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Valor Ético e Estético do Kung-Fu

- Em busca das suas potencialidades educativas -

Rafael Carvalho da Silva Mocarzel


Porto, 2020
Valor Ético e Estético do Kung-Fu
- Em busca das suas potencialidades educativas -

Dissertação apresentada com vista à obtenção do


grau de Doutor em Ciências do Desporto nos termos
do decreto-lei nº 74/2006 de 24 de março.

Orientação: Professora Doutora Teresa Oliveira Lacerda


Co-orientação: Professora Doutora Paula Queirós

Rafael Carvalho da Silva Mocarzel


Porto, 2020
FICHA DE CATALOGAÇÃO

Mocarzel, R. C. S. (2020). Valor Ético e Estético do Kung-Fu – em busca das


suas potencialidades educativas. Porto: R. C. S. Mocarzel. Dissertação de
Doutoramento em Ciências do Desporto apresentada à Faculdade de Desporto
da Universidade do Porto

PALAVRAS CHAVE: KUNG-FU; ARTE MARCIAL; ÉTICA; ESTÉTICA;


VALORES EDUCACIONAIS.

IV
A todos os meus antepassados,
com carinho e gratidão!

V
Agradecimentos

O ser humano é um ser social. Fato. Impossível desmentir. Desde que


nascemos somos dependentes uns dos outros. Em diversos momentos
esquecemo-nos de reconhecer isso e ficamos cegos pelo ego e pelas
preocupações do cotidiano. Em quantos momentos fomos auxiliados e não
dissemos um “obrigado” sequer. Em quantos momentos nos estenderam a mão
e nos tiraram dos buracos da tristeza e da depressão, onde achávamos estar
esquecidos por Deus e exilados das coisas boas da vida. E nessa guisa, os
meus agradecimentos ficam ainda mais sinceros quando relembro os anos
difíceis que passei neste período doutoral. Problemas pessoais, profissionais,
financeiros e de saúde. Mas foi na escuridão e no silêncio do mundo que os
anjos disfarçados de humanos me agraciaram com sua luz concedendo-me
não só sorrisos, mas também esperança e força para perseverar sobre as
dificuldades. Em atos simples, mas profundamente imersos em uma
humanidade fraterna e bondosa. Como no ato de explicar com paciência, ao
emprestar seus ouvidos quando eu precisava desabafar, ao sorrir para mim
quando eu precisava relembrar que há, sim, um mundo positivo para além dos
meus próprios problemas, ao conceder-me um inesperado presente de natal
quando meus parentes mais próximos estavam em outro continente, ao tentar
abrir uma porta profissional para mim quando me sentia perdido em um
labirinto de negativas, ao olhar nos meus olhos sem preconceitos e dizer:
“Força, rapaz! Tudo ficará bem!”.
A vocês que passaram pela minha vida (ainda estando nela ou não), a
vocês que tenham me machucado (mas que dessa forma contraditória também
me ensinaram algo), a vocês que me influenciaram no passado e
lamentavelmente já não estão mais em encarnados ao meu lado, a vocês que
mesmo por um só breve momento desejaram coisas boas para mim, eu digo
com a mais genuína e profunda sinceridade, gratidão e reverência: POR
FAVOR, ACEITE O MEU “MUITO OBRIGADO”!

VII
ÍNDICE GERAL

Agradecimentos VII
Índice de Figuras IX
Índice de Quadros X
Resumo XI
Abstract XIII

1. Introdução Geral............................................................................................1

2. Enquadramento Teórico e Metodológico..................................................13

3. Estudos Teóricos
Estudo I – Valores ético e estético do Kung-Fu – uma revisão sistemática..... 49
Estudo II – Wu De – reflexão filosófica acerca do Código de Ética Marcial do
Kung-Fu.............................................................................................................69
Estudo III – Uma visão conceitual através dos tempos sobre o universo marcial
à luz da Ética e Estética – o caso do Kung-Fu..................................................89

4. Estudo Empírico
Estudo IV – Importância da Ética e da Estética no ensino do Kung-Fu
tradicional a partir de narrativas de mestres marciais.....................................121

5. Buscando uma interpretação integrada dos estudos realizados – uma


reflexão final...................................................................................................143

6. Conclusões e Considerações Finais.......................................................165

7. Referências Bibliográficas........................................................................173

8. Anexos........................................................................................................XV

VIII
ÍNDICE DE FIGURAS

Enquadramento Teórico e Metodológico


Figura 1: Representação da ordenação axiológica disposta em gráfico
piramidal............................................................................................................24

Estudos Teóricos – Estudo I


Figura 1: Anos das publicações em linha temporal a partir do artigo mais antigo
relacionado na revisão sistemática até o ano de 2018......................................58

Estudos Teóricos – Estudo II


Figura 1: Interpretação holística da expressão Kung-Fu...................................72

Figura 2: Saudação tradicional do Kung-Fu......................................................74

Figura 3: Preceitos orientadores para um artista marcial..................................81

Estudos Teóricos – Estudo III


Figura 1: Taxonomia de conceituação e enquadramento das práticas do
universo marcial baseada no estudo de Mocarzel (2011)...............................96

Estudo Empírico – Estudo IV


Figura 1: Saudação tradicional do Kung-Fu....................................................131

Figura 2: Conhecer amigos através das artes marciais...................................132

IX
ÍNDICE DE QUADROS

Introdução Geral
Quadro 1: Síntese das teses doutorais encontradas sobre artes marciais
realizadas em Portugal no campo das Ciências do Desporto (e afins)
ordenadas por ano de publicação........................................................................7

Quadro 2: Resumo da estrutura e dos estudos incluídos no corpo da


dissertação ..........................................................................................................9

Estudos Teóricos – Estudo I


Quadro 1: Síntese dos artigos encontrados ordenados por ano de
publicação..........................................................................................................55

Quadro 2: Áreas acadêmicas dos periódicos onde as pesquisas foram


publicadas..........................................................................................................57

Estudos Teóricos – Estudo II


Quadro 1: Síntese de artigos encontrados na pesquisa, utilizando o motor de
busca ‘Descoberta’............................................................................................79

Quadro 2: Princípios axiológicos do Wu De (em português e chinês)...............80

Estudos Teóricos – Estudo III


Quadro 1: Ideogramas chineses que compõem o termo “Kung-Fu”................110

X
RESUMO

O Kung-Fu é uma das artes marciais mais conhecidas e praticadas do mundo e


possui significativa carência em pesquisas acadêmicas, principalmente no
Ocidente e na lusofonia. É de notar que se encontraram apenas seis teses
doutorais portuguesas sobre artes marciais na área do desporto e nenhuma
estudou o Kung-Fu. O objetivo geral deste trabalho consistiu em procurar
identificar e compreender o valor ético e estético do Kung-Fu tradicional,
evidenciando as potencialidades desta arte marcial como meio educacional. A
pesquisa, em modelo escandinavo, teve natureza qualitativa e foi estruturada
em quatro estudos (três estudos teóricos e um estudo empírico). Em termos
metodológicos, elencou-se a revisão sistemática da literatura para
mapeamento do estado do conhecimento sobre a matéria em estudo e
recorreu-se a entrevistas semiestruturadas com Mestres de Kung-Fu de
renome mundial com vista a conhecer e integrar o contributo esclarecido
destes peritos acerca da temática em análise. Assim, as entrevistas foram
exploradas através da análise de conteúdo, tendo sido interpretadas a partir de
uma organização em categorias temáticas. Constatou-se que no campo
acadêmico pouco se aborda de maneira profícua e profunda sobre a ética e
mais ainda sobre a estética no Kung-Fu. Ficou entendido o conceito de arte
marcial como uma prática de educação pacifista. Além disso, o Kung-Fu se
destacou como símbolo cultural chinês apresentando diversos ensinamentos
imersos em questões éticas e estéticas. Por meio de entrevistas de grandes
Mestres mundiais, evidenciou-se o objetivo de transmissão e incorporação de
virtudes confucionista inseridas na educação do Kung-Fu, como: humildade,
respeito, justiça, confiança, lealdade, vontade, resistência, perseverança,
paciência e coragem.

PALAVRAS-CHAVE: 1. KUNG-FU; 2. ARTE MARCIAL; 3. ÉTICA; 4.


ESTÉTICA; 5. VALORES EDUCACIONAIS.

XI
Ethical and Aesthetic Value of Kung-Fu - In search of its educational
potential

ABSTRACT

Kung Fu is one of the best known and most practiced martial arts in the world
and has a significant shortage in academic research, especially in the West and
Lusophone. It should be noted that there were only six Portuguese doctoral
theses on martial arts in the field of sport and none studied Kung-Fu. The
general objective of this work was to seek to identify and understand the ethical
and aesthetic value of traditional Kung-Fu, highlighting the potential of this
martial art as an educational medium. The research, in a Scandinavian model,
had a qualitative nature and was structured in four studies (three theoretical
studies and one empirical study). In methodological terms, there was a
systematic review of the literature to map the state of knowledge on the subject
under study and semi-structured interviews were conducted with world-
renowned Kung-Fu Masters in order to know and integrate the enlightened
contribution of these experts about the theme under analysis. Thus, the
interviews were explored through content analysis, having been interpreted
from an organization in thematic categories. It was found that in the academic
field little is proficiently and profoundly addressed about ethics and even more
about aesthetics in Kung-Fu. The concept of martial art was understood as a
practice of pacifist education. In addition, Kung-Fu stood out as a Chinese
cultural symbol presenting several teachings immersed in ethical and aesthetic
issues. Through interviews with great world Masters, the objective of
transmitting and incorporating Confucian virtues into Kung-Fu education
became evident, such as: humility, respect, justice, trust, loyalty, will, resistance,
perseverance, patience and courage.

KEYWORDS: 1. KUNG-FU; 2. MARTIAL ART; 3. ETHICS; 4. AESTHETICS; 5.


EDUCATIONAL VALUES.

XIII
1. Introdução Geral

_______________________________________________________________
As práticas desportivas são das manifestações humanas mais antigas
de que há registro na história da humanidade, tendo integrado várias culturas
de povos ao redor do globo e em períodos de tempo diferentes, como os
egípcios, os gregos, os maias e os chineses (Mandell, 1986; Tubino, 1987).
Progressivamente, foram incorporadas às estruturas sociais das épocas
vigentes, adaptando-se aos costumes e necessidades dos povos através dos
séculos. Tubino (1993, p.12) assegura assim que o desporto se modificou
juntamente com as transformações da sociedade recebendo e gerando
influências culturais. Hoje, as práticas desportivas são perpetuadas e
difundidas como nunca na história humana, contribuindo para superar diversos
conflitos sociais, políticos, bélicos, econômicos e religiosos. Assim, o desporto
se perfaz como exemplo de zeitgeist, expressão alemã para “espírito de época”
(Murad, 2009).

Dentre as práticas tidas como das mais antigas, aponta-se a luta, que é
parte da história primitiva humana e animal. Para o ser humano, tal ato adveio
da contínua necessidade de se defender (Ferreira, 2005; Acevedo, Gutiérrez &
Cheung, 2011; Mocarzel & Columá, 2015). É expresso por Maia (1990, p.207)
que: “No antigo texto sagrado do Ramayana (cerca de 10.000 anos) existem
inúmeras referências à arte da guerra e à sua prática pela casta guerreira dos
Kshatriyas (aqueles que salvam os semelhantes da dor e do sofrimento)”. Sob
o prisma sociocultural, lutar é parte da identidade humana (Murad, 2007) ou
mesmo de qualquer ser vivo que busca defender a si, sua prole e território
(Pimenta, 2009; Pereira & Feron, 2010). Assim, procurou-se o aperfeiçoamento
de métodos e utensílios para autodefesa (Ferreira, 2008).

Os métodos de autodefesa evoluíram com o desenvolvimento da


intelectualidade e reflexão humana. Dividem-se aqui os métodos de autodefesa
em luta não técnica, luta técnica e arte marcial (Mocarzel, 2011; Mocarzel &
Columá, 2015). A “luta não técnica” remete para práticas primitivas que podem
ser observadas no mundo animal, fazendo uso da força bruta, atacando
inclusive pontos vitais para causar danos rápidos e letais. Trata-se de algo
inato e instintivo, parte da natureza do ser, sem qualquer instrução ou

2
orientação para tal. Já a “luta técnica” surgiu depois, tendo sido percebida a
necessidade de melhoria e otimização das habilidades e valências físicas e
técnicas para o embate tão qual a preparação física do praticante. Técnicas
foram estudadas, estruturadas, difundidas e aperfeiçoadas em diversas
culturas. Finalmente, a “arte marcial” nasceu para combater os diversos
problemas de opressão, agressão e mortes de terceiros, pelo uso abusivo dos
conhecimentos técnicos e do aprimoramento no lutar para fins centrados no
interesse próprio, tornando-se necessária a inserção de aspectos disciplinares
rígidos que colaborassem não só com a ordem, mas com a formação do bom
caráter de cada praticante (Bäck & Kim, 1979; Iedwab & Standefer, 2001).

Essa idéia parece ser exatamente oposta àquela que, no senso


comum, temos das artes marciais, ou seja, a de que seu
objetivo é “gerar a violência”. Pelo contrário. O artista marcial
encara, vivencia a violência, desde suas mais evidentes até as
mais sutis manifestações. Assim, aprende a fazer uso de sua
inerente agressividade (instinto necessário à vida),
diferenciando-a da violência (requinte humano relacionado à
morte). (Lima, 2000, p.112)

No mesmo sentido, Cynarski e Lee-Barron (2014, p. 12), destacam que


“As artes marciais ensinam o respeito pelos outros, pela tradição e pela
autoridade; melhoram o auto-controlo, ensinam a concentração, a
perseverança, a integridade e ajudam a desenvolver pessoas de vontade forte.”

É importante observar que o ideário de arte marcial citado, mesmo


sendo exposto de forma sucinta, é apoiado pelas atuais características do
conceito de desporto defendido por Bento e Bento (2014, p.51), pois o desporto
“Essencialmente pertence ao domínio do simbólico e ‘artístico’: cumpre
objetivos educativos, sociais, filosóficos e culturais, éticos, estéticos e morais.
Serve o processo civilizador, isto é, visa melhorar o índice de civilização”.
Enfim, para o desenvolvimento da natureza humana em sua plenitude pura
(Abe, 1986). Yonezawa (2010, p. 348) esclarece que as artes marciais
adentram ainda em meandros de um campo sensível e reflexivo da educação,
por meio de vivências profundamente imersas em experiências artísticas e
educacionais para uma “prática marcial de fortalecimento da vida”. Já aí se

3
percebe um exalar de uma compleição que agrega elementos éticos e
estéticos. Nos movimentos firmes, leves e surpreendentemente impactantes do
Qigong1, nas expressões artísticas miméticas baseadas nas observações da
natureza, na plasticidade corporal no executar das posturas e saltos, na
marcialidade das formas desenhadas em coreografias tenazes e ritmadas.

Esta dissertação se aprofunda especificamente nos valores ético e


estético de uma arte marcial, o Kung-Fu, pois se entende que estas dimensões
axiológicas são não tão somente destacadas, mas sim, estimuladas e
objetivadas sólidamente na prática do desporto, principalmente quando elevado
no seu viés educativo de forma ímpar. No Kung-Fu, tal axioma não se faz
diferente do que no desporto.

Similar a essa premissa civilizacional atrás referida, a China, uma das


nações mais antigas da história humana, floresceu e difundiu a milenar arte
marcial chamada Wushu (武術). Popularmente conhecida como Kung-Fu (功夫
), ela é símbolo sólido da cultura corporal, marcial, histórica, artística e
representante do ethos chinês (Lima, 2000; Apolloni, 2004; Acevedo, Gutiérrez
& Cheung, 2011; Mocarzel, 2011; Carneiro, 2013). Como símbolo maior da
designação do Kung-Fu como arte marcial apresenta-se o Wu De (武德), o
código de ética dos kungfuístas (praticantes de Kung-Fu). É no Wu De que está
subjacente um quadro axiológico, designadamente de valores éticos e/ou
comportamentos morais, que serve como caminho norteador do
comportamento dos praticantes de Kung-Fu, seja ele um praticante recém-
iniciado ou extremamente avançado. Este código de ética marcial já milenar
teve sua grande fonte inspiradora nos ensinamentos filosóficos de dois dos
maiores pensadores e sábios do antigo Oriente: Lao-Tsé ou Láucio (老子)2 e

1
O Qigong ou Chi-Kung é a manipulação da energia vital interna difundida na cultura oriental e
na medicina tradicional chinesa – MTC (Gouveia, 2009; Ramos et al., 2017). Resumidamente,
pode ser praticado para fins, marciais, meditativos e terapêuticos (Mocarzel & Columá, 2015).
2
As palavras que compõem o nome de Lao-Tsé de forma romanizada podem ser encontradas
com variações, como: Laozi, Lao Tzu, Lao Zi, Lao Tsé, Lao Tzi, Lao Tseu, Lao Tze, Lao
Tan e Li Erh. Especula-se que tenha vivido entre 604-517 a.C. e que segundo a tradição foi
arquivista na corte de Zhou (Bizerril, 2010; Mocarzel, 2011), embora ainda haja incerteza sobre

4
Kung-Fu-Tsé ou Confúcio (孔子)3, ambos ícones da história e filosofia da
China. Tanto o Taoísmo quanto Confucionismo baseiam-se na primazia do
comportamento moral, onde em ambas as filosofias orientais seriam dois
valorosos pilares edificadores da harmonia e consequentemente do bem
(Mocarzel, 2011).

Não só por treinos técnico-marciais, preparo do físico ou estudos


históricos, mas sim através de atitudes no cotidiano, os Mestres e Professores,
membros mais altos da hierarquia no Kung-Fu, buscam ser exemplos vivos aos
seus subordinados; enfim, a idoneidade. Tais ensinamentos cultivam o
comportamento ético e estético do ser humano, princípios já pontuados por
Patrício (1993) no domínio da filosofia da educação. No princípio ético, registra-
se a necessidade do controle do ego humano afastando-se de conflitos intra e
interpessoais (Bäck & Kim, 1979; Lima, 2000; Yonezawa, 2010; Mocarzel,
Murad, Ferreira & Silva, 2012), o estímulo às capacidades volitivas reflexivas
centradas na civilidade e moral (Bento, 199-; Bäck, 2009) e a gratidão aos
antepassados e ancestrais que colaboraram com a transmissão de tudo que já
foi vivido e estudado até então (Iedwab & Standefer, 2001; Mocarzel, 2011). Já
no princípio estético, a busca incessante por um desenvolvimento uno entre
corpo e espírito (Allen, 2013), o alcançar de uma plenitude da condição física,
emocional, espiritual harmônica (Bäck, 2009), a solidificação da força de
vontade superando as adversidades físicas impostas por disputas desportivas
ou mesmo da vida cotidiana (Lacerda, 2000), focando a qualidade técnica mais
elevada (Coelho, Kreft & Lacerda, 2013) em uma fruição artística (Bäck & Kim,
1979), perseguindo através de sua expressão constante a transcendência para

tais datas ou mesmo sobre sua existência, sendo alvo de profunda discussão sinológica (Kohn,
2001). É considerado o pai do Taoísmo (道家).
3
As palavras que compõem o nome de Kung-Fu-Tsé de forma romanizada podem ser
encontradas com variações, como: Kǒng Zǐ, K'ung-tzu, Kǒng Fūzǐ, K'ung-fu-tzu. Viveu entre
551-479 a.C. (Oliveira, 2006; Mocarzel, 2011), sendo talvez o erudito mais importante de toda
história chinesa com suas políticas sociais reformadoras. É considerado o pai do
Confucionismo (儒家). Foi talvez na história o primeiro grande defensor da “Etocracia”;
ideologia que, segundo Murad (2009), busca a elevação do poder dos valores éticos, morais e
educacionais, fundamentalmente tendo os líderes do povo como exemplos para seus
subordinados.

5
algo superior e belo, atingindo o virtuosismo em suas ações, tocando e
contaminando quem o observa (Coelho & Lacerda, 2012; Lacerda, 2007).
Assim, a busca da união vívida e genuína dos princípios ético e estético na vida
do ser, tendo a alegria de se superar e vencer os desafios sejam eles
transitórios ou constantes (Monahan, 2007), ampliando também sua visão de
capacidades e possiblidades (Coelho & Lacerda, 2012), como expressado
abaixo no conceito “Homo Disciplinatus” (Mocarzel & Murad, 2012, p.94).

Importante esclarecer que não se adota aqui o significado de


“disciplina” no sentido autoritário, rígido, inflexível. De fato, o
sentido é direcionado para o ideário do indivíduo zeloso,
dedicado, que busca incessantemente a perfeição e a
harmonia em todos os seus campos de atuação, seja em
âmbito social, profissional ou mesmo em afazeres do cotidiano,
por exemplo, fazer um simples chá. Não importa o que um
verdadeiro artista marcial venha fazer; ele sempre buscará
realizar a ação com muita dedicação, zelo e perfeição; com
espírito, mente e corpo unos àquele objetivo.

Pese embora se perceba e se sinta (no sentido do conhecimento


sensível enunciado por Baumgarten, cit. por Herrero, 1988) o modo como a
dimensão ético-estética permeia o universo das artes marciais, a investigação
em Ciências do Desporto parece que não tem estado receptiva a investir o seu
esforço em estudos sobre esta matéria. De facto, nesta pesquisa doutoral,
apenas foi encontrado um artigo que invoca de forma genérica as questões
éticas do Kung-Fu tradicional (Mendonça & Antunes, 2012) e nenhum que foca
seus predicados estéticos. Mais: mesmo o Kung-Fu sendo uma das artes
marciais mais conhecidas e praticadas do mundo, possui também significativa
carência em pesquisas acadêmicas, principalmente no Ocidente e na lusofonia.
Como exemplo, encontraram-se apenas seis dissertações de doutoramento
portuguesas sobre artes marciais na área do desporto e nenhuma estudou o
Kung-Fu (quadro 1).

6
Quadro 1 – Síntese das dissertações doutorais encontradas sobre artes marciais realizadas em
Portugal no campo das Ciências do Desporto (e afins).
TÍTULO DA DISSERTAÇÃO AUTOR INSTITUIÇÃO (ANO)
A capoeira: a transformação de uma atividade Araújo, Paulo Coelho FADEUP (1995)
guerreira numa atividade lúdica. de.

A Institucionalização do Karaté: Os Modelos Figueiredo, Abel. FMH (2006)


Organizacionais do Karaté em Portugal.

A formação e a sua influência no papel do Maduro, Luiz Alcides FADEUP (2012)


treinador de judô no planejamento dos treinos e Ramires.
nas competições.

Em busca de fatores de excelência no desporto Cachada, José Mário FADEUP (2013)


de alto rendimento-estudo a partir da história de
vida de Nuno Delgado.

A experiência estética do atleta de Taekwondo. Coelho, Rebeca FADEUP (2014)


Cardozo.

Modelo(s) de ensino do judo em Portugal: para Veloso, Rui Jorge de UTAD (2015)
um conhecimento e compreensão do processo Abreu.
de formação desportiva na modalidade.

Sabe-se que a transmissão oral, importantíssima ferramenta


sociocultural, é uma característica marcante ainda vívida no povo chinês
(Granet, 1997) e também no Kung-Fu tradicional (Lu, 2008), o que gera uma
forte carência de literatura que dê suporte a estudos acadêmicos,
principalmente para nações de idiomas diferentes do chinês. Reconhece-se a
importância dos ensinamentos de transmissão oral perpetuados até os dias
atuais no Kung-Fu tradicional, todavia Matos (2013, p.57) elucida que

o valor do conhecimento científico precisa de assentar numa


conceção de ciência, traduzida numa linguagem e num
paradigma apropriados e em critérios de cientificidade que
dotem o conhecimento de objetividade, fidelidade e validade.

Por isso faz-se necessário conduzir a temática para moldes


acadêmicos, aumentando e garantindo maior credibilidade, dando-lhe
respaldos científicos e não apenas tácitos. Justifica-se, assim, esta pesquisa,

7
convergida aos princípios éticos em conjunto com os princípios estéticos do
Kung-Fu, pois a atuação mútua desses dois campos de valores legitimam a
preocupação educacional e deontológica, consubstanciada no pressuposto do
conceito de arte marcial, afastando-se, portanto, de atos de subversão e
violência.

Foi tendo em conta todo este enquadramento, que se formulou a


questão central da investigação, traduzida na seguinte interrogação: em que
medida o Kung-Fu por incorporar dimensões éticas e estéticas
acentuadas e idiossincráticas revela-se como uma prática desportiva com
elevado potencial educativo?

Dessa forma, como objetivo geral procurou-se identificar e


compreender o valor ético e estético do Kung-Fu tradicional,
evidenciando as potencialidades e dificuldades desta modalidade como
veículo de educação dos praticantes.

A investigação é de natureza qualitativa tendo como objeto de estudo o


Kung-Fu. A escolha dessa arte marcial se deu por este ser o campo principal
de desejo de observação, experiência, pesquisa e análise do autor desta
dissertação. Além disso, os contatos dos meios marcial e acadêmico do
pesquisador permitiram-lhe acesso a diversos materiais tidos como fontes
primárias, reforçando e garantindo a qualidade do trabalho e pesquisa.

A presente dissertação está organizada de acordo com o modelo


escandinavo, incorporando um conjunto de quatro estudos (quadro 2)
submetidos em diferentes periódicos com revisão por pares, todos já
publicados. Por conta da adoção de tal formato, as normas de apresentação e
as referências foram expostas nos moldes dos periódicos aos quais os artigos
foram submetidos. As palavras-chave de cada estudo foram refletidas e
selecionadas com o auxílio do amplo estudo publicado por Pérez-Gutiérrez,
Gutiérrez-García e Escobar-Molina (2011). Houve a preocupação de selecionar
periódicos diferentes para cada estudo, adequando a natureza da temática em
estudo ao âmbito e características de cada revista. Seguindo ainda um

8
posicionamento de fortalecimento e valorização do referido campo acadêmico
na lusofonia, decidiu-se produzir e publicar todos os estudos no idioma
português.

Quadro 2 – Resumo da estrutura e dos estudos incluídos no corpo da dissertação.


Estudos Teóricos

Valores ético e estético do Kung-Fu – uma Mocarzel, R.; Queirós, P. & Lacerda, T.
revisão sistemática (2020). Valores ético e estético do Kung-Fu –
uma revisão sistemática. Motrivivência,
32(62), 01-21.

Wu De – reflexão filosófica acerca do Código Mocarzel, R.; Queirós, P. & Lacerda, T.


de Ética Marcial do Kung-Fu (2016). Wu De – reflexão filosófica acerca do
Código de Ética Marcial do Kung-Fu. Revista
Portuguesa de Ciências do Desporto, (S2A),
140-152.

Uma visão conceitual através dos tempos Mocarzel, R. C. S., Queirós, P., & Lacerda, T.
sobre o universo marcial à luz da Ética e O. (2019). Uma visão conceitual através dos
Estética – o caso do Kung-Fu tempos sobre o universo marcial à luz da ética
e estética – o caso do Kung-Fu. FairPlay,
Journal of Philosophy, Ethics and Sports Law,
15, 90-115.

Estudo Empírico

Importância da Ética e da Estética no ensino Mocarzel, R.; Queirós, P. & Lacerda, T.


do Kung-Fu tradicional a partir de narrativas (2019). Importância da Ética e da Estética no
de Mestres marciais ensino do Kung-Fu tradicional a partir de
narrativas de Mestres marciais. In: Anais do 6º
Encontro Nacional de Artes Marciais e
Esportes de Combate (ENAMEC) / 1º
Simpósio Internacional de Lutas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (SIL-
UFRJ). Rio de Janeiro: Universidade Federal
do Rio de Janeiro,.147-175.

Mais especificamente, esclarece-se que esta dissertação é composta


por quatro estudos, sendo estes três estudos teóricos e um estudo empírico.
Com o intuito de iluminar cada ponto a ser abordado, expõem-se os referidos
estudos destacando sinteticamente seus objetivos e metodologias.

9
Estudo I – Valores ético e estético do Kung-Fu – uma revisão
sistemática

Para este primeiro estudo, fixaram-se os seguintes objetivos:

a) Analisar os trabalhos publicados que incidem sobre os valores


éticos e estéticos no contexto do Kung-Fu, sinalizando o seu
potencial educativo.

b) Destacar, por meio das pesquisas encontradas, como e em que


proporções surgem enunciados que convocam o domínio da ética e
da estética, convergindo para o valor educativo do Kung-Fu.

Estabelecendo uma base teórica consistente para reflexões iniciais a


partir do primeiro estudo, deu-se continuidade para desenvolvimentos mais
aprofundados na temática da ética e estética do Kung-Fu tradicional.

Estudo II – Wu De – reflexão filosófica acerca do Código de Ética


Marcial do Kung-Fu

O segundo estudo desenvolveu-se a partir dos objetivos seguintes:

a) Situar o código de ética marcial Wu De em relação ao seu papel


axiológico no Kung-Fu e clarificar seus conceitos no enquadramento
ético-moral.

b) Realizar a tradução literal do texto do Wu De para o português e


mapear os princípios axiológicos ali presentes.

Estudo III – Uma visão conceitual através dos tempos sobre o


universo marcial à luz da Ética e Estética – o caso do Kung-Fu

Para o terceiro estudo estabeleceu-se o seguinte quadro de objetivos:

a) Realizar uma revisão e reinterpretação de alguns conceitos


importantes do universo marcial sob análise filosófico-cultural
focada na ética e na estética.

10
b) Diferenciar as práticas do universo marcial a partir de uma
categorização conceitual – esta diferenciação foi concretizada
através de uma taxonomia com definição de critérios relacionados
com as características e os princípios vertidos nas suas práticas.

c) Destacar e respaldar a categoria “arte marcial” como uma prática


imersa em valores filosóficos pacifistas.

d) Com base na categorização definida no ponto anterior, destacar e


contextualizar a posição do Kung-Fu nesta taxonomia como “arte
marcial” expondo suas idiossincrasias.

Após uma sólida estruturação reflexiva e conceitual baseada nos


fundamentos enaltecidos na prática do Kung-Fu há séculos e discutidos nos
dois primeiros estudos, a atenção foi direcionada para ouvir Mestres de renome
mundial em um processo de entrevista sobre a temática da ética e da estética
no ensino do Kung-Fu, chegando-se desta forma ao estudo IV.

Estudo IV – Narrativas de Mestres marciais sobre o ensino e


prática da Ética e Estética no Kung-Fu tradicional

Para este último estudo, de natureza empírica, definiram-se os


objetivos seguintes:

a) Identificar o cunho ético e estético nas práticas do Kung-Fu


tradicional a partir do ponto de vista dos entrevistados.

b) Indagar, com base nos discursos dos entrevistados, em que medida


o Kung-Fu tradicional pode colaborar com o processo educativo de
seus praticantes em seu cotidiano, designadamente no que se
refere à formação ética e estética.

É de realçar que este trabalho enfrentou a dificuldade de se debruçar


sobre um objeto de estudo ainda pouco explorado. Se este obstáculo se

11
traduziu, por um lado, num estímulo acrescido ao desenvolvimento da
pesquisa, por outro, não deixou de constituir uma limitação, já que o salutar e
instigador confronto com outras investigações no âmbito do Kung-Fu não pode
atingir o alcance desejado, sendo esta uma das suas limitações. Ainda assim,
pensamos que um certo pioneirismo pode ser atribuído a este estudo, o que se
traduz numa das suas forças, almejando-se que se possa vir a constituir como
referência para futuras investigações na área. Espera-se que o presente
trabalho possa servir às esferas acadêmica, desportiva e marcial, produzindo
outros estudos, enriquecendo o conhecimento sobre a ética, a estética, os
desportos de combate e o Kung-Fu.

A presente dissertação, para além desta Introdução Geral, está


estruturada em mais sete capítulos. O segundo capítulo, intitulado
Enquadramento Teórico e Metodológico, teve o intuito de consubstanciar maior
conhecimento e arcabouço teórico à pesquisa, proporcionando assim um
melhor embasamento e ligação da mesma com os eixos teóricos que seu tema
se faz circunscrito (nomeadamente aqui a educação, o desporto e os valores
éticos e estéticos). O mesmo capítulo ainda complementa informações sobre
as metodologias aplicadas para a execução dos estudos. Logo em seguida, no
capítulo três, apresentam-se os três estudos teóricos que compõem essa
pesquisa doutoral, nomeadamente: uma revisão sistemática sobre o tema
(estudo I), uma exploração e interpretação do Código de Ética do Kung-Fu
(estudo II) e uma anáilise conceptual do universo marcial sob lentes da ética e
da estética (estudo III). Dando continuidade, destaca-se no capítulo quatro o
estudo empírico (estudo IV) realizado por meio de entrevistas com Mestres de
renome mundial, onde se pretendeu compreender quais as suas perspectivas
acerca do valor educativo da ética e da estética no ensino do Kung-Fu
tradicional. Ao final dos estudos, no capítulo cinco, traz-se uma larga discussão
que almejou convergir as reflexões de toda a pesquisa, intitulada Buscando
uma interpretação integrada dos estudos realizados – uma reflexão final. Por
último, finaliza-se este trabalho expondo no capítulo seis as Conclusões e
Considerações Finais. Nos capítulos sete e oito elencam-se, respectivamente,
as referências bibliográficas e os anexos.

12
2. Enquadramento Teórico e Metodológico

_______________________________________________________________

13
Este capítulo tem como propósito apresentar, aprofundar e assim por
sua vez também embasar elementos temáticos que serviram como eixos
teóricos onde esta pesquisa doutoral se alicerça. Aqui são trazidos à luz
tópicos como educação, desporto, axiologia, estética, ética, cultura oriental,
artes marciais e Kung-Fu. Tais tópicos são discutidos e refletidos, ora de modo
mais isolado ora de modo mais integrado, possibilitando o descortinar de novos
caminhos e reflexões no estudo dessas temáticas. Dessa forma, busca-se
suprir quaisquer possíveis lacunas de embasamento teórico que possam ter
surgido ou restado com as publicações dos estudos desta pesquisa doutoral
(que se deu em modelo escandinavo), fruto das limitações de paginação para
publicação, escopos dos periódicos e/ou eventos acadêmicos (dentre outros
possíveis limites encontrados).

O capítulo está organizado em subtópicos onde de forma geral foram


discorridos conceitos, ordenações, reflexões e sínteses embasadas na
literatura. Almejou-se assim consolidar uma segurança acadêmica sobre as
temáticas aumentando seu valor e confiabilidade. Inicialmente, no primeiro
subtópico nomeado “Da relação educação e desporto”, abrem-se os raciocínios
ao falar de aspectos diversos sobre a educação do homem, fazendo uso de
autores oriundos e imersos nas ciências humanas (filosofia, história, sociologia,
pedagogia e afins). No segundo subtópico, nomeado “Dos valores ético e
estético e suas relações com o desporto”, são tecidos e aprofundados
princípios e elementos que constituem a compleição da ética e da estética e
suas aproximações ao desporto. Por fim, no terceiro subtópico, nomeado “Das
metodologias aplicadas”, discorreu-se de forma mais extensiva sobre os
processos metodológicos que foram elencados para a realização de cada um
dos artigos publicados.

2.1. Da relação educação e desporto

A preocupação e discussão mundial para com a educação nunca


estiveram tão fortes como hoje. Marques (1993, p. 109) conceitua educação
como “(...) o alargamento do horizonte cultural, relacional e expressivo, na
dinâmica das experiências vividas e na totalidade da aprendizagem da

14
humanidade pelos homens”. A premente necessidade de refletir e repensar
sobre os meios de educação e ensino junto à sua importância para a edificação
da sociedade e do ser humano, faz-se cada vez mais concreta e visível, sendo
foco da atenção de pessoas, governos e órgãos internacionais (Gadotti, 2005).
Para além das fronteiras culturais e étnicas onde se encontram os costumes e
hábitos idiossincráticos dos povos mundo afora, é na educação que repousa a
esperança de harmonização, evolução e conquista de dias melhores para o
indivíduo e para a sociedade. No século XVIII, Kant afirmava que “O homem
não pode tornar-se um verdadeiro homem senão pela educação. Ele é aquilo
que a educação dele faz” (Kant, 1996, p. 15). Sob a luz dessas palavras, é
possível perceber a seriedade e importância desse assunto, pois se entende
que a carência de educação pode ser uma porta aberta para a subutilização
das capacidades do ser humano ou mesmo, algo pior, a utilização de forma
egoística e perniciosa, degradando o ser humano para algo ruim e menor. Faz-
se necessário, assim, discutir vigorosamente os problemas da educação para,
segundo Kant (1996), desvendarem-se os segredos da evolução da
humanidade. Mais: ao discutir a educação é necessário analisar o ser humano
de maneira holística, não desprezando a totalidade do ser e de sua conjuntura
sociocultural geral. Tudo que é humano não deve ser desprezado quando o
foco recai sobre a educação (Patrício, 1993).

Um dos clássicos fundadores da sociologia enquanto ciência, Dürkheim


(1968) defendia a ideia de que a educação é uma “segunda natureza”,
almejando “conter” e mesmo “civilizar” a natureza primitiva humana, que pode
ser repleta de manifestações de violência (Dadoun, 1998). Na reflexão de
Bento (2006) é dito que o ser humano é o animal que tenta se afastar de sua
animalidade. Por conta de tal fato, a educação deve sempre ser um processo
permanente (Murad, 2009) e fundamentado no aprendizado e vivência dos
valores; ou seja, na axiologia (Patrício, 1993), pois como afirma Murad (2009),
a vida moral é tão relevante quanto a vida biológica do indivíduo, sendo
igualmente incisiva na história da sociedade humana.

Procurando explorar e perspectivar linhas para a educação do século

15
XXI, Edgar Morin (2014) explicitou e apresentou o seu pensamento sobre este
assunto na obra “Os sete saberes necessários à educação do futuro”. Ali ele
ordena o que seriam saberes fundamentais para toda e qualquer sociedade e
cultura, afastando-se de exclusividades e rejeições. Alerta que tais saberes são
sim respaldados na ciência, contudo estes seriam efêmeros, pois além de
reconhecer o conhecimento como transitório e em processo eterno de
maturação, ainda tocam “em profundos mistérios referentes ao Universo, à
Vida, ao nascimento do ser humano. Aqui se abre um indecidível, no qual
intervêm opções filosóficas e crenças religiosas através de culturas e
civilizações” (Morin, 2014, p. 13). Esses “sete saberes” são: 1) as cegueiras do
conhecimento – o erro e a ilusão; 2) os princípios do conhecimento pertinente;
3) ensinar a condição humana; 4) ensinar a identidade terrena; 5) enfrentar as
incertezas; 6) ensinar a compreensão; e 7) a ética do gênero humano.
Entende-se que o autor principia seu raciocínio sobre educação abarcando a
necessidade do homem em reconhecer sua ignorância e suas falhas na busca
pelo conhecimento, de certa forma clamando assim pelo abaixar da guarda do
ego humano e pedindo um ato de humildade e de autorreflexão. Destarte,
progressivamente os discentes passariam a estudar e a compreender o mundo
de maneira externada, ou seja, de dentro (do eu) para fora (do mundo). Por fim,
compreenderiam suas inseguranças como algo comum e humano e não mais
como fraqueza, o que estimularia a fraternidade e cooperação entre os homens
em uma atitude coletiva profundamente ética. Sem dúvidas, um currículo
imerso em valores. Soma-se a tal reflexão a máxima de Merleau-Ponty (1989,
p. 136):

A partir do momento em que reconheci que minha experiência,


justamente enquanto minha, abre-me para o que não é eu, que
sou sensível ao mundo e ao outro, todos os seres que o
pensamento objetivo colocava à distância aproximam-se
singularmente de mim.

Ainda sob essa análise, Merleau-Ponty (2004) complementa o


raciocínio dizendo que é através do olhar e do observar que o homem alimenta
o processo de questionamento, buscando compreender os elementos que

16
constituem o mundo que o cerca e o envolve dia a dia. Deste modo, quando
reflete sobre o mundo, o homem acaba por descortinar também novas auto
expressões, o que se dará até o findar da vida. Nasce então uma centelha
criativa através do corpo, que por sua vez materializa e dimensiona o que viu
traduzido à sua forma por meio de seus gestos. Dá-se aí a chamada “dialética
de visibilidade construída a partir do olhar corpóreo, do movimento e da
subjetividade” (Silva & Porpino, 2014, p. 67). Ter tal experiência vai além da
execução mecânica, ela pode dar início a um processo contínuo e frequente,
gerando um costume, uma tradição e, quando em coletivo, um habitus
(Raffaelli, 2013). Por conta disso, faz-se extremamente necessário a
humanidade ir muito além da visão. Como já enunciara o célebre poeta
português Fernando Pessoa4, “pensar é estar doente dos olhos”.

É alertado por Bento (1995) que os estudos e aprendizados axiológicos


muitas vezes são tidos (principalmente pelos jovens) como pura teoria; algo
maçante, monótono e tedioso. Por diversas vezes, por conta dessa imagem
pré-concebida, cria-se uma barreira inerte, dificultando sensivelmente o
interesse e entendimento da relação teoria-prática da axiologia no cotidiano do
indivíduo. Em diversas circunstâncias no campo da educação, supõe-se o
aprendizado prático superior ao teórico. Instaura-se aí um comum equívoco.
Contudo, em muitos casos as densas teorias precisam ser mais destrinçadas e
mesmo traduzidas aos aprendizes, demonstrando objetivamente sua
importância para execução e entendimento massivo da prática. Amadio e
Serrão (2011, p. 15) aludem que “vislumbrar as reais possibilidades de
aplicação de uma disciplina acadêmica possibilita a revitalização de seu corpo
de conhecimento, condição que fundamenta as bases para que seu
desenvolvimento se perpetue”.

A teoria pensa, imagina e compreende a prática produtiva e moral. É

4
Fernando Pessoa teceu seus escritos fazendo uso de diversos heterônimos, dentre alguns
deles: Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Bernardo Soares. Por conta de tal fato,
Hass (2009) chegou a dizer que Pessoa inventava poetas inteiros e o coloca em um patamar
cimeiro dentre os escritores e poetas do mundo ocidental (e não somente da lusofonia).

17
fundamental a compreensão teórica profunda e extensa para que a prática
possa ser elevada e otimizada em prol do bem. Srour (2008) já deixa a
entender que o mais difícil não é fazer o que é certo, mas sim descobrir o que é
certo fazer. Logo, fica clara a necessidade da educação revestida de valores,
uma educação axiológica. Algo já preconizado por Aristóteles (ed. de 2015)
quando afirmava que apenas saber o que é a excelência moral ou mesmo
intelectual não se faz o suficiente. É necessário sim um esforço genuíno em
possuir e praticar tais excelências ou mesmo experimentar quaisquer outras
formas e meios para os homens se tornarem bons. Complementarmente,
Baptista (2005, p. 23) pontua que sensibilidade, prudência, solicitude ou
bondade, são marcas de uma ação ética investida e que requerem o exercício
pessoal de uma consciência crítica.

Porém, a educação da sociedade humana, de forma una e singular em


âmbito global, se faz utópica. As inúmeras culturas, religiões, convicções
políticas, pensamentos divergentes sobre pontos de interesse, diferentes
interpretações da moral e ideologias mil, tornam a sociedade humana e suas
discussões assuntos extremamente complexos (Goergen, 2005). Por conta
disso não é possível afirmar a existência de apenas uma teoria e/ou prática
soberana e melhor que todas as outras, tanto no campo inter quanto
intraindividual. Aparentemente, todas se fazem importantes (Bento, 1995).

Superando tais dificuldades, uma forma que vem sendo utilizada já há


diversos séculos (ou mesmo há milênios) como meio de transmissão dos
valores, independentemente das diversas variáveis sociais do indivíduo é o
desporto (Rubio, 2002; Rosa, 2021). Darido (2003, p. 2) é categórica quando
afirma que "A Educação Física5 é um meio da Educação". É através do
desporto que, metaforicamente, o ser humano busca expressar através dos
tempos suas características inerentes, sejam elas físicas, cognitivas ou sociais,
de forma prática, lúdica, técnica, artística e moral. Por meio do desporto

5
Importante esclarecer que a expressão “Educação Física” é utilizada no Brasil (país de origem
da autora citada) como sinônimo das expressões “Ciências do Desporto” e “Ciências da
Motricidade Humana” utilizadas em Portugal.

18
manifesta-se não apenas o ser humano como indivíduo, mas sim, como ser
coletivo descortinando as lógicas, obviedades e ambiguidades de sua
sociedade (Murad, 2009). Assim, elucida Tubino (1993, p.12): “a história do
desporto é íntima da cultura humana, pois por meio dela se compreendem
épocas e povos, já que certo período histórico tem o seu esporte e a essência
de cada povo nele se reflete”. Portanto, o desporto (ou esporte) é uma
representação microssociológica transcendental do coletivo humano sob o
prisma temporal que, por sua vez, também se divide em incontáveis esferas e
campos de estudos e práticas (Murad, 2009). Ainda é reforçado por Bento
(1995, p.231) que toda essa transformação histórica acarreta grande influência
nas mudanças de pensamento “(...) sobretudo no plano dos valores, dos
direitos, dos interesses, dos problemas e das necessidades”. Fica mais que
evidenciado então que o universo do desporto / motricidade humana /
educação física se contempla em múltiplas esferas não só anátomo-fisio-
lógicas, mas também bio-sócio-filosóficas (Darido, 2003).

É dito por Tiedemann (2004, p. 3) que

"Sport" is a cultural field of activity, in which human beings


voluntarily go into a real or only imagined relation to other
people with the conscious intention to develop their abilities and
accomplishments particularly in the area of skilled motion and to
compare themselves with these other people according to rules
put self or adopted without intending to damage them or
themselves deliberately.

Ou seja, o desporto se perfaz em essência em um entendimento sadio


e harmônico do coletivo; enfim, ético. Indo ao encontro de tal reflexão, uma das
mais antigas e importantes características do desporto é a conglomeração e
união de povos para suas práticas e realização de eventos desportivo-
competitivos (Rubio, 2002). Em diversos pontos do globo e desde a
Antiguidade, as manifestações desportivas já integravam culturas primitivas,
ganhando estatutos elevados de grandes manifestações sociais (Tubino,
1987). Ali, ocorria a relação pacífica dos estados, reinos, nações e países para
a prática de desportos e realização de competições, sendo a maior referência

19
histórica deste fato os Jogos Olímpicos da Antiguidade em aproximadamente
776 a.C. (Basso, 2012). Entende-se então que, ao menos já há mais de dois
milênios, o desporto, mesmo que ainda de forma incipiente e em um formato
diferente daquele que é conhecido hoje, já possuía alguma propriedade
civilizadora. Tais pensamentos somam-se às atuais reflexões de Elias (1994)
sobre sua conceituação do “processo civilizador”, onde o desporto pode (e
deve) ser um meio educativo, colaborando com o entendimento de questões
axiológicas e deontológicas de forma tanto teórica quanto prática. O desporto,
solidamente embasado em fundamentos educativos e axiológicos, pode
proporcionar a transmissão de princípios marcantes para a diminuição das
manifestações de violência na sociedade como um todo (Rosa, 2021), sejam
elas manifestações físicas ou mesmo, como enunciado por Bourdieu (2000),
manifestações simbólicas.

Atualmente, o desporto cada vez mais é visto claramente como um


sistema aberto, rompendo fronteiras geográficas e culturais, gerando inclusive
diferentes modelos e formas de entendimento, organização e prática (Matos,
1998). O uso do desporto como ferramenta do processo educativo é visível
(Bento, 2003) e acolhido mundialmente, talvez podendo ser exposto como um
axioma. Sua atuação pode se desdobrar em diversas vertentes, tais como:
“autodefesa”, “promoção da saúde e qualidade de vida”, “transmissão de
valores educacionais”, “práticas desportivo-competitivas”, “lazer e ludicidade”,
“estética cosmética” e “socialização” (Tubino, Ferreira & Capinussú, 1990;
Bäck, 2009; Mocarzel, Ferreira & Murad, 2014; Mocarzel & Columá, 2020).
Estas vertentes não se encerram aí, mas já abrangem significante proporção
popular no universo desportivo, ou seja, o universo desportivo pode abranger
ainda mais vertentes de estudo e atuação. Tal pensamento vai ao encontro dos
aforismos de Bento (1990) que defende o “desporto plural”, um espaço de
objetivos, práticas e atitudes em meio a diversos desportos conglomerados em
um mesmo ambiente macro. Ainda é defendido por Tubino, Tubino e Garrido
(2007) que o desporto contemporâneo desenvolveu princípios educacionais
que são manifestados em toda sua compleição, sendo eles: princípio da Co-
Educação, princípio da Co-Responsabilidade, princípio da Cooperação,

20
princípio da Inclusão, princípio da Participação, princípio da Superação,
princípio do Desenvolvimento do Espírito Esportivo, princípio do
Desenvolvimento Esportivo, princípio do Prazer, princípio do Esporte de
Desempenho, princípio do Esporte-Educação e princípio do Esporte-Lazer. É
possível dizer que hoje, o desporto tornou-se algo tão intrínseco do ser
humano, que talvez possa ser considerado como uma espécie de identidade
(Murad, 2007), algo já mesclado à cultura humana (Rosa, 2021). Reforça-se a
isso a existência da prática de educação física nas escolas e colégios mundo
afora. É no ministrar dessa disciplina curricular imersa no universo do desporto
que, ludicamente, as crianças desde cedo começam a compreender (teoria) e
exercitar (prática) princípios educacionais que suportam os fundamentos
civilizadores: respeitando regras e autoridades, reconhecendo limites físicos
próprios e dos colegas, desafiando e descobrindo suas capacidades
psicomotoras, desenvolvendo estratégias para vencer as adversidades, criando
o sentimento de cooperação e de coletivo social, experimentando e superando
a frustração das derrotas e o orgulho ególatra das vitórias; enfim, como parte
do processo de civilização do ser humano (Bento, 1995). Trata-se, portanto, do
espírito desportivo oriundo do caráter agonístico da vida humana já preceituado
pelos gregos (Reid & Evangeliou, 2008) em sua época clássica no século V
a.C. Pode-se dizer que se perfaz deste modo o Homo Sportivus (Tubino, 1990).

Sendo assim, pensa-se que o processo educativo por meio do desporto


necessita sempre estar alicerçado em princípios axiológicos profundos. Além
disso, devem-se buscar fundamentos que sejam de entendimento, se possível,
global, pois em muitos casos, a multiplicidade de culturas e etnias, com suas
peculiaridades e entendimentos diversos, podem proporcionar o surgimento de
conflitos. Por outro lado, Vygotsky (1991) afirma que é exatamente na
heterogeneidade que a riqueza do aprendizado através da ação partilhada
entre os seres humanos, desenvolvendo as capacidades individuais e,
consequentemente, as coletivas, acontece de forma concreta. Ou seja, os
aspectos interacionistas sociais estimulando os aspectos cognitivos do
indivíduo. É nesse entendimento que se relaciona aqui o alerta de Dürkheim
(2006) onde ele afirma que o ensino da deontologia deve ser feito minuciosa e

21
detalhadamente, respeitando interpretações diferentes de entendimento, por
conta da realidade humana ser multifacetária, peculiar e particular para cada
caso específico.

2.2 Dos valores ético e estético e suas relações com o desporto

A filosofia é talvez a mais antiga área de atuação reflexiva da


humanidade. É dela que floresceu a gênese das mais diversas ciências
existentes, tais como a matemática, a biologia, a física, dentre outras. De
maneira sucinta, aponta-se que o papel da filosofia é ser o caminho de
aprofundamento do pensamento sobre todas as coisas e fatos, gerando, por
conseguinte, novas indagativas na busca de conhecimentos. Em outras
palavras, a filosofia, por meio do pensamento reflexivo, é a ciência dos
“porquês”. Ao primeiro momento que algo for respondido, imediatamente este
novo conhecimento passa a integrar alguma das ciências existentes, assim,
emancipando-se da filosofia. Logo, pode-se dizer que a filosofia trabalha com a
matéria bruta vestigial e residual, reiniciando o processo de busca e indagação
sobre os questionamentos e mistérios da existência perpetuamente.
Historicamente é exposto por Chauí (2000) que o termo filosofia foi
cunhado pela primeira vez pelo célebre filósofo Pitágoras (570-496 a.C.). Tem
por significado etimológico do grego antigo as palavras philo que deriva de
philia (amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais) e sophia ou sophos
(sabedoria ou sábio). “Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria,
amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo
saber, deseja saber” (Chauí, 2000, p.19).

Pitágoras teria afirmado que a sabedoria plena pertence apenas ao


divino, no entanto, os seres humanos podem desejá-la ou mesmo amá-la,
tornando-se assim, filósofos (Chauí, 2000). Sem dúvida, o ato do saber, pouco
a pouco conquistado através dos tempos, gerou e ainda gera transformações
no ser humano e em sua sociedade. O saber para a humanidade nutre direta

22
ou indiretamente o corpo, a mente e a alma do ser humano, como a ambrosia
as divindades do Olimpo.

Refletindo sobre as colocações anteriores, é possível aqui apontar,


mesmo que de forma genérica ou mesmo abstrata, uma característica humana:
a curiosidade que transforma. Ao que tange o ato de descobrir e de saber, tais
conquistas geram o mudar, a transformação do ser ou mesmo de toda a
sociedade. Enfim, o ser humano parece “não aceitar” ser quem ele é (Cortella,
2002). Através da busca da evolução ele tenta incessantemente transcender
sua posição inata de animal, passo a passo, buscando sua aproximação com
algo mais elevado espiritualmente e maior (Bento, 2006). Logo, a filosofia se dá
como um meio para o alcance dessa evolução, todavia, Cortella, (2005b) alerta
que a filosofia apenas pela filosofia também foi usada por déspotas em
ditaduras e alienações. A filosofia só é benéfica quando alimenta o processo de
humanização e não de domesticação.

Dentro da filosofia podem-se identificar alguns grandes campos de


estudo e pesquisa. São eles: ontologia ou metafísica, lógica, epistemologia,
teoria do conhecimento, ética, filosofia política, filosofia da história, filosofia da
arte ou estética, filosofia da linguagem e história da filosofia (Chauí, 2000).
Porém, é destacada por Pedro (2014) a existência da axiologia, um campo que
busca o tratado dos valores por meio da reflexão filosófica abrangendo sua
natureza, características, estrutura, conhecimento e teorias. Entende-se assim
que é na axiologia que se inserem importantes ramificações que dão foco aos
estudos dos valores, tais como: “políticos, éticos, morais, estéticos, ecológicos,
vitais, espirituais, económicos, religiosos” (Pedro, 2014, p.488). Ao que diz
respeito a uma hierarquia de tais valores, muitas vezes o assunto pode ser
tomado como polêmico e conflitante, tornando-se alvo de críticas e cenário de
discussões. No entanto, Patrício (1993, p.66) ergue-se e esclarece uma
necessidade não de hierarquização, mas sim de ordenação, onde ele
complementa dizendo que: “O valor não apenas é valor; ao mesmo tempo, o
valor tem valor. Alguns valores têm mais valor do que outros: nesta realidade
assentam todas as classificações dos valores”. Assim, por meio de tal aforismo,

23
é possível dar forma a uma ilustração exemplificativa (fig. 1) dos ditos de
Patrício (1993), onde se apresenta uma ordenação dos valores. Estes últimos
são ali dispostos em primeiro de forma mais basal os valores vitais, em
segundo os valores práticos, em terceiro os valores estéticos, em quarto os
valores lógicos, em quinto os valores éticos e por fim, na cumeeira da pirâmide
axiológica, os valores religiosos.

Figura 1: Representação da ordenação axiológica disposta em gráfico piramidal


(Patrício,1993).

Após apresentar de forma sucinta e mais lato o que seriam os eixos de


pensamento dentro da filosofia, é importante aqui relembrar que como forma de
delimitação dessa pesquisa doutoral, os estudos efetuados no modelo
escandinavo recaíram sobre o aprofundamento da prática do Kung-Fu através
de óticas da ética e da estética. Sendo assim, essas últimas são aqui abaixo
mais detalhadas, destrinçadas e refletidas.

Iniciando pela ética, o referido termo tem origem grega e é encontrado


na obra de Aristóteles como adjetivo “ethike”, que qualifica uma forma de
saber, conduzindo a prática duradoura das virtudes morais e ainda, a
reflexividade dos costumes “ethea”; tendo ambas as adjetivações derivadas do
substantivo “ethos” (Brochado, 2009).

24
A ética (considerando todas as suas possibilidades de extensão) talvez
seja uma das temáticas mais discutidas, mesmo que informalmente, no século
XXI. A busca por um comportamento ético coletivo (e não somente individual)
nas diversas esferas da sociedade humana é algo desejado por praticamente
todos. Debatem-se hoje comportamentos éticos para com o amor, com a
amizade, com o trabalho, com o dinheiro, com a educação, com o meio
ambiente, com a saúde, com a religião, com a mídia, com o lazer, com o
animal, com a pesquisa, com o esporte, com o sexo, com a política e até com a
guerra. Para aludir sobre o tema, Cortella (2005a) expõe que a ética tem
relação direta com o coletivo, entretanto, enfatiza tal afirmação sendo
relacionada à liberdade do indivíduo, como é fundamental o ser humano
entender suas capacidades e fazer bom uso delas para um real bem coletivo
maior (Cortella, 2005b, p.5): “Daí, da liberdade, vêm as três grandes questões
éticas que orientam (mas também atormentam, instigam, provocam e
desafiam) as escolhas do indivíduo: Quero? Devo? Posso?”. Conclui-se a
existência de coisas que: pode se querer, mas não se deve; se deve, mas não
se pode; ou mesmo, se pode, mas não se quer. A reflexão sobre o crivo ético
do indivíduo se fará importantíssima para a determinação de suas ações
futuras. Afinal, como explanado na 1ª carta de Paulo aos Coríntios, no início do
primeiro milénio: “Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém” (1 Coríntios
6,12). De forma ainda mais conclusiva e profunda, Jesus diz “Pois, que adianta
ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Marcos 8,36).

Analisando o contexto do coletivo, compreende-se que a ética anda de


mãos dadas desde sua concepção com as qualidades volitivas e o autodomínio
do indivíduo (Bento, 199-). Vê-se de forma cristalina o princípio ético na
chamada “regra de ouro bíblica” onde Jesus recita seus ensinamentos aos
seus acólitos e asseclas durante o famoso “sermão da montanha”: “Portanto,
tudo o que quereis que os outros vos façam, fazei o mesmo também vós a
eles: nisso está a Lei e os Profetas” (Mateus, 7, 12). Por sua vez, Kant (1995)
reforça6 tal pensamento ético para com o comportamento civilizacional entre os

6
Apesar de diversos atritos históricos entre a religiosidade (fé) e a filosofia (ciência), não é raro
ver ambas coexistirem e concordarem em textos que se inserem em discussões educacionais

25
homens, afirmando que o indivíduo deve agir de tal maneira tratando a
humanidade sempre e simultaneamente como fim e nunca como meio (tanto
para consigo mesmo como para com a pessoa de qualquer outro). Percebe-se
que o altruísmo possui também uma significativa vertente ética. Enfim, é por
meio dessas qualidades volitivas e do autodomínio que o ser humano faz suas
escolhas de ação, gerando consequências socioculturais, inclusive a
transformação de pensamento de todo um povo através dos tempos,
constituindo assim o que Bourdieu (1996, p.21) nomeia de habitus, um
importante “(...) princípio gerador e unificador que retraduz as características
intrínsecas e relacionais de uma posição em um estilo de vida unívoco, isto é,
em conjunto unívoco de escolhas, de bens, de práticas”. Uma matriz cultural
(Murad, 2009) que não pode nem deve ser desprezada. A base da educação
de uma cultura é permeada desses princípios éticos e morais (Kant, 1996),
sendo útil ainda para a busca do bem e a preservação da civilização (Ribeiro &
Zancanaro, 2011). Para um resumido esclarecimento de diferenciação
conceitual, disse aqui “ética” para o entendimento e normatização do
comportamento coletivo e costumes de um grupo, nação, tribo e/ou povo. Já
“moral” por sua vez se alude à execução de tais comportamentos e costumes
da referida população. Ou seja, a ética como conceito teórico e a moral como
práxis de tal.

É nessa perspectiva educacional que foi estruturado o conceito do


“processo civilizador” de Elias (1994), onde as regras, princípios normativos de
atuação padronizada, compreendidos pelo todo coletivo, atuam no desporto
como uma forma educativa e reguladora das ações do indivíduo, colaborando
com a diminuição de atitudes antiéticas e, consequentemente, antidesportivas.
Assim, o desporto pode liberar suas emoções e permitir sua expressão sob a
forma de excitação controlada e moderada (Rosa, 2021). Não obstante, busca-
se ainda a igualdade, respeito e justiça para todos os envolvidos. Novamente,
percebe-se a necessidade da conquista do autocontrole do ser humano,

mais alargadas. Reforçando-se a isso, lembra-se ainda que a estrutura educacional ocidental
faz-se amplamente alicerçada no direito romano, na filosofia helênica e na fé do Deus de Israel.
Dão-se aí os 3 pilares da civilização ocidental (Bento & Bento, 2014).

26
superando seus instintos de frustração e egoísticos para tal façanha, tornando
o coletivo mais pacífico.

O esporte, nesse enfoque, é “civilizacional” porque exercita a


sociedade na qual está inserido e experimenta a sua
regulamentação e os seus limites. Portanto, pode ser educativo
ou reeducativo porque ajuda na preparação das pessoas para
conviverem e respeitarem o outro, o que é uma vivência de
cidadania. Em outras palavras, uma convivência (Murad, 2009,
p.114).

Historicamente, nota-se claramente a “transformação humanitária” que


o desporto sofreu, abandonando majoritariamente práticas de origens bélicas,
com sangue, mortes e atitudes afastadas do princípio educacional moral,
outrora até tidas como ferramenta política na cultura do “pão e circo” – um
exemplo do conceito de “espetáculo” (Debord, 2003). Sem dúvida, essa ruptura
decisiva com as atitudes do passado foi provocada pela mudança do
pensamento ético e moral da sociedade da época, que por sua vez tem seu
estímulo no desenvolvimento educacional e na transformação cultural que
ocorre sazonalmente (Murad, 2009). Porém, lembra-se novamente que o
próprio desporto pode influenciar a sociedade humana, colaborando de forma
diplomática e humanitária com o cessar de guerras, com o intercâmbio de
culturas, com a troca de experiências, com o alegrar ou entristecer de uma
torcida, com a transmissão de valores. Portanto, afirma-se que não só o
desporto pode influenciar uma sociedade, mas também, uma sociedade
influencia o desporto, constituindo assim a nomeada “bilateralidade sócio
esportiva” (Mocarzel et al., 2012, p. 120).

São as mudanças ideológicas e transformações de pensamento que


fazem a cultura humana se modificar (Garcia, 2006). Já na clássica e milenar
obra oriental “Tao Te King” (道德經)7 de autoria de Lao-Tsé (Lao, 2001),

7
As palavras que compõem o nome romanizado do “Tao Te King” podem ser encontradas com
variações, como: Tao Te Ching ou Dao De Jing. Também conhecido como “Livro do caminho e
da virtude”. É um dos textos fundamentais dos princípios filosóficos, reflexivos e educacionais
do Taoísmo (Mocarzel, 2011), sendo ainda o livro mais traduzido do mundo após a Bíblia
(Cunha & Rego, 2007).

27
destaca-se a cultura (de forma geral) como uma “arte viva”, em constante
modificação, buscando se adaptar e superar as dificuldades que surjam em
todos os momentos em prol de uma harmonia maior. Esse pensamento soma-
se às colocações de Geertz (1989) sobre como a cultura da sociedade humana
também é dinâmica e muda a todo instante, algo também já preceituado por
Durkheim (1995, p.303) ao afirmar “(...) que a humanidade se faz, se desfaz e
se refaz sem parar (...)". Não diferentes tais transformações também ocorrem
na área de talvez maior influência do desporto em conjunto com a educação: a
educação física. É defendido por Daolio (2007) que é nessa conjuntura cultural
efêmera que o professor de educação física atua, influenciando e sendo
influenciado constantemente sob o prisma cultural:

Tenho afirmado em outros trabalhos que “cultura” é o principal


conceito para a educação física, porque todas as
manifestações corporais humanas são geradas na dinâmica
cultural, desde os primórdios da evolução até hoje,
expressando-se diversificadamente e com significados próprios
no contexto de grupos culturais específicos. O profissional de
educação física não atua sobre o corpo ou com o movimento
em si, não trabalha com o esporte em si, não lida com a
ginástica em si. Ele trata do ser humano nas suas
manifestações culturais relacionadas ao corpo e ao movimento
humanos, historicamente definidas como jogo, esporte, dança,
luta e ginástica. O que irá definir se uma ação corporal é digna
de trato pedagógico pela educação física é a própria
consideração e análise desta expressão na dinâmica cultural
específica do contexto onde se realiza (Daolio, 2007, pp. 2-3).

Hoje, a preocupação com a ética e sua atuação direta ligada à área do


desporto se faz inequívoca. Garcia (2006) alerta para a busca de tal princípio
em um período de conflitos educacionais e ideologias “semianárquicas”
disseminadas pela sociedade, onde o relativismo axiológico se sobressai quase
como uma ditadura, o que Bauman (2003) adverte veementemente como uma
sociedade líquida que se desfaz fugazmente, proliferando o Homo Eligens e
esquecendo diversos e importantes axiomas. Faz-se mais que necessário a
busca pela ética, dando-lhe estatutos elevados nos princípios educacionais,
tendo ainda a certeza que, com as transformações culturais porvindouras,
clamar-se-á também por novas reflexões, posturas e atitudes éticas do ser

28
humano em seu meio de atuação. Jorge (2014) afirma a necessidade de
institucionalizar a ética, fazendo parte dos princípios educacionais não só dos
indivíduos (pessoas físicas), mas também das instituições (pessoas jurídicas),
tendo sido tal pensamento cada vez mais aceite pela sociedade nas principais
áreas de manifestação humana. Acredita-se que é daí que se germinou com o
passar dos tempos a instauração de ações éticas no desporto, tendo seu cume
de propagação no esporte contemporâneo com o auxílio de instituições
mundialmente importantes no desporto (como, Comité Olímpico Internacional –
COI, Federação Internacional de Futebol – FIFA, Agência Mundial Antidoping –
WADA, dentre outras), recebendo as lentes da grande mídia internacional.

Reconhece-se que o embrião da ética desportiva no mundo ocidental


realmente teve sua maior inspiração nos aforismos dos povos helênicos (ou
helenos) constituintes dos antigos domínios da Grécia no século V a.C. através
do grande filósofo Sócrates8, predominando também boa parte da reflexividade
ética ocidental, muito embora Platão e Aristóteles (discípulos diretos da linha
sucessória de Sócrates) afirmassem a origem da filosofia (área de inserção da
ética) sendo oriental (Chauí, 2000). É no pensamento das máximas socráticas
que a ética é apresentada através da humildade (“só sei que nada sei”) e a
necessidade da auto avaliação constante (“conhece-te a ti mesmo”). Isto é,
voltado para o conhecimento do íntimo, espírito e índole; assim, haveria a
chance de se alcançar a verdade (objetivo maior da filosofia) e a virtude do ser
(Chauí, 2000). Já Platão, discípulo de Sócrates, traz no “Mito da Caverna” uma
velada e póstuma homenagem ao seu mestre, tentando demonstrar que foi
através da filosofia reflexiva e postura ética até o fim da vida que seu mestre
alcançou a virtude, mesmo tentando iluminar aqueles que o condenaram e o
mataram (Chauí, 2000). Por fim, Aristóteles, discípulo de Platão, faz diversas
alusões ao equilíbrio, meio-termo, prudência e moderação em sua obra
“Política” (Aristóteles, 2006); uma ética de harmonia entre os lados de um
possível conflito (Monteiro, Pereira, Carmona & Monteiro, 2015).

8
Infelizmente, Sócrates não escreveu seus ensinamentos. Foram Platão e Xenofonte, seus
discípulos, que difundiram suas filosofias e pensamentos após sua morte (Mocarzel & Columá,
2020).

29
Sintetizando os pensamentos dos ocidentais ícones da filosofia e
precursores da reflexão ética, pode-se observar que as premissas do desejo da
ética estão em alcançar uma transcendência ao sagrado e divino, repousado
na verdade oculta no espírito do ser, podendo ser descoberto através do
estudo reflexivo e do ato do bem. É na sabedoria que se encontram as virtudes
éticas, onde o homem virtuoso sabe discernir sobre a felicidade e o bem-estar
humanos por meio da Paideia (Monteiro et al., 2015). Exatamente neste prisma
que a ética no e do desporto passa a ser elevada no Ocidente, mais
especificamente na Inglaterra no século XIX, por meio do Associacionismo.
Com o advir dos Jogos Olímpicos da Modernidade à porta do século XX, é
agregado ao Associacionismo o princípio do Fair Play, este último base para a
ética do Movimento Olímpico (Tubino, Tubino & Garrido, 2007).

A filosofia do Fair Play objetiva a elevação do chamado “espírito


esportivo”, dentro e fora dos eventos e competições (Capinussu, 2004). Já é
dito por Tubino, Tubino e Garrido (2007, p.52) que Fair Play

é o movimento de entidades/associações e esportistas no


sentido de enfrentarem a exacerbação e os abusos cometidos
no campo do esporte que arranham a própria essência da
prática esportiva, a qual deve estar sempre referenciada em
padrões éticos em todas as suas manifestações.

Mocarzel (2011) elucida que é através do espírito esportivo imerso na


ética do Fair Play que se procura neutralizar ações de violência indireta, como:
racismo, abuso de poder de autoridades políticas e/ou financeiras, agressões
físicas e/ou simbólicas. Ainda exposto por Santos (2005), o espírito esportivo
colabora diretamente com a estrutura normativa do esporte, mesmo quando
não descrito nos estatutos e regulamentos do mesmo. Não se pode nem deve
desprezar o “código de ética popular”, objetivando respeito, tolerância e
igualdade (Mocarzel, 2011). Esclarece Murad (2007) que o Fair Play caminha
de mãos dadas com a cultura e a educação. Esse pensamento converge com o
de Bento (1990, p.27), que em um ponto de vista sociológico, cita que: “A ética
do desporto é parte de uma problemática que abrange todos os domínios da
actividade humana”.

30
Passando agora a discorrer sobre a segunda categoria axiológica,
porém deixando muito claro sua relação quase que indissociável com a
categoria anterior, a ética tem uma profunda ligação com a estética (Bayer,
1993; Hermann, 2005). Para esclarecimento, a palavra estética é oriunda do
termo grego “aisthesis”, denotando sensibilidade, podendo ainda expressar
percepção ou sensação da afetividade humana (Bayer, 1993; Huisman, 1994).
Enfim, a estética busca sua existência no sentir, na emoção, na experiência
que aflora o prazer sensível (Perniola, 1998). “A estética nasce da tentativa de
explicitar o papel que as sensações e as emoções desempenham no
pensamento humano” (Townsend, 1997, p.10).

Normalmente, de forma popular, é feita relação quase que imediata da


estética com a arte, uma vez que a estética como categoria filosófica trata aqui
de forma sucinta do belo ou da beleza o que se faz uma visão limitada da
estética, importante dizer. Com a expansão de pesquisas na área sociocultural,
que por sua vez observam e estudam significantemente questões de cunho
psico motivacional e sócio afetivo, a estética ganhou maior luz para discussões
e questionamentos mais profundos agora no campo desportivo (Tubino, Tubino
& Garrido, 2007). Importante destacar que, sob o olhar da Era Moderna, a
estética como valor e seus julgamentos e juízos já traziam a subjetividade e a
necessidade de reflexão conceituando o belo como algo universal, porém,
como já reconhecido por Kant (1989), que pode ser sentido pelas emoções.

Hoje, algumas reflexões contemporâneas dão novas fronteiras à


estética vendo-a como um valor consolidado na emoção humana (Garcia &
Lemos, 2003). Todavia, é no corpo físico dos desportistas que boa parte da
visão popular recai quando se toca no tema da estética do desporto,
restringindo seu raso entendimento como algo puramente cosmético.
Importante dizer aqui, tal pensamento é deveras limitado ou mesmo
equivocado (Lacerda, 2002, 2007), pois é nos bons atos humanos que a beleza
da humanidade (filosoficamente falando) reside; culminando na virtude do ser
humano. A estética transcende os invólucros carnais do corpo físico, inclusive
destacando-se ainda mais quando o corpo tem debilitações, sejam elas por

31
idade, doenças, acidentes ou problemas na formação congênita ou no
nascimento (Lacerda, 2007; Mocarzel, 2016). Por conta disso que o desporto
adaptado (seja para qual corpo for) é preciosíssimo e torna-se um campo áureo
para o campo da estética do desportivo. Metaforicamente, a estética sendo o
palco, tendo o desporto e a motricidade como peça teatral, constitui o pano de
fundo das ciências do desporto com os atletas como seus artistas principais.

É certo que não há corpo desportivo sem corpo motor, não há


desporto sem motricidade (ou, se houver, será um fenómeno
residual, irrelevante), mas sem desporto a motricidade fica
confinada a um vaivém absurdo, sisifiano, fica sem programa,
sem quadro conceptual, Para fazer do autómato um corpo, há
que juntar ao ‘movimento automático’ um ‘movimento
metabólico’, que o alimente, e ‘um movimento semântico’, que
o signifique e lhe permita a deslocação pelo território das ideias
(Cunha e Silva, 1999, p. 62).

Além disso, não é absurdo afirmar que o desporto é o fenômeno


cultural contemporâneo mais popular no que diz respeito ao prazer e à beleza
(Gumbrecht, 2001). Relacionam-se aqui tais tópicos às percepções dos
espectadores e à capacidade expressiva dos desportistas (Lacerda, 2004).
Nesse processo em que são conquistados os admiradores, por meio afetivo
dos sentimentos e emoções geradas ao ser testemunha dos atos
espetaculosos que o desporto pode proporcionar (Lacerda, 2002) e que
transformam os atletas que alcançam tais façanhas épicas em seres humanos
virtuosos (Lacerda, 2007), mesmo que ainda sejam façanhas momentâneas e
efêmeras (Monteiro, Moraes & Carmona, 2014). Igualmente, percebe-se que a
estética não só vive pelas técnicas excepcionais, pelos bons resultados em
competições desportivas ou mesmo pela díade vitória-derrota no confronto com
os adversários (Lacerda, 2000), mas sim pela dedicação, zelo, determinação,
força de vontade, superação, cooperação, respeito e ética, predicados
genuínos perpetuados no e pelo desporto. E lembra-se aqui, a estética é
destacada, estimulando tais posturas tanto de forma inter como intrapessoais.

Na esteira desse pensamento, é dito por Cunha e Silva (2004) que é da


natureza do desporto ser carente de olhos espectadores, pois ele invoca a

32
visibilidade por meio de suas ações fantásticas. Ações essas que carregam
consigo a fruição estética da superação da realidade humana (Herrero, 1988).
Assim, esse fenômeno, o desporto, chama, atrai, cativa, une, surpreende,
apaixona, encanta. Indo além, pode-se dizer que é através desse despertar de
emoções advindas dos admiradores que ele perpetua sua magnitude, pois isso
alimenta sua celebração e mesmo seu imaginário, transfigurando a
humanidade em miríades de bardos que narram os feitos ali presenciados e
registrados na história humana. Ainda nesse espírito, Gumbrecht (2007) tece
uma verdadeira ode à estética do desporto onde descreve inclusive elogios à
beleza atlética de forma mais tangível através de elementos nomeados por ele
como “os sete fascínios do desporto”. São eles: corpos esculpidos, sofrimento
diante da morte, graça, instrumentos que aumentam o potencial do corpo,
formas personificadas, jogos como epifanias e timing.

O primeiro fascínio, “corpos esculpidos”, apresenta o ideário dos


corpos bem preparados para o desporto, materializando dessa forma o que
seria a personificação estética da beleza física, que por sua vez gera não só
admiração, mas também erotização aos atletas e aos espectadores. Claro que
de certa forma a beleza desse corpo atlético pode variar de acordo com o
desporto e mesmo a cultura influenciadora. O corpo de uma saltadora
ornamental tradicionalmente será diametralmente diferente do corpo de um
lutador de sumô. E mesmo assim, cada um terá sua beleza e capacidades
magníficas. Todavia, não seria indiscreto apontar aqui, por exemplo, as
compleições dos ginastas masculinos e femininos. Fortes, delineados, flexíveis,
hábeis, capazes, ágeis, velozes, precisos, esbeltos. Enfim, belos.

O segundo fascínio, “sofrimento diante da morte”, traz à luz as


consequências da violência (tanto de atletas quanto de espectadores),
enfrentando o possível risco de morte numa busca de superação da dor e do
medo. Destacam-se aí as longas provas de travessias marítimas de barco e a
nado, revivendo os tempos dos descobrimentos marítimos, onde tempestades
e criaturas podem ceifar a vida do desportista. As velozes corridas motorizadas
nos interiores dos países com a população à volta dos trajetos e, obviamente,

33
em meio ao perigo de acidentes e atropelamentos, gerando assim catarses de
angústia, ansiedade, emoção, euforia. Os esportes radicais que criam um
profundo religar do homem com o meio ambiente e a natureza em práticas de
escalada que desafiam a gravidade e a vertigem. A maratona que jaz na
história do desporto há milênios, proporcionando uma díade de sofrimento e
glória aos poucos capazes de completá-la. Os desportos de combate que
majoritariamente têm em sua essência o contato direto do adversário contra
seu corpo, ocasionando impactos ou deslocamento forçados perigosos ao solo,
podendo propiciar grandes lesões e danos se em proporções desmedidas.
Outrossim, de forma metafórica sobre esse fascínio, o famoso filme “Rocky
Balboa” de 2006, ícone da chamada “cultura pop”, mostra o lutador de Boxe
outrora campeão mundial e agora já aposentado conversando com seu filho,
explicando a ele que o simples ato de viver já é um ato de superação de
obstáculos constante como era quando ele lutava no ringue:

O mundo não é um mar de rosas; é um lugar sujo, um lugar


cruel, que não quer saber o quanto você é durão. Vai botar
você de joelhos e você vai ficar de joelhos para sempre se você
deixar. Você, eu, ninguém vai bater tão forte como a vida, mas
não se trata de bater forte. Se trata de quanto você aguenta
apanhar e seguir em frente, o quanto você é capaz de aguentar
e continuar tentando. É assim que se consegue vencer
(Winkler, Chartoff, Winkler, King & Stallone, 2006).

O terceiro fascínio, “graça”, remonta a ideia da demonstração de


harmonia entre os fundamentos do desporto de forma elevada, conglomerando
seus princípios e valências da prática através do movimento corporal. Um
conjunto de “engrenagens técnicas peculiares”, dispostas de maneira
harmônica que quando combinadas de forma ímpar proporcionam deleite aos
olhos. Por exemplo, a estonteante delicadeza durante os infindáveis
movimentos de giro na patinação no gelo. A conexão dramática e romantizada
de um casal em uma dança em pas-de-deux. O aterrissar aparentemente
suave de um atleta que salta de esqui uma distância de aproximadamente 100
metros.

O quarto fascínio, “instrumentos que aumentam o potencial do corpo”,

34
diz-se de extensões do corpo dos atletas. Podem ser incluídos os animais e
máquinas (como em equitação e automobilismo). Além disso, ganham luz
outros instrumentos como armas e equipamentos peculiares que se “fundem”
com o corpo humano buscando uma simbiose. Lembra-se aqui a união de uma
amazona montando e guiando seu corcel, perfazendo assim dois corpos, duas
mentes, duas emoções, em busca de uma união graciosa de “um só espírito”.
A sutileza dos movimentos precisos do jogador de bilhar ao colidir o taco com a
bola em um ponto específico, com a força e sentido certeiros. As formas
coreografadas de artes marciais fazendo uso preciso de armas brancas, como
o facão, a espada, a lança ou o bastão no Kung-Fu.

O quinto fascínio, “formas personificadas”, expressa aí os detalhes que


vão relacionar-se com a técnica e ao mesmo tempo com o gosto. E é por conta
disso que em muitos casos, os árbitros e juízes são deveras criticados por não
valorizarem, ou mesmo valorizarem em demasia, certas apresentações. É
ajustar o corpo do atleta com a técnica elevada do desporto em um exato
momento e tempo determinado dentro de toda a conjuntura que ele se envolve.
Em muitos casos, o ineditismo do movimento pode ser motivo de alegria do
público, gerando assim uma ansiedade por altas pontuações dos juízes.
Todavia, não necessariamente o corpo de jurados compartilhará de tal ânimo e
efusividade. Contudo, a questão aqui não se dá na aparente dicotomia entre
emoção (público) e razão (júri), mas sim em convenções ou hábitos que não
serão, necessariamente, de agrado de alguns mais conservadores quando
repaginados. Relembra-se o caso da ginasta olímpica brasileira Daiane dos
Santos e a polêmica da sua música e coreografia. Todos estavam
entusiasmados para presenciar a atleta já multi campeã apresentar em um
campeonato internacional oficial seu novo salto, o duplo twist carpado que
posteriormente recebeu seu nome “Dos Santos”. A atleta por sua vez trouxe a
música “Brasileirinho”, um famoso chorinho de Waldir Azevedo dessa vez
remixado com samba, batuques, sons de berimbau (instrumento tradicional da
capoeira), dentre outros componentes afro-brasileiros. Já na coreografia foi
onde se deu a maior questão polêmica. Daiane fez imenso uso de movimentos
de samba e danças afros com ritmos corpóreos mais agitados e vigorosos, de

35
forma que seus gestos se unissem à musica elencada. Inegavelmente pode-se
dizer que sua coreografia afastou-se do habitus (Bourdieu, 1996) do referido
esporte, que tem em sua essência histórica as coreografias e passos de ballet
(Gumbrecht, 2007). De fato críticas surgiram, no entanto não foram suficientes
para abafar ou sobrepujar os aplausos e ovações que se concretizaram com os
diversos títulos subsequentes da ginasta. O gosto de alguns mais ortodoxos
pode ter sido de certa forma afrontado (mesmo que não intencionalmente), mas
o ineditismo daquele ato gerou um momento estético singular e vanguardista.

O sexto fascínio, “jogos como epifanias”, também é interpretado como


uma bela jogada. Encaixa-se na situação de realizar, após uma epifania, uma
jogada com maestria dentro de uma realidade complexa contendo vários
fatores influenciadores (como adversários, tempo, posicionamento e afins).
Refletindo sobre o termo “epifania”, acredita-se que é um elemento que se
vincula à imaginação. Por sua vez, Kreft (2015) diz que a imaginação é uma
capacidade estética. Aqui, entende-se que é no desporto que a imaginação é
vislumbrada no desejo da forma, do movimento, da eficácia, da proeza, da
superação, da criatividade por meio do corpo. Poder-se-ia dizer que a
imaginação é a germinadora do que se chama aqui de uma valência estética,
algo nato, mas que por sua vez, assim tais como as valências físicas, podem
ser aprimoradas através das experiências de prática e estudo. Quando se
transporta a criatividade já maturada e amoldada ao universo do desporto,
contemplam-se fenômenos momentâneos ricos em essência estética, oriundos
de uma linha limiar entre o caos e a ordem. Por exemplo, ao se observar um
jogo de futebol, nota-se uma ordem técnica, tática e biológica dos jogadores
nesse coletivo. Ali buscam deter os avanços dos adversários e superar suas
defesas fazendo uso de força, velocidade, aprumo técnico, estratégias
previamente estudadas e afins. Todavia, há momentos em que o jogo recebe
uma profunda “benção da aleatoriedade”, o que de certa forma, recai nos ditos
de Caillois (1990) quando cita o elemento alea, deixando claro que o jogo tem
seus momentos que o “artífice do destino” toma para si aquele instante da
partida e é ali que em raros momentos se apresentam obras-primas do
universo desportivo. Um momento mínimo (porém nada insignificante) de caos

36
e surpresa dos espectadores e jogadores que quebra o padrão organizado e
esperado da ordem, gerando assim um momento estético. Importante dizer que
de forma alguma as valências físicas são aqui desprezadas. Ou mesmo, quem
sabe, haja ainda até um pouco de sorte. Contudo, entende-se que esse
momento estético nasceu do somatório das valências físicas do jogador, seu
aprumo técnico-táctico conquistado arduamente em treinamentos, com a
conjuntura situacional ali ocorrida e, claro, a áurea criatividade ali demonstrada.
De forma a vislumbrar de maneira histórica basta relembrar no futebol a
plasticidade do chute de ponta-cabeça hoje mundialmente conhecido como
“bicicleta” de Leônidas da Silva (o “Diamante Negro” da Copa do Mundo de
1938), os chutes certeiros de “bate-pronto” de Cristiano Ronaldo (melhor
jogador do mundo por vários anos), a astúcia dos dribles de Mané Garrincha
(considerado por muitos um dos maiores dribladores da história). Enfim, nesses
raros instantes estéticos, a criatividade se fez presente de forma cumeeira,
gerando surpresa aos olhos e vociferando da boca um “mantra estético”: “uau!”.

Por fim, o último e sétimo fascínio, “timing”, remete à percepção e uso


do tempo na situação crítica do desporto ou jogo em questão. Muitas vezes
também conhecido como to be in the zone ou “entrar na zona” (zona mental de
concentração profunda, porém ativo e alerta) onde o tempo parece andar mais
lento e a sensibilidade do atleta se demonstra mais aflorada. Um dos relatos
mais impressionantes sobre tal fascínio se deu quando o saudoso piloto
brasileiro Ayrton Senna realizava sua prova de classificação para o Grand Prix
de Mônaco em 1988, ano em que viria a sagrar-se campeão pela 1ª vez.
Naquele sábado de preparação para corrida de domingo, Senna não somente
conquistou a pole position, mas o fez com aproximadamente 1 segundo e meio
à frente do seu principal adversário, o então bicampeão (e posteriormente viria
ainda a ganhar mais dois títulos) o francês Alain Prost9. Importante dizer que
nas provas de Fórmula 1 tal diferença de tempo do 1º para o 2º colocado não
só era fora do normal mas também gritante para época. Acresce-se a isso o

9
Mais especificamente Senna fez 1’23:998, já Prost fez 1’25:425, uma diferença de 1:427 de
segundo.

37
fato do ocorrido se dar em Mônaco, onde muitos apontam ser uma das provas
mais difíceis (se não a mais difícil) do mundo automobilístico. Os técnicos da
McLaren (equipe em que Senna corria naquele ano) e da Honda (fabricante
dos motores da equipe na época) afirmaram ao piloto que em certo momento
da classificatória os computadores acusaram que Senna teria alcançado o
máximo de potência do carro gerando surpresa e espanto a todos. Contudo a
surpresa não teria se encerrado aí. Senna por sua vez, após ouvir o relato dos
técnicos, conta reservadamente aos seus companheiros de equipe e familiares
que em certo momento se sentiu em uma espécie de dimensão paralela, com
torpor físico, mas em alerta cognitivo, algo que nunca sentira antes, mas diz
ainda que teve uma sensação de aproximação com plano espiritual. Uma
espécie de experiência que deixara de ser imanente e passara a ser
transcendente.

Não obstante aos fascínios, talvez seja por conta da grande


capacidade expressiva humana que a estética seja em diversos momentos
confundida como algo exclusivo da arte. Monahan (2007) diz que o próprio
corpo humano (ferramenta primal do desporto) se torna o meio para a
expressão artística. Indo além, Lacerda (2002) adverte que quando o desporto
é contemplado em sua magnitude é possível ver os princípios estéticos de
forma cristalina. Evitando conceitos separatistas, Bento (2006, p.13) defende
que: “O desporto é uma arte, um artefato, uma invenção, para ajudar a fazer o
homem conforme a uma condição cultural e moral”. Ou seja, fazer seus atos e
ações belos para tornar seu íntimo belo também (Lacerda, 2002). Cunha e
Silva (2001) diz que na história do desporto e da arte ora o desporto começou a
ser instigado a se comportar como matéria artística, ora a arte foi instigada a se
comportar como desporto. No entanto, de forma significativa e pertinente,
Cunha e Silva (1999) e Lacerda (2002) contribuem para esta discussão
esclarecendo que o desporto ser arte ou não é algo menor ou mesmo
irrelevante, pois aos seus olhos seria uma discussão estéril. Todavia Cunha e
Silva (1999) esclarece também que é através do desporto, em conjunto com a
matéria e o imaginário artístico, que se é capaz de converter o corpo desportivo
em um objeto artístico, pois este inegavelmente terá uma verídica e inegável

38
intenção estética.

Importa lembrar que aquela discussão em torno do estatuto estético do


desporto em função da sua aproximação à arte, animou o debate entre os
estudiosos da estética do desporto nas últimas décadas do século XX, sendo
de mencionar a participação de Osterhoudt (1991) neste contexto, que
organizou em quatro domínios as diferentes posições dos vários autores,
designadamente: i) o desporto considerado como uma atividade com valor
estético e como uma forma de arte, ii) o desporto considerado como uma
atividade quase-artística e estética, iii) o desporto considerado como uma
atividade estética mas não artística, iv) o desporto considerado como uma
atividade que não é estética nem artística. Interessa ainda destacar o
importante contributo de Best (1988), alinhado com a posição que argumentava
sobre o valor estético do desporto de forma relativamente independente da sua
consideração como atividade artística, posição que muito influenciou o
desenvolvimento e consolidação da estética do desporto no espaço da filosofia
do desporto.

Indiscutivelmente, fazendo ou não parte do mesmo meio, o desporto e


a arte têm importância singular para a expressão da cultura humana, sendo
também sensíveis veículos da educação em valores (Murad, 2007), sendo
extensivo também as suas áreas de influência, como alertam Graça e Lacerda
(2012), pautando a educação física como um veículo de educação sobre tais
temáticas axiológicas.

Além disso, a perspectiva cultural faz avançar na educação


física a consideração de aspectos simbólicos, estimulando
estudos e reflexões sobre a estética, a beleza, a subjetividade,
a expressividade a relação com a arte, enfim, o significado
(Daolio, 2007, p.10).

É de suma importância salientar que não se tem aqui o interesse em


criar inúteis disputas sobre quem ou o que educa mais ética e esteticamente,
se o desporto ou a arte. Sabe-se que os dois têm sumo valor e autoridade
sobre o assunto.

39
2.3 Das metodologias aplicadas

Após a apresentação anterior dos elementos principais que constituem


o enquadramento teórico desta pesquisa doutoral, busca-se agora esclarecer
de forma mais detalhada o que Matos (2013, p. 55) nomeou de “plano de
investigação” empregado nos estudos publicados. Mais especificamente,
pontuam-se aqui metodologias, conceituações e possíveis variáveis dos
estudos (este último, mais especificamente, onde se inserem os procedimentos
de recolha de dados). Sobre a importância dos tópicos metodológicos em uma
pesquisa científica, Matos (2013, p. 17) esclarece que

As questões metodológicas fazem parte do conjunto geral de


questões levantadas no processo de investigação científica e
devem ser equacionadas no contexto de uma noção global de
ciência e do modo de "produzir" o conhecimento científico, que
afirma a autonomia de uma disciplina científica. Por sua vez, a
metodologia pode ser concebida como um conjunto de normas
orientadoras da investigação científica e situa-se ao nível das
diretrizes que definem a essência de uma disciplina, não se
subordinando a uma visão puramente tecnológica ou lógica,
que reduziria a investigação a um conjunto de procedimentos
lineares.

Como avanço primeiro de qualquer investigação, faz-se preciso o


clareamento do objeto ou mesmo do tema da pesquisa e análises (Queirós &
Graça, 2013). Dessa forma, é aqui estudado o Kung-Fu sob as lentes da
filosofia do desporto, mas especificamente da ética e da estética. Importante
dizer, desde o início, a proposta desta pesquisa doutoral sempre teve seu foco
nos ensinamentos teóricos e nas práticas perpetuadas na arte marcial chinesa
Kung-Fu, fazendo uso dos conceitos, reflexões e aforismos da ética e da
estética para constituição do processo de discussão acadêmica. Ou seja, a
falange da pesquisa tem como sua protagonista a arte marcial Kung-Fu que
atua no palco acadêmico das ciências do desporto, sob holofotes ético-
estéticos.

Dando prosseguimento ao decorrer do processo de planeamento e

40
estruturação da pesquisa, foi necessário decidir inicialmente a concepção
fundamental da metodologia de investigação que seria empregada. Estava
claro que a mesma se faria real sob a égide de uma pesquisa qualitativa, pois o
tipo de abordagem às questões educacionais, comportamentais e
socioculturais, buscava a interpretação e compreensão dos fenómenos. Sob
um prisma histórico, a pesquisa qualitativa foi largamente utilizada em áreas de
estudo do campo humano, como história, sociologia, antropologia e afins
(Goellner, et al., 2010). Hoje, faz-se também presente de maneira sólida no
campo das ciências do desporto. Para fins de esclarecimento, Thomas, Nelson
e Silverman (2007) afirmam que a pesquisa qualitativa é um método
sistemático de investigação que tem por hábito seguir o método científico de
solução de problemas. Indo além, afirmam ainda que é comum, muito embora
não necessariamente obrigatório, não haver hipóteses do estudo, mas sim o
uso de questões mais gerais como forma de guia para nortear o estudo. Assim,
a pesquisa progride em um processo de forma indutiva de desenvolvimento de
teorias e hipóteses à medida que os dados são adquiridos e interpretados. Por
fim, destacam: “O pesquisador é o instrumento primário da coleta e análise de
dados” (Thomas, Nelson & Silverman, 2007, p. 31). Por sua vez, Flick (2009)
aponta a pesquisa qualitativa como de fundamental importância para a
humanidade, ao que tange a complexidade e pluralidade das esferas da vida,
principalmente quando repousadas em campos mais subjetivos do que
objetivos. Por isso o autor diz que os aspectos essenciais da pesquisa
qualitativa se materializam

(...) na escolha adequada de métodos e teorias convenientes;


no reconhecimento e na análise de diferentes perspectivas; nas
reflexões dos pesquisadores a respeito de suas pesquisas
como parte do processo de produção de conhecimento; e na
variabilidade de abordagens e métodos (Flick, 2009, p. 23).

Ao que tange a compleição da pesquisa, decidiu-se que a mesma se


constituiria no formato escandinavo. Segundo Cyrino e Pimentel (2017), tal
modelo apresenta a totalidade da pesquisa de forma seccionada em mais de
um artigo ou capítulo de livro, refletindo assim uma “coleção de textos” sob um

41
tema maior. Os mesmos autores afirmam que habitualmente elenca-se o
modelo escandinavo em detrimento ao modelo clássico (ou tradicional) para
possibilitar uma maior produção científica com relação ao número de
publicações apresentando temas complementares.

Nesta pesquisa doutoral o modelo escandinavo foi adotado não por


haver preocupação em aumentar número de publicações. De fato, almejou-se
sim receber, ouvir, ajuizar e incorporar ponderações e reflexões de colegas do
meio da pesquisa em eventos acadêmicos e em periódicos científicos, aonde
paulatinamente os artigos doutorais iam sendo apresentados e publicados no
decorrer dos anos. Dessa forma, a pesquisa de maneira geral ganhou maior
visibilidade, cooperação e aceitação coletiva.

Sob um prisma organizacional, os estudos foram estruturados em 4


publicações distintas. Mais especificamente, foram 3 estudos teóricos e 1
estudo empírico. O primeiro estudo se constituiu em uma revisão sistemática
como forma de recolher artigos e proporcionar mapear o estado da arte nos
domínios da ética e da estética no Kung-Fu. No segundo estudo foi realizada
uma revisão de literatura complementar e traduções documentais para abarcar
informações oriundas do código de ética marcial do Kung-Fu (Wude). Já no
terceiro estudo foram revistos, reinterpretados e categorizados importantes
conceitos do universo marcial à luz da ética e da estética, fazendo inclusive uso
de observações hermenêuticas sobre ideogramas chineses que se fazem
fulcrais à temática. Por fim, o quarto estudo trouxe a narrativa de consagrados
Mestres de Kung-Fu em âmbito mundial para então aludir sobre a presença de
ensinamentos e atitudes educacionais imersas em valores éticos e estéticos na
referida arte marcial.

Sobre a revisão sistemática, Medina e Pailaquilén (2010) afirmam ser


uma metodologia cada vez mais utilizada no campo da saúde (área essa que
também abarca as ciências do desporto). Batista e Cunha (2013, p.69) aludem
que o ato de organizar sistematicamente os dados e evidências dos
documentos e escritos sobre uma determinada temática é indubitavelmente
uma importante forma de auxiliar o meio acadêmico a “(...) compreender o

42
modo como diferentes partes de um campo de pesquisa se podem interligar,
conduzindo, assim, a um entendimento mais global e articulado, pela
configuração das diferentes partes que perfazem o todo”. Assim, o
conhecimento passa a ser mais acessível e confraternizado, tornando-o mais
maduro e desenvolvido, tanto em âmbito teórico quanto prático. Importante
dizer, que não se tem aqui o intuito de descredenciar a relevância da revisão
de literatura mais tradicional (ou revisão narrativa) tais quais seus contributos
na história da pesquisa humana. Todavia, vem-se aqui destacar outra
possibilidade de execução de revisão de literatura, nomeadamente revisão
sistemática, que apresenta um maior rigor metodológico comparativamente e
que, por sua vez, pode elevar a fiabilidade do estudo (Gomes & Caminha,
2014) contribuindo ainda com sínteses e não somente levantamento de
literatura disponível (Medina & Pailaquilén, 2010). Indo além e
complementando o pensamento anterior, Sampaio e Mancini (2007) defendem
que a revisão sistemática norteia o desenvolvimento de pesquisas sobre uma
temática conglomerando estudos diversos, tornando-se um recurso importante
perante o crescimento acelerado da informação científica, ajudando a sintetizar
evidências disponíveis na literatura mesmo que escassas. Mais: seus
resultados passam a ser significativas referências para estudos futuros sobre
as temáticas abordadas.

A revisão sistemática que integra esta pesquisa doutoral é classificada


como de natureza qualitativa (ou metassíntese), como esclarecido por
Hoefelmann, Santos e Moretti-Pires (2012, p. 401), pois segundo eles: “Quando
as revisões agrupam resultados de outros estudos, porém não aplicam análise
estatística de modo global, são chamadas de revisões sistemáticas
qualitativas”. Assim, tais revisões objetivam primordialmente valorizar tanto as
paridades e similitudes quanto distinções relevantes entre os textos e dados
das pesquisas já concretizadas, expandindo as possibilidades de
(re)interpretação e reflexão dos resultados.

Dando prosseguimento aos métodos utilizados, esta pesquisa doutoral


já sabidamente elencou como campo de investigação o Kung-Fu (prática

43
milenar chinesa tida como símbolo da cultura sino). Sendo assim, foi
necessária uma imersão em aspectos e elementos culturais chineses mais
profundos. Nesse tocante, foram abordadas questões históricas, filosóficas,
socioantropológicas, contudo, a linguagem e escrita se faziam altamente
relevantes para as discussões e reflexões objetivadas. Destarte, foi realizada
uma interpretação hermenêutica de alguns ideogramas caros ao tema em
questão. Para Ricoeur (1989), autor ícone sobre a interpretação de narrativas,
a hermenêutica é um significativo caminho metodológico para o entendimento
mais profundo da literacia de fontes teóricas, tanto obras acadêmicas quanto
da poesia. Silva (2011) complementa que a hermenêutica é ainda um
instrumento e mesmo um guia para a compreensão de discursos de cunho
filosófico, político, pedagógico, dentre outros campos. Por tais razões, a
hermenêutica empregada de forma a ser instrumento de compreensão do
discurso ou da ação, torna-se um laço de compreensão com o “espírito
mimético ou alegórico” que um texto pode carregar. Por isso, Silva (2011, p.
20) afirma que “toda obra tem caráter simbólico, seja um discurso (uma
linguagem) ou uma palavra, e necessita da mediação simbólica do mito, da
poesia ou do símbolo”. E exatamente por conta de possíveis subjetividades
encontradas na linguagem humana (escritas, faladas, ilustradas e afins), tanto
Schmidt (2012) quanto Stein (2010), dois relevantes nomes no estudo
hermenêutico, são verticalmente categóricos quando descrevem a
hermenêutica como uma busca genuína pela mais pura interpretação do
sentido expressado na linguagem.

Um instrumento de pesquisa que também foi utilizado nesta tese


doutoral para a coleta de dados foi a entrevista. É dito por Thomas, Nelson e
Silverman (2007) que a entrevista em uma pesquisa qualitativa é talvez o
instrumento de coleta de dados mais usual no meio acadêmico, podendo ser
realizada individualmente (pessoa a pessoa), em grupos ou grupos-focais. Não
obstante, pontuam ainda o nível de estruturação de uma entrevista, onde é
possível se dar a entrevista fechada, altamente estruturada, em um extremo, à
entrevista aberta em formato de conversa em um tom mais informal, em outro
extremo. Muito embora, Bauer e Gaskell (2007) alertam que essa dicotomia

44
não se faz uma verdade única, havendo uma posição intermédia nesse
espectro, onde destacam a chamada entrevista semiestruturada 10, onde o
entrevistador segue seu guião (ou roteiro) de entrevista, mas a qualquer
instante pode tomar novos rumos desde que isso proporcione um melhor
andamento e coleta de dados da pesquisa. Evidentemente, a seleção do
modus operandi da entrevista também irá variar de acordo com o objetivo da
investigação em questão (Queirós & Lacerda, 2013). Por fim, tanto Thomas,
Nelson e Silverman (2007) quanto Queirós e Lacerda (2013) apontam que
mesmo que o entrevistador faça as mesmas perguntas aos entrevistados
participantes da pesquisa, não é raro haver variação da ordem, das palavras
exatas utilizadas nos questionamentos ou até do tipo de questões abordadas
pelo entrevistador. Logo, se faz cristalino que os baixos ou altos predicados
dos dados obtidos em uma entrevista de pesquisa qualitativa são altamente
dependentes da qualidade do desempenho do entrevistador. Segundo Queirós
e Lacerda (2013), as entrevistas qualitativas têm o poder de proporcionar
aberturas e caminhos aos investigadores, para assim acederem aos
pensamentos, opiniões, preocupações, ansiedades e valores dos
entrevistados, muito embora alertem também que tal método tem suas
limitações ao que tange o quesito prático, pois podem tocar em assuntos mais
sensíveis e caros aos entrevistados. As autoras ainda continuam a destacar
outra categorização de entrevista. Primeiro pontuam haver a entrevista clínica,
utilizada para diagnósticos em geral. Em segundo, citam a entrevista de
recrutamento que é comum para seleções diversas. Enfim, aludem sobre a
entrevista de investigação, que se perfaz “(...) um desejo de conhecimento e
por isso é uma entrevista orientada para a informação. O saber teórico do
investigador ocupa o pano de fundo da prática da entrevista e delimita o campo
de pesquisa” (Queirós & Lacerda, 2013, p. 183).

Mais especificamente sobre as escolhas feitas para a execução desta


pesquisa, decidiu-se realizar três entrevistas semiestruturadas individuais e em
10
Queirós e Lacerda (2013) também pontuam tais classificações estruturais, todavia utilizam as
expressões “diretiva” ou “estandardizada” (entrevista fechada), “semidiretiva” (entrevista
semiestruturada) e “não diretiva” (entrevista aberta).

45
profundidade para o levantamento das informações qualitativas, onde, assim, o
entrevistador pôde questionar focado objetivamente no tema principal da
pesquisa e permitiu que os entrevistados respondessem de maneira não tão
formal, algo mais livre e espontâneo (Alves-Mazzotti & Gewandsznajder, 2002),
possibilitando ainda “explorações não previstas, oferecendo liberdade ao
entrevistado para dissertar sobre o tema ou abordar aspectos que sejam
relevantes sobre o que pensa” (Negrine, 1999, p.74). Sobre o contexto de
participação, optou-se em realizar as entrevistas com apenas três participantes.
De fato, aparenta ao primeiro olhar configurar-se como um número baixo de
participantes, entretanto, tais participantes são sagrados como membros do
mais elevado patamar hierárquico dentro do Kung-Fu (Mestres/Grão-Mestre) e
que ainda capitaneiam estilos tradicionais largamente difundidos em âmbito
internacional. Dessa forma, planeou-se ter extrema profundidade e riqueza
informativa oriunda de membros que estão em posições cumeeiras,
objetivando alta relevância e credibilidade nos discursos produzidos e na
informação recolhida. As entrevistas ocorreram entre novembro de 2017 e
outubro de 2018. Procedimentalmente, uma entrevista se deu presencialmente
(sendo gravada por áudio) e duas entrevistas se deram via videoconferência
(sendo gravadas por áudio e vídeo), onde se deixou os participantes falarem
sem maiores interrupções, pois, como já foi referido por Queirós e Lacerda
(2013, p. 194): “Constitui um mau hábito os entrevistadores interromperem e
desviarem a conversa muitas vezes, já que num projeto de entrevista
qualitativa a informação é cumulativa, isto é, cada entrevista determina e liga-
se à seguinte”. Seguindo os alertas de Thomas, Nelson e Silverman (2007) e
Queirós e Lacerda (2013), todas as entrevistas foram realizadas em locais
considerados pelos entrevistados de ambiente cordial, para estimular respostas
francas e verdadeiras em seu inteiro teor, sem intimidar os participantes.

As preocupações com os critérios éticos de uma pesquisa, incluindo a


execução de entrevistas, tem sido alvo de muitos debates pela comunidade
acadêmica e científica (Goellner, et al., 2010). Almejando aqui atender aos
critérios éticos metodológicos de forma elevada não somente durante a
execução das entrevistas, mas também após as mesmas, efetuou-se por fim a

46
“checagem pelos participantes”, prática que repousa nos princípios éticos da
pesquisa e que consiste em transcrever tudo que foi dito e observado na
entrevista (de maneira integral) e devolver aos entrevistados para sua
corroboração e aprovação, proporcionando consequentemente maior
credibilidade nos dados adquiridos nas entrevistas (Negrine, 1999; Alves-
Mazzotti & Gewandsznadjer, 2002).

Finalmente, para identificar, descrever e interpretar a informação


recolhida nas entrevistas, optou-se pelo uso da análise de conteúdo (Bardin,
2004). De maneira conceitual, Vala (1986, p.107) diz que "(...) a análise de
conteúdo é uma técnica que pode incidir sobre material não-estruturado". De
maneira mais alargada, Queirós e Graça (2013) destacam a análise de
conteúdo como um método de análise de mensagens diversas, sejam elas
escritas, verbais ou mesmo visuais (incluindo mapas, imagens, sons, símbolos,
números e obras artísticas). Já Bardin (2004, p. 344), talvez o maior nome
mundial sobre a temática, enuncia a análise de conteúdo como:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando


obter por procedimentos sistemáticos objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens indicadores (qualitativos ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições
de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

Enfim, a autora deixa claro que não se trata de um único instrumento


metodológico, mas sim de um apanhado de formas de avaliação do campo das
comunicações, que circunscreve outras práticas que têm a ação de explicar e
mesmo sistematizar mensagens e expressões e que mesmo trazendo
informações parciais agregam dados uma à outra de forma complementar.
Sendo assim, a análise do conteúdo se faz um meio vantajoso de trabalho com
entrevistas, questionários, correspondências e mensagens, sendo este um dos
motivos de sua colaboração principalmente nos campos da história, psicologia,
jornalismo, sociologia e semiologia. De forma objetiva, Queirós e Graça (2013)
elucidam que a análise de conteúdo em seu uso prático recai sobre dois
pontos, o primeiro com função heurística de natureza exploratória objetivando a

47
descoberta e o segundo com função comprobatória de natureza administrativa
dos dados e provas objetivando a corroboração de informações. Contudo, os
autores alertam que dentro do universo da investigação científica social e do
tratamento de dados, há a necessidade de ter em mente que apesar de
algumas aproximações e similaridades, o conceito de análise de conteúdo não
é uma tautologia para com outras expressões e conceitos, como linguística,
análise linguística, análise documental ou análise do discurso. Outrossim,
afirmam que “a finalidade da análise de conteúdo é pois efetuar inferência, com
base numa lógica explicitada, sobre as mensagens cujas características vão
ser inventariadas e sistematizadas, no fundo desocultar um pensamento”
(Queirós & Graça, 2013, p. 121). Por fim, os autores aludem ainda sobre os
modos indutivo e dedutivo da execução da análise de conteúdo. Ao salientar o
modo indutivo ressaltam que não se fazem presentes ideias teóricas ou
hipóteses ao início do estudo, afirmando que as considerações conceituais são
advindas e relacionadas com os dados adquiridos do tema estudado, sem
partir também de categorias analíticas predefinidas. Por outro viés, o modo
dedutivo é comumente utilizado quando a análise que é executada já possui
conhecimento prévio em um modelo pré-estabelecido, fazendo-se um modo
valioso para testar teorias ou ainda quando já existente um quadro conceitual.
Ou seja, entende-se que no modo indutivo, os processos de construção e
criação de categorizações habitualmente se dão a posteriori do seu início. Os
estudos desta tese doutoral se classificam no espectro do modo indutivo, tendo
sido construídos e direcionados com os resultados paulatinamente encontrados
no decorrer da pesquisa.

48
3. Estudos Teóricos – Estudo I

_______________________________________________________________

Mocarzel, R.; Queirós, P. & Lacerda, T. (2020). Valores ético e estético do


Kung-Fu – uma revisão sistemática. Motrivivência, 32(62), 01-21.

49
Resumo

O Kung-Fu é uma arte marcial chinesa milenar e mundialmente conhecido por


seus princípios de ensino à ética e estética, destacando-se com uma profunda
singularidade filosófica vertida em valores. Neste estudo qualitativo realizou-se
uma revisão sistemática objetivando identificar a literatura sobre a importância
da ética e da estética no contexto do valor educativo do Kung-Fu. Encontraram-
se 36 artigos e quase todos abordam a ética e estética de maneira genérica e
abstrata. Só quatro eram em língua portuguesa. Muitos citam a ética e estética
como aspectos educativos filosóficos históricos, mas não abordam essas
temáticas quando adentram em competições desportivas.

Palavras-chave: Kung-fu; Ética; Estética; Revisão sistemática; Filosofia do


esporte

Introdução

As práticas desportivas são das manifestações humanas mais antigas de


que há registro na história da humanidade, tendo integrado várias culturas de
povos ao redor do globo e em períodos de tempo diferentes, como os egípcios,
os gregos, os maias e os chineses (MANDELL, 1986; TUBINO, 1987).
Progressivamente, foram incorporadas às estruturas sociais das épocas
vigentes, adaptando-se aos costumes e necessidades dos povos através dos
séculos. Hoje, as práticas desportivas são perpetuadas e difundidas como
nunca na história humana, superando pacientemente diversos conflitos sociais,
políticos, bélicos, econômicos e religiosos. É sob essa guisa que Bento e Bento
(2014, p.51) esclarecem sobre o desporto que este categórica e
“Essencialmente pertence ao domínio do simbólico e ‘artístico’: cumpre
objetivos educativos, sociais, filosóficos e culturais, éticos, estéticos e morais.
Serve o processo civilizador, isto é, visa melhorar o índice de civilização”.
Assim, há tempos o desporto passa a ser inscrito como um meio
educativo para a transmissão axiológica, ou seja, uma educação de valores
(PATRICIO, 1993; BENTO, 1995; RUBIO, 2002). Dentre tais valores destacam-
se aqui a ética e a estética, tidos como dois dos pilares do pensamento
filosófico e educacional. A ética (considerando todas as suas possibilidades de
extensão) talvez seja uma das temáticas mais discutidas, mesmo que
informalmente, no século XXI. A busca por um comportamento ético coletivo (e
não somente individual) nas diversas esferas da sociedade humana é algo
desejado por praticamente todos. A base da educação de uma cultura é
permeada desses princípios éticos e morais (KANT, 1996), sendo útil ainda
para a busca do bem e a preservação da civilização (RIBEIRO; ZANCANARO,
2011). Já a estética anda de mãos dadas à ética e busca seu nome no sentir,
na emoção, na experiência que aflora o prazer sensível (PERNIOLA, 1998),
sendo ainda esclarecido por Townsend (1997, p.10) que “A estética nasce da
tentativa de explicitar o papel que as sensações e as emoções desempenham
no pensamento humano”.

50
No universo desportivo, as artes marciais são popularmente
reconhecidas como práticas disciplinadoras e educativas, exigindo não só
dedicação no treino físico, mas ainda respeito e zelo no comportamento diário
para consigo mesmo e para com o próximo (LIMA, 2000; IEDWAB,
STANDEFER, 2001; MOCARZEL, COLUMÁ, 2015). Antes mais difundidas no
Oriente, hoje as artes marciais são propagadas mundo afora incluindo o
Ocidente. Dentre as artes marciais mais antigas e tradicionais destaca-se aqui
o Wushu, arte marcial chinesa mundialmente conhecida como Kung-Fu.
O Kung-Fu é uma arte marcial chinesa com registros datados de mais de
dois milênios antes de Cristo, correspondendo a um dos mais antigos métodos
de autodefesa da humanidade (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007;
MOCARZEL, 2011). Ao decorrer dos tempos, o Kung-Fu foi absorvendo e
enriqueceu seu conteúdo com diversos componentes da cultura chinesa,
conglomerando elementos históricos, marciais, terapêuticos, folclóricos e
filosóficos (LIMA, 2000; APOLLONI, 2004; ACEVEDO; GUTIÉRREZ; CHEUNG,
2011; MOCARZEL, 2011; CARNEIRO, 2013).
Ao que tange a compleição filosófica do Kung-Fu, pode-se afirmar que
boa parte de sua natureza adveio de influência direta de pensamentos taoístas
e confucionistas, filosofias extremamente presentes na história da China antiga
e que ajudaram a alicerçar princípios da medicina tradicional chinesa ou MTC
(MOCARZEL; COLUMÁ, 2015) e do budismo (APOLLONI, 2004; ILUNDÁIN-
AGURRUZA, 2014). Tais influências também se fazem sentir no valor
educativo do Kung-Fu, como pacifismo, harmonia, virtude e etocracia –
princípio que prega os superiores serem exemplo vivo aos seus subordinados
(MURAD, 2009).
Ao observar o Kung-Fu sob um espectro mais amplo, o mesmo não é
visto tão somente como um método de autodefesa, mas como prática de
transmissão de valores educacionais e que direciona seus praticantes até
mesmo para uma trajetória de busca espiritual e perpétua, em prol de uma
evolução do próprio ser (BÄCK; KIM, 1979; ALLEN, 2013). Tal fato é o que faz
o Kung-Fu ser reconhecido como arte marcial, pois este conceito denota
técnicas marciais que por sua vez são alicerçadas em princípios educacionais
sólidos e massivos, que pregam harmonia, qualidade de vida, mas acima de
tudo o pacifismo por seus praticantes (MOCARZEL; COLUMÁ, 2015). Dando
maior suporte a esse entendimento, Ilundáin-Agurruza (2014, p.464) traz sua
reflexão sobre o referido conceito, destacando que o mesmo está imerso em
valores, principalmente éticos e estéticos: “Estes caminhos [artes marciais] são
formas práticas e normativas notáveis que dão ética, estética e princípios
existenciais e valores”11.
Faz-se importante o seguinte esclarecimento. O entendimento ocidental
sobre a ética é maioritariamente convergido em seus primórdios principalmente
a Platão e Aristóteles, filósofos gregos que viveram no período clássico da
Grécia Antiga no século V a.C.; período esse extremamente próximo a
Confúcio, filósofo ícone do pensamento antigo chinês e oriental que viveu
poucas décadas antes na China antiga. Os aforismos e reflexões dos três
filósofos aqui citados bebem de fontes humanistas, onde enaltecem a virtude,
11
Tradução nossa.

51
uma meta a ser almejada pelo indivíduo. Contudo, Confúcio se posta de
maneira mais holística que seus colegas gregos. Enquanto Platão contemplava
mais o imaterial e Aristóteles mais o material, Confúcio se posicionava em um
patamar intermédio, afirmando que a busca pela harmonia e felicidade deveria
ser encontrada no equilíbrio da saúde e paz física, mental e espiritual e que
assim se perfazia o Tao – caminho de harmonia com o todo (BUENO, 2005) e
algo objetivado por praticantes de Kung-Fu.
Já numa visão contemporânea, a ética também tem sido utilizada como
lente temática para estudos sobre o universo da atividade física. Segundo
Meinberg (1990), a atividade física tornou-se popularmente um meio de buscar
uma “juventude prolongada”, todavia alerta que nem todas as formas práticas
de atividade física e do desporto são benéficas à saúde, pois limites podem ser
ultrapassados levando a mazelas e sequelas aos praticantes. Logo, constitui-se
assim um interessante e atual campo de estudo da ética. Reconhece-se que a
promoção da saúde do corpo e de sua beleza estético-cosmética sejam valores
e que devem ser levados em consideração. Todavia, as principais
preocupações de uma educação ético-estética vão para muito além da matéria
ou mesmo da carne, buscando assim servir ao desenvolvimento da natureza
humana em sua plenitude pura (ABE, 1986). É nessa guisa educativa filosófica
que nas artes marciais se constitui o Homo Disciplinatus (MOCARZEL;
MURAD, 2012).
Curiosamente, mesmo o Kung-Fu já sendo uma arte marcial milenar e
ser praticado mundo afora, apresenta no Ocidente poucas referências
bibliográficas que explanem de forma detalhada e profunda seus fundamentos
filosóficos, principalmente a ética e a estética. Tal fato agrava-se quando em
idioma português (MOCARZEL; QUEIRÓS; LACERDA, 2016). Boa parte dessa
carência se respalda em motivos histórico-culturais, onde Lima (2000) aponta
dois dos principais obstáculos que atrapalham o desenvolvimento de estudos
mais profundos sobre esse tema. O primeiro mais distante, onde ocorriam
ordens de destruição de registros culturais e documentais do povo vencido em
batalha. O segundo cita a subjetividade cultural chinesa, rica em metáforas,
filosofias, linguagens, dialetos, com ideogramas que podem ser traduzidos de
diferentes formas. Por tais problemáticas, a transmissão oral passou a ser
valorizada como forma de comunicação e perpetuação da informação na
cultura chinesa (GRANET, 1997), tornando escritos de fontes confiáveis mais
incomuns. No universo marcial, Ferreira (2005) diz que a transmissão oral
tornou-se comum, sendo o ato de falar a verdade uma demonstração de
nobreza e honradez. Contudo, não se pode deixar de ter o pensamento crítico,
pois a relação “mestre-discípulo” é passível de falha tratando-se de uma
comunicação entre seres humanos; ou seja, seres imperfeitos providos de ego,
podendo manifestar arrogância, soberba e vaidade, para além de equívocos e
desconhecimento de assuntos. Nesse entendimento, Luc Ferry (1997) já
alertava não ser incomum o narcisismo (mesmo velado) sobrepor-se à ética.
Traz-se também que o ego humano alimenta emoções tidas por filósofos
como menores e inferiores, ferindo valores éticos e estéticos. Apesar do termo
“estética” só ter sido cunhado por Alexander Baumgarten em 1750
(HERMANN, 2005), seu entendimento de busca da perfeição, dedicação
genuína e zelo já eram enaltecidos séculos antes de Cristo. Os gregos em

52
busca da Paidéia (NÓVOA, 1991) e povos orientais em busca da
transcendência e iluminação (LIMA, 2000; ALLEN, 2013). Cada um ao seu
modo, objetivando a aproximação do divino. Mais: soma-se a isso um famoso e
profundo lamento de Confúcio onde disse não ter visto alguém que ame a
virtude tanto quanto a beleza do corpo. Logo, demonstra-se aqui que a tensão
entre virtude e vício está inscrita na “matriz humana”, sendo comum a todos os
períodos da humanidade e locais do globo.
É importante aprofundar esta temática à luz do conhecimento produzido
nas últimas décadas, pelo que se torna necessário identificar, analisar e
compreender o aporte que a literatura (desde os anos de 1990 até dias atuais)
traz relativamente ao valor educativo do Kung-Fu. Neste sentido, o objetivo
deste estudo foi analisar os trabalhos publicados que incidem sobre os valores
éticos e estéticos no contexto do Kung-Fu, sinalizando o seu potencial
educativo. De forma específica, buscou-se destacar por meio das pesquisas
encontradas como e em que proporções surgem enunciados que convocam o
domínio da ética e da estética, convergindo para o valor educativo do Kung-Fu.
Justifica-se este estudo sob a argumentação que a maioria das
pesquisas em português no campo das artes marciais não recai sobre a
filosofia do desporto – que conglomera a ética e estética. Fato que se agrava
quando convergido ao Kung-Fu pela carência em referências (CORREIA;
FRANCHINI, 2010). Especificamente a estética ainda aparenta ser mais
esquecida mesmo em um campo de pesquisa mais abrangente como o da
educação física e desportos, supostamente a área mais indicada para
pesquisas nas artes marciais (GRAÇA; LACERDA, 2012). Assim, espera-se
que este estudo traga colaborações aos meios acadêmicos, desportivos e
marciais, enriquecendo o entendimento da ética e estética no Kung-Fu.

Método

Este estudo é de natureza qualitativa e ainda sim se buscou não


desprezar alguns dados quantitativos, que colaboraram com o enriquecimento
de informações (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2007).
Fez-se uso da revisão sistemática na vertente qualitativa (GOMES;
CAMINHA, 2014). Tal método foi selecionado, pois Sampaio e Mancini (2007)
defendem que a revisão sistemática norteia o desenvolvimento de pesquisas
sobre uma temática conglomerando estudos diversos, tornando-se um recurso
importante perante o crescimento acelerado da informação científica, ajudando
a sintetizar evidências disponíveis na literatura mesmo que escassas. Mais;
seus resultados passam a ser significativas referências para estudos futuros
sobre as temáticas abordadas. Assim, realizou-se uma busca de estudos
acadêmicos em bases de dados por meio do motor de busca “Descoberta” 12,
que faz uso das bases de dados Scopus, Ebsco, Web of Science (antiga Web
of Knowledge), Pubmed e B-on.
Decidiu-se realizar a pesquisa para recolher estudos que atuassem
amplamente sobre o Kung-Fu e especificamente explorassem suas questões
12
Disponível em: http://eds.b.ebscohost.com/eds/search/basic?vid=0&sid=199386ad-42f2-
4e28-93b9-b6808a6faf45%40pdc-v-sessmgr01.

53
éticas e estéticas. Dessa forma, foram efetuadas algumas buscas como ponto
de partida do estudo fazendo uso das seguintes palavras-chave (em português,
inglês e espanhol): "kung-fu" ou “kungfu” ou "kung fu" ou "wushu” e “estética” e
“ética”, tendo as variações da escrita do nome da referida arte marcial sido
alicerçadas pela pesquisa de Pérez-Gutiérrez, Gutiérrez-García e Escobar-
Molina (2011). Inesperadamente, resultados emergiram de maneira muito
discrepante e alternante, demonstrando muito ruído e excessos. Contudo,
tendo retirado as expressões “estética” e “ética” e refazendo a pesquisa
durante os primeiros dez dias de janeiro de 2018, objetivando, de tal modo,
observar uma constância de resultados homogêneos, os números que surgiram
foram concisos.
Dessa forma, a revisão sistemática foi realizada em etapas. Inicialmente,
o uso do motor de busca foi concretizado no mês de janeiro de 2018.
Elencaram-se as seguintes palavras: "kung-fu" ou “kungfu” ou "kung fu" ou
"wushu”. Determinou-se os campos de pesquisa nas áreas disciplinares de
“Antropologia”, “Artes Dramáticas e Teatro”, “Educação”, “Estudos Culturais
Étnicos”, “Cinema”, “Saúde e Medicina”, “História”, “Ciência e História Militar”,
“Nutrição e Dietética”, “Psicologia”, “Religião e Filosofia”, “Ciências Sociais e
Humanas”, “Sociologia”, “Esporte e Lazer”, “Medicina Esportiva”. Na primeira
etapa analisaram-se títulos, resumos e palavras-chave das publicações
encontradas tendo como expansores assuntos equivalentes e pesquisas
também no texto completo dos artigos. Como limitadores da pesquisa, definiu-
se a procura de textos completos nos idiomas português, inglês e espanhol,
que tenham sido publicados em periódicos com a avaliação de especialistas.
Não foi determinado qualquer período temporal.
Como segunda etapa, verificou-se cada um dos textos recolhidos,
retirando documentos destoantes da temática e parâmetros relatados que
porventura tenham transpassado os filtros selecionados, assim como textos
duplicados.
Por fim, como terceira e última etapa, efetuou-se a leitura completa dos
textos de todos os artigos para que de maneira mais segura fosse possível
trazer à luz através da análise de conteúdo de Bardin (2004) os trabalhos que
ao menos minimamente abordassem de forma mais específica questões éticas
e/ou estéticas do Kung-Fu, citando, por exemplo: superação, aprimoramento,
beleza, zelo, respeito, virtude, paz, socialização, harmonia e afins.

Resultados E Discussão

Inicialmente os resultados acusavam 392 artigos. Após a aplicação de


todos os critérios iniciais de inclusão e exclusão da pesquisa obteve-se o
resultado de 36 artigos. Estes são aqui expostos em ordem alfabética pelos
títulos dos estudos, pontuando seus autores e nomes das revistas com os anos
de publicação.

54
Quadro 1 – Síntese dos artigos encontrados ordenados por ano de publicação.
TÍTULO DOS ESTUDOS AUTOR(ES) REVISTA (ANO)
A history of physical activity, Domhnall MacAuley Journal of the Royal Society of
health and medicine Medicine (1994)
Kung Fu fighting - The cultural Ashley Carruthers The Australian Journal of
pedagogy of the body in the Anthropology (1998)
Vovinam Overseas Vietnamese
Martial Arts School
Kung fu: negotiating Siu Leung Li Cultural Studies (2001)
Nationalism and modernity
Muslim Martial Arts in China: Helena Hallenberg Journal of Muslim Minority
Tangping (Washing Cans) and Affairs (2002)
Self-defense
Crouching Tiger, Hidden John R. Eperjesi Asian Studies Review (2004)
Dragon: Kung Fu Diplomacy
and the Dream of Cultural
China
Martial arts – enactment of Viqui Rosenberg e Carlos Psychodynamic Practice (2005)
aggression or integrative Sapochnik
space?
Virtual bodies, flying objects: Vivian Lee Journal of Chinese Cinemas
the digital imaginary in (2006)
contemporary martial arts films
Goal profiles, mental toughness Garry Kuan e Jolly Roy Journal of Sports Science and
and its influence on Medicine (2007)
performance outcomes among
Wushu athletes
‘To Push the Actor-Training to Frank Camilleri Contemporary Theatre Review
its Extreme’: Training Process (2008)
in Ingemar Lindh's Practice of
Collective Improvisation
Health benefits of Kung Fu: A Tracey Wai Man Tsang, Journal of Sports Sciences
systematic review Michael Kohn, Chin Moi Chow (2008)
e Maria Fiatarone Singh
A randomized placebo-exercise Tracey W. Tsang, Michael Journal of Sports Science and
controlled trial of Kung Fu Kohn, Chin Moi Chow e Medicine (2009)
training for improvements in Fiatarone Singh M.
body composition in
overweight/obese adolescents:
the “Martial Fitness” study
Being Aggressive: An Roly Fletcher e Martin Milton Existential Analysis: Journal of
interpretative phenomenological the Society for Existential
analysis of kung fu Analysis (2009)
practitioners’ experience of
aggression
Literatura Wushia, Budismo, José Otávio Aguiar Antíteses (2009)
marcialidade e ascese - da arte
da guerra à historiografia sobre
o mosteiro de Shaolin
‘It can be a religion if you want’ George Jennings, David Brown Ethnography (2010)
- Wing Chun Kung Fu as a e Andrew C. Sparkes
secular religion
Effects of martial arts on health Bin Bu, Han Haijun, Liu Yong, Journal of Evidence-Based
status – a systematic review Zhang Chaohui, Yang Xiaoyuan Medicine (2010)
e Maria Fiatarone Singh
An Obsessive’s Guide to Tea Alexis Littlefield Southeast Review of Asian

55
Obsession Studies (2011)
Illustration of Cultural Attributes Shiliang Yan Asian Social Science (2011)
in China Wushu Routine
Os primórdios da prática do wu- Tiago Oviedo Frosi, Wagner Revista da Educação
shu / kung fu em Porto Alegre, Maidana e Janice Zarpellon Física/UEM (2011)
Rio Grande do Sul (décadas de Mazo
1970-1990)
Walk in Balance: Training Crisis Brian A. Chopko Journal of Creativity in Mental
Intervention Team Police Health (2011)
Officers as Compassionate
Warriors
Wushu's Transformation from Zheng Shuai Journal of Asian Martial Arts
the Local Boxing Ring to the (2011)
World Stage
Chinese wushu texts: function Yongzhou Luo Perspectives: Studies in
and translation Translatology (2012)
Contribution to the study of Aleksandar Filipović e Srećko Physical Culture (2012)
religious and philosophical Jovanović
basis of the far east martial arts
Don’t think, feel: Mediatization Mie Hiramoto Language & Communication
of Chinese masculinities (2012)
through martial arts films
Traditional Asian martial arts Marc Theeboom, Zhu Dong e Archives of Budo (2012)
and youth: Experiences of Jikkemien Vertonghen
young Chinese wushu athletes
Self-Perception and Attitude Tracey W. Tsang, Michael R. Research in Sports Medicine
Toward Physical Activity in Kohn, Chin Moi Chow e Maria (2013)
Overweight / Obese Fiatarone Singh
Adolescents: The “Martial
Fitness” Study
The Martial Arts and Buddhist Graham Priest Royal Institute of Philosophy
Philosophy Supplement (2013)
I Am the Invincible Sword Mie Hiramoto e Cherise Shi Societies (2014)
Goddess: Mediatization of Ling Teo
Chinese Gender Ideology
through Female Kung-Fu
Practitioners in Films
Projecting the ‘Chineseness’: Lu Zhouxiang, Qi Zhang e Fan The International Journal of the
Nationalism, Identity and Hong History of Sport (2014)
Chinese Martial Arts Films
Tai Ji Quan: An overview of its Yucheng Guo, Pixiang Qiu e Journal of Sport and Health
history, health benefits, and Taoguang Liu Science (2014)
cultural value
Transmitting Health George Jennings Societies (2014)
Philosophies through the
Traditionalist Chinese Martial
Arts in the UK
A comparison of spectators’ Paweł Zembura IDO MOVEMENT FOR
motives at Wushu and amateur CULTURE. Journal of Martial
mixed martial arts events in Arts Anthropology (2015)
Poland
Mindful Fitness - Guidelines for Kimberlee Bethany Bonura, International Journal of
Prenatal Practice Nina Ida Marie Spadaro e Rives Childbirth Education (2016)
Whittle Thornton
Tradição no kung fu: mestres Marcio Antonio Tralci Filho Movimento (2016)
brasileiros entre permanências
e transformações

56
‘Wushu belongs to the world’ Marc Theeboom, Dong Zhu e International Review for the
But the gold goes to China Jikkemien Vertonghen Sociology of Sport (2017)
O wushu como uma ferramenta Everton de Souza da Silva, Revista de Artes Marciales
para o desenvolvimento motor, Diego Pereira Alves, Lucas Asiáticas (2017)
cognitivo e socioafetivo na Ribeiro dos Santos, Marcelo
escola – um estudo exploratório Augusto P. dos Santos,
Sumara Brito Soares e Bianca
Miarka
The journey to the cradle of Wojciech J. Cynarski e Pawel IDO MOVEMENT FOR
martial arts: a case study of Swider CULTURE. Journal of Martial
martial arts’ tourism Arts Anthropology (2017)

Posterior à captação dos dados, iniciou-se a análise de conteúdo,


buscando identificar predominâncias e padrões consistentes expressados nos
trabalhos sobre aspectos éticos e estéticos no Kung-Fu. Como informações
complementares foram observadas algumas questões, como: áreas
acadêmicas específicas dos periódicos, idiomas publicados e anos das
publicações. Após o fim da leitura de todas as pesquisas foi possível observar
se a temática foi abordada de forma genérica superficial ou de forma específica
aprofundada. Assim, deram-se os seguintes resultados expostos abaixo.

Quadro 2 – Áreas acadêmicas dos periódicos onde as pesquisas foram publicadas.


ÁREAS ACADÊMICAS N°. DE PUBLICAÇÕES
Humana (história, cultura, sociedade, antropologia e religião) 10
Educação física, desportos e medicina esportiva 10
Lutas, artes marciais e desportos de combate 5
Medicina 3
Psicologia 3
Artes cênicas e cinema 2
Linguística 2
Filosofia 1

Em relação ao quantitativo de publicações por ano, nota-se (figura 1) que


de fato houve uma razoável crescente a partir da segunda década do séc. XXI.
Contudo, ainda aparenta ser um quantitativo muito abaixo do esperado de uma
prática já milenar e famosa por seus fundamentos filosóficos popularmente
conhecidos. O fato se agrava quando comparado às outras atividades físicas,
esportes e mesmo artes marciais, ficando à margem. Foi notória a maioria das
publicações em inglês com 32 estudos, tendo apenas quatro em português e
nenhum em espanhol.

57
Figura 1 – Anos das publicações em linha temporal a partir do artigo mais antigo
relacionado na revisão sistemática até o ano de 2018.

Destrinçando os artigos que surgiram nesta revisão sistemática, foi


possível notar que a maioria dos estudos constituiu-se de ensaios que
abordaram as temáticas filosóficas da ética e/ou estética de maneira
superficial, dando maior foco ao que o meio acadêmico chama mais
amplamente de “área humana”, havendo mistura e sincretismo nos campos da
história, cultura, sociedade, antropologia e religião. Ali puderam ser analisadas
questões que se mesclam aos ensinamentos perpetuados pelos pilares
filosófico-religiosos do Oriente (taoísmo, confucionismo e budismo) até dias
atuais, sendo um de seus principais difusores as artes marciais, incluindo aqui
o Kung-Fu, mesmo que indiretamente (FILIPOVIĆ; JOVANOVIĆ, 2012). Por
exemplo, Littlefield (2011) apresenta em sua publicação uma detalhada
pesquisa sobre a famosa cerimônia do chá, evento tradicionalíssimo na cultura
oriental, ocorrendo inclusive em festividades do Kung-Fu como demonstração
de respeito e zelo aos antepassados ou como rito de passagem de graduações
e/ou titulações.
Já de forma mais direta às práticas marciais, Aguiar (2009) aborda a
ascese por meio das práticas ancestrais do Kung-Fu pelos monges de Shaolin
(importantíssimo centro budista de difusão do Kung-Fu), que poderia ser
entendida como uma forma de pensamento ou de fé que considera a disciplina
e o autocontrole estritos do corpo e do espírito por um caminho imprescindível
em direção ao divino, à verdade e virtude. Por tal entendimento que a ascese é
estudada tanto por uma visão religiosa quanto filosófica, indo ao encontro e

58
somando-se aos pensamentos éticos e estéticos para sua incorporação no dia
a dia dos praticantes. Sabidamente, um tradicional método de treinamento e
busca de uma prática virtuosa se dá através da prática de rotinas coreográficas
do Kung-Fu chamadas taolus (MOCARZEL, 2011). Por meio delas os
praticantes buscam não apenas o ensaio, erro e repetição da técnica, mas em
muitas das vezes uma “incorporação mimética” da fonte inspiradora (como a
águia, o tigre, o dragão, a flor de cerejeira, dentre outros) (Lima, 2000;
ACEVEDO; GUTIÉRREZ; CHEUNG, 2011), objetivando criar uma execução
em uma área convergente à funcionalidade marcial, promoção da saúde e
qualidade de vida e beleza do movimento. Tal questão foi significativamente
abordada no estudo de Yan (2011), onde também detalhou descritivamente
algumas visões de cunho ético e estético da prática das rotinas no Kung-Fu,
gerando sensibilização não apenas em seus praticantes, mas também em seus
espectadores, característica essa singular e marcante da estética desportiva,
como: fluidez de movimento, harmonia, expressão corporal e ritmo
(MARQUES; LACERDA, 2012).
Contudo, de maneira em parte conflitante com tal abordagem histórico-
filosófica descrita anteriormente, vê-se a temática desportivo-competitiva
ganhando extrema atenção nas publicações, onde são majoritariamente
exploradas questões direcionadas ao universo competitivo que é por sua vez
apenas uma das faces de atuação das práticas marciais. Importante dizer que
essa situação é conflitante, pois tal face desportivo-competitiva não é explorada
ou mesmo é repudiada por alguns praticantes mais conservadores e rígidos.
Mesmo assim ela surge cada vez mais forte no universo das publicações
acadêmicas em uma crescente volumosa. Ao entrevistar vários Mestres
tradicionais do Kung-Fu no Brasil, Tralci Filho (2016) se deparou com algumas
questões aparentemente inesperadas. Em seu estudo ele abordaria questões
tradicionais da filosofia do Kung-Fu, contudo acabou explorando mais os
aspectos competitivos atuais da prática por conta da condução dos discursos
dos Mestres em suas entrevistas (instrumento utilizado em sua pesquisa). É
exatamente nessa guisa que é discorrido o estudo de Zheng Shuai (2011),
onde o pesquisador traça as transformações do Kung-Fu para pouco a pouco
ser adaptado e convergido de uma prática nacional para global (da China para
o mundo). Ali ele defende tópicos de cunho ético e estético, deixando claro que
estes podem ser parcialmente preservados quando o Kung-Fu deixa as mãos
da sua nação-mãe e ganha novos horizontes, incluindo sua difusão desportivo-
competitiva, tais como: beleza do movimento, superação, aprimoramento
técnico, respeito e hierarquia. Já Theeboom, Dong e Vertonghen (2012)
concordam com o pensamento anterior, contudo observam mesmo
modestamente um menor foco pedagógico na transmissão teórica de valores
(éticos e estéticos) para enfatizar treinos físicos ginásticos com foco
competitivo, objetivando veementemente premiações e títulos.
Destacam-se também os diversos estudos que exploraram temáticas
voltadas à promoção da saúde e qualidade de vida dos praticantes. Inclusive
as duas únicas revisões sistemáticas que surgiram nessa pesquisa abordam
pontualmente esse foco (TSANG ET AL., 2008; BU ET AL., 2010). As questões
discutidas nos estudos citam a prática do Kung-Fu em sua visão holística,
objetivando atingir para além de um corpo saudável, mas sim uma harmonia

59
maior que vai além do corpo material adentrando em campos sociais,
psicológicos, emocionais, alimentares e energéticos (SILVA ET AL., 2017),
todos já preconizados na milenar MTC (MACIOCIA, 1996; LIMA, 2000). Enfim,
uma prática de valor histórico, salutar, cultural, desportivo e marcial (GUO; QIU;
LIU, 2014).
Por fim, diversos estudos abordam a busca pela transformação da ação
do praticante para uma ação de não violência. Dentre eles, Fletcher e Milton
(2009) expõem a mudança comportamental do praticante tendo seu foco na
intenção das técnicas durante o treinamento, objetivando uma postura pacífica
no dia a dia do praticante. Já Kuan e Roy (2007) exploram a premissa da
autoconfiança, mostrando que desenvolvendo uma maior tenacidade mental os
praticantes expressam suas personalidades com mais coragem e iniciativa.
Essa mescla de uma personalidade de ação pacífica, determinada e confiante
é utilizada para instrução a policiais e militares como relata Chopko (2011),
usando os princípios educativos do Kung-Fu como exemplos.

Considerações finais

A pesquisa buscou a identificação de estudos que fizessem uso do Kung-


Fu como forma de transmissão de valores éticos e estéticos. Contudo ficou
claro que suas narrativas eram em maioria pouco profundas e não exploraram
suficientemente a temática. Os artigos sugerem a presença de importantes
aspectos filosóficos enraizados às práticas e ensinamentos das artes marciais
e, principalmente, do Kung-Fu, tais como respeito às hierarquias, dedicação
constante, zelo ao fazer algo, conhecer e perpassar suas limitações
respeitando sua mente e corpo, sabedoria para efetuar boas escolhas, liderar e
saber ser liderado, adaptar-se aos tempos e dificuldades buscando harmonia,
serenidade emocional em prol de um autocontrole e pacifismo. Todavia,
detalhamentos mais extensos sobre as práticas foram escassos, sendo muitas
vezes citados genérica e superficialmente. Além disso, demonstrou-se que a
carência de estudos publicados na língua portuguesa sobre tal temática ainda
se faz fortemente presente, mesmo com o razoável aumento de publicações
nos últimos anos.

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68
3. Estudos Teóricos – Estudo II

_______________________________________________________________

Mocarzel, RCS.; Queirós, P. & Lacerda, T.. Wu De - Reflexão filosófica acerca


do código de ética marcial do Kung-Fu. Revista Portuguesa de Ciências do
Desporto, v.S2A, p.140-152, 2016.

69
Resumo: Ao Wu De está subjacente um quadro axiológico que norteia o

comportamento dos kungfuístas, praticantes de Kung-Fu, o qual teve

inspiração nos ensinamentos filosóficos de Confúcio. O propósito deste

trabalho é situar o código de ética marcial Wu De em relação ao seu papel

axiológico no Kung-Fu, clarificando seus conceitos no enquadramento ético-

moral. Foi usada a revisão de literatura para coleta de informação. Observou-

se que no Wu De relatam-se as virtudes áureas que o ser humano deve buscar

incondicionalmente para permear a paz no mundo, em sua sociedade e em si

mesmo. Destaca-se que o Wu De se mistura constantemente com os

ensinamentos teóricos e práticos das técnicas do Kung-Fu. Outrossim, a

ideologia do pacifismo confucionista mesclada à cultura do Kung-Fu, faz desta

arte marcial uma representação da ideia maior apregoada filosoficamente na

busca constante da harmonia, afastando-se verticalmente da violência. Todos

esses princípios filosóficos recaem ainda mais sobre os indivíduos mais

graduados (Mestres), que devem expressar em vida e em seu cotidiano o

conceito confucionista da etocracia, onde os superiores buscam ser exemplos-

vivos técnicos e morais para os seus subordinados. Enfim, uma atuação

holística filosófica e reflexiva para superação e transcendência do ser na busca

pelo bem e harmonia.

Palavras-chave: 1. Ética; 2. Confucionismo; 3. Arte Marcial; 4. Kung-Fu; 5. Wu

De

70
INTRODUÇÃO

O Kung-Fu (功夫), também podendo ser chamado de Wushu (武术), é

(17, 4, 2, 20, 9, 22)


uma arte marcial chinesa milenar mundialmente famosa . Para

maiores esclarecimentos é fundamental destacar que acata-se aqui a

conceituação de artes marciais como

«todas as técnicas marciais de caráter sócio-educativas,


estruturadas em métodos didático-pedagógicos, que por sua
vez são embasados por uma ou múltiplas filosofias que pregam
(20,
harmonia, saúde, qualidade de vida e acima de tudo a paz»
p.15)
.

O termo “Kung-Fu” tal como é propagado hoje nem sempre foi a

nomenclatura popularmente adoptada. A designação original da arte marcial


(16)
chinesa é “Wushu”, que tem por significado “arte marcial” ou “arte da
(25)
guerra” . Porém, a expressão “Kung-Fu” ficou mundialmente conhecida

quando o cinema no século XX incluiu em diversos roteiros cenas de

acrobacias e lutas com atores chineses praticantes de Wushu. Quando os

mesmos eram indagados sobre como conseguiam efetuar movimentos de

grande plasticidade e beleza, os atores/lutadores apenas respondiam: “Kung-

Fu!” (20).

A expressão tem por significado “tempo e esforço despendido numa

atividade”, ou “grau de perfeição alcançado em qualquer área de atuação”, ou


(13, p.3) (5)
ainda, “conhecimento profundo de um assunto” . Já Apolloni evidencia

que o termo “expressa uma habilidade intuitiva obtida pela repetição intencional
(17)
de uma ação”. De forma mais generalista, Lima alude à busca constante da

71
(15, p.16)
perfeição, enquanto Jefremovas remete a significação do termo para
(16, p.22)
“trabalho duro”. Ainda, Koppe se posiciona afirmando que Kung-Fu é a

“habilidade adquirida através de um longo período de treino”.

Percebe-se não existir um entendimento unívoco do conceito, sendo no

entanto possível identificar um conjunto importante de afinidades que

permitem, em síntese, descrever conceitualmente o “Kung-Fu” sob um prisma

holístico como “qualquer grande conhecimento e/ou prática alcançados após

muito esforço, trabalho e treino árduo e que se aperfeiçoam com o tempo de

prática, incluindo-se aqui a caligrafia, pintura, escultura, e claro, arte marcial”


(20, p.32) (6)
. Por conta disso Apolloni esclarece haver outras atividades artísticas

ligadas ao espírito marcial dos praticantes de Kung-Fu, mesmo que seja


(17)
subtilmente. É nessa guisa que Lima estruturou uma representação

esquemática (fig. 1) que busca figurar essa visão holística da expressão “Kung-

Fu” e como ela está intrínseca no cotidiano do ser humano.

(17)
Figura 1: Interpretação holística da expressão Kung-Fu .

72
Para melhor entendimento da figura 2, esclarece-se que o Kung-Fu em

sua vertente marcial possui uma divisão13 entre interno e externo. Esta

categorização expressa, basicamente, a metodologia enfatizada no treino dos

praticantes. Estilos internos focam-se inicialmente no desenvolvimento

cognitivo, perceptivo e psicomotor através da meditação, movimentos lentos e

respirações profundas, para, posteriormente, acentuar as práticas marciais de

forma mais objetiva. Já os estilos externos dão ênfase primordialmente ao

treino marcial com saltos, investidas velozes bem vigorosas e respirações mais

rápidas e intensas, para posteriormente, destacarem as práticas meditativas de

forma mais objetiva (17, 7, 2, 20).

Representativamente, a saudação14 tradicional do Kung-Fu possui um

gestual altamente simbólico, que expressa alguns princípios da sua filosofia

que facilitam um melhor entendimento desta actividade. Muito provavelmente

introduzida no período da Dinastia Qing (清朝)15, nesta saudação (fig. 2) os

membros superiores elevam-se no plano sagital à altura do coração, formando

um círculo, enquanto a mão esquerda aberta com os dedos juntos e mais

alongados se une à mão direita em punho cerrado, ficando assim a mão

esquerda sobre a mão direita.

13
Essa temática é ampla, porém não é o cerne deste estudo. Recomendam-se aqui as leituras
(2) (20)
de Acevedo, Gutiérrez e Cheung e Mocarzel para maiores aprofundamentos.
14
A tradicional saudação de cortesia marcial do Kung-Fu pode ser chamada de “Kin Lai” (敬禮),
“Li Baoquan” (武术抱拳礼) e ainda “Jìng Lǐ” (敬礼).
15
A Dinastia Qing liderou o último período imperial da China nos anos de 1644 a 1911 quando
começou os processos de revolução contra a mesma, tendo sua derrocada final em 1912.

73
Figura 2: Saudação tradicional do Kung-Fu.

Essa diferenciação da posição das mãos representa respectivamente: a

energia yang, a masculinidade, o calor, o sol, o ataque, a lâmina, a

agressividade, o homem – lado esquerdo; a energia yin, a feminilidade, o frio, a

lua, a defesa, o escudo, a docilidade, a mulher – lado direito. Vê-se assim a


(20)
perfeita dualidade do Tao . Também existem relatos da representação da

mão fechada (direita) simbolizar a agressividade, encontrando-se por baixo e

segura pela outra mão (esquerda) que está aberta, representando a cortesia e

a diplomacia. Deste modo, toda a manifestação de agressividade ou mesmo de

combate estaria em uma posição de submissão e inferioridade a qualquer

postura diplomática que busca uma harmonia maior.

Como símbolo maior da designação do Kung-Fu como arte marcial, ou

seja, uma prática que sobreleva ensinamentos de filosofias pacifistas,

apresenta-se o Wu De ou Wu Te (武德), o código de ética dos kungfuístas

(praticantes de Kung-Fu). No Wu De está subjacente um quadro axiológico,

74
designadamente de valores ético-morais, que serve como caminho norteador

do comportamento de todos os praticante de Kung-Fu.

Possivelmente a primeira referência histórica ao Wu De surge nos anais

militares do rei Zhuāng de Chǔ (楚莊王)16. Este código de ética marcial milenar

teve sua grande fonte inspiradora nos ensinamentos filosóficos do Taoísmo e,

mais ainda, no Confucionismo. Estas duas linhas filosóficas tiveram como

mentores dois dos maiores pensadores e sábios do Oriente, Lao-Tsé ou Láucio

(老子)17 e Kung-Fu-Tsé ou Confúcio (孔子)18. É sabido que os princípios do

Taoísmo tiveram alguma influência sobre Confúcio, auxiliando-o em seu

processo de reflexão e síntese na busca pelo comportamento ideal do ser

humano, não só individualmente como coletivamente. Hoje, os aforismos de

Confúcio são tidos como pensamentos clássicos de cunho filosófico,

educacional e sociológico, tocando também o meio desportivo, como relatado

por Brownell (8) que afirma que o Barão de Coubertin declarou abertamente que

havia se apoiado em Confúcio, dentre outros pensadores, para então estruturar

o que viria a ser a “pedagogia esportiva” defendida com tanto esmero pelo

16
Rei da Dinastia Zhou do período da Primavera e Outono (春秋時代) que provavelmente viveu
entre os anos de 613 a.C. a 591 a.C..
17
As palavras que compõem o nome de Lao-Tsé de forma romanizada podem ser encontradas
com variações, como: Laozi, Lao Tzu, Lao Zi, Lao Tsé, Lao Tzi, Lao Tseu, Lao Tze, Lao
(20)
Tan e Li Erh. Especula-se que tenha vivido entre 604-517 a.C. , embora ainda haja incerteza
sobre tais datas ou mesmo sobre sua existência. É considerado o pai do Taoísmo (道家).
18
As palavras que compõem o nome de Kung-Fu-Tsé de forma romanizada podem ser
encontradas com variações, como: Kǒng Zǐ, K'ung-tzu, Kǒng Fūzǐ, K'ung-fu-tzu. Viveu entre
(20)
551-479 a.C. . É considerado o pai do Confucionismo (儒家). Foi talvez na história o primeiro
grande defensor da “Etocracia”; ideologia que, segundo Murad (2009), busca a elevação do
poder dos valores éticos, morais e educacionais, fundamentalmente tendo os líderes do povo
como exemplos para seus subordinados.

Murad, M. (2009). Sociologia e educação física: diálogos, linguagens do corpo, esportes. Rio
de Janeiro: FGV.

75
fundador dos Jogos Olímpicos da Era Moderna. É expressado por Mocarzel,
(21)
Murad, Ferreira e Silva que a busca constante do aprimoramento e da

perfeição, base da filosofia que tece a estrutura conceitual do Confucionismo e

do Kung-Fu, pode ser interpretada como uma “versão oriental” do Lema

Olímpico, que por sua vez, também preconizou o desenvolvimento integral e

multilateral do ser humano.

«O lema olímpico CITIUS, ALTIUS, FORTIUS pode ser


traduzido por ‘mais veloz, mais alto, mais forte’. Significa uma
mensagem de aperfeiçoamento humano, expressando a
conclamação do Comitê Olímpico Internacional (COI) a todos
os participantes do Movimento Olímpico, convidando-os a uma
(25,
superação pessoal, de acordo com o Espírito Olímpico»
p.652)
.

Porém, apesar de o Wu De ser um código de ética já milenar e imerso

na prática e cultura marcial chinesa, parece não ter despertado ainda o

interesse em termos de pesquisas que o considerem enquanto objecto de

estudo e investigação. Há que referenciar, contudo, o trabalho de Mendonça e


(19)
Antunes , que se centra em uma vertente educativa mais sociológica,

observando a educação do ser humano na sociedade.

Em nosso entender, qualquer estudo sobre Kung-Fu não pode

negligenciar uma análise cuidada sobre o Wu De, já que o código de ética

marcial determina a própria matriz desta actividade. Neste sentido, os

propósitos deste artigo (que se inscreve num trabalho mais alargado e

aprofundado sobre o Kung-Fu), são: a partir de uma revisão da literatura

disponível, situar o código de ética marcial Wu De em relação ao seu papel

axiológico no Kung-Fu e clarificar seus conceitos no enquadramento ético-

76
moral. Dessa forma, objetiva-se especificamente a tradução literal do texto do

Wu De para o português e o relato dos princípios axiológicos ali presentes.

METODOLOGIA

Face a uma constatação clara e inequívoca acerca da existência de um

espaço inexplorado no que concerne aos estudos sobre o Wu De, procurou

mapear-se esse território através de duas vias. A primeira por meio de uma

busca de estudos acadêmicos sobre a temática, realizada em bases de dados.

Utilizou-se o motor de busca “Descoberta”19, que faz uso das bases de dados

Scopus, Ebsco, Web of Science (antiga Web of Knowledge), Pubmed e B-on.

Já a segunda teve foco em revistas em papel, documentos não publicados,

dentre outros que dificilmente surgiriam em uma busca em base de dados

digitais.

Numa primeira fase, a pesquisa teve início com busca de palavras

ligadas à temática de forma ampla, detectando-se “ruídos”, ou seja, estudos

que não se enquadram objetivamente no âmbito desta pesquisa. Por exemplo,

ao procurar a expressão “código de ética marcial” ou “código marcial” (mesmo

em inglês), encontravam-se textos de ordem militar. Quando apenas

expressado “código de ética” surgiam textos de naturezas muito diversas,

muitos envolvendo ética profissional no direito, na enfermagem, na política,

dentre outros. Assim, após algumas reflexões, procurou-se objetivamente a

19
Disponível em: http://eds.a.ebscohost.com/eds/search/basic?sid=a269ea5b-34f7-4f20-99dd-
cce7933f0981%40sessionmgr4005&vid=0&hid=4208.

77
expressão “wude” ou "wu de" ou "wu-de" ou “wute” ou "wu-te" ou "wu te" e

"kung fu" e "kung-fu" e “kungfu”. Não foi determinado campo de pesquisa para

que a busca fosse mais abrangente. Todas as referidas consultas ocorreram

em junho de 2016.

Para o desenvolvimento deste trabalho analisaram-se os títulos,

resumos e palavras-chave das publicações encontradas, complementando-se

com outros estudos de conhecimento dos pesquisadores resultantes da 2ª via

de pesquisa anteriormente referida e que não surgiram, portanto, nas bases de

dados.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS

As ferramentas de pesquisa identificaram 10 estudos (quadro 1) como

resultado final após os crivos de análise, sendo um deles, o segundo no quadro

de resultados, uma republicação traduzida do primeiro no mesmo quadro.

TÍTULO DO ESTUDO AUTOR(ES) REVISTA

La regla taiji: el legado del inmortal Revista de Artes


Cohen, K. S. (2008)
durmiente Marciales Asiaticas

Taiji: ruler legacy of the sleeping Journal of Asian


Cohen, K. S. (2008)
immortal Martial Arts

Taijiquan y taoísmo: de religión a


Revista de Artes
arte marcial, de arte marcial a Wile, D. (2012)
Marciales Asiaticas
religión

Análisis de las publicaciones


Acevedo, W. & Revista de Artes
periódicas marciales chinas editadas
Cheung, M. (2011) Marciales Asiaticas
durante el periodo republicano

78
De guerreros adeportistas: cómo se
Revista de Artes
adaptaron las artes marciales chinas Filipiak, K. (2010)
Marciales Asiaticas
a la modernidad

Chinese diasporic imaginations in


Hong Kong films: sinicist Tam, S. K. (2001) Screen
belligerence and melancholia

Journal of Asian
Liu xiheng: memories of a taiji sage Mason, R. (2010)
Martial Arts

The irresistible: Hong Kong movie


once upon a time in china series - an
Hwang, A. (1998) Asian Cinema
extensive interview with
director/producer Tsui Hark

Pitfalls of cross-cultural analysis: Asian Journal of


Yeh, E. Y. (2009)
Chinese wenyi film and melodrama Communication

Wushu's transformation from the Journal of Asian


Shuai, Z. (2011)
local boxing ring to the world stage Martial Arts

Quadro 1: Síntese de artigos encontrados na pesquisa, utilizando o motor de busca


‘Descoberta’.

Infelizmente, nenhum desses trabalhos se reporta directamente ao Wu

De. Alguns tratam genericamente de questões filosóficas das artes marciais,


(12, 26)
envolvendo de certo modo o comportamento ético dos praticantes .

Contudo, acabam não atendendo directamente este estudo.

Todos, mesmo indiretamente, usam como objeto de estudo e discussão

de pesquisa a cultura oriental, tendo em alguns momentos aproximações ao

Kung-Fu. Pensa-se ser este o motivo que explica, pelo menos em parte, o seu

surgimento nas buscas realizadas. No entanto, as investigações citadas não se

alinham harmonicamente com as propostas deste estudo.

Destaca-se a presença de publicações de duas revistas específicas das

artes marciais mais conhecidas internacionalmente, ainda três revistas da área

79
das artes e mídia, no entanto, surpreendentemente, não aparecendo qualquer

revista da área da filosofia, história, ética, sociologia ou mesmo do desporto.

Assim, reforça-se a ideia de que o Wu De foi de certa forma deixado à parte

quando observado em sua compleição mais ampla apesar de, em nosso

entender, poder colaborar com o aspecto educativo e social em áreas diversas

de atuação do ser no cotidiano.

Além disso, os referidos artigos foram publicados entre o período dos

anos de 1998 a 2013, o que se nos afigura como um lapso de tempo muito

reduzido, indiciando o estado incipiente da investigação neste domínio.

Notando que a pesquisa por publicações acadêmicas forneceu pouco

suporte material para o aprofundamento do presente estudo, convergiu-se a

atenção para as traduções do Wu De para a língua portuguesa e suas

reflexões.

São destacados no Wu De dez princípios de cunho axiológico (quadro 2)

que, posteriormente, dão suporte tanto filosófica quanto educacionalmente a

sete preceitos relatados de maneira mais descritiva.

HUMILDADE RESPEITO JUSTIÇA CONFIANÇA LEALDADE

謙遜 尊敬 公正 信用 義氣

VONTADE RESISTÊNCIA PERSEVERANÇA PACIÊNCIA CORAGEM

志氣 忍受 不屈 忍耐 勇氣

Quadro 2: Princípios axiológicos do Wu De (em português e chinês).

80
Deste modo, as virtudes destacadas no quadro 2, encontram-se vertidas

na postura marcial expressa nos sete preceitos que pontuam de maneira clara

a presença da prática e da preocupação do zelo na própria atitude do indivíduo,

de maneira honrosa e respeitosa, perseguindo um referencial ético

determinado.

Figura 3: Preceitos orientadores para um artista marcial.

A tradução do texto do Wu De em chinês para o inglês e para o

português foi realizada com a ajuda de uma Mestra de Kung-Fu chinesa nata,

com conhecimento, portanto, do idioma chinês em nível nativo.

«Um artista marcial:

1) Sempre deve cultivar e defender o Wu Te;

2) Nunca deve lutar ou usar suas habilidades para intimidar os outros;

3) Nunca deve se envolver em discussões desnecessárias;

4) Nunca deve difamar ou menosprezar os outros;

5) Deve ser humilde e modesto sempre praticando humildade;

6) Deve aprender com os ancestrais sobre todas as dificuldades e controlar sua raiva e
emoções;

7) Deve ser exemplo trazendo honra e respeito às artes marciais.»

81
Analisando cada um dos sete preceitos, somos conduzidos a afirmar que

se articulam num conjunto que vai para além do ideário simplesmente ético ou

mesmo moral, congregando-se num quadro axiológico alicerçado em

fundamentos pacifistas. É de fácil identificação que os ensinamentos ali

contidos bebem das fontes dos valores confucionistas, podendo desdobrá-los

não somente para técnicas marciais ou mesmo desportivas, indo ao encontro


(17)
do pensamento holístico que Lima relata ser característica fundamental do

Kung-Fu, buscando sempre o trabalho e aperfeiçoamento do ser como um

todo; mais, podendo ainda o indivíduo colaborar progressivamente com a

evolução de toda a sociedade.

Ou seja, o treino marcial tem que ampliar as capacidades do indivíduo,

capacidades essas que têm que ser úteis não apenas para o próprio, mas para

todos. Ao analisar o Wu De detalhadamente é observado que este código

atenta para ensinamentos de ordem social, buscando assim afastar o

praticante de Kung-Fu do ideário de violência seja física, psicológica ou

simbólica. Os ensinos de cunho ético-moral somam-se a princípios


(7)
civilizacionais que colaboram com a superação do ego e das frustrações .

Todos esses predicados espelham-se desde o nome popular dessa arte

marcial.

(7)
Um artista marcial vai além das atitudes e posturas de um lutador .O

artista marcial não se preocupa apenas com sua técnica pela eficácia marcial

ou com seu preparo físico para ter mais capacidade de combate, mas sim,

aperfeiçoar seu bom caráter através de seu zelo e perseverança. Ainda que se

torne o melhor possível, manterá uma atitude humilde genuína, evitando

82
quaisquer conflitos, tentando ter uma postura harmônica e serena, honrando

seus antepassados e ancestrais, postando-se sempre que possível na

bifurcação da emoção e da razão, procurando acima de tudo ser exemplo vivo

a todos a sua volta (3, 20, 22).

Incorporando tais comportamentos no cotidiano do artista marcial,

objetiva-se nada mais do que transcender o mundanismo, atingindo patamares

elevados de virtude (道德) e honra (荣誉). Nessa perspectiva, notam-se as

aproximações à importância da dimensão axiológica permeada no Kung-Fu

através de seu código de ética marcial (Wu De), exercendo o praticante

atitudes de profundo cunho ético e estético. Nos esclarecimentos de Yonezawa


(28, p.352)
é dito que “tal é a razão de Confúcio dizer que somos a ponte entre o

céu e a terra. Esta é a força envolvida no combate e que as Artes Marciais

nasceram para defender”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao que tange os ensinamentos éticos do universo marcial identifica-se

um conjunto de princípios que não só podem como devem ser aspirados por

todos os seus praticantes. Todavia, aparentemente, a temática da ética e toda

sua compleição filosófica não parece ter tido grandes difusões no universo dos

estudos acadêmicos relativo às artes marciais, mais especificamente ao Kung-

Fu e ao seu código de ética. Espera-se que este trabalho possa contribuir para

o avanço do conhecimento das comunidades acadêmica, científica, desportiva

83
e marcial de forma significativa e que não só inspire novas buscas e estudos,

mas sim, novas perspectivas de treino, prática e de vida.

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88
3. Estudos Teóricos – Estudo III

_______________________________________________________________
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através dos tempos sobre o universo marcial à luz da ética e estética - o caso do
Kung-Fu. FairPlay, Journal of Philosophy, Ethics and Sports Law, 15, 90-115.

89
Resumo: Diversas terminologias que vêm sendo usadas de maneira
generalizada no universo marcial causaram entendimentos dúbios (mesmo não
propositalmente) sobre características e peculiaridades das práticas
envolvidas. Isso abre margem para dificuldades de entendimento e estudo,
más interpretações sobre a temática e em situações mais radicais e alargadas
socialmente, instiga o preconceito por praticantes, estudiosos e simpatizantes.
Este estudo busca como objetivo realizar uma revisão e reinterpretação de
conceitos importantes do universo marcial sob análise filosófico-cultural focada
na ética e estética, pois são campos que mais influenciaram e que ainda
influenciam o universo marcial. Os termos conceituais serão observados sob as
lentes da hermenêutica. Especificamente, objetivou-se (i) diferenciar as
práticas do universo marcial a partir de uma categorização conceitual
(taxonomia) com critérios relacionados às características culturais e princípios
filosóficos vertidos nas práticas; (ii) destacar e respaldar a categoria “arte
marcial” como prática imersa em valores filosóficos pacifistas; e (iii) destacar e
contextualizar a posição do Kung-Fu nesta taxonomia como “arte marcial”
expondo suas idiossincrasias. Foram observadas transformações dos
pensamentos e nomenclaturas usadas no universo marcial juntamente com as
mudanças do pensamento humano. Defende-se ter ficado evidenciado a
existência de valores éticos e estéticos contidos no conceito “arte marcial” e
“Kung-Fu”.
Palavras-chave: 1. Lutas e artes marciais; 2. Kung-Fu; 3. Ética; 4. Estética.

1.Introdução

O universo marcial, em sua essência mais primitiva e longínqua,


confunde-se com a história humana (e até mesmo animal), onde de maneira
rudimentar o ser humano buscou ser capaz de combater e superar conflitos
(Acevedo, Gutiérrez & Cheung, 2011). Com o passar dos séculos, foram
criados métodos combativos que procuravam servir diversos fins bélicos. Esses
métodos foram progressivamente cada vez mais observados, analisados,
praticados e difundidos como ferramentas úteis ao que tange o sucesso na
superação de discórdias e antagonismos, assim como o desenvolvimento do
condicionamento físico. Dessa forma, guardas militares e exércitos foram
formados, sendo que as suas capacidades e habilidades na defesa do território
e das populações foram responsáveis pela construção e reconfiguração da
história e sociedade humanas. Por meio da guerra, a humanidade foi
repaginada inúmeras vezes, gerando assim transformações diversas.

90
Contudo, o processo de desenvolvimento e evolução da humanidade, do
qual faz parte integrante o florescer e amadurecimento do pensamento crítico-
filosófico, conduziu ao surgimento da visão holística, que foi sendo adotada e
aprofundada pela antiga cultura chinesa ainda séculos antes de Cristo.
Segundo Lima (2000), o holismo pontua a visão do ser como um todo, não
devendo ser observado de forma avulsa e fragmentada, envolvendo assim seu
corpo, mente, relações sociais, emoções e afins. Mais: o holismo ainda carrega
consigo uma profunda natureza histórico-sociocultural, na qual o ser humano é
pensado não apenas como ser único e independente, mas sim como parte
integrante de todo um sistema complexo que o cerca, abrangendo o
ecossistema e a sociedade humana de forma una, ontem, hoje e amanhã
(Ilundáin-Agurruza, 2014a).

Exatamente por ser edificada sobre tais fundamentos, a visão holística


oriental transformou os métodos combativos, alertando para a necessidade de
não apenas dever trabalhar e difundir ensinamentos técnicos bélicos e
aprimoramentos físicos, mas também de propagar valores educacionais
pacifistas. Dessa forma, o ego humano, manifesto em atitudes torpes e
egoísticas, recebe “grilhões” para ser contido, gerando assim maior harmonia
na sociedade (Lima, 2000; Mocarzel & Columá, 2015). Tal pensamento vai ao
encontro do aforismo que a educação ajuda a transformar o ser humano
podendo ser vista como uma “segunda natureza” (Dürkheim, 1968; Bento,
2006; Murad, 2009). Por conta disso, Hermann (2005) adverte que é de
fundamental importância o zelo maior com o que constituirá essa educação,
devendo ser irrigada de questões éticas, morais e estéticas, ou seja, um
retorno à educação dos valores filosóficos em sua essência. Algo que é
perseguido pela humanidade há muito tempo, um comportamento de valores
na teoria e prática difundido na sociedade (Goergen, 2005).

É nessa guisa que surge a mudança de pensamento relativamente ao


ensino e prática dos métodos combativos, que evoluem para algo mais
humanizado, mais vinculado à determinada regra de conduta, mais pacífico e
também mais artístico. Encontra-se aqui a origem do entendimento acerca do
conceito de arte marcial, sendo este algo muito mais profundo e complexo do

91
que o ato de lutar em si. Essa abordagem é respaldada pela colocação de
Bäck e Kim (1979) e Min (1979) que afirmam que esse seria o motivo de muitos
mestres e/ou praticantes dedicados de artes marciais tornarem-se também
guias espirituais (ou ao menos serem vistos desta forma pela sociedade leiga).

Aponta-se como um problema que nas últimas décadas até aos dias
atuais, diversas terminologias vêm sendo usadas de maneira generalizada no
universo marcial, causando entendimentos dúbios (mesmo que não
propositalmente) sobre características e peculiaridades das práticas que
envolvem tal universo (Rufino & Darido, 2011). Esse fato abre margem para
dificuldades de entendimento e estudo, más interpretações sobre a temática e
até mesmo em situações mais radicais e alargadas socialmente, instiga o
preconceito por praticantes, estudiosos e simpatizantes. É esclarecido por
Bowman (2017) que é comum e mesmo positivo haver diferentes pensamentos
dentro das áreas de estudo, onde se estruturam debates, reflexões e
contrapontos e que esses normalmente trazem colaborações à área científica,
fugindo de uma estruturação estagnada, unívoca e monoculturalista. Contudo,
o mesmo autor alerta que para que essa visão positiva ocorra são necessários
múltiplos estudos em diferentes áreas, realizando assim intercâmbios
coerentes e harmônicos, tanto comunitários quanto interdisciplinares,
oxigenando a área e ao mesmo tempo se resguardando da heterogeneidade
radical. No contexto das artes marciais, é ainda salientado por Bowman (2015)
que são possíveis estudos em uma vasta variedade de disciplinas: história,
antropologia, psicologia, esporte, sociologia, literatura, diplomacia, religião e
filosofia, mídia, arte, economia, política, saúde. Neste estudo elevam-se aqui
questões como: (i) da longevidade e antiguidade do universo marcial, fazendo
com que essa se permeie e se deixe permear em diversos âmbitos históricos e
socioculturais; (ii) pelo fato de ainda não haver uma estruturação acadêmica
amplamente consolidada mundialmente nessa área; e ainda (iii) pela pesquisa
acadêmica online (que possui alcance global compreendendo todas as culturas
e idiomas, e resguarda os registros históricos) ser uma realidade relativamente
recente, logo, só há proporcionalmente pouco tempo é que a comunidade

92
acadêmica teve a dimensão da amplitude e proporção que o universo marcial
pode atingir.

Assim sendo, este estudo busca como objetivo geral realizar uma revisão
e reinterpretação de alguns conceitos importantes do universo marcial sob
análise filosófico-cultural focada na ética e estética. Pensa-se que esses sejam
dos campos que mais influenciaram e que ainda influenciam o universo
marcial. Para tal, os termos conceituais aqui em questão serão observados sob
as lentes da hermenêutica, técnica que busca interpretar, compreender e
reinterpretar baseada na história e na filosofia, dentre outros conhecimentos já
pré-estabelecidos (Figueiredo, 2006). Definiu-se como objetivos específicos: (i)
diferenciar as práticas do universo marcial a partir de uma categorização
conceitual – esta diferenciação foi concretizada através de uma taxonomia com
definição de critérios relacionados com as características culturais e os
princípios filosóficos vertidos nas suas práticas; (ii) destacar e respaldar a
categoria “arte marcial” como uma prática imersa em valores filosóficos
pacifistas; e (iii) com base na categorização definida no ponto anterior, destacar
e contextualizar a posição do Kung-Fu nesta taxonomia como “arte marcial”
expondo suas idiossincrasias. É importante dizer aqui, como alertado por
Channon (2016), que a construção e definição de parâmetros e princípios deste
estudo não têm a intenção de gerar normativas ou mesmo exclusões, mas sim
de elevar e aclamar os valores atribuídos existentes. Indo além, vê-se aqui uma
importante possibilidade de apresentação, discussão, estudo e esclarecimento
sobre os conceitos que formam o universo marcial sob um olhar dos valores
filosóficos, pois se defende que a partir do momento que alguns desses
conceitos são perspectivados como sinônimos no entendimento comum (visão
reducionista), tal ato gera uma “amputação”, o que enfraquece a sua base
educacional profunda, na qual se alicerça sua compleição maior.

2. Metodologia

Este estudo enquadra-se numa investigação de natureza qualitativa,


fazendo-se uso de uma aproximação hermenêutica (Thomas, Nelson &
Silverman, 2007) realizando reflexões crítico-filosóficas sobre as práticas e os

93
conceitos abordados. Fez-se uso da revisão narrativa de literatura que
conjuntamente com a narrativa oral, prática comum dentro do universo marcial
(Granet, 1997), sustentou teoricamente os dados sobre a temática das lutas e
artes marciais. Esclarece-se que se optou aqui pela revisão narrativa pois
defende-se que uma revisão sistemática limitada apenas à busca de conceitos
do universo marcial seria confusa pelo fato de em muitos casos as
terminologias serem utilizadas como sinônimos ou surgirem ambígua e
incompletamente diferenciadas. A bibliografia elencada abrangeu livros e
capítulos de livro, pesquisas acadêmicas de stricto sensu, artigos de
conceituados periódicos (em maioria da área do desporto em geral) que
tematizam o universo marcial.

Destaca-se que o uso das análises hermenêuticas sobre a temática, uma


área carente no Ocidente como já ressaltado por Theeboom e De Knop (1999),
não se deu apenas sobre nomenclaturas estruturadas em alfabetos
romanizados, mas também em ideogramas chineses que carregam consigo as
subjetividades e pensamentos filosófico-culturais de seu povo há milênios.
Dessa forma, espera-se que não haja perda de entendimentos ou mesmo
limitações de reflexões quando houver traduções ou transposições para outro
tipo de alfabeto ou caligrafia, almejando assim unir o mais harmonicamente
possível o raciocínio filosófico oriental e ocidental.

Definiu-se o Kung-Fu como objeto de estudo desta pesquisa. Ressalta-se


que esta arte marcial possui diversos detalhamentos culturais, idiossincrasias,
peculiaridades e variantes que possibilitam um explorar amplo da proposta de
construção da categorização conceitual (taxonomia). Além disso, este é o
principal campo de observação, experiência, pesquisa e análise de um dos
pesquisadores deste estudo.

A concepção dessa taxonomia teve seu início nos trabalhos de Mocarzel


(2011) onde se constituiu seu primeiro formato. Posteriormente, através das
discussões e reflexões da equipe de pesquisa, a taxonomia passou por uma
releitura e reestruturação, ganhando assim uma nova disposição interpretativa
e, consequentemente, gráfica. Para que as etapas da taxonomia se façam

94
claramente entendíveis, todos os seus níveis foram destacados e discorridos
de forma a aprofundar a razão de sua presença no estudo e determinar suas
bases e peculiaridades. Realça-se que apesar de o método de autodefesa que
está sendo destacado na referida taxonomia ser o Kung-Fu, objetivou-se deixar
aberta aqui a possibilidade de uso desta taxonomia para outras técnicas
marciais em estudos futuros.

Outro significante ponto a ser salientado é a possibilidade de alteração


dos níveis da taxonomia para atender de forma direta os objetivos de
pesquisas e caracterizações mais específicas das práticas do universo marcial.
Por exemplo, poderia ser inserido um nível de destaque que diferenciasse os
métodos de autodefesa que fizessem e não fizessem uso de implementos,
como armas brancas. Neste caso, seria visível que a Esgrima estaria na
divisão armada e o Judô na divisão desarmada; contudo, o Kung-Fu estaria em
uma categoria mista, pois possui técnicas marciais armadas e desarmadas.
Poder-se-iam realizar ainda outros desdobramentos da taxonomia proposta
neste estudo. Porém, pensa-se que o exemplo anterior já fez valer o seu
propósito explicativo.

Por fim, ao que tange aqui as limitações do estudo, esclarece-se que


qualquer visão crítica de que tal proposta conceitual (taxonomia) ser vaga e
genérica por conta de sua possibilidade de alterações é refutada exatamente
por conta dessa flexibilidade organizacional. Assim, deixa-se em aberto
possibilidades de enriquecimento da taxonomia, robustecendo-a com outros
níveis e destacamentos, todavia sem tocar nos pontos primordiais que se tem o
intuito de elevar neste estudo, e que são elencados nos dois primeiros níveis
desta taxonomia: contextos de aplicação, fundamentos filosóficos e seus
métodos de ensino.

3. Desconstruindo e reconstruindo conceitos. Uma proposta de


taxonomia

Com o propósito de delinear a reflexão que tange este estudo,


desenvolveu-se uma representação esquemática para melhor visualização e

95
entendimento da argumentação elaborada sobre a temática. Em nosso
entender, a organização gráfica desta representação traduz de forma muito
efetiva a taxonomia, pois busca proporcionar alguma ordem e até mesmo
classificação sobre o assunto em análise.

Deste modo, na figura 1 representa-se a linha de pensamento reflexivo e


designações normativas propostas neste estudo, sustentados por questões de
cunho cultural e educacional envolvendo o universo marcial. As conceituações
foram dispostas em níveis ou escalas com ligações lineares entre si, para
auxiliar o desenvolvimento do pensamento discutido. Cada nível buscou
explorar e aprofundar de maneira progressiva a especificidade do assunto,
começando no nível 1, no qual se faz uma aproximação mais generalista e
ampla, para gradativamente se irem delimitando de forma mais precisa as
particularidades, culminando no nível 4 de modo muito direto e orientado para o
Kung-Fu (tanto em sua vertente tradicional marcial quanto moderna
desportiva).

Figura 1: Taxonomia de conceituação e enquadramento das práticas do universo marcial


baseada no estudo de Mocarzel (2011).

No tocante da interpretação da taxonomia apresentada é de se notar


que propositalmente não se faz alusão a três expressões que recorrentemente
são vistas ou utilizadas popularmente pelos leigos quando o assunto trata do

96
universo marcial: “briga”, “defesa pessoal” e “desporto de combate”. Segundo
Mocarzel e Columá (2015), o termo briga já carrega consigo (mesmo que
veladamente) um significativo ideário de negativismo ou ainda violência,
manifestando-se nos momentos de desavenças e desarmonias. Sendo este
estudo imerso em questões dos valores educacionais filosóficos, fica então de
fácil compreensão que tal terminologia não deva ser utilizada neste universo.
Além disso, os mesmos autores ainda acentuam que o termo defesa pessoal
traduz, de forma geral, um dos objetivos da prática de lutas e artes marciais, ou
seja, o ato de defesa pessoal está sempre contido nas lutas e artes marciais,
não constituindo uma categoria à parte. Sendo assim, esta terminologia
também não foi incluída separadamente na representação gráfica. Por fim, no
presente trabalho, o termo desporto de combate é tido como uma vertente
desportivo-competitiva das práticas de lutas e artes marciais, de acordo com a
compreensão do termo “esporte” (ou desporto) de Barbanti (2006, p.57):

Esporte é uma atividade competitiva institucionalizada que envolve


esforço físico vigoroso ou o uso de habilidades motoras relativamente
complexas, por indivíduos, cuja participação é motivada por uma
combinação de fatores intrínsecos e extrínsecos.

Curiosamente, as práticas desportivo-competitivas de combate são


algumas das mais antigas que se tem registro (Tubino, 2010). Afinal, o ato de
lutar faz parte do instinto humano e o esporte nada mais é do que uma
extensão reduzida (microssociológica) da sociedade humana como um todo
(macrossociológica) que perpassou os tempos (Murad, 2009). Tendo a prática
desportivo-competitiva sua representatividade na subcategoria de foco
competitivo no nível 4 da taxonomia (aqui no caso especifico deste estudo),
não se viu maior necessidade de destacamento.

Sobre a representação gráfica da taxonomia, no “nível 1“, referenciado ao


contexto de aplicação, apresenta-se o seu ponto mais importante e um dos
eixos principais deste estudo: a diferenciação dos conceitos de “autodefesa” e
de “violência” no campo do universo marcial. É fulcral elucidar que esta
abordagem se refere aos aspectos decorrentes do pôr em causa à integridade
física, pois sabidamente, os mesmos conceitos são por demais abrangentes

97
em campos de estudo diversos (sociologia, antropologia, segurança pública,
psicologia, dentre outros), não sendo a partir de qualquer desses campos
diretamente que se desenvolve este estudo. Neste contexto, deixa-se claro que
as diferenças daqueles dois conceitos envolvem muito mais do que apenas
ações e posturas sob um prisma operativo (ou seja, com a realização das
próprias ações, com a prática), mas também a verdadeira intenção do indivíduo
com aquela atitude em si, tornando-se a “bússola moral direcionadora” para
entendimento e conceptualização neste estudo. Tal reflexão aproxima-se das
colocações de Fromm (1973) que diferencia a agressividade benigna e
agressividade maligna. A primeira abrange atos que muitas vezes são vistos
como bruscos e de muita aspereza, mas ocorrem para deter uma ação de
violência (autodefesa) ou por serem atos permitidos em regulamentos
desportivos – contudo, são estimulados pela competitividade e não pela
violência em si. Já a segunda é a manifestação de atitudes que vão claramente
contra a ética, a estética e a moral, sendo um ato cruel e violento, como por
exemplo, desprezar em uma competição desportiva a integridade e o bem-
estar do colega adversário (que neste caso é confundido e tratado como se
fosse inimigo). Conclusivamente sobre tal reflexão, Lima (2000, p.113)
esclarece que: “Sermos agressivos ao compreendermos algo significa termos
determinação e energia direcionada para uma tarefa específica (o que é
bastante diferente de sermos violentos ao cumprir essa mesma tarefa)”. Dessa
forma, como esclarece Calhoun (1987), é possível notar que uma prática
desportiva pode sim ser usada para evidenciar, mascarar, aumentar, mas
também diminuir as manifestações de violência de uma sociedade.

Pode-se dizer que a autodefesa busca de forma direta o resguardo e


proteção do próprio indivíduo (ou mesmo sua prole e/ou território) de maneira
que consiga manter sua integridade física o mais intacta possível (Mocarzel &
Columá, 2015). Já a violência é de maneira objetiva a carreadora das
manifestações que refletem a pior face do ser humano (Arendt, 2009), que
alimentam o ego e trazem consigo a soberba, a opressão, o egoísmo, o ódio e
atitudes ou sentimentos afins. Tal questão fica melhor elucidada por Dadoun
(1998, p. 12) que classifica conceitualmente a violência como: “todo sinal

98
extremo, ou de algum modo excessivo, [que] implica uma pressão, uma
coação, uma força – resumindo, uma violência”. Claro que a conceituação
anterior sobre o fenômeno da violência é de certa forma elementar, pois como
afirmam Minayo e Souza (1998, p.522), a violência: “é um fenômeno histórico,
quantitativa e qualitativamente, seja qual for o ângulo pelo qual o examinemos
(conteúdo, estrutura, tipos e formas de manifestação)”. Neste sentido, Capez
(2003, p.XI) é categórico quando diz que “a violência constitui uma das
expressões primitivas do ser humano. Em todas as épocas e em todas as
sociedades sempre houve violência. No campo desportivo não poderia ser
diferente”. Sob esse prisma, Bento (2006) cita que é possível através da
educação, da atividade física disciplinada e regrada e do esporte o ser humano
afastar-se de sua animalidade primitiva. Sêneca, importante e famoso
intelectual da época de Cristo, já expunha o declínio da moral do império
romano durante seu tempo, ao ver vários nobres e ricos de seu povo investir
voluptuosas cifras em lutadores apenas por puro desfrute da violência em meio
aos gritos da multidão, símbolo este do baixo instinto que predominou na época
(Gumbrecht, 2007). É nessa perspectiva que Dadoun (1998) acusa o ser
humano de não ser verdadeiramente o homo sapiens (ser da sapiência), pois
este se permite abandonar seus dons intelectuais avançados em prol do
pacifismo para abraçar a animalidade da violência. Dessa forma, Kalina e
Barczyński (2008) afirmam que a autodefesa deve ser algo inserido no
conhecimento cotidiano da sociedade humana contemporânea e ainda
pontuam de maneira clara que esta é apenas uma das faces que a arte marcial
detém, pois a mesma ainda promove a saúde somática, a saúde mental, a
saúde social e a competência motora. Essa reflexão abre horizontes para o
próximo nível da taxonomia a seguir.

No “nível 2”, adstrito aos fundamentos filosóficos e métodos de ensino, é


proposta a divisão dos conceitos “arte marcial”, “luta técnica” e “luta não
técnica”. Na origem, a “luta não técnica” nada mais é do que a materialização
“instintiva e natural” de qualquer ser vivo buscando sua proteção e integridade
física. Ela não requer qualquer conhecimento ou mesmo preparo prévio. Sendo
embora uma capacidade com raízes antropológicas, a sua presença é ainda

99
mais acentuada no reino animal. Exatamente por isso pode ser observada em
animais durante um confronto físico, assim como leigos ainda crianças e
idosos, devido suas condições de maior fragilidade e vulnerabilidade. Daí a
normativa de não ser técnica, pois é tida como inata.

Já a “luta técnica” embasa-se sob um treinamento metódico e estruturado


de difusão técnica do método de autodefesa. Através de tal treinamento, a
preparação física e a instrução e refino técnico-tático são adquiridos, buscando
gerar assim maior capacidade combativa no praticante. Essa prática é a
adotada, por exemplo, pelos militares em seus treinamentos de combate corpo
a corpo. Seu treinamento tem foco na preparação física intensa e no aprimorar
da técnica marcial, para assim, caso seja necessário em uma situação bélica,
conseguir aplicar a técnica em questão quantas vezes for necessária de
maneira otimizada. Tem-se como exemplo as práticas de combate corpo a
corpo dos militares que convivem cotidianamente com a possibilidade de uma
insurgência bélica, necessitando assim de extrema eficácia na execução das
técnicas de combate e tendo ainda a preocupação de um condicionamento
físico e mental rigoroso para enfrentar quaisquer situações. Para tal, é
necessário muito esmero e prática.

Por fim, a “arte marcial” vai além das questões do preparo físico,
capacidades motoras e habilidades técnicas, objetivando o lapidar e o
consolidar do bom caráter do praticante durante as diversas situações do
cotidiano (Allen, 2013). Tal categorização embasa-se numa “filosofia da
educação” de cunho ético e estético, gerando um ciclo de práxis: estudo,
reflexão e fazer bem (Ilundáin-Agurruza, 2014b). Destaca-se que é exatamente
por este motivo que a arte marcial não se liga à violência, pois o ato de um
artista marcial deve sempre ser consubstanciado em intenções pacíficas ricas
de valores morais, éticos e estéticos (Bäck & Kim, 1979; Abe, 1986), ou seja,
ligado diretamente ao bem, à pureza do espírito e, assim, à beleza como já
enaltecido por Platão, o que Bäck e Kim (1979) chamam de “fruição artística”.
Porém, como apresentado na taxonomia por meio das linhas que fazem a
ligação entre os dois primeiros níveis, a “luta não técnica” e a “luta técnica”
podem ser utilizadas para realização de atos de violência. Talvez seja por tais

100
motivos que Cynarski, Sieber, Kudłacz e Telesz (2015) apontam que muitos
vêm a arte marcial como um caminho não apenas moral, mas sim espiritual e
ainda ressaltado por Bäck e Kim (1979) como algo de procura e prática perene.
O sentimento essencial do ato muda o valor da ação; se expressa valor aqui no
sentido axiológico do termo (Abbagnano, 2014), ou seja, “(...) é aquilo que é
estimado como tal através de um juízo” (Goergen, 2005, p. 987), representado
em uma visão oriental (taoísta e confucionista) a formação de um ser humano
bom e harmônico (Lima, 2000) e em uma visão ocidental (kantiana) a formação
de um ser humano que julga que atribui verdade, bondade e beleza às coisas
julgáveis (Goergen, 2005). A importância da educação imersa nos valores,
tanto no prisma oriental quanto ocidental, será imprescindível para a
capacidade volitiva do artista marcial em seu cotidiano, sendo provavelmente
um dos maiores norteadores de suas decisões no dia a dia (Bento, 199-; Bäck,
2009).

O “nível 3” procurou apresentar a origem cultural do método de


autodefesa em questão. Em primeiro lugar, a importância desta distinção
justifica-se por questões de natureza geográfica, designadamente pelo fato de
alguns métodos serem difundidos por um país, enquanto outros apenas são
praticados por alguns povos e/ou tribos específicos. Como exemplo, destacam-
se aqui dois métodos de autodefesa bem distintos: o Krav-Maga, prática
israelita que hoje é um símbolo patriótico de Israel (Pimenta, 2007) e o Huka-
Huka de origem índio-brasileira que, no entanto, só é praticado e propagado
pelos índios do Xingu no Brasil (Mocarzel & Columá, 2015).

Além disso, outra questão de importância que é trazida à luz neste nível é
exatamente a riqueza de material utilizado, que pode ser analisado e refletido
sob cunho cultural, tendo em vista que as atividades físicas em geral possuem
largas raízes com vastas extensões sobre a sociedade humana, repercutindo-
se no decorrer da história. Dentro de tais aspectos tanto históricos quanto
socioculturais, repousam questões de natureza axiológica que podem ser
elevadas à reflexão de forma minuciosa. Há muitos séculos atrás, várias
práticas culturais da sociedade humana, entre as quais o desporto (lato sensu),
proporcionaram influências entre si, gerando assim uma permeabilidade mútua

101
frequente. Dessa forma, é possível notar influências que transitaram das
práticas do universo marcial para a sociedade tanto quanto da sociedade para
as práticas do universo marcial. Esse caso é um exemplo do fenômeno da
“bilateralidade socioesportiva” (Mocarzel, Murad, Ferreira & Silva, 2012, p.120).
É aqui que se faz clara a razão da presença de alguns aspectos peculiares de
diversas das práticas do universo marcial, embasando assim suas
idiossincrasias, como por exemplo: nome de movimentos e/ou posturas,
indumentárias, trejeitos e aspectos comportamentais, uso ou não uso de
determinados materiais específicos (por exemplo, as armas brancas20), dentre
outras.

Sendo o Kung-Fu o objeto de estudo deste artigo, faz-se necessário


deixar claro que a questão cultural chinesa é indubitavelmente um elemento
central desta arte marcial. Hoje o Kung-Fu está espalhado mundo afora (Allen,
2013). Contudo, suas idiossincrasias são em sua imensa maioria oriundas da
China Antiga, carregando consigo elementos tradicionais, tais como:
movimentos e/ou posturas baseadas nas profissões de outrora (cavaleiro,
arqueiro, bombeiro, dentre outros), vestes com acabamento em nós chineses
(coletes, jalecos, faixas, dentre outras), saudações por meio de gestuais
representativos de filosofias e/ou religiões (taoísmo, confucionismo e budismo),
armas que remontam a história e o folclore chinês (bastão, lança, sabre,
espada, kwan dao, leque, dentre outras) e estilos e/ou técnicas baseados em
animais do folclore chinês (leão chinês, dragão, fênix, serpente divina, dentre
outros).

No “nível 4”, relativo à origem histórica, representa-se esquematicamente


o que Tubino, Tubino e Garrido (2007) designam por “esportivização”. Neste
plano, e de forma adaptada ao universo do Kung-Fu, se buscou explanar as
duas vertentes no contexto da referida arte. A primeira segue uma linha

20
Armas brancas são entendidas como “armas de uso manual que não sejam de fogo
utilizadas no cotidiano para ações diversas, como cortar, esmagar, contundir e aprisionar”
(Mocarzel & Columá, 2015, p.55). Sob tal nomenclatura Nasalski (2003), baseado em estudos
linguísticos, alude que a mesma é fruto de dois ideários: o brilho da lâmina metálica e o que o
autor chama de “simbolismo branco”, advindo da ética e pureza do caráter e do espírito, pois aí
repousariam a honra, inocência e morte honorável.

102
tradicional e mais conservadora, onde são expostas de maneira constante não
apenas questões como a eficácia da marcialidade de maneira mais firme e
incisiva, mas ainda conhecimentos profundos sobre a história e filosofia
humana almejando uma “iluminação” (Allen, 2013). A segunda inspira-se na
primeira, porém envereda progressivamente para uma visão adaptada ao meio
desportivo-competitivo, onde obviamente faz-se necessário afastar-se de
diversas das questões tradicionais mais enraizadas e ganha um formato parcial
e mais enxuto, porém ainda significativamente diferente e próprio (Theeboom &
De Knop, 1999; Bäck, 2009; Zheng, 2011). É dito por Cynarski e Litwiniuk
(2011) que essa adaptação foi vital para uma melhor difusão da prática às
crianças e adolescentes de hoje. Contudo, deixa-se claro aqui que a criação de
tal vertente desportivo-competitiva não exime a educação e prática de valores
éticos, morais e estéticos (Abe, 1986; Bäck, 2009; Allen, 2013). De fato,
Brownell (2008) afirma que o Barão de Coubertin21 declarou abertamente ter
consultado Confúcio, dentre outros pensadores, para então estruturar o que
viria a ser a pedagogia esportiva, hoje espinha dorsal da educação olímpica.
Talvez, poder-se-ia dizer aqui, que a busca constante do aprimoramento e da
perfeição, base da filosofia que tece a estrutura conceitual do Kung-Fu, é uma
“versão oriental” do Lema Olímpico, que por sua vez, também prega o
desenvolvimento humano.

O Lema Olímpico Citius, Altius, Fortius pode ser traduzido por “mais
veloz, mais alto, mais forte”. Significa uma mensagem de
aperfeiçoamento humano, expressando a conclamação do Comitê
Olímpico Internacional (COI) a todos os participantes do Movimento
Olímpico, convidando-os a uma superação pessoal, de acordo com o
Espírito Olímpico. (Tubino, Tubino & Garrido, 2007, p. 652)

No trabalho de Theeboom, De Knop e Wylleman (1995) são apontadas


três áreas de atuação: (a) “tradicional” que representaria os aspectos filosófico-
educacionais, (b) “eficiência” que abarcaria as práticas marciais de combate e
(c) “esportiva” que convergiria apenas as práticas competitivo-desportivas.
Discorda-se aqui de tal reflexão, pois se defende que os aspectos filosófico-
21
Seu nome era Pierre de Fredy e foi idealizador e organizador dos Jogos Olímpicos da
atualidade (Capinussú, 2007).

103
educacionais não só podem como devem estar inseridos tanto nas práticas
marciais quanto competitivas. Em ambos os universos citados as questões
éticas, estéticas e morais permeiam os ensinamentos e treinamentos dos
praticantes, sendo eles adaptados para situações do cotidiano e
comportamento humano ou sobre o cumprimento de regulamentos desportivos
e normas éticas comportamentais. Novamente, frisa-se aqui que, a imersão,
absorção e incorporação dos valores de cunho filosófico aqui expostos dão-se
desde o primeiro dia ao iniciar o treinamento já em caráter físico, cognitivo e
afetivo-emocional. Enfim, uma busca da visão holística concreta e genuína
(Min, 1979; Lima, 2000; Yonezawa, 2010; Abe, 2013).

Traz-se à luz aqui um breve esclarecimento para evitar conflitos nominais


ou mesmo de terminologia. No início do século XX dentro do universo do Kung-
Fu, a vertente marcial era chamada de Kuoshu enquanto a vertente desportivo-
competitiva era chamada de Wushu Moderno, diferenciação nominal essa que
progressivamente foi abandonada22. Como um dos aspectos diferenciadores
ligado à autodefesa, a vertente tradicional tem seu treinamento voltado à
eficácia da aplicação dos golpes, podendo estes serem extremamente lesivos
ou mesmo, em casos extremos, letais. A vertente desportivo-competitiva muda
radicalmente o foco citado, objetivando o treinamento técnico-tático de seu
praticante para ganhar pontos durante competições orientadas por regras que
aludem a raiz combativa tradicional. Sem tais adaptações seria impossível a
prática competitiva de forma razoavelmente sadia e segura, retornando a
tempos que nos remetem para competições similares às dos gladiadores no
Coliseu em Roma (Mocarzel, 2011). Entretanto, alerta-se que o aumento de
locais de treino exclusivamente focados às competições gera grandes críticas
por parte de adeptos mais conservadores e tradicionalistas (Filipiak, 2010).
Outro aspecto diferenciador do ponto de vista organizacional e ainda
hierárquico advém das regras e normativas no âmbito tradicional, que em regra

22
Em 1928 o governo chinês alterou por decreto de lei o nome Wushu (já conhecido
internacionalmente por Kung-Fu) para Kuoshu, que significa “arte nacional”. Isso se deu com a
intenção de incentivar o espírito nacionalista do país (Li, 1993). Em meados do século XX o
nome Wushu foi convergido para a prática desportivo-competitiva objetivando em longo prazo
conseguir torná-la olímpica (Mocarzel, Murad & Capinussú, 2013).

104
geral, são emanadas pelo mestre, sendo este o indivíduo líder por sua grande
experiência e amplo conhecimento reconhecidos popularmente. Esse
arquétipo, muito frequentemente perspectivado como conservador, lembra de
certa forma o comportamento dos clãs e patriarcados da história humana
(Figueiredo, 2006). Já na vertente desportivo-competitiva, as regências e
decisões são advindas de entidades jurídicas estatutárias (como institutos,
associações, federações, confederações, dentre outras), que instituem
princípios e regras para a população praticante. Como outro elemento distintivo
a ser apresentado, é importantíssimo destacar aqui que se constitui bem
diferente o ideário da relação mestre-discípulo com o da relação professor-
aluno. Sob um olhar sociológico, a relação de mestre-discípulo é comparada a
uma relação familiar, como pai-filho. Habitualmente, o discípulo segue as
orientações de seu mestre, pois tem nessa relação não apenas confiança em
seu superior, mas também uma sensível admiração pelo mesmo (Dalmaso,
2010). Claro que isso não exime ou mesmo elimina a importância do
pensamento crítico-reflexivo do discípulo sobre as colocações feitas pelo seu
mestre. De fato, cabe ao mestre a real posição de se colocar disponível às
críticas e questionamentos para não só ensinar seu discípulo com exemplos
práticos, mas também para ele mesmo continuar em seu caminho de
desenvolvimento pessoal. A relação professor-aluno se estabelece sob um
cunho mais profissional e menos pessoal, tendo na maioria dos casos uma
profundidade importante, porém não tão elevada na vida pessoal do praticante.
Entende-se que toda essa diferenciação de relacionamento vem do
entendimento sociocultural de cada tribo, comunidade, povo ou nação. Diz-se
isso, pois, muitas artes marciais possuem a relação mestre-discípulo não
apenas por tradição, mas também por entender que a experiência de vida e o
reconhecimento popular (título de mestre) podem até mesmo valer mais do que
uma certificação profissional (título de professor).

Entende-se ser compreensível a difusão ou mesmo adaptação da arte


marcial tradicional para outros fins que não a autodefesa, promoção da saúde e
transmissão de valores educacionais, ainda mais sendo o Kung-Fu uma prática
milenar (Acevedo, Gutiérrez & Cheung, 2011). Para além dos três objetivos já

105
narrados, Bäck, (2009) e Mocarzel, Ferreira e Murad (2014) apontam ainda a
competição, o lazer, a estética-cosmética (beleza do corpo)23 e a socialização
como objetivos mais comumente citados por praticantes de Kung-Fu já no
século XXI. Sob um olhar estético filosófico, essa questão dá suporte ao
entendimento da arte marcial como arte em si; um meio de visão, criação e
expressão da sensibilidade e da cultura que se adapta às transformações
sazonais da sociedade humana, afinal Heráclito de Éfeso24 (535 a.C. – 475 a.
C.) já dizia “nada é permanente, exceto a mudança”, reflexão que Lao Tsè25
(604 a.C. – 517 a.C.) já apoiava alegando que a cultura de forma geral é uma
“arte viva” mudando a cada dia (Lao, 2001), como também Dürkheim (1995, p.
303) que afirmava “(...) que a humanidade se faz, se desfaz e se refaz sem
parar (...)”. Isso mais uma vez demonstra a presente compleição estética que
integra o Kung-Fu como é exposto por Veloso e Oliveira Junior (2015), onde a
referida prática é tida como uma possibilidade em busca da estética da
existência. Contudo, independentemente do foco e objetivo do praticante, os
princípios práticos devem sempre ser irrigados pelos ensinamentos pacifistas
derivados do taoísmo e confucionismo (Mocarzel, Queirós & Lacerda, 2016),
buscando manter-se como um exemplo vivo de arte marcial: um caminho
educativo para o corpo, mente e espírito (Abe, 1986; Allen, 2013).

4. Análise hermenêutica de ideogramas do universo marcial

Para a concretização da instauração de valores filosóficos por uma cultura


é necessário que a mesma não só os absorva, mas também os perpetue. A
linguagem e comunicação (escrita e falada) passaram a serem talvez as

23
Viu-se a necessidade de esclarecer que a colocação da expressão “estética-cosmética” se
relaciona apenas com a prática do Kung-Fu como meio de embelezamento corporal do
praticante, não sendo ali profundamente ligada à expressão “estética” como um dos eixos
principais da filosofia.
24
Filósofo pré-socrático considerado "Pai da dialética”.
25
Filósofo considerado fundador do taoísmo (ou daoísmo) e que dentre diversos escritos tem
como sua obra mais famosa o clássico Tao Te King, possivelmente a obra de maior
profundidade poética filosófica e de relevância de toda a cultura oriental.

106
principais ferramentas de transmissão de conhecimento da humanidade. Ao
analisar cuidadosamente a cultura oriental, com um foco especial na cultura
chinesa (uma das mais antigas da humanidade), é possível notar diversos
princípios educacionais de profundo teor filosófico sendo estes princípios
compostos de valores éticos, morais, deontológicos e estéticos (Lima, 2000).
Muitos dos referidos valores tiveram suas origens nos três grandes pilares do
pensamento chinês; o taoísmo, o confucionismo e o budismo e foram
absorvidos, espalhados e propagados pela cultura chinesa através dos tempos
(Acevedo, Gutiérrez & Cheung, 2011; Mocarzel, 2011). Interessante observar
que tais linhas de pensamento até hoje são discutidas como filosofias ou como
religiões (Monteiro, 2015). Porém, independentemente da natureza filosófica ou
religiosa do valor, a sabedoria e prática cotidiana do mesmo podem ser vistas
com grande importância no pensamento chinês (Granet, 1997). Nessa cultura,
os valores devem ser cultivados e propagados por todos, tanto um imperador
quando o chamado homem comum (Lao, 2001).

A transmissão dos valores e princípios educacionais foi pouco a pouco


atingindo as diversas esferas da sociedade chinesa com o passar dos séculos,
buscando torná-la mais harmônica e civilizada. Assim, tal pensamento enaltece
a virtude do pacifismo, um dos principais ícones dos três pilares filosófico
religiosos. A arte marcial chinesa, símbolo marcante dessa cultura, não foi
diferente e rapidamente inseriu tais princípios em seu meio. Contudo, é comum
observar até dias atuais pessoas leigas questionarem a transmissão de valores
de ordem pacifista em práticas marciais (que, de forma aqui extremamente
superficial e simplista, podem ser utilizadas como meio para matar alguém).
Para melhor entendimento do pensamento chinês torna-se interessante uma
análise e reflexão de seus ideogramas, pois como já alertado por Bowman
(2015), muitos dos significados essenciais (principalmente os mais subjetivos)
não raramente se perdem com as traduções. Sabidamente, a escrita chinesa é
uma verdadeira e profunda arte da comunicação, pois nela não se realiza
apenas uma troca rápida de informação. Os ideogramas chineses estão
consubstanciados em uma riquíssima gama de metáforas poéticas e
simbologias históricas, dando margem para longos estudos e reflexões

107
literárias (Green, 2003). De certa forma, os ideogramas chineses muitas vezes
buscam representações muito mais profundas do que sua interpretação literal
ou transliteração. Pode-se dizer que em diversas situações, tais símbolos
tocam o conceito de alegoria sob o prisma filosófico, onde assumem
representações que podem envolver mitos, contos, entidades, simbologias e
afins, não representando apenas fatos comuns, mas sim uma síntese elevada
à esfera poética (Abbagnano, 2014).

É nessa guisa que ao analisar alguns ideogramas tidos aqui como pilares
da temática deste estudo, os mesmos revelam algumas interpretações mais
profundas muito significativas para uma reflexão e entendimento de natureza
filosófica no universo marcial. Dando início pela expressão “arte marcial” por

meio dos significados dos ideogramas da expressão “Wushu” (武术), nome

original da arte marcial hoje conhecida por Kung-Fu. Notam-se significativas


inclinações pacifistas onde estas se afastam do ideário de violência tido por
alguns leigos. De forma detalhada é esclarecido por Santos (2014, p. 1) que:

O ideograma wǔ (武) é o que melhor resume na concepção chinesa


tudo que se liga a arte de ataque e defesa. É constituído de dois
signos: zhǐ (止) e gē (戈). Gē é arma e pictograficamente assemelha-
se a um tipo de lança, sendo reconhecida como uma arma de ataque
muito poderosa. O signo zhǐ pode significar parar, pés, caminhar,
marchar ou agir, dando a ideia de ações de luta e guerra ou mesmo
parar a guerra. Pictograficamente, zhǐ evolui de um retângulo que
simbolizava um castelo e dos signos de pés que representam
caminhada ou marcha. Combinando os dois signos, o significado de
wǔ é ‘marcial’, ‘militar’. Na língua moderna chinesa, arte é yìshù (艺术
), sendo que shù (术) significa técnica, habilidade ou modo.

Assim sendo, a interpretação da expressão “arte marcial” através dos


ideogramas chineses expressam literalmente “arte de parar a guerra”, o que
diretamente dá suporte ao ideário pacifista afastando-se do pensamento de
violência. É no mínimo curioso e contraditório que tal prática no Ocidente
receba uma nomenclatura derivada do Deus greco-romano da guerra “Marte” e
seja ressaltada tão somente como “arte da guerra”. A priori, demonstra-se
assim uma significativa diferença de entendimento e significado hermenêutico
quando analisado por lentes históricas ocidentais e orientais. Mais; Donohue e

108
Taylor (1994) ainda acrescentam que o eixo principal do pensamento
hermenêutico oriental aqui exposto não nasce ou tem relação com aspectos
geográficos (práticas orientais ou ocidentais). De fato, destacam que as
práticas tidas como arte marcial têm sim um alto senso de refino cultural e
estético, dando respaldo ainda à máxima de Sun Tzu que declara abertamente
que “o verdadeiro caminho da guerra é a vitoriosa paz” (2006, p. 16). Ou seja,
entende-se assim que a harmonia e paz são o fim maior e que o meio belicoso
deveria ser sim a última alternativa de alcance à harmonia. Para além disso,
Lao Tsè já caracterizava as armas como instrumentos nefastos dizendo que as
mesmas só deviam ser utilizadas em último caso. Se o corpo humano passar a
ser visto como arma após o adquirir de proficiência marcial então o
entendimento anterior passa a ser ampliado ao próprio ser humano em uma
visão pacifista ainda mais alargada.

Convergindo agora a um melhor entendimento dos aspectos filosóficos


que constituem o Kung-Fu de forma mais ampla, defende-se aqui a
necessidade de realizar uma análise e interpretação dos ideogramas que
formam sua nomenclatura. Por muitas vezes ao se estudar o Kung-Fu, tal
questão passa despercebida ou ainda é observada de maneira muito
superficial ou mesmo leviana, ignorando a maior profundidade que esse tema
pode expor. Ao que tange os ideogramas chineses, a hermenêutica é apenas
parte do processo, pois ainda faz-se necessário a desconstrução e
reconstrução dos ideogramas para seu maior entendimento, exibindo assim
suas questões filosófico-culturais carreadas ao passar dos tempos. Em um
estudo doutoral pioneiro na língua portuguesa em sua época, Lima (2000)
disseca e detalha cada ponto importante dos referidos ideogramas,
apresentando suas variações de interpretação, tanto de forma simples quanto
de forma mais reflexiva, algo que poderia ser visto como uma expressão
poética, imersa em beleza ética e estética.

Inicialmente são apresentados abaixo os ideogramas que compõem a


referida expressão, objetivando expor suas interpretações tanto quando
analisados separadamente ou uno a outros:

109
Ideogramas que formam a expressão Kung-Fu.

Ideogramas que formam a expressão Kung.

Ideograma que pode ser traduzido como “mente”.

Ideograma que pode ser traduzido como “força”. Em sua representação


gráfica traz um desenho de um arado.

Ideogramas que formam a expressão Fu.

Ideograma que pode ser traduzido como “ser humano”. Em sua


representação gráfica traz um desenho de uma pessoa andando.

Ideograma que pode ser traduzido como “presilhas de cabelo”.

Quadro 1: Ideogramas chineses que compõem o termo “Kung-Fu” (Lima, 2000).

A arte marcial Kung-Fu era chamada apenas por Wushu na China.


Porém, o termo “Kung-Fu” ficou mundialmente conhecido quando o cinema no
século XX incluiu em diversos roteiros cenas de acrobacias e lutas com atores
chineses praticantes de Wushu. Quando os mesmos eram indagados por

110
ocidentais como conseguiam efetuar movimentos de grande plasticidade e
beleza, os atores/artistas marciais apenas respondiam: “Kung-Fu!” (Mocarzel,
2011). Sob um sentido interpretativo do significado pode ser entendido como:
“tempo e esforço desprendido numa atividade” ou “grau de perfeição alcançado
em qualquer área de atuação”, ou ainda, “conhecimento profundo de um
assunto” (Hirata & Del Vecchio, 2006, p.3). Já Apolloni (2004, p.74) coloca que
o termo “expressa uma habilidade intuitiva obtida pela repetição intencional de
uma ação”. De forma mais generalista, Lima (2000) alude ser a busca
constante da perfeição, mesmo que tal busca seja efêmera como cita Monahan
(2007). Alguns ainda conceituam resumidamente como “trabalho duro”
(Jefremovas, 2003, p.16). Mais recentemente, Koppe (2009, p.22) posicionou-
se dizendo que Kung-Fu seria “habilidade adquirida através de um longo
período de treino”. Portanto, conclui-se que, a expressão “Kung-Fu” denota:
qualquer grande conhecimento e/ou prática alcançados após muito esforço,
trabalho e treino árduo e que se aperfeiçoam com o tempo de prática,
incluindo-se aqui a caligrafia, pintura, escultura, e claro, arte marcial. É de se
observar novamente o entendimento holístico e a riqueza ética e estética do
sentido dessa prática, trazendo à luz a dedicação, o zelo e o empenho nas
práticas não apenas marciais, mas sim cotidianas do ser humano, indicando
assim para além de uma atividade física, um meio competitivo desportivo ou
tão somente uma forma de autodefesa, mas sim uma filosofia de vida, que
misturam práticas de delicadeza e rigidez, do físico e mente, de criação e
recriação constantes (Andraus, 2012; Ng 2016). Por meio dessa (re)educação
o ser humano se re(molda), pois como já aclarava Aristóteles (2015), somos o
que repetidamente fazemos, sendo a excelência um hábito a ser construído
com o aperfeiçoamento constante da prática.

5. Ao modo de conclusão

Este estudo buscou discutir sob uma análise hermenêutica alguns dos
mais importantes conceitos e respectivas designações do meio do universo
marcial que, não tão raramente, são tomados como sinônimos. Através de uma

111
desconstrução e reconstrução, a reestruturação da taxonomia proposta por
Mocarzel (2011) objetivou apresentar diferenciações e evidenciar valores de
natureza ética, moral e estética contidos principalmente no conceito “arte
marcial” e fazendo ligação com a essência conceitual filosófica do conceito
“Kung-Fu”.

Sob uma ótica histórica, entende-se que ficou exposto que com as
transformações e modificações do pensamento humano, fruto dos
desenvolvimentos histórico-socioculturais, as práticas do universo marcial
transformaram-se e, consequentemente, os temas que as designam hoje
reconfiguram o seu significado, o entendimento das próprias terminologias ou
ainda a própria prática em si, alterando-as significativamente em sua essência.
Fica claro que apenas será possível um entendimento unívoco dos conceitos
abordados no universo marcial caso os mesmos não sejam analisados em sua
base hermenêutica e essencialmente filosófica de maneira profunda. Por meio
da reestruturação da taxonomia aqui proposta, destacaram-se diversos
embasamentos filosóficos (tanto de natureza ocidental quanto oriental) e
designação do conceito de arte marcial como uma educação e prática pacifista,
aludindo como um exemplo da cultura chinesa o Kung-Fu, imerso em questões
filosóficas, nomeadamente a ética, a moral e a estética.

Defende-se que este estudo trouxe suas contribuições para ajudar a


instigar outras pesquisas fundadas em argumentos legitimados pela
sustentabilidade académica, buscando afastar-se de um comportamento mais
entusiasta e superficial do senso comum. Explorou-se aqui a categorização das
práticas do universo marcial fundada em argumentos que se inscrevem no
domínio filosófico, histórico, cultural e educacional, sinalizando as diferenças e
peculiaridades de cada prática. Entende-se que a taxonomia incluída neste
estudo (e cuja representação gráfica se explanou na figura 1), expõe as
principais, ou mesmo essenciais diferenças de cada prática presente no
universo marcial. Já sob o foco do Kung-Fu, as peculiaridades desta arte
marcial receberam luzes e destacaram-se diversas de suas singularidades
demostrando, como cita Nulty (2017), algo muito além de técnicas marciais e
treinamentos intensos. As reflexões salientadas neste estudo não foram triviais

112
e reforçam a legitimação da importância do entendimento e compreensão das
raízes filosóficas que embasam o universo marcial, salientando suas bases
educativas.

Recomendam-se mais estudos visando óticas filosóficas sobre as práticas


do universo marcial, para que estes possam trazer novas interpretações,
críticas e reinterpretações que sempre serão necessárias por conta da
constante transformação e evolução deste domínio de estudo. A importância
desta área é salientada por Bowman e Judkins (2017) no seu trabalho, no qual
questionam: Is Martial Arts Studies Trivial?

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121
Resumo:
Kung-Fu é uma antiga prática chinesa que entronizou filosofias pacifistas em
sua essência, buscando assim proporcionar um processo de autorreflexão
constante do praticante em prol de uma elevação ética e estética. Este estudo
objetivou identificar as dimensões das práticas do Kung-Fu tradicional com
acentuado cunho ético e estético, e mais especificamente, indagar em que
medida o Kung-Fu tradicional pode colaborar com o processo educativo de
seus praticantes em seu cotidiano, designadamente no que se refere à
educação ética e estética. Foram entrevistados três Mestres de alto renome
mundial. Através de seus discursos, podem-se ver princípios éticos e estéticos,
como espírito familiar, respeito hierárquico, harmonia, perseverança, honra,
beleza, virtude, tradição humanização e pacifismo.
Palavras-chave: Kung-Fu. Ética. Estética. Filosofia do Desporto. Filosofia
oriental e ocidental.

1 INTRODUÇÃO

O Kung-Fu (功夫) é uma arte marcial, conceito que busca o aprimorar do


corpo, de técnicas combativas e ainda o aprendizado da filosofia e valores
(MOCARZEL; COLUMÁ, 2015). Assim, preconiza atingir uma educação
holística entre corpo, mente e espírito (LIMA, 2000). Historicamente, o Kung-Fu
adveio da China tendo mais de quatro milênios de existência documentados
(TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007; ACEVEDO; GUTIÉRREZ; CHEUNG,
2011). Sua compleição se estrutura em torno do espírito filosófico
milenarmente permeado na cultura chinesa, onde ecoam ensinamentos dos
chamados três pilares filosófico-religiosos do Oriente: taoísmo, confucionismo e
budismo (LIMA, 2000; APOLLONI, 2004; ILUNDÁIN-AGURRUZA, 2014). É
dessa prática que se constitui o chamado Kung-Fu tradicional, mantendo vivas
tradições e comportamentos de profundo cunho filosófico, deixando em
segundo plano as práticas competitivo-desportivas (FERREIRA; SOUZA;
MARCHI JÚNIOR, 2017). É necessário esclarecer que o Kung-Fu tradicional
hoje mantem tais relações apenas em vertente filosófica e não religiosa, sendo
esta última apenas histórica. Já sob o foco competitivo, Tralci Filho (2016)
expõe, após entrevistas com Mestres de Kung-Fu tradicional, que a vertente
desportivo-competitiva atual é mais tecnicista enquanto a tradicional abraça
questões culturais almejando que estas não sejam esquecidas com o tempo,
pois são notados ali valores.

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Quando analisada a estrutura do Kung-Fu tradicional observa-se que o
mesmo se divide em centenas de estilos – fontes de inspiração para criação e
prática das técnicas marciais imersas em cunho filosófico (LIMA, 2000;
MOCARZEL, 2011). Os estilos possuem também uma organização social que
se assemelha aos antigos clãs com suas hierarquias peculiares, havendo uma
divisão clara entre superior e subalterno, respectivamente nomeados Mestre e
discípulo. No meio marcial, tal relação é tida como mais valorosa que uma
relação de professor e aluno, adentrando em patamares de confiança bem
mais profundos, sendo esta relação comparada a vínculos familiares
consanguíneos (DALMASO, 2010). Os Mestres de Kung-Fu tradicional não são
só antigos praticantes, mas pessoas que dedicaram boa parte de suas vidas ao
estudo e incorporação das técnicas e ensinamentos filosófico-educacionais,
tendo notório saber e reconhecimento pela comunidade marcial, indo para além
da técnica, objetivando atingir um comportamento virtuoso. Tal elevação
virtuosa seria advinda de práticas constantes no dia a dia de um
comportamento ético e estético com tudo e com todos. Afinal, seguindo uma
interpretação hermenêutica, a expressão “Kung-Fu” significa resumidamente
“qualquer grande conhecimento e/ou prática alcançados após muito esforço,
trabalho e treino árduo e que se aperfeiçoam com o tempo de prática,
incluindo-se aqui a caligrafia, pintura, escultura, e, claro, arte marcial”
(MOCARZEL, 2011, p. 32). Outros autores reforçam tal conceito, como Hirata e
Del Vecchio (2006, p.3) dizendo que a expressão tem por significado: “tempo e
esforço desprendido numa atividade” ou “grau de perfeição alcançado em
qualquer área de atuação”, ou ainda, “conhecimento profundo de um assunto”.
Já Apolloni (2004b, p.74) coloca que o termo “expressa uma habilidade intuitiva
obtida pela repetição intencional de uma ação”. De forma mais generalista,
Lima (2000) alude ser a busca constante da perfeição. Logo, entende-se que
seu aperfeiçoamento não repousa apenas nos estudos bélicos e/ou marciais,
mas no zelo e respeito diário em prol de um bem maior e coletivo. Enfim, fazer
algo bem para o Bem. Aí repousa sucintamente o valor ético e estético do
Kung-Fu.

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Sob esse prisma, os ensinos de tais Mestres são tidos como valorosos.
Porém, para a grande maioria dos ocidentais, há dificuldade de assimilação de
tais ensinamentos pelo desconhecimento dos dialetos chineses. Acresce-se a
isso a secular característica cultural chinesa de transmissão oral (GRANET,
1997) incorporada ao meio marcial até hoje (SHAHAR, 2011; FERREIRA;
MARCHI JÚNIOR; CAPRARO, 2014), atribuindo ainda mais valor ao que foi
narrado pelo Mestre (FERREIRA, 2005). Contudo, tal peculiaridade fez com
que se tenha hoje pouco material escrito credível sobre a temática do Kung-Fu
tradicional (LU, 2008), o que se torna mais escasso ainda em idioma português
(MOCARZEL; QUEIRÓS; LACERDA, 2016).
Assim, este estudo objetiva identificar as dimensões das práticas do
Kung-Fu tradicional com acentuado cunho ético e estético, e mais
especificamente, indagar em que medida o Kung-Fu tradicional pode colaborar
com o processo educativo de seus praticantes em seu cotidiano,
designadamente no que se refere à educação ética e estética.

2 METODOLOGIA

O estudo é qualitativo (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2007) e com


uso de entrevistas semiestruturadas individuais e em profundidade (BAUER;
GASKELL, 2007) para o levantamento das informações qualitativas. Assim o
entrevistador pode questionar focado objetivamente no tema principal da
pesquisa e permite que o entrevistado responda de forma livre e espontânea
(ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2002), possibilitando ainda
“explorações não previstas, oferecendo liberdade ao entrevistado para dissertar
sobre o tema ou abordar aspectos que sejam relevantes sobre o que pensa”
(NEGRINE, 1999, p.74). As entrevistas ocorreram entre novembro de 2017 e
outubro de 2018.
As entrevistas foram realizadas tanto presencialmente quanto por
videoconferência, em locais considerados pelos entrevistados de ambiente
cordial, para estimular respostas francas e verdadeiras em seu inteiro teor, sem
intimidar os participantes (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2007). Elevando

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a credibilidade da pesquisa, efetuou-se a “checagem pelos participantes”
(NEGRINE, 1999, ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNADJER, 2002).
Elencaram-se como entrevistados três Mestres de Kung-Fu tradicional
reconhecidos mundialmente por seus méritos no universo marcial e que
capitaneiam estilos tradicionais largamente difundidos em âmbito internacional.
Espera-se que tal relevância dê suporte, valor e fidedignidade ao estudo. São
eles (nomes em negrito na ordem que as entrevistas ocorreram):
Lily Lau – Nascida em 12/12/1945 em Pequim (China). Maior
representante do estilo Garra de Águia no mundo. Fundou e comanda a Lily
Lau Eagle Claw Kung Fu Federation International. Atualmente a única mulher
no mundo a chefiar um estilo de Kung-Fu. Filha do já falecido Grão-Mestre Lau
Fat Mang, famoso artista marcial que ajudou a defender a China contra o
Japão na II Guerra Mundial. Foi Instrutora Chefe de Kung-Fu da Hong Kong
University Student Union. Atuou em diversos filmes culturais chineses sobre
Kung-Fu e ópera chinesa. Ajudou a fundar e gerenciar diversas entidades de
Kung-Fu pelo mundo. Laureada em 2013 com o Extraordinary Martial Artist of
the World, prêmio honorário por suas realizações e conquistas. Possui alunos
em 18 países e reside no estado da Califórnia (Estados Unidos da América).
Leo Imamura – Nascido em 18/03/1963 em São Paulo. Principal
representante do estilo Ving Tsun na América do Sul. Fundou e comanda o Clã
Moy Yat Sang de Ving Tsun. Único discípulo no Brasil do já falecido Mestre
Moy Yat. Formado em Direito pela Universidade de São Paulo e em Educação
Física pela Faculdade de Educação Física de Santo André. Desenvolveu e
implantou em 2003 o Programa Moy Yat Ving Tsun de Inteligência Marcial,
onde tutela o que denomina “vida Kung-Fu”. Foi ainda professor na
Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Possui alunos em 12 países e
reside no estado de São Paulo (Brasil).
Thomaz Chan – Nascido em 01/12/1967 em São Paulo. Filho do Grão-
Mestre Chan Kwok Wai, uma das maiores autoridades do estilo Shaolin do
Norte no mundo (dentre outros estilos). Ocupa o posto de Diretor Técnico Geral
da Confederação Brasileira de Kung Fu/Wushu, tendo sido peça-chave para o
crescimento e reconhecimento da Seleção Brasileira de Kung-Fu no cenário

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internacional. Iniciou sua formação em Wushu Moderno na Beijing University of
Physical Education (atualmente Beijing Sport University), tornando-se
referência no Ocidente como atleta e treinador. Colaborou na criação de
diversas entidades do Kung-Fu no Brasil. Converge sua docência ao Brasil e
reside no estado de São Paulo (Brasil).
As entrevistas buscaram captar a história oral narrada pelos Mestres.
Nunes (2011) diz que tal ferramenta de estudo ganha brilho na temática da arte
marcial no meio acadêmico, algo ainda reforçado por Ferreira (2013) quando
convergido ao Kung-Fu tradicional. Entretanto, apesar de reconhecer o valor ali
contido, tais narrativas carecem de contornos acadêmicos (MATOS, 2013).
As colocações dos Mestres sobre as manifestações éticas e estéticas no
Kung-Fu foram refletidas, analisadas e posteriormente dispostas através de
categorias temáticas do discurso (GADET; HAK; MARIANI, 1997). O método do
discurso da história oral já é preconizado por Ferreira, Marchi Junior e Capraro
(2014) como método de pesquisa pertinente no meio marcial por conta da
significância social e educativa da cultura da transmissão oral ali consolidada.
Seus discursos estão a seguir dispostos em itálico.
Como esta pesquisa se inscreve num âmbito marcadamente heurístico,
optou-se por deixar o entrevistado desenvolver o seu pensamento de forma
mais livre, permitindo considerações que, apesar de ausentes do guião da
entrevista, foram relevantes aos olhos dos entrevistados. Posteriormente os
dados foram analisados pelo pesquisador e os se mostraram pertinentes para o
estudo da temática em análise, foram considerados.

3 ANALISANDO E DISCUTINDO AS ENTREVISTAS

3.1 Ser um praticante de estilo tradicional

As narrativas dos Mestres convergem sobre essa temática, deixando


claro que há uma unidade de pensamento neste tópico. O conceito “tradicional”
carrega consigo um conjunto de memórias e vínculos com Mestres
antepassados dos respectivos estilos em proporções profundas. Por conta

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disso, parece exalar daí um sentimento de necessidade de máximo zelo pela
prática hoje, objetivando assim não manifestar desrespeito à memória dos
antepassados.
Expondo um segmento do discurso do Mestre Leo Imamura, ele coloca
criticamente que ser um praticante de estilo tradicional
é ser integrante de uma família que detém conhecimento do Kung-Fu
sendo aceito por ela. (...) Dessa forma, tudo que aquele estilo
tradicional proporciona passa a ser mais valorizado e praticado.
Contudo, o desejo do brasileiro (e mesmo do ocidental de maneira
geral) é ir logo ao aprendizado de modo pontual e específico, não
desejando obter o conhecimento de forma convivial e geral (como
acontece com o oriental habitualmente). No Oriente, isso se dá para
que você possa entender e absorver os costumes e valores daquele
grupo, para aí sim ter acesso às questões técnicas da prática marcial
do estilo.

Somando-se às colocações acima, Mestre Thomaz Chan enfatiza o valor


contido na história que é perpassado de geração em geração nos estilos
tradicionais. Diz que ser um praticante de estilo tradicional

é ser uma pessoa de sorte por ter acesso a tamanho conhecimento! É


aprender e praticar atitudes cotidianas que te ajudam a ser uma
pessoa melhor. Não digo apenas sobre a prática marcial técnica, mas
sobre o valor educativo de maneira geral. Além disso, vejo como algo
muito valoroso isso ser passado por nossos antepassados de
geração em geração através do ensino e do exemplo.

Para Grã-Mestra Lily Lau sua visão se mistura com seu legado familiar,
pois a família Lau já é protagonista na difusão de um estilo tradicional há
gerações. Além disso, a referida Grã-Mestra fez um juramento no leito de morte
de seu pai que daria continuidade à propagação de seus conhecimentos
marciais. Apesar de este último caso soar como um relato poético atenta-se
aqui para o entendimento honroso que tal visão carrega. Tal continuidade é sob
um espectro amplo uma demonstração prática de respeito e gratidão aos
antepassados e antigos praticantes que colaboraram para que aquela prática
chegasse até ali através dos tempos. Já sob um espectro específico, a Grã-
Mestra relata que é uma forma de relembrar seu pai. Enfim, uma forma
particular carinhosa e íntima de memória filial. “Meu pai estava me ensinando e
me amava dessa maneira.” Relembra-se aqui que amor e piedade filial são

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virtudes confucionistas (CONFÚCIO, 2012) e que tal filosofia alicerça a
educação comportamental perpetuada no Kung-Fu tradicional.
Em meio às afirmações acima, acredita-se ser importante trazer à luz
duas reflexões. A primeira é ressaltada por Lima (2000), onde enfatiza que o
entendimento do termo “marcial” para cultura oriental traz um conjunto de
significados diferente do entendimento ocidental. É uma luta interna consigo
mesmo. É a superação dos próprios sentimentos egoísticos (BÄCK; KIM,
1979). Assim, na prática cotidiana de um artista marcial tradicional, buscar a
demonstração de humildade ouvindo os mais experientes seria o natural. Em
uma segunda reflexão, observam-se com maior rigor acadêmico as possíveis
situações avaliando se seriam “tendenciosas”. Para tal questionamento poder-
se-ia criticar aqui a influência familiar do Mestre Thomaz Chan e da Grã-Mestra
Lily Lau, afinal suas famílias são profundamente enraizadas em tais práticas.
Contudo, observa-se que a narrativa do Mestre Leo Imamura faz tal crítica cair
por terra, já que vem respaldar as citações dos outros Mestres e o mesmo não
possui vínculo marcial familiar ascendente, demonstrando que a visão narrada
pelos Mestres é compartilhada pela comunidade tradicional. Segundo Tralci
Filho (2016), dá-se aí um exemplo de tradição no Kung-Fu, onde o sistema
educacional é salvaguardado pelas gerações seguintes.
Ao que tange a perpetuação desse sistema comportamental adotado no
Kung-Fu tradicional, vê-se como necessário um detalhamento e análise de
maior profundidade para melhor compreensão de sua natureza. Respaldando o
princípio educativo das artes marciais, Ilundáin-Agurruza (2014, p.464) defende
que as artes marciais: “são formas práticas e normativas notáveis que dão
ética, estética e princípios existenciais e valores”. Logo, faz-se evidente que os
valores éticos e estéticos são falanges de tal estrutura educacional e que
devem ser descortinados.

3.2 Ética no Kung-Fu

Os Mestres adentraram em terrenos histórico-culturais, enaltecendo sua


representatividade para além dos praticantes de Kung-Fu, conduzindo suas

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narrativas ao povo chinês e oriental. Apontam unanimemente que as bases
filosóficas do Kung-Fu têm suas raízes principalmente no confucionismo e que
dele absorveu-se as questões humanistas do que chamam Wu De (武德), o
código de ética marcial do Kung-Fu tradicional, onde se ressaltam as virtudes
almejadas pelo praticante (MOCARZEL; QUEIRÓS; LACERDA, 2016;
COCENZO, 2018).
A Grã-Mestra Lily Lau afirma: “o Kung-Fu tradicional faz parte da cultura
chinesa. E a cultura do Kung-Fu tem o foco no Wu De como sua filosofia. Eu
quero espalhar isso para outras pessoas através do Kung-Fu: saúde, paz,
aprendizado”. Contudo, é interessante apontar uma profunda reflexão tecida
pelo Mestre Leo Imamura que adentra criticamente os meandros dessa
temática, onde ele correlaciona a importância da prática diária não só do
praticante iniciante como do Mestre.
No Kung-Fu busca-se desenvolver uma ética através de uma prática
moral própria, aflorando valores muitas vezes não enfatizados na
sociedade convencional ou mesmo da sociedade que percebemos.
Isso vem como uma particularidade das artes marciais, que por sua
vez fazem parte de uma filosofia maior que seria o Kung-Fu. Esse
último, explicando de maneira mais simples, seria uma habilidade
incorporada e manifestada concretizando-se através da prática
constante. Essa prática é pessoal e singular, não sendo ensinada e
sim somente aprendida. Ou seja, aí reside um profundo pensamento
confucionista que a habilidade se adquire através do desenvolvimento
humano. Ele se aprende com a convivência com o próximo. Por isso
talvez não devêssemos chamar os locais de treinos de Kung-Fu de
“escolas” ou “academias”, mas sim de “recinto marcial”. O verdadeiro
Kung-Fu é aprendido através de um processo convivial. Você deve
conviver com pessoas que já têm esse processo mais desenvolvido e
aquilo evolui com a convivência e não por meio de cursos e
seminários. Se você está aprendendo Kung-Fu de maneira não
convivial, então você não está aprendendo Kung-Fu tradicionalmente.

Aí nota-se o ideário confucionista de “etocracia”, que segundo Murad


(2009), busca na educação a elevação do poder dos valores éticos e dos
comportamentos morais, tendo os líderes do povo como exemplos aos seus
subordinados. Logo, entende-se que o Mestre tem mais responsabilidade e
deve se manter numa constante autovigia, sabendo que seu comportamento
(zeloso ou não) influencia a si e seus orientandos como exemplo (bom ou
mau).

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Ainda sob uma visão ética, Mestre Thomaz Chan enfatiza que o
processo educativo no Kung-Fu tem seu início no Wu De, ressaltando ainda
que os ensinamentos combativos práticos só devem vir após esse processo.
Mais, ressalta que a prática de todos deve ser perpétua e que assim, pouco a
pouco, as mudanças acontecerão.
Tudo no Kung-Fu começa no Wu De. Qualquer técnica só deve ser
ensinada após a orientação do que vem a ser o Wu De. É por ele que
nos guiamos e nos pautamos para nosso comportamento dentro e
fora de um treino de Kung-Fu. É pra vida! Isso se dá todo dia. No
respeito aos compromissos e horários, no zelo com as coisas à volta,
na forma como tratamos os outros. Nos treinos, ao cumprimentar os
antepassados e os colegas de treino, em estar com o uniforme
adequado e limpo, é estar atento quando estiver recebendo
orientações, é ter paciência com os erros e dúvidas dos menores de
idade ou mesmo menos graduados. Enfim, com paciência e tempo o
Wu De vai se tornando nossa prática e não só teoria. Nesse meio
tempo, as mudanças comportamentais vão acontecendo pouco a
pouco. Em relação às técnicas marciais, elas são secundárias. São
ensinadas, porém o foco maior deve sempre ser o Wu De, seja qual o
objetivo que for do praticante.

Dessa forma, o Kung-Fu como ferramenta educativa se transforma em


um dos meios de consolidação da cultura oriental preconizando (mesmo que
indiretamente) princípios confucionistas imersos em atos éticos pacifistas.
Enfim, é por meio dessas qualidades volitivas e do autodomínio que o ser
humano faz suas escolhas de ação, gerando consequências socioculturais,
inclusive a transformação de pensamento de todo um povo através dos
tempos, constituindo o habitus: “(...) princípio gerador e unificador que retraduz
as características intrínsecas e relacionais de uma posição em um estilo de
vida unívoco, isto é, em conjunto unívoco de escolhas, de bens, de práticas”
(BOURDIEU, 1996, p.21). Uma matriz cultural (MURAD, 2009) que não pode
nem deve ser desprezada. A base da educação de uma cultura é permeada
desses princípios éticos e morais (KANT, 1996).
Assim, apresentam-se dois exemplos que demonstram uma compleição
ética nos atos cotidianos na prática do Kung-Fu tradicional. Primeiramente,
descreve-se aqui a saudação utilizada no Kung-Fu tradicional. Tal saudação
(figura 1) é executada com as mãos unidas afastando-se do coração em
direção à pessoa saudada e os braços dispostos em círculo. Nesse ponto
destaca-se o significado que a saudação deve “vir do coração” com sinceridade

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e generosidade. A mão direita fica em punho cerrado representando a
agressividade, contudo a mão esquerda fica aberta abarcando a mão esquerda
representando a cortesia que se sobrepõe à agressividade. Logo, vê-se aí uma
representação do Tao, simbologia filosófica do caminho em busca da
harmonia.

Figura 1: Saudação tradicional do Kung-Fu.


(Fonte: Câmara Shaolin).

Como segundo exemplo, expõe-se abaixo uma postura executada em


dupla muito comum nas práticas do Kung-Fu (figura 2). Tradicionalmente
conhecida como Tui Shou (推手) ou “empurrar mãos”, essa técnica é também
informalmente citada como “conhecer amigos através das artes marciais”. Uma
postura básica ensinada a praticantes iniciantes, pela qual buscam aumentar
sua percepção e controle do seu corpo com auxílio do seu companheiro de
treino. A isso se somam duas dimensões de contornos éticos: a progressão
pedagógica na arte marcial e o aspecto cooperativo.

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Figura 2: Conhecer amigos através das artes marciais. (Fonte: vídeo demonstrativo da Grã-Mestra Lily
Lau apresentando a técnica em dupla “72 Joint Locks Eagle Claw Chin Na”).

A progressão pedagógica nas artes marciais narra que a técnica não


apenas deve ser ensinada da mais fácil para a mais difícil, como preconizam os
entendimentos pedagógicos, mas ainda deve ser pautada da mais branda para
a mais lesiva (MOCARZEL, 2011). Assim, entende-se que as técnicas que
estão sendo ensinadas devem ser avaliadas para se ter cuidado não só com o
praticante, mas também com as pessoas à volta dele. Uma preocupação de
cunho pacifista, observando se o praticante já tem maturidade suficiente para
entender que tais técnicas não devem ser utilizadas de maneira leviana. Além
disso, o aspecto cooperativo nas artes marciais busca a compreensão que a
pessoa que lhe acompanha é seu companheiro de treino, merecendo todo
respeito e cuidado. Isso se estende a qualquer atividade dentro e fora de
recintos marciais, incluindo competições desportivas. O “adversário” é um
colega que está auxiliando no seu desenvolvimento. Um entendimento muito
diferente de “inimigo” que se aproxima de um sentimento de barbárie, algo que
nas artes marciais (incluindo Kung-Fu) buscam se afastar veementemente
(LIMA, 2000). Logo, o objetivo de fazer amigos utilizando o Kung-Fu como um
meio para tal passa a ser plausível. La Boétie (1997) diz que só quem leva uma
vida ética tem amigos, pois quem não leva, tem cúmplices. Mais, afirma ainda
que os “maus” não têm amizade, apenas se entre temem. Tais frases se ligam
ao pensamento de amizade, fraternidade, companheirismo e unidade familiar

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do confucionismo. Enfim, a ética deve ser verdadeira nas atitudes e ainda mais
no íntimo do ser (CORTELLA, 2016).

3.3 Estética no Kung-Fu

A análise das entrevistas evidenciou que as opiniões dos Mestres se


entrelaçam, descortinando um emaranhado estético que ultrapassa a prática
marcial exclusivamente no treino, sendo transposta também para a vida diária.
Donohue e Taylor (1994) entendem que arte marcial é uma prática refinada
com profundo senso cultural estético. Contudo as narrativas exploram o âmago
humano, o bem do espírito, o que a filosofia ocidental habitualmente chama por
“virtudes”.
A Grã-Mestra Lily Lau sucintamente expressa que o Kung-Fu se constitui
de estética, afirmando que o mesmo é composto de “(...) arte, beleza e
habilidade”. Esclarece ainda que o cerne se encontra na intenção advinda do
coração do praticante. Assim a ação pode ser melhorada e refinada, mas o
bom sentimento se faz como ingrediente fundamental para alcançar o que
comumente os Mestres chamam de “verdadeiro Kung-Fu”. Complementa a
Grã-Mestra dizendo: “e a beleza não é apenas pelas suas maneiras; vem do
seu coração. Por isso, se você tem um bom coração, você tem Wu De e
quando você se move, será lindo”. Fazendo uma analogia com clássicos
pensadores ocidentais, para Platão a ideia de belo está na essência e para
Aristóteles a ideia de belo está na concretização. Poder-se-ia ponderar aqui
que talvez o ideal da prática cotidiana do Kung-Fu esteja em um terreno
intermédio, na busca pela harmonia na vida. Enfim, o trilhar do Tao (LIMA,
2000; LAO, 2001).
Por sua vez, Mestre Leo Imamura destrincha o pensamento sobre a
prática do Kung-Fu ser uma prática para toda vida. Entretanto, faz suas
ressalvas através de óticas culturais, buscando esclarecer uma das
dificuldades de transportar o Kung-Fu que é uma prática enraizada na cultura
chinesa para o mundo ocidental.
O chinês não tem a mesma visão sobre a aplicação. Da forma como
conhecemos aqui, a aplicação é uma visão grega, onde se busca

133
aplicar a teoria à prática. Já o chinês vê aquilo como um processo
exploratório. Um momento de exploração de uma união. Por isso o
movimento de incorporação de animais (como por exemplo, uma
águia) busca as qualidades daquele animal inspirador. Ali se dá algo
além do gestual, algo estético! Contudo, executa-se de acordo com
as capacidades de cada praticante, respeitando suas limitações. Uma
educação de adaptação para ensiná-lo a se preparar para as técnicas
do sistema marcial que o mesmo pratica. Isso vai além do aspecto
bélico de autodefesa. Novamente exponho que a estética conduz ao
geral, pois só criando ligações entre as diferentes questões ali
envolvidas (o físico do praticante, as idiossincrasias culturais, a
poesia, a intenção da prática) haverá um aprofundamento sólido e
real na arte.

As técnicas e formas do Kung-Fu tradicional não idealizam um corpo


abstrato que seriam num imaginário simples o somatório do corpo humano com
o corpo da inspiração de seu estilo; afinal, seria impossível. Tais práticas
buscam uma beleza ideal (funcional e artisticamente prazerosa) de forma
mimética e orgânica através da mente e corpo do praticante, onde o modelar
de seu caráter em prol de algo bom e harmônico geraria deleite à sua alma e
físico, indo ao encontro do entendimento de uma prática bela (ECO, 2004).
Mais, soma-se a isso o entendimento aristotélico de “perícia” (ARISTÓTELES,
2015), onde a funcionalidade e a arte se unem.
Reforçando os pensamentos anteriores, Mestre Thomaz Chan destaca
que muitos podem apenas ver a beleza quando a técnica já está refinada,
contudo reforça que a beleza está no processo desse refino.
A estética está presente não apenas na capacidade de execução de
uma técnica. Ela se estende à capacidade de uma execução eficaz,
porém com beleza marcial no movimento, sendo executada de
maneira natural e fluida. Beleza marcial quer dizer expressão,
incorporação do espírito daquela técnica em questão incluindo a
eficácia e boa execução. O empenho em buscar a perfeição todo
treino. O Kung-Fu se dá assim, por ensaio e erro constante.

Evidencia-se então que a perseverança se faz um valor estético


presente no Kung-Fu. Para alguns hoje, tal perseverança recai na busca da
perfeição de movimentos e desempenhos desportivos em prol de vitórias em
competições. Ou seja, tem sua atenção convergida maioritariamente ao físico.
Mestre Leo Imamura explica categorizando essa atitude como incipiente e
compreensivelmente imatura. “É algo que tem sim seu valor, mas é apenas o
primeiro estágio do Kung-Fu, que seria a parte do treino físico. (...) Reconheço

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ali que há uma centelha, mas o verdadeiro Kung-Fu está muito além de esforço
físico”. Novamente reforça-se o pensamento do Kung-Fu possuir um lado
introspectivo profundo além do campo físico. Praticar apenas focando-se no
campo físico seria então subutilizar o potencial essencial do Kung-Fu. A
perseverança toca não apenas a paciência, mas também a serenidade e o
desapego de sofrimentos numa busca pela harmonia. Nesse ponto nota-se
uma aproximação dos pensamentos históricos da filosofia chinesa com a
grega. Em ambos os casos o praticante busca adquirir capacidades
magníficas, porém na cultura grega objetivavam ser sobre-humanos
(semideuses) e na chinesa transcenderem e alcançarem a iluminação (estado
uno ao plano material e espiritual). De fato, não parece ser difícil perceber a
singular proximidade desse entendimento chinês mais profundo do Kung-Fu
com o entendimento grego de Areté (RUBIO; CARVALHO, 2005). Mais: o
próprio significado da expressão “Kung-Fu” se harmoniza com o pensamento
de Aristóteles, onde a virtude humana não é algo inato, excepcional e heroico,
mas advém sim de uma dedicação constante.
Sendo mais enfático e assertivo, Mestre Thomaz Chan ainda esclarece
que as qualidades físicas e técnica têm importância menor quando comparadas
ao ensino ético e estético no Kung-Fu tradicional.
São secundárias. A amizade, o respeito, a fidelidade. Isso tudo deve
vir antes. Vêm com a confiança de quem está te ensinando, de quem
treina junto a você, de toda a história que está ali contida.
Naturalmente assim, desenvolvemos pouco a pouco a obediência, a
paciência, a perseverança. Daí é que vêm as conquistas, como: a
superação e a sensação de aperfeiçoamento, o espírito fraternal
familiar.

Sobre a ética e estética, Bento (2003) dá a entender que ambas se


conciliam indissociavelmente no universo do desporto. Trazendo tal aforismo
para o Kung-Fu, retoma-se a etocracia agora sob o prisma estético. Na busca
em ser um bom exemplo, os Mestres destacam a gentileza e cortesia ao
próximo como importante tópico na docência. A Grã-Mestra Lily Lau alerta:
“Use o seu Wu De do Kung-Fu, gentileza, conhecimento e caráter. Não use
apenas a sua posição. Professor. Mestre. Poder". Já Mestre Thomaz Chan
ressalta a presença estética: “No respeito às pessoas, aos valores, ao próximo,

135
à hierarquia, à história. Além disso, na superação de adversidades, nessa
busca pela perfeição que devemos ter”. Por fim, ele ainda reforça a união do
pensamento ético-estético no Kung-Fu tradicional:
O Kung-Fu é uma prática para vida! Eu vejo o Wu De (e
consequentemente o Kung-Fu como um todo) sendo um meio
importante de ajuda na formação da pessoa. Um meio de formar o
carácter de forma boa. Enfim, não ser uma pessoa mesquinha, ser
uma pessoa confiável, respeitosa, dedicada. Isso influencia no meio
em que a pessoa vive; positivamente quero dizer. Uma forma de
colaboração à cidadania.

Fica evidente que as descrições acima tocam a virtude da humildade,


algo que nas culturas ocidentais e orientais demonstra grandeza de espírito.
Logo, fica claro que uma das máximas do Kung-Fu tradicional se faz vivificada:
“no Kung-Fu tradicional, o posto de Mestre não é apenas uma graduação, mas
um reconhecimento público”. Algo construído em diversos momentos durante o
cotidiano entre as relações e observações da demonstração de virtudes. Enfim,
uma práxis de um verdadeiro artista marcial para além da técnica de combate
físico, assim como elevado na clássica e milenar obra oriental Tao Te King de
autoria de Lao-Zi (2001, cap. 68), base do taoísmo:

Um bom soldado nunca é agressivo;


um bom lutador nunca fica irado.
A melhor maneira de conquistar um inimigo
é ganhar dele sem enfrentá-lo.
A melhor forma de liderar pessoas
é colocar-se abaixo para servi-las.
A isso se lhe chama a virtude da não-luta!
A isso se lhe chama usar as habilidades do homem!
A isso se lhe chama estar em unidade com o Céu!

4 CONCLUSÔES

Em meio à história humana diversos pensamentos, escolas e conceitos


filosóficos permearam as mentes e as ações das culturas ao redor do mundo,
transformando-as através de suas práticas e transmitindo-as de geração em
geração. O caso do Kung-Fu não se faz diferente, por meio de princípios
axiológicos (aqui destacados a ética e estética) absorvidos de filosofias
orientais, constituiu-se uma educação pacifista cooperativa, em busca de

136
promoção da saúde, superação física e mental, numa perpétua procura pela
harmonia interna e externa do ser. Poder-se-ia dizer uma espécie de
transcendência ou iluminação; o Tao (LIMA, 2000).
Através tanto de autores de outrora quanto atuais, do Oriente e do
Ocidente, fica evidente que a virtude se perfaz como um axioma, uma verdade
indubitável necessária para a evolução do ser humano. Faz-se valioso e
valoroso haver práticas que buscam uma educação imersa em tais virtudes,
ainda mais quando esse ensino pensa além de exclusivamente um indivíduo,
mas sim no coletivo, na humanidade como um todo. De fato, não ser um ser de
ações solitárias, mas sim solidárias.
A interpretação dos discursos dos grandes Mestres aqui coletados
demonstra a importância da ética e da estética no estudo e prática do Kung-Fu
tradicional, deixando subentendido que sem tais valores em sua compleição o
mesmo não se tornaria um meio de busca de virtudes; o mesmo não seria o
“verdadeiro caminho da chamada vida Kung-Fu”.
De forma sucinta, os antigos gregos usavam o termo Paidéia para
expressar a formação do espírito e do caráter em prol de um educar cívico
(PATRÍCIO, 2008; MARINHO, 2013). No fundo, a Paidéia é uma pedagogia
que conduz a um ideal de beleza para uma vida bela, baseada na verdade e no
bem. Sob essa ótica, é compreensível a comparação feita por Oliveira (2006)
que reflete sobre o Kung-Fu tradicional ser uma espécie de “Paidéia à chinesa”.

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142
5. Buscando uma interpretação integrada dos estudos realizados – uma
reflexão final

_______________________________________________________________

143
Com o avançar do processo de pesquisa, alguns tópicos ganharam luz e
foram aos poucos sendo expostos de maneira mais direta e objetiva no
decorrer das publicações realizadas. Contudo, alguns outros temas figuraram
nos estudos que compõem o todo desta pesquisa doutoral de maneira
coadjuvante, sendo indiretamente abordados ou ainda citados não de forma tão
aprofundada, por conta das limitações de paginação para publicação, escopo
dos periódicos e/ou eventos acadêmicos, dentre outros possíveis limites
encontrados.

Com o propósito de colmatar esta lacuna, desenvolveu-se o presente


capítulo, no qual se encontrou o espaço necessário para reflexões e
aprofundamentos mais amplos e enriquecedores. Procurou-se, como se
expressa no título, mapear um conjunto de dimensões que, pontuando embora
os quatro artigos que incorporam o trabalho, não terão sido suficientemente
articuladas e adequadamente exploradas relativamente ao contributo de cada
uma para a totalidade do estudo. Neste sentido, organizamos este capítulo em
torno, num primeiro momento, do universo do desporto, para logo a seguir
desenvolvermos aspectos centrais do seu protagonista fundamental, o corpo,
sem deixar de perspectivá-lo no âmbito amplo da cultura e prosseguir para o
domínio específico da cultura corporal. Por último, chamam-se à colação as
técnicas do Kung-Fu, que são tensionadas com as práticas do universo
marcial.

Torna-se pertinente revisitar de novo o entendimento e conceito de


“desporto”. Ao que tange a perspectiva lusófona percebe-se que o princípio
conceitual não se faz uníssono. No estudo I, o conceito de desporto defendido
por Bento e Bento (2014) se perfaz em um espectro que atende questões
educativas, sociais, filosóficas e culturais. Ou seja, seu sentido conceitual recai
sobre mais profundidade no âmago do ser humano e da sociedade que o
mesmo constitui, tendo o desporto como um dos meios de desenvolver ali
princípios e valores. Entretanto, durante o estudo III, observa-se que o conceito
exposto por Barbanti (2006) sobre esporte (tido internacionalmente como
sinônimo de desporto) se respalda em um prisma deveras tecnicista e

144
competitivista, não tendo maiores inclinações aos campos mais profundos das
humanidades. Apesar de o conceito de desporto já ter sido apresentado no
enquadramento teórico desta tese doutoral, viu-se aqui necessidade de
discorrer um pouco mais sobre o assunto para evitar conflito por conta das
diferenças culturais deparadas. Sobre isso, Tojal (2004) explica que existem
denominações diversas para esse campo científico, tais como: cinesiologia,
cultura física, atividades físicas, cultura corporal, ginásticas, atividades
corporais, dentre outras. Todavia, observam-se na lusofonia fundamentalmente
dois entendimentos diferentes; “desporto” (Bento, 1995)26 e “motricidade
humana” (Sérgio, 1989). É esclarecido por Lovisolo (2000) que a referida área
científica no Brasil recebe o nome de “educação física” sob uma cobertura mais
generalista, algo que acontece diferente em Portugal, pois o referido termo é ali
empregado e voltado especificamente para atuação no campo escolar, sendo a
Educação Física uma disciplina do currículo escolar. De forma a “apaziguar”
quaisquer possíveis ruídos e atritos conceituais, acolhe-se aqui a abordagem
conceitual de Tubino (2001) que enfatiza haver esporte educação, esporte
participação e esporte performance. Logo, ao observar tal tripé conceitual, de
certo o termo “esporte” apresenta-se sim como sinônimo de desporto
enaltecido por Bento e Bento (2014). Dessa forma, nota-se também maior
afinidade para com os estudos que transitem pelo campo da filosofia do
desporto, já que o referido conceito abarca de maneira clara e inequívoca as
humanidades, indo para além dos aspectos biológicos e competitivos. Na
verdade, a investigação em ciências do desporto, quando opta por uma
aproximação a partir das ciências humanas, como sucede neste trabalho, tem
sempre que extrapolar estes aspectos.

Assim, no quadro da investigação em ciências do desporto, o presente


trabalho focalizou-se no contexto amplo do “objeto cultural desporto”, no Kung-
Fu, Tomando aqui emprestadas as palavras de Figueiredo (1996, p. 64), o
Kung-Fu configura-se como de natureza “bio-psico-socio-axiológica”. Ao que

26
Aparentemente Bento compartilha do mesmo pensamento de João Lyra Filho, que em 1941
ao escrever a primeira lei (decreto-lei 3199) sobre esporte/desporto do Brasil preferiu utilizar a
expressão “desporto”.

145
tange tal configuração, o corpo se apresenta nos quatro estudos como um
veículo de aprendizado, representação e (auto)descoberta, tocando um
princípio educativo exploratório, imerso em valores que transitam pelas quatro
esferas citadas (o que nomeadamente chama-se aqui de “corpo-bio”, “corpo-
psico”, “corpo-socio”, “corpo-axiológico”). Neste sentido, o corpo esboça uma
trajetória dinâmica que decorre não apenas de aspectos biológicos, mas
também abarca aspectos cognitivos, socioculturais e filosóficos (Fensterseifer,
2001). Inicialmente sobre tal questão, Merleau-Ponty (2006, p. 136) esclarece
que o corpo não deve mais ser assim refletido “como objeto do mundo, mas
como meio de nossa comunicação com ele, ao mundo não mais como soma de
objetos determinados, mas como horizonte latente de nossa experiência”. Sob
essa guisa, Cunha e Silva (1998) afirma que o corpo é uma estrutura
autopoiética e que por sua vez possui relações íntimas e cumplicidades com o
meio em que se apresenta e no qual interage. Contudo, para tal interação faz-
se necessária uma percepção apurada do ser para com o meio, a chamada
consciência corporal (ou do corpo). À primeira vista, tal expressão aparenta
findar-se no próprio corpo, todavia sua prática se dá na expansão da
percepção de todo o meio de forma inequívoca para uma otimização da
execução do movimento do corpo no ambiente (Merleau-Ponty, 2006). Assim,
Gil (2001, 9. 176) conclui que:

A consciência do corpo abre-se em direcção a um mundo


primitivo, selvagem ou originário, para empregarmos (...) a
terminologia fenomenológica (...). No entanto, este mundo não
comporta abismos psicológicos, nem se limita apenas ao
campo dos movimentos corporais. A consciência do corpo não
acaba no corpo. Mergulhando no corpo, a consciência abre-se
ao mundo; já não como consciência de alguma coisa, já não
segundo uma intencionalidade que faria dela a doadora de
sentido, não pondo um objecto diante de si, mas como adesão
imediata ao mundo, como contacto e contágio com as forças do
mundo.

Unindo os entendimentos citados do “corpo-bio” com o “corpo-psico”, é


possível compreender de forma mais ampla que o ser humano é corporeidade
e por isso é movimento, expressividade e presença. Possui não só repetição,

146
mas criação. Compreender a corporeidade é saber olhar sensivelmente o
próprio corpo e o do outro, em uma busca de consciência corporal, algo além
de uma disciplina imposta ou padronizada (Sérgio, 2005). Logo, não se deveria
dizer que se possui um corpo, mas que se é o corpo, que absorveu
experiências, conhecimentos, práticas, trejeitos, hábitos e afins, constituindo-se
como se encontra, indo além de uma objetiva visão biológica. Assim, o corpo
mereceria receber maior destaque do que se tem hoje como meio do processo
de ensino e aprendizagem. É de se observar que tais aforismos de Sérgio
(2005) dão alicerces para uma aproximação substancial do conceito mais
abstrato de “Kung-Fu”, onde o mesmo é tido como uma prática de
aprofundamento real e genuíno em um estudo ou exercício (algo já esclarecido
no estudo III). Importante dizer que tal interação ganha ainda mais valor
quando recaída sobre outro indivíduo (“corpo-socio”), consubstanciando
princípios altamente significativos para uma construção social e coletiva
harmônica (tópico já destacado no estudo IV). Dessa forma, essa relação
intercorpórea com o outro e o vínculo estabelecido nesse contato colocam o
corpo como universo aberto para todas as sensações da sensibilidade, numa
unicidade de existência que ensina sobre nós mesmos, sobre o outro e
expande ontologicamente o viver ético e estético para outra forma de existir
(Raffaelli, 2013; Silva & Porpino, 2014). É nesse posto que, de maneira
proeminente, emerge a importância do entendimento e prática da ética e da
estética de modo indissociável (Santin, 1995); a primeira para uma
compreensão do bem próprio e coletivo nas esferas da razão e a segunda para
sensibilização e humanização nas esferas da emoção (como consubstanciado
em âmbito teórico no estudo III e em âmbito prático no estudo IV). David Hume
(2009) buscou no século XVIII refletir o lado humano do homem (social e
emocional) através do raciocínio experimental que foi usado por Isaac Newton
para o entendimento da natureza física. Dessa forma, Hume concluiu que a
razão é um atributo humano privilegiado para permitir que as sensações sejam
as melhores possíveis. A razão permite ainda o encontrar de justificativas para
os afetos, sejam eles aceitáveis por você (moral) e/ou pelos outros (ética).
Entende-se então que a razão está a serviço dos afetos e de uma natureza

147
sociável humana. Afinal, a ética é a inteligência compartilhada a serviço da
convivência. E tais atos buscando uma pureza em sua intimidade essêntica
(ser) e em sua execução (fazer) a tornam também estética. Novamente vê-se
aí a união quase que indissociável da ética com a estética. Enfim, de forma
conclusiva, entende-se sob as palavras de Merleau-Ponty (2006), que o mover
do corpo não se faz simplesmente em uma atitude isolada naquele momento
do tempo, mas sim se configura como um ato consequente de uma sequência
de outros atos que construíram o amadurecimento de uma visão, da
experiência de vida, da educação de vida, dos valores experienciados e
absorvidos na vida. Dá-se aí então o gênesis de um “corpo-axiológico“. Em
uma visão entrelaçada das palavras de Merleau-Ponty para com os campos da
ética e da estética recaídas no corpo humano, entende-se que a existência de
um corpo ético-estético se faz na expressividade do e no espaço (Raffaelli,
2013). Assim se perfaz um corpo expressivo. Este se auto expressa e expressa
seu meio, sua história, sua cultura, suas emoções íntimas, seu eu. Este
entendimento mais holístico do corpo já começa a ser reconhecido hoje pelo
meio acadêmico ocidental das ciências do desporto como “corpo desportivo”
(Lacerda, 2016). Importante dizer, Cunha e Silva (1999b, p. 60) explica que
essa expressividade rica em estética sobre o corpo pode sim ser vista como
útopica, porém de forma alguma como atópica. Para o mesmo autor, o corpo
transforma-se, assim, em um “laboratório da utopia”, onde o movimento banha
o corpo desportivo de uma “mais-valia estética” por sua infinidade de
variabilidades potenciais.

Fazendo uma transposição do corpo para uma cultura corporal, Daolio


(1995, p. 25) afirma que: “Não podemos imaginar um ser humano que não seja
fruto da cultura e também não podemos imaginar um corpo natural”. Logo, fica
entendido que o corpo não é apenas uma obra biológica oriunda de uma
combinação de genes e circunstâncias ambientais, mas sim fruto também da
cultura humana. De forma a clarificar essa discussão, Tubino (1992, p. 68)
defende ser indispensável o entendimento da expressão “cultura” que por sua
vez deriva da expressão latina colere que carrega consigo o significado de “(...)
cultivar, e que depois os romanos forneceram sentido a esta expressão,

148
interpretando-a como a educação de uma pessoa que conhecesse as artes, a
filosofia, ou tivesse uma vida ligada à ciência” (1992, p. 68). Sob olhares mais
historicistas, Ortega y Gasset (1999, pp. 98-99) aponta que a cultura vive e
pulsa em cada época de forma ímpar e singular de modo concomitante com as
ideias do tempo em questão, dizendo que: “o homem vive sempre a partir de
algumas ideias determinadas, que constituem o chão onde apoia sua
existência”. Sob um viés mais socioantropológico, Morin (2003, p.58) é mais
direto apontando que a cultura se caracteriza como um:

(...) conjunto de hábitos, costumes, práticas, saber-fazer,


saberes, regras, normas, proibições, estratégias, crenças,
ideias, valores, mitos, ritos, que se perpetuam de geração em
geração, que se reproduzem em cada indivíduo, que geram e
regeneram a complexidade social.

Geertz (1978) já dava a entender que é da natureza do homem ser um


ser cultural. Afinal, segundo Daolio (1995), é exatamente a cultura e a
capacidade de produzi-la que coloca a humanidade em uma posição cumeeira
no mundo perante os outros animais. Não obstante, ainda afirma que:

O corpo é uma síntese da cultura, porque expressa elementos


específicos da sociedade da qual faz parte. O homem, através
do seu corpo, vai assimilando e se apropriando dos valores,
normas e costumes sociais, num processo de inCORPOração
(a palavra é significativa). Mais do que um aprendizado
intelectual, o indivíduo adquire um conteúdo cultural, que se
instala no seu corpo, no conjunto de suas expressões (Daolio,
1995, p. 25).

Entende-se em Merleau-Ponty (2006) que o homem se faz sempre


através de suas ações e manifestações um corpo fenomenológico, no qual tudo
o que ele produz é, por vezes, uma simbiose de atividades culturais e
corporais. Por isso, a cultura corporal é assim “apontada a reforçar uma cultura
desenvolvida pela via do movimento humano” (Kunz, 2009, p. 20). Contudo,
Raffaelli (2013) alerta que para o corpo infundir-se na cultura corporal do
movimento, faz-se necessário usufruir de seus sentidos e de sua própria
reflexão e para tal, é preciso o indivíduo se abrir à experiência. Buscando

149
acompanhar as reflexões de Cunha e Silva (1998), o aprofundamento da
relação do homem com seu corpo propicia o vislumbrar de um conjunto de
potencialidades sensório-motoras, propiciando ao homem oportunidades de
descobrir suas capacidades e aprimorá-las pouco a pouco com o estudo e
treinamento devido. No entanto, tecendo aqui uma ligação com os treinos
técnico-práticos de Kung-Fu, não é raro a execução de técnicas inspiradas
poeticamente em movimentos corpóreos de outros animais ou ainda outros
sujeitos da natureza, como flores (lótus e cerejeira), os cinco elementos da
medicina tradicional chinesa (água, madeira, fogo, terra e metal), as estações
climáticas do ano, dentre outros. Dá-se aí uma profunda imersão mimética e
poética, onde ora o movimento se apresenta de maneira alegórica, ora se
apresenta de maneira aplicável. Entende-se assim que o corpo do praticante
kungfuista irá objetivar inicialmente um aprimoramento físico do próprio corpo.
Porém, não se deterá nesse certame, buscando animações corpóreas que, de
certa forma mimética, incorporarão outros sujeitos da natureza, construindo e
revelando assim novos caminhos práticos de exercícios outrora não
percebidos. Assim que os olhos do praticante recaídos sobre o exercício
deixam de ser “olhos humanos” e recebem novas ”lentes” (como por exemplo,
de uma águia, um tigre, uma serpente ou um dragão), um novo corpo também
se perfaz e se faz necessário. Esse ciclo de estudo de observação, prática,
reflexão, construção, reconstrução se engendrará perpetuamente. Sob olhos
fisio-metabólicos, o corpo humano juntamente com as vicissitudes da vida
estará sempre em mutação, engordando, emagrecendo, alongando,
encurtando, fortalecendo, enfraquecendo, machucando, curando, estressando,
relaxando, envelhecendo. Logo, com transformações tão constantes, o corpo
precisaria sempre se manter em prática para permanecer em um patamar
cumeeiro de primazia anatômica e técnica. Não obstante, o kungfuista busca,
de certa forma, uma transcendência em uma conjuntura com outros corpos da
natureza em uma conjuntura, por assim dizer, mimética-poética-holística em
uma experiência de estudo inter-multi-corpórea. Enfim, uma cultura corporal
profundamente ligada à ecologia, folclore e cultura chinesa, (pensamento já

150
abordado desde o estudo I). Pegando emprestadas as palavras de Merleau-
Ponty (2006, p. 202)

(...) nosso corpo não é apenas um espaço expressivo entre


todos os outros, ele é a origem de todos os outros, o próprio
movimento de expressão, aquilo que projeta as significações
no exterior, dando-lhes um lugar, aquilo que faz com que elas
comecem existir como coisas, sob nossas mãos, sob nossos
olhos.

Assim, o ser humano e seu corpo expressivo dão sentido e substância à


experiência do movimento e da cultura humana (Raffaelli, 2013). Através do
movimento e de exercícios físicos oriundos de outras culturas, o corpo
transgride seu lugar e transforma noutros lugares por meio de uma ação
estética que, por sua vez, alimenta a multiculturalidade. Nesse espírito, Cunha
e Silva (1999a) traz a dança como exemplo, aludindo que o corpo que dança
pode ser visto como um corpo cartográfico, tecendo uma amálgama de
questões culturais do corpo com os locais por onde ele passou. Seguindo essa
guisa o Kung-Fu também se perfaz como um modelo integrante desse
destacamento. Indo além, poder-se-ia dizer aqui que o corpo do praticante se
funde ainda à história dos milhares (quiçá milhões) de corpos que já praticaram
tal exercício e perpetuaram a referida prática para que a mesma chegasse até
os tempos atuais. Isso se dá não só porque um indivíduo isolado e nucleado
decidiu dar continuidade a uma prática. Isso se deu na verdade por conta de
um coletivo ver e enxergar ali uma prática com valor. E esse valor, seja ele
histórico, artístico, religioso, enfim, se destacou como algo significativamente
relevante para aquele coletivo. Algo que se perpetuou e se transpassou até os
tempos hodiernos. Logo, entende-se mais; o valor estético ali repousado e
propagado se tornou também deontológico, assim que sua prática passa a ser
aceita coletivamente (ética) e coletivamente também praticada (moral).
Importantíssimo ressaltar novamente, “(...) o conjunto de posturas e
movimentos corporais representa valores e princípios culturais.
Consequentemente, atuar no corpo implica em atuar sobre a sociedade na qual
este corpo está inserido” (Daolio, 1995, p. 26). O corpo deve se fazer

151
subjacente aos valores do espírito (Figueiredo, 1996), caso contrário, poderá
recair sobre o ego, sobre o preconceito e sobre atitudes hedonistas. A ação
cobra sempre a reflexão. A ética recai sobre o respeito e a estética sobre a
sensibilidade, dessa forma, os prazeres do corpo se perfazem em um prazer
inteligente (Hermann, 2005). Por isso, a necessidade de haver práticas regidas
por um profundo código educativo que estimulem um comportamento ético,
estético, deontológico e pacifista como o Wu De – o código de ética marcial do
Kung-Fu (destacado no estudo II). Afinal: “Refletir a ação, o movimento, é
significar a cultura” (Raffaelli, 2013, p. 43). Nessa esteira, Morris (1998) é
incisivo quando afirma que as artes marciais chinesas (o Kung-Fu) são a mais
famosa e autêntica manifestação de cultura física da China. Contudo, é
interessante esclarecer que o corpo que pratica Kung-Fu convoca o “lugar
oriental” e o transmuta em “lugar ocidental”, justamente pela prática. No fundo,
esse novo lugar habitado pelo movimento que decorre do Kung-Fu que hoje
praticamos é um “novo lugar”, já que é criado a partir da aproximação Oriente-
Ocidente.

Para além de questões histórico-culturais, o estudo I levantou diversos


trabalhos onde muitos abordaram as técnicas do Kung-Fu como um meio de
promoção da saúde e qualidade de vida, abrangendo práticas desde a infância
até fases longevas da vida humana. Para tal, temas educativos e pedagógicos
também surgiram com alguma frequência, onde pontuaram destaques
relevantes no ministrar do Kung-Fu para seus diferentes públicos.
Independentemente da abordagem enfatizada, os aspectos de promoção da
saúde e de patrimônio cultural chinês de algum modo se encontram presentes.
Assim nota-se que o patrimônio cultural é adaptado e ministrado ao aluno na
proporção da sua capacidade de entendimento27 (Manoel, 1994) e ainda são
identificadas as formas adequadas e seguras de práticas de exercícios físicos
para sua promoção da saúde (Amadio & Serrão, 2011). Dá-se assim um

27
Indo ao encontro do entendimento didático-pedagógico de Comênio, considerado pai da
didática moderna desde o séc. XVII, que preconizava que todos deveriam aprender, mesmo
que em velocidade e modos distintos. Nessa mesma guisa Bourdieu (2007) afirma que todos
os alunos devem ser vistos individualmente, respeitando suas singularidades e não tendo em
mente que os mesmos entenderam a transmissão de valores igualmente.

152
princípio técnico-pedagógico salutar e cultural. Para tal, faz-se necessário uma
consolidada prática pedagógica, onde a sensibilidade do como saber ensinar
se faz fundamental para perpetuação saudável da atividade e de seus
praticantes (Pillotto, 2006). O que Patrício (1993, p. 20) destaca como o “saber
fazer-ser”. Deste modo, inegavelmente: “Quando esse sentir se refere ao fazer
pedagógico, sabe-se que a prática pedagógica sempre envolve uma dimensão
ética” (Raffaelli, 2013, p. 47).

Sobre o facto da criação técnica do Kung-Fu conter um rico aspecto


mimético, citado tanto no estudo I quanto no estudo IV, é importante destacar
que tal questão vai além de sua natureza cultural e folclórica. Aristóteles (2019)
em “A Arte Poética” trata como temática principal de sua obra a mimeses onde
a este conceito atribui as práticas da imitação e emulação. Assim, o homem
busca pela mimeses uma metamorfose, uma transformação, uma fuga
simbólica momentânea da sua forma e natureza animal humana
(cartesianamente falando) para algo novo que ele ali observa, já que de acordo
com este entendimento toda a imitação é diferença. Deste modo, “O corpo
desportivo é um corpo de variabilidades” (Cunha e Silva, 1999b, p. 61).
Entende-se, então, que a mimeses se dá através de um caminho centrípeto em
relação ao homem, ou seja, é germinada no meio e floresce no homem. Em
uma representação tece-se aqui uma exemplificação: um homem observa o
meio que o cerca e de tais observações nascem reflexões onde alimentam e
provocam no homem o desejo de repensar, refazer, remodelar seus hábitos e
ações. Pode-se dizer que o intuito exploratório de tal prática contempla uma
junção harmônica salutar-funcional-cultural por meio do animus (razão) com
anima (imaginação) (Sérgio, 2005). A experiência desse movimento fica
“fundada na intuição, na sensibilidade e na percepção, que por sua vez,
possibilita verdadeiramente produzir/criar conhecimentos, saberes e cultura-
expressividade” (Gomes da Silva, 2010, p. 66). Nesse sentido, o pensar
Merleau-Pontyano vem ao encontro desse tópico, pois o autor pontua e
compartilha o entendimento de experiência vivida em relação à ação do
movimento. Assim, a experiência do movimento revela a unidade de homem-
mundo, um corpo próprio, como afirma Merleau-Ponty (2006), que produz

153
experiências e evolui a partir delas. Algo para além do físico, pois, como
ilumina Cunha e Silva (2004, s.p.): “Há exercícios, físicos, que podem
acontecer na intimidade dos corpos”.

Durante a estruturação da taxonomia exposta no estudo III, percebeu-se


a necessidade de expandir as discussões que a mesma estimula para maiores
reflexões e esclarecimentos. O processo de conceituação das práticas do
universo marcial buscou iluminar suas características. Tal processo foi
norteado por questões técnico-práticas, análises hermenêuticas e princípios
axiológicos. Ao observar a representação gráfica da taxonomia (fig. 1 – estudo
III) é de notar que os dois níveis iniciais de categorização tornam-se pontos
nevrálgicos para a proposta axiológica abordada. Suas linhas de conexão
apontam o afastamento do conceito de “arte marcial” de qualquer manifestação
de natureza essencialmente violenta. Tal visão pode parecer ao primeiro
momento como algo purista, contudo, o princípio reflexivo aqui abordado
defende o ideário do conceito de arte marcial como uma prática de genuínas
raízes axiológicas. De tal modo, qualquer ato que se apresente como uma ação
estultícia irrigada em ego ou opressão se afastará de um ato de valor, de um
ato axiológico. O conjunto de valores ali contido não se fragiliza em essência,
mas, por sua vez, pode ser mal executado ou mesmo ignorado, pois afinal, o
ser humano é um ser falho e pode livremente tomar caminhos não tão áureos
em valores. Por exemplo, afirma-se assim, novamente, que os princípios éticos
ali contidos estarão intactos, pois repousam no plano das ideias, que se
procura imaculável. Contudo, a execução de tais princípios é que configura a
compleição da moral, ou seja, algo prático e que permeia o mundo físico e por
sua vez passível de falhas, assim como o sentimento humano. Logo, tal
categorização apenas se pode fazer autêntica quando sua execução recair tão
somente em atos pacifistas, por tal razão sua natureza sempre advém de um
processo de autodefesa. Dessa forma, os princípios axiológicos se manterão
intactos e imaculados, perfazendo de fato uma prática de viés educativo imerso
em valores. Para Platão, a ideia de belo está na essência (ideia). Para
Aristóteles, a ideia de belo está na concretização (mundo). Poder-se-ia dizer
aqui que o Kung-Fu busca em sua natureza filosófica uma confluência em

154
proporções cumeeiras dos pensamentos citados. Acresce-se a isso a
lembrança de estar afastado do ego, postando-se harmoniosamente entre o
equilíbrio de emoção e razão.

Está, pois, suficientemente esclarecido que a virtude moral é


um meio-termo, e em que sentido devemos entender esta
expressão; e que é um meio-termo entre dois vícios, um dos
quais envolve excesso e o outro deficiência, e isso porque a
sua natureza é visar à mediania nas paixões e nos atos
(Aristóteles, 2015, livro II, 9).

Ter o íntimo voltado ao bem é um importante passo, mas não o último


nem mesmo o único. Por sua vez, tão pouco ter uma técnica de excelência de
execução. Ao que tange o ideário de um sincero e genuíno estudo e prática, o
kungfuista percorrerá uma “peregrinação holística” e uma busca da excelência
do fazer, do sentir, do relacionar, do ser, do viver e do ensinar. Importante
dizer, tais atos almejam a mudança do ser para com as dificuldades do mundo.
E assim, espera-se que o mundo, pouco a pouco, receba o gesto com
cordialidade e reciprocamente devolvendo a ele generosidade e admiração.
Assim, os valores educacionais outrora inseridos no Kung-Fu oriundos das
filosofias taoístas, confucionistas e budistas, colaboram (mesmo que de
maneira homeopática) para um íntimo (indivíduo) e uma sociedade (coletivo)
pacifista.

Com o intuito de elevar e complexificar o processo interpretativo do


modelo aqui defendido, indo além dos limites da linguagem, apresenta-se
então o modelo de “luta não técnica” como uma luta primária e de dinâmica
reptiliana28. Por sua vez, a “luta técnica” é exposta como luta funcionalmente

28
A expressão “reptiliana” recaiu sobre a neurologia. Segundo MacLean (1990), uma parte do
cérebro humano conhecida como Cérebro Basal (ou Tronco Cerebral ou ainda R-complex
como MacLean assim chamava) tem sua formação da Medula Espinhal e porções basais do
Prosencéfalo. Ali se dão os reflexos simples, similar ao que acontece com répteis, dessa forma
justifica-se seu nome. Neurologicamente, dá-se nessa porção cerebral o processo instintivo,
atuando nas ações de sobrevivência, fome, sede, sono e afins. Muito embora a referida
expressão não seja mais usada na neurologia, ainda é bem presente em discussões de âmbito
sociocultural.

155
utilitária de dinâmica cortico-racional focada na utilidade da ação em si mesma.
Por fim, a “arte marcial” é apontada como uma luta ritualizada e de dinâmica
mais paleo-mamífera e racional com fins éticos e educativos, ou seja, como
meio de desenvolvimento ético do ser humano, agregando uma multivisão
integrante de técnica e arte. Enfim, algo atravessado por princípios éticos e
estéticos. Tal questão traz ainda a valorização das experiências (tanto teóricas
quanto práticas) para com sua educação e comportamento em âmbito social,
cívico e marcial29, como assinalam Silva e Porpino (2014, p. 68):

Assim, o homem vai sendo construído por cenários


socioculturais, marcados pelas experiências vividas de
desconforto e de paz, de fuga e de empatia, de presença e de
ausência. Um circuito mundo-corpo-outro criador de marcas
sensoriais inscritas na dinamicidade das relações.

Ao que tange o destacamento do Kung-Fu como uma prática de viés


“moderno” ou “tradicional”, procurar-se-á agora aprofundar um pouco mais esta
problemática. Desde já se esclarece que ambas as esferas conglomeram em si
valor e que estas não se fazem dicotómicas. O objetivo da discussão não é de
forma alguma sobrepujar ou denegrir uma ou outra esfera. O intuito foi sim de
trazer dados e reflexões mostrando não só a versatilidade do universo do
Kung-Fu, mas ainda suas diferentes potencialidades educativas, respeitando
ainda a especificidade do objeto de estudo. Sob o prisma do “Kung-Fu
moderno” já ficou esclarecido que sua prática possui uma maior ênfase para
com o universo desportivo-competitivo, tendo esse viés significativa influência
em todo seu currículo e processo educacional. Sobre o processo desportivo-
competitivo, Gumbrecht (2007) alude sobre dois conceitos consolidados da
filosofia desportiva que surgem para a interpretação da competição desportiva:

29
Relembra-se aqui, “marcial” no sentido oriental de ter a atitude de deter uma manifestação de
violência e não ocidental de ter uma atitude oriunda de uma divindade greco-romana belicosa.
Esclarece-se que não se tem aqui o intuito de elevar ou mesmo romantizar o contexto oriental
em detrimento do ocidental como já alertava Figueiredo (2006) sobre o orientalismo. Porém,
após as diversas explanações e demonstrações sobre as interpretações já ressaltadas, onde
principalmente o pacifismo se fez destaque, vê-se de suma importância novamente frisar tal
diferença.

156
agon e aretê (ou areté). Pode-se explicar o agon como competição tendo as
potencialidades de violência controladas sob a chancela de regras e
organizações regentes. Já a aretê implica em buscar a excelência de uma
atuação, alcançando o limite possível, individual ou coletivo. O mesmo autor
ainda dá a entender que se fosse necessário comparar ambos os princípios,
talvez a aretê devesse receber mais louvor, pois, exatamente por conta do
agon ter hoje mais atenção de um modo geral, o desporto competitivo parece
perder progressivamente seus predicados de nobreza e ganhando maiores
ares de disputas que se encerram em si mesmas. Para Lacerda (2016), o
desporto é justamente um fenômeno que agrega tais conceitos, encontrando-
se sempre neste estado transitório de aperfeiçoamento, presente na busca da
utopia antropológica que é a perfeição. Por sua vez, o viés “tradicional”
apresenta algumas diferenças. Chama-se a atenção que tal inclinação não
exime seus praticantes de participarem de competições desportivas. Contudo,
sua compleição está mais próxima e circunscrita em uma linha de estudo e
prática mais substancialmente ligada à história, aos métodos de autodefesa
mais vigorosos e contusivos que a maioria das práticas desportivo-
competitivas, aos ensinos reflexivos (inclusive muitos com fundo filosófico) que
podem até ter lugar em sessões teóricas e às práticas holísticas de promoção
da saúde. Algumas destas práticas, como por exemplo a meditação, não são
comuns no meio desportivo-competitivo. Entende-se que muito das
características do viés tradicional aqui apresentado se perpetua por conta de
fatores culturais. Sobre isso ser designado como algo tradicional, Cevasco
(2001, p. 72) discute sobre tal expressão dizendo que:

(...) toda tradição é construída segundo um princípio de


seleção, funciona como um poderoso mecanismo de
incorporação, articulando processos de identificação e de
definição cultural. (...) funciona como um elemento formador do
presente, apresentando uma versão do passado
deliberadamente criada para estabelecer uma conexão com o
presente e ratificar seus significados e valores.

Não obstante, pontua-se que em uma prática de alto rendimento


competitivo, não é raro observar atletas se isolando em concentração (inclusive

157
de suas famílias e amigos), estudando estratégias, praticando jogadas,
exercitando fundamentos, buscando assim ter maior foco em si e/ou na sua
equipe competitiva. Já em uma prática tradicional os aprendizados e
conhecimentos adquiridos devem ser maturados com as vivências e
convivências na sociedade em seus fins salutar, educativo e pacifista. Assim,
fazendo uma aproximação aos escritos de Paulo Cunha e Silva (1999b), poder-
se-ia dizer que o viés moderno apresenta um corpo centrípeto, voltado pra
dentro e para si. Por sua vez, o viés tradicional expõe um corpo centrífugo,
voltado não tão somente para si, mas para o mundo que o cerca e para quem
ali vive de forma harmônica e convivialmente pacífica. Sob uma ótica prática de
execução de uma técnica marcial, tanto o viés moderno quanto tradicional
podem proporcionar o surgimento do que Lacerda (2016) refere como gesto
oportuno, uma ação criadora que busca a harmonia da situação em um
momento necessário (nesse caso, como em uma competição ou uma ocasião
que se faz necessário defender-se), proporcionando uma adequação estética à
situação. Todavia, o viés tradicional, diferentemente do viés moderno, se
ramificará em questões mais profundas do processo educativo, abordando
ideários quase ritualísticos. Sob o ponto de vista confucionista (prática que
influenciou significativamente o habitus do Kung-Fu), as cerimônias são atos
importantes para a humanidade, para assim proporcionar o sentimento de
pertença e de virtude em um ato zeloso através da tradição – ato ético-estético.
Entende-se, assim, que o caminho do Kung-Fu tradicional não se faz sob um
perfil extremamente rígido, austero ou mesmo militarizado; de fato, esse
entendimento se faz bem equivocado.

Ainda sobre as ramificações vistas no Kung-Fu, de fato a pluralidade de


nomenclaturas pode gerar significativa confusão como já destacado nos
estudos desta tese doutoral. Entende-se que a expressão humana (linguagem)
pode se relacionar ou ser usada de mais de uma forma no cotidiano, algo visto
através da história. Reforça-se a visão do Kung-Fu como um modo de
"caminho" (ou Tao) como reforçado por Lima (2000). Importa deixar claro que o
entendimento popular da prática do Kung-Fu como exercício físico ou luta é
uma visão reduzida. Talvez aí se encontrem alguns "Kung-Fus": a) um

158
imaginário reduzido de forma pontual como anteriormente citado; b) um esporte
competitivo mais amplamente estudado e complexificado; c) um modo ou
caminho de vida (Tao). Claro que a isso em algum momento se unem os
diferentes conceitos ali permeados (Wushu, Kung-Fu, Wude), como também
defendido por Dai e Lu (2019) em suas reflexões interpretativas da referida arte
marcial. Contudo, para enriquecer as discussões aqui abordadas, destaca-se
novamente a expressão “Kuoshu” (ou Guoshu), já apresentada no estudo III. O
surgimento de tal expressão adveio sob fins políticos, como um ato nacionalista
do governo da República da China (1912-1949), buscando afastar-se de
práticas tradicionais na época imperial. Relembra-se aqui que sua tradução
significa “arte nacional”. No estudo historiográfico de Morris (1998, p. xv) é
afirmado abertamente que:

Even China's indigenous martial arts, which represented to


many the worst of China's ‘feudal’ and ‘backward’ traditions,
came to be understood in terms of these new forms of rational
competition, scientifically-approved modes of fitness, and the
connections they posed between the individual body and
national strength and worth.

Ou seja: há uma invenção nacionalista moderna que conflita com a


chamada visão feudalista tradicional, onde valores como hierarquia entre
mestre e discípulo (algo já discutido no estudo III) são completamente
substituídas pela visão científica e de comunicação moderna, elogiando como
valores centrais “fit body and strong nation”. Tal fato se reflete inclusive na
mudança de terminologias utilizadas, sendo alteradas de “mestre-discípulo”
para “treinador-atleta”. Ação que objetivou descontruir e retirar certa liberdade e
poder do povo chinês, ao proibir por lei a prática das artes marciais de âmbito
familiar (estilos tradicionais). Pode-se observar aqui a grande influência de uma
abordagem militarista vista também historicamente em outros países (incluindo
Alemanha e Brasil), quando a prática de exercício físico foi usada pelo governo
para potencializar a imagética nacionalista. Tal colocação foi ainda reforçada
pelo que aconteceu logo em seguida na China, tendo a instauração do
comunismo ditatorial e movimentos que objetivavam findar as forças familiares

159
submetendo-as ao governo, algo que a população praticante do Kung-Fu
quase que em uníssono não apoiou. Além disso, praticantes foram perseguidos
como formadores de quadrilha, com o receio do governo que os artistas
marciais se revoltassem contra ele. Neste contexto, propiciou-se um êxodo de
diversas pessoas perseguidas pelo governo ditador chinês nas décadas
medianas do século XX, incluindo aí mestres e praticantes de Kung-Fu (e em
muitos casos, foi por conta de tal fato histórico que o Kung-Fu começou a ser
tutelado por esses mesmos mestres e praticantes em diversos outros países
pelo mundo). Posteriormente, vendo que não conseguiria extinguir ou mesmo
"domar" o Kung-Fu, pois o mesmo é parte integrante e indissociável da cultura
chinesa, o governo então mudou sua estratégia, tornando o Kung-Fu em um
desporto competitivo, buscando abandonar práticas combativas mais
tradicionais e mais lesivas e, ainda, desvinculando as mesmas de suas origens
filosófico-religiosas, colocando sua tutela e organização centrada no próprio
governo. Assim objetivou uma “desfiguração” e ainda buscou usar o Kung-Fu
como ferramenta de marketing político, vendo sua prática tão somente como
uma prática ginástica de promoção da saúde e um desporto competitivo onde a
China é a principal potência mundial. Mais; em um texto sobre a Educação
Física de Mao Tsé-Tung escrito originalmente em 1917, logo no início refere-se
o seguinte:

Physical education helps to maintain life. East and West differ in


their interpretations of it. Chuang Tzu followed the example of
the cook, Confucius drew on the lesson of the archer and the
charioteer. In Germany, Physical Education has gained the
greatest popularity. Fencing has spread all over the country.
Japan has bushido. Moreover, recently, following the traditions
of our country, jujutsu has developed there to an admirable
degree. When we examine these examples, we see that they all
begin with the study of physiology (Mao, 1990).

Ou seja, Mao (1990) coloca a Esgrima (Fencing) como exemplo e


objetivamente mostra como o Jujutsu (arte marcial japonesa ancestral do Judo)
se desenvolveu a partir das tradições da China. Contudo, ele não referencia o
Kung-Fu diretamente. Tal visão racionalista de modernidade bio-fisiológica é
notória em todo o texto maoísta de 1917, sendo indicador da época em

160
nascitura. Novamente, é amplamente sabido da questão do movimento
comunista em se afastar das práticas filosóficas e religiosas. Afastar a nação
de tais práticas era (e ainda é) algo visto. Seguindo tal pensamento, faz sentido
o governo chinês querer dar maior visibilidade à fisiologia. Obviamente não se
tem aqui qualquer interesse em diminuir a importância da fisiologia para o
desenvolvimento e aprimoramento de qualquer exercício físico. Contudo, a
compleição das artes marciais se faz não só no prisma metabólico ou no
técnico, alcançando o tocante de valores mais íntimos e profundos, algo
conhecidamente semeado pelas filosofias e religiões na história humana e por
uma perspectiva unitária de corpo (como desenvolvido anteriormente).
Recaíram ainda diversos receios do governo chinês de o Kung-Fu não só se
apresentar como uma manifestação cultural que remonta a presença de
influencias filosófico-religiosas da China, mas também uma prática marcial
passível de ser utilizada pelo povo chinês como autodefesa contra
movimentações revolucionárias comunistas ditatoriais governamentais (ou seja,
um genuíno medo do povo insurgir-se contra o governo). Dessa forma, as
práticas que começaram a ser regidas e adaptadas para um viés desportivo-
competitivo não só recebiam regimentos e regulamentos de regras
competitivas, mas também significativa influência nas técnicas ministradas,
onde segundo Dai e Lu (2019, p. 332): “as a new ideal for combat, Chinese
Wushu also came up with a ‘touch is enough’ competitive orientation which is
the role prescription of superior Wushu competitors”. Ou seja, para o processo
de construção de exercícios de embate corporal como um combate formal e
regulamentado, foi-se iniciando um movimento de origem governamental que o
“tocar é suficiente”, dando-lhe assim um patamar de atitude superior. É, de fato,
quase que inegável que o processo de adaptação de práticas do universo
marcial necessite e careça de significativas adaptações técnico-marciais, para
que dentro de um espírito desportivo genuíno (ou seja, um espírito portador de
atitudes éticas e estéticas para si e para com seus colegas de competição –
incluindo adversários), tais práticas sejam possíveis de serem tuteladas e
praticadas. Caso contrário, provavelmente instaurar-se-ia a barbárie. Questão
essa amplamente abordada e aludida por Elias (1994) sobre o processo

161
civilizador do desporto, dando-lhe “amarras” para defender os praticantes de
possíveis excessos e exageros da agressividade humana. É obvio que essa
atitude merece e deve ser enaltecida, incentivada e perpetuada. Entretanto, o
que se critica aqui fortemente foi a tentativa de “sufocar” o Kung-Fu tradicional
por meio das atitudes governamentais da ditadura comunista chinesa sobre
suas profundas inclinações políticas. Entende-se, assim, que há espaço para
ambos os caminhos (tradicional e moderno), como uma terceira via, pois
possuem profunda relevância educativa repousada em valores. O que Dai e Lu
(2019, p. 335) declamam que: “Thus, as the culture of adversaries, Wushu has
civilization on the outside and a warrior in the inside”.

Foi apoiado neste referencial que se decidiu, na parte empírica deste


trabalho, captar os relatos históricos (por meio de entrevistas) de
personalidades que colaboram na expansão da prática de maneira convivial,
em um formato quase que familiar (habitual no meio marcial já há séculos e,
em alguns casos, há milênios) como ficou patente no estudo IV. Ou seja, sob
um foco microssociológico, deu-se assim voz e luz às visões que buscam
perpetuar o estudo e a prática do Kung-Fu como um caminho e modo de vida,
afastando-se dum contexto desportivo-competitivista ou ainda duma ferramenta
político-social para o povo chinês. O foco recaiu sobre um objeto cultural
altamente significativo, um ícone integrante do ethos chinês, permeando sua
história, sua cultura e sua sociedade – o Kung-Fu tradicional. Destarte, ficou
mais evidente ainda o afastamento do Wushu Moderno que, de uma maneira
ou de outra, se perfaz com constante influência das políticas governamentais,
algo que não configura diretamente os objetivos ou campos de pesquisa desta
tese doutoral. Procurou-se ao longo do trabalho defender fortemente que as
vivências, visões e narrativas de pessoas de forma mais nucleada e local, que
se afastam de uma institucionalização governamental chinesa, possuem sim
relevância e merecem ser valorizadas não só socialmente, mas também pelo
contributo que podem trazer à investigação, algo que se objetivou realizar,
principalmente através do estudo IV.

162
Enfim, através desta incursão científica pelos quatro artigos que
constituem esta tese doutoral, pode-se notar a presença de elementos
axiológicos (nomeadamente elementos de natureza ética e estética)
permeados no estudo e prática do Kung-Fu. Interessante pontuar também que
tais observações podem ser notadas não somente no Oriente quanto no
Ocidente, demonstrando ainda a transmissão de valores para além das
fronteiras geográficas, das questões políticas, das diferenças culturais ou
mesmo do tempo. Dessa forma, entende-se que tal prática pode ser vista como
um meio de antropagogia, ou seja, um sistema pedagógico que visa alargar a
ação educativa colaborando com as escolas e famílias. Um ensino imerso em
valores, buscando a saúde nas esferas física, mental e social, o pacifismo, o
respeito à história e culturas e a superação de dificuldades da vida. De forma
insofismável, a ética e a estética se mostraram de forma áurea como falanges
do processo educativo que ocorre no estudo e prática do Kung-Fu. O
entendimento de tais conceitos e a vigília constante para a execução de um
comportamento axiológico na sociedade humana traz e promove ao indivíduo
um caminho com elevado potencial educativo que vale a pena aqui ser
destacado e valorizado.

163
164
6. Conclusões e Considerações Finais

_______________________________________________________________

165
O pensamento é o princípio da ação. Porém, o pensamento reflexivo é o
princípio da boa ação. Através dele promove-se a gênese da filosofia que com
seus questionamentos e respostas, perpetuamente propiciará a educação
humana. Afinal, “Quanto mais se avança no conhecimento, mais mistérios
insondáveis aparecerão” (Morin, 2003, p. 21). Não são as dúvidas e incertezas
que abalam o pensamento reflexivo. De fato, é o pensamento reflexivo que
abala as dúvidas e incertezas. E assim que estas últimas são superadas
descobrindo novas verdades, edificam-se também novas dúvidas e incertezas.
Desta forma, perfaz-se o ciclo da vida do pensamento reflexivo; este, eterno.
Muitas vezes como Sísifo, em prisões e sofrimento. Em outras, talvez poucas,
como Hércules, em júbilo após vencer os desafios outrora gigantes, tocando-se
na sublimação, no divino. Logo, entende-se que nas atuais conjunturas, a
educação de maneira geral passa por uma profunda reavaliação, sendo alvo de
reflexões e reformas em todos os seus campos. Tal afirmação se comprova
quando há uma miríade de casos repensando seu modo de vida, suas leis,
suas políticas, seus (pre)conceitos, suas formas de governo e inclusive suas
práticas cotidianas. Seguindo essa guisa o exercitar de uma prática imbuída de
valores educacionais, ou seja, algo que tem seu fim no bem poderia ser de
imensa valia à sociedade e cultura humana, indo muito além de apenas
exercícios para fins salutares pontuais ou uma estética cosmética de gasto
calórico, que se funda na melhoria da aparência. Mesmo a filosofia, tida como a
milenar ciência-mãe de todas as outras, ainda parece precisar ganhar mais
robustez no universo do desporto, mais especificamente no meio marcial, onde
muito se fala de sua presença do ponto de vista empírico, porém a existência
de investigação a partir da abordagem filosófica ainda é incipiente. Reconhece-
se sim aqui algum desenvolvimento sobre o assunto, todavia, um quantitativo
maior de pesquisas mais profundas e derivadas de formações stricto sensu
seriam de grande contribuição, principalmente no idioma português.

De maneira zelosa, houve nesta tese a preocupação de mapear o que


era tratado pela literatura acadêmica e científica e, de forma geral, o meio
acadêmico deixou claro (através das pesquisas emanadas no estudo I) que o
Kung-Fu é uma prática de reconhecido valor ético e estético. Tal afirmação

166
evidencia-se mesmo em suas diferentes faces e vertentes, como: método de
autodefesa, meio de promoção da saúde e qualidade de vida, processo
educacional, categoria desportivo-competitiva, campo de lazer, ferramenta
estético-cosmética ou apenas um ambiente de socialização. Contudo, para
uma construção de um pensamento mais complexo e de maior profundidade,
fazia-se necessário o afastamento do entusiasmo de adepto praticante e
adentrar nas indagativas que os campos da filosofia (nomeadamente aqui a
ética e a estética) proporcionam. Ao ganhar forma em um molde acadêmico,
deu-se assim a criação do estudo II com a catalogação e tradução para o
português do código de ética marcial do Kung-Fu, facilitando e aproximando as
compreensões. Por seu lado, o estudo III trouxe para um entendimento tangível
o antigo pensamento chinês a uma realidade contemporânea ocidental.
Objetivando ainda corroborar as referidas reflexões na prática ou mesmo
aparar qualquer “ponta solta” deixada para trás, realizou-se um conjunto de
entrevistas com Mestres de renome do Kung-Fu (estudo IV), assim trazendo
luz sobre tal temática que é popularmente muito falada, mas academicamente
tão pouco estudada. Desse modo, foi possível percorrer pelas narrativas do
mundo acadêmico, pelas reflexões geradas pelo mesmo e após isso ouvir e
interpretar o entendimento ético e estético a partir da experiência vivenciada e
enaltecida pelos docentes de mais elevado patamar hierárquico dessa arte
marcial chinesa milenar.

Defende-se aqui que a conjugação dos quatro estudos que constituem a


compleição desta dissertação doutoral gera uma complementação harmônica
entre si, trazendo luz tanto ao universo filosófico quanto marcial, acrescentando
e engrandecendo educacionalmente ambos. O foco foi estudar de maneira
ampla e diversa os valores educacionais ali contidos, destacando a ética e a
estética. É importante dizer também que o foco não se deu apenas nos
aspectos teóricos, mas sim em sua prática perpetuada nas gerações de
adeptos e reconhecida por Mestres de referência.

Mais especificamente através do estudo I, foi possível observar que no


campo acadêmico pouco se aborda de maneira profícua e profunda sobre a

167
ética e mais ainda sobre a estética no Kung-Fu. Suas narrativas em maioria
carecem de maiores detalhamentos e acabam percorrendo discussões mais
superficiais e genéricas. Os textos apontados pela revisão sistemática chegam
sim a assinalar comportamentos mais direcionados, como respeito às
hierarquias, dedicação constante, zelo ao fazer algo, conhecer e perpassar
suas limitações respeitando sua mente e corpo, sabedoria para efetuar boas
escolhas, liderar e saber ser liderado, adaptar-se aos tempos e dificuldades
buscando harmonia, serenidade emocional em prol de um autocontrole e
pacifismo. Todavia, detalhamentos mais extensos sobre as práticas foram
escassos, sendo muitas vezes citados genérica e superficialmente. Foi daí que
o estudo I colaborou na criação do guião de entrevistas do estudo IV, onde o
mesmo foi convergido para questões mais práticas e concretas e menos
abstratas. Ainda sobre o estudo I, ficou clara a carência de estudos publicados
na lusofonia sobre tal temática.

O estudo II catalogou e compilou os dizeres e ensinamentos voltados


ao campo ético do que é ensinado no Kung-Fu. Os referidos ensinamentos se
organizam como um código ético marcial conhecido como Wu De. Através dele
os praticantes se norteiam em suas atitudes e buscam incorporar valores sob
supervisão e orientação de seus Mestres. Importante dizer, sempre uma busca
de um aperfeiçoamento holístico, tocando o corpo físico, a mente e o espírito à
luz de uma educação pacifista e harmônica. O registro dos preceitos contidos
no Wu De traduzidos para o idioma português facilita a reflexão e entendimento
dos mesmos e ainda alicerça todo princípio educativo e pedagógico dessa arte
marcial milenar de maneira bastante singular, repousando ali valores que
perpassam pelas filosofias confucionistas. Espera-se que tais ensinamentos
sejam colocados em prática no dia a dia do kungfuista (praticante de Kung-Fu)
e não tão somente durante os horários de treinamento.

O estudo III apresenta em seu eixo reflexivo uma importante


necessidade de desconstruir e reconstruir conceitos sobre a arte marcial onde
se enquadra mais especificamente o Kung-Fu. Isso se faz fundamental, pois o
pensamento chinês advém de concepções que não compartilham totalmente

168
com as mesmas nomenclaturas ou entendimentos do Ocidente. Os países e
culturas da lusofonia se enquadram em maioria nesse último prisma. Logo, a
necessidade de discutir, refletir, ponderar, indagar, desconstruir e reconstruir
conceitos e ideias sobre o Kung-Fu numa perspectiva hermenêutica, o que foi
fulcral para que tal estudo pudesse ser confeccionado, sabatinado,
reestruturado, submetido e aprovado à publicação. E assim, ficou definida e
entendida a designação do conceito de arte marcial como uma educação e
prática pacifista, aludindo como um exemplo da cultura chinesa o Kung-Fu,
imerso em questões éticas e estéticas. Vê-se ali uma educação centrada no
ser, ou seja, a pessoa como princípio axial da educação (Queirós, 2002). Mais,
entendendo que a ética é um princípio coletivo, tal ser deve irradiar, transmitir e
emanar essa integridade e dignidade cultivada dia a dia na sociedade de forma
zelosa e fraternal. Já vislumbrando sua raíz estética, nota-se uma ação que
busca abarcar uma visão holística dividida em duas instâncias. A primeira é
conduzida à matéria: do treino do corpo em suas valências físicas, da
superação da dor e das limitações corporais, do estudo empírico de como
melhorar o movimento, no desafiar da gravidade e das forças opostas. Enfim,
algo limitado e movido pelo corpo. Contudo, a segunda direciona-se ao
imaterial: da força de vontade da mente e do espírito, da busca em conquistar e
permanecer com um bom coração, no entendimento de ser herdeiro de uma
herança coletiva que se perpassou através dos tempos e gerações tornando-se
uma representatividade sociocultural impactante criando uma força do ethos.
Enfim, algo direcionado e movido pelo coração e espírito.

Por último, o estudo IV proporcionou a materialização da práxis,


buscando assim descortinar todo o desconhecimento de como a ética e a
estética são ensinadas pelos Mestres e ainda como são colocadas em prática
pelos adeptos do Kung-Fu em seu dia a dia. Tal estudo vem complementar
todo o entendimento teórico já levantado pelo meio acadêmico (estudo I) e nas
reflexões durante a construção desta dissertação (estudo III), dando forma e
principalmente maior tangibilidade às práticas imbuídas e imersas em valores
no cotidiano do ser. É nessa perspectiva que surge e se desvela a edificação
de uma pessoa mais educada no prisma ético e estético. Ou seja, o Kung-Fu

169
como meio de busca de uma educação ética e estética para o alcançar da
incorporação de virtudes como enaltece a visão confucionista, incorporando
humildade, respeito, justiça, confiança, lealdade, vontade, resistência,
perseverança, paciência e coragem (aspectos já evidenciados no estudo II).

Sob tal processo reflexivo, observa-se que o Kung-Fu tem um acervo


teórico ético e estético pouco a pouco constituído através dos milênios.
Todavia, o praticante passa anos por um processo de incorporação desses
valores objetivando tornar tal conhecimento empírico através da práxis, até que
tais práticas tornem-se naturais e tácitas; enfim, parte de si. Talvez para um
entendimento facilitado na cultura ocidental, destaca-se que essa é a busca
contínua para tornar-se um Homo Disciplinatus (Mocarzel & Murad, 2012).
Importante dizer, este último um conceito gerado pelos aspectos educativos
oriundos das artes marciais e que engloba outras facetas humanas
hierarquicamente anteriores perpassadas pelo universo do desporto, como: o
Homo Sapiens com seus entendimentos complexos, o Homo Aestheticus com
sua sensibilidade singular (Ferry, 1997), o Homo Sportivus em sua busca
incessante pela superação (Tubino, 1990), o Homo Politicus objetivando uma
harmonia social individual e coletiva maior (Aristóteles, 2006), o Homo Ludens
expressando sorriso e prazer pelo lúdico da vida (Huizinga, 2010) e
indubitavelmente o afastar da violência em seu entendimento mais sombrio e
torpe do Homo Violens (Dadoun, 1998).

De forma conclusiva, o Kung-Fu em sua constituição cultural chinesa


tornou-se algo para além de um simples meio de autodefesa. Após o estudo,
cotejamento e análise do referencial teórico e dos discursos dos Mestres
expondo seus pensamentos e práticas nesta dissertação, nota-se que tal arte
marcial destaca-se como um caminho educacional filosófico na busca pelo Tao,
conceito que almeja a harmonia maior do ser humano no mundo (Lima, 2000;
Lao, 2001). Não só sob um olhar exterior, mas também voltado para dentro de
si, em um profundo e perpétuo processo de auto avaliação, auto conhecimento
e auto reconstrução. Contudo, o desejo de prosperar, progredir e aprimorar-se
deve se manter firme aos ideais e comportamentos ético-estéticos. Dessa

170
forma, possibilita-se o crescimento de um ser humano virtuoso, que
engradeceu e enalteceu o espírito e o bom caráter e não somente as vaidades
e prazeres do corpo físico. E é nesse espírito iluminado que repousa a
preocupação de uma educação ética e estética através do Kung-Fu. Afinal,
tomando emprestadas as palavras do poeta Fernando Pessoa, tudo vale a
pena se a alma não é pequena!

Como muitos dos estudos do Ocidente que falam sobre o Kung-Fu


utilizados nesta dissertação são de certa forma pioneiros, fica claro que seu
campo de pesquisa ainda tem muitas veredas acadêmicas a serem
desbravadas. Todavia, convergindo aqui ao campo de estudo percorrido por
estas pesquisas em âmbito doutoral, recomendam-se aqui estudos no campo
das humanidades, elevando questões filosóficas, educativas e históricas onde
se defende que esta pesquisa ajudou a abrir portas e alicerçar bases
científicas. Recomendam-se também mais estudos de cunho pedagógico em
suas mais diferentes vertentes e abordagens. Recomendam-se ainda estudos
sobre organização e gestão desportiva no universo do Kung-Fu. Por fim,
recomendam-se pesquisas que teçam comparações educativas e curriculares
das formações acadêmicas de nível superior em Ciências do Desporto (ou
afins) com Wushu30, buscando assim afastamentos e aproximações entre
ambas as formações. Tais recomendações foram aqui apontadas, pois ao
decorrer dos estudos os referidos temas foram paulatinamente observados
com alguma carência, contudo não se constituíam objetivamente como focos
desta pesquisa doutoral, perfazendo-se assim como limitações da pesquisa.
Enfim, fica claro que o Kung-Fu carece de pesquisadores que possuam o
mesmo espírito intrépido e vanguardista dos antigos navegadores lusitanos,
que se lançavam ao desconhecido, enfrentando mares nunca dantes
navegados.

30
Na China existe formação acadêmica de nível superior em Wushu. É o único país que apresenta tal
formação.

171
172
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205
206
8. Anexos

_______________________________________________________________
ROTEIRO SEMI-ESTRUTURADO PARA AS ENTREVISTAS

1. Que estilo(s) de Kung-Fu tradicional pratica e há quanto tempo?


2. O que representa para si ser um praticante de Kung-Fu tradicional?
3. Como é que situa a importância do Kung Fu na educação (ou formação) do
praticante?
4. Que mudanças e transformações você identifica no Kung-Fu tradicional nas
últimas décadas?
5. Os estilos modernos foram fortemente apoiados pelo governo chinês desde
meados do século XX até dias atuais. Que tipo de mudanças é que este
apoio pode ter gerado nos estilos tradicionais?
6. O que lhe é dado dizer sobre ética no âmbito do Kung-Fu tradicional?
7. O que lhe é dado dizer sobre estética no âmbito do Kung-Fu tradicional?
8. Relativamente às questões éticas e estéticas, que diferenças você identifica
entre os estilos tradicionais e modernos e qual a sua relevância?
9. Como situa a importância das questões éticas e estéticas do Kung-Fu
tradicional relativamente à qualidade física e técnica do praticante?
10. Que significado atribui ao Wude (ética marcial do Kung-Fu ) e qual sua
importância no contexto da prática do Kung Fu?
11. Como é que vê a possibilidade de se transporem para a vida quotidiana os
princípios éticos do Kung-Fu tradicional?
12. Quais são as principais questões que você observa na prática cotidiana dos
princípios éticos do Kung-Fu tradicional?
13. Como é que descreve o potencial educativo da dimensão ética do Kung Fu?
14. Que significado atribui à estética e qual sua importância no contexto da
prática do Kung Fu?
15. Como é que vê a possibilidade de se transporem para a vida quotidiana os
princípios estéticos do Kung-Fu tradicional?
16. Quais são as principais questões que você observa na prática cotidiana dos
princípios estéticos do Kung-Fu tradicional?
17. Como é que descreve o potencial educativo da dimensão estética do Kung-
Fu?
18. Quão importantes são as questões éticas e estéticas do Kung-Fu tradicional
na evolução e na carreira do praticante?

XVI

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