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O que diferencia o sistema prisional brasileiro daqueles que vemos em países

desenvolvidos?

Glaucia Rossatto Dias da Silva


RA201830940
Faculdades Metropolitanas Unidas
Pós-graduação em Serviço Social e Gestão de Projetos Sociais
Orientadora Mirian Queiroz de Souza Daniel

1. Introdução

As observações do sistema prisional brasileiro nunca permitiram que os


cidadãos pudessem exprimir contentamento. O Brasil é classificado como possuidor
da quarta população carcerária do mundo e isso nunca significou que esta
população equivalesse a todos os indivíduos que carecem de detenção.
Após averiguações realizadas em unidades penitenciárias na Europa e
análise de materiais documentando as instalações, verificou-se uma diferença
equivalente à definição brasileira acerca da condição de detento.
Parece que em nosso país a punição é assumida popularmente como
circunstância de excessiva reprovação e drástico isolamento, através de uma
ruptura social que impede que o sistema prisional se mantenha integrado às cidades
e à sociedade, como de fato deva ser.
Ao observar a Penitenciária de Lisboa e o Presídio em Tegel, viu-se que
esses locais assumem caráter pertencente à cidade, se apresentando integrados,
com acessos e fachadas participantes do urbanismo. Registros históricos mostram
que essa abordagem, mantenedora da proximidade entre o cidadão e sua
condenação, é o que sugere que ele esteja passando pela reforma almejada através
da aplicação das penas.
Enquanto isso, indivíduos detentos no Brasil ficam dispostos em unidades
deslocadas do urbanismo, localizados em regiões afastadas, algumas vezes
desérticas e sem acessibilidade. Esse contexto traduz-se ao indivíduo como
informativo de que ele está proibido à socializar, tal inexistissem, da mesma forma,
atos de cidadania que fossem precisos manter enquanto detento.
Apesar da ênfase despertada pela morfologia do termo, as noções de
cidadania no Brasil são confusas quanto à relação dos comportamentos cidadãos
com a vida nas cidades. Obviamente, ser cidadão somente é possível nas cidades,
ou seja, nos desertos, selvas e outros locais desprovidos de urbanismo, este
conceito se esvai, como se esvai a raiz do termo, ‘cidade’.
Arquiteturas de programas funcionais similares, entre Berlim, Lisboa e o
presídio de Itatinga, podemos seguramente afirmar que o presídio brasileiro não
contempla os conceitos de ‘Segurança e Ordem Pública’, enquanto que nos demais
está entendido que o contexto prisional faz diretamente parte da urbe.

Imagem 1 – O presídio em Tegel e a igreja do estabelecimento, à esquerda, ao centro da área de terreno


ocupada. Com pátio frontal ao ar livre, alguns detentos podem fazer visitas ao santuário. O ângulo da foto
corresponde à vista da janela do hotel em frente ao presídio JVA, onde visitantes costumam se hospedar. Ao
fundo, em terracota à direita, um dos pavilhões. FONTE: Mapa: Arquivo de imagens via satélites do Google
Maps. Foto: Da autora, realizada em Setembro de 2018.
Imagem 2 - Portão principal de acesso ao presídio em Lisboa, na Avenida Marques de Fronteira. A arquitetura
do complexo penitenciário é clássica, foi criado para o fim que se pratica até o presente, transpondo dois séculos
de atividades de regime penal. O entorno imediato tem restaurantes, bares, um shopping center, um parque e
até um asilo. FONTE: Mapa: Arquivo de imagens via satélites do Google Maps. Foto: Da autora, realizada em
Setembro de 2018.

Imagem 3 – No Complexo Penitenciário de Itatinga, a portaria se assemelha a um portal condominial. Os


pavilhões estão sob remota interligação com o sistema viário. Fortaleza tem passado por ataques terroristas, os
quais tem sido apontados como reflexos de descontentamentos dos presidiários. FONTE: Mapa: Arquivo de
imagens via satélites do Google Maps. Foto: Aurélio Alves/O POVO, publicada em 06/01/2019 no Portal Sertões,
www.portalsertoes.com.
3. O que a interpretação dos lugares traduz

Contraditoriamente, no intuito de afastar o regime penal e rebeldes indivíduos


da harmonia pretendida, fez-se a penitenciária cearense tão desconectada que
afrontas da população diante das regras de gestão impostas se tornaram inevitáveis.
Quando se remete aos ocupantes das casas de detenção, vem sendo
atribuído que a indisciplina é característica inerente aos comportamentos. É neste
momento que se designam ideologias de afastar as unidades prisionais, impondo os
presidiários à maneira avessa ao padrão social. Uma tremenda contradição,
certamente causadora de mais revolta.
Formular e corroborar para excluir pessoas da cidade são atitudes pertinentes
às análises da criminalística1. Os sociólogos Berger e Luckmann2 defendem que “a
sociedade resulta da construção social da realidade”. Pelo viés dessa teoria,
colocar um indivíduo sob condição de inexistência para a sociedade é como contar
mentiras e cobrar conformismo, uma postura política e nenhum um pouco legal.
Sobre a localização das unidades, a Lei de Execuções Penais (LEP)
determina que construam penitenciárias longe dos centros. Serão erguidas em
zonas urbanas apenas cadeias públicas e casas do albergado.
Segundo o diretor-geral do DEPEN3, Jefferson de Almeida, “Resolver o
problema com criação de vagas vai demorar muito tempo” e há várias frentes para
resolver a superlotação dos presídios, apontada como o cerne da crise da
Segurança Pública em nosso país.

4. Considerações Finais

Por duas décadas, o Instituto de Regeneração4 foi considerado padrão de


excelência. Sob impossibilidade de edificar com tamanhos rigor e princípios, e
supondo que as desordens vislumbradas em São Paulo decorriam da rebeldia dos
criminosos detentos, o Carandiru foi implodido e o local hoje é frequentado por
pessoas que aprenderam que destruir provas e cenários de conflitos é bom para o
Brasil.
As leis não impedem comportamentos, apenas regram e qualificam os
autores de comportamentos. Os ambientes e lugares, nesse sentido, são mais
eficazes. É impossível acabar com a criminalidade apenas criando ambientes
satisfatórios porque os desobedientes das regras ambientais também são anômalos.

1
Criminalística é a ciência na qual os métodos e técnicas de investigação científica das ciências naturais são
aplicados no exame de material relacionado a um suposto ato criminoso.
2
Peter Ludwig Berger foi um sociólogo e teólogo luterano austro-americano, conhecido por sua obra "A
Construção Social da Realidade" publicada em co-autoria com Thomas Luckmann, professor de Sociologia na
Universidade de Constança na Alemanha.
3
Departamento Penitenciário Nacional.
4
Popularmente conhecido como Carandirú ou Casa de Detenção de São Paulo, na zona norte da capital. No
local hoje está instalado o Parque da Juventude.
Porém, leis e lugares são conceitos que andam juntos e não há como esperar ordem
e progresso sem impeli-los por ambos os canais.
Desde 2009, as penitenciárias femininas devem ter instalações para
parturientes, a Constituição Federal assegura direitos “durante o período de
amamentação” e a LEP estabelece que as unidades possuam creche “para abrigar
crianças maiores de seis meses e menores de sete anos, com a finalidade de
assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa”. Neste caso, o filho
de uma presidiária fica desobrigado do convívio na cidade até os sete anos de
idade? O que será que pretendem para a vida adulta destas crianças?

5. Referências Bibliográficas

A TRIBUNA DO CEARÁ. “Declaração do secretário sobre mudanças em presídios


instigou ataques”, avalia especialista. Coluna da Segurança Pública. Disponível em
http://tribunadoceara.uol.com.br/noticias/segurancapublica/declaracao-do-secretario-
sobre-mudancas-em-presidios-instigou-ataques-avalia-especialista/ . Ceará,
04/01/2019.
BERGER, Peter L.; LUCKMANN, Thomas. The Social Construction of Reality: A
Treatise in the Sociology of Knowledge. No Brasil: A construção social da
realidade: tratado de sociologia do conhecimento. Tradução de Floriano de
Souza Fernandes. Petrópolis: Editora Vozes, 2014.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Conheça os diferentes tipos de
estabelecimentos penais. Portal CNJ. Brasil, 20/07/2015. Disponível em
http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/79914-conheca-os-diferentes-tipos-de-
estabelecimentos-penais .
CORBUSIER, Le. Por uma Arquitetura. (1973) São Paulo, Editora Perspectiva,
2014.
DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional). Levantamento Nacional de
Informações Penitenciárias (Infopen). Ministério da Segurança Pública. Governo do
Brasil. Portal on-line disponível em
http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen/infopen.
O ESTADO DE SÃO PAULO. Em São Paulo, Carandiru vira Parque da Juventude.
Matéria do jornal Estadão. São Paulo, 14/03/2010. https://sao-
paulo.estadao.com.br/noticias/geral,em-sao-paulo-carandiru-vira-parque-da-
juventude,523907.

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