Você está na página 1de 31

TERAPIA COGNITIVO - COMPORTAMENTAL DE

CASAL E FAMÍLIA

1
NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

1
Sumário

NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 1

Introdução ................................................................................................ 3

Cognições e comportamentos .............................................................. 4


A necessidade do laço afetivo .............................................................. 6
As emoções na vida amorosa .............................................................. 8
Aceitação e tolerância .................................................................... 11

A estrutura da prática clínica com casais: integrando abordagens das


TCCs............................................................................................................. 13
1ª fase: avaliação e conceitualização ............................................. 14

2ª fase: estabelecendo um compromisso com a terapia e com o


casamento ................................................................................................. 19

3ª fase: intervenção ........................................................................ 20

4ª Fase: consolidação e finalização................................................ 27

REFERÊNCIAS ..................................................................................... 28

2
Introdução

Vínculos conjugais fortes pautados na lealdade, na colaboração e em


projetos conjuntos funcionam como base segura para o enfrentamento das
adversidades da vida e das árduas tarefas como, por exemplo, a criação dos
filhos e o desenvolvimento de uma carreira profissional. Contribuir para a
construção de um casamento forte é o mesmo que promover profilaxia
transgeracional, porque o clima emocional que paira no lar influenciará as
gerações seguintes na construção de seus próprios vínculos amorosos futuros.
Apesar do sofrimento, casais que buscam terapia desejam permanecer juntos e
melhorar seu relacionamento.

As Terapias Cognitivo-Comportamentais (TCCs) envolvem uma


diversidade de abordagens com grande valor de ajuda para a compreensão e a
intervenção nos dramas vividos pelos pacientes. Cada abordagem se soma
ampliando e enriquecendo o arsenal de ferramentas à disposição do terapeuta
(Leahy, 2016).

Intervir nas reações emocionais excessivas ou deficitárias é um ponto


relevante na terapia cognitivo-comportamental com casais. O tratamento de
casais busca auxiliar os parceiros a desenvolver habilidades para manejarem e
expressarem suas emoções funcionalmente. Algumas pessoas tendem a não
tolerar emoções desagradáveis e expressar seus sentimentos de uma forma

3
exagerada. Por exemplo, uma esposa que não recebe atenção de seu marido,
quando expõe um problema em seu trabalho, pode sentir raiva e começar a
hostilizar seu companheiro. Outros indivíduos apresentam déficits na percepção
de suas próprias emoções, podem negligenciá-las e, em conseqüência disso,
não expressá-las de forma funcional Esses fatores podem derivar do modelo
educacional recebido em cada contexto familiar original de ambos os parceiros.

Cognições e comportamentos

A Terapia Cognitivo-Comportamental com casais abarca processos


circulares que envolvem fatores cognitivos, afetivos e comportamentais (Dattilio,
2006). Fatores como intercâmbios comportamentais negativos e comunicação
distorcida constituem-se como barreiras para a resolução de problemas da vida,
gerando danos ao relacionamento amoroso. Juntos a esses fatores
comportamentais somam-se os fatores cognitivos (Dattilio, 2011). Baucom e
Epstein (1990) identificaram cinco tipos de cognições que contribuem para o
funcionamento e tendem a interferir na satisfação conjugal, sendo eles:

• Suposições: Crenças sobre as características gerais do parceiro e


sobre as interações conjugais. Por exemplo: “Não se pode confiar nos homens”
ou “amor não dura”.

• Percepções: Maneira como se percebe o parceiro na dinâmica da


interação. Em casais clínicos, geralmente as percepções são distorcidas e
determinam a forma como lidam um com o outro. Por exemplo: no caso de Josie
e Fábio, este a percebia como demasiado exigente e emocional, o que fazia com
que não considerasse suas manifestações.

• Expectativas: Previsões do que vai acontecer. Caso as


expectativas quanto ao parceiro sejam altas, fixam padrões de expectativa
negativos quando não satisfeitas que podem funcionar como “profecias
autorrealizadoras”. Por exemplo: “Ele vai me atormentar novamente, não tem
jeito”.

4
• Atribuições: Inferências sobre os motivos das ações do parceiro,
responsabilizando-o pelos acontecimentos. Casais clínicos fazem atribuições de
forma maciça sobre o outro ser o culpado pelo conflito. Por exemplo: concluir
que o parceiro não ama ou não se interessa pelo relacionamento porque não lhe
enviou nenhuma mensagem ao longo do dia.

• Padrões: Crenças sobre características que os relacionamentos


devem ter, ou seja, sobre o relacionamento ideal. Casais em conflito ficam muito
aborrecidos quando os padrões não são atingidos. Por exemplo: “Em um
verdadeiro relacionamento amoroso, os parceiros devem compartilhar tudo um
com o outro” ou, ao contrário, “Deve-se manter ao máximo a privacidade”.

Embora esses processos cognitivos estejam presentes em algum nível


nos relacionamentos de um modo geral, eles assumem, nos vínculos amorosos,
uma dimensão crítica, face à natureza complexa dos relacionamentos íntimos.
Nas interações de casais em conflito, levam às trocas comportamentais
problemáticas e ao mal-estar no relacionamento.

O modelo cognitivo-comportamental trabalha com os processos


cognitivos descritos, mostrando ao casal quando aparecem em suas interações,
tanto nas sessões como em eventos fora dela. Busca, também, mostrar que
esses processos estão na origem dos pensamentos automáticos, aos quais
respondem de forma emocional e comportamental (Bonet & Castilla, 2007). É
preciso criar condições para que as visões sobre o parceiro e sobre o casamento
se ampliem, em vez de permanecerem restritas por cognições distorcidas, as
quais contribuem para interações destrutivas. As mudanças comportamentais
geram mudanças cognitivas porque os novos comportamentos precisam de
novas cognições que sejam consistentes com elas e vice-versa.

5
A necessidade do laço afetivo

A teoria do apego de Bowlby (1979) demonstra que a necessidade de ter


um relacionamento íntimo está cunhada em nossa genética. Fomos
programados para identificar pessoas que se tornarão fundamentais em nossas
vidas. “A necessidade começa no útero e termina quando morremos” (Levine &
Heller, 2013, p. 22), mas a aplicação da teoria do apego aos relacionamentos
adultos só ocorreu em fins da década de 1980, com os estudos de Hazan e
Shaver (1987) e Johnson (1986).

O sistema de apego fica ativado ao longo de toda a vida e afeta a


formação, a consolidação e a manutenção de relacionamentos amorosos
adultos. Além disso, influenciam a qualidade, a satisfação e a estabilidade
desses vínculos (Dattilio, 2011). Hazan (2012) refere que Bowlby (1979) foi muito
específico ao definir que o apego tem quatro características distintas que se
apresentam no comportamento em relação a uma figura de apego: procurar e
manter proximidade física (manutenção da proximidade), buscar ajuda ou
conforto (porto seguro), sofrer com separações prolongadas (sofrimento de
separação) e utilizar uma figura de apego como base de segurança para o
envolvimento em atividades sem apego (base segura). “A proposição explícita
da teoria de apego é que esses comportamentos, que na infância são dirigidos

6
aos cuidadores primários, na vida adulta são redirecionados aos companheiros”
(Hazan, 2012, p.48).

Pesquisas têm demonstrado a relação entre estilos de apego dos


parceiros com o sucesso ou fracasso no relacionamento romântico (Dattilio,
2011; Scheren, Dellatorre, Neumann, & Wagner, 2015). Nesta perspectiva,
compreende-se sua complexidade, porque são direcionadas para vínculos
amorosos muitas expectativas de satisfação de necessidades advindas das
relações primitivas com os cuidadores. Tais necessidades envolvem questões
relativas à perda/privação, separação/ abandono, pertencimento/individuação.

As queixas de Josie e Fábio: “Ele me atormenta com sua indiferença” e


“Ela só me critica e não me apoia” são exemplos das vulnerabilidades de cada
um relativamente às questões de separação/abandono e proximidade/distância.
As mágoas de ambos por não perceberem suas demandas mais profundas
atendidas podem gerar comportamentos reativos, sendo o mais comum o de
atacar ou de se fechar.

As interações tornam-se cada vez mais hostis, sarcásticas e desafiadoras.


Mas o terapeuta atento pode perceber que, na maioria das vezes, essas brigas
representam a necessidade de ter respostas como: “eu importo para você?”,
“Posso contar com você?” Ou seja, a necessidade de restabelecer o apego
seguro e a conexão emocional.

Johnson (2012a) atribui o mal-estar e a infelicidade nas relações


conjugais à perda dessa conexão, ao procurar entender os dramas emocionais
dos casais que atendia, ela percebeu que as relações saudáveis iam muito além
de acordos racionais e intercâmbios de comportamentos. A autora enfatiza os
processos de apego na terapia de casal, como meio para compreender e
recuperar a conexão emocional através de mecanismos que fomentam a
acessibilidade, receptividade e o engajamento.

Johnson (2012a) chama de “feridas do apego” o processo que ocorre


quando um parceiro frustra a expectativa que o outro possui de que receberá
conforto e cuidado em momentos de vulnerabilidade e sofrimento. Profundos
sentimentos de abandono eram ativados em Josie quando percebia seu parceiro
distante; queria proximidade e atenção de Fábio, mas solicitava de forma raivosa

7
e crítica. Fábio, ao se perceber exigido e criticado, fazia o contrário do que Josie
desejava: se afastava para proteger-se da crítica. As atitudes de um suscitavam
as atitudes do outro, gerando ciclos de interações emocionais negativos e, por
consequência, a perda da conexão emocional entre eles.

Trabalhar com casais em desadaptação é construir pontes onde um


abismo se instalou. A identificação e a compreensão das vulnerabilidades de
cada cônjuge que são abordadas na sessão com escuta empática e validação
dos sentimentos de ambos fomentam a construção da conexão entre eles. Os
parceiros tornam-se encorajados a “baixarem a guarda” e trabalharem em prol
do objetivo comum: construir um modelo de relacionamento com mais
engajamento e gratificações.

As emoções na vida amorosa

A experiência emocional dos pacientes é o centro das terapias de


diferentes abordagens teóricas. Dattilio (2011) refere que a emoção sempre
esteve presente nas TCCs com casais como ingrediente importante no processo
terapêutico. Acrescenta o autor que as cognições influenciam intensamente a
emoção, as reações fisiológicas e os comportamentos, havendo um processo
recíproco entre tais domínios. Bonet e Castilla (2007), na mesma linha,
ressaltam que deixar de fora esse componente é centrar no compromisso de
estarem juntos sem considerar o papel da intimidade e da paixão.

8
Doss, Simpson e Christensen (2004), em uma pesquisa com 147 casais
questionados sobre os motivos que os levaram à terapia, identificaram que as
razões mais comuns eram comunicação problemática e a falta de afeto. Então,
a distância emocional é fator decisivo para busca de tratamento. A emoção
envolve complexas camadas de processos em constante interação com o meio
e estas interações englobam os processos cognitivos, “[a emoção] reflete
fundamentalmente o valor que a mente atribui aos eventos externos e internos
e, então, direciona a alocação dos recursos para promover o processamento
dessas informações” (Dattilio, 2011, p. 56).

A regulação e a desregulação emocional definem a forma como a pessoa


interage com o mundo. Tanto o temperamento como a história de apego
concorrem para definir a capacidade de cada indivíduo para regular suas
emoções (Dattilio, 2011). A desregulação emocional pode ocorrer de forma
eventual e pontual com qualquer pessoa, sem criar um padrão fixo, mas um
funcionamento pessoal pautado pela intensidade no sentir e no expressar
emoções nas interações amorosas contribuirá fortemente para a construção de
padrões que tornam as interações previsíveis e perturbadas.

Leahy (2016) desenvolve um modelo terapêutico ao qual denomina


“terapia do esquema emocional” e o define como um modelo social-cognitivo das
emoções e da regulação emocional, cujo foco incide em como as pessoas
pensam sobre suas próprias emoções e sobre as emoções dos outros. “Um

9
componente do processo de experimentar uma emoção é a interpretação e a
avaliação desse sentimento junto com o uso de estratégias adaptativas ou
desadaptativas para sua regulação” (Leahy, 2016, p.18). O autor distingue
esse seu modelo do esquema emocional do modelo de terapia focada no
esquema de Young et al. (2003). O primeiro modelo centra-se nas crenças sobre
as emoções e nas estratégias para lidar com as mesmas. Por outro lado,
segundo Leahy (2016, p. 20):

O modelo de Young propõe que os indivíduos desenvolvem conceitos de


si (p.ex., “difícil de amar”, “especial”, “deficiente”) como resultado de experiências
precoces (formando esquemas maladaptativos precoces), e esses conceitos ou
esquemas persistem e são mantidos por meio da esquiva, compensação ou
manutenção.

Quando uma emoção é despertada, muitas interpretações e avaliações


da própria experiência emocional são ativadas. O que acontecerá? Quais
estratégias usar para lidar com elas? Se afastar? Ruminar? Aceitar? Retomando
o caso de Josie e Fábio como exemplo, vemos que Fábio se afastava diante da
forma queixosa com que Josie solicitava atenção e cuidado. Josie, por sua vez,
reagia ao afastamento de uma forma crítica, raivosa e acusadora. As
vulnerabilidades de ambos, construídas através das vivências anteriores,
definem suas interpretações a respeito das atitudes do parceiro íntimo. A família
de origem de Fábio valorizava o trabalho como a única base para manter a
sobrevivência de seus membros. Para eles, expressar emoções ou se queixar
de algo era visto como uma ameaça, porque tirava o foco das condutas que
produziam trabalho. Assim, Fábio reagia de forma a desvalorizar, suprimir ou
distanciar-se sempre que Josie tentava compartilhar com ele seus sentimentos.

Alinhado com a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) (Hayes,


Luoma, Bond, Masuda, & Lillis, 2006; Hayes, Strosahl, & Wilson, 2012), o modelo
focado no “esquema emocional” de Leahy (2016) considera que as avaliações
das emoções, as estratégias fracassadas de controle e a esquiva da emoção
contribuem para a psicopatologia. Ambas as abordagens focam em detectar e
aceitar uma emoção como um “evento”, em vez de tentar evitá-la ou suprimi-
la (Leahy, 2016). Além disso, ambas também ressaltam a ligação entre emoções
e valores, levando os pacientes a terem clareza das virtudes que lhes são

10
importantes e das emoções, tanto as difíceis, como as agradáveis,
desconstruindo crenças inflexíveis sobre o conteúdo de emoções.

Por exemplo, avaliar uma emoção como desnecessária, inútil, que deve
ser suprimida, só aumenta as interações problemáticas no caso de
relacionamentos amorosos, porque fere os propósitos de apoio, validação e
intimidade. Por outra via, Avigail e McKay (2017) contribuem ao proporem a
integração do trabalho com esquemas à perspectiva da ACT, o que
corresponderia a identificar padrões de aprendizagem que são acionados em
interações problemáticas e ajudar a cultivar a flexibilidade psicológica e
comportamental para que façam escolhas guiadas por valores pessoais, em vez
de ativadas por esquemas desadaptativos.

Aceitação e tolerância

Falar em aceitação e tolerância no casamento pode parecer simplista.


Porém, abordar em profundidade esses conceitos junto com o casal pode
representar um divisor de águas para o sucesso da terapia.

O modelo da Terapia Comportamental Integrativa (IBCT) de Christensen,


Doss e Jacobson (2014) aborda com maestria a questão da aceitação das
diferenças no convívio conjugal. Os autores definem que aceitar um
comportamento que parece negativo em seu parceiro é entender o significado
mais profundo desse comportamento e vê-lo em um contexto mais amplo,
podendo, inclusive, apreciar o seu valor para o relacionamento. Aceitação
diferencia-se de submissão, porque, neste caso, a pessoa sucumbe ao outro
com medo e sofrimento, ou seja, a submissão vem de uma posição de fraqueza
e a aceitação de uma posição de força.

O modelo da IBTC contempla processos de mudança e processos de


aceitação em um equilíbrio próprio para cada casal (Mairal, 2016). Na dinâmica
do relacionamento, muitas vezes, o que era visto como diferenças entre os
parceiros podem passar a ser vivido como incompatibilidades (Christensen,

11
Doss, & Jacobson, 2014). Os autores identificam três tipos de reações negativas
ante as incompatibilidades: a coerção, a difamação e a polarização.

Nas atitudes de coerção, como manejo das incompatibilidades, o parceiro


imprime condutas que sejam aversivas ao outro com o objetivo de conseguir o
que deseja. Por exemplo: um se fecha toda vez que o outro não se mostra
disponível e colaborador na tentativa de que, com essa atitude, o outro mude
seu comportamento, mas, via de regra, o que se vê é uma reatividade ante a
essa manifestação. Este processo de coerção através da implementação de um
estímulo aversivo (se fechar e fazer cara feia) vai se consolidando e contribui
para formar um padrão de interação complementar problemática, onde ambos
participam para sua manutenção – um silencia e o outro briga e grita.

As atribuições mútuas quanto à responsabilidade pelo mal-estar vivido no


relacionamento é o passo seguinte ao processo de coerção. Cada um acha que
o outro é o culpado devido ao seu comportamento “errante”, por exemplo:
exagerado(a), impulsivo(a), acomodado(a). As interações se dão sob a forma de
críticas, desmerecimentos e acusações.

A polarização é o processo que se instala na sequência. Diante desse


cenário, invariavelmente, cada um atua de forma a se defender, fechando um
circuito de interações negativas. Posicionam-se de forma acirrada e, com a
manutenção dessa dinâmica, acabam por se perceberem de um jeito pior do que
são na realidade. Entram em uma batalha de ataque e defesa, não havendo
espaço para atitudes que agradariam o outro.

Para interromper esse circuito e construir outro padrão de interação, o


primeiro passo seria dar visibilidade a esse intercâmbio de condutas que vem
mantendo o estresse conjugal e, a partir disso, construir caminhos para
mudanças em equilíbrio com os processos de aceitação. A IBTC identifica o
processo de aceitação como a chave para obter bons resultados nas terapias de
casal.

12
A estrutura da prática clínica com casais: integrando
abordagens das TCCs

A Terapia Cognitivo-Comportamental com casais segue o padrão utilizado


nas TCCs de um modo geral. Existe uma fase inicial, que engloba avaliação e
conceitualização dos problemas do casal. Na sequência, uma fase de
desenvolvimento, cujo objetivo é implementar as intervenções que possuem o
objetivo de identificar, junto com o casal, onde estão, onde querem chegar e se
estão dispostos a atravessar as barreiras que se interpõem nessa caminhada.
Segue-se a fase da flexibilização de crenças sobre o relacionamento e, por
último, consolidação dos avanços, a finalização e as sessões de seguimento. A
Figura

As entrevistas se dão, basicamente, de forma conjunta, podendo ser


inseridas entrevistas individuais caso necessário. Ao longo do trabalho, são
implementados planos de ação para serem realizados em casa que conectam
uma sessão com a outra na evolução do processo terapêutico.

A postura empática e firme do terapeuta acompanha todo o processo. As


sessões se desenvolvem com uma estrutura semelhante, em que se questionam
os sentimentos de cada um ao longo da semana, os eventos vividos pelo casal
e o plano de ação prescrito para casa. Cada evento trazido a sessão tem a
função de oferecer oportunidade para que se acessem os processos específicos
de cada casal, como emoções, crenças, automatismos e gatilhos que são
acionados diante dos eventos.

13
O foco não é no evento em si, mas no que aconteceu com o casal diante
do evento. Entrar no conteúdo dos eventos é uma armadilha para o terapeuta,
uma vez que, via de regra, buscam um juiz que avalie quem está certo e quem
está errado. O processo terapêutico ocorre em movimentos sinuosos, porém,
para fins de apresentação, são demarcadas quatro fases.

1ª fase: avaliação e conceitualização

Quem é esse casal? O que deu errado?

A primeira entrevista é fundamental, porque dá o tom que demarcará o


processo terapêutico, englobando objetivos como: conhecer como o casal
interage, fomentar a instalação do senso de equipe (casal e terapeuta), acolher,
redefinir a busca de ajuda terapêutica como uma atitude saudável e de coragem
por parte do casal. Após as apresentações de praxe, é lançada a pergunta:
“Quem é esse casal?”. Essa pergunta estratégica traz em si alguns conceitos
importantes para o desenrolar da terapia.

Em primeiro lugar, incentiva o casal a olhar para o relacionamento em


perspectiva. Como diz o escritor José Saramago: “É preciso sair da ilha para ver
a ilha, não nos vemos se não saímos de nós”. Tomar distância possibilita ao
casal ver o todo e os contornos de seu relacionamento, pois chegam focados
apenas em seus conflitos. Quanto mais se explora essa questão com escuta
empática, mais abrangente será o cenário descrito. Ao falar amplamente sobre
o relacionamento, os conflitos são vistos como uma parte, mas não o todo.
Muitas vezes se emocionam ao identificarem aspectos valorosos no cenário
amplo do vínculo amoroso em um momento que estão mergulhados em
desapontamentos.

Em segundo lugar, a pergunta “Quem é esse casal?” insere a noção que


estamos diante de três identidades: a de cada parceiro e a do casal. Conforme
Caillé (1999), no casamento, a lógica do um e um são três, o autor denomina de
“absoluto de casal” o modelo único que define a formato da conjugalidade que
cada par constrói. Então, o casal, como terceira identidade, é o paciente e os

14
parceiros são responsáveis por essa terceira identidade, formada por partes de
cada um, mas que é singular. Após obter uma visão abrangente do
relacionamento como se estivéssemos fazendo um voo panorâmico de
helicóptero e visualizado todo o conjunto da paisagem, faremos aproximação e
pouso na situação-problema que os levou à terapia.

Não importa o teor do problema, essas são as queixas mais comuns.


Todas têm na sua base processos de desconexão afetiva (falta de empatia) e
reatividade (comportamentos de ataque), gerando um padrão de interação
problemático típico de cada casal e que se auto reforça a cada evento conflitivo.
Abordar conflitos do casal de forma empática, valorizando a dor de cada um, faz
com que se sintam ouvidos em profundidade, o que pode atenuar julgamentos e
acusações mútuas, ainda que temporariamente, mas importante para dar início
ao processo terapêutico.

O terapeuta pode concluir a primeira sessão apresentando uma síntese


de que, apesar dos conflitos e diferenças entre eles, ambos concordam que o
modelo de relacionamento que estão vivendo está desajustado e trazendo
infelicidade. É preciso construir um novo modelo consistente com o momento
atual. Argumentar sobre o caráter dinâmico das relações de casal e sobre como
diferentes fases exigem demandas distintas ajuda o casal a perceber que fazer
ajustes é natural.

15
Identificando as experiências pessoais geradoras de gatilhos no
vínculo amoroso

Cada cônjuge leva para dentro do casamento sua bagagem de


experiências pessoais. Deste modo, é importante conhecer o que carregam
dentro dela.

A história de vínculos de cada parceiro pode ser abordada através da


entrevista e da técnica do Genograma familiar. O Genograma é um recurso muito
usado na abordagem sistêmica, oferece uma visão das relações da família de
origem em nível transgeracional, organiza as informações de uma maneira
visual, possibilitando identificar padrões de funcionamento que se repetem ao
longo das gerações. Ele funciona como uma “radiografia”, mostrando eventos
importantes da história familiar e a forma como lidavam com eles, bem como o
clima emocional que envolvia as interações, McGoldrick (2012). Essa ferramenta
que levará à identificação e compreensão da história de apego de cada parceiro,
das crenças e dos esquemas que se formaram. Essas informações sobre a
história de cada membro possibilitam que compreendam mais profundamente
suas próprias reações e as do companheiro, ampliando a visão e favorecendo o
processo de mútua aceitação.

Onde tudo começou: a escolha do parceiro

A relação conjugal se define a partir de uma escolha mútua subjetiva. Os


aspectos identificados no outro, que constituem a motivação para a formação de
casal, integram as expectativas quanto ao relacionamento e quanto às
demandas individuais trazidas das relações primárias. Então, a escolha do
cônjuge não se dá ao acaso. Ela é precisa e se ancora em profundas raízes da
vida da pessoa; é direcionada para satisfazer demandas pessoais, tanto
conscientes como não conscientes, para confirmar crenças quanto a si e quanto
ao mundo e para reeditar interações conflitivas vivenciadas no passado,
oferecendo uma possibilidade de resolução ou a manutenção do conflito (Scribel,
Sana, & Benedetto, 2007).

16
Sob a perspectiva da abordagem dos esquemas de Young (2003), a
escolha se fundamenta nas representações mentais de cada parceiro, as quais
oferecem a base para estruturação dos esquemas. Os esquemas podem estar
latentes ou ativos e podem ser adaptativos ou desadaptativos. Nos
relacionamentos amorosos, dado o grau de envolvimento dos parceiros, os
esquemas são acionados de forma intensa e influenciam a escolha do parceiro,
assim como os temas de estresse no relacionamento.

Dentre as distorções cognitivas, a abstração seletiva, minimizações e


magnificações podem ter grande influência na escolha, ou seja, se coloca foco
naquilo que se quer ver, enquanto outras partes ficam no escuro. Porém, tudo
estava lá desde o início, os temperamentos distintos de cada um, o que
gostavam e o que gerava tensão. Escolheram-se de forma livre, sem pressões
e ambos percebiam as diferenças, mas elas não eram vistas como perigosas.
Como isso aconteceu? É possível que, com o passar do tempo, as questões e
tensões do dia a dia os levaram a focalizar excessivamente os aspectos
problemáticos.

O que era visto como qualidade no momento da escolha, no


enamoramento, pode ser visto posteriormente como um grande problema. Por
exemplo, Joana pode passar de “me fascinou seu jeito aventureiro e
divertido” a “ele é irresponsável, tenho que ficar atenta todo o tempo”; Pedro de
“gostava de ver que ela sabia viver com regras” a “não tolero esse controle;
então, o que posso fazer senão me desligar?”. Aventura e descontração era uma
demanda de Joana devido a ter crescido em um ambiente familiar onde era muito
exigida e criticada caso não apresentasse alto nível de rendimento. Por outro
lado, as regras e a organização eram demandas de Pedro, pois viveu em uma
família numerosa cujos pais ocupavam posições importantes, sendo muito
comprometidos com o trabalho; assim, não havia o gerenciamento coerente das
demandas dos filhos, predominando um clima caótico na dinâmica familiar.

Trazer para a sessão os fatores que os atraiu no passado vai além de


despertar lembranças, pois gera empatia com o jeito de funcionar de cada um e
com suas próprias demandas quanto ao relacionamento. Essa abordagem pode
também trazer para o momento presente algum carinho que estava submerso
por camadas de sentimentos dolorosos, como raiva, tristeza, ressentimentos,

17
dentre outros. Assim, pode-se começar a vislumbrar um pequeno passo na
direção de uma ponte para a conexão afetiva.

As expectativas irrealistas: missão impossível

Muitas crenças irreais a respeito dos relacionamentos amorosos são


construídas a partir dos contextos familiar e cultural. Os contos de fada seguem
fascinando as pessoas. Velhos mitos sobre relacionamentos ainda
permanecem: “o parceiro perfeito”, “você me completa”, “amor eterno”
(Harris, 2009). Além dessas crenças, as “feridas do apego” (Johnson, 2012b)
advindas de aprendizados cognitivos e emocionais na infância podem ser
fortemente acionadas na relação amorosa, gerando demandas exageradas que
o relacionamento não é capaz de prover.

As diferenças

Lidar com diferenças é inerente a todo o tipo de interação humana.


Contudo, nas interações amorosas, pode se tornar uma questão crítica. É um
tema sempre presente nas terapias de casais, não importa a abordagem teórica
utilizada. Na terapia, se explora não só como os parceiros lidam com as
diferenças, mas suas crenças sobre o tema. É bastante comum chegarem com
a crença de que diferenças são ameaças que podem inviabilizar o casamento.
Desse modo, configuram-se como fonte de estresse conjugal, levando a atitudes
para eliminá-las na tentativa de evitar um possível rompimento. A intolerância
quanto às diferenças entre parceiros gera interações pautadas em acusações
mútuas, pois cada um acredita que sabe como as coisas devem funcionar.

A presença das diferenças é potente fator de desconstrução do mito


quanto ao casamento ideal e quanto ao parceiro perfeito. Na tentativa de manter
o mito, os cônjuges podem direcionar seus esforços para mudar o parceiro ou
acreditar que aquele não é o parceiro certo. Redefinir positivamente as

18
diferenças como tesouros que podem enriquecer a vida do casal incentiva outra
representação das mesmas, fomentando atitudes mais flexíveis diante delas.

Como citado anteriormente, Christensen, Doss e Jacobson (2014), no


modelo IBTC, referem-se à aceitação das diferenças como o fundamental fator
para a construção do bem-estar conjugal. Colocar ênfase na aceitação
encerraria a luta interminável de casais na busca de razões, de quem está certo
e quem está errado, de quem é o culpado. As intervenções terapêuticas se
dirigem a ajudar o casal a compreender o quanto é ineficaz o esforço para mudar
o parceiro. Ao contrário, o caminho é mudar a si mesmo e também realinhar,
em parâmetros reais, as expectativas quanto ao parceiro e quanto ao
casamento. Tal mudança de foco favorece que os casais consigam usufruir os
pontos fortes e a tolerar aqueles pontos que não puderem aceitar.

2ª fase: estabelecendo um compromisso com a terapia e com o


casamento

É fundamental que se trabalhe o comprometimento de ambos com o


casamento e com o processo terapêutico. A relação terapêutica é fundamental
para os bons resultados das terapias de um modo geral, mas, nas terapias com
casais, se reveste de maior complexidade porque, na criação de uma atmosfera
de contribuição e responsabilidade partilhada, há mais do que um conjunto de
dinâmicas no processo terapêutico (Kazantzis, Dattilio, & Dobson, 2017).

O terapeuta assume uma postura de respeito, interesse e empatia ao se


conectar com o sofrimento de cada parceiro, cuida ao mesmo tempo de ambos
os cônjuges e do relacionamento. O terapeuta encoraja o casal a olhar para sua
vida e antecipa que o processo terapêutio, muitas vezes, traz momentos difíceis,
obstáculos poderão se interpor; mas estarão juntos (casal e terapeuta) nessa
jornada. O sucesso depende do comprometimento e da perseverança de ambos.
Contudo, os parceiros podem escolher fazer essa viagem ou não, podem
escolher se querem ficar e trabalhar duro, ou se querem sair, mas é importante
que se esclareçam as alternativas. Desistir do casamento: qual o efeito? Qual o
custo? Ficar e mudar o que pode ser mudado e aceitar o que não pode ser

19
mudado: qual o efeito? Qual o custo? Não há caminho certo ou errado, pode-se
inclusive escolher ficar em um relacionamento tóxico, mas é importante que se
tenha clareza da escolha e que se observe o seu efeito. Porém, se o casal está
disposto a fazer algo para melhorar seu relacionamento, é hora de arregaçar as
mangas e botar a mão na massa.

3ª fase: intervenção

Os aspectos abordados na fase inicial, ou seja, “Quem é esse casal?”,


pontos fortes e pontos de vulnerabilidade, como foram as experiências de cada
um em suas famílias de origem e no mundo, como se escolheram para viver uma
história de amor, quais expectativas quanto ao casamento, qual padrão
interacional, o que mantém esse padrão, etc., reúnem elementos que oferecem
um panorama do funcionamento do casal e, a partir daí, o material clínico para
se buscar a forma mais eficaz de intervenção.

Construindo um novo modelo de relacionamento

Não há modelo certo ou errado de relacionamento amoroso. O processo


terapêutico leva o casal a compreender que são livres para escolherem quais
componentes querem inserir e quais querem deixar de fora na construção do
novo modelo. Questionar o casal sobre “que tipo de parceiro você gostaria de
ser?” e “qual modelo de relacionamento gostariam de construir?” leva-os, em
primeiro lugar, a se conscientizarem de que são responsáveis por suas escolhas
e a comprometerem-se ainda mais com o processo. Em segundo lugar,
incentiva-os a refletirem sobre expectativas irrealistas, crenças inflexíveis e a
redimensionarem seus pensamentos sobre o papel das diferenças entre os
parceiros.

Embora cada casal tenha a representação do melhor formato de


relacionamento para si, valores como conexão afetiva, cuidado, colaboração e

20
respeito são normalmente desejados. A tarefa terapêutica centra-se em reunir
esforços para auxiliar casais a se aproximarem desses propósitos.

Como foi dito anteriormente, o terapeuta cognitivo-comportamental conta


com diretrizes teóricas e procedimentos sustentados cientificamente,
favorecendo que o trabalho com casais seja cada vez mais efetivo. Das
inovações trazidas pelas TCCs com a terceira onda (mais integrativas e
contextuais), os seis pressupostos da ACT aplicados às terapias de casais
(Avigail & McKay, 2017; Harris, 2009) são de grande ajuda para a construção de
um modelo de relacionamento mais eficaz para o casal. São eles:

• Valores: Agir de acordo com seus próprios valores promove um


significado à vida e, sobretudo, o encontro consigo mesmo. Que tipo de parceiro
você quer ser? Esclarecer valores com casais fornece orientação sobre os
comportamentos que querem terno relacionamento e, também, a motivação para
buscá-los. Uma vez que os valores são próprios de cada um, devem ser
cuidadosamente explorados na sessão para que sejam vistos com
responsabilidade, para que se reflita sobre o que ocorre quando se está em
contato com seus valores e quando você está entrincheirado no jogo de
acusações mútuas sobre quem é o culpado e quem é inocente.

Já que você já sabe que tipo de parceiro você gostaria de ser, quais os
obstáculos para ir nessa direção? Vamos olhar cuidadosamente para o que o
está impedindo de alcançar valores tão fundamentais que você percebe que
tornaria o relacionamento mais gratificante. Apegar-se ao passado, às memórias
de eventos dolorosos mantém o casal em ciclos de interação negativos, como,
por exemplo: “Não adianta, vai dar tudo errado, já deu errado antes”; ou centrar-
se em julgamentos: “Ele(a) errou novamente, incompetente, faz tudo errado, é o
culpado(a)”. Os medos também impedem que se vá na direção dos valores (p.
ex.: medo de ser abandonado ou de ser controlado pelo parceiro). Então, você
pode dar um passo atrás e identificar como sua mente constrói histórias: “Lá vem
a história do parceiro malvado” ou “Lá vem a história de que serei
abandonado(a)”. Nossas histórias não são fatos, não são verdades absolutas,
mas, às vezes, nos fixamos nelas e as vivemos como tal. Isso leva à
inflexibilidade psicológica, o que pode distanciar você do parceiro que gostaria
de ser.

21
O terapeuta, então, encoraja os cônjuges a construírem interações
consistentes com os valores que o próprio casal definiu como essenciais. Uma
vez identificados os valores, estes estarão presentes ao longo de todo o
processo terapêutico, buscando-se, em cada evento conflitivo trazido à sessão
pelo casal, os possíveis obstáculos para que se dirijam ao que verdadeiramente
é importante para eles.

• Ações de compromisso: Ações específicas baseadas nos valores


descritos que são implementados para substituir os velhos comportamentos que
não estão funcionando. Encorajar os parceiros a refletirem a cada dia sobre o
que podem fazer hoje para qualificar seu relacionamento e o que foi feito hoje
que os distanciou desse propósito, somados aos questionamentos “Se o ciúme
aparecer, o que vou fazer?”, “Se a raiva aparecer, o que vou fazer?”, “Serei
um parceiro reativo?”, “Isso seria consistente com meus valores?” são formas
de ajudar na aplicação de ações comprometidas com cada valor especificado
pelos parceiros.

• Desfusão Cognitiva: Criar distância, olhar as situações


problemáticas em perspectiva para se distanciarem dos pensamentos pautados
por crenças problemáticas que funcionam como barreiras para as ações
baseadas nos valores do casal. Por exemplo: “Sou um fracasso, nunca serei
amado” e “É tarde demais, isso nunca vai mudar, eu me casei com a pessoa
errada” são apenas pensamentos disparados em momentos de tensão. Os
pensamentos se transformam em barreiras quando nos fixamos neles como
verdades absolutas. Os pensamentos vão e vêm, a aderência a eles é o que
gera engessamento e torna estagnada a história do casal, ou seja, ficam presos
em um relacionamento sem flexibilidade, sem movimento, sem alternativas – um
relacionamento tóxico. Tomar distância desses pensamentos e enxergá-los em
perspectiva pode desmontar os automatismos e impedir que caiam nessas
armadilhas. Ao recuar e assistir seus próprios pensamentos, é possível escolher
como responder a eles.

• Eu como contexto: A parte de nós que observa o fluxo das próprias


experiências, que é capaz de notar, ou seja, o “eu observador”. Ter consciência
dessa parte de nós contribui para que façamos escolhas mais conscientes.

22
• Contato com o momento presente: Estar presente, enxergar o outro
mais diretamente e não com as lentes de suas crenças distorcidas. Casais têm
uma história e guardam ressentimentos quando não veem suas expectativas
satisfeitas por seus parceiros, é como guardarem um baú de mágoas sempre
aberto para que seu conteúdo seja usado como argumento para pensamentos
de desesperança e de julgamento: “Eu estou certo você está errado” ou “Você
errou mais naquela vez”. A terapia, ao mesmo tempo em que valida o sofrimento
de cada um pelas experiências vividas, questiona a funcionalidade em manter
essas lembranças no presente, uma vez que desejam construir um novo modelo
de relacionamento. Ao contrário, a terapia incentiva que desenvolvam
habilidades para permanecerem no momento presente em sintonia e conexão
com seu parceiro, fomentando respostas emocionais mais adaptativas.

• Aceitação: Acolher suas próprias experiências internas, assim


como as do parceiro, integrá-las sem tentar mudá-las é especialmente
importante nos relacionamentos amorosos para desapegarem-se da luta
inglória, mas tão presente, para tentar mudar o parceiro.

Desenvolvendo a comunicação emocional assertiva

23
A comunicação é o componente inerente a todas as interações humanas,
sendo através dela que as relações se constroem, no contexto amoroso tende a
ativar emoções de forma muito intensa. Conforme Greenberg e Goldman (2008),
a comunicação revela sinais emocionais que, com a experiência interativa dos
parceiros, contribuirá para formar um padrão de interação.

Casais estressados tendem a se comunicar de forma ineficiente devido à


presença de componentes desencadeantes de desavenças como críticas,
exigências, mágoas e sentimentos de rejeição, sendo comum distorcerem a
mensagem e responderem de acordo com a interpretação distorcida (Silva &
Vandenberghe, 2008). Via de regra, esses casais expressam sentimentos
negativos de uma forma inadequada e pouco expressam os sentimentos
positivos. Embora busquem afeição e reconhecimento, o fazem de forma
agressiva que gera efeito contrário: afastar o parceiro. É comum a comunicação
ser fonte de prazer no início do relacionamento e se deteriorar gradativamente
na mesma proporção em que os conflitos se intensificam.

O treino em habilidades de comunicação faz parte das terapias de casal


independente do que dizem as teorias sobre as fontes e processos de sofrimento
conjugal. As intervenções terapêuticas visam a desenvolver a boa comunicação
emocional ou a comunicação assertiva não violenta, constituindo-se em uma
forma de expressar o que é preciso sem alienar aquele que recebe, motivando
a pessoa a querer colaborar (Servan-Schereiber, 2004).

A comunicação emocional foi amplamente estudada por Marshall (2006)


com o intuito de gerenciar conflitos em diferentes âmbitos. O autor identifica a
suspensão do julgamento do outro como a chave da comunicação emocional
assertiva. Para tanto, é preciso focar na descrição objetiva dos fatos e comunicar
sentimentos na primeira pessoa, por exemplo: “Eu me senti triste quando percebi
que você não estava ao meu lado naquele momento” em vez de “Você nunca
está a meu lado quando preciso”. Ao ser honesto e mostrar os próprios
sentimentos e vulnerabilidades sem acusações, há maior possibilidade de que o
outro tenha vontade de cooperar. De acordo com esses fundamentos, a prática
clínica para desenvolver as habilidades de comunicação assertiva compreende:

24
• Criar um ambiente seguro onde o terapeuta será modelo para
escuta empática, validando a expressão de sentimentos.

• Estimular a comunicação na primeira pessoa – começar com “eu”


em vez de “você”.

• Focar em um tema de cada vez e não puxar vários assuntos e


mágoas ao mesmo tempo.

• Perceber os efeitos da comunicação no outro durante a sessão,


estimulando que expressem como se sentiram antes de reagirem.

• Dar e receber feedbacks.

• Olhar nos olhos de quem fala, o que seria uma forma de mostrar
interesse.

• Valorizar a expressão de pensamentos e sentimentos, mesmo que


não aprove a conduta.

• Encorajar que se comuniquem de forma consistente com o parceiro


que gostariam de ser.

A comunicação emocional assertiva promove vitalidade, pois favorece


áreas centrais para o bem-estar conjugal, como a resolução de problemas no dia
a dia, a aceitação, o engajamento entre os parceiros e a possibilidade de
construírem projetos conjuntos. Por outro lado, na comunicação pautada em
ataques e contra-ataques, aquele que se sentiu atacado tenderá a ficar focado
em suas próprias emoções e a cooperação fica inviabilizada (Servan-Schreiber,
2004).

Engajamento emocional

Uma vez que o casal deixou cair a armadura, identificou os valores,


permitiu que os sentimentos fluíssem através de uma comunicação emocional
assertiva, flexibilizou crenças distorcidas, construindo visões mais adaptativas
sobre o parceiro e sobre o relacionamento, desapegou-se da luta para mudar o
cônjuge, percebendo que o caminho para melhorar o casamento é mudar a si

25
mesmo, o terreno está preparado para focar no engajamento emocional entre os
parceiros. Reforçar o engajamento contribui para a solidificação dos avanços
alcançados. Quanto mais os parceiros se sentirem seguros para expressarem
seus sentimentos, porque confiam que serão acolhidos, maior será a intimidade
e, por consequência, maior o engajamento emocional no relacionamento
(Johnson, 2012b).
Tarefas de casa como identificar e implementar algo que, do seu ponto de
vista, agradaria o parceiro, tem como objetivo, por um lado, prestar atenção no
cônjuge e, por outro, perceber os sentimentos privados quando se dedicam ao
outro, assim como o efeito que gera no relacionamento. Encorajar os casais a
identificarem como se sentem diante dos eventos da vida em comum e a
expressarem suas emoções de uma forma não violenta, sendo respeitosos com
os sentimentos do outro, a cultivar a abertura, o estar presente com o parceiro e
o desapegar-se dos julgamentos e críticas é trabalhar em prol do engajamento
emocional (Harris, 2009). Esse cenário possibilitará que construam a base para
o novo modelo de interação com mais comprometimento emocional, o que
favorecerá o restabelecimento de um vínculo seguro e de conforto na relação
conjugal.

26
4ª Fase: consolidação e finalização

Ao vivenciar cada fase anterior e chegar à fase final, o casal já


experimenta bem-estar em algum grau. Assim, esta fase centra-se em dar
visibilidade às novas posturas diante dos velhos eventos da vida do casal e ao
novo modelo de relacionamento que vem sendo construído em conjunto, com
contornos mais firmes e consolidados. Nesta fase, busca-se, também, que se
tornem conscientes de que conflitos irão ocorrer, mas que aprenderam a lidar
com eles, dando-lhes a dimensão devida. A validação das conquistas que
alcançaram o espaçamento das sessões para frequência quinzenal e o contrato
de sessões de seguimento contribuem para a consolidação do novo modelo de
relacionamento que construíram ao longo do processo terapêutico.

27
REFERÊNCIAS

Avigail, L. & McKay, M. (2017). Acceptance and commitment therapy for


couples: A clinician's guide to using mindfulness, values, and schema awareness
to rebuild relation- ships. Oakland: Context Press.
Baucom, D. H. & Epstein, N. (1990). Cognitive-behavioral marital therapy.
Philadelphia: Brunner/Mazel. (Brunner/Mazel Cog- nitive fterapy Series).
Bolwby, J. (1979). The making and breaking of affectional bonds. London:
Tavistock.
Bonet, J. I. C. & Castilla, C. D. S. (2007). Um protocolo cognitivo-
compor- tamental para a terapia conjugal. In: V. E. Caballo. Manual para o
tratamento cognitivo-comportamental dos transtornos psicológicos da
atualidade: Intervenção em crise, transtornos da personalidade e do
relacionamento e psicologia da saúde (v. 2). C ritiba: Santos.
Caillé, F. (1991). Un et un font trois: Le couple révélé à lui même. Paris:
ESF. Christensen, A., Doss, B. D., & Jacobson, N. S. (2014). Reconcilable
differences: Re- build your relationship by rediscovering the partner you Love-
without losing yourself (2. ed). New York: fte Guiford Press.
Dattilio, F. M. (2011). Manual de terapia cognitivo-comportamental para
casais e famílias. Porto Alegre: Artmed.
Dattilio, F. M. (2006). Reestruturação dos esquemas familiares. Revista
Brasileira de Terapias Cognitivas, 2(1), 17-33.
Doss, B. D, Simpson, L. E., & Christensen, A. (2004). Why do couples
seek marital therapy? Professional Psychology: Research and Practice, 35(6),
608-614.
Epstein, N. (1985). Depression and marital dysfunction: Cognitive and
behavioral linkages. International Journal of Mental Health, 13(3-4), 86-104.
Epstein, N. & Schlesinger, S. E. (1995). Problemas conjugais. In.: F. M.
Dattilio & A. Freeman (Orgs.). Estratégias cognitivo- comportamentais para
intervenção em crises (pp. 343-365). Campinas: Editorial Psy II.
Greenberg, L. S. & Goldman, R. N. (2008). Emotion-Focused Couples: fte
dynamics of emotion, love and power. Washington: American Psychological
Association.

28
Harris, R. (2009). ACT: with love: stop struggling, reconcile differences,
and strengthen your relationship with acceptance and commitment therapy.
Oakland: New Harbinger.
Hayes, S. C., Strosahl, K. D., & Wilson, K. G. (2012). Acceptance and
commitment therapy: fte process and practice of mindful chance (2. ed.). New
York: fte Guilford Press.
Hayes, S. C., Luoma, J. B., Bond, F. W, Masuda, U. M., & Lillis, J. (2006).
Acceptance and commitment therapy: model process and outcomes. Behavior
Research and Therapy, 44(1), 1-25.
Hazan, C. (2012). A natureza essencial das relações conjugais. In S. M.
Johnson, & V. E. Whiffen (Orgs.). Os processos de apego na terapia de casal e
família (pp. 40-60). São Paulo: Roca.
Hazan, C. & Shaver, P.R. (1987). Romantic love conceptualized as an
attachment processe. Journal of Personality and Social Psycho- logy, 52(3), 511-
524.
Johnson, S. (2012a). Teoria do apego: Um guia para a terapia de casal.
In S. M. Johnson & V. E, Whiffen (Orgs.). Os processos de apego na terapia de
casal e família (pp.97- 116). São Paulo: Roca.
Johnson, S. (2012b). Abrace-me apertado: Sete conversas para um amor
duradouro. São Paulo: Jardim dos Livros.
Johnson, S. M. (2007). A new era for couple therapy: fteory, research, and
practice in concert. Journal of Systemic Therapies, 26(4), 5-16.
Johnson, S. (1986). Bonds or bargains: Relationship paradigms and their
significance for marital therapy. Journal of Marital and Family Therapy, 12(3),
259-267.
Hayes, S. C., Luoma, J. B., Bond, F. W, Masuda, U. M., & Lillis, J. (2006).
Acceptance and commitment therapy: Model process and outcomes. Behavior
Research and Therapy, 44(1), 1-25.
Kazantzis, N., Dattílio, F. M., & Dobson, K. S. (2017). The therapeutic
relationship in cognitive-behavioral therapy: Clinician’s guide. New York:
Guilford Press.
Leahy R. L. (2016). Terapia do esquema emocional: Manual para o
terapeuta. Porto alegre: Artmed.

29
Levine, A. & Heller R. S. (2013). Apega- dos: Um guia prático e agradável
para estabelecer relacionamentos românticos recompensadores. Ribeirão Preto:
Novo Conceito Editora.
Mairal, J. B. (2016). Terapia integral de p reja: Una intervención para
superar las di- ferencias irreconciliables. Vallermosos: Sintesis.
Marshall, R. (2006). Comunicação não violenta: Técnicas para
aprimoramentos pessoais e profissionais. São Paulo: Ágora.
McGoldrick, M. (2012). Genogramas: Avaliação e intervenção familiar.
Porto Alegre: Artmed.
Snyder, K. D & Halford, W. K. (2012). Evi- dence-based couple therapy:
Currente status and future directions. New Developments in Evidence-based
Couple Therapy, 34(3), 229-249.
Scheeren, P., Delatorre, M. Z., Neumann, A. P., & Wagner, A. (2015). O
papel preditor dos estilos de apego na resolução do conflito conjugal. Estudos
de Pesquisa em Psicologia, 15(3), 835-852.
Scribel, M. C., Sana, M. R., & Di Benedet- to, A. M. (2007). Os esquemas
na estruturação do vínculo conjugal. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas,
3(2), 35-42.
Servan-Schereiber, D. (2004). The Instinct to Heal: Curing depression,
anxiety and stress without drugs and without talk therapy. Pennsylvania: Rodale
Books.
Silva, L. P. & Vandenberghe, L. (2008). A importância do treino de
comunicação na terapia comportamental de casal. Psicologia em Estudo, 13(1),
161-168.
Young, J. E. (2003). Terapia cognitiva para transtornos da personalidade
(3. ed.). Porto Alegre: Artmed.

30

Você também pode gostar