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DIREITO NATURAL E CONSTITUIÇÃO – ANOTAÇÕES PARA O DEBATE

REALIZADO PELO IDASF EM 26.05.20211

Amauri Feres Saad2

1 – O direito natural existe? Qual é a sua utilidade para a discussão jurídica atual?

2 – Separação entre ser e dever-ser: visão jusnaturalista, positivista e pós-


positivista.

3 – Qual é a função da constituição? Jusnaturalismo, positivismo, pós-positivismo.

Eu gostaria de começar falando como e por que eu passei a estudar o direito natural

e a me opor ao positivismo e ao pós-positivismo, não apenas como alguém que

considera tais vertentes do estudo e compreensão do direito como inadequadas ou

prejudiciais ao ser humano, mas também, e principalmente, como uma

representação falsa do fenômeno jurídico.

1Evento disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=FjR4idN32so.


2Doutor e Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Master of Laws pela University of Toronto.
Professor de direito, advogado e consultor jurídico. E-mail: amauri.saad@gmail.com.

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a) O homem integral

A primeira razão é a metodologia que eu passei a adotar para minha vida de

estudos. Eu parto do pressuposto de que o homem é um ser integral, corpo e alma,

e que essa integralidade deve se refletir em todas as suas atividades. Existe um

continuum entre a consciência e o conhecimento de qualquer objeto da realidade.

Vou dar um exemplo de como isso funciona. Eu, bem no início da faculdade de

direito, fiquei fascinado pela teoria dos sistemas, de Niklas Luhmann. É uma teoria

fantástica, com muitas aplicações para o direito. Vale a pena ser conhecida e

estudada. Ocorre que, conforme eu me aprofundava no seu estudo, cheguei a um

ponto fundamental da teoria, que é o da equivalência analítica dos sistemas sociais.

Para Luhmann, cada sistema é enxergado como um feixe de comunicações e opera

segundo um código binário próprio (para a economia: ter e não ter; para a política:

maioria e minoria; para o direito: lícito e ilícito, e assim por diante). A religião, na

concepção luhmanniana, é só mais um sistema, sem precedência sobre os demais.

A teoria é incapaz de ordenar hierarquicamente os sistemas. Ora, uma teoria não

tem a obrigação de refletir exatamente a realidade (afinal, todo esforço científico

é sempre aproximativo), mas tem a obrigação de não a distorcer, e me parece claro

que a teoria dos sistemas proporciona uma distorção. Como eu intuía que o direito,

e a economia e a política eram por definição menos importantes que Deus

(qualquer Deus — não falo só da perspectiva de um católico), então a única

conclusão possível (para mim) era abandonar Luhmann. Antes que apontem esse

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meu abandono como a atitude de um crente, advirto que, embora sempre tenha

sido católico, na época eu não tinha nenhuma prática nem formação religiosa; a

religião ocupava um espaço nulo na minha vida: foi uma decisão estritamente

racional.

Ainda hoje me espanto quando vejo pessoas que se declaram católicas,

protestantes ou judias, e acham que é possível conciliar existencialmente isso com

o crachá de positivista em direito. Posso assegurar que não é possível: ou o católico

mata o positivista ou o positivista, cedo ou tarde, mata o católico. Uma hora ou

outra a sua prática se transforma na sua crença.

b) Toda postura epistemológica pressupõe uma ontologia

As pessoas se esquecem frequentemente de investigar a sua própria cosmovisão

como um pressuposto de sua atividade científica. Em que você acredita? Qual é o

sentido do mundo para você? Pelo que você morreria?

É conhecida a história de Thomas More, um político inglês do século XVI que foi

canonizado. Hoje ele é, para nós católicos, santo. Ele morreu pelas mãos de

Henrique VIII por um motivo aparentemente banal: ele se recusou a prestar um

juramento que na prática significava a afirmação de que o rei exercia uma

precedência espiritual sobre o papa. Para ele continuar vivo e ocupando os cargos

mais honrados do reino ele só precisaria prestar esse juramento, uma coisa de

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nada (todos nós, quando colamos grau na faculdade de direito, prestamos o

juramento à Constituição, que hoje é o nosso Henrique VIII). Mas o conteúdo

daquilo era tão mentiroso, tão repugnante intelectualmente, que More preferiu

morrer. Há, claro, a dimensão espiritual dessa escolha (ele não é santo por acaso),

mas há, também, a dimensão da probidade científica: ele se recusou a deixar que a

sua vida pudesse se estruturar em torno de uma mentira ontológica. (Recomendo

a vocês uma peça, escrita por Robert Bolt, chamada “A man for all seasons”, que

conta essa história.)

Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus e, também como More, um

santo católico, resume em poucas palavras a cosmovisão católica (vou falar dela

porque é a que eu conheço e a que me parece a única correta). Diz ele, logo no início

dos Exercícios Espirituais:

“O homem foi criado para adorar, fazer reverência e servir a

Deus nosso Senhor, e mediante isso salvar a sua alma; e as

outras coisas que jazem sobre a face da terra são criadas para

o homem e para que o ajudem na prossecução do fim para o

qual foi criado. Daí se segue que o homem deve tanto usar

delas, na medida em que o ajudem para tal fim, quanto afastar-

se delas, na medida em que o impeçam.”

Está tudo aí.

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Importante salientar, desse trecho de Loyola, um dado que muitas vezes nos passa

despercebido: a realidade da queda. O mundo — este mundo — é um mundo decaído,

e nós — todos nós — somos seres decaídos.

Carl Schmitt costumava dizer que toda teoria política que se prezasse e tivesse

algum valor tinha que reconhecer que o homem é mau. Ele gostava de uma frase

de Thomas Hobbes, no Leviatã, segundo a qual a vida no estado de natureza é

“solitária, pobre, desagradável, bruta e curta”. Isso é a queda.

A miséria, a morte, os desentendimentos, a tristeza, a opressão, a luta pela

sobrevivência, a desordem, tudo isso é consequência da queda. É nesse mundo, e

com essas pessoas, que temos que construir o direito, e o direito pode apenas

impedir que o mundo piore muito. Se me perguntarem para que se deve estudar

direito, a única resposta que me parece satisfatória é esta: para evitar o genocídio.

Evitar o genocídio é muito diferente de realizar qualquer utopia ideológica neste

mundo.

c) O direito e os direitos

A queda, no entanto, não mudou o universo criado por Deus, só mudou a nossa

posição nele. Se antes a nossa posição era de contato imediato e direto com Deus,

agora essa relação se dá de forma muito mais distanciada e pode ser agravada

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(Santo Tomás fala que os sucessivos pecados que o homem praticou depois da

queda acabaram piorando a nossa capacidade de cognição do direito, i.e., do bem e

do mal). Logo depois da queda, o homem ainda falava com Deus (Caim, já assassino,

tentou esconder o seu crime de Deus) e vivia muitos séculos. Depois disso Deus se

retirou, a vida ficou curta e perigosa, e Deus entrou de novo na jogada, enviou seu

Filho, e o resto nós conhecemos.

Essa distância importa a necessidade constante de o ser humano aprender (ou

reaprender) o que é certo e o que é errado e traz à tona o ideal — que já era

reconhecido pelos gregos — de que a virtude pessoal é determinante na busca da

sabedoria e de que o sábio é, por definição, virtuoso. Trazendo isto para a nossa

discussão (eu já disse isso em sala de aula, sempre com espanto geral): se quiser

fazer bem o seu trabalho, o cientista (e o jurista, nessa linha) deve ser, em certa

medida, um santo. (Ou pelo menos morrer tentando.)

É impossível compreender o direito natural sem a noção filosófica de participação.

Quando nós falamos em participação (em sentido leigo, e não em sentido filosófico),

nós podemos nos referir a certas condutas que um indivíduo faz na qualidade de

membro de uma instituição (assim é a participação de um cidadão na vida política

do país a que pertence, ou a participação de um indivíduo no clube de futebol de

sua preferência). De outro lado, um indivíduo pode dar algo de seu para terceiros

(isso acontece quando alguém dá uma boa notícia a seus parentes, ele participa a

boa nova com eles).

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Em sentido ontológico o conceito ilustra a dependência da criatura em face do

criador. Em relação a Deus, cada ente criado participa do ser de Deus de acordo

com certo grau que é indicado pela essência daquele ente (um cachorro participa

do ser de Deus em grau diferente do homem, mas há participação em ambos os

casos). Deus não participa, nesse sentido; Deus é a plenitude subsistente da

energia ontológica. Deus é a fonte do ser, uma fonte que não retira a sua existência

de nenhum ente alheio a si. Não à toa, Deus, muito antes de Popeye, assim se

definiu, falando a Moisés: Eu sou o que Sou (Êxodo 3:14).

No plano metafísico, participação é um modo de ser e de receber, no sentido de que

o todo permanece intacto e não-dividido, enquanto um aspecto ou forma do objeto

é participado. Tomemos um exemplo do mundo moral: quando praticamos um ato

de caridade com relação ao próximo, quando ajudamos desinteressadamente a

alguém, podemos dizer que estamos imitando uma qualidade que é divina, já que

só Deus possui a caridade em plenitude e é a fonte de toda a caridade. Mas a

participação não é uma mera imitação, é mais do que isso. Quando participamos da

caridade de Deus, não só imitamos Deus mas nos tornamos Deus, aderimos

intimamente a um aspecto de sua existência que se torna o nosso próprio ser. Um

clássico católico é o livro “A imitação de Cristo”. Qual é a ideia que o título deste

livro evoca? A de que eu possa participar de Cristo a ponto de dizermos, como São

Paulo, que já não sou eu que vivo, mas Cristo vive em mim (Gálatas, 2:20). A

Eucaristia é o ápice da participação no divino: quando comunga o fiel literalmente

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come Deus, que se integra não apenas à sua alma mas à sua corrente sanguínea, às

fibras dos seus músculos, e assim por diante. Aquele que participa ganha alguma

coisa do participado, que permanece idêntico a si mesmo. Dito de outro modo, e

mais tecnicamente, a participação é um modo de possuir limitadamente perfeições

que, em si, são ilimitadas.

Essa é a noção de participação, em linhas muito gerais e rudimentares. Quem

quiser se aprofundar nesse estudo (e eu recomendo vivamente que o faça),

consulte os estudos do filósofo italiano Cornelio Fabro, além, é claro, das obras de

Santo Tomás, de Aristóteles e de Platão.

A participação informa a doutrina metafísica tomista, que compreendia o direito

dentro desse quadro.

Mas, antes de tudo, o que é o direito para Santo Tomás? Para ele, uma lei “é uma

ordenança vinculante da razão para o bem comum político, efetivamente

promulgada por uma autoridade competente” (S.t. I-II, 90,1–4). Tudo que estiver

dentro dessa definição possui natureza jurídica.

A mente divina, o justo absoluto, a fonte da qual emana todo o direito, é Deus. A

essa dimensão do direito podemos chamar de direito divino. Nós não temos acesso

ao direito divino, só podemos dele participar.

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O direito natural corresponde ao direito que pode ser apreendido pelo intelecto

humano, racionalmente. Ele se revela pela criação (a natureza, os animais e os

seres humanos), pela revelação (os Dez Mandamentos são uma “ajuda” de Deus

para melhorarmos a nossa cognição do direito natural), e por uma predisposição

natural que todos temos (São Paulo descreve o direito natural como a lei inscrita

no coração do homem). Dito em linguagem de hoje: essa predisposição natural do

homem (essa inscrição da lei natural no seu coração) seria o hardware, e a criação

e a revelação divina são, em conjunto, o software.

Por último, o direito positivo corresponde ao direito instituído pelo Estado, que é a

forma mais ampla e complexa de associação entre seres humanos.

Para o tomismo — que é na verdade um realismo, porque procura descrever a

realidade em toda a sua abrangência —, não há nenhuma oposição entre essas três

esferas (o direito divino, o direito natural e o direito positivo), mas uma relação de

participação. O direito positivo participa do direito natural. O direito natural

participa do direito divino. Na verdade, ambos, o direito positivo e o direito natural,

participam do direito divino; o primeiro mediatamente e o segundo imediatamente.

Um exemplo, o homicídio. O homem pode chegar à vedação do homicídio pelo

direito natural, mesmo que não houvesse um tipo penal correspondente no direito

positivo. A norma que veda o homicídio pertence, em todos os países, ao direito

positivo, que participa de norma com igual conteúdo no direito natural, que

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participa da mente Divina, que reserva a si o direito de dar e tirar a vida de suas

criaturas.

Um outro exemplo, do Canadá. Na Constituição de 1982 os constituintes, que eram

em maioria de esquerda, deixaram de fora do texto o direito de propriedade. Não

há, no direito positivo canadense, o direito de propriedade. Mas os juízes o afirmam

diariamente, independentemente de qualquer texto positivo.

Isso me lembra uma conversa que tive uma vez com um professor positivista da

PUC/SP. Ele se gabava de dizer que não se ocupava do sexo dos anjos (que para ele

era o direito natural) e que gastava o seu tempo só com aquilo que os juízes usavam

para decidir (para ele, o direito positivo). É claro que isso é uma petição de

princípio: se o critério para investigação científica for o que os juízes (ou juristas)

levam em conta para formulação dos seus juízos jurídicos, então basta que estes

usem o direito natural nos seus juízos, como os juízes fazem com o direito de

propriedade no Canadá, para o assunto deixe de ser banal para ser digno de

atenção. É claro que é mistificação.

Um jusfilósofo brasileiro de primeira grandeza, Arnaldo Vasconcelos, numa obra

ainda de maturação do seu pensamento, descrevia essa íntima relação entre o

direito natural e o direito positivo da seguinte forma: para ele, o conteúdo de

qualquer norma do direito positivo é o direito natural, como condição de validade

do direito positivo. (Eu acho que uma melhor formulação desse pensamento teria

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de ser: o conteúdo de uma regra do direito positivo não pode contrariar o direito

natural. Isso porque, se considerarmos uma norma do direito positivo que

estabeleça, por hipótese, a cor dos uniformes dos guardas de trânsito, nós não

podemos dizer que esse conteúdo seja o direito natural, pois não há razão, extraível

do direito natural, para preferir uma cor a outra; nem tampouco um mandamento

divino sobre as cores — Deus deixou, me parece, esse campo livre para os gostos, e

até para o mau gosto, humanos).

d) O modo de apreensão do direito natural

Uma crítica de positivistas ao jusnaturalismo se refere à suposta “falta de acordo

quanto ao conteúdo do direito natural”, de onde se extrai a ideia falaciosa de que o

direito natural não existe. É como se o positivista dissesse: como eu não sei como

chegar ao direito natural, prefiro nem investigar. Na verdade, o que está por trás

deste raciocínio é a ideia de tudo aquilo que é metafísico (isto é, tudo aquilo que

ultrapassa o suprassensível) não é científico e, por isso, não é digno de ser

investigado. Com essa postura, como diz Arnaldo Vasconcelos, falando do fracasso

do positivismo: "Na verdade, mais não se poderia esperar de uma pseudofilosofia

que cinde a realidade ao meio, contentando-se em ficar com a pior parte dela."

(Teoria pura do direito: repasse crítico de seus principais fundamentos. Rio de

Janeiro: Forense, 2003, p. 210.)

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Sobre o momento histórico em que ocorre essa rejeição positivista à metafísica,

que não temos tempo de discutir aqui, recomendo o meu posfácio à obra “A

primeira graça. Redescobrindo o direito natural em um mundo pós-cristão”, de

Russell Hittinger, que tive a honra de traduzir e acabou de ser publicado pela

editora EDA.

Houve, entretanto, tentativas de estabelecer um conteúdo para o direito natural.

Há uma obra interessantíssima, chamada “Derechos y deberes del hombre según

el derecho natural”, de Jacques Leclerq, em que o autor faz um esforço para

determinar o conteúdo do direito natural. É interessante como exercício, mas

nunca vai esgotar as possibilidades do real. A complexidade dos problemas sociais

oferece inúmeras dificuldades, e a eles é muito difícil dar respostas antecipadas.

Por isso é que uma linha mais produtiva dos modernos estudos sobre o direito

natural reconhece que o juízo sobre o que deve ser — que se dá em um contexto

ontológico e, portanto, é metafisicamente condicionado —, é também um momento

de liberdade humana, em que tudo pode acontecer. Recomendo, sobre esse aspecto,

as obras do suíço Martin Rhonheimer e da americana Pamela M. Hall.

É nesse momento, carregado de tensões, que o indivíduo realiza uma complexa

operação moral para saber o que fazer. Santi Romano oferece uma definição

interessante do jurista: para ele, o jurista é o indivíduo que possui a capacidade de

“dominar e perscrutar as mínimas particularidades de um horizonte quase infinito

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(...), que é o da vida social inteira” (Fragmentos de un diccionario jurídico. Buenos

Aires: Ed. Europa-America, 1964, p. 222). A operação de prudência tem de ser

capaz de situar o ser humano na ordem do cosmos e articular o direito positivo e o

direito natural, os quais, como eu disse, não podem logicamente se contrapor.

Na Inglaterra medieval, quando o rei abusava do seu poder, criando ordenanças

(direito positivo, portanto) contrárias ao direito natural, os juízes invalidavam

aquela legislação sob o argumento de que violava a lei fundamental da terra e que

o rei não podia errar (the king can do no wrong). Era inconcebível (era uma

presunção absoluta) que o rei (a autoridade civil) pudesse querer instituir uma

norma de direito positivo contrária ao direito natural, e a resolução do conflito só

poderia se dar pela harmonização do direito positivo com o direito natural.

Alguns direitos positivos reconhecem essa harmonia. A Declaração de

Independência americana reconhece ao indivíduo direitos que lhe são outorgados

por Deus e que não podem ser vulnerados pelo Estado. A Constituição portuguesa

de 1933 (art. 6º, §1º) reconhecia ao indivíduo direitos e garantias “resultantes da

natureza” e estabelecia como limites ao poder do Estado (art. 4º), “a moral e o

direito”.

O positivismo kelseniano tentou fugir do problema, escondendo-o sob a solução da

“norma hipotética fundamental”, que era o fundamento de validade da ordem

jurídica estatal, e que ele próprio reconhecia ser o direito natural.

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O positivismo é um voluntarismo irracionalista, que outorga ao Estado um poder

absoluto sobre o indivíduo, independentemente do direito natural. Vimos o

positivismo em seu Estado puro na Alemanha nazista e nos estados totalitários que

se formaram do século XX em diante. O pós-positivismo, longe de ser uma negação

do positivismo, é uma radicalização do positivismo: ele (pós-positivismo) institui

um voluntarismo radical, não limitado nem mesmo pelo Estado e pelo direito

positivo. O positivismo distorce o direito, o pós-positivismo o dissolve.

Resumindo, e tentando responder objetivamente aos pontos do debate de hoje:

1) Sim, o direito natural existe e é absolutamente fundamental para a

compreensão inclusive e sobretudo do direito positivo.

2) A separação entre ser e dever-ser existe, mas se restringe ao plano da lógica.

No plano da existência, existe uma continuidade entre o que é e o que deve

ser, e as tensões entre ambos os domínios têm de ser resolvidas por um ato

moral pelo qual o homem assume responsabilidade perante Deus e perante

seus semelhantes. Isto é o que, na doutrina moral tradicional, se chama

prudência.

3) O direito natural não oferece uma teoria do Estado, não oferece uma teoria

da constituição. Isto é uma matéria para o direito positivo. O que o direito

natural oferece é a medida de julgamento do direito positivo, uma medida de

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julgamento da constituição e uma medida de julgamento de todo e qualquer

raciocínio jurídico.

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