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Anialise de contetdo Wilson Corréa da Fonseca Junior formacao do campo comunicacional nao pode ser compreendida so fazer referéncia & andlise de contetido. Desde sua presenca nos prise trabalhos da communication research &s recentes pesquisas sobre novas tecnol passando pelos estudos culturais e de recepedo, esse método tem demons ‘grande capacidade de adaptacio aos desafios emergentes da comunicacio ‘outros campos do conhecimento. Em determinados momentos, quando se sava que havia se esgotado toda a sua capacidade de proporcionar anélises sistentes e pertinentes, eis que ressurge a andlise de contetido com novas ® cas ¢ novos objetos a serem investigados. Este capitulo possui como prin objetivo proporcionar a compreensio inicial sobre esse método polémico. ando por uma breve revisio histérica e terminando com as principais t& utilizadas, Ao final do texto, seja qual for a posi¢ao do leitor, uma concl certa: a anilise de contetido é impossivel de ser ignorada. 1 Histéria ‘A Anélise de Contetido (AC), em concepcao ampla, se refere a um das ciéncias humanas e sociais destinado a investigacao de fendmenos siz cos por meio de varias ténicas de pesquisa. Esse conjunto de instrum metodolégicos, em constante aperfeigoamento, vem sendo utilizado, pele nos, desde o século XVII, quando a corte suica analisou minuciosame: colegio de 90 hinos religiosos andnimos, denominados Os cantos de Si saber se eles continham idéias perniciosas, sem que nenhuma prova de hes fosse encontrada (KRIPPENDORFF, 1990, p. 15-16). A adogio regular d= Anilise de conceido 281 se de contetido, entretanto, s6 veio a ocorrer no inicio do século XX, estando a servigo de varios campos do conhecimento. Nas ciéncias politicas, por exemplo, propiciou a descoberta de armas secretas alemas pelos britanicos, a partir do estudo da propaganda nazista; na psicologia, contribuiu para o diagnéstico de pacientes por meio da anilise da gravacao de entrevistas terapéuticas; na critica literdria, permitiu destacar os tracos caracteristicos do estilo de um autor; na sociologia, a compreender a diversidade das mentalidades nacionais; na comu- nicagao de massa, a comparar as atitudes adotadas por diferentes jornais em perfodo eleitoral (KIENTZ, 1973). Embora a andlise de contetido tenha servido, e ao mesmo tempo agregado, a essa diversidade de conhecimentos, seu status enquanto método de pesquisa ja passou por periodos ciclicos de grande reconhecimento ~ como ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial ~ ¢ de desqualificacao, como se verificou na década de 1970 entre pesquisadores marxistas. Neste caso, um dos principais argu- mentos era que a analise de contetido, devido a sua origem positivista, nao per- mitiria uma aproximacio critico-ideoldgica suficiente dos meios de comunica- cao de massa. Essa colocacio viria depois a ser contestada por outros autores Inarxistas, 20 afirmarem que 0 trabalho critico nao se define pelas técnicas de pesquisa que utiliza (LOZANO, 1994). Nos anos de 1990, a possibilidade de acesso, pela World Wide Web (www), a arquiivos on line de jornais, programas de ridio ¢ de televisdo levou a um renovado interesse pelas técnicas de anélise de conteiido, em particular daquelas elaboradas com 0 auxilio do computador (BAUER, 2002, p. 189-190). No decorrer de um século, o desenvolvimento aplicagdo desse método conquistaram adeptos fervorosos, usuarios cautelosos ctiticos reticentes. No cerne da polémica encontra-se um debate ideol6gico, ainda nao totalmente superado, sobre a pertinéncia de uma das visdes mais tradicionais da ciéncia: o positivismo. 1.1 A heranga po: No contexto geral da ciéncia, a andlise de contetido é tributaria do positivismo, corrente de pensamento desenvolvida por Augusto Comte (1798-1857), cuja principal caracteristica é a valorizaco das ciéncias exatas como paradigma de Cientificidade e como referéncia do espirito humano em seu estégio mais eleva~ do. Na viso positivista, até mesmo as teorias sobre a vida social “deveriam ser formuladas de forma rigida, linear ¢ metédica, sobre uma base de dados verificaveis” JOHNSON, 1997, p. 179), procurando-se evitar “a andlise de in- tengdes ¢ de outros fatores nao-quantificéveis” (ROHMANN, 2000, p. 315) Essa postura encontra-se presente em varias definicées de anilise de conteiido, entre elas a clissica definicio formulada em 1952 por Bernard Berelson ~e cita- da por autores como Kientz (1973), Bardin (1988) e Krippendorff (1990) -, que 282. Métodos«rénicas de pesquiza em comunicasio a designa como “uma técnica de pesquisa para a descri¢ao objetiva, sistematic quantitativa do contetido manifesto da comunicacao’.. A énfase no aspecto quantitativo dessa definicao, associada a comunicacss como objeto de estudo, se deve ao fato de a andlise de contetido haver se conso- lidado nos Estados Unidos, na primeira metade do século XX, como uma “re=- sao contra a antiga andlise de texto, excessivamente subjetiva, e de uma necessi- dade de sistematizacio imposta pelo prodigioso desenvolvimento da comunics- io de massa” (KIENTZ, 1973, p. 10). Curiosamente, a ascenséo desse método no decorrer do tempo chegou a ser quantificada por Barcus (1959, apud BARDIN. 1988, p. 22), cujo trabalho revelou um crescimento em razao geométrica. Ent 1900 e 1920, o némero de estudos realizados com a utilizagao da andlise de contetido era, em média, de apenas 2,5 ao ano; entre 1920 e 1930, esse ntimero assou para 13,3 trabalhos anuais; entre 1930 e 1940 subiu para 22,8, chegando a 43,3 na década seguinte. Nos anos de 1950 ja eram produzidos mais de cem estudos anuais, 1.2 A supremacia dos néimeros Os trabalhos iniciais em anélise de contetido encontram-se estreitamente relacionados a0 florescimento do jornalismo sensacionalista (muckrakine Journalism) nos Estados Unidos nas tltimas décadas do século XIX. Ao assum a perplexidade da sociedade civil diante desse fendmeno, as primeiras escolas norte-americanas de jomalismo adotaram a anélise quantitativa de periédicos como critério de objetividade cientifica. Desencadeou-se, entdo, um “fascinio pela contagem e pela medida (superficie dos artigos, tamanho dos titulos, locali- zacio na pagina)”, chegando-se a mensurar o grau de “sensacionalismo” nos textos da imprensa (BARDIN, 1988, p. 15). Segundo Krippendorff (1990, p. 16- 17), talvez um dos primeiros estudos nessa linha seja “Do newspapers now give the news?” (Os jornais se ocupam de noticias atualmente?), publicado ainda em: 1893. Nesse artigo, G. J. Speed demonstra como as questées religiosas, cienti- cas e literdrias haviam desaparecido dos principais jornais nova-iorquinos, entre 1881 e 1893, para dar lugar as intrigas, aos escandalos e aos esportes. A partir do caminho aberto pelas pesquisas sobre o sensacionalismo na im- prensa, diversas outras disciplinas (psicologia, histéria, sociologia etc.) passa- ram a incluir a andlise de concetido entre suas técnicas de pesquisa. No campo da comunicacao, até a metade do século XX, as grandes preocupacoes dos estu- diosos estiveram relacionadas ao problema da opinio publica e & propaganda politica. No primeiro caso, a principal obra de referencia é Public opinion, de Walter Lippman, publicada em 1922, que estimulou a investigagao sobre os esteredti- Pos sociais. No segundo caso, Harold Dwight Lasswell escreve Propaganda isteméticae g comunica se méroda sd BARDIN. Etrica. Entre 2 andlise sse nimero 8, chegand: mais de cem eiras escolas e periédices am “fascinis rulos, loc alismo” nos (1990, p. 16- ers now give do ainda em 52s, cientifi- guinos, entre res. lismo na im- etc.) passa- 2. No campo Ses dos estu- . propaganda on, de Walter os estereéti- = Propaganda Anilise de conteido 283 technique in the World War, publicado em 1927, em que analisa os principais te~ mas das propagandas americana, inglesa, francesa ¢ alema durante a Primeira Guerra Mundial. © grande impulso recebido pela andlise de contetido ocorreu mesmo duran- te a Segunda Guerra Mundial. Nessa época, 25% das pesquisas com esse méto- do estiveram a servico do governo americano, seja dedicando-se a desmascarar periddicos e agéncias de noticias suspeitos de propaganda subversiva (BARDIN, 1988; KIENTZ, 1973), seja monitorando as transmiss6es radiofnicas internas dos nazistas e seus aliados (KRIPPENDORFF, 1990). Terminada a guerra, a anilise de contetido passou por séria crise epistemol6gica, a ponto de Bernard Berelson, um de seus principais formuladores, afirmar que 0 método nfo possui qualidades magicas e que nada substitui as idéias brilhantes (BARDIN, 1988, p. 20). Apesar da crise, a andlise de conteiido jé havia conseguido, até aquele mo- mento, numerosos avancos quando comparada a anélise quantitativa de jomnais (1) a incorporagao de ricos marcos te6ricos com a ades4o de muitos cientistas sociais eminentes; (2) a definicdo de conceitos bastante especificos, como os de atitude, estereétipo, estilo, simbolo, valor e métodos de propaganda; (3) a aplica- ‘fo de ferramentas estatisticas mais precisas, especialmente aquelas proceden- tes de enquetes e experimentos psicol6gicos; ¢ (4) a incorporacéo dos dados procedentes da andlise de contetido em trabalhos de maior envergadura. A pri- Meira exposicao suméria desses trabalhos apareceu no livro de Berelson Lazarsfeld, Content analysis in communication research (Andlise de contetdo na pesquisa em comunicaco), publicado em 1948 e considerado o primeiro manual sobre esse método (KRIPPENDORFF, 1990, p. 20): 1.3 A valorizacao da inferéncia © reconhecimento de Berelson sobre as limitag6es do método néo foi suficien- te para diminuir sua imporcancia. Em 1955, durante o Ultimo de uma série de congressos convocados pela Social Science Research Concil’s Comittee on Linguistic and Psichology, pesquisadores de diversas ércas afirmaram seu interesse pela ané- lise de conectido, que readquiriu fOlego incorporando novas contribuigGes. Se- gundo Bardin (1988, p. 21), 0 aspecto mais importante desse periodo consistiu ha superagao da excessiva énfase no aspecto quantitativo, pois alguns pesquisa Gores se interrogaram “acerca da regra legada pelos anos anteriores, que con- fundia objectividade e cientificidade com a minéicia da anilise de freqiiéncias”, Na pritica, isto significa que “a andlise de contetido jé no ¢ considerada exclusiva mente com um alcance descritivo (cf. os inventarios de jornais do principio do ‘éculo), antes se tomando consciéncia de que a sua fungo ou 0 seu objectivo a inferéncia” (BARDIN, 1988, p. 21-22, grifos do autor), seja ela baseada ou ndo etm indicadores quantitativos. 284 Métodos eticniens de porguiss em comaniengio Na anilise de contetido, a inferéncia é considerada uma operacao logica des- tinada a extrair conhecimentos sobre os aspectos latentes da mensagem analisa- da, Assim como 0 arquedlogo ou o detetive trabalham com vestigios, 0 analista trabalha com indices cuidadosamente postos em evidéncia, tirando partido do tratamento das mensagens que manipula, para inferir (deduzir de maneira légi- ca) conhecimentos sobre 0 emissor ou sobre 0 destinatério da comunicacio (BARDIN, 1988, p. 39-40). Por meio da inferéncia procura-se, por exemplo, adivinhar as intencGes militares que esto por trés dos discursos de propaganda estrangeira ou por em evidéncia as avaliagdes (opinides, tomadas de posicso conscientes ou nao) de um individu, a partir de seus enunciados (BARDIN, 1988, p. 40). Ao focar atencao nos mecanismos subjacentes da mensagem que nao podem ser observados, a inferéncia também contribuiu para amenizar o impacto da heranga positivista na anilise de contetido. © melhor exemplo dess2 tendéncia é a definicao de Krippendorif (1990, p. 29), para quem “a anélise de conteiido & uma técnica de investigacio destinada a formular, a partir de certos, dados, inferéncias reproduziveis e vélidas que podem se aplicar a seu contexto”. 1.4 A andlise de contetido na América Latina O desenvolvimento e a utilizacdo da andlise de contetido nao se restringiram ‘aos Estados Unidos, podendo ser encontrados em outros paises e regides, como na Europa - particularmente na Franca ~ e na América Latina. Segundo Bardin (1988, p. 19), até o inicio da década de 1970 os pesquisadores franceses obedeciam de maneira rigida ao modelo original berelsoniano, negando os 20 ou 30 anos de progressos americanos, e negligenciando a contribui¢ao francesa ou estrange!- ra das ciéncias conexas & anilise de conteddo (a lingiiistica, a semantica, @ semiologia, a documentacao, a informatica). Na América Latina, a difuséo am- pla da andlise de contetido é atribuida ao Centro Internacional de Estudos Supe- riores de Jornalismo para a América Latina (Ciespal), por meio da introducao dos estudos de jornalismo comparado iniciados por Jacques Kayser, ex-diretor do Instituto Francés de Imprensa (MARQUES DE MELO, 1972). Fundado pela Unesco em 1958, em pleno contexto da Guerra Fria, 0 Ciespal estimulou, na década seguinte, o ensino técnico-profissional em oposicao a for- macio clissico-humanista que até ent predominava nos cursos de jornalismo. Reflexo de uma politica de contra-insurgéncia 4 ameaca comunista no continente, a atuago do Ciespal representou a modernizacio dos sistemas educacionais lati- no-americanos pela valorizagio do funcionalismo norte-americano' (MEDITSCH, 10 funcionalismo & uma derivagao do positivismo, adequado a sociologia por Emile Durkheim. As idéias de Durkheim foram sistematizadas nos Estados Unidos por incermédio de Talcott Parsons € Robert K. Merton, nomes consicerados cléssicos do funcionalismo norte-americano. 1999). A concentr aplicand Deutsch na, Entn professo de Catél magao | 1972). 15 1 At entre o! a anélis quantit quisade saparec cia do< cados ¢ do anal dizia B deve & de inve deain de not apud I como deste ° anos, como cia ca Partid propo didatc (Dos conta : posicZo SARDIN, Ses, como do Bardin obedeciam 30 anos de estrangei- mantica, 2 ifusio am- ados Supe- srodugio _ex-diretor 2, 0 Ciespal igo a for- jornalismo. ‘continente, cionais lati- MEDITSCH, Anilse de conteido 285 1999). Além de formar pesquisadores, aquele centro internaciona] também se concentrou num projeto-piloto ~ Dos semanas en la prensa de Américt Latina -, aplicando-se a metodologia desenvolvida por Kayser Schramm, Markham € Deutschmann @ andlise de morfologia e contetido da imprensa latino-america~ hha. Enire os pioneiros a adotar @ proposta do CIESPAL no Brasil encontet-tf © professor Luiz Beltrdo, a0 criar, em 1961, 0 Curso de Jornalismo da Universida- are dlica de Pernambuco e, dois anos depois, 0 Instituto de Ciéncias da Infor agao (Icinform), vinculado & mesma universidade (MARQUES DE MELO, 1972). 1.5 Tendéncias atuais em andlise de contetido ‘Atualmente, embora seja considerada uma técnica hibrida por fazer a poms entre o formalismo estatistico ea anise qualitativa de materiais (BAUER, 2002), cranilise de contetido oscila entre esses dois pélos, ora valorizando o aspet© quantitativ, ora o qualitativo, dependendo da ideologia ¢ dos interesses do pes- Guisador, Apesar da introducio da inferéncia, a empatia pelos niimeros nao de- apareceu. A adocao do computador na andlise de contetido éa principal evidér seer oninuo interesse pela anélise quantiativa, Entretanto, por mais sofist cados que sejam os programas de informatica, eles ainda no substituem o papel analista na formulagao da pesquisa e na andlise dos dados ~ ou seja, come ja tata Berelson, nada substitui as idéias brilhantes. Outro aspecto imporsent: dove as propostas de utilizagdo desse método em parceria com ovine récnicas dde investigacio. Ao abordar a anélise semidtica de imagens, Penn (2002) defen- de a integrardo da semiologia com a andlise de contetdo; no estado da producio se areas, Barba (1994) sugere a incorporacso da etnografia; Michelat (1981, gpud DUARTE, 2005) considera pertinente a utilizacdo da anilise de conteido aeno técnica acessoria na pesquisa por meio de entrevistas (ver 0 Capitulo 4 deste livto). © desenvolvimento hist6rico da andlise de contetido se reflete, nos dlrimos anos, em Varios enfoques de pesquisa nos diversos campos do conhecimels®, como a psicologia, historia e comunicarZo. Além disso, verifica-se 0int tendén- Giacada vez maior de sua utilizagao na esfera do ativismo politico, Desde 1982, 0 cae Radical Kaliano (worw. radicalpary.org), por exemplo, denuncia a des- proporeao do tempo concedico pelos principais telejornais daquele pafs aos can- ar gecos do govern e 20s da oposiczo, a partir da anélise do contesido televisivo (DOSSIER RAI, 1982).? Mais recentemente, esse, mesmo partido passou @ wallizar a proporcéo de assuntos de interesse piblico cobertos pels imprene To autor agradece & jornalisa Sueli Bach pela cessio de documentos por ela obtidos junto a0 Partido Radical Italiano. 286 Métedos «técnica de possuiss em comunicagso sa, Enquanto isso, na Suécia, a International Clearinghouse on Children and Violence on the Screen, financiada pela Unesco e pelo governo sueco, analisa as represen- tac6es de violéncia da midia nas criangas JENSEN, 2001). No Brasil, trabalho semelhante é realizado pela Agéncia de Noticias dos Direitos da Infancia (ANDI) (), que periodicamente realiza analises quanti-qualitati- vas detalhadas sobre o tratamento editorial concedido a infancia pela midia impressa. 2. Fundamentos conceituais Desde a publicagao do primeiro manual sobre andlise de contetido, elabora- do por Berelson e Lazarsfeld em 1948, os fundamentos conceituais desse méto- do vém sofrendo revisées. Apesar da diversidade de abordagens — ou até mesmo em funcao delas - & possivel construir um referencial bisico sobre os principais fundamentos da andlise de contetido. 2.1 Perfil da andlise de contetdo No contexto dos métodos de pesquisa em comunicacio de massa, a anélise de contetido ocupa-se basicamente com a andlise de mensagens, 0 mesmo ocor- tendo com a anélise semiol6gica ou anilise de discurso. As principais diferencas entre essas modalidades so que apenas a anilise de contetido cumpre com os requisitos de sistematicidade e confiabilidade. Segundo Lozano (1994, p. 141-142), A andlise de contetd é sistematica porque se baseia num conjunto de procedimentos que se aplicam da mes- ma forma a todo o contetido analisével. E também con- fiével — ou objetiva — porque permite que diferentes pes- sons, aplicando em separado as mesmas categorias & mes- ‘ma amostra de mensagens, possam chegar ds mesmas conclusées. Na visdo de Krippendorff (1990), 2 andlise de contetido possui atualmente urés caracteristicas fundamentais: (a) orientag4o fundamentalmente empirica, exploratéria, vinculada a fendmenos reais ¢ de finalidade preditiva; (b) transcen- déncia das nogies normais de contetido, envolvendo as idéias de mensagem, canal, comunicacio e sistema; (c) metodologia prépria, que permite ao investi- gador programar, comunicar e avaliar criticamente um projeto de pesquisa com independéncia de resultados. Durante muito tempo, a andlise de contetido foi considerada quase sinéni- mo de andlise de mensagens escritas e impressas. Até as mensagens orais (dis- cursos poli sadas sob ¢ de acesso | apenas a 2 dda; em seg em tiltimo olfato e gu Strauss tei como uma siderar qui queljo cor comum «: mente em nais, revis de mensa TV segme massa tra 2.2 Ma Sega requer do 1.0 mentos b deve pen: como ele 2.0 curso occ influenci texto dos blemas p de forma comunic 3.0 gura nur terminat inferénci por ele f 4.0 se enuni and Violence s represen- il, trabalho cia (ANDI) -i-qualitati- pela midia do, elabora- desse méto- 2 até mesmo os principais sa, a andlise mesmo ocor is diferengas mpre com os p. 141-142), si atualmente nte empirica, (©) transcen- le mensagem, ite a0 investi- pesquisa com quase sinoni- ens orais (dis- Anilse de conceido 287 cursos politicos, entrevistas psicoterapicas, emissdes radiof6nicas) eram anali- sadas sob a forma de transcricées. Ainda hoje, mesmo diante dos baixos custos de acesso e documentacéo das mensagens dos varios canais de comunicacio, apenas a anélise de materiais impressos encontra-se normalmente desenvolvi- dda; em segundo plano ficam os estudos de mensagens sonoras e audiovisuais; em titimo plano encontram-se as mensagens dos outros canais sensoriais (tato, olfato e gustacio), muito pouco estudados, embora o antropélogo Claude Lévi- Strauss tenha aberto esse caminho ao contemplar a cozinha de uma sociedade como uma linguagem (KIENTZ, 1973). Partindo dessa premissa, € possfvel con- siderar que alimentos industrializados, tais como a lasanha semipronta, 0 pao de queijo congelado e a feijoada em lata, no caso brasileiro, possuem muito em comum com os produtos da industria cultural por serem difundidas macica- mente em exemplares rigorosamente idénticos, assim como os CDs, livros, jor- nais, revistas, videos e DVDs, Outro grande desafio, a ser superado, é a aniilise de mensagens da chamada nova midia (Internet, CD-ROM, livros eletr6nicos, TV segmentada), que altera algumas caracteristicas centrais da comunicacao de massa tradicional: a unidirecionalidade e a massificacdo (LIMA, 2001). 2.2 Marcos de referéncia Segundo Krippendorff (1990, p. 35-40), a adogao da andlise de contetido requer do pesquisador a consideragZo aos seguintes marcos de referéncia: 1. Os dados, tais como se apresentam ao analista: os dados sio os ele- mentos basicos da andlise de contetido e constituem a superficie que o analista deve penetrar. Por isso é preciso deixar claro que dados estao sendo analisados, como eles foram definidos ¢ de qual populacio eles foram extraidos. 2.0 contexto dos dados: nao é possivel ignorar que um determinado dis- curso ocorre em fangao de um contexto e que algumas condicdes do contexto influenciam na construgo do discurso. Assim, é fundamental explicitar 0 con- texto dos dados, que precisa ser delimitado de acordo com as convencies ¢ pro- blemas praticos de cada disciplina. Uma mesma mensagem pode ser analisada de forma diferenciada no ambito da psicologia, sociologia, ciéncias politicas ou comunicacao. 3. O conhecimento do pesquisador: se o proprio texto cientifico se confi- gura num discurso, 0s interesses e conhecimentos do pesquisador também de- terminam a construgéo do contexto dentro do qual sero realizadas suas inferéncias, Portanto, é necessdrio que pesquisador explicite os pressupostos por ele formulados sobre a relagdo entre os dados e seu contexto. 4, O objetivo da anilise de contetido: em toda andlise de contetido deve- se enunciar, com dlareza, a finalidade ou o objetivo das inferéncias. Estudos 288 Métodoeeténicas de pesquisa em comunicagao exploratérios preliminares podem auxiliar o pesquisador a decidir sobre 0 me thor enfoque para seu trabalho. Essa decisao é muito importante, porque esc diretamente relacionada a selecao do material a ser analisado. Os projetos d= andlise de contetido normalmente incluem um objetivo geral e varios objetivos especificos. 5. A inferéncia como tarefa intelectual basica: a tarefa de toca anilise contetido consiste em relacionar os dados obtidos com alguns aspectos de se contexto. Uma coisa é analisar 0 contetido dos cartazes oficiais na China; outs bem diferente 6 compreender 0 que os chineses aprendem sobre as decises politicas do governo, a partir da anélise de contetido dos cartazes oficiais. 6. A validade como critério de sucesso: embora a razio de ser da andl de contetido soja justamente a falta de provas diretas sobre os fendmenos an: sados, os quais constituem 0 objeto da inferéncia, é necessario que sejam est= belecidos critérios para a validacao dos resultados, para que outras pessoas pos sam comprovar se as inferéncias sdo de fato exatas. 3 Ométodo O desenvolvimento do método de andlise de contetido é 0 resultado da con tribuigao de diversos autores. Entre as tendéncias metodolégicas existentes, en- contra-se a proposta da pesquisadora francesa Laurence Bardin (1988). Isso n: invalida, neste capitulo, a inclusao de outras idéias no delineamento metodoldgi de Bardin, seja como forma de enriquecer ou de atualizar seu pensamento.? Em sua concepsio original, a autora estruturou o método de andlise de contetido cinco etapas: (3.1) Organizacdo da anélise; (3.2) A codificagao; (3.3) A categorizacio; (3.4) A inferéncia; e (3.5) O tratamento informético. 3 A concepcao de Bardin sobre o método de anilise de contetido, colocada a seguir, encontr: se na terceira parte de sua obra ja considerada cléssica. Procurando-se evitar o excesso de citagoe: ¢ facilitara leitura, optou-se por referenciar essa autora nos casos estritamente necessatios, como forma de diferenciar suas idéias da dos demais autores utilizados neste capitulo = sobre 0 me- porque est 's projetos de sos objetivos oda andlise de pectos de seu 2 China; outra re as decisées oficiais. ser da andlise menos anali- ue sejam esta- 5 pessoas pos- sultado da con- existentes, en- 1988). Isso no > metodolégico nsamento.* Em ie conteaido em. 2 seguir, encontra- excesso de citagies ecessérios, como lo. Escolha de documentos |¢—>| Anilise de contedido 289 Desenvolvimento de uma andlise PRE-ANALISE _ La a ae 4 = a ¥ ; rormitscio de fiplewer| Referenciacao dos indices 1 dos objetivos Elaboracao dos indicadores Dimensao e direcoes deaudlse Regras de recorte, de categarizacio, de codificacao| Preparacao do material Texting das técnicas Fonte: Bardi Figura 1 Outras orientacdes | para uma nova analise : [eesaarnae Herre ey geet as “| EXPLORACAO DO MATERIAL Administracdo das técnicas sobre 0 corpus | ‘TRATAMENTO DOS RESULTADOS E INTERPRETACOES Operagies estatisticas T <—|_Provas de validacéo Sintese e selegao dos resultados v Interpretacao Uilizagéo dos resultados de analise com fins, teéricos ou pragmaticos , 1988. Esquema de Bardin. 290 Métodos erénicas de pesquisa em comunicasso 3.1 Organizagao da andlise ‘A anilise de contetido organiza-se em trés fases cronoldgicas: (1) Pré-analt se: consiste no planejamento do trabalho a ser elaborado, procurando sistemati= sar as idéias iniciais com o desenvolvimento de operacdes sucessivas, contempla- das num plano de andlise; (2) Exploracéo do material: refere-se & andlise pro priamente dita, envolvendo operagdes de codificagao em funcao de regras previs= erente formuladas, Se a pré-anilise for bem-sucedida, esta fase nao é nada mais do gue a administragio sistemstica das decisGes tomadas anteriormente; (3) Trate- wrento dos resultados obtidos e interpretacao: os resultados brutos so trata Tox de mancira a serem significativos e vilidos. Operacoes estatisticas (quando for 0 caso) permite estabelecer quadtos de resultados, diagramas, figuras ¢ mo- Gelos. A partir desses resultados, 0 analista pode ento propor inferencias. Ums visio geral sobre essas fases pode ser encontrada na Figura 1 De todas as fases da andlise de contetido, a pré-anilise € considerada uma das mais importantes, por se configurar na propria organizacio da andlise, que serve de alicerce para as fases seguintes. Envolve a escolha de documentos 2 serem submetidos andlise, a formulagao das hipéteses e dos objetivos, bem: tomo a claboracio de indicadores que fundamentem a interpretacao final. V- Sando facilitar 0 trabalho da pré-andlise, encontram-se a seguir alguns pontos importantes a serem considerados. Por onde comegar ‘Toda pesquisa cientifica ¢ motivada pelo desejo de compreensao de alguns aspectos do mundo real com a utilizacio de procedimentos j& consagrados, en- tre eles o método de pesquisa. Entretanto, nenhum método - nem mesmo 2 undlise de contetido ~ € capaz de substituir uma boa teoria e um problema de pesquisa sélido (BAUER, 2002). “Nao devemos esquecer que a andlise de con- feido é apenas um instrumento, um meio a disposi¢do da pesquisa, jamais urs fimem si”, afirma Kientz (1973, p. 161). Por isso ¢ importante que se tenha, pelo menos, algum ponto de partida. Krippendorff (1990) acredita que a primeira coisa 2 set feita € estabelecer algum objetivo de pesquisa, embora reconhera que muitos analistas partam do extremo oposto, isto &, dos dados disponiveis, para eles extrair alguma idéia interessante sobre o que pesquisa. Bardin (1988) € tum dos que adotam esse procedimento ao propor como primeira atividade da nilise de conteddo a leitura flutuante, ou seja, 0 contato com os documentos 2 Serem analisados, visando conhecer 0 texto deixando-se invadir por impressoes ¢ orientagbes. Isto ocorre principalmente em dominios de investigagao pouco ex- plorados, em que faltam 20 mesmo tempo a problematica de base e as técnicas 2 Iitilizar. Essa perspectiva nfo invalida a utilizacio da andlise de contetido como Instrumento de verificacéo de hipéteses. Na realidade, segundo Bardin (1988), esses dois enfoques podem coexistir de maneira complementar. ») Pré-andli- do sistemati- , contempla- -anilise pro- egras previa- nada mais do e; (3) Trata- ros so trata- icas (quando figuras e mo- réncias. Uma siderada uma . anilise, que ocumentos a pjetivos, bem cio final. Vi- Iguns pontos do de alguns ssagrados, en- em mesmo a "problema de nalise de con- sa, jamais um se tenha, pelo ue a primeira -econheca que poniveis, para din (1988) é 2 atividade da documentos a © impresses € 0 pouco ex- eas técnicas a ontetido como Bardin (1988), Andlise de contenido 291 que analisar [As diversas aplicades da andlise de contetido, j4 relacionadas por Berelson em 1950 ¢ agrupadas por Janis em 1965, foram organizadas por Krippendorff (1990, p. 45-69) em seis categorias: a) Sistemas: o sistema é uma construgao mental que descreve uma por- 40 da realidade, constituida por um conjunto de elementos interdependentes. A partir do enfoque sistémico é possivel extrapolar 0s dados existentes para outros estados de coisas ainda desconhecidos, come, por exemplo, conhecer a origem tedrica de um texto cientifico pela anilise de suas referéncias bibliograficas. b) Normas: a anilise de contetido permite saber em que medida as men- sagens estéo de acordo com normas preestabelecidas. Dados sobre a composicao demogrifica de uma determinada populacdo (origem étni- «a, idade, profissdo) podem servir de referéncia para avaliar a populacao de personagens de ficco numa telenovela; questées legais, como a exi- gencia de certa proporcdo de programas jornalisticos numa programa- 40 radiofonica, podem ser utilizadas como norma para a avaliagao de uma emissora de radio, c) indices e sintomas: o indice é uma varidvel cuja importancia numa investigagdo depende do grau em que se possa consideré-lo correlato de outros fenémenos. Na medicina os indices sio denominados sinto- mas. O quociente de perturbac3o na fala mede a anguistia do paciente numa entrevista psiquidtrica; 2 andlise de reclamagSes dos cidadaos por meio de cartas ou telefonemas pode levar & criacao de indices de insatis- facdo. d) RepresentagGes lingitisticas: qualquer discurso possui como princi pal caracteristica a intervengao da linguagem, mediante a exposicio e a argumentacio sisteméticas. Entretanto, a maior parte dos analistas de contetido se limita a realizar cAlculos a partir dos dados lingiiisticos, nao entrando no mérito das implicagSes da linguagem. Entre as exce- ‘ses encontra-se o trabalho de Allport, realizado em 1965, que, ao ana- lisar as Cartas de Jenny, de carater pessoal, mostra como poderia ser 0 mundo do autor dessas cartas, a partir de diversas inferéncias psicolé- gicas extraidas do material disponivel. ¢) Comunicagoes: o intercambio de mensagens ocorre dentro de um de- terminado contexto ¢ modifica as relacdes estabelecidas entre duas ou mais pessoas. A andlise das comunicagdes pode contribuir para expli- car as causas € os efeitos inerentes a essa mediacao simbélica, como a existéncia de psicopatologias, o aparecimento de conflitos e de consen- 0 ou mesmo a transformagdo de uma cultura material. Ainda séo pou- 292 Métodos eenicas de pesquisa em comunicagio co freqiientes os trabalhos de anilise de contetido sobre essa forma de investigacao. Processos institucionais: as mensagens também podem desempenhar func6es dentro das organizacées e das instituigSes sociais. A existénci2 de familias, érgéos governamentais ¢ sociedades é impensdvel sem for- mas regulares e normais de processos de comunicacdo. Por isso, 08 pro- cessos institucionais sao objeto de particular interesse da andlise de con- tetido, principalmente aqueles verificados no ambito das organizagées de comunicacao de massa, como o processo de adaptagao de uma obra lite- réria para 0 cinema ou os mecanismos de selecdo de noticias num jornal Na drea de comunicacao organizacional, a andlise de contetido & também de grande valia como instrumento de inteligéncia organizacional e com- petitiva, auxiliando na avaliago e monitoramento dos ambientes interno @ externo (ver o Capitulo 22 neste livro).. A constituigao do corpus Apés a realizacao da leitura flutuante, que levaré a escolha do tema ¢ do referencial tedrico, passando pela formulacao do problema, dos objetivos ¢ das hipéteses de pesquisa, o proximo passo ser a constituico do corpus, ou seja, 2 definicao do conjunto de documentos a serem submetidos 4 anélise. Segundo Bardin (1988) e Barros e Targino (2000), as principais regras para a constituicéo do corpus so as seguintes: a) Regra da exaustividade: todos os documentos relativos ao assunto pesquisado, no perfodo escolhido, devem ser considerados, sem deixar de fora nenhum deles por qualquer razAo (dificuldade de acesso, extra- vio, material desinteressante etc.). Seo objetivo for analisar a publicids- de de automéveis publicada na imprensa durante um ano, por exemplo, qualquer antincio publicitério que corresponda a esses critérios deve ser incluido. b) Regra da representatividade: as pesquisas sociais, de forma geral abrangem um universo de elementos 10 grande que se torna impossi- vel consider4-los em sua totalidade, sendo necessério trabalhar com uma amostra (GIL, 1999). Um dos grandes problemas encontrados na utilizagdo da andlise de contedido é justamente esse: a definigao do ta~ manho da amostra. A amostragem sera rigorosa se a amostra for um2 parte representativa do universo inicial. Quantas edig6es de um jornal por exemplo, séo necessérias para generalizar os resultados sobre © periodo de um ano? A definicao do tamanho da amostra também depende da disponibilidade de recursos humanos, econémicos ¢ temporais (LOZANO, 1994). Se a edicdo de OPT TE Ye Wee Anilise decomeido 293 determinado jornal possuir em torno de 50 noticias pertinentes para a andlise e a deciséo for selecionar 14 edigSes (amostragem de datas), isto implicara na codificagao de cerca de 700 noticias (amostragem de unidades de anélise). Se a ‘meta for analisar dois jornais, ento esse mimero sobe para 1.400 noticias, exi- gindo folego do pesquisador, tempo de pesquisa ou, até mesmo, recursos finan- ceiros, caso seja necessdrio contar com auxiliares para efetuar esse trabalho no cronograma estabelecido. Entre os tipos de amostragem mais comuns em anélise de contetido encon- sram-sea “amostragem nao probabilistica de semanas compostas” ea “amostragem, probabilistica de semanas compostas”, normalmente utilizadas na andlise da im- prensa. No primeiro caso, escolhe-se, no calendario, a semana que servira como referéncia inicial e, dentro dessa semana, o dia em que se deseja comecar a and- lise, geralmente uma segunda-feira. Na semana seguinte, 0 dia escolhido seré serca-feira, na semana posterior a quarta-feira e assim por diante, até chegar & étima semana, que inclui 0 domingo. No segundo caso, a “amostragem srobabilistica de semanas compostas” possui a vantagem da anterior, além de saregar o beneficio da aleatoriedade. Consiste em agrupar todas as segundas, eras, quartas-feiras e assim por diante em diferentes grupos e, em cada um eles, sortear uma data, até completar o ntimero de edicées estabelecido (LOZANO, 1994). ‘As decisées sobre a constitui¢ao do corpus também condicionam a énfase a ser dada na pesquisa (andlise quantitativa ou qualitativa). Se a quantidade de material a ser analisado for muito grande, isso exigira a adocao de procedimen- cos de estatistica para se obter uma visio de conjunto, devendo-se optar pela enélise quantitativa. Neste caso, ganha-se em abrangéncia, mas perde-se em crofundidade. Se o objetivo for aprofundar o contetdo, torna-se impossivel Srocessamento de uma grande quantidade de dados, devendo ser realizada uma anilise qualitativa. ©) Regra da homogeneidade: os documentos obtidos devem ser da mes- ‘ma natureza, do mesmo género ou se reportarem ao mesmo assunto. Cinema, publicidade e jornalismo, por exemplo, séo géneros diferentes de comunicacdo que se prestam & andlise de contetido. Mas o corpus no pode incluir, simultaneamente, filmes, amincios e noticias. Além disso, dentro de uma mesma natureza de documentos pode haver sub- divisdes, como 0s géneros cinematograficos (romance, aventura, co- média, mistério ete.) ¢ os géneros jornalisticos (noticias, editoriais, ar- tigos, entrevistas etc.), exigindo também critérios diferenciados para serem analisados, de forma a respeitar sua homogeneidade. 4d) Regra de pertinéncia: os documentos devem ser adequados aos obje- tivos da pesquisa em todos 0s aspectos: objeto de estudo, perfodo de anélise € procedimentos. Se 0 objetivo é analisar a posicéo oficial do 294. Mitodosetéenicas de pesquisa em comunicasio governo sobre a mudanga das regras dos planos de satide, por exemplo, no 6 pertinente um corpus de entrevistas concedidas a imprensa pela diretoria do Conselho Federal de Medicina, mas sim os diversos comu- nicados oficiais do governo sobre o assunto no perfodo estabelecido para andlise. 3.2 A codificagao A codificacio € 0 processo de transformagdo dos dados brutos de forma sistematica, segundo regcas de enumeracio, agregacio e classificacio, visando esclarecer 0 analista sobre as caracteristicas do material selecionado. Sua prinei- pal funco é servir de elo entre o material escolhido para andlise e a teoria do pesquisador, pois, embora os documentos estejam abertos a uma multidao de possiveis quest6es, a andlise de contetido os interpreta apenas & luz do referencial de codificago (BAUER, 2002, p. 199). Para esse processo ser bem-sucedido, & necessirio que o pesquisador jé tenha feito a “lico de casa” da pré-andlise, como aescolha do tema a ser pesquisado, a doco de um referencial teérico, a formu- lacdo de hipéteses e objetivos, a definicdo do corpus etc. A codificacao compreen- de trés fases: (a) 0 recorte ~ escolha das unidades de registro e de contexto; (b) a enumeracio ~ escolha das regras de enumeracao; (c) a classificagao e agrega- fo ~ escolha das categorias, que Bardin (1988) esclarece em capitulo a parte (Segao 3.3 — A categorizacio). A escolha das unidades de registro e de contexto Unidades de registro: as unidades de registro podem ser consideradas par- tes de uma unidade de amostragem, estabelecida anteriormente na constituicgo do corpus. Se a unidade de amostragem for a edicdo de um jornal, por exemplo, as nidades de registro podem ser as noticias de interesse para a pesquisa publicadas nessa edi¢ao. A andlise de contetido contempla diversas formas de unidades de registro: as palavras-chaves de um discurso politico, os personagens de um fil- me ou romance, os antincios publicitérios de uma revista, os acontecimentos de um periodo histérico etc. Alguns textos sobre anilise de contetido incorporam 2 esta modalidade as unidades de enumerasio, ou unidades espago-temporais, como o minuto de emissdo radiofonica, a seqiiéncia de um filme, o centimetro coluna das noticias dos jornais etc. Unidades de contexto: muitas vezes, para as unidades de registro serem compreendidas corretamente, torna-se necessirio fazer referéncia ao contexto no qual esto inseridas. Na andlise de mensagens politicas, por exemplo, 2 contextualizasdo de palavras tais como liberdade, progresso, democracia e sociedade podem auxiliar na compreensao de seu verdadeiro sentido. Ocasi6es especificas, como Ne dades de program A escoll Asx de regis (4990, 5 sobre 2s idéia ou anfase; (b simbolo, a quanti idéia ow uma cre A codifi Con feita coz lapis, 0 material pagina g 0 codifi Uma ve seus dac etapa im de form: indices escala d contetid humane tona”, al Anise de contesdo 295 como Natal, Copa do Mundo e Carnaval, também podem se configurar em uni- dades de contexto se forem titeis para o entendimento de antincios publicitérios, programas de televisao ou noticias de jornal. A escolha das regras de enumeragéo As regras de enumeracao se referem ao modo de quantificacio das unidades de registro que levardo ao estabelecimento de indices. Segundo Krippendorff (1990, p. 57), & possivel encontrar tradicionalmente trés indices nas pesquisas sobre as comunicacSes de massa: (a) a fregiiéncia com que aparece um simbolo, idéia ou tema tende a ser interpretada como medida de importancia, atengio ou anfase; (b) 0 equilibrio na quantidade de atributos favordveis e desfavordveis de um simbolo, idéia ou tema tende a servir como medida de orientagao ou tendéncia; (c) a quantidade de associagées e de classificagbes manifestadas sobre um simbolo, idéia ou tema pode ser interpretada como uma medida de intensidade ou forga de ‘uma crenca, convieeio ou motivacéo. A codificagio na pratica Conforme a orientacio de Bauer (2002, p. 202-207), a codificacdo pode ser feita com papel e lépis, ou diretamente no computador. No formato de papel ¢ liépis, 0 codificador receber4 instrucdes na forma de um livro de codificacéo, no ‘material textual e nas folhas de codifica¢ao. Uma folha de codificacao é uma pagina quadriculada com uma célula reservada para cada cédigo (ver Figura 2) O codificador iré colocar seu julgamento para cada cédigo na célula designada, Uma vez completa 2 codificago, todas as folhas de codificagao sao juntadas seus dados transferidos para um computador visando a anélise dos dados. Uma etapa importante desse processo é a orientacao € o treinamento dos codificadores, de forma a preservar a fidedignidade, ou seja, a concordancia entre os intérpretes. {indices de fidedignidade medem a concordancia entre codificadores em uma escala de 0 (nao concordancia) a 1 (concordancia plena). “Nenhum analista de conteiido espera perfeita fidedignidade quando estio implicados julgamentos humanos, e desse modo a questao de um nivel aceitavel de fidedignidade vem & tona”, afirma Bauer (2002, p. 206-207) 296 Mécodos eténicas de pesquisa em comunicagio 'ANALISE DE CONTEUDO — COBERTURA DA IMPRENSA SOBRE A VIOLENCIA FORMULARIO DE CODIFICAGAO Grupo: _| Codificador Jornais: [Di Faiha de, Paulo [OO éstado des. Paulo [Cl Jomal da tarde TD Didrio de s. Paulo [0 Agora sao Paulo Tociebe Tiomaldo brash [00a | Tibuna da Imerense 1 Coreio srazilense 1D Jornal de Brasilia TD iomel da Comunidade Revistas: [0 Yee epoca Distoe Pau: | Titulo da matéria: Re ‘rea total da pagina (ewea): “rea total da matéria (anico}, ae ca ‘eda matéria: | rea de texto (crvcoly % | atea de foto (amcor % 100 1, Presenga de 8 Ges: DNase [Osim aia Taraticos| [Dintoaricos 2. Género (selecionar um predominante): ota [notice [Creportagem 3. formato (selecionar um) Dsegae [Opals [Opaltica [O economia [Beuttura Jacidades [Mciéncia [mundo [Doutos ‘lencarte Tisuplemento Toutros: ‘ANALISE DE TEXTO. 4, Local da violén Brasil [Tsui ‘sudeste Ticentro-oeste [Norte CiNordeste | Exterior | América do Sul [DAmérica Central [América do Norte [Europa DArica Asia oceania [Anilse de conteido 297 (continuagaio) Se 5. Conotacio da mensagem: ‘EiMensagom de violéncia | TiMensagem de nao-violencia I Mensagem neutra . Contatido da mensagem sobre violénci [Divioléncia racial [Bvienda sod Tiviolencia pablica Tivicléncia pessoal 7, Forma de violéncia presente na mensagem: Liviolinda tise [Civieléncia psicolégice [violencia moral [DViolenda econdmica 8. Motivagio da violéncia: violencia moral [Peete propria [Evincance [Bseaine [Cenfurecimento, loucura [EDetesa da sociedade| Tivicléncia ideal [EIVioléncia pessional (viel) Divioléncia addental [violencia esportiva [ANALISE DE FOTO 9. Local da violénci — wast asa [OSuiete Fawcmw [ito pies | Exterior [Gamera do sol |DAmbica Cental [DAméica donore [Plewropa |DAtrica DAsia [oceania 70. Conotagao da mensagem: Tintensagem de violencia [Diersagem de ndovietinca [Mensagem neutra 71, Conteiido da mensagem sobre violén Tiviolincia pessoal ‘violencia radial [Bviclénda social | IViolBnca politica 72, Forma de violéncia presente na mensaget Toutes Tiviolinca fica [Elvioléncia psicologica —_[LVioiéncia moral [violencia econdmica | 73. Motivacdo da vielncia: Divio¥éncia normal Didetesa propria [Bvinsonse sadismo ‘Tviolncla Moat” [Elvielénca passional (ido) [Clenfurecimento,Ioucure [EDefesa da sociedad Tivioiéncia acidental [Civiolencia esportve I 74. Observacées sobre a mate! Exemplo de formulirio de codificagao. Figura 2 298 Métodoseténicas de pesquisa em comunicagso 3.3. A categorizacao A categorizacdo consiste no trabalho de classificagdo e reagrupamento das unidades de registro em nimero reduzido de categorias, com o objetivo de tor- nar inteligivel a massa de dados e sua diversidade. Ao analisar as reportagens sobre a visita do lider soviético Nikita Kruschey & Franca, no inicio de 1960, em pleno contexto da Guerra Fria, a pesquisadora Violette Morin realizou um traba- Iho considerado modelo sob o aspecto metodolégico. Ela decompds 0 seu corpus (ete didrios e nove semanérios) em 8.532 unidades de informacdo e reagrupou essas unidades em 69 categorias, tais como “a acolhida parisiense”, “a politica franco-russa”, “as medidas de seguranca”, “as trocas comerciais” ete. Num se- gundo momento, ela distribuiu as 69 categorias em seis grandes temas: “a ex- curso na Franca”, “Kruschey-de Gaulle”, “os problemas politicos”, “a comiti- va", “os outros problemas” e “os acontecimentos sociais” (MORIN, 1970). Segundo Bardin (1988), os critérios de categorizagdo podem ser semantico (categorias tematicas), sintético (verbos, adjetivos), léxico (Classificagao das pala vras segundo seu sentido) e expressivo (categorias que classificam as diversas perturbag6es da linguagem, por exemplo). Além disso, a categorizacio envolve duas etapas: o inventdrio e a classificago. A primeira consiste em isolar o elemer tos enquanto a segunda consiste em repartir os elementos, reunindo-os em grupos similares de forma a impor certa organizagao as mensagens. Uma bos categorizagio, na opinitio de Bardin (1988) e de Barros ¢ Targino (2000), des possuir as seguintes caracteristicas a) exclusdo miitua: um elemento inclufdo na categoria X no pode sex inclufdo na categoria b) homogencidade: sé devem ser incluidas na mesma categoria unid= des de registro da mesma natureza; c) pertinéncia: o sistema de categorias deve refletir as intencdes da inv tigagao; 4) objetividade e fidelidade: os procedimentos classificatérios dev. ser objetivos, de forma a garantir a fidelidade dos resultados, caso =~ guém queira repeti-los; ©) produtividade: um conjunto de categorias deve fornecer resultados férteis em indice de inferéncias, dados ¢ novas hipéteses. 3.4 Inferéncia Trata-se do momento mais fértil da anilise de contetido, estando cent: nos aspectos implicitos da mensagem analisada. Esse procedimento nio é na pratica cientifica. © médico faz deduces sobre a saiide de seu cliente gra 208 si do ex: contet campe aes de indivi sfoda p. 40) reside fatore ridveis samento das jetivo de tor- _reportagens de 1960, em ou um traba- $0 seu corpus > e reagrupou -”, “a politica exc. Num se- remas: “a ex- ss”, “a comiti- IN, 1970). 2 ser seméntico -acdo das pala- mas diversas ‘aco envolve solar o elemen- unindo-os em zens. Uma boa © (2000), deve X no pode ser ategoria unida- =ngbes da inves- icatorios devem ultados, caso al- necer resultados ses. estando centrado mento ndo é raro xu cliente gracas Anilse de conteido 299 os sintomas. 0 arquedlogo pode extrapolar conhecimentos hist6ricos a partir do exame de uma anfora, Da mesma forma, a leitura efetuada pelo analista de contetido procura evidenciar o sentido que se encontra em segundo plano. No campo da comunicacao, este procedimento é utlizado para desvendat as cond foes de produgdo das mensagens analisadas, isto é “as variéveis psicolégicas do ‘rdividuo emissor, varidveis socioldgicas ¢ culturais, variéveis relativas @ sicua- {go da comunicagao ou do contexto de producio da mensagem” (BARDIN, 1988, p. 40). Dessa forma, o fundamento da especificidade da analise de contetido P side na articulacdo entre: (a) a superficie do texto (no sentido amplo) ¢ (b) os fatores que determinam essas caracteristicas. Existem diversos processos ¢ va- ruiveis de inferéncias, que podem ser agrupados em duas modalidades: + inferéncias especificas: quando vinculadas a situagio especifica do pro- blema investigado. Na andlise do noticidrio nacional sobre a alteragéo das regras dos planos de satide, por exemplo, as inferéncias especificas procurarso compreender: quais as intencdes das operadoras de planos Fe satide? Quais as intengoes do Governo? Quais as intengSes das or- ganizagoes de defesa do consumidor? Quais so as causas da discor- dia? « inferéncias gerais: quando extrapolam a situagao especifica do proble- wna analisado. Tomando o mesmo exemplo, 0 analista precisaré de ou- ros dados do contexto, tais como a reconstituicio hist6rica da atuacio dos planos de satide, para estabelecer generalizagées e definir as princi- pais variaveis inerentes ao problema. Na literatura especializada 6 possfvel encontrar diversos tipos de inferéncias, tais como, por exemplo, a inteligéncia, a facilidade de comunicaséo, a origem racial a ansiedade, a agressividade, a estrutura associativa, as atitudes, 08 valo- res, 08 habitos lingiiisticos do emissor. Outros tipos de inferéncias importantes sacs as concepsbes ideol6gicas de uma sociedade, imagens, clichés e arquétipos culturais, sistema de crengas, esteredtipos sociais, representacao de tipos © pa péis sociais (homem, mulher, rico, pobre, negro, branco, jovem, idoso etc) (BARDIN, 1988). 3.5 © tratamento informatico © interesse pela utilizacéo do computador na analise de contetido pode ser verificado desde o final da década de 1950. Segundo Krippendorff (1990, p. 26- 37), a evolucao dos suportes l6gicos (oftware) transformou © computador em inggrumento cada vez mais eficaz para 0 processamento de dados alfabéticos (em oposi¢fo aos numéricos). Esse desenvolvimento também foi estimulado pela contribuigdo de varios campos do conhecimento. A psicologia se intsresson por simular a cognigéo humana; a lingiistica contribuiu com numerosos 300 Métodos esénicas de pesquisa em comunicagso enfoques de andlise sintatica e interpretacio semantica das express6es lingtifsti- cas; a inteligéncia artificial concentrou-se na cria¢ao de maquinas que poderiam compreender as linguagens naturais. Atualmente, a utilizacio do computador na andlise de contetido divide-se em trés espécies principais: (a) andlises estatisticas, em que os dados si classificados, reorganizados, transformados e descritos por indices numéricos visando a seu processamento em softwares, como o SPSS; (b) auxilio nos estu- dos e descobertas, quando a idéia for estabelecer um panorama geral sobre o contetido (variedade, classes e distribuigao dos dados) de uma grande quantida- de de material textual; (c) andlise de contetido por computador, com 0 objetivo de representar algum aspecto do contexto social dos dados, ou seja, de realizar inferéncias (KRIPPENDORFF, 1990, p. 175-190). Por se tratar de um campo bas- tante dinamico, fica muito dificil sugerir a adocao de programas de informética definitivos em andlise de contetido. Entretanto, Bauer (2002, p. 209-212) identifi- ca trés correntes basicas para 0 processamento de materiais textuais: + KWOC (Keyword Out of Context ~ palavra-chave fora do contexto) que classifica palavras singulares em conceitos. © computador lista to- das as palavras de um texto, agrupando-as em um dicionério, sendo cada conceito definido por uma lista de simbolos. Por exemplo, palavra: como “aproximar-se”, “ataque” e “comunicar” podem ser simbolos de “ago socioemocional”. O principal problema do KWOC ¢ que em sex dicionério os simbolos podem ser relacionados a apenas um conceito, implicando uma limitac3o fundamental, pois as palavras sao ambigucs. KWIC (Keywords in Context - palavras-chave dentro do contexto), direcionado para a andlise de concordancia e co-ocorréncia, conside- rando as palavras-chave em seu contexto. Muitos programas oferecem a possibilidade de realizacao de concordancias como uma rotina, facil tando o trabalho de andlise de textos. Uma concordancia presenta uma lista de palavras associadas a seus respectivos contextos. Por exemple a.adocao de uma rotina de concordancia ajudaria rapidamente a distin- guir 0s artigos publicados nos congressos da INTERCOM (Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicagao) dos textos publicados na newsletter da INTERCOM (International Committee on Management). A anélise de co-ocorréncia, por sua vez, é uma anélise estatistica de pares de palavras freqiientes no corpus de texto. O proce- dimento supe que a ocorréncia freqiiente de duas palavras juntas seja semanticamente significance. CAQDAS (Computer-Assisted Qualitative Data Analysis Software ~ software para anélise de dados qualitativos com auxi- lio do computador). £ 0 mais recente desenvolvimento para at na andlise de texto. Comporta a etiquetagio, a codificagao e a indexack ntexto), lista to- mbolos de se em seu | conceito, ambiguas. contexto), . conside- s oferecem, na, facili sent uma r exemplo, cea distin- Sociedade dos textos amittee on sma anélise 0. O proce- juntas seja Analysis com auxi- para auxilio 2 indexacéo [Anilisedeconteido 301 de texto, proporcionando, portanto, a segmentacao, ligagao, ordenagao ¢ reordenacio, estruturacao, bem como a busca e reapresentacao de textos para fins de andlise. Ao mesmo tempo em que cumpre o papel de controlador, induzindo os estudantes inexperientes a adotar certa dis- ciplina na anilise de dados qualitativos, também pode favorecer prati- cas indesejaveis, tais como a proliferacao de estruturas ramificadas na representacao dos dados de uma entrevista, levando & perda do objetivo da pesquisa. 4 Técnicas Pelo fato de este capitulo se configurar em texto introdut6rio, encontra-se a seguir um resumo das principais técnicas utilizadas em anilise de contetido, servindo apenas como guia para o aprofundamento posterior. As referéncias so Bardin (1988) e Barros e Targino (2000) 4.1 Anidlise categorial Cronologicamente, esta técnica é a mais antiga, sendo, na pratica, a mai utilizada. Funciona por desmembramento do texto em unidades, em categorias segundo agrupamentos analdgicos. Entre as diferentes possibilidades de categorizacdo encontra-se a andlise tematica, bastante répida e eficaz. O detalhamento desta técnica pode ser encontrado no item 3.3, A Categorizacio, deste capitulo. 4.2 Anilise de avaliacdo Denominada literalmente evaluative assertion analysis (andlise de assercao avaliativa), sua principal finalidade 6 medir as atitudes do locutor quanto aos objetivos de que ele fala. Parte do prinefpio de que a linguagem representa reflete diretamente aquele que o utiliza. Fundamenta-se, ainda, nos conhe mentos da psicologia social sobre a nogo de atitude. Uma atitude é uma predis- posicio, relativamente estavel e organizada, pata reagir sob a forma de opinides (nivel verbal), ou de atos (nivel comportamental), em presenga de objetos (pes- soas, idéias, acontecimentos, coisas etc.). 4.3. Andlise da enunciacao Sua principal caracteristica é apoiar-se numa concepefo de discurso como palavra em ato. Enquanto a andlise de contetido tradicional considera o material 202. Métodos«técnicas de pesquisa om comunicasio de estudo como um dado, a andlise da enunciagdo considera a produgao da pala- vvra como um processo. O discurso nao é um produto acabado, mas um momento num processo de elaboracio. Isto é particularmente evidente nas entrevistas, cuja produgao é 20 mesmo tempo espontanea e constrangida pela situacao. Por isso esta técnica aplica-se muito bem na anilise de entrevista nao diretiva, ow seja, aquela em que o entrevistador possui um roteiro, mas aberto. No campo da comunicagao, um bom material para ser analisado com esta técnica so as entre- vistas jornalisticas, filmes, programas radiofonicos e amiincios publicitarios. 44 Anilise da expressio Esta modalidade de andlise parte do principio de que existe uma correspon- déncia entre o tipo do discurso e as caracteristicas do locutor e seu meio. Consi- dera que os tracos pessoais, o estado do locutor ou sua reagéo a uma situac: modificam 0 discurso tanto na sua forma como no seu contetido. Trata-se de uma andlise que prima pelo formal (plano dos significantes) e nao pelo seman: (plano dos significados). Os setores mais propicios & aplicagio desta técnica so a investigacdo da autenticidade de um documento (literatura, histéria), a psico- Togia clinica (psicoterapia, psiquiatria), os discursos politicos ou os que sao sus- cetiveis de veicular uma ideologia (retérica). Com a utilizacio desta técnica j@ foram realizados trabalhos sobre o racismo, sobre os estados emocionais e per turbacfo da linguagem ou sobre cartas de suicidas. 4.5 Anélise de contingéncia ‘Também denominada andlise associativa. Considera que 0 mais importante no é 0 némero de vezes em que certas palavras, temas ou tipos de personag: aparecem numa mensagem, mas sim como eles esto organizados entre si, ou seja: o que estd associado a qué? Num caso de psicoterapia, por exemplo, verifi- ca-se uma associacao significativa entre os temas doenga e dinheiro na correspon- déncia de um doente mental. Qual seria o sentido deste indice e de outras liga- ges obtidas pelo mesmo processo? No campo da comunicagao esta anilise pode Ser aplicada nos estudos de género da midia, como o discurso de revistas femini- nas sobre o homem e vice-versa. Qual a rela¢ao entre termos como mulher solte: ra e mulher casada? Ou entre adol.s -nte e mulher madura? 4.6 Anilise estrutural Baseada na lingiifstica estrutural, esta técnica parte do pressuposto de que todo texto € uma realidade estruturada, que ndo se revela pelo contetdo mani- festo, pois encontra-se implicita. A estrutura é entendida como uma realidade coculta do funcionamento da mensagem a ser desvelada pelo analista. No campo Anilise de conteido 303 da comunicagio a anilise estrutural pode ser aplicada na anélise de filmes, tele- novelas, anincios publicitarios etc 4.7. Anilise do discurso Neste caso, existe estreita ligagdo entre a andlise de contetido e a anélise automatica do discurso (AAD), inaugurada por Michel Pécheux. Procura esta- belecer ligacdes entre as condigées de producao do discurso e sua estrutura. Sua hipétese geral considera que um discurso é determinado pelas suas condicdes de producao e por um sistema lingiifstico. Desde que ambos sejam conhecidos, pode-se descobrir a estrutura organizadora ou processo de producao, através da andlise da superficie semantica e sintatica deste discurso (ou conjunto de dis- cursos). Segundo Bardin (1988, p. 213), a AAD tem por objetivo a destruicao da anélise de contetido, visando a sua substituicio. Referéncias bibliogréficas BARBA, Cecilia Cervantes. Anilisis de contenido y etnografia en el estidio de la producefon de noticias, In: RUIZ, Enrique Sanchez; BARBA, Cecilia Cervantes (Org). Investigar la comunicacién: propuestas iberoamericanas. Guadalajara: Universidad de Guadalajara/ALAIC, 1994. p. 77-103. BARDIN, Laurence. Anélise de conteido. Lisboa: EdicSes 70, 1988. BARROS, Antonio Teixeira de; TARGINO, Maria das Gracas. 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