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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA (UNEB)

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO - CAMPUS XIV - CONCEIÇÃO DO COITÉ


LETRAS COM HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA

COMPONENTE CURRICULAR: ESTUDO DA PRODUÇÃO LITERÁRIA NO


BRASIL: DO REALISMO À ATUALIDADE

DOCENTE: ANDRÉA DO NASCIMENTO MASCARENHAS SILVA

DISCENTES: ANA BEATRIZ BARBOSA, LETÍCIA ANDRADE, MARIANA


SANTANA, MARIA VITÓRIA E WALERYA MATOS

Machado de Assis: a loucura e a ironia trágica

1. Introdução

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 1839, no Rio de Janeiro. Escritor e


tradutor, Machado de Assis desempenhou um papel muito importante na literatura
brasileira. Em 1856, o autor publicou seu primeiro poema, intitulado Ela, no jornal
Marmota Fluminense. No ano de 1860, passou a escrever para periódicos como
o Diário do Rio de Janeiro e A Semana Ilustrada. Em 1867 recebeu o título de
Cavaleiro da Ordem da Rosa e em 1881 publicou Memórias Póstumas de Brás
Cubas.

Devido ao seu talento com a escrita, Machado de Assis é reconhecido como um


dos maiores escritores brasileiros, eternizado em suas obras, foi o principal
representante do realismo brasileiro, mesmo tendo escrito sobre uma sociedade
meio idealizada e que não se enquadrava nos padrões reais da época. Nas suas
obras realistas, a ironia é uma característica que está sempre presente, sendo
um dos seus principais marcos como escritor, onde junto a ironia ele incluía um
humor meio ácido, de forma que tal característica passa a ser bastante valorizada
na literatura nacional. O romancista, contista, dramaturgo, poeta e cronista,
faleceu em 29 de setembro de 1908, no Rio de Janeiro (mec.gov).
Uma característica marcante em suas obras, e que se faz presente no conto O
Alienista, é a forma como ele dialoga com o leitor, tendo como exemplo o trecho
que diz “E agora prepare-se o leitor para o mesmo assombro que ficou a vila [...]”
(1882, p. 35), dessa forma, o leitor se sente mais íntimo com a obra, essa
intimidade possibilita um melhor entendimento do que foi lido e submersão na
história apresentada. Este método de escrita se iniciou com Machado de Assis
que inovou a ideia de escrita, tanto para a escola literária do realismo quanto para
a literatura brasileira em geral.
2. Desenvolvimento

No conto O Alienista, Machado de Assis apresenta uma narrativa que explora


intensamente a temática da loucura, buscando compreender e problematizar os
limites que separam a sanidade da insanidade, pondo em pauta os conceitos que
as diferem. Na história, o alienista, termo usado para se referir a um psiquiatra,
Simão Bacamarte passa a se dedicar ao estudo científico da loucura e, ao longo
do tempo, começa a perceber que a fronteira que separa o normal do patológico
é muito tênue, de modo que o Simão questione a saúde mental dos outros e a
própria.

Por meio da personagem de Simão Bacamarte, Machado oferece uma reflexão


sobre a complexidade do tema da loucura e de suas diferentes concepções, que
variam de acordo com o contexto histórico e cultural. Assis nos apresenta Simão
Bacamarte como um doutor que vê na vida um objeto de estudo, todas as suas
ações se baseiam unicamente na ciência, tendo como exemplo a motivação para
a escolha de sua esposa já que ele a escolheu unicamente pelo fato de que a
mulher “reunia condições fisiológicas e anatômicas de primeira ordem, digeria
com facilidade, dormia regularmente, tinha bom pulso, e excelente vista” (DE
ASSIS, 1882, p. 2.).

Ao decorrer do conto, o alienista se mostra vítima de sua própria obsessão pela


ciência, perdendo-se na busca pelo conhecimento e pelo controle da mente
humana. Ao prender arbitrariamente pessoas que considerava doentes mentais,
Simão acaba gerando um caos na cidade e mostrando a fragilidade e a
relatividade da noção de sanidade, ao fim do conto, Simão Bacamarte vê em si
mesmo a insanidade quando percebe que não possui defeito algum, deste modo
interpreta como uma nova doutrina e toma a si como primeiro exemplo, deste
modo ele se torna o único na Casa Verde “Fechada a porta da Casa Verde,
entregou-se ao estudo e à cura de si mesmo.” (DE ASSIS, 1882, p. 34).

Dessa forma, a ligação entre o conto e a loucura se torna óbvia, uma vez que a
obra apresenta uma reflexão crítica sobre as diferentes formas de enxergar e
lidar com a saúde mental, questionando a validade de uma abordagem científica
e médica do que seria a loucura. É interessante analisar este conto tendo em
mente o autor, já que Assis costuma usar de sua escrita como modo crítico, mas
ironizando o real problema que aborda, de modo que a compreensão total da
leitura só é possível através de análises sem, é claro, deixar de usufruir do humor
crítico que Assis proporciona (DE ASSIS, 1882).

Para debater sobre os estudos de Patrick Pessoa e o modo como ele aborda e
analisa Machado de Assis, é necessário um conhecimento básico sobre o escritor
em questão, sendo assim, Patrick Estellita Cavalcanti Pessoa é graduado em
filosofia e possui doutorado no mesmo ramo, escritor e estudioso brasileiro. Em
comparação aos outros estudantes de sua área, Pessoa é jovem, tem como
principal objeto de estudo o foco e a reflexão sobre conceitos críticos de obras
clássicas, em principal as obras de Assis. Devido a seu interesse nas obras de
Assis, Pessoa costuma sobrepor suas críticas e traz, por exemplo, na obra A
segunda vida de Brás Cubas, a ironia trágica presente no livro do ilustre escritor
Machado de Assis. Atualmente Patrick Pessoa é docente associado do
departamento de filosofia da UFF, (Universidade Federal Fluminense), e é
coordenador do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFF, além de ter
publicado inúmeros ensaios em diversas revistas especializadas, Pessoa tem
também 6 livros publicados. Essa introdução traz um ponto importante que é a
formação de Pessoa, já que o mesmo, apesar de ser da área de filosofia,
demonstra grande interesse nas pautas relacionadas à literatura, em especial
Machado de Assis.

A menção de Pessoa se dá devido aos artigos por ele escritos, tendo como
principal referência o material nomeado como A ironia trágica em Machado de
Assis, onde por meio desse estudo ele menciona como principal objeto de estudo
a escrita de Machado de Assis, especificamente o livro Memórias Póstumas de
Brás Cubas. Pessoa argumenta que a ironia de Assis ganha inteligibilidade
quando vista à luz do conceito de ironia trágica, que é ambíguo, mas pode ajudar
a entender a natureza da ironia do autor. Pessoa também discute a distinção
entre tragédia e romance do escritor húngaro, Lukács e como o caráter irônico e
trágico pode autorizar e subverter interpretações tradicionais da obra de Machado
de Assis como um "mestre da ironia" (PESSOA, 2007).
O texto discute a presença da ironia nas Memórias Póstumas de Brás Cubas e
como seu uso visa produzir efeitos cômicos ou satíricos, mas também se
relaciona com a ironia trágica. A ironia da ação trágica se torna visível a partir
daquele distanciamento irônico-reflexivo que caracteriza tanto o poeta quanto o
espectador da tragédia. A ironia machadiana é trágica na medida em que o
narrador afirma a vida quando queria negá-la, ou o autor encontra a contradição
humana onde queria encontrar apenas a contradição brasileira. A ironia trágica é
simultaneamente objetivo e subjetivo, como uma técnica específica do autor, e
como tal em certa medida passível de estabilização, mas, ao mesmo tempo,
como aquilo que impossibilita o império da técnica e assim resguarda e torna
visível o caráter ironicamente trágico da própria realidade, fundamento ontológico
daquilo que anteriormente foi chamado de “tragédia da linguagem” (PESSOA,
2007).

Essas duas obras, sendo elas O Alienista e Memórias Póstumas de Brás Cubas
apresentam o mesmo estilo irônico e pessimista característico de Machado de
Assis, bem como uma crítica social ao comportamento humano e à sociedade
brasileira do século XIX. Ambas as obras também abordam temas relacionados à
condição humana, como a loucura, a morte, a vaidade e a busca pelo
conhecimento e pela felicidade. Em resumo, as obras de Assis têm em comum o
estilo literário e o tema da condição humana, apresentando uma visão irônica e
pessimista da sociedade brasileira do século XIX.

Como modelo do realismo literário brasileiro, Machado de Assis é frequentemente


criticado por sua visão cínica e desencantada do mundo. Muitos críticos, em
especial Gustavo Bernardo, argumentam que seu foco na psicologia e nas
interações sociais pode ser limitado e que ele negligência problemas políticos e
sociais importantes. No estudo de O problema do realismo de Machado de Assis,
de Gustavo Bernardo vemos que Duarte apresenta a visão de Bernardo e de
outros críticos sobre a escrita e o realismo machadiano, apontando também o
questionamento de alguns críticos em relação à Machado, já que há dúvidas
sobre o modo que Assis descreve a sociedade da época, se ele realmente retrata
a realidade brasileira de sua época ou se ele procura criar um mundo que era
fruto de sua imaginação, algo idealizado. Sua escrita é conhecida por suas
sutilezas e ironias, o que pode levar a uma leitura subjetiva e ambígua de suas
obras (DUARTE, Eduardo de Assis. 2011).

Outras críticas também surgem em relação ao fato de que a perspectiva de


Machado muitas vezes é limitada à classe alta branca e urbana do Rio de
Janeiro. Escrever sobre tais personagens, de certo modo, anula a realidade do
próprio autor, atitude essa que fez com que muitas vezes a visão dele como
homem negro fosse ignorada, deixando de lado outras experiências e
perspectivas. Finalmente, alguns argumentam que ele pode ter "embelezado"
certos aspectos da vida social brasileira, como a escravidão, e minimizado sua
brutalidade e opressão, sendo assim, o que seria o realismo de Machado Assis?

O que faz com que as obras de Machado de Assis façam parte do realismo? Que
aspecto em sua escrita lhe inseriu nessa escola literária senão o tempo? O
período em que suas obras foram escritas definiram seu pertencimento ao
realismo, mas e o que ele escreveu, estava limitado ao realismo? Essa questão
ainda é motivo de debate entre estudiosos da área, tendo como principal exemplo
o crítico Gustavo Bernardo que, em seu livro O problema do realismo de
Machado de Assis questiona o porquê de outros estudiosos acrescentarem
adjetivos ao realismo com o intuito de incluir Assis. Realismo é realismo,
independente do adjetivo, a essência se mantém e Machado de Assis não se
limita a essa essência.
3. Conclusão

Em suma, Patrick Pessoa aborda em seus textos sobre Machado de Assis temas
pouco pensados na sociedade, porém ainda muito estigmatizados, a exemplo da
loucura. O filósofo ressalta o caráter irônico e pessimista nas obras do escritor
canônico, bem como seu objetivo de fazer críticas à sociedade do século XIX.

As obras machadianas O Alienista e Memórias Póstumas de Brás Cubas tornam-


se objeto de estudo para Patrick Pessoa justamente por trazerem reflexões
importantes e uma perspectiva crítica das convenções sociais, tanto da
sociedade do século em que foram escritas quanto da atualidade, evidenciando a
atemporalidade de Machado de Assis. 

A partir deste estudo, podemos pensar em maneiras de levar a temática da


loucura para a sala de aula. Estipulando que as atividades devam ser realizadas
em, no máximo, duas aulas de quarenta e cinco minutos e partindo do
pressuposto que os estudantes já tenham lido o conto O Alienista de Machado de
Assis, em um primeiro momento poderíamos trazer o videoclipe da música
Gentileza de Marisa Monte.

Logo, no segundo momento, introduziríamos brevemente a figura do Profeta


Gentileza, que foi a inspiração para a composição da cantora. Nesse momento é
interessante destacar que o Profeta foi um ex-empresário que, após presenciar
um incêndio em um circo no Rio de Janeiro que vitimou aproximadamente 500
pessoas, afirmou haver escutado um chamado para realizar sua missão na Terra,
e que após isso, vendeu os seus pertences e criou um jardim no local onde
ocorreu o acidente, vivendo lá por um período de 4 anos, além de ter viajado pelo
Brasil pregando o amor e palavras de esperança, razão pela qual foi chamado de
louco.
Seguindo para o terceiro momento, os discentes seriam convidados a discutir
sobre Gentileza, buscando fazer uma relação direta com o conto de Machado de
Assis e como os aspectos abordados nos materiais refletem na sociedade. O
quarto e último momento seria destinado a uma produção escrita (poema, haikai,
tirinha, paródia...) envolvendo o tema loucura e as percepções de mundo que os
estudantes têm.

Referências

DE ASSIS, Machado. O alienista. 1882.


DUARTE, Eduardo de Assis. O problema do realismo de Machado de Assis, de Gustavo Bernardo. 2011.
Marisa Monte e a história de Gentileza - https://youtu.be/YhY_3zpHWlg - Acesso em: 29/04
“Gentileza gera gentileza” – Profeta Gentileza (José Datrino) - https://www.revistaprosaversoearte.com/gentileza-gera-
gentileza-profeta-gentileza-jose-datrino/ - Acesso em: 29/04
Marisa Monte - Gentileza (Videoclip) - https://youtu.be/mpDHQVhyUrY - Acesso em: 29/04
BERNARDO, Gustavo. O problema do realismo de Machado de Assis. Editora Rocco, 2012.

PESSOA, Patrick. A ironia trágica de Machado de Assis. Viso: Cadernos de estética aplicada, v. 1, n. 1, p. 96-
108, 2007. - (PDF) A ironia trágica de Machado de Assis (researchgate.net)

Machado de Assis - Vida e Obra (mec.gov.br)

https://www.academia.org.br/academicos/machado-de-assis/biografia#:~:text=Biografia&text=Machado%20de
%20Assis%20

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