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Garrafada de Vinho branco e Ervas medicinais para a cura de doenças

Garrafada de Vinho branco e Ervas medicinais para a cura de doenças

No dia-a-dia, constantemente alguns processos de dominação e de subordinação


envolvem-nos sem que se perceba isto. Assim, muitas alternativas estão sendo pensadas e
colocadas em prática a fim de contribuir com a construção de uma nova educação científica.
Um exemplo destas, que vem se desencadeando no processo educacional é a valorização dos
saberes populares.
Diante de tais aspectos, não parece válido que se estude somente o conhecimento
científico muitas vezes descontextualizado, abandonando formas de produção do
conhecimento vinculadas às suas raízes e às suas culturas, pois há múltiplos saberes que estão
associados a diferentes culturas e diferentes práticas sociais que fazem parte do cotidiano.

É interessante ressaltar também, que ao longo do processo evolutivo, o homem foi


aprendendo a selecionar plantas para a sua alimentação e para o alívio de seus males e
doenças. O resultado desse processo é que muitos povos passaram a dominar o conhecimento
do uso de plantas e ervas medicinais, de modo que estas, beneficiaram e ainda continuam
beneficiando a humanidade, sendo utilizadas para o tratamento de enfermidades, mesmo
havendo medicamentos sintéticos no mercado para o tratamento das mesmas patologias.
Assim, até hoje, alguns povos ainda fazem uso consciente de medicamentos fitoterápicos
tradicionais relacionados com saberes e práticas que foram adquiridas ao longo dos séculos.

Conforme tais fatores, o saber tradicional aqui exposto, retrata a preparação de


garrafadas para cura, ou melhora de enfermidades, produzidas a partir de ervas e de vinho
branco (o vinho medicinal é a junção da casca, das flores e das folhas das ervas que irão
enriquecer o líquido onde se misturam).

O objetivo aqui é resgatar um conhecimento (saber) de uma pessoa idosa, de modo


que um conhecimento cientifico está sendo produzido, embasado em termologias como o que
é ciência e o que esta faz, diante de tal resgate.

Assim, os dados obtidos da pesquisa, consistiram na realização de uma entrevista


feita ao senhor Antônio Romão, possuidor de um saber tradicional.

Perguntas como “com quem ele aprendeu esse conhecimento” “para quê este saber é
útil para as pessoas” e “há quanto tempo ele possuía esse saber”, e “se ele achava importante
que o mesmo fosse passado para outros”, foram feitas ao senhor, que de maneira muito gentil
e coesa as respondeu dizendo que, já possuía esse conhecimento há muito tempo, e que o
havia aprendido quando tinha 18 anos de idade, com uma senhora que na época tinha 107
anos. Enfatizou que, tal conhecimento só deveria ser ensinado por pessoas de sexos
diferentes, um homem só poderia ensinar para uma mulher, e uma mulher só poderia ensinar
para um homem. Caso pessoas de mesmo sexo ensinassem umas as outras, a força da reza ou
a preparação da garrafada enfraqueceria.

Disse ainda que, só Deus era quem sabia de tudo, mas que ele (Antônio Romão)
sabia de vários remédios e umas coisas que ajudavam quando alguém procurava por socorro,
se estivesse com alguma enfermidade. Assim, o seu saber é bastante útil na ajuda destas
pessoas.

Relatou que sabia preparar varias garrafadas, utilizando na composição das mesmas,
vinho branco e ervas. Preferia usar vinho brando, no lugar de cachaça. Tais garrafadas
serviam para pessoas e para animais também, elas ajudavam na melhoria para dores nas
pernas, dores de barriga, problemas intestinais e entre outros. Os animas mais comuns que
faziam uso das garrafadas eram cavalos e bois.
O senhor Antônio acha muito importante que o saber que possui seja passado para
outras pessoas, por que quando ele morrer quem tiver adquirido seu saber dará continuidade
ao que ele fazia, não deixando assim que esse conhecimento seja esquecido.

Ele sabia também varia rezas, dentre as principais estavam, a da cura para o veneno
da cobra, a do vermelhão (que ocorria mais precisamente nas pernas), a do ramo da morfina, a
de bicheira (bichos que corroem algum animal) e a de atalhar sangramento.

Diante de tais fatos, a entrevista realizou-se de modo coerente com o esperado, sendo
as respostas dadas, explicitadas de maneira bastante clara, e assim, os resultados que puderam
ser obtidos sobre este saber tradicional que o senhor Antônio possui, foram importantes a
cerca da questão deste conhecimento, onde foi observado que existe certa crença vinda das
pessoas que fazem uso dessas garrafadas produzidas com ervas e vinho branco, pois elas
acreditam que ao tomarem o liquido contido nas garrafadas, ficariam boas ou até curadas das
enfermidades que possuíam.

O psicológico muitas vezes é um fator muito influenciante na melhora de algumas


enfermidades, e o uso destas garrafadas citadas a pouco, é um exemplo disto, pois se a pessoa
acreditar que melhorará ao tomar o líquido contido nas mesmas, poderá melhorar, embora se
saiba que, certas ervas realmente tenham fins curativos.

Assim, é com base em tudo o que já foi exposto no decorrer do texto, que uma
discussão surge abrangendo certos conceitos, como por exemplo, os fundamentos científicos
ligados a este conhecimento (produção de garrafadas com vinho branco e ervas, para cura de
doenças), sobre a perspectiva da história da ciência, e o que se tem dito sobre a mesma.

Desta maneira, conforme Ferreira (1986), Ciência, s.f. Conjunto de conhecimentos


socialmente adquiridos ou produzidos, historicamente acumulados, dotados de universalidade
e objetividade que permitem sua transmissão, e estruturados com métodos, teorias e
linguagens próprias, que visam compreender e, poss., orientar a natureza e as atividades
humanas.

A ciência é tida desta forma como um produto social, é mutável e precisa de


organização para ser feita. Deste modo, a história da ciência, progride e se acumula numa só
direção, sendo está a que é natural do pensamento humano, tendo a sociedade como mola
mestra do processo científico.
Uma relação se pode observar com o depoimento do senhor, já que este engloba
todos os aspectos, por ser um conhecimento adquirido há muitos anos, e ter sido tomado
como um fato histórico que por sua vez, possui linguagens próprias.

Outro fator, é que enquanto na ciência o conhecimento se dá por meio da aceitação


da comunidade científica, no meio popular isso se dá pela aceitação da comunidade que cerca
o individuo. Deste modo, percebe-se que essa analise, relaciona-se com a vivência de seu
Antônio Romão, pois a comunidade que o cerca, confia em seu saber (que é tratado como
algo de total importância), tirando proveito dos benefícios que o mesmo fornece.

Observa-se que o saber histórico popular ressalta a importância de se conservar as


origens, dando assim continuidade a estas, passando este conhecimento de geração em
geração. Assim, segundo as ideias de Kuhn, [...] conhecimentos elaborados no passado ou por
diferentes culturas não seriam nem melhores, nem piores, nem mais corretos que os atuais,
uma vez que se tratariam de construções humanas aceitas em determinada época e sociedade.
[...] (p.127)

Assim, [...]. Como parte da história humana, a história da ciência sofre idas e vindas,
avanços e retrocessos, dificuldades e injunções de toda sorte. A ciência não é algo que existe
de forma estanque em relação à sociedade. Ao contrário, e parte integrante dela e com ela
compartilha as vicissitudes da condição humana. Aliás, sem esses aspectos, a história da
ciência provavelmente não seria tão fascinante como é. (FILGUEIRAS, 2007. p. 91)

Diante de todos os aspectos que aqui foram explicitados, é observável que assim
como na Química, o saber popular de seu Antônio Romão é produzido a partir de produtos da
natureza (ervas), passando por vários processos com o uso do vinho, até alcançar o estado
desejado para consumo. Tais aspectos podem ser melhores entendidos, segundo a perspectiva
de Chrispino, que retrata que a Química está a serviço social da transformação dos produtos
existentes na natureza, visando o bem estar social. A química não cria a partir do nada, retira
da natureza e, num processo de concatinação de reações em situações controladas, transforma
a matéria até chegar ao produto final desejado, passando por quantos estágios intermediários
sejam necessários. (1960 p.23)

Portanto, conforme tudo o que foi exposto, conclui-se que os objetivos foram
atendidos, de modo que a entrevista realizada proporcionou um conhecimento bastante
importante à cerca dos saberes populares, juntamente com o embasamento que permeou a
história da ciência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALFONSO-GOLDFARB, Ana Maria. O que é história da ciência. 4ª


reimpressão da 1ª Ed. de 1994. São Paulo: Brasiliense, 2004 – (Coleção
primeiros passos; 286).

CHRISPINO, Alvaro. O que é química. A importância da Química. Primeira


edição, 1989.

FERREIRA, V. F. A fitoterapia no mundo atual. Química. Nova, Vol. 33, Nº.


9. 1829, 2010.

FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário Aurélio. 2ª Ed. São Paulo: Nova


Fronteira, 1986.

FILGUEIRAS, Carlos A. L. Lavoisier – o estabelecimento da Química


Moderna: nada se cria, nada se perde, tudo se pesa. [ilustrações Libero
Malavoglia]. 2ª ed. São Paulo: Odyssseus Editora, 2007. (Imortais da Ciência/
coordenação Marcelo Gleiser).

TRINDADE, L. dos S. P.; RODRIGUES, F. S.; BELTRAN, M. H. R. História


da Ciência e Ensino: alguns desafios. In História da Ciência: Tópicos Atuais.
São Paulo: Livraria da Física; Capes, 2010. pp 119-132.

VENQUIARUTO, L. D.; DALLAGO, R. M.; VANZETO, J.; DEL PINO, J. C.


Saberes Populares Fazendo-se Saberes Escolares: Um Estudo Envolvendo a
Produção Artesanal do Pão. Química Nova na Escola. Vol. 33, N° 3. pp. 135-
141. AGOSTO de 2011.

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