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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS
PESQUISA EM ARTES VISUAIS

ELISAMA DE MORAIS SILVA

UMA PRODUÇÃO ARTÍSTICA CONTEMPORÂNEA EM DIÁLOGO COM O CROCHÊ ARTESANAL

Natal-RN
2016
ELISAMA DE MORAIS SILVA

UMA PRODUÇÃO ARTÍSTICA CONTEMPORÂNEA EM DIÁLOGO COM O CROCHÊ ARTESANAL

Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado na Universidade Federal do Rio Grande
do Norte como requisito para a obtenção do título de
Licenciatura em Artes Visuais.

Orientador: Prof. Dr. Vicente Vitoriano Marques


Carvalho

Natal-RN
2016
ELISAMA DE MORAIS SILVA

UMA PRODUÇÃO ARTÍSTICA CONTEMPORÂNEA EM DIÁLOGO COM O


CROCHÊ ARTESANAL

Aprovado em 05 de dezembro de 2016.

_________________________________________________
Prof. Dr. Vicente Vitoriano Marques Carvalho – UFRN (Orientador)

___________________________________________________
Profa. Dra. Laís Guaraldo – UFRN (Examinadora Interna)

____________________________________________________
Profa. Dra. Evanir de Oliveira Pinheiro – IFESP-SEC/RN (Examinadora Externa)
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus que realizou meu sonho de cursar Artes


Visuais nesta universidade e esteve comigo dando-me forças durante minhas
fraquezas e tristezas.
À minha preciosa família, filhos, nora e genro, pela paciência e
compreensão.
Ao meu querido esposo por me acompanhar nessa trajetória, pelo seu
amor, apoio e ajuda constante.
Às minhas queridas netas, que durante o curso se apaixonavam pela arte
cada vez que viam meus trabalhos artísticos e me alegravam quando diziam que
queriam fazer seus desenhos com a mesma técnica utilizada.
Aos meus colegas de curso por compartilharmos momentos de estudos
que ao longo desta jornada se transformaram em fieis amigos.
A todos os meus professores que no decorrer dos anos aqui vividos,
enriqueceram os meus conhecimentos através das aulas ministradas.
Ao meu orientador Vicente Vitoriano que me orientou com muita dedicação
tornando possível a conclusão desta pesquisa.
A todos vocês, meu muito obrigada.
"A arte consiste em fazer os outros sentir o que nós sentimos,
em os libertar deles mesmos, propondo-lhes a nossa
personalidade para especial libertação."
Fernando Pessoa.
RESUMO

O presente documento apresenta o desenvolvimento de pesquisa elaborada para


o Trabalho de Conclusão de Curso em Licenciatura em Artes Visuais da UFRN,
iniciada no segundo semestre de 2015 e sendo finalizada no segundo semestre
de 2016. Nesta direção, a pesquisa teve como objetivo realizar e descrever a
produção de uma instalação artística, com obras que estabeleceram o diálogo do
artesanato de crochê com a arte contemporânea, em uma perspectiva regional.
Para isso, foi necessária a realização de visitas de campo a um grupo de
rendeiras que fazem varandas em crochê na Região do Seridó, para obter dados
sobre seus trabalhos, e assim, planejar e executar as obras em crochê com linhas
de algodão cru, tingidas artesanalmente. Na construção da obra foram usados
como referenciais, os artistas contemporâneos NeSpoon, Sheila Hicks, Crystal
Gregory e Ernesto Neto, os quais fazem uso de técnicas do tecer nas suas obras,
e em Vatenor de Oliveira o referencial temático. Os mesmos serviram como base
para a escolha do objeto de pesquisa com o fito de desenvolver um diálogo entre
o artesanato e a arte contemporânea. E os autores como Zamboni, Almeida,
Morais, Carvalho, Salles, entre outros, trouxeram importantes contributos para a
elaboração desta pesquisa. Este estudo teve como resultado final uma instalação
que carrega o título “Tramas ao vento”. E todo o processo da elaboração das
obras foram registrados em um diário de bordo que se materializou na forma de
uma instalação artística. Com a mesma se pretende apresentar uma obra
carregada de lembranças cognitivas da infância da artista para seu público que
emergirá no ambiente construído por esta. Como o artesanato é uma das mais
ricas expressões da cultura e criatividade de um povo, neste sentido, esta
produção artística propõe um diálogo entre o artesanato, especificamente a
técnica do crochê artesanal da região do Seridó potiguar, com a arte
contemporânea. Assim, a partir deste diálogo, encontramos a relevância deste
trabalho para o contexto sociocultural e histórico vigente.

Palavras–chave: Arte Contemporânea. Artesanato. Crochê. Diálogo. Instalação


Artística.
RESUMEN

En este trabajo se presenta el desarrollo de la investigación llevada a cabo para la


finalización de curso en Licenciatura de Artes Visuales, en la Universidad Federal
del Rio Grande do Norte (UFRN), iniciada en la segunda mitad del año de 2015 y
se completó en la segunda mitad del año de 2016. En este sentido, la
investigación tuvo como objetivo realizar y describir la producción de una
instalación artística, con obras que establezcan un diálogo con la artesanía de
croché con el arte contemporáneo desde una perspectiva regional. Para esto fue
necesario llevar a cabo visitas de campo a un grupo de mujeres que tejen croché
en la Región del Seridó, para obtener datos sobre su trabajo, y por lo tanto para
planear y ejecutar los trabajos en croché con hilos de algodón crudo teñidos a
mano. En la construcción de la obra se utilizaron como referencial los artistas
contemporáneos NeSpoon, Sheila Hicks, Crystal Gregory y Ernesto Neto, que
utilizan técnicas de tejer en sus obras, y Vatenor de Oliveira como artista
temático. Ellos sirven como base para la elección del tema de investigación con el
objetivo de desarrollar un diálogo entre la artesanía y el arte contemporáneo. Y
los autores como Zamboni, Almeida, Carvalho, Morais, Salles, entre otros,
trajeron importantes contribuciones al desarrollo de esta investigación. Este
estudio tuvo como resultado final una instalación que lleva el título "Tramas ao
Vento". Y todo el proceso de la preparación de las obras se registraron en el
cuaderno del artista que se materializó en forma de una instalación artística. La
misma tiene la intención de presentar una obra llena de recuerdos cognitivos de la
infancia del artista a su público que emergerá en el entorno construido para esta
obra. Como la artesanía es una de las más ricas expresiones de la cultura y la
creatividad de un pueblo, en este sentido, esta producción artística propone un
diálogo entre el arte, específicamente la técnica de croché de la región del Seridó
potiguar, con el arte contemporáneo. Por lo tanto, a partir de este diálogo, nos
encontramos con la relevancia de esta obra hacia el contexto sociocultural
histórico de la actualidad.

Palabras-clave: Arte Contemporáneo. Artesanía. Croché. Diálogo. Instalación


Artística.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Varanda de rede em crochê. Parelhas RN...................................................16


Figura 2 - Mulheres tecendo peças de crochê para as obras de NeSpoon, Fundão,
Portugal........................................................................................................16
Figura 3 - “Beauvai Vine” Obra de arte de Sheila Hicks apresentada na 30º Bienal
De São Paulo.............................................................................................20
Figura 4 - “Lianes de Beauvai”. Obra feita em linho, de Sheila Hicks apresentada na
30º Bienal de São Paulo..............................................................................20
Figura 5 - Obra de arte Foundation I, de Crystal Gregory...........................................21
Figura 6 – Obra de arte Foundation II, de Crystal Gregory.........................................21
Figura 7 – Obra de arte Foot Traffic, de Crystal Gregory............................................21
Figura 8 – Obra “Dengo” no Museu de Arte Moderna (MAM-SP)...............................22
Figura 9 – Obra “É o Bicho” na 49º Bienal de Veneza................................................22
Figura 10 – Intervenção Urbana. Obra de arte de NeSpoon......................................23
Figura 11 – Intervenção. Obra de arte de NeSpoon ..................................................23
Figura 12 – Obra “Vatenor, cajus para todos” de Vatenor de Oliveira .......................24
Figura 13 – Acrílico sobre tela. Obra de Vatenor de Oliveira. ....................................24
Figura 14 – Obra autoral “Meu Cajueiro””...................................................................26
Figura 15 – Parte de uma peça que compõe a obra “Meu Cajueiro”..........................26
Figura 16 – Tronco da obra “Meu Cajueiro”................................................................26
Figura 17 – Peças dos troncos tingidos “Meu Cajueiro”.............................................26
Figura 18 – Troncos tingidos da obra “Meu Cajueiro”.................................................27
Figura 19 - Troncos da obra “Meu Cajueiro” sendo costurados..................................27
Figura 20 - Primeiros cajus em crochê, obra “Meu Cajueiro”......................................27
Figura 21 - Experiência com salsa da obra “Meu Cajueiro”........................................29
Figura 22 - Circulo com barbante endurecido da obra “Meu Cajueiro”.......................30
Figura 23 - Cajus de barbante endurecido da obra “Meu Cajueiro”............................30
Figura 24 - Processo dos Cajus sendo tingidos e endurecido da obra “Meu
Cajueiro”....................................................................................................30
Figura 25 - Cajus tingidos e endurecido da obra “Meu Cajueiro”................................30
Figura 26 - Triângulos em crochê para a copa da obra “Meu Cajueiro”......................31
Figura 27 - Tingindo os triângulos em crochê da obra “Meu Cajueiro”.......................31
Figura 28 - Triângulos em crochê tingidos da obra “Meu Cajueiro”............................31
Figura 29 - Triângulos tingidos da obra “Meu Cajueiro”..............................................31
Figura 30 - Retângulos em crochê da obra “Cajus ao vento”......................................32
Figura 31 - Cajus em crochê da obra “Cajus ao vento”................................................32
Figura 32 - Cajus tingidos da obra “Cajus ao vento”....................................................33
Figura 33 - Distribuindo os cajus da obra “Cajus ao vento”.........................................33
Figura 34 - Estudo de montagem da moldura..............................................................34
Figura 35 - Montagem das molduras menores............................................................34
Figura 36 - Montando a obra “Tramas”.......................................................................35
Figura 37 - Moldura com Cajus da obra “Tramas”.......................................................35
Figura 38 - Cajus tingidos da obra “Tramas”...............................................................36
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 11

2 INSTALAÇÃO, ARTE CONTEMPORÂNEA E ARTESANATO ............................................................. 13

2.1 Breve nota sobre a origem do crochê e o artesanato brasileiro ..................................................... 13

2.1.1 Breve história do crochê.................................................................................................................. 14

3 O CROCHÊ E O CAJU COMO MOTE GERADOR DA PROPOSTA ARTISTICA ................................ 15

3.1 Proposta artística: diálogo entre a arte contemporânea e o crochê artesanal ............................. 17

3.2 Referenciais artísticos e temático ...................................................................................................... 18

4 Processo artístico .................................................................................................................................... 24

4.1 A escolha do material ........................................................................................................................... 24

4.2 Obra “Meu Cajueiro” ............................................................................................................................ 25

4.2.1 Experimento com ramas de salsas .................................................................................................. 28

4.2.2 Experimento com barbante e crochê endurecido .......................................................................... 29

4.3 Obra “Cajus ao Vento” ......................................................................................................................... 31

4.4 Obra “Tramas” ...................................................................................................................................... 34

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................................... 36

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 39

APÊNDICE A - FOTOS DAS VARANDAS DE REDE DE CROCHÊ, PARELHAS/RN ............................. 42

APÊNDICE B - FOTOS DA INSTALAÇÃO “TRAMAS AO VENTO” ......................................................... 42

APÊNDICE C - RELATO DA AÇÃO PEDAGÓGICA E FOTOS .................................................................. 45


11

1 INTRODUÇÃO

O trabalho aqui apresentado, que tem por título “Uma produção artística
contemporânea em diálogo com o crochê artesanal”, foi materializado sob a
forma de uma instalação na Galeria de Artes do Departamento de Artes, localizada
no Campus Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(DEART/UFRN). O trabalho configura-se como uma produção artística que propõe
fazer um diálogo entre a técnica de crochê artesanal e a arte contemporânea.
Este documento pretende explicar e relatar o processo de produção artística
resultante do diálogo acima referido realizado no decorrer de toda a pesquisa. Para
esta produção, tem sido utilizada a técnica do crochê, que expressa conexões
estabelecidas entre o que estamos chamando de artesanato e arte contemporânea
em uma perspectiva regional.
A forma como isso seria alcançado foi um desafio ao longo do caminho,
durante um ano e meio. Este percurso iniciou-se em agosto de 2015 na disciplina de
Pesquisa em Artes Visuais ministrada pelo o professor Vicente Vitoriano. A pesquisa
seguiu durante o TCC I e o TCC II. Hoje, ao término da mesma, considero ter
alcançado a maioria dos objetivos propostos, alguns com mais dificuldades que
outros, dificuldades que foram encaradas como desafios a serem vencidos. À
medida que eram ultrapassados, sentia-me enriquecida com as experiências vividas,
e avançava em direção ao término do projeto.
Iniciei este projeto pesquisando sobre artistas que utilizavam a técnica do
crochê em suas obras, em seguida visitei um grupo de mulheres que fazem
varandas de rede em crochê, que eram comercializadas pela extinta Associação dos
Artesãos e Microempresários de Parelhas-RN (ASSOAMEP), na cidade de Parelhas,
Região do Seridó, Rio Grande do Norte, para obter dados sobre seus trabalhos. Em
nossa produção artística, as tramas de fios são baseadas nos pontos usados
tradicionalmente por estas mulheres rendeiras.
A princípio, a ideia era fazer uma releitura de algumas obras do artista
plástico potiguar, Vatenor de Oliveira, “o pintor dos cajus”, plasmada no crochê.
Porém, no desenvolver da pesquisa decidi fazer o trabalho sobre uma obra de minha
própria autoria. E surgiu então a proposta da instalação, à qual dei o título de
“Tramas ao Vento”. Composta por três obras tecidas em crochê, peças que foram
12

executadas com barbante de algodão cru, as quais depois de prontas foram tingidas
artesanalmente com corantes de tecido.
Registrei todos os passos dados na elaboração da obra em meu diário de
bordo. Tais registros foram de grande valia para redigir o relato do processo de
criação, pois com base nos registros foi possível descrever as dificuldades,
mudanças ocorridas no decorrer da pesquisa, experimentos com êxitos e os que não
funcionaram e as preocupações que foram se dissipando ao se aproximar da etapa
final da pesquisa.
A relevância deste trabalho está ligada à importância da produção artística da
instalação intitulada “Tramas ao Vento” para o momento contemporâneo.
Deste modo, com esta instalação pretendo trazer para a academia o valor
desta produção, que está ligada à cultura de comunidades tradicionais que se
mantiveram vivas ao longo dos tempos como um elemento da criatividade popular,
em oposição a diversas técnicas industriais.
A produção artística possui um valor subjetivo, cognitivo e simbólico para o
artista e para o espectador, pois segundo Tolstoi (apud ALMEIDA, 2005, p. 82), “o
artista sente uma certa emoção e transmite essa emoção através da obra à
audiência, provocando nela o mesmo tipo de estado emocional. A expressão é vista
como uma forma de comunicação, permitindo sentir à audiência o mesmo que o
artista sentiu ao criar a obra”. Neste sentido, esta produção nasceu das lembranças
cognitivas da infância da autora, na qual os cajus e cajueiros faziam parte do cenário
da Cidade de Natal-RN. Estas memórias remontam a um tempo em que uma das
principais marcas de nossa região era o caju, que estava espalhado nos mais
diversos lugares da cidade. Sendo assim, a relevância da obra também está ligada à
comunicação deste estado cognitivo e afetivo ao espectador que, em contato com as
obras, compartilhará desta emoção que primeiro nasceu na artista.
Esta pesquisa tem o valor pedagógico de trazer para a audiência elementos
sensoriais que provocam emoções que estabelecem um elo entre artista e
espectador. É a provocação de um olhar para o artesanal que carrega valor
simbólico e cognitivo pessoal, mas que dialoga com o meio social e artístico
contemporâneo, através de técnicas que ressignificam a função e a finalidade do
crochê, trazendo esta produção para uma instalação artística que se comunica com
o velho e o novo, o tradicional e o contemporâneo, o popular e o acadêmico.
13

O trabalho se caracteriza como uma pesquisa em arte, pois tem como produto
final uma criação artística, que segundo Zamboni (1998), a expressão pesquisa em
arte refere-se aos trabalhos de pesquisa relacionados à criação artística, realizados
por artistas pesquisadores que objetivam ter como produto final a obra de arte.
Desta forma todo o andamento da pesquisa e seu registro, configura a
fundamentação teórico-prática do processo de sua elaboração e culmina com a
exposição das obras.

2 INSTALAÇÃO, ARTE CONTEMPORÂNEA E ARTESANATO

Instalação é um fenômeno relativamente recente nas artes e vários artistas


contemporâneos têm expressado sua arte através de instalações, que é sem dúvida,
uma das marcas de um fazer artístico contextual e contemporâneo.
De acordo com Carvalho (2005, p. 266), “[...] as instalações artísticas e outras
obras operam com o contexto, como questão artística e poética, tanto quanto
estética, entre outros aspectos, problematizam as condutas convencionalizadas para
a figura do espectador”. Deste modo, podemos inferir que nossa produção artística
se torna relevante quando “problematiza as condutas convencionalizadas” que são
consensuais para o espectador. Logo, esta produção possibilita um outro olhar sobre
a realidade vigente, quando estabelece diálogo entre o artesanato e a arte
contemporânea.
Destacamos também a relevância de práticas artísticas com técnicas
artesanais. De acordo com o Programa de Artesanato Brasileiro (PAB) (2012, p. 5),
“o artesanato é uma das mais ricas formas de expressão da cultura e do poder
criativo de um povo”. Logo, quando se propõe a dialogar com a arte contemporânea,
esta produção artística está engajada num processo de valorização de uma
expressão cultural que carrega dentro de si elementos regionais e o valor criativo,
historicamente construído pelos grupos humanos.

2.1 Breve nota sobre a origem do crochê e o artesanato brasileiro

O artesanato no Brasil é rico de diversidade por ter tido influência de outros


povos que passaram por aqui. Sabendo disso, é muito importante incentivar a nossa
identidade cultural através do artesanato de cada região do Brasil para que a cultura
14

brasileira e a arte popular não sejam esquecidas e sim valorizadas e disseminadas


através do artesanato.
No contexto nacional, o PAB dá apoio, incentivos, desenvolvimento das
comunidades de artesãos e valorização dos produtos artesanais. Com incentivos
aos pequenos empresários, que podem negociar e expor seus produtos em feiras e
eventos, destinados para este mercado. Estes mercados revelam peças artesanais
de valor cultural com propostas de composições diferenciadas e exclusivas de
determinada região.
Tratando-se do artesanato da região Nordeste há bastante variedade, indo
desde a utilização de produtos orgânicos até a utilização de fibras. Dentro dos
materiais sintético, estão os artesanatos em rendas, garrafas com imagens em areia
colorida, bordados com muitos detalhes, até as redes tecidas com varandas em
crochê. De acordo com o PAB (2012), o crochê é um tipo de artesanato com origem
de matéria-prima processada, no qual se desenvolvem tramas de fio usando,
inclusive, linhas sintéticas.

2.1.1 Breve história do crochê

Segundo Vegne (2011, p.22) a palavra "crochê" tem sua origem do francês
medieval croké, que significa um instrumento de ferro curvado, em forma de gancho,
para suspender ou segurar algum objeto. A expressão broder au crochet ("bordar
com o gancho"), passou a ser conhecida na França no século XIX.
Ninguém sabe ao certo quando ou onde o crochê começou. Alguns escritores
dizem que a técnica do crochê tem origem na Pré-história e que o crochê era tido
como um ofício e não como arte, como se conhece atualmente. Paludan (1976, apud
VEGNE, 2011, p.20) afirma que, após pesquisas para descobrir a origem do crochê,
existem três possíveis origens. Primeiro, chegou à Europa vindo da Arábia, entrando
pela Espanha aproximadamente no ano de 1700, através da rota do comércio pelo
Mediterrâneo. Segundo, há indícios de que algumas tribos da América do Sul
utilizavam a técnica do crochê nos adornos que usavam em rituais da puberdade.
Em terceiro, na China havia relatos de bonecas que foram tecidas com a mesma
técnica.
Ainda segundo Vegne (2011, p.22), o crochê passou a ser difundido em 1800,
quando a francesa Eleonor Riego de La Branchardiere desenhou padrões de crochê
15

e publicou em livros para que as pessoas pudessem copiar os desenhos. Neste


período, o crochê passou a ser o principal passatempo das damas nas cortes da
Itália, da Espanha e da França.
Mesmo que a técnica de crochetar faça parte da cultura popular desde muito
tempo, para muitos é uma atividade desvalorizada ou esquecida.
Em geral, o artesão utiliza o crochê como forma de descobrir as próprias
manifestações artísticas, como também, ao produzir as peças, o artesão pode
beneficiar-se de diversas maneiras como, por exemplo, o próprio bem-estar interior,
o convívio social, ao relacionar-se com pessoas que tenham interesse pela mesma
atividade, ou ainda transformar este passatempo em uma atividade lucrativa, ao
comercializar seus produtos.

3 O CROCHÊ E O CAJU COMO MOTE GERADOR DA PROPOSTA ARTISTICA

Segundo Zamboni (1998, p. 52), falando sobre a prática artística, “poderá


haver vários caminhos diferentes, mas existirá sempre um mais adequado para ser
trilhado”. Deste modo, o crochê artesanal foi o caminho mais adequado a ser
trilhado, o qual me levou a conhecer um grupo de mulheres potiguares que tecem as
varandas das redes em Parelhas, na Região do Seridó, do Rio Grande do Norte. O
grupo se reunia regularmente para fazer vários trabalhos manuais e algumas
mulheres se dedicavam especificamente em fazer varandas em crochê para redes
(Figura 1), um elemento de muito significado para a nossa cultura e que nos faz
lembrar o nosso rincão nordestino.
Estas mulheres me fizeram lembrar a artista polonesa NeSpoon (Figura 2)
que, em algumas de suas obras, usou como inspiração o crochê das mulheres da
cidade de Fundão, Portugal. Da mesma forma, à minha maneira, utilizo o crochê das
mulheres de Parelhas como referência no meu processo de criação.
16

Figura 2: Mulheres tecendo peças de crochê para


Figura 1: Varanda de rede em crochê.
as obras de NeSpoon, Fundão, Portugal.
Parelhas - RN
Fonte: SILVA Elisama, 2015. Fonte: Behance, 2015

O crochê está presente em minha vida há muito tempo. Desde a


adolescência, aos doze anos, aprendi a tecer com uma vizinha, que me ensinou os
pontos básicos, começando com os pontos correntinhas, o ponto alto e em seguida
o ponto baixo. Tendo aprendido os pontos básicos do crochê, pude finalmente tecer
minha primeira peça, uma toalhinha para bandeja, usando basicamente correntinhas
e pontos altos. Fiquei bastante orgulhosa com meu desempenho, o que me
encorajou a seguir tecendo várias outras peças. Começaram, então, a chegar as
primeiras encomendas, tais como bicos em pano de pratos, blusas, meias e
sapatinhos para bebês.
Porém, não demorei a perceber que não me identificava com aquele tipo de
produção. Então, passei a produzir peças decorativas, almofadas, colcha para cama,
trilho para mesa, tapetes e bolsas. Estas peças foram tecidas para uso familiar. Com
o tempo, fui experimentando vários materiais para tecer com o barbante e fios de
plástico, entre outros. No decorrer dos anos, minha relação com o crochê se tornou
mais estreita.
Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), no Curso de
Licenciatura em Artes Visuais, na disciplina História da Arte, estudando os vários
movimentos artísticos, foram apresentados artistas que trabalhavam com a arte
contemporânea e utilizavam vários materiais em suas composições. Havia entre eles
a artista Toshiko Horiuchi MacAdam, apresentada pela professora Adriana Lopes,
17

que usava a arte do tecer na elaboração de suas obras. Desta observação, foi
possível ver a arte do tecer por um ângulo diferente. Como diz Morais (2003, p. 92),
“a apropriação da criatividade popular como base para recriações ou reelaborações
eruditas, tem sido uma constante da arte brasileira desde muito tempo”. Com base
nesta apropriação da criatividade popular surge a necessidade de trilhar pelo
caminho do crochê, atrelando à figura do caju que aparece completando o mote
gerador de minha proposta.
O caju sempre me fascinou, na verdade tenho uma ligação afetiva com o
mesmo. E quando li sobre as obras do artista plástico Vatenor de Oliveira em uma
entrevista dada ao Blog do Programa Xeque Mate da TVU1 despertou-me mais
interesse. Na entrevista, o artista falava que tem no caju a maior inspiração para as
suas obras.

3.1 Proposta artística: diálogo entre a arte contemporânea e o crochê artesanal

Inicialmente, havia pensado em fazer uma releitura de algumas obras do


pintor naif Vatenor de Oliveira, conhecido como o “pintor dos cajus”.
A ideia era fazer algumas molduras em madeira e nela fazer uma trama com
barbante utilizando vários tons de verde, dando uma ideia de folhagens. Nessas
molduras, com a trama, seriam aplicados alguns cajus tecidos em crochê.
A escolha deu-se com a intenção de fazer uma representação simbólica das
minhas próprias lembranças referentes à minha infância, através do diálogo do tecer
artesanal com a arte contemporânea. Desta forma partiu-se para a seleção do tipo
de linha a ser utilizado. Depois de experimentar algumas, percebeu-se que seria
mais adequado usar o barbante de número seis, pois tinha a espessura exata para
deixar a textura que se desejava, um pouco mais maleável, além de dar rápido
crescimento ao tecer, que ajudava a ganhar tempo.
A próxima etapa foi escolher qual ponto de crochê seria utilizado, depois de
tecer várias miniaturas de cajus e folhas, experimentando diversos pontos, decidiu-
se por tecer basicamente com correntinhas e ponto alto para que as peças tivessem
uma mistura do rústico do barbante com a leveza do crochê artesanal.

1 Blog do Programa Xeque Mate da TVU. Disponível em: <http://programaxequemate.blogspot.com.br/2009/11/vatenor-de-oliveira-artista-plastico.html> . Acesso em: 20 de maio de 2015.
18

Todas as peças foram tecidas com barbante, também conhecido como linha
de algodão cru, e depois de prontas tingidas. Os cajus nas cores amarela, laranja e
vermelho e as folhas com vários tons de verde.
Durante a experiência de tecer os primeiros cajus, surgiu a ideia ou
possibilidade de fazer a pesquisa baseada numa produção própria e não mais a
releitura da obra do artista plástico Vatenor de Oliveira. Segundo Salles, Isto é
normal acontecer em uma obra em construção.

“As interações são muitas vezes responsáveis por essa proliferação de


novos caminhos: provocam uma espécie de pausa no fluxo da continuidade,
um olhar retroativo e avaliações, que geram uma rede de possibilidades de
desenvolvimento da obra. Essas possibilidades levam a seleções e ao
consequente estabelecimento de critérios.” (SALLES, 2008, p. 20).

Diálogos frequentes que mantive com meu orientador, o professor Vicente


Vitoriano, com minha filha Kellita Morais, que é arquiteta, e com Francisco Moura,
meu esposo, que também é artista plástico, ajudaram-me a gerar mudanças de
horizontes, possibilitando a produção de um novo projeto, a Instalação “Tramas ao
Vento”. E com a mudança, veio a necessidade de pesquisar os referenciais artísticos
que iriam nortear o tipo de instalação artística que se pretendia realizar,
possibilitando um diálogo da técnica de crochê com estilos contemporâneos, dando
as obras um valor extremamente relevante.

3.2 Referenciais artísticos e temático

Visando uma compreensão melhor sobre a utilização do crochê na arte


contemporânea, tornou-se necessário conhecer o trabalho de alguns artistas que
tecem com vários tipos de materiais, para expressar a sua arte, para que outros
possam apreciar e até mesmo interagir com suas obras que são expostas nas ruas
ou em galerias. Os artistas utilizam a sua arte com fios para expressar uma posição
crítica sobre determinados temas como políticas culturais e ambientais. Outros
simplesmente desejam dar um “colorido” delicado, em lugares especifico das
cidades. Este tipo de arte com fios já está presente em vários países. As
19

possibilidades do artista que deseja trilhar o caminho do tecer são várias. O exemplo
dos seguintes artistas aponta este caminho, e suas obras serviram-me como
referencial artístico.
Sheila Hicks, nasceu nos Estados Unidos em 1934 e, segundo Elbaz (2015,
p. 11), concluiu seus estudos na Universidade de Yale, lá recebeu uma bolsa para
pintar no Chile onde estudou a cultura Andina e suas técnicas artesanais a qual
adotou como referências para suas obras. Como realça Elbaz (2015, p.15) as obras
de Sheila Hicks são uma “desconstrução da estrutura dos meios artísticos
tradicionais” e “é inspirado pela era pré-colombiana de tecelagem”. Segundo Pacce
(2012), a artista tornou-se “uma força crítica na redefinição da arte contemporânea,
reimaginando a profunda relação do artista com o artesão”.
Além de ser conhecida por suas grandes obras, Sheila Hicks também elabora
obras em miniatura ou menores em linho ou barbante com a mesma técnica de
tecelagem. À obra intitulada “Beauvai Vine” (Figura 3), apresentada na 30º Bienal
de São Paulo, a artista faz referência ao Muro das lamentações em Jerusalém, que
para os judeus é um lugar sagrado para orações, e para a artista sua obra é o muro
representando a temporada de frutas maduras de mamões, melancias, laranjas,
mangas e uvas que generosamente caem do céu e pintam a obra com tons
alaranjados, vermelhos e amarelos. Já na obra “Lianes de Beauvai” (Figura 4) a
artista busca uma comunicação com seu espectador através de uma linguagem
universal, a trama de linhas, que faz parte da técnica de tecelagem pertencente ao
artesanato de muitas culturas.
20

Figura 3: “Beauvai Vine” Obra de Figura 4: “Lianes de Beauvai”. Obra


arte de Sheila Hicks apresentada feita em linho, de Sheila Hicks
na 30º Bienal de São Paulo. apresentada na 30º Bienal de São
Fonte: Bamboo, 2012. Paulo.
Fonte: PACCE, 2012.

Crystal Gregory é uma artista plástica norte-americana que usa o tecer nos
elementos cotidianos para suas intervenções urbanas com o objetivo de provocar e
transmitir sensações nos espectadores que passam nas ruas e percebem as
transformações no seu cotidiano.
As tramas de linhas e cores modificam a paisagem urbana e deixam as
cidades com aspecto de alegria. De acordo com Braun (2013, p.27) falando da obra
de Crystal, sua proposta é criar “objetos e instalações que estão relacionados ao
lugar, ao corpo e à arquitetura”.
Nas obras Foundation I (Figura 5) e Foundation II (Figura 6), a artista empilha
alguns tijolos; na primeira, parte dos tijolos são envoltos com crochê, e na segunda
obra, alguns tijolos são retirados e substituídos por crochê, e uma iluminação vinda
do interior dá um toque especial à obra. Em ambos trabalhos a artista constrói um
diálogo entre a leveza e a rigidez.
Instalações como a Foot Traffic de 2010 (Figura 7), foram inspiradas nos
sapatos que eram jogados na ponte Lincoln Road, em Miami-USA, formando um
“candelabro” de fios e cores. Gregory teceu em crochê losangos coloridos que,
unidos formaram uma grande tela que foi colocada na grade da ponte, mudando de
forma simples a visão do local.
21

Figura 5: Obra de arte Foundation I, Figura 6: Obra de arte Foundation II, de


de Crystal Gregory. Crystal Gregory.
Fonte: Crochet Concupiscence, 2011 Fonte: Crochet Concupiscence, 2011

Figura 7: Obra de arte Foot Traffic, de Crystal Gregory.


Fonte: Crochet Concupiscence, 2011

Ernesto Neto, é um dos mais conceituados artistas da arte contemporânea no


Brasil. Suas obras vão desde a escultura até instalações abstratas. Em suas obras
o artista busca representar formas orgânicas com que o espectador possa interagir.
O artista em suas grandes instalações abstratas, usa diversos materiais que vão das
linhas em algodão até redes de nylon em formas de gotas, com especiarias no seu
interior.
Segundo Wilson (2010, p.7 apud VILAÇA, 2011, p.9) esses “volumes
maleáveis e a incorporação de especiarias, Ernesto Neto salienta a importância do
processo perceptivo através do tato e olfato”, ou seja, o artista tem a intenção de
22

levar seus espectadores para interagir com suas obras de maneira a trazer
experiências sensoriais.
Ernesto Neto, em sua obra intitulada “Dengo” (Figura 8), faz uma trama de
corda utilizando a técnica artesanal do crochê e bolas de plástico no interior da peça
formando gotas. Ao longo da obra o espectador pode ter uma experiência sensorial
com as cores, formato e cheiros das especiarias que estão no interior das gotas.
Já na obra “É o Bicho” (Figura 9), o artista se utiliza do tule de poliamida para
representar a pele de animal, sendo este a “pele” que fecha a estrutura interna e, já
o uso das especiarias como o açafrão, cravo e pimenta, são os órgãos em que o
espectador irá interagir e ter diversas sensações.

Figura 8: Obra “Dengo” no Figura 9: Obra “É o Bicho” na 49º Bienal


Museu de Arte Moderna (MAM- de Veneza.
SP). Fonte: Galeria Forte Vilaça, 2008
Fonte: Galeria Forte Vilaça,
2008

NeSpoon espalha seu trabalho artístico pelas ruas de sua cidade, Varsóvia,
Polônia, ou em outros países da Europa. Deixa sua marca por meio de intervenções
artísticas, utilizando crochê, estêncil, cerâmica e outros materiais que têm como
base padrões de renda. O delicado trabalho embeleza os espaços públicos com
uma estética que remete a um artesanato urbano, usando as tintas de spray a artista
embeleza as ruas com suas rendas, que lembram o crochê, para causar impacto
nos espectadores que se apropriam daquele espaço.
Os crochês (Figuras 10 e 11) são distribuídos nos postes das cidades ou em
galhos encontrados na areia da praia, como se fossem a formação de teia das
23

aranhas. Com isso a artista pretende que o espectador tenha um novo olhar para
aquilo que pode ser considerado abandonado e esquecido.

Figura 10: Intervenção Urbana. Obra Figura 11: Intervenção. Obra de arte de
de arte de NeSpoon. NeSpoon
Fonte: Indústria Criativa, 2013 Fonte: Indústria Criativa, 2013.

O tema caju nas obras do pintor potiguar Vatenor de Oliveira despertou o meu
interesse em utilizá-lo como referencial temático e de fazê-lo parte do meu processo
de criação.
Vatenor na maioria de suas obras retrata o caju, uma fruta muito conhecida
no Nordeste do Brasil e que, segundo ele, em entrevista dada ao programa Xeque
Mate da Televisão Universitária:

“remonta ao passado de sua infância vivida felizmente entre as cores e o


aroma dos cajueiros no bairro de Igapó, na cidade de Natal, Rio Grande do
Norte. O caju é, desde o início da sua carreira, o tema central das telas de
Vatenor, um símbolo que para sempre marcará o artista que o tornou
conhecido como o ‘Pintor dos Cajus’ ” (Costa, 2015)

O objetivo do artista plástico é transmitir em suas obras (Figura 12 e 13), as


suas memórias, através de pinturas coloridas.
24

Figura 13: Acrílico sobre tela. Obra


Figura 12: Obra “Vatenor, cajus
de Vatenor de Oliveira.
para todos” de Vatenor de Oliveira.
Fonte: No minuto, 2009.
Fonte: Tribuna do Norte, 2011.

O caju também faz reviver a minha infância, quando eu brincava no sítio de


minha irmã. Lá havia muitos cajueiros nos quais eu subia com outras crianças para
brincar. Colhíamos cajus maduros de cores amarela, laranja e vermelha, que
pareciam saltar ao nosso encontro. A brisa e a sombra que o cajueiro nos
proporcionava ainda perduram em minha memória, e essas sensações pretendo
transmiti-las ao espectador com as minhas obras, com o intuito de estabelecer o
diálogo entre o tradicional e o contemporâneo

4 Processo artístico

O processo artístico da criação das obras foi registrado no diário de bordo, um


item importante na trajetória do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), pois teve
como objetivo registrar tudo, desde o início até ao final da pesquisa. As anotações
iniciais foram referentes ao crochê como técnica artesanal, experimentos e os
materiais a serem utilizados na instalação.

4.1 A escolha do material

Em busca da realização do novo projeto, iniciamos a pesquisa a fim de


descobrir a melhor maneira de utilizar o crochê no processo de criação das obras.
Veio a lembrança do crochê usado pelas mulheres de Parelhas para fazer as
varandas das redes, tecidas com pontos que davam a leveza que estávamos
procurando, como folhas movidas pelo vento. Optamos por tecer o crochê com
barbante cru por ser uma linha mais rústica e ter a facilidade de tingir em vários tons
25

de verde, marrom, vermelho e amarelo. O crochê foi tecido com agulha de número
2, utilizando os pontos básicos do crochê, o ponto alto e correntinhas, os mesmos
usados pelas mulheres da ASSOAMEP.
O próximo passo foi iniciar, tecendo as primeiras obras da Instalação, todavia,
enquanto tecia, pensava na obra como um todo, ou seja, tema e técnica, que vinham
à imaginação e tomavam formas variadas, que subjetivamente se pretendia
comunicar com o espectador através da instalação.
A seguir, passo a descrever o processo de criação das obras que compõem a
Instalação “Tramas ao Vento”.

4.2 Obra “Meu Cajueiro”

A obra intitulada “Meu Cajueiro” representa as memórias de minha infância,


um retorno ao passado.
Esta é a obra com maior dimensão e foi produzida em três etapas.

Primeira etapa

Iniciei tecendo em crochê oito faixas, cada uma delas com 58 carreiras
(Figura 14 e 15), que foram costuradas umas às outras usando agulha de costura
grossa e linha de crochê fina.
Para aumentar a largura da parte inferior desta peça, teci quatro triângulos, os
quais também foram costurados entre as faixas.

Figura 14: Obra autoral “Meu Cajueiro” Figura 15: Parte de uma peça que
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. compõe a obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
26

Antes de tingir as peças com vários tons de marrom, decidi que seria melhor
montar a parte inferior para ter uma ideia de como iria ficar, então fiz um ensaio,
uma junção de três faixas de crochê unindo uma a uma até quase a metade da peça
e emendei a peça triangular entre uma faixa e outra, mas o resultado não me
agradou, percebi que a base não ficou da largura que havia imaginado e tampouco
tinha o caimento que eu desejava. Então percebi que os triângulos deveriam ser
maiores, tanto em largura como em altura e comecei a tecer novos triângulos.
Também mudou a quantidade de troncos (Figura 16, 17, 18 e 19), que antes era
apenas um grande tronco redondo e agora são três troncos no formato triangular,
permitindo desta forma que o espectador interaja melhor com a obra ao caminhar
entre a mesma, tocar os cajus e olhar para o alto, comtemplando a copa do cajueiro
que se estende.
Porém ao analisar qual seria o local onde a obra seria instalada na exposição
mais adequadamente, e já com algumas peças prontas, percebi que toda instalação
não teria o impacto desejado para o espectador se a mesma estivesse dentro da
galeria do DEART. Decidi que deveria trazer a obra “Meu Cajueiro” para o hall de
entrada da galeria, por se tratar de um local com estrutura física mais adequada
para distribuição dessa peça, permitindo o espectador a interagir melhor com a obra.
Fiz a medição do local e constatei os seguintes dados: 3,75m de largura, 2,85m
de profundidade e 4,35m de altura. De acordo com estas medidas, era necessário
fazer 54 triângulos para a copa, 34 retângulos para cada tronco do cajueiro (3
troncos), 09 triângulos para a base dos troncos e 13 cajus.

Figura 16: Tronco da obra “Meu Cajueiro” Figura 17: Peças dos troncos tingidos “Meu
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
27

Figura 18: Troncos tingidos da Figura 19: Troncos da obra “Meu


obra “Meu Cajueiro” Cajueiro” sendo costurados.
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Segunda etapa

Para a segunda etapa da obra, teci cajus em vários tamanhos (Figura 20),
que seriam tingidos nas cores vermelha, laranja e amarelo, os quais ganhariam
volume ao serem cheios com manta acrílica e presos à copa do cajueiro. Para isso
já havia tecido todos os cajus, quando na apresentação do TCC I, as professoras
que compunham a banca, Lais Guaraldo e Regina Johas, sugeriram que pensasse
na possibilidade de mudar os cajus, para não parecer muito figurativo, segundo elas
não condiziam com a arte contemporânea presente em minha pesquisa. Então,
decidi tecer os cajus em formatos de bolas e endurecer com massa endurecedora.
Para testar, dei início a uma série de experimentos que passo a descrever a seguir.

Figura 20: Primeiros cajus em crochê,


obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
28

4.2.1 Experimento com ramas de salsas

Fiz um experimento com ramas de salsa, uma planta do banhado que possui
ramas bastante compridas. Muitos artesãos utilizam as ramas de salsa para fazer
diversos trabalhos, como cestos, vasos, arranjos natalinos, presépios e guirlandas,
entre outros.
Fui à beira do Açude Boqueirão, localizado em Parelhas, para retirar ramas
de salsa. O processo foi retirar todas as folhas, enrolar as ramas em volta de um
balde várias vezes até ficar da espessura desejada e esperar secar por 24 horas
para retirar da forma. Após fazer os círculos com as ramas de salsa, utilizando forma
de objetos como balde pequeno, balde grande e pneus, pois gostaria de ter círculos
de vários tamanhos com o objetivo de escolher o tamanho mais adequado para o
projeto. Depois que retirei os círculos das formas verifiquei que estavam bem
endurecidos e reservei. Teci uma peça redonda em crochê e costurei no círculo feito
com as ramas, para representar o caju. Teci também uma castanha em crochê,
envolvi uma pedra com manta acrílica, pois queria que tivesse peso para puxar a
tela para baixo e costurei a castanha no caju.
Depois de ter feito todo este trabalho, o resultado não me agradou, pois, o
ponto que havia tecido o crochê estava muito junto e a peça parecia um pouco
pesada, sem caimento.
Então decidi fazer outra tela, com pontos mais abertos (Figura 21), desta vez
antes de costurar o crochê no suporte, tingi a peça. Utilizei corante para tingir tecido
da marca Tupy, na cor vermelha. Prendi o caju no suporte para ter uma ideia de
como ficaria.
A castanha foi tecida com linha já na cor cinza, pois achei que seria mais
prático visto que é uma peça menor, depois de pronto costurei a castanha na tela e
no suporte. O resultado desse segundo modelo me agradou bastante.
Após ter tomado a decisão por fazer os cajus de forma mais abstrata em
crochê e ramas de salsa, voltei ao açude Boqueirão para buscar mais ramas para
fazer outras peças, mas não encontrei nenhuma rama de salsa pois não estava na
época. E mais uma vez optei por fazer um outro experimento que havia ensinado na
minha Ação Pedagógica.
29

Figura 21: Experiência com salsa da obra “Meu


Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

4.2.2 Experimento com barbante e crochê endurecido

Pensei em vários materiais para substituir as ramas de salsa, arame, canudos


de jornais, ramas de batata doce e barbante. Como havia ministrado a oficina de
endurecimento de crochê na Ação Pedagógica, resolvi fazer mais um experimento
com barbante endurecido, o mesmo barbante que eu estou usando para fazer o
crochê. Utilizando a mesma técnica para fazer os círculos com as ramas de salsa,
juntei a cola ou o conhecido grude, que é a base para fazer a massa endurecedora.
Esta massa foi preparada da seguinte maneira: dilui em água o amido de milho e
cozi em fogo brando, após engrossar deixei ferver por alguns minutos, desliguei o
fogo e deixei esfriar, coloquei em um recipiente maior e misturei cola branca, álcool
e um pouco de água fria, misturei bem até ficar com uma textura cremosa. Depois da
massa pronta, retirei o barbante do novelo e fui soltando aos poucos dentro da
mistura, retirei a ponta do barbante e fui dando voltas no balde, aproximadamente 20
voltas, cortei o barbante e prendi a ponta, esperei secar 24 horas e retirei do balde
usado como forma (Figura 22). O resultado foi muito satisfatório.
Paralelo a este experimento decidi também endurecer os cajus de crochê
(Figura 23), coloquei o crochê na massa endurecedora retirando todo o excesso da
massa, coloquei-o sobre uma bacia abobadada fazendo a junção da mesma sobre
um balde. Após o tempo de secagem desenformei-o e o resultado foi surpreendente.
Comparando o resultado destes dois experimentos decidi usar os cajus
endurecidos, pois dispensava o uso dos arcos e seria mais prático.
30

As peças em crochê são de vários tamanhos, a ideia é que sejam cajus de


comprimentos variados, que serão presos na parte superior da obra “Meu Cajueiro”
(Figura 24 e 25). Tendo resolvido os contratempos desta segunda etapa, passo a
descrever como foi o processo da etapa seguinte.

Figura 22: Circulo com barbante Figura 23: Cajus de barbante endurecido da
endurecido da obra “Meu Cajueiro” obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Figura 25: Cajus tingidos e endurecido da


obra “Meu Cajueiro”
Figura 24: Processo dos Cajus
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
sendo tingidos e endurecido da
obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Terceira etapa

A terceira e última etapa da obra “Meu Cajueiro” foi tecer triângulos grandes
com barbante e tingi-los com corantes de vários tons de verde, o crochê foi
elaborado com ponto alto e correntinhas (Figura 26, 27, 28 e 29). Os triângulos
foram unidos um ao outro, os quais seriam presos no parapeito do piso superior do
31

anexo do DEART, sustentados com barbante e cabo de aço de espessura fina e


suspensos de um lado a outro para suportar o peso da parte superior desta obra.
Para realizar esta etapa, devido ao prazo curto de execução das obras, entrei
em contato com mulheres que teciam crochê para auxiliar na execução das peças,
contratei quatro mulheres dispostas a me ajudar, mas no andamento da execução
das peças três delas não conseguiram continuar desenvolvendo o crochê, algumas
não sabiam acertar o ponto e outras deixaram por motivo de trabalho, apenas a
senhora Luzinete ficou fazendo crochê comigo até o final do projeto.

Figura 26: Triângulos em crochê Figura 27: Tingindo os triângulos


para a copa da obra “Meu Cajueiro” em crochê da obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Figura 28: Triângulos em crochê Figura 29: Triângulos tingidos da


tingidos da obra “Meu Cajueiro” obra “Meu Cajueiro”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

4.3 Obra “Cajus ao Vento”

Desde o desenrolar deste trabalho foram modificadas algumas ideias ao


longo da pesquisa. As ideias foram ficando mais claras e à medida que avançava a
pesquisa, foram feitas várias adaptações. A princípio foi pensado em fazer um puff,
figurando um lugar de repouso, onde o espectador poderia interagir com a obra ao
32

se sentar e descansar um pouco. Sendo esta a segunda obra da instalação “Tramas


ao Vento”, queria que a mesma dialogasse diretamente com as demais peças, não
queria que fosse algo isolado, e o puff me pareceu uma obra à parte, não estava
cumprindo esse objetivo. A ideia era que a peça tivesse algum movimento, balanço
e delicadeza.
Quando penso em movimento nesta pesquisa, sempre me vem à mente as
varandas que são tecidas em crochê pelas mulheres de Parelhas, passei a pensar
nas varandas como sendo uma rede de conexão, com o conhecimento da técnica
utilizada, o tipo de linha, as varandas aplicadas nas redes e o uso das mesmas
pelas famílias locais no decorrer dos anos.
Desta forma surgiu a terceira peça da instalação, a obra “Cajus ao vento”
(Figura 30, 31, 32 e 33). Nela faço uma alusão ao movimento das varandas das
redes sendo movidas pelo vento, lembram-me também os galhos dos cajueiros
carregados de cajus movidos pelo vento, fazendo conexão com a delicadeza das
varandas de uma rede armada debaixo de um cajueiro.
E para transmitir mais leveza à peça, um ventilador estará soprando
suavemente ao lado da obra na ocasião da exposição, o que fará com que a peça se
movimente lembrando o balanço de uma rede.

Figura 30: Retângulos em crochê da obra Figura 31: Cajus em crochê da obra
“Cajus ao vento” “Cajus ao vento”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
33

Figura 32: Cajus tingidos da obra “Cajus ao


vento”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Figura 33: Distribuindo os cajus da


obra “Cajus ao vento”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

Uma particularidade desta obra são os formatos diferente do caju. Esta peça
me agrada por sua beleza simples, o contraste do colorido dos cajus figurativos
sobre as faixas tecidas com barbante cru, fazendo um diálogo perfeito com o
contemporâneo. Quanto a isso, é interessante a colocação de Salles:

“Devemos pensar, portanto, a obra em criação como um sistema aberto que


troca informações com seu meio ambiente. Nesse sentido, as interações
envolvem também as relações entre espaço e tempo social e individual, em
outras palavras, envolvem as relações do artista com a cultura, na qual está
inserido e com aquelas que ele sai em busca. ” (SALLES, 2008 p. 25 e 26).

A ideia realmente é fazer uma menção às redes tecidas pelas mulheres de


Parelhas, as quais fizeram parte da minha pesquisa. A forma como esta obra foi
fixada, de uma extremidade a outra do canto da galeria, é para remeter à imagem de
uma rede estendida em seus armadores.
Esta obra tem diversas faixas tecidas em crochê, seguindo o mesmo padrão
de pontos da obra anterior, são variados na altura e foram emendadas
aleatoriamente uma à outra, porém não totalmente presas, cada faixa está unida
somente na parte superior dos retângulos para que tenham movimento. Outra
particularidade desta peça é que, diferentemente das outras, não foi tingida, ela ficou
34

na cor natural do barbante de algodão cru, com o propósito de transmitir mais


leveza.
Esta peça tem ainda alguns cajus tecido em crochê, tingidos na cor amarela,
laranja e vermelha, cheios com manta acrílica e aplicados em pontos estratégicos
das faixas.

4.4 Obra “Tramas”

A última etapa do projeto é a criação da obra “Tramas”. Esta obra tem uma
particularidade que a diferencia das demais obras, é o fato da mesma ser composta
por seis molduras (Figura 34, 35, 36 e 37) que formam um conjunto de tramas com
linhas e cajus endurecidos tecidos em crochê.
São seis molduras em madeira. Três molduras medindo 27cm X 40cm e três
medindo 27cm X 60cm feitas por um marceneiro. Ele cortou em uma máquina
apropriada e eu colei as peças de madeira com cola branca.

Figura 34: Estudo de montagem da Figura 35: Montagem das molduras


moldura. menores.
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.
35

Figura 36: Montando a obra Figura 37: Moldura com


“Tramas” Cajus da obra “Tramas”
Fonte: SILVA, Elisama. 2016. Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

A obra foi produzida com barbante na cor verde, um pouco mais grosso do
que usei para tecer o crochê. Para fazer esta peça prendi a ponta do barbante por
baixo da madeira e dei algumas voltas, sempre esticando o barbante de um lado
para outro, formando a trama sem seguir nenhuma direção específica, simplesmente
fui preenchendo os espaços aleatoriamente e quando estava já bem espalhada as
linhas sobre a moldura cortei a ponta e prendi por baixo, de forma que não se
pudesse ver a ponta do barbante.
A próxima etapa foi tecer alguns cajus (Figura 38). Como para cada obra optei
por fazer cajus diferentes, para esta peça teci com barbante cru metade dos cajus,
que foram endurecidos com a massa endurecedora. Para realizar este processo,
passei os cajus já tingido com corante da marca Tupy pela massa endurecedora,
retirei cuidadosamente o excesso da massa e coloquei sobre umas forminhas, que
havia preparado com antecedência para servir de suporte que daria forma ao caju,
utilizei frascos de plásticos com o formato que eu desejava para fazer as formas,
esperei secar durante 24 horas, desenformei e retirei todo o excesso que fica da
massa já endurecida, impermeabilizei com cola branca diluída em um pouco de
água.
36

O passo seguinte foi prender com barbante os cajus sobre a trama que
lembram o emaranhado de galhos com folhas do cajueiro.

Figura 38: Cajus tingidos da obra “Tramas”


Fonte: SILVA, Elisama. 2016.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O foco desta pesquisa é descrever o processo de criação de uma instalação,


utilizando o crochê na elaboração das peças a serem expostas. Durante o processo
criativo foi possível registrar também os desafios que foram encontrados ao longo do
desenvolvimento das obras que levaram a modificar algumas peças, mas não
impediu de atingir o objetivo proposto.
Foi relatado um pouco da história da técnica do crochê, nossa vivência com a
referida técnica no decorrer dos anos e como o crochê tem sido utilizado por artistas
como Nespoon, Crystal Gregory, Sheila Hicks e muitos outros que utilizam em suas
obras a versatilidade desta técnica, observando como cada artista, com suas
características, transmite suas ideias, tecendo peças com fios coloridos em tons
vivos ou suaves.
Ao longo desta pesquisa foi possível destacar também outros pontos
importantes. Quanto à proposta artística, podemos destacar que, por se tratar de
uma instalação e, sendo ela uma das marcas da arte contextual e contemporânea,
esta produção artística procura problematizar as “condutas convencionais”, quando
possibilita ao espectador ter um olhar capaz de entender o diálogo existente do tecer
artesanal com o tecer na arte contemporânea.
37

Em nossa produção podemos ainda destacar que as tramas tecidas em


crochê têm como referência os pontos com que as mulheres rendeiras do Seridó-RN
tecem em crochê as varandas de redes para serem comercializadas. De igual modo,
estas obras procuram destacar o valor de produções culturalmente ligadas aos
costumes de uma comunidade que se opõe à diversidade da produção industrial.
O processo de criação foi registrado no diário de bordo conforme está descrito
nesta pesquisa de TCC, tudo o que foi realizado referente ao processo criativo no
semestre passado e no decorrer deste semestre. Tive o cuidado de registrar
detalhadamente como foram tingidas as peças de crochê, a elaboração da trama, o
endurecimento dos cajus e sua aplicação, nas molduras em madeira, da obra
“Tramas”, detalhes do processo criativo das faixas e dos cajus da obra “Cajus ao
Vento”, como foi tecida em crochê cada parte das peças que compõe a obra “Meu
Cajueiro”, a obra de maior dimensão. E finalmente a montagem dá instalação
“Tramas ao Vento”.
Por ironia do destino, devido a problemas de ordem estrutural, ocasionado por
fortes ventos, o teto do hall de entrada da escadaria foi afetado, causando
vazamentos de águas pluviais, precisamente onde seria instalada a obra “Meu
cajueiro”; por causa desta circunstância foi necessário transferir a obra para o
interior da galeria, onde já estava as demais obras que compõem a instalação.
E como parte da exigência do curso, realizei uma Ação Pedagógica, a qual
está relacionada ao trabalho de pesquisa, através de uma oficina com o tema:
“Crochê endurecido, como endurecer e criar peças com a técnica do crochê
endurecido”. Este trabalho foi realizado com aulas práticas mostrando os três pontos
básicos do crochê; tecendo pequenas peças em crochê, aplicação da massa
endurecida de crochê e como colocá-la sobre peças decorativas.
A Ação Pedagógica foi ministrada em agosto de 2016 e o relatório da mesma
segue em apêndice a este documento (Apêndice C).
Portanto, esta pesquisa de TCC vem tratando do crochê como técnica
utilizada no processo de criação das obras de arte que buscam associações
importantes entre o crochê artesanal com a arte contemporânea. Isto se dá por meio
de uma instalação composta por um conjunto de obras com fios tecidos em crochê,
carregados de valores estéticos e sentimentais, formas que saíram da abstração do
imaginário do artista para se materializar e se integrar num ambiente artístico
contemporâneo.
38

Esta pesquisa me fez entender um significado muito importante referente aos


valores atribuídos ao crochê artesanal para um pequeno grupo de mulheres que
insiste em manter as tradições do tecer varandas de rede em crochê, atividade
quase extinta na região, devido ao aumento do produto industrializado.
Produzir as obras, tendo como referência o trabalho dessas mulheres ajudou-
me, enquanto artista, a entender o quanto é importante para os grupos sociais
guardar as tradições, como também expressá-las através de criações artísticas.
Transmitir este fato através da instalação “Tramas ao Vento” também tem a
pretensão de provocar no público um olhar diferente para o diálogo que pode existir
entre o tecer artesanal e o tecer na arte contemporânea.
39

REFERÊNCIAS

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crochê na arte contemporânea em uma perspectiva educativa. 2013. 96p.
Monografia - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.

CARVALHO, Ana Maria Albani de. Instalação como problemática artística


contemporânea: Os modos de espacialização e a especificidade do sítio. 2005.
369p. Tese - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.

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acervo-para-venda/202959>. Acesso em: 05 out. 2015.
40

FUNDAÇÃO JOSÉ AUGUSTO. Vatenor de Oliveira comemora 40 anos de


carreira com exposição na Pinacoteca. Disponível em:
<http://www.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=31575&ACT=null&PAGE
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


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NETO, Ernesto. Benjamin Mendes. Artes e Ideias. Disponível em:


<http://obviousmag.org/archives/2009/02/ernesto_neto.html>. Acesso em: 25 ago.
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OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 14. ed. Petrópolis, RJ:


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PACCE, Lilian. Bienal de artes de São Paulo: entre fios. Disponível em:
<http://www.lilianpacce.com.br/e-mais/bienal-de-artes-de-sp-entre-fios>. Acesso em:
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SALLES, Cecília Almeida. REDES DA CRIAÇÃO, construção da obra de arte.


Registro na Biblioteca Nacional 359.234, Livro 663 Folha394, 194p. 2008

VERGNE, Gisela de Moraes. Tecendo memórias no ar: A atividade sequencial com


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41

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ZAMBONI, Sílvio. A Pesquisa em Arte: Um Paralelo Entre Arte e Ciência. 2. Ed.


Campinas, SP: Editora Autores Associados, 1998.
42

APÊNDICE A - FOTOS DAS VARANDAS DE REDE DE CROCHÊ, PARELHAS/RN

Varanda em crochê. Parelhas-RN. Detalhe dos pontos em crochê.


Fonte: SILVA, Elisama, 2015. Parelhas – RN.
Fonte: SILVA, Elisama, 2015.

Varanda de rede em crochê.


Parelhas – RN.
Fonte: SILVA, Elisama, 2015.
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APÊNDICE B – FOTOS DA INSTALAÇÃO “TRAMAS AO VENTO”

Montando “Cajus ao Vento” na galeria do DEART Montando a instalação na galeria do DEART


Fonte: MORAIS, Kellita, 2016. Fonte: MOURA, Francisco, 2016.

“Cajus ao Vento” na galeria do DEART


Fonte: MORAIS, Kellita, 2016.

Montando a instalação na galeria do DEART


Fonte: MORAIS, Kellita, 2016.

Troncos do cajueiro
Fonte: MOURA, Francisco, 2016.

Troncos e copa do cajueiro


Fonte: MOURA, Francisco, 2016.
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Elisama Morais montando a sua obra “Tramas”


Fonte: MOURA, Francisco, 2016

Elisama Morais e sua obra “Tramas”


Fonte: MOURA, Francisco, 2016.

Instalação “Tramas ao Vento” Elisama Morais e sua obra “Meu cajueiro”


Fonte: MOURA, Francisco, 2016. Fonte: MOURA, Francisco, 2016
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APÊNDICE C – RELATO DA AÇÃO PEDAGÓGICA

Ação Pedagógica

A escolha do tema teve o objetivo de enfatizar o valor do crochê artesanal,


mostrando sua utilização na arte contemporânea, o que procurei fazer de forma que
as senhoras relacionassem suas ideias com os saberes que estão associados às
emoções e com os acontecimentos de suas experiências de vidas.

Tendo em vista que a oficina seria ministrada para um grupo de senhoras de


meia e terceira idade, creio que as experiências adquiridas das participantes ao
longo dos anos, seriam elementos importantes e capazes de impulsionar a
criatividade das participantes.

PLANO DE AULA

TEMA: “Crochê endurecido, como endurecer e criar peças com a técnica do crochê
endurecido”

LOCAL: Igreja Presbiteriana de Parelhas, Rua Sete de Setembro, nº 215, Centro,


Parelhas, Rio Grande do Norte.

PÚBLICO ALVO: Senhoras do Grupo Vida Ativa, um grupo que oferece terapia
ocupacional a Senhoras de meia e terceira idade.

DURAÇÃO: 8 horas

MATERIAIS NECESSÁRIOS:

Imagens de peças de crochê endurecidos como referência (apresentado em


Notebook)

Linha de crochê

Agulha de crochê

Peças em crochê
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Recipientes de plásticos (redondos, quadrados, retangulares, etc.)

Ingredientes da massa endurecedora (amido de milho, água, cola branca e álcool)

Pincel chato

Verniz

Facas de mesa

OBJETIVOS

GERAL:

Desenvolver a capacidade de utilizar o crochê de forma criativa e inovadora.

ESPECÍFICOS:

- Abordar características do crochê artesanal e sua utilização na arte


contemporânea, apresentando produções artísticas referentes ao crochê.

- Fomentar um diálogo sobre o crochê, comentando a produção artística


desenvolvida no TCC e as possibilidades de uso do tecer.

- Incentivar o diálogo e a criatividade entre os participantes para a produção de


peças utilitárias a partir, da técnica do crochê endurecido.

- Instigar a relação entre os saberes regionais, principalmente no que diz respeito ao


crochê artesanal e sua relação com arte contemporânea.

- Promover a apreciação artística e o fazer artístico através das apresentações de


imagens de obras de artistas que utilizam o crochê em suas criações, tempo para
fornecer também informações sobre seu contexto histórico, suas principais
características e motivações.

Na etapa seguinte da aula, ocorrerá o processo prático, no qual o grupo


estará aberto para iniciar seu processo criativo, desenvolvendo uma postura mais
consciente em relação à sua produção artística.
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JUSTIFICATIVA:

A proposta para a ação pedagógica surgiu da necessidade de ter uma


experiência pedagógica que relacionasse algumas características do fazer artístico
com crochê, utilizando a técnica do crochê endurecido como meio para
representação de ideias advindas, do tecer de um grupo de mulheres, visto que
minha pesquisa de TCC surgiu também do olhar voltado para o crochê das varandas
das redes tecidas pelas mulheres de Parelhas e não só, creio também na
importância em se trabalhar no ensino de Artes Visuais, temas que relacionem a
teoria e o lado emocional com a expressão criativa, encontrei no grupo Vida Ativa,
tais elementos, que eram trabalhados com o objetivo de ajustar as emoções através
da criatividade, para tanto utilizei o contextualísmo de Paulo Freire, aproveitando as
possibilidades para a construção e troca de saberes. Considero de suma
importância, o fato de poder explorar todo o conhecimento obtido durante a
pesquisa, ou seja, acompanhar o processo de forma prática durante a ação
pedagógica

METODOLOGIA:

A oficina será ministrada em dois encontros, sendo desenvolvida da seguinte


maneira, uma breve exposição sobre o objetivo da ação pedagógica, apresentando
a técnica do endurecimento do crochê e algumas obras, dando ênfase ao diálogo
que pode existir entre o crochê artesanal e a arte contemporânea, apresentando
também algumas obras de artistas que usam o tecer em suas criações.

Como a oficina será ministrada a um grupo de senhoras de meia e terceira


idade e um baixo grau de conhecimento artístico, farei apresentação das imagens
feita através do notebook e impressões em folha A4, pois acredito que a
visualização facilitará na aprendizagem.

Em seguida, haverá a apresentação dos materiais a serem utilizados na


oficina, ressaltando as inúmeras possibilidades existente no processo de criação.

Após esse período inicial, a turma terá oportunidade de expor para as demais
integrantes do grupo seus materiais, discutirem o que desejam expressar, se
possuem conhecimentos da técnica do crochê e o que as inspiram.
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Neste período farei também uma demonstração da primeira etapa do


processo de endurecimento da peça de crochê (visto que a segunda parte só poderá
ser realizada após 24 horas, devido ao tempo de secagem), logo após a
demonstração darei um tempo para que elas possam dar evasão a suas ideias,
produzindo suas próprias peças.

Na aula seguinte se fará a impermeabilização das peças, utilizando verniz ou


cola branca, neste momento farei demonstração de como desenformar as peças,
como será feita a retirada do excesso do produto endurecido e como envernizar.

Tendo concluído as atividades práticas, haverá exposição dos trabalhos no


próprio local das oficinas, visto se tratar de um espaço frequentado por várias
pessoas, podendo também nesta ocasião trocar experiências sobre o processo
criativo, pois toda atividade artística favorece a comunicação, o relacionamento com
o meio, a capacidade expressiva e a construção do espírito crítico. Desta forma
compartilho o mesmo pensamento do pedagogo Paulo Freire (1996, p.47) quando
diz: “saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades
para a sua própria produção ou a sua construção”. De igual modo, acredito que o
professor não detém o conhecimento e que o aluno tem sempre algo a contribuir.
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Relatório da Oficina

A Oficina “Crochê endurecido, como endurecer e criar peças com a


técnica do crochê endurecido” ocorreu na Igreja Presbiteriana, localizada na Rua
07 de setembro, nº 215, Centro, na cidade de Parelhas, Rio Grande do Norte.

A igreja localiza-se em um prédio próprio e possui uma estrutura física,


considerada boa para a realidade da comunidade assistida, sendo o público,
pessoas de origem bastante heterogêneo, economicamente falando.

A igreja possui boa organização e procura dar uma boa assistência social a
comunidade, além da assistência espiritual.

As mulheres que participaram da Oficina tinham entre 50 e 65 anos de idade.

Para um melhor aproveitamento do conteúdo, resolvi dividir as aulas em dois


dias, com 4 horas de aula em cada dia, ministradas à tarde.

O primeiro dia de aula (30/08)

O direcionamento do primeiro dia da oficina teve como ponto de partida o


relato do desenvolvimento de meu TCC, com o propósito de inserir os participantes
no contexto da minha pesquisa, no que diz respeito ao possível diálogo do crochê na
arte contemporânea e o crochê artesanal em uma perspectiva regional, como
também, algumas informações técnicas para o exercício da prática do crochê
endurecido. Em seguida ensinei, a partir de imagens e do uso do notebook, como
fazer peças utilitárias e decorativas usando a técnica do endurecimento do crochê.

Após discutir brevemente sobre as muitas possibilidades dos trabalhos a


serem realizados, tratei de relacionar o que havia sido mostrado com o que fora
produzido no meu TCC, dando ênfase ao diálogo do crochê na arte contemporânea
e o crochê artesanal. Também mostrei algumas peças que teci em crochê e que
fazem parte do meu TCC.

As mulheres participaram bastante das atividades, algumas trouxeram


toalhinhas de crochê tecidas em casa, prontas para fazer o endurecimento, outras
trouxeram linhas e agulhas para tecer o crochê na oficina. E um fato bem
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interessante aconteceu, duas senhoras trouxeram linhas e agulhas e pediram para


ensiná-las a fazer crochê, o que não fazia parte da minha oficina, porém tive o maior
prazer em ensiná-las os dois pontos básicos (correntinhas e ponto auto) para elas.
Também pedi que continuassem a tecer em casa e trouxessem na próxima aula.

Terminada esta primeira experiência da oficina, passei a explicar como se


preparava a massa para o endurecimento do crochê. Para adiantar o procedimento,
trouxe a cola de amido de milho de casa (no interior é popularmente conhecida
como grude), coloquei em um recipiente de tamanho médio e aos poucos misturei a
cola branca, a água e o álcool; misturando cuidadosamente até formar um creme
homogêneo, e nesta mistura emergi uma toalhinha de crochê. E após ter certeza
que toda a peça estava molhada, retirei o excesso da massa endurecedora, sem
torcer envolvi a parte externa de um recipiente plástico, redondo ou quadrado, de
acordo com o formato do crochê que serviria de forma. Expliquei que o recipiente
deve estar emborcado sobre uma superfície e que ao terminar esta etapa deve-se
esperar 24 horas para desenformar com muito cuidado, usando uma faca sem ponta
ou o cabo de uma colher.

Desta forma, terminamos o primeiro dia de oficina com um bom


aproveitamento, e devido ao interesse das senhoras ultrapassamos o tempo de
termino da aula, o que ocorreu também no segundo dia de oficina, pois elas
insistiram em prolongar um pouco mais a oficina. A prorrogação foi aceita por todas,
o que para mim foi muito bom, pois deu tempo para fazer a primeira etapa do
processo de endurecimento do crochê de forma que todas pudessem participar,
deixando suas peças secando para a etapa seguinte.

Pude perceber também que, apesar da boa aceitação da oficina, algumas


senhoras demonstraram um pouco de desânimo por não saberem fazer crochê, mas
logo se animaram quando me dispus a ensinar as que quisessem aprender a tecer,
e expliquei que elas não tinham que necessariamente tecer o crochê, mas, poderiam
pedir a alguém para fazer as peças em crochê e elas fazerem apenas o processo de
endurecimento para criarem suas peças.
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O segundo dia de aula (06/09)

O propósito era primeiro recapitular a aula anterior, com o objetivo de ter


certeza que as senhoras tinham condições necessárias para continuarem a
desenvolver a técnica do endurecimento do crochê e, para saber se isto era
possível, realizei mais algumas demonstrações utilizando algumas toalhinhas que
tinha em casa, para logo passar para a etapa de desenformar as peças.

A parte de desenformar as peças foi realizada de forma que todas pudessem


participar. A ideia era que todas as integrantes do grupo observassem-me retirando
minha peça da forma, para em seguida repetirem a atividade em suas peças, que já
estavam secas. Expliquei que deveriam tomar cuidado ao descolarem as peças dos
recipientes plásticos, tal procedimento deveria ser feito cuidadosamente com auxílio
de uma faca sem ponta ou arredondada, em seguida deveriam tirar com ajuda da
mesma faca todo o excesso de cola seca e então chegariam a última etapa do
processo, que era envernizar a peça por dentro e por fora utilizando um pincel chato
e verniz.

O desenvolvimento desta atividade foi regado de surpresas, algumas


senhoras tinham dúvidas se o crochê ia ficar endurecido mesmo e com o formato
dos objetos utilizados como forma, e foi engraçado observar o olhar surpreendido
delas ao ver o resultado final. Este fato deixou as senhoras animadas e ansiosas
para pegar a faca e começar a limpeza das peças para em seguida envernizar. As
senhoras compraram um litro de verniz e levei um pouco de aguarrás para limpar os
pinceis, depois de usar o verniz.

O contentamento com o resultado final foi tanto que muitas não ficaram
satisfeitas com apenas duas tardes destinadas à oficina e me pediram para realizar
mais um encontro, pois queriam fazer mais peças. Este fato deixou-me bastante
satisfeita em saber que o meu objetivo havia sido alcançado, e como era o desejo de
todas, concordei em ter mais um encontro.

E ao fim da oficina as senhoras perceberam o diálogo que pode haver entre o


crochê artesanal e a arte contemporânea. A senhora Madalena, uma das
52

participantes, fez um comentário que confirmou isto: “é, realmente se pode fazer
muitas coisas com o crochê”.

A sugestão da exposição dos trabalhos foi bem aceita, mas preferiram expor
no mês de novembro, ocasião em que os trabalhos feitos durante todo o ano seriam
expostos; visto que elas se reúnem quinzenalmente para fazerem trabalhos
manuais, de imediato fizeram a postagem de seus trabalhos nas redes sociais.

Percebi com essa experiência o quanto é importante produzir uma aula com
foco em alcançar a terceira idade, muitas vezes observei as senhoras trabalhando
animadamente e falando que estas atividades ajudavam a esquecer os problemas,
por este motivo procurei sempre levar as senhoras para a discussão sobre o que
elas estavam produzindo.

Além disso, já ter conhecimento do local e das senhoras para quem eu iria
ministrar a Ação Pedagógica, representou uma vantagem para o bom andamento da
oficina. Acredito que pelo fato de conhecê-las ajudou-me a saber o que seria
necessário preparar em casa com antecedência e o que não seria possível fazer no
local, como por exemplo, a cola de amido de milho que precisava ir ao fogo e, como
no local não havia fogão, levei pronto de casa, utilizei apenas recipientes que havia
na cozinha da igreja que serviram de formas para a produção das peças. No geral,
me ajudaram a cumprir todos os objetivos que foi proposto no planejamento. Fiquei
muito satisfeita com tudo o que produzimos e posso dizer que foi um aprendizado
mútuo, foi uma maravilhosa troca de saberes.
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Demonstração para as alunas

Preparando a massa para o endurecimento Imergindo o crochê na massa endurecedora

Emergindo e tirando o excesso da massa Colocando a peça na forma

Esperando secar

Produção das alunas

Aluna repetindo o procedimento Colocando a peça na forma


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Dando forma a peça Trabalhando na peça

Peça esperando secar Peças finalizadas

Ensinando a fazer crochê

Ensinando como iniciar o crochê Senhora aprendendo a fazer crochê

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