igualmente positive. O equilibria estaré na conciliagdo delicada dos niveis de emedo mau e de «medo born, porque nenhum deles depende exclusivamente davontade humana e ambos sao predominantemente determinados por fatores psiquiicos inconscientes. 8 é a a Sistematizacgao das linhas tematicas de Educagao Literaria (10.°, 11.° e 12.° anos) Representagées do sentimento amoroso Poesia trovadoresca Cantigas de amigo + Avariedade do sentimento amoroso (amor, saudade, alegria, raiva, tristeza... + O drama sentimental da donzela (aparentemente esponténeo e natural). + Aconfidéncia amorosa (amigas, mae, Natureza). Cantigas de amor + Accoita de amor (softimento amoroso) e 0 amor cortés: a wsenhor» ¢ 0 sofrimento do poeta. + Oclogio cortés. Rimas de CamBes + amor como sentimento complexo, inexplicével e paradoxal. * Acentralidade e superioridade do Amor (entidade referida com recurso 8 maidscula). + A mulher amada marcada pela perfeigéo fisica e espiritual (retrato idealizado, & maneira petrarquistal Amor de Perdi¢ao + O.amor-paixéo: forte, transcendente (realizando-se na morte) e de cardcter quase sagrado, absolute. + O.amor igado a unio fisica e, sobretudo, espiritual. + O.amor subjugado as convengdes sociais, Cesério Verde + Amuther, objeto de sentimentos diversos: a mulher natural, simples e fragil, que desperta admiragao e carinho; a mulher fatal, bela e fria, que seduz e se ‘associa (negativamente} a cidade. Gil Vicente Farsa de Inés Pereira + Ocasamento como projeto de libertagao e de promogao social, + Odesejo de um marido «avisado» e «discreto» ea wexperiéncian, que da «licao». + Asoguranga de um marido «rico, honradon. Auto da Feira + Os casamentos infelizes como exemplo do «mundo as avessas». Frei Luis de Sousa + Osentimento amoroso de cardcter trégico e inviabilizado (forga do destino e da ordem social. (Os Maias' + Oamor-paixao ea instabilidade emocional (Pedro da Maia). + Avolubilidade amorosa (Carlos da Maia, antes do envolvimento com Maria Eduard). + Oamor-paixio e a tragédia (Carlos da Maia). + Asensibilidade romantica e 0 erotismo (Ege), Poetas contemporaneos + Continuagao da longa tradigao ltersria do ‘tema do amor, abordaco em miltiplas variantes, José Saramago ‘O Ano da Morte de Ricardo Reis + O.amor natural, espontaneo, sem artificios & imune as convengoes sociais (Ricardo Reis © Lidia, mulher simples e sensual. + O.amor socialmente ritualizado (Ricardo Reis ¢ Marcenda, mulher idealizada, mas fisicamente limitada). ‘Memorial do Convento + O.amor natural, sincero, espontaneo, sensual, sem artificios e imune as conveng6es socials, (Baltasar e Blimunda) + «amor» artificial, protocolar, marcado pela ritualizagao e pelas conveng6es (0, Jo Ve D. Maria Ana Josefa) 1 Acaptad de RES. Carlos, 2016. Os Mais Epa de Ques: Port: Post Era pp 45-50, 42 ica e mudanga social Poesia trovadoresca - Cantigas de escérnio e maldizer * Acritica social de recorte caricatural + Adimensao satirica: a critica de costumes, Gil Vicente Farsa de Inés Pereira Auto da Feira + A dimensao satirica: + Arepresentagao alegorica: —oposigao de interesses e concegdes de vida -o conflto ~a critica as supersti¢oes; intergeracional; =a dentincia da corrupgao da Igreja; =o casamento como projeto de libertagao e de promogdo =a censuraa crise de valores. social ~ os conflitos socials em poténcia; as mudangas sociais ea crise de valores. Rimas de Camoes Os Lusiadas de Camées + Odesconcerto do mundo: + Asreflexdes do poeta e 0 tom antiépico: consideragoes confusao, arbitrariedade, ideol6gicas e propésitos moralizadores e didaticos. ambigao, injustiga, * Critieas: conflituosidade, =a falta de cultura nacional (0 desprezo pelas artes e pelas letrast; desorganizacao (crise =a ingratidao e & falta de reconhecimento do mérito; de valores) =a0 poder do dinheiro e aos meios indignos de atingir a fama; + Amudanga social e moral =a decadéncia moral do pais. Contos «Sermao de Santo Anténion + «Georger: a dentncia do preconceito social. + Acritica social de base alegérica~as virtudes + «Familias desavindasy:aironia ea apresentagdo __@ os vicios dos peixes como representago humoristica de aspetos pessoais, profissionais metaférica dos defeitos humanos: e sociais, ~ desrespeito pela palavra de Deus; + «Sempre uma companhian:acriticaaocontexto _—_— fraqueza, explorago, arrogancia, parasitismo, histérico, marcado pelo isolamento sociopoltico, ambig0, vaidade, hipocrisia e traigéo. ‘Amor de Perdi¢io Os Maias + Aobra como crénica da mudanga social: | - Acritica social na crénica de costumes (personagens a revolta e o desencanto face ao pais; e episédios representativos da sociedade portuguesa —oherdi romantica em conflito com os dda segunda metade do século XIX): jantar no Hotel valores morals @ as convencées Central, corridas em Belém, jantar dos Gouvarinho, sociais. episédios dos jornais, sarau do Teatro da Trindade. Poetas contemporaneos Continuagao da longa tradigao literéria dos temas criticos e alusivos 4 mudanga, abordados em miltiplas variantes. José Saramago (O Ano da Morte de Ricardo Reis Memorial do Convento * Arecriag3o do ambiente da Lisboa de 1936 (contexto + Adeniincia dos contrastes socials, histérico, politico ¢ ideolégico): a propaganda ea realidade. do tempo da historia (século XVII), * Critica da visto social determinada pela eresignagao, + Areleitura da Hist6ria e a exaltaco hhumildade, paciéncia» (0. 11 da obra) do povo, denovos heréis: 0 povo, 43 Mudanga Poesia trovadoresca CrénicadeD.JoaoldeFernaoLopes Cantigas de escdrnio e maldizer + Amudanga politica e a crise de sucesso + Adimensdo satirica e a dendncia de comportamentos __-_como momento de afirmagao da desviantes dos cédigos da época, consciéncia coletiva, Gil Vicente Farsa de Inés Pereira + Amudanga pessoal de Inés e a sua evolugao: do desejo de um emarido avisado», & wexperiéncia que dé ligdo» (com o Escudeiro Brés da Mata) e 3 opeao por um «muito manso matido» (Péro Marques). + Amudanga social, na sequéncia dos Descobrimentos, e a satira (com recurso a personagen: ‘20 cémico) denunciadora das transformages vividas nesse «mundo novo»: a ambigao material, a subverséo dos valores morais (crise de valores). Rimas de Camées Os Lusiadas de Camées + Amudanga individual: reflexio sobre a vida + As reflexes do poeta e as consideragées pessoal e 0 desconcerto, ligado 3 desilusao face sobre a sociedade em mudanga ea crise a existéncia e 20 destino impiedoso. de valores: + Amudanga da Natureza, inspiradora da aceitago ~afalta de cultura nacional e o desprezo da renovagao ciclica, da passagem inexorével do pelas artes e pelas letras: tempo e dos seus efeitos. 0 poder do dinhe'ro ea corrupeao + Oudesconcerto do mundo»: as transformagées moral econémicas, sociais e morais e a degradaco de = «vl tristeza do pats. valores de uma sociedade em profunda mudanca. Frei Luis de Sousa ‘Amor de Perdi¢ao + 0 Sebastianismo associado 8 + Amudanga social refletida no conflto entre o par Simao/ ‘mudanga politica e, enquanto fic¢o, Teresa e as respetivas familias, ligado & possivel mudanca da familia, | + O confronto entre o desejo de renovacao e a afirmacao + Adentncia das convengdes sociais dos sentimentos individuais (0 amor-paixo) ¢ os valores ea inspiragao para amudangae para | da sociedade conservadora. a aceitacao social dos filhos, + Acritica a incapacidade de mudanga do mundo antigo, considerados ilegitimos, marcado pela forga da honra e do dever social «Q sentimento dum ocidental» + Asubversdo da meméria épica como forma de deniincia das mudangas operadas na capital entre os s€culos XVI eo tempo da escrita do poema (final do século XIX). Contos + «Georgen: as metamorfoses da figura feminina, + «Familias desavindas»: as mudangas historicas e sociais ¢ a evolugdio da relago entre as familias, + «Sempre 6 uma companhiay: a mudanga promovida pela chegada da telefonia, com a passagem da solidéo & convivialidade. Poetas contemporaneos + O tema da mudanga, explorado de miiltiplas e diversificadas formas. Humor, satira e ironia Poesia trovadoresca - Cantigas de escérnio e maldizer * Acritica individual ou social de recorte caricatural. + Orecurso a sétira (reprovagao e critica, com intuito didético) e ao cémico. + Adimensao satirica: a parédia do amor cortés e a critica de costumes. GilVicente Farsa de Inés Pereira Auto da Feira + Adimensao satrica: + Arepresentagdo alegérica: 0 casamento coma projeto de libertacao e de promogao a critica as superstigdes; social; a dentincia da corrupgao da Igrejay ~as mudangas sociais ea crise de valores. a censura a crise de valores. * Orecurso ao cémico, + Orecurso ao cémico, «Familias desavindas» de Mario de Carvalho + Oinséiito (a humanizagao da maquina). + Acredibilidade histérica ea verosimilhanga da narrativa através da referéncia a marcos histéricos. * Os insultos. Os Maias Poetas contemporneos * Aironia na representagao de espagos sociais, * Continuagao da longa tradigSo iteréria do 20 servico da critica de costumes, humor, abordado em mittiplas variantes. Sentimento nacional e existéncia coletiva Cr6nica de D. Jodo I de Fernao Lopes + Acriagao de uma meméria nacional: grandes feitos e grandes herds, protagonistas da identidade coletiva, + Atores individuais (D. Jodo le os seus adjuvantes). + Atores coletivos: 0 povo, sobretudo 0 de Lisboa. + Aafirmagao da consciéncia coletiva: a forga e os sacrificios dos atores na defesa dos interesses. rracionais, Os Lusiadas Frei Luis de Sousa + Amatéria épica: os feitos histéricos, a + A dimensdo patriética ea sua expresséo viagem e a mitificagao do heréi simbélica. representante da coletividade. + A defesa dos interesses e da identidade coletiva + Aafirmagdo da identidade coletiva (Manuel de Sousa Coutinho). Mensagem Poetas contemporaneos * Adimensao épico-ltica ea exaltago * Continuagao da tradigao literéria da abordagem patridtica. do sentimento nacional e da existéncia coletiva, * Adimensao simbélica do herdi, ‘sob miltiplas variantes e com particular destaque representante da coletividade, para 0 periodo do Estado Novo. 45 Os Lusiadas, Luis de Camées Cc=D Letra aletra Glossadrio Dedicatéria Parte da estrutura interna da epopeia em que o autor oferece a sua obra. No caso de Os Lusiadas, a Dedicatéria ¢ dirigia a D. Sebastiao, o monarca no poder aquando da publicagao da = obra, e ocupa as estancias 6 a 18 do Canto Epopeia Poema narrativo (narrativa em verso), marcado pela beleza da expresso, destinado celebrar ages elevadas e grandiosas cometidas por um her6i de valor excecional, Heréi Protagonista de feitos extraordingrios que merecem louvor e reconhecimento. © herdi de Os Lusfadas, ao contrério dos das epopeias anteriores, € real e coletivo/maltiplo, uma vez que Camées procura celebrar as qualidades notaveis dos portugueses, representados nos protago- nistas da primeira viagem maritima a India e em figuras destacadas da Historia de Portugal. Histéria de Portugal Plano narrative em que sao relatados acontecimentos da hist6ria nacional. Surge encaixado no plano da viagem e a sua apresentagdo é da responsabilidade de figuras histéri- cas (Vasco da Gama e Paulo da Gama) e de entidades mitologicas, que se Ihe referem em prolepses (relatos de eventos cronologicamente posteriores). liha des Amores Espago ¢ episédio destinados a glorificagao do herdi por meio da recompensa preparada por Vénus. A racegao dos portugueses na Ilha dos Amores, na viagem de regresso @ Portugal, corresponde ao ponto maximo da mitificago, a que os lusitanos recebem «o prémio ano fim, bem merecido» (Canto IX, est 88, v. 7) pelos seus feitos, através da satisfagao dos sentidos, com as ninfas, e do acesso ao conhecimento maximo (Maquina do Mundo e profecias) In medias res Técnica narrativa que consiste em nao contar os acontecimentos segundo a ordem cronolégica por que ocorreram, mas comegar 0 relato jé num ponto avangado da ago. No caso de Os Lusfadas, a narragao inicia-se quando a viagem de Vasco da Gama a india se encontra jé na costa oriental africana, Sé posteriormente, por meio da analepse (recuo temporal da narragao, para contar eventos precedentes) se conhecem os acontecimentos anteriores a esse momento da viagem, contados pelo préprio Vasco da Gama (ao rei de Melinde). Invecagae Parte da estrutura interna da epopeia em que o autor solicita a protego ou inspiragao 2 uma entidade. Em Os Lusiadas, a Invocagao, que ocupa as estrofes 4 5 do Canto |, é dirigida as ‘Tagides, as ninfas do Tejo, a quem 0 poeta pede auxilio para conseguir 0 tom «alto © sublimado» que deseja para relatar adequadamente os grandes feitos do herd lusfada Matéria épica Conjunto dos elementos que constituem o objeto da epopela e em torno dos quals, ¢ respetiva excecionalidade, se desenrola o relato. Corresponde, no caso de Os Lusiadas, ao conjunto dos acontecimentos e das entidades merecedoras da exaltacao épica (factos e herdis da viagem de Vasco da Gama a India em 1497-1498 e da Hist6ria de Portugal). 0 62 cD Os Lusfadas, Luis de Camées Mitificagae de heréi Processo de construgao e valorizagao gradual do herbi, através da superagao dos diversos obstaculos (naturais, humanos e mitolégicos) com que se depara. Corresponde & forma como, de modo progressive, no decorrer da narragdo € com o contribute dos diferentes planos, o heréise eleva a um patamar de exceléncia e garante a sua imortalidade, tal como é apre~ sentada na Proposigdo: a libertagao da «lei da Morte» através da coneretizagao de «obras valero- ‘880 (est.2, w.5-6) € a obtengo da imortalidade. Mitologia Plano narrativo dedicado a intriga mitol6gica que acompanha a viagem da armada de Vasco da Gama até a India, em 1497-1498. Centra-se nos acontecimentos protagonizados pelos deuses em reagao a atuagao dos portugueses e que decorrem em paralelo com esta, Vai sendo dado a conhecer de forma alternada com o plano da viagem. A mitologia contribu, em Os Lusiadas, para a diversidade e para 0 dinamismo da ago e contribui também, de maneira relevante, para © proceso de mitficagao do herdi lusiada, que atinge o seu ponto maximo com a rececao dos marinheiros na liha dos Amores, No confronto com os deuses oponentes ou com os obstéculos por eles preparados, o herd revela a sua ousadia ereforga o seu carder extraordinario; 0 apoio & 2 ajuda dos deuses adjuvantes conferem-the relevancia e conduzem ao reconhecimento da sua condigao sobre-humana. Narragio Parte da estrutura interna da epopela em que se relatam os acontecimentos que contri- buem para a exaltagao do herdi, Em Os Lusiadas, a narraco inicia-se na estancia 19 do Canto |, in medias res, segundo as regras do género épico, e desenvolve-se em trés planos narratives distintos (plano da viagem, plano da Hist6ria de Portugal ¢ plano da mitologial Planes Linhas narrativas centradas num determinado tema (viagem, Histéria de Portugal, mitologia) ou consideragdes sobre assuntos de valor intemporal, criticas e conselhos aos portugueses (refle= x6es do poeta}. Parte da estruture i terna da epopeia em que o autor apresenta aquilo que propée para a ‘sua obra, enuncia o seu objetivo e expde o assunto que vai tratar. Em Os Lusiadas, corresponde as trés primeiras estrofes do texto, nas quais o poeta anuncia a sua intengao de divulgar, através do ‘seu canto, 0s feitos do «peito ilustre Lusitano», capazes de, pelo seu «valor mais alto», fazer esque= cer tudo o que a «Musa antiga» cantara, ou seja, capaz de suplantar os herdis e as epopelas ante- riores (Cantol, est. 3. w. 7-8) Reflexées do poeta Plano (nao narrativo) de Os Lus/adas em que o poeta, geralmente em momentos correspondentes ao final de cantos e na sequéncia dos acontecimentos anteriormente relatados, tece consideragées sobre tematicas de valor universal ¢ intemporal ou reflete sobre os portugue- ses do seu tempo, dirigindo-Ihes criticas e conselhos. Correspondem a uma vertente antiépica da epopeia, uma vez que a visdo heroica dos lusiadas do passado o poeta contrapde, num tom mais subjetivo, uma visao mais disférica da realidade do seu tempo, numa perspetiva didatica e morali- zadora e contribuindo para a definigao de um ideal de herd Sublimidade do canto Qualidade e perfeigo do estilo épico, de forma a fazer corresponder & exce- léncia da matéria épica uma linguagem e uma forma de expressdo adequadas. Corresponde & , No conjunto dos seus «pares que ele considera serem «tao grandes, os seus irmaos, a Inclita Geracdo, ele nao foi ninguém. Dotado de uma alma «Virgemmente parada», sem atividade ou audacia, D. Joao considera te sido um indtil eleito de Deus. Porém, como reconhece ser préprio da natureza do povo portugués” ter ou sero tudo ou o nada—«0 todo, ou 0 seu nada», ele terd sido o nada* D, Sebastiao, Rei de Portugal Manual-p.119 © poema apresenta o dramatismo do discurso na L* pessoa, num ato de afirmagao e, ao mesmo tempo, de autointerpretagio. Tomando a sua prépria vor, D. Sebastido interpreta-se, wnarrav asua historia, projeta-se no futuro e expie-se a teflexao filoséfica £ um ew que se distancia, que se desdobra, que se tora em sentido de si mesmo, objeto/sujeito. 0 tépico é o da loucura positiva, o da loucura como sin- gularidade na ousadia, no espfrito de aventura, na coragem, no tentar ultrapassar os limites da mediania, de que D. Sebastiao é tomado como simbolo, O sinal positivo na figura contrapée-se ao sinal negativo na sua tentativa de realizagio. Loucura que se outorga, como heranga, Aqueles que estardo, talvez, na hora certa, em que a sorte sera favoravel & grandeza, O desdobramento do significado da figura: «o ser que houver— temporal, circunscrito a um momento histérico em que se es- gotou; «ndo o que ha» - intemporal, que permanece no homem habi- tado pela loucura do desejo de grandeza. A sugestio factual é muito leve, esbocada, estilizada, evocada em pequenos tracos: 0 «areals ea sua correlagio com o titulo, recria evocativamente a cena desastrosa da Batalha de Alcécer Quibir.[] Voz de um rei dando testemunho de uma experiéncia que falhou de facto, mas permanece em esséncia ¢ aqui é anunciada como catalisa- dora da vontade, da loucura de um povo, que parece ter-se esquecido desi mesmo e ter-se deixado amortecer” I.ACoroa Nun Alvares Pereira (© destaque, na figura de Nuno Alvares Pereira, é dado a espada, que concede uma auréola personagem, atribuindo-lhe grandeza Foi com a espada que ele se notabilizou, de tal forma que é ‘comparada a Excalibur do rei Artur. Foi com a espada que ele nos indicouo caminho a seguir, mas Portugal precisa da luz e do brilho dessa espada para ver a estrada e assim poder segui-la © poema é um louvor ao guerreiro santo que viveu no reinado de D. Joao Ie se distinguiu na célebre batalha de Aljubarrota [. © poema termina com uma prece, pedindo a sua intervensao para ajudar Portugal a ver 0 ‘caminho e poder seguir em frente* 14 => Mensagem, Fernando Pessoa & V0 Timbre A Cabeca do Grifo: O Infante D. Henrique Em Mensagem, ha dois poemas dedicados ao Infante D. Henrique, este eo que abre a segunda parte do poema, Mar Portugués. Henrique, 0 navegador, o mais famoso membro da Inclita Geragio, iniciador da aventura maritima portuguesa com a expedi¢ao a Ceuta em 1415, é apresentado como um ser solitério - «Com seu manto de noite e solidao»- inteiramente dedicado sua missao: a de descobrir um mundo novo. Este mundo do «mar novo» e das «mortas eras» faz dele o tinico im- perador do mundo, porque sé ele possui a chave do verdadeiro poder, o conheci- : ‘mento: «O (inico imperador que tem, deveras, /O globo mundo em sua mao. © antetitulo do poema é claramente simbélico. O grifo é uma criatura endaria com asas de aguia e corpo de ledo. A sua insergao em muitos brasées deve-se ao facto de o grifo ser apresentado como uma enti- dade repleta de virtudes sem nenhum vicio. Assim, aoescolheriden- @ tificar o Infante D. Henrique com a cabeca do grifo, o poeta atribui- -lhe o papel inspirador dos descobrimentos portugueses* Uma Asa do Grifo: D. Jodo 0 Segundo (© Rei perscruta «o mar que possa haver além da terra». A abertura dos mares e as sucessivas descobertas de praias e terras estranhas assustou nao s6 o mundo ocidental, conjugado de longa data para encontrar o caminho maritimo para as Indias, como também o Oriente, receoso da perda das suas influéncias comerciais: «E parece temer o mundo vario / Que ele abra os bracos e Ihe rasgue 0 véus.’ ‘A Outra Asa do Grifo: Afonso de Albuquerque Aponta para Afonso de Albuquerque, [.] Vice-Rei da India, grande conquistador e funda- mento da estabilidade dessas paragens, sujeitas ao Império Portugués. [.] © Império Colonial Portugués, criado e alargado facil e rapidamente («como quem desdenha») por Albuquerque, estaré seguro. Portugal sera entao o centro do mundo comercial e cultural Hiperbolicamente retratado - «Tao poderoso que nao quer o quanto / Pode [.., «Calcara mais que 0 submisso mundo» — Afonso de Albuquerque foi, no seu tempo e nas paragens remotas, motivo de admiracao pela sua capacidade nao s6 conquistadora como também civilizadora, con- seguindo abarcar o dominio daqueles que formaram os «trés impérios» mais conhecidos da Histéria: 0 Babilénio, o Oriental Medo-Persa e o Classico, fundindo-os numa civilizagao tinica, feita de varias e diversificadas gentes, usos ¢ costumes” .* Parte - Mar Portugués - Possessio Maris (Posse do mar) 1.0 Infante ‘Um dos mais singulares poemas de Mensagem, evidencia a nova representacao da Terra apés ‘a «Posse do Mar» pelos Portugueses: — Uma nova visio geografica: a Terra nao jé retangular, como outrora fora pensada, mas sredondae; 15 16 & ‘Mensagem, Fernando Pessoa a= —Um novo estatuto para 0 «Mars: «Que o mar unisse», como o Mediterraneo sempre unira o$ povos das suas «orlasy e «a nao separasse», Por outras palavras, o mar estatuisse como um novo # ‘caminho entre os povos e continentes. © poema reflete, assim, uma profunda revolucao histérica, geogréfica, cognitiva e antropolé ica, que diferencia radicalmente a visdo antiga e medieval do mundo, fechado sobre a Europa, de uma visao moderna, aberta e conhecedora dos restantes continentes, de oriente a ocidente. Como habitual na sua interpretagao, Pessoa considera poeticamente que o povo autor de tao imensissima obra histérica nao a poderia ter realizado sem o auxilio da vontade de Deus, impul- sionador da acdo do Infante D. Henrique («Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. / Deus quis que a terra fosse toda umav). Assim, como sempre em Mensagem, o plano divino, providencialista ‘e messianico, impde-se ao plano historiogréfico, elevando a a¢ao dos Descobrimentos a um pata~ mar sagrado. Por isso, reza eDo mar e nés em ti nos deu sinal», isto é, Deus, por via do Infante D. Henrique, anunciou veladamente o estatuto de Portugal como pais de um povo eleito ou ins- trumento divino de unificacao do mundo. Porém, na iiltima estrofe, o orgulho maximo («Quem te sagrou criou-te portugués.), levando a realizagao de um império material («Cumpriu-se o mary), anuncia igualmente que este, blo- queado, se desfez, foi suspenso, sé se realizando efetivamente quando, mais tarde, se instaurar o Quinto Império, ou, dito de outro modo, «Senor, falta cumprit-se Portugal!» Horizonte O titulo sugere distancia, o que anossa vista pode alcangar olhando para longe e, relacionando-o com o «Mar Portugués», imaginamos a linha do horizonte, aquela linha de contacto aparente entre o céueaterra A primeira estrofe comega por uma apéstrofe, o poeta dirige-se diretamente ao mar, personificando-o ao falar para o mar antigo, o mar desconhecido que metia medo, mas onde existiam ja «coral e praias € arvoredos». Com o infcio das descobertas mariti- mas, depois que se venceu o medo e que foram ultra- passados os obstaculos ¢ também o que era desconhe- cido e misterioso como a noite, o nevoeiro, o Longe, metaforizado numa flor que se abre, revela as primeiras aus 0 que era oculto, assinalando esse momento feliz A primeira estrofe constitui a primeira parte do poema, ou seja.a viagem, o percurso de iniciacao, A segunda estrofe, ao referir-se a linha abstrata do horizonte que vai desaparecendo, traduz ‘em sintonia um movimento de aproximagao progressiva a costa: primeiro, «érvores» ao longe, depois «sons e cores e finalmente, quando desembarcam, jé veem «aves, flores» Esta visdo de um mundo novo constitui a segunda parte do poema. A terceira parte, constituida pela tiltima estrofe, fala-nos do sonho que, com esperanga e von tade, foi concretizado, Fala também do impulso necessério para avancar e descobrir, na linha fria do horizontes onde nada se via, a recompensa («Os beijos merecidos da Verdade.») traduzida zna enumeragao «A arvore, a praia. flora ave, a fontes.* exp Mensagem, Fernando Pessoa UL, Padrao: Diogo Cao ¢ o emissor da mensagem poética. No século XV, este navegador portugués desco- briu o estuério do rio Zaire (1482 ou 1484) e atingiu, numa outra viagem, o limite meridional de ‘Angola (talvez.em 1486), No poema, Diogo Cao afirma que conquistow a distancia, ultrapassou todos os obstaculos e conseguiu superar-se a si mesmo. Consciente da sua pequenez enquanto homem - «0 homem & pequenos -, o navegador reconhece, no entanto, ser protagonista de uma grande obra, a conquista do mar - «obra ousada». Diogo Cao afirma-se, pois, como her6i que, ao saber interpretar a vontade divina, ousou ir sempre além. Para diante navegou, mas, em cada «areal moreno», deixou um padrao. A conquista de novas terras era assinalada por um padrao, cujas quinas relembram que o mar sem fim é por- ‘tugués e cuja cruz, simbolo da fé crista, anima a febre da descoberta permanente — «0 porto sem pre por achar» Como acontece ao longo de Mensagem, Deus toca o homem, projeta-lhe um determinado destino eo homem cumpre, invariavelmente, esse destino para que foi designado, Por isso, Diogo Cao reconhece a sua intervencao neste projeto de raiz divina e que se caracteriza por uma demanda constante do desconhecido—«é minha a parte feita»* 1V.0 Mestrengo © texto abre com uma referéncia ao mostrengo (v1) e fecha aludindo a «ELRei D. Joao ‘Segundols (v.27, Sdo exatamente eles os representantes das duas forcas que se contrapéem no texto:o poder e os perigos do mar (forcas da natureza), representados pelo primeiro, ea determit nacao dos portugueses, representada pelo segundo. [.] Mas a contraposigao de ambos, mostrengo e rei, nao ¢ feita diretamente, O mostrengo habita ‘omar, [. tem poder sobre o mar (xo que s6 eu posso», v1), identifica-se com o mar tenebroso e desconhecido [.. ‘Ao encontro desse poderio oculto, parte D, Joao Segundo, mas nao diretamente, através de um intermediério que enviou em seu nome-o homem do leme. O confronto é pois estabelecido entre omostrengo e este tiltimo, que representa o rei e, na pessoa do rei, todo o povo portugués. D, Jodo Il 6a vontade, o homem do leme é 0 seu agente. [.1 Voltando ao mostrengo, pelos circulos que tece em roda da nau (vv. 5,4, 17,18 25), ele parece querer asfixiar os portugueses com a sua presenga. Os argumentos de autoridade que evoca mais nao pretendem que provocar neles 0 medo ¢ levé-los a voltar para trés, a desistir do empreendi- ‘mento comegado. Mas, diante da garbosidade do mostrengo, o homer do lemme revela a humik dade de quem tem consciéncia do lugar que ocupa e do que esta alia fazer. Ele sabe que esta a enfrentar um ambiente hostil, um tertitério alheio ¢ desconhecido. E mostra-se medroso, a principio. Contudo, a pouco e pouco a determinagao de que se encontra possuido vai vindo ao de cima,e ele assume a convicgao de que ali nao se representa a si mesmo («Aqui ao leme sou mais do que ‘eu, 22), mas uma causa transcendente: a vontade do seu rei e a determinagio do seu povo. Dai a resposta, plena de emocao patriética, que o homem do leme da a arrogancia do mostrengo (vv, 18,2220. E bem claro no texto que a tomada de consciéncia do homem do leme, acerca do lugar que ocupa, é gradual. [..] Revela-se inversamente proporcional em rela¢ao a posigéo ocupada pelo mostrengo. [.] 17 & ‘Mensagem, Fernando Pessoa a= ‘Quanto mais a presenca do mostrengo se apaga, mais se revela a do homem do leme, de El-Rei do povo portugués. £ a face oculta do mar que se desvenda, o mundo até ai desconhecido que se vai revelar’ \V.Epitafio de Bartolomeu Dias vi 18 Poema mais curto de Mensagem, recorda Bartolomeu Dias (cerca de 1450-1500), 0 capitao que dobrou o Cabo das Tormentas (ponta final de Africa), desde entao designado Cabo da Boa Espe- ranga, Dobrado 0 Cabo, «O mar ¢ 0 mesmo», isto 6 a natureza mostrara-se homogénea, nao distinta, ¢ 0 medo do diferente sucumbira por si préprio, Tinham sido unidos os dois mares: 0 africano (0 Atlantico) eo indiano e arabico (0 Indico). Ao mar, «j4 ninguém o temals.[.] A expresso «Dobrado o Assombro» refere-se historicamente a0 Cabo das Tormentas, mas também poeticamente a figura do mostrengo. Agora, unidas as duas partes do mundo, o Oriente €0 Ocidente, Atlas, ita que por castigo cartega o mundo as costas, «mostra alto o mundo no seu ombro»? Os Colombos Este titulo plural é intencionalmente irénico, evocando o contencioso entre Portugal e Espanha em volta da figura do navegador Cristévao Colombo. ( sujeito postico alude a falta de «Magia» do navegador, capaz de conferir grandeza as desco- bertas «0 que a eles nao toca / £ a Magia que evoca / O Longe e faz dele histéria® [|e sublinhaa ideia de que os navegadores portugueses sao os pioneiros na conquista dos mares ¢ os inspirado- tres de outros navegadores estrangeiros, de que Colombo é exemplo." | Ocidente © poeta, uma vez mais, associa as descobertas maritimas & conjugagio da vontade de Deus com a ago do homem - «Com duas mos ~ 0 Ato e o Destino ~ / Desvendémos». Deus foi a salmae eo homem teve a ousadia e tornow-se a «mao que des- vendow» Por obra do «Acaso, ou Vontade, ou Temporal», o certo que amao do homem rasgou 0 «Ocidenter, ou seja, as naus de Pedro Alvares Cabral descobriram o Brasil, em 22 de abril de 1500. © poema alude, assim, a descoberta do Brasil, que, segundo alguns historiadores, aconteceu em virtude de uma forte tem- pestade que tera desviado as naus de Pedro Alvares Cabral que rumavam ao oriente e nao ao ocidente, nao tendo chegado ao Brasil por objetivo definido* 2 exp Mensagem, Fernando Pessoa Vil. Ferndo de Magalhaes Ferndo de Magalhaes quis ser dos «dos homens, o primeiro» a realizar a viagem a volta da ‘Terra —«cingir o materno vulto [.| cercar /A terra inteira com seu abraco». Nao consegui, por ter sido ferido e morto numa emboscada pelos habitantes da Patagonia, «sombras disformes e des- compostas»; por isso, os donos mitolégicos do Mundo, «os Titas» da Terra dancam de satisfagao ‘sda morte do marinheiro», Dangam também os indigenas que o assassinaram, «dancam na soli- ao», outra vez, «sombras disformes e descompostas». Todavia os seus nautas continuaram a vie~ gem, seguindo o rumo tracado, porque «a alma ousada / Do morto ainda comanda a armada, / Pulso sem corpo ao leme a guiar». Animados com o sactificio da vida do seu capitao e em sua homenagem, sofreram os maiores revezes do mar para levar a cabo essa viagem de circum-nave- gacdo,a primeira’ IX. Ascensio de Vasco da Gama Os senhores da tempestade («Deuses da tormenta») ¢ os Titas (referidos como «gigantes da terra», que tentaram atingir 0 céu pondo serras sobre serras e entre os quais se inclui o Adamas- tor) param as suas guerras e ficam espantados («pasmams) vendo o herdi (Vasco da Gama) que sobe aos céus. A ascensdo decorre num cenétio de assombro (esiléncio», enévoa ondeando os ‘véuse, «0 rastro rage em nuvens e clardes», «luz de mil trovées, céu abrir o abismo»). Completa ‘ocenario pequeno pastor que, no chao, levanta o olhar e fica de tal modo extasiado com o que vvé que deixa cair a flauta Vasco da Gama surge como um heréi, comparado aos Argonautas (heréis gregos que, sob 0 comando de Jasao, se dirigiram para a Célquida no navio Argos, com o fim de se apoderarem do Velo de Ouro). assim que, por mérito, ele sobe aos céus, tendo a recompensa da sua coragem e saber na descoberta do caminho maritimo para a India Note-se que este heréi aparece ladeado sombro a ombro» com os medos, numa alusao clara a sua condicéo de homem que naturalmente tem receios ao ter de ultrapassar tantos e variados obstéculos na sua viagem.* X. Mar Portugués Manual-p. 127 © poeta dirige-se ao mar, um mar responsével pelo sofrimento das ‘aes, dos filhos, das noivas de todos aqueles que ousaram cruzar as suas 4guas com 0 intuito de o dominarem - «Para que fosses nosso, 6 marl, ‘Tera valido a pena tanto sofrimento? «Tudo vale a pena /Sea alma nao é pequena». £ mais uma nova maneira de o poeta afirmar aim- portancia da vontade da alma humana, vontade sempre insaciavel. Se, na primeira estrofe, o mar é sinénimo de dor, jé na segunda estrofe, o mar aparece associado conquista do absoluto. O mar en- cerra 0 «perigo» ¢ 0 «abismos, mas também espelha o «céus, ou seja, oferece recompensas, ao permitir 0 acesso a um prémio superior, seja ele a Verdade, a heroicidade, a imortalidade, a gloria." xi. 120 & ‘Mensagem, Fernando Pessoa a A Ultima Nau Manual-p.138 ‘Como o rei Artur das lendas bretas medievais, D. Sebastido aguarda—miticamente, nao histo-: ricamente — na silha indescoberta», ou seja, num espaco mitico, imaginal, projetando sobre a2 consciéncia coletiva dos Portugueses o desejo de realizacao futura («Deus guarda o corpo e a? forma do futuro, / Mas Sua luz projeta-o, sonho escuro / E breve»). Neste sentido, quanto mais a histéria material desvanece (+h, quanto mais ao povo a alma falta»), mais o sonho do Império («a minha alma atlantica») se torna obsessivo na consciéncia dos Portugueses, auspiciando a realizacao de um novo Império, ora espiritual ‘Quando tal sucedera? Quando se realizaré de novo a uniao entre Histéria e Mito, ambigao sonho, desejo e realizacao? Pessoa nao o sabe dizer, mas sabe que «ha a hora», «num mar que néo tem tempo ou ‘spacor (numa histéria espiritual, mftica), momento ontolégico envolvido em «mis- ‘ério», momento operativo e iniciatico, realizador do regresso de D. Sebastio, trazendo ainda «o pendao» do Império. Do mesmo modo que existiré uma segunda vinda de Cristo Terra para instaurar um reino de amor e justia, assim regressara D. Sebastiao (nao o corpo, mas o espirito, a mentalidade), para concretizar Quinto Império” rece Manual-p. 128 sPreces é 0 titulo do poema com que a segunda parte da obra termina. O tom de siiplica, que o atravessa, em consonancia, alias, com o préprio titulo, exprime a dor da incerteza em relacao a0 futuro de Portugal. Um Portugal caracterizado como «alma vile, «siléncio hostile, em suma, como ‘opafs decadente que o ultimo poema da obra «Nevoeiro» ha de pincelar com tintas ainda mais negras. Um Portugal indolente que contrasta com a «tormenta e a vontades que foi o Portugal das Descobertas. ‘A quem dirige o sujeito poético (indiferenciado num nds) a sua prece? Ao vocativo «Senhors que abre o poema e permanece ambiguo, Refere-se a Deus? ao Encoberto?, que «0 frio morto em cinzas a ocultous? Mais claro é em nome de quem 0 sujeito poético solicita ajuda, jé que o texto se refere explicitamente a um «nés», Certo é que do esforgo coletivo depende a repeticao dessa aventura passada, que é, hoje, em nés, apenas lembranga inconsequente do «mar universal» «sauudade», Pelo menos ndo esta, de todo, morta a esperanca, que a «mao do vento pode ergué-la ainda. ‘© empenhamento coletivo precisa, porém, do estimulo que a edesgraca» ou a «Ansiav da alma insatisfeita representam |..] ‘Nao resulta, por isso, indiferente que este poema de 12 versos seja 0 12. Giltimo da segunda parte. Ao apelo & mobilizacao coletiva que o percorre nao é alheio o ciclo completo (simbologia do riimero doze) que se cumpriu com o mar e que se apresenta como «a ligao de ter sido». Falta-nos ‘cumprir o poder vir a ser que essa licéo do passado profeticamente anuncia |. (Os versos que terminam o poema «Prece», numa esotérica circularidade do tempo e do espaco. reenviam-nos precisamente para a necessidade de cumprir esse futuro adivinhado do passado, que foi a posse dos mares: «E outra vez. conquistemos a Distancia - / Do mar ou outra, mas que seja nossal»* exp Mensagem, Fernando Pessoa .* Parte - 0 Encoberte - Pax in Excelsis (Paz nas alturas) Os Simbolos D. Sebastido Manual: © poema, utilizando um discurso de primeira pessoa, inicia-se com um apelo do rei aos portu- gueses, a quem o monarca transmite a esperanga de um futuro promissor. Para o rei, a chora adversa» do presente nao é mais do que o «intervalo» necessério para o inicio da realizagao de um grande sonho universal e eterno — ef O que eu me sonhei que eterno dura» — que ultrapassard a precariedade do momento em que o D. Sebastiao histérico, aquele que desapareceu em Alcacer Quibir, caiu no areal. {A derrota em Alcécer Quibir 6, assim, apresentada como um «mal necessério» para se ultra passar a dimenstio material e efémera do império portugués +o areal e a morte ea desventura» ~e se comecar a construir uma outra grandeza possuidora de uma dimensao espiritual e eterna, ‘© Quinto Império, inspirado na figura do rei - ef; Esse que regressarei». O rei assume-se como uma espécie de Messias, um enviado de Deus - «Que Deus concede aos seus»; «Se com Deus me guardei?» -, um salvador que conduziré o seu povo a gléria eterna O Quinto Império Manual-p. 129 Nas duas primeiras estrofes, faz-se @ apologia do sonho. © conformismo e a acomodacao tornam a vida triste. Quem vive sem sonhos, sem objetivos, sem metas a alcancar, tem uma vida ca, de desanimo (+Nada na alma lhe diz), esperando apenas e naturalmente pela morte. E 0 sonho que favorece a grandeza da alma e proporciona grandes feitos. Nas duas estrofes seguintes, releva-se a passagem inexoravel do Tempo (sEras sobre eras se somem / No tempo que em eras vem). O verso «Ser descontente é ser homem.» vem na continu dade do pensamento inicial ao dizer-nos que a insatisfacao constante do homem é que o leva a tentar concretizar os seus ideais, sendo como um impulso para o progresso da humanidade. Passados os quatro impérios, a enoites em que o homem vive transformar-se-4 no «dia claro» da redengdo com o regresso de D. Sebastido e surgira das cinzas 0 Quinto Império, um Império Universal que terd como centro a patria lusitana. A interrogacao retérica com que termina o poema é claramente para reflexao: face ao que foi dito, quem acredita que emorreu D. Sebastido»?* ODesejado Na economia de Mensagem, «O Desejado» representa a figura enigmatica por quem os Portur gueses permanentemente anseiam para se sentirem redimidos do fracasso histérico de, apés a criagdo de um descomunal império material, o terem perdido para méos alheias, tanto para os castelhanos quanto, posteriormente, para os franceses, ingleses e holandeses. Constitui, como o nome indica, uma figura do desejo, aquele que, possuindo apenas existéncia ideal ou espiritual («sente-te sonhado, / E ergue-te do fundo de nao-seress), um dia vira e se tor- nard instrumento de salvacdo de Portugal. Surge logo na primeira estrofe (ainda) sem existéncia real: tornar-se-& uma sintese das qualidades de todas as figuras retratadas na primeira parte de ‘Mensagem e sobretudo das qualidades mfticas de D. Sebastido, Neste sentido, Pessoa, na segunda estrofe, identifica-o com «Galaazs, o mais puro cavaleiro da Tavola Redonda, 0 tinico a quem foi 121 & ‘Mensagem, Fernando Pessoa a= dada a honra suprema de contemplar o «Santo Graals. Assim, «© Desejado», «com pitrias (Portugal), figura rediviva de D, Sebastiao, promovers a «Eucaristia Nova», a unio entre o plano mitico-reli- | gioso (Deus, a Providéncia) e 0 histérico, a instauracéo do Quinto Império, que dissolveré ? Estados, nagées, paises, substituidos por um reino de pureza ética, concretizacao do permanent universal anseio humano de justia e paz’ — As has Afortunadas a . A © poema gira & volta da palavra «voz»: vozindefinida (+Que voz vem no \ som das ondass), voz desconhecida (de alguéms);voz.que néo admite res- ~ath “R. _ posta («se escutamos, cala»), voz que cala também, se acordamos («vamos despertando, / Cala a voz»), pela simples razao de se cair na realidade Primeiramente, as ilhas «sao terras sem ter lugar»: tudo se passa no interior das consciéncias, onde reside a «esperanca» ¢ 0 sorriso dormente de quem nao vé claramente a realidade, apenas a perscruta, a deseja: onde se vislumbra a felici dade possivel, mas nublosa, que se esvai com o préprio ato de a querer saber, pois @ assumir a impossibilidade de conhecer a hora, 0 dia, 0 quando, 0 se... Como a crianga que sorri de felicidade, desconhecendo a razao e 0 porque, mas sorri. Estas ilhas da nossa imaginacio serao wafortunadas» para nés, que esperamos confiantes e esperancosos (sela nos diz a esperancay) e para o «Reis desejado, que eh Sie. também Is «mora esperandos. Uma aura sebastianista invade o poema OEncoberto Coincidindo o seu nome com o titulo geral da terceira parte do livro, o poema «O Encobertor ‘ocupa, sem diivida, um papel central na arquitetura simbélica e esotérica da Mensagem, Com- pée-se de trés quadras, com versos de seis silabas e rima cruzada. Nao obstante a sua aparente ‘modéstia formal, ele constitui o coragao hermético do volume pessoano. As trés quadras tém uma estrutura muito semelhante, tanto numa perspetiva semantica ‘como morfossintatica, constituindo os dois primeiros versos uma pergunta e os dois seguintes a resposta a essa pergunta. Em cada uma delas se reproduz também, verbalmente, o ritual inicis- tico da morte e ressurreigao do adepto [1 © poema é dominado pela simbologia iconogréfica rosacruciana [..] Na segunda estrofe, o lugar da rosa (da vida) é efetivamente ocupado pela figura de Cristo, que aquela flor simboliza, ¢ na terceira encontramos no mesmo espago o Encoberto, um novo ‘nome e uma nova identidade de Cristo, prenunciando uma nova religiosidade, a Eucaristia Nova, revista em poemas como «0 Desejador ot «O Terceiro» dos «Avisos»." Os Avisos OBandarra © poema inicia-se com a forma verbal «Sonhava», que sugere os sonhos que integravam as profecias do Bandarra.O sujeito poético descreve este profeta popular, recorrendo a construgao negativa~ «Nao foi nem santo nem herGis. No entanto, uma vez mais, esta figura histérica elenda- ria é objeto de sagracao divina - «Mas Deus sagrou com Seu sinal», Bandarra surge, ento, como: 122 ap Mensagem, Fernando Pessoa —um ser anénimo e confuso na sua misao; —um plebeu «como Jesus Cristo» — ele era um simples sapateiro; ~marcado, assinalado por Deus «Deus sagrou com Seu sinal®; —alguém dotado de um coragao que é o préprio Portugal - enquanto profeta de Deus, Ban- darra é préprio Portugal’ Anténio Vieira Da obra de Vieira nada se refere na Mensagem, para além daquilo que importa a Pessoa. Ao padre jesuita defensor dos escravos, ao grande pregador, ao embaixador de Portugal nao dedicao autor de Mensagem um s6 verso. Interessou-o, pelo contrério, o Mestre da lingua portuguesa eo profeta do Quinto Império que Vieira foi.) E verdade que a «grandezae, a «fama» ou a «gléria» sao atributos do heréi, mas estes distin- guem sobretudo o heréi-alma, sacralizado, que vive como arquétipo na meméria coletiva [| Note,finalmente, como o Quinto Império nos & dado em mistério: pertence desfera do xetéreo», do divino, e 0 seu comeco 6 «madrugada irreal. Se nao ficamos a saber em que consiste precisamente, fica, contudo, clara a sua ligagao a D. Sebastido (o que é uma recriagao pessoana do mito, j que este ‘nao é, como se sabe, o Rei-salvador do Mundo na teorizagdo de Vieira) e a ideia de que ele resulta do «imenso |. meditar® e do sentido visionétio do her6i, que, eno céu amplo de desejor,o sonhou portu- _gués em portugués, Da universalidade que ao Quinto Império se atribui fica, para além da sua inspi- ago divina,a aluso vaga de que «Doira as margens do Tejo», ponto de partida das naus* «Terceiro~'Screvo meu livro A beira-magoa» Este 6 0 tinico poema de Mensagem que no apresenta titulo, sendo, por esse facto, conside~ rado como aquele em que o discurso se identifica com o proprio Pessoa. (© poema estrutura-se em torno do desencanto e da magoa do poeta, que sente os seus «dias vacuos», 0 vazio que subjaz a ruina do império de quinhentos, e que anseia pela chegada de um Messias, de um salvador, que possa restituir a grandeza perdida - «Quando virés, 6 Encoberto, / Sonho das eras portugués, © predominio das interrogacées revela essa dor do presente e a ansia da chegada da «Nova Terrar e dos «Novos Céus», Atente-se, ainda, na identificacao realizada pelo sujeito poético entre © sonho e @ entidade divina inspiradora - «Quando, meu sonho e meu Senhor?» — que o torna ‘uma das forgas impulsionadoras da vontade humana.* IL Os Tempos Noite Dois dos trés filhos do nobre Joao Vaz Corte-Real tinham-se tornado capitaes de armada Gaspar e Miguel navegaram para ocidente, terdo atingido os bancos da Terra Nova, na América do Norte, mas nenhum deles regressou. Gaspar foi o primeiro a desaparecer. Miguel partiu em busca do irmao e também desapareceu. Restou Vasco, o primogénito, Este pediu autorizacao pata partir em busca dos irmaos, mas D. Manuel I nao autorizou. Poema narrativo, eleva o triste episédio histérico do desaparecimento dos dois irmaos Corte- -Real a prentincio do desfecho definitivo do império material portugués. As duas primeiras 123 & ‘Mensagem, Fernando Pessoa a= estrofes narram a partida ¢ 0 desaparecimento dos irmaos eno mar sem fim». O seu desapareci mento constitui simbolicamente o termo de duas qualidades dos heréis portugueses dos : Descobrimentos: «© Poder [a vontade e a forcal e o Renome [a fama, a glétial, Com este duplo ? desaparecimento, perdeu-se igualmente a poténcia animadora e a fama internacional granjea das pelos Portugueses com os Descobrimentos. Chegara ao fim a segunda parte do plano provi- dencial de Deus para os Portugueses, Ora espreitaria a decadéncia, em breve tornada real © terceiro irmao ambicionava «ir buscé-lose, isto 6, superar a «vile tristeza da decadéncia. Fazendo-o, buscava-se a si préprio e a «quem somos, na distancia / De nés». A Deus rogava, mas «Deus [jé] nao dé licenga que partamos». Quebrara-se o animo sagrado que tinha impelido os Portugueses a desvendar o mar desconhecido; o tempo histérico entrara em agonia, substitufdo pelo mitico,o tempo suspenso da espera, simbolizado pela morte de D. Sebastido. Faltou transpor ‘© Império material em espiritual. Resta agora unir o tempo histérico ¢ o mftico, provocando a «Horae, 0 advento do Quinto Império” Tormenta A primeira estrofe 6 constituida por duas perguntas paras as quais existem respostas. A pri- ‘meira «Que jaz no abismo sob o mar que se ergue?» alude a um mar violento e alterado que parece esconder alguma coisa lé no fundo do abismo ¢ o sujeito postico pergunta expressivamente que coisa sera essa, uma vez. que 6 Ié que residem os medos. No segundo verso, somos esclarecidos sobre 0 que jaz no fundo do mar: é Portugal, somos nés, uma nacéo que pode um dia emergir do abismo, sair da decadéncia em que se encontra, e «ser, existindo realmente como nacdo gloriosa A segunda pergunta («Que inquietagao do fundo nos soergue?») tem alguma subjetividade: 0 sujeito postico fala em inquietacao perguntando que inquietagao 6 essa, que ansia 6 essa que nos faz levantar e superar as dificuldades. Em resposta, o quarto verso patenteia o sentido da citada sinquietagom: apés 0 desejo, avaliam-se as forcas finalmente é s6 ter vontade para a concretizagao. Na segunda estrofe, alude-se ao mistério que envolve o mat, principalmente de noite, em que a tormenta é ainda mais aterradora, A conjuncao adversativa marca uma mudanga no sentido do discurso, podendo entender-se que, no auge da tempestade, entre a fuiria dos elementos («o vento ‘ruges, «0 mar’scuro ‘struge>) surge um relampago a iluminar o escuro da noite e que, tal como um sfarol de Deus») (metéfora), com a sua luz e brilho, indica o caminho e orienta os marinheiros para orumo certo e verdadeiro. £ um poema que representa o lado negative das Descobertas, pois que, nas viagens martti- ‘mas, uma tormenta pode significar o fim, o naufragio, a morte, e simboliza também o momento de crise e de decadéncia que Portugal atravessava* Calma © poema,pela sua posiio, confirma oaferismo +a aaa seguir & tempestade vem a bonancas e constr6ise a : Ls partir de uma série de questoes: — que costa é essa que o sujeito poético desconhece e que as ondas encontram? que caminho conduz a essa «Ilha proxima e remota»? = que outras possibilidades havera de comunicagao com 0 coutro lado»? 124 aD Mensagem, Fernando Pessoa —uma vez atingida essa «ilha velada», estara af o Rei desterrado», o futuro Messias de Portugal? © poema aponta, assim, para a figura do rei D. Sebastiao como libertador capaz de reconduzir Portugal ao «paraiso perdido’».* Antemanha ‘A Antemanha - 0 quarto dos Tempos - consagra definitivamente a ideia de potencialidade para a qual os quatro tempos nos reenviam, A antemanha é tradicionalmente simbolo de todas as possibilidades e de todas as promessas, isto 6, do renascer da esperanca. ‘Aantemanha 6 ainda, o tempo dos favores divinos eo sinal do poder de Deus (o terceiro sinal, recorde-se), agora explicitamente interpretado pelo regresso do Mostrengo ja domado e que ven reclamar do seu senhor - «Aquele que esta dormindo / E foi outrora Senhor do Mar ou seja, de Portugal - que cumpra o seu destino rumo ao futuro glorioso que é 0 seu. ‘Tem, pois, Portugal, de reconhecer a chamada que os trés sinais de Deus veiculam (trés tinham sido jé 0s «avisos»)* Nevoeiro Manual-p. 133 (© poema final de Mensagem apresenta uma caracterizacao negativa de Portugal, pais mar- cado pela falta de identidade ~«Nem rei nem lei, nem paz nem guerra» — pela falta de entusiasmo ~ sfulgor bao», «Brilho sem luz e sem arder» pela falta de objetivos - «Ninguém sabe que coisa quer» -, pela falta de valores morais - «Nem o que 6 mal nem o que é bem» Portugal é um pais fragmentado, mergulhado na incerteza, vivendo a sombra de um pasado glorioso que morreu — «Como o que o fogo-fatuo encerrar. No entanto, o nevoeiro que envolve Portugal traz em si o gérmen da mudanga, indicia um outro tempo anunciado pela exclamagao final«f a Horals—e pela saudagao latina «Valete, Fratres» (Saiide, irmaos).£0 tempo do Quinto Império, que dara a lingua e & cultura portuguesas uma dimensao eterna e universal.* Biniograta “L RAMOS, Aunt, © BRAGA Za, 2022. Mensagem, Fernando Pessoa. Porto: Elmentos 2. FALCAO, Ara, 2012 Como bord A ntertetusidade Os side Mensagem Porto: Are {1 REAL Miguel 2013. Mensagem de Ferrand Pessos coment por Miguel Reiss: Parl 4 RAMOS, Aun, € BRAGA, Za, 2010. Meneagom ElgSo especial comamoratva do comentadapor Arla Ras e Zaid aga Via Nova do Fara Centro Attica §5. VERISSIMO, Artur. 2002, Diloinoc Manso {6 LOURENGO, Artin Apolnério El, 2008. Femando Pessoa, Mensagem Cobra: Angelis Nows SOARES, Mara Alia, 2004, Para um etude wensagars de Fomando Pessoa, 2c, ica: Presenga MACEDO. 4 Otera,2002,Sebo sgnodotmpéra. Part: ASA |: WA Line Morera, 1989, Do Texto Letra Metodeoga de Abardagem Textual Com aplcaeio a bra de Femando Pesos, 5 10. OURENCO.Anténo Apotnirie, 2071. Guide Latra- Mensagem de Fomande Posson. Comix: Almeins 125

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