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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

a
FACULDADE DE FILOSOFIA DOM AURELINO MATOS
CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA

BENITO DE PAIVA GONÇALVES

INTEGRAL DE RIEMANN: MATERIAL DE APOIO PARA O ESTUDO


DE ANÁLISE MATEMÁTICA

LIMOEIRO DO NORTE - CEARÁ


2021
BENITO DE PAIVA GONÇALVES

INTEGRAL DE RIEMANN: MATERIAL DE APOIO PARA O ESTUDO DE


ANÁLISE MATEMÁTICA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao curso de Licenciatura em Matemática
da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano
Matos, centro da Universidade Estadual do
Ceará, como requisito parcial à obtenção do
grau de licenciado em Matemática.

Orientador: Prof. Dr. Flávio Alexandre


Falcão Nascimento

LIMOEIRO DO NORTE - CEARÁ


2021
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Universidade Estadual do Ceará
Sistema de Bibliotecas

Goncalves, Benito de Paiva.


Integral de Riemann: material de apoio para o
estudo de Análise Matemática. [recurso eletrônico]
/ Benito de Paiva Goncalves. - 2021.
130 f. : il.

Trabalho de conclusão de curso (GRADUAÇÃO) -


Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de
Filosofia Dom Aureliano Matos, Curso de
Matemática, Limoeiro do Norte, 2021.
Orientação: Prof. Dr. Flavio Alexandre Falcao
Nascimento.
1. Material didático. 2. Análise matemática
na licenciatura. 3. Integral de Riemann.. I.
Título.
BENITO DE PAIVA GONÇALVES

INTEGRAL DE RIEMANN: MATERIAL DE APOIO PARA O ESTUDO DE


ANÁLISE MATEMÁTICA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Licenciatura em Matemática da
Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos,
centro da Universidade Estadual do Ceará,
como requisito parcial à obtenção do grau de
licenciado em Matemática.

Aprovada em: 26 / 02 / 2021.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Flávio Alexandre Falcão Nascimento (Orientador)


Universidade Estadual do Ceará (UECE)

Prof. Dr. Wanderley de Oliveira Pereira


Universidade Estadual do Ceará (UECE)

Profa. Ma. Ana Cecı́lia Costa de Freitas Nogueira


Universidade Estadual do Ceará (UECE)
1

Dedico este trabalho primeiramente a Deus,


por ser meu guia, e a todas as pessoas que
contribuı́ram direta ou indiretamente com
essa realização.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus por ter me dado força nos momentos difı́ceis
e por ter me guiado pelo caminho certo nessa fase da minha vida. Sem Ele, nada disso
seria possı́vel.
Agradeço também aos meus pais, Francisca de Paiva Sousa e Benedito Antônio
Gonçalves, por terem sempre me apoiado nas decisões, muitas vezes difı́ceis, que tive
de enfrentar até aqui, além de darem todo suporte que precisei para a efetivação dessa
jornada. À minha irmã Maria Quitéria, meu motivo de alegria em todos os momentos.
Agradeço a todos os professores que contribuı́ram com minha trajetória acadê-
mica, especialmente ao professor Flávio Falcão por, além de orientado, ter realmente
participado deste trabalho, demonstrando dedicação e muito empenho, além de grande
preocupação em sempre me deixar motivado para a efetivação deste trabalho. Manifesto
aqui minha gratidão eterna por compartilhar sua sabedoria, o seu tempo e sua experiência.
Também sou grato ao professor Wanderley de Oliveira pelas oportunidades me dadas
durante o curso, além de grandes ensinamentos e conselhos compartilhados. Obrigado
por acreditarem na minha capacidade.
E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, o
meu muito obrigado.
1

“Na maior parte das ciências, uma geração


põe abaixo o que a outra construiu, e o que
a outra estabeleceu a outra desfaz. Somente
na Matemática é que cada geração constrói
um novo andar sobre a antiga estrutura.”
(Hermann Hankel)
RESUMO

As disciplinas que tratam sobre a Análise Matemática, em grande parte dos cursos de
Licenciatura em Matemática, restringem-se apenas a tópicos inicias do livro “Análise
Real: funções de uma variável” do autor Elon Lages Lima. O estudo dos conceitos que
a análise contém agregam bastante valor na formação do licenciando em matemática,
tanto para aqueles que desejam lecionar na Educação Básica, quanto para aqueles que
queiram seguir carreira acadêmica. Assim, por ser uma disciplina bastante desafiadora,
surge a seguinte problemática: que material didático produzir para os alunos de cursos
de licenciatura em matemática, que potencialize ou agregue nos seus estudos em análise?
Para solucionar esse questionamento, foi adotado como referência principal para este tra-
balho o livro “Curso de Análise” volume 1, também de autoria de Elon Lages Lima, e
além disso, trabalhar o capı́tulo que aborda integrais nesse livro. Este trabalho tem como
objetivo principal, produzir um material didático de Análise Matemática com foco no
conteúdo de Integrais de Riemann e, como objetivos especı́ficos, explorar Integrais de
Riemann com base em livros de análise; apresentar resultados de maneira precisa, a fim
de tornar o conteúdo mais compreensı́vel aos estudantes de análise; indicar, no decorrer
do trabalho, livros em que se encontra grande parte dos resultados usados no decorrer
de algumas demonstrações, tornando claro os passos implı́citos em provas e explicitando
resultados omitidos. Espera-se que esse trabalho seja fonte de muito estudo para os leito-
res interessados em se aprofundar e entender boa parte da teoria de Integrais de Riemann.

Palavras-chave: Material didático. Análise matemática na licenciatura. Integral de


Riemann.
ABSTRACT

The subjects that deal with Mathematical Analysis, in most of the Mathematics Degree
courses, are restricted only to the initial topics of the book “Análise Real: funções de uma
variável” by the author Elon Lages Lima. The study of the concepts that the analysis
contains add a lot of value in the formation of the mathematics licentiate degree student,
both for those who wish to teach in Basic Education, and for those who want to pursue
an academic career. Thus, as it is a very challenging discipline, the following problem
arises: what didactic material to produce for mathematics licentiate degree student, that
enhance or aggregate in their studies under analysis? To solve this question, the book
“Curso de Análise”, volume 1, also authored by Elon Lages Lima, was adopted as the
main reference for this work, and also, the chapter that addresses integrals in that book
for to work. This work has as main objective, to produce a didactic material of Mathema-
tical Analysis focusing on the content of Riemann Integrals. The specific objectives are:
to explore Riemann Integrals based on analysis books; present results in a precise way, in
order to make the content more understandable to students of analysis; indicate, in the
course of the work, books in which is found a large part of the results used in the course
of some demonstrations, making clear the implicit steps in proofs and explaining omitted
results. It is hoped that this work will be a source of much study for readers interested
in deepening and understanding a good part of Riemann’s Integrals theory.

Keywords: Didactic material. Mathematical analysis in the licenciate degree. Riemann


integral.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Representação das somas como áreas de polı́gonos, um ins-


crito e outro circunscrito, ao gráfico de f. . . . . . . . . . . . . 28
Figura 2 – Função escada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Figura 3 – Gráfico da função f . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
Figura 4 – Gráfico da função F . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
Figura 5 – Elementos das partições P e P1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
2 PRELIMINARES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.1 Conceitos iniciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2 Resultados básicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
2.3 Problemas sobre inf e sup . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
3 INTEGRAL DE RIEMANN . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
3.1 Integral superior e integral inferior . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
3.1.1 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.2 Funções integráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
3.2.1 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
3.3 O Teorema Fundamental do Cálculo . . . . . . . . . . . . . . . . 68
3.3.1 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
3.4 Fórmulas clássicas do Cálculo Integral . . . . . . . . . . . . . . . 81
3.5 A integral como limites de somas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
3.5.1 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
3.6 Caracterização de funções integráveis . . . . . . . . . . . . . . . 103
3.6.1 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130
11

1 INTRODUÇÃO

A ideia de integração tem sua origem em conceitos e problemas geométricos,


nos quais os gregos colocavam entre as suas principais preocupações. Dentre esses proble-
mas podemos destacar o cálculo de áreas de figuras por meio de decomposições através de
polı́gonos retangulares. Embora essa técnica de construção geométrica esteja relacionada
com ideias aparentemente simples, como a de calcular áreas por meio da soma das áreas
de polı́gonos, o seu entendimento perfeito só se tornou possı́vel com a chegada do Cálculo
Diferencial e Integral que trouxe consigo o conceito de limite. A criação do Cálculo tem,
em grande parte, se originado no século XVII devido aos matemáticos Fermat, Newton,
Leibniz, entre outros, que começaram a relacionar tais noções geométricas às ideias de
integração que conhecemos hoje. Apesar dos criadores do Cálculo tenham preenchido
certas lacunas deixadas pelos gregos, haviam ainda muitas deficiências e lacunas a se-
rem preenchidas no que se refere ao formalismo e o rigor matemático. Esse rigor que a
Matemática necessitava, principalmente a partir do século XVIII, exigia que os conceitos
do Cálculo, baseados em interpretações geométricas, fossem devidamente aritmetizados.
Isso foi feito por vários matemáticos entre os quais podemos destacar Cauchy, Riemann,
Bolzano, Weierstrass, Cantor, que apresentaram de maneira mais sólida e rigorosa os
conceitos de limite, continuidade, derivação, integrais, entre outros.
Fazendo uma pequena associação da história com a matriz curricular dos cursos
de licenciatura em matemática, o inı́cio do Cálculo, com suas motivações e interpretações
geométricas, assemelha-se, de uma maneira mais sútil, com o que é abordado na dis-
ciplina Cálculo Diferencial e Integral. Enquanto as disciplinas que são destinados para
os alunos estudarem Análise Matemática, está próxima daquilo que os matemáticos dos
séculos XVIII fizeram com o Cálculo. Essa divisão (Cálculo × Análise) se deve tanto por
questões históricas, como também por motivações pedagógicas, pois é necessário conside-
rar o amadurecimento progressivo dos estudantes que aprendem nos conceitos do Cálculo
de maneira intuitiva para, posteriormente, retornarem aos mesmos conceitos, dessa vez
vestidos a rigor na Análise Matemática.
Contudo, durante a graduação, boa parte dos cursos de licenciatura em ma-
temática, nas disciplinas de Análise, restringem-se apenas aos conceitos iniciais, que se
origina na dedução dos números naturais pelos três axiomas de Peano e chegam até
sequências e séries de número reais, adotando de maneira axiomática no meio do percurso
a existência do corpo ordenado completo dos números reais. Isso pode ser considerado
algo negativo, pois o licenciando pode deixar tanto de vivenciar uma cultura matemática,
quanto aprender boa parte de como a matemática se organizou ao longo da história. Es-
ses dois fatores contribuem significativamente na construção de um ponto de vista crı́tico
sobre a matemática moderna, além de possibilitar o discente ser um docente mais ri-
goroso matematicamente, afrontando o ensino da matemática por meios de técnicas e
12

memorização de fórmulas, algo bastante presente na Educação Básica.


Além disso, os conceitos sobre análise não abordados na licenciatura, pode se
tornar um fator limitante para os educandos que pretendem seguir carreira acadêmica no
âmbito da matemática pura. Pois, ao observamos os mais diversos processos seletivos para
um programa de mestrado em matemática pura, é exigido de maneira majoritária concei-
tos de análise que até então, grande parte dos cursos de licenciatura não abordam. Isso
impõe que alunos de licenciatura que queiram seguir na área, busquem por conta própria
preencher essa lacuna. Dessa maneira, evidencia-se diversas dificuldades por parte dos
discentes em dar continuidade nesses estudos. Entre esses obstáculos, podemos destacar
a ausência de materiais mais compreensı́veis, que apresentem os resultados de maneira
mais precisa e explı́citas para o discernimento de certos conceitos.
Alguns livros de análise, embora bastante completos, apresentam as demons-
trações e soluções de problemas de uma maneira mais concisa, com intuito de tornar o
material mais acessı́vel, relativo a logı́stica de acesso. Porém, apesar de ser um excelente
exercı́cio tentar entender esses resultados da maneira que estão escritos, alguns alunos
acabam frustados por não terem uma base teórica adequada para isso ou por não terem
adquirido uma maturidade suficiente para entenderem certos conceitos sem a mediação
do professor, algo que colabora para a idealização de que estudar análise é algo quase
impossı́vel.
Diante disso, devido a demanda dos conteúdos que podem ser trabalhados em
análise ser grande, decidimos eleger o conteúdo de Integral de Riemann para produzir um
material didático para alunos de cursos de licenciatura em matemática, com o intuito de
acrescentar ou potencializar os seus estudos no âmbito da análise, pois detectamos que
a Integral de Riemann é um dos tópicos em que a maioria dos cursos de licenciatura em
matemática não conseguem atingir, bem como, é um dos conteúdos que mais carece na
busca de seus resultados em materiais eletrônicos. Pensando nisso, traçamos como obje-
tivo geral, produzir um material didático de Análise Matemática com foco no conteúdo de
Integrais de Riemann e, para atingir esse propósito, traçamos como objetivos especı́ficos:
explorar Integrais de Riemann com base em livros de análise; apresentar resultados de
maneira precisa, a fim de tornar o conteúdo mais compreensı́vel aos estudantes de análise;
indicar, no decorrer do trabalho, livros em que se encontra grande parte dos resultados
usados no decorrer de algumas demonstrações, tornando claro os passos implı́citos em
provas e explicitando resultados omitidos.
De acordo com os objetivos especı́ficos, este trabalho teve como ação inicial
explorar as Integrais de Riemann, realizando estudos em livros de análise, proporcionando-
nos maior familiaridade com o conteúdo. Nesta ação evidenciamos que o livro de Lima
(2014) era o mais utilizado para o estudo dessa disciplina, porém decidimos adotar como
referência principal o livro de Lima (2012), devido ser mais completo e englobar grande
parte da teoria de integrais evidenciados nos demais livros. A ação seguinte foi aprimo-
13

rar o Capı́tulo IX do Livro de Lima (2012), apresentando resultados e demonstrações de


maneira mais precisa, além de acrescentar mais exemplos, demonstrações omitidas, bem
como figuras e gráficos para auxı́liar os leitores no entendimento de conceitos, pois, como
bem assegura Lima (2012), é oportuno trazer figuras, como de gráficos de funções, para o
melhor entendimento dos raciocı́nios do texto, servindo de guia à nossa imaginação e su-
gerindo ideias que ajudam a entender certos conceitos, embora as figuras não intervenham
diretamente na argumentação lógica do texto.
Por fim, na terceira ação buscamos explicitar alguns resultados omitidos ou
evidenciados implicitamente na obra nos quais achamos relevante destacar.
Com o intuito de atingir o objetivo principal, de produzir o material de apoio
aos estudantes de análise, esta pesquisa é classificada como exploratória, uma vez que,
segundo Gil (2002) estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior familiaridade
com o problema, com o intuito de torná-lo mais explı́cito, tendo como um dos objetivos
principais o aprimoramento de ideias.
Do ponto de vista de procedimento técnico, podemos classificar também como
uma pesquisa bibliográfica, pois, conforme Gil (2002), este tipo de pesquisa é desenvol-
vida com base em material já elaborado, constituı́do principalmente de livros e artigos
cientı́ficos.
Muito embora a principal fonte bibliográfica deste trabalho seja a obra de
Lima (2012), utilizou-se também, como fonte de pesquisa, os livros de Lima (2014), Ru-
din (1976), Figueiredo (1996) e Ávila (1999). Vale ressaltar que esta monografia está
estruturada em mais três seções subsequentes, apresentados a seguir: a segunda, Prelimi-
nares, subdividi-se em três subseções dados por: Conceitos iniciais; Resultados básicos;
Problemas de inf e sup, que contemplam resultados e definições essenciais de análise para
o estudo de Integrais de Riemann. A terceira seção, Integral de Riemann, apresenta de
maneira mais precisa os teoremas, lemas, proposições e exemplos de Integrais de Riemann
abordados na obra de Lima (2012), bem como a introdução de figuras, gráficos e resulta-
dos que se encontravam de maneira implı́cita na obra. A quarta e última seção, nossas
considerações finais ao leitor.
14

2 PRELIMINARES

Nessa seção, apresentamos os pré-requisitos que julgamos necessários para a


exposição dos resultados e definições das seções subsequentes deste trabalho. Vale ressaltar
que extraı́mos grande parte da teoria do livro de Lima (2012), bem como, omitimos grande
parte das demonstrações dos resultados presentes nessa seção. Entretanto, sempre que
possı́vel, indicamos as referências para encontrar as demonstrações omitidas. Finalizamos
essa seção com alguns problemas do conteúdo de ı́nfimo e supremo, essenciais para a seção
a seguir. Além das referências citadas nessa seção, mais detalhes sobre alguns conceitos
aqui expostos podem ser consultados em: Lima (2014), Figueiredo (1996) e Rudin (1976).

2.1 Conceitos iniciais

Iniciamos com algumas definições úteis para serem consultadas pelo leitor e
citadas no decorrer do trabalho. Vale salientar que nesta seção não hesitamos em abordar
rigorosamente as teorias que antecedem a de Integral de Riemann, pois acreditamos que
nossos leitores já tenham estudado Cálculo e tido um contato com conceitos iniciais de
Análise Real.
Na seção seguinte, tratamos de estudar a teoria da integrabilidade de funções
limitadas. Essa teoria está baseada na aplicabilidade dos conceitos de ı́nfimo e supremo
(que certos tipos de conjuntos de números reais gozam). As definições logo abaixo são
necessárias para introduzirmos as noções de ı́nfimo e supremo, bem como caracterizar os
conjuntos que usufruem desses conceitos.

Definição 2.1 Um conjunto X ⊂ R diz-se limitado superiormente quando existe algum


b ∈ R tal que x ≤ b, para todo x ∈ X.

Neste caso, todo elemento b ∈ R que limita um conjunto X ⊂ R superiormente


é denominado cota superior de X.

Definição 2.2 Diz-se que um conjunto X ⊂ R é limitado inferiormente quando existe


a ∈ R tal que a ≤ x, para todo x ∈ X.

Analogamente, todo número a ∈ R que limita um conjunto X ⊂ R inferior-


mente é chamado cota inferior de X.

Definição 2.3 Um conjunto X ⊂ R chama-se limitado quando é limitado superiormente


e inferiormente, ou seja, quando existem a, b ∈ R tais que X ⊂ [a, b].

Definição 2.4 Diz-se que um número p ∈ X ⊂ R é o menor elemento de X (ou elemento


mı́nimo de X) quando se tem p ≤ x para todo x ∈ X.
15

Definição 2.5 Diz-se que um número p ∈ X ⊂ R é o maior elemento de X (ou elemento


máximo de X) quando se tem p ≥ x para todo x ∈ X.

Estabelecidas as Definições acima, introduzimos logo abaixo os conceitos de


ı́nfimo e supremo.

Definição 2.6 Seja X ⊂ R um conjunto limitado superiormente e não vazio. Um ele-


mento b ∈ R chama-se supremo do conjunto X quando b é a menor das cotas superiores
de X em R.

Mais explicitamente, b é o supremo de X quando cumpre as duas condições:


S1: Para todo x ∈ X, tem-se x ≤ b.
S2: Se c ∈ R é tal que x ≤ c, para todo x ∈ X, então b ≤ c.
A condição S2 admite a seguinte reformulação:
S2’: Se c < b, então existe x ∈ X tal que c < x.
Podemos entender S2’ ainda da seguinte maneira: dado ε > 0, existe x ∈ X tal que
b − ε < x.

Definição 2.7 Seja X ⊂ R um conjunto limitado inferiormente e não vazio. Um ele-


mento a ∈ R chama-se ı́nfimo do conjunto X quando a é a maior das cotas inferiores de
X em R.

Mais explicitamente, a é o ı́nfimo de X quando cumpre as duas condições:


I1: Para todo x ∈ X, tem-se a ≤ x.
I2: Se c ∈ R é tal que c ≤ x, para todo x ∈ X, então c ≤ a.
A condição I2 admite a seguinte reformulação:
I2’: Se a < c, então existe x ∈ X tal que x < c.
Podemos entender I2’ ainda da seguinte maneira: dado ε > 0, existe x ∈ X tal que
x < a + ε.

Entendido o que é um conjunto limitado, e que tipos de conjuntos fazem sentido


falarmos de ı́nfimo e supremo, de maneira mais direta, apresentamos logo abaixo quando
uma função f : X ⊂ R −→ R é limitada, fazendo sentido definirmos o ı́nfimo e o supremo
de f.

Definição 2.8 Uma função f : X ⊂ R −→ R chama-se limitada quando sua imagem


f (X) ⊂ R é um conjunto limitado. Neste caso define-se o sup f como o supremo do
conjunto f (X). (Às vezes se escreve sup f (x) ou sup f.)
x∈X X

A noção de valor absoluto, em geral, é de muito importância na Análise Ma-


temática. No estudo das Integrais de Riemann usamos muito esse conceito em mani-
pulações algébricas para determinadas demonstrações de resultados.
16

Definição 2.9 No corpo ordenado R, definiremos o valor absoluto de um elemento x,


como sendo x, se x ≥ 0 e −x se x < 0. Usaremos o sı́mbolo |x| para indicar o valor
absoluto. Assim, dado x ∈ R, tem-se



 x, x > 0,

|x| = −x, x < 0,



 0, x = 0.

Observação 1. Dado x ∈ R, ou x e −x são ambos zero, ou um é positivo e o outro é


negativo. Aquele, entre x e −x, que não for negativo, será chamado |x|. Portanto, |x| é
o maior dos elementos x e −x. Em outras palavras |x| = max{x, −x}. Este fato poderia
ter sido usado como definição.

Observação 2. Se |x| = max{x, −x}, então x ≤ |x| e |x| ≥ −x. A última desigualdade
pode ser escrita como −|x| ≤ x. Assim, temos −|x| ≤ x ≤ |x|, para todo x ∈ R.

Listamos a seguir alguns conceitos topólogicos de subconjunts da reta R, que


julgamos necessários para a compreensão de noções básicas da teoria de Integrais de
Riemann.

Definição 2.10 Dado um conjunto X ⊂ R, um ponto x ∈ X chama-se ponto interior de


X quando existe um intervalo aberto (a, b) tal que x ∈ (a, b) ⊂ X.

Definição 2.11 Um subconjunto A ⊂ R chama-se um conjunto aberto quando todos os


seus pontos são interiores.

Definição 2.12 Diremos que um ponto b é aderente a um conjunto X ⊂ R quando b for


limite de uma sequência de pontos xn ∈ X.

Definição 2.13 Chamaremos fecho do conjunto X ao conjunto X formado pelos pontos


aderentes a X.

Definição 2.14 Um conjunto X ⊂ R diz-se fechado quando X = X, isto é, quando todo
ponto aderente a X pertence a X.

Definição 2.15 Um conjunto X ⊂ R chama-se compacto quando é limitado e fechado.

Apresentamos abaixo um breve compêndio de definições ligadas a teoria de


Limites, continuidade e derivabilidade de funções reais.

Definição 2.16 Um número real c chama-se um valor de aderência de f no ponto a


quando existe uma sequẽncia de pontos xn ∈ X −{a} tal que lim xn = a e lim f (xn ) = c.
n→∞ n→∞

Definição 2.17 Chamaremos limite superior de f no ponto a ao maior valor de aderência


17

de f no ponto a. Escreveremos
lim sup f (x) = L
x→a

para exprimir que L é o limite superior de f no ponto a.

Definição 2.18 Se l é o menor valor de aderência de f no ponto a, diremos que l é o


limite inferior de f no ponto a e escreveremos

lim inf f (x) = l.


x→a

Definição 2.19 Seja f : X −→ R uma função e a ∈ X 0 . Considere, para todo δ > 0,

Vδ = {x ∈ X; 0 < |x − a| < δ}.

Diremos que f é limitada numa vizinhança de a, quando existir algum δ > 0, tal que a
restrição f |Vδ seja limitada.

Definição 2.20 Uma função f : X −→ R, definida no conjunto X ⊂ R, diz-se contı́nua


no ponto a ∈ X quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se obter δ > 0 tal
que
x ∈ X, |x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < ε.

Definição 2.21 Diz-se que f : X −→ R é uma função contı́nua quando f é contı́nua em


todos os pontos a ∈ X.

Definição 2.22 Dizemos que f : X −→ R possui uma descontinuidade de primeira


espécie no ponto a ∈ X quando f é descontı́nua no ponto a e, além disso, existem os
limites laterais lim+ f (x) e lim− f (x).
x→a x→a

Definição 2.23 Uma descontinuidade a ∈ X da função f : X −→ R é chamada de


segunda espécie quando a ∈ X+0 e lim+ f (x) não existe ou então quando a ∈ X−0 mas não
x→a
existe o limite à esquerda de f no ponto a.

Definição 2.24 Uma função f : X −→ R diz-se uniformemente contı́nua no conjunto


X ⊂ R quando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pode-se obter δ > 0 tal que

x, y ∈ X, |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < ε.

Definição 2.25 Uma função f : X −→ R chama-se lipschitziana quando existe uma


constante k > 0 (chamada constante de Lipshchitz da função f ) tal que |f (x) − f (y)| ≤
k · |x − y|, sejam quais forem x, y ∈ X ⊂ R.

Observação 3. Toda função lipschitziana f : X −→ R é uniformemente contı́nua: pois,


18

ε
para qualquer ε > 0 dado arbitrariamente, basta tomarmos δ = , em que k é a constante
k
de Lipshchitz da função f. Daı́,

ε
x, y ∈ X, |x − y| < ⇒ k · |x − y| < ε ⇒ |f (x) − f (y)| < ε,
k

visto que, por f ser lipschitziana, |f (x) − f (y)| ≤ k · |x − y|.

Definição 2.26 Seja f : I −→ R derivável em todos os pontos do intervalo I. Quando


f 0 é contı́nua, diz-se que f é uma função continuamente derivável no intervalo I, ou uma
função de classe C 1 .

2.2 Resultados básicos

Neste tópico, enunciamos resultados citados frequentemente na seção seguinte,


indicando as referências para encontrar suas respectivas demonstrações.

Teorema 2.1 Sejam x e a elementos pertencentes a R. As seguintes afirmações são equi-


valentes:
(i) −a ≤ x ≤ a;
(ii) x ≤ a e −x ≤ a;
(iii) |x| ≤ a;
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 72.

Teorema 2.2 Para elementos arbitrários do corpo ordenado R, valem as relações:


(i) |x + y| ≤ |x| + |y|;
(ii) |x · y| = |x| · |y|;
(iii) |x| − |y| ≤ ||x| − |y|| ≤ |x − y|;
(iv) |x − z| ≤ |x − y| + |y − z|.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 73.

Teorema 2.3 (Teorema do Confronto para sequências) Sejam xn ≤ zn ≤ yn , para


todo n ∈ N. Se lim xn = lim yn = a então lim zn = a.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 119.

Lema 2.1 Seja (Iλ )λ∈L uma famı́lia de intervalos abertos, todos contendo o ponto p ∈ R.
[
Então I = Iλ é um intervalo.
λ∈L
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 167.

Teorema 2.4 (Estrutura dos abertos da reta) Todo subconjunto aberto A ⊂ R se


exprime, de modo único, como uma reunião enumerável de intervalos abertos dois a dois
disjuntos.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 168.
19

Teorema 2.5 Um conjunto F ⊂ R é fechado se, e somente se, seu complementar R − F


é aberto.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 171.

Teorema 2.6 Se (Fλ )λ∈L é uma famı́lia qualquer de conjuntos fechados, então a in-
\
terseção F = Fλ é um conjunto fechado.
λ∈L
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 171.

Teorema 2.7 (Borel-Lebesgue) Seja [a, b] um intervalo limitado e fechado. Dada


[
uma famı́lia (Iλ )λ∈L de intervalos abertos tais que [a, b] ⊂ Iλ , existe um número finito
λ∈L
deles Iλ1 , . . . , Iλn tais que [a, b] ⊂ Iλ1 ∪ · · · ∪ Iλn .
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 180.

Teorema 2.8 (Forma definitiva do Teorema de Borel-Lebesgue) Seja F ⊂ R um


[
conjunto limitado e fechado. Toda cobertura F ⊂ Aλ de F por meio de abertos admite
λ∈L
uma subcobertura finita: F ⊂ Aλ1 ∪ · · · ∪ Aλn .
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 181.

Teorema 2.9 (Teorema do Confronto) Sejam X ⊂ R, f, g, h : X −→ R, a ∈ X 0 . Se,


para todo x ∈ X, x 6= a, for f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) e, além disso, tivermos lim f (x) =
x→a
lim h(x) = L então lim g(x) = L.
x→a x→a
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 198.

Teorema 2.10 Sejam X ⊂ R, f : X −→ R uma função monótona limitada, a ∈ X+0 e


b ∈ X−0 . Existem os limites laterais

L = lim+ f (x) e M = lim− f (x).


x→a x→a

Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 207.

Teorema 2.11 Seja f : X → R limitada numa vizinhança de a. Então

lim sup f (x) = lim Lδ e lim inf f (x) = lim lδ ,


x→a δ→0 x→a δ→0

em que lδ = inf f (Vδ ), Lδ = sup f (Vδ ) e Vδ = {x ∈ X; 0 < |x − a| < δ}.


Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 216.

Teorema 2.12 Seja f limitada numa vizinhança de a. Então existe lim f (x) se, e so-
x→a
mente se, f possui um único valor de aderência no ponto a.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 217.

Teorema 2.13 Se f, g : X −→ R são contı́nuas no ponto a ∈ X, então f + g, f − g e


20

f · g são contı́nuas nesse mesmo ponto. Se g(a) 6= 0, então f /g também é contı́nua no


ponto a.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 226.

Observação 4. Em particular, se f é contı́nua no ponto a então c · f é contı́nua no


mesmo ponto, para qualquer c ∈ R. Também o mesmo ocorre com 1/f, se f (a) 6= 0.

Teorema 2.14 Uma função monótona f : X −→ R não admite descontinuidades de


segunda espécie.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 232.

Teorema 2.15 Seja f : X −→ R uma função cujas descontinuidades são todas de pri-
meira espécie. Então o conjunto dos pontos de descontinuidade de f é enumerável.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 233.

Teorema 2.16 (Teorema do Valor Intermediário) Seja f : [a, b] −→ R contı́nua.


Se f (a) < d < f (b) então existe c ∈ (a, b) tal que f (c) = d.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 234.

Teorema 2.17 Seja f : X −→ R contı́nua. Se X é compacto então f (X) é compacto.


Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 238.

Teorema 2.18 (Weierstrass) Toda função contı́nua f : X −→ R definida num com-


pacto X é limitada e atinge seus extremos (isto é, existem x1 , x2 ∈ X tais que f (x1 ) ≤
f (x) ≤ f (x2 ) para todo x ∈ X).
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 239.

Teorema 2.19 Seja X compacto. Toda função contı́nua f : X −→ R é uniformemente


contı́nua.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 243.

Teorema 2.20 Sejam X ⊂ R, f : X −→ R e a ∈ X ∩ X 0 . Se existe a derivada f 0 (a)


então f é contı́nua no ponto a.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 261.

Teorema 2.21 (Valor intermediário para a derivada) Seja f : [a, b] −→ R de-


rivável em todos os pontos x ∈ [a, b]. Se f 0 (a) < d < f 0 (b) então existe c ∈ (a, b)
tal que f 0 (c) = d.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 269.

Corolário 2.1 Se f : I −→ R é derivável num intervalo I, então f 0 não pode ter des-
continuidade de primeira espécie em I.
Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 269.

Teorema 2.22 (Teorema do Valor Médio, de Lagrange) Seja f : [a, b] −→ R


21

contı́nua. Se f é derivável em (a, b), existe c ∈ (a, b), tal que

f (b) − f (a)
f 0 (c) = .
b−a

Demonstração. Pode ser consultada em Lima (2012), página 272.

2.3 Problemas sobre inf e sup

Neste tópico, demonstramos alguns problemas elementares sobre ı́nfimos e su-


premos, tratados como lemas ou corolários na seção seguinte e utilizados no decorrer de
algumas demonstrações.

Problema 2.1 Sejam A, B conjuntos não vazios limitados de números reais. Pondo
A + B = {x + y; x ∈ A, y ∈ B}, tem-se inf(A + B) = inf A + inf B e sup(A + B) =
sup A + sup B.
Demonstração. Inicialmente mostremos que o conjunto A + B é limitado.
De fato, sendo A e B limitados, existem sup A, inf A, sup B e inf B. Segue-se que, para
todo x ∈ A e y ∈ B,
(i) sup A ≥ x e sup B ≥ y;
(ii) inf A ≤ x e inf B ≤ y.
Desta maneira, sup A+sup B ≥ x+y e inf A+inf B ≤ x+y, para qualquer x+y ∈ A+B.
Logo, sup A + sup B é cota superior e inf A + inf B é cota inferior do conjunto A + B e,
consequentemente, A + B é limitado.
Diante disto, existem sup(A+B) e inf(A+B). Afirmamos que sup(A+B) = sup A+sup B
e inf(A + B) = inf A + inf B.
Como já mostramos que sup A + sup B é cota superior e inf A + inf B é cota inferior do
conjunto A + B, a fim de provar o problema, resta-nos mostrar que sup A + sup B é a
menor cota superior e inf A + inf B a maior cota inferior.
Com efeito, dado ε > 0 arbitrário, existem x ∈ A e y ∈ B tais que

ε ε
sup A ≥ x > sup A − e sup B ≥ y > sup B − .
2 2
Somando membro a membro, obtemos

sup A + sup B ≥ x + y > sup A + sup B − ε.

Isto prova que qualquer número real menor que sup A + sup B deixa de ser cota superior
de A + B, ou seja, que sup A + sup B é a menor das cotas superiores de A + B e, portanto,
sup(A + B) = sup A + sup B.
De maneira semelhante, existem x ∈ A e y ∈ B tais que
22

ε ε
inf A ≤ x < inf A + e inf B ≤ y < inf B + ,
2 2
o que implicam em,

inf A + inf B ≤ x + y < inf A + inf B + ε.

Logo, qualquer número real maior que inf A + inf B deixa de ser cota inferior de A + B,
donde, inf A + inf B é a maior das cotas inferiores de A + B e, consequentemente, inf(A +
B) = inf A + inf B. Isto prova o desejado.

Problema 2.2 Seja A um conjunto limitado e não vazio de números reais. Dado c ∈ R,
ponhamos c · A = {c · x; x ∈ A}. Então sup(c · A) = c · sup A e inf(c · A) = c · inf A caso
c > 0. Quando c < 0, tem-se sup(c · A) = c · inf A e inf(c · A) = c · sup A.
Demonstração. Seja c > 0. Para todo x ∈ A temos que

x ≤ sup A ⇒ c · x ≤ c · sup A.

Isto significa que c · sup A é uma cota superior do conjunto c · A. Além disso, dado ε > 0
qualquer, existe x ∈ A tal que

ε
sup A − < x ≤ sup A,
c

o que implica em,


c · sup A − ε < c · x ≤ c · sup A.

Portanto c · sup A é o supremo do conjunto c · A.


De maneira semelhante, para todo x ∈ A, temos

x ≥ inf A ⇒ c · x ≥ c · inf A.

Logo c · inf A é uma cota inferior do conjunto c · A. Como dado arbitrariamente ε > 0,
existe um x ∈ A tal que
ε
inf A ≤ x < inf A + ,
c
temos que
c · inf A ≤ c · x < c · inf A + ε.

Assim c · inf A é o ı́nfimo do conjunto c · A.


Seja agora c < 0. Assim, para todo x ∈ A, tem-se

x ≥ inf A ⇒ c · x ≤ c · inf A.
23

Desta maneira c · inf A é cota superior do conjunto c · A. Ora, dado arbitrariamente ε > 0,
existe x ∈ A tal que
ε
inf A ≤ x ≤ inf A − ,
c
ε
pois − > 0. Segue-se que
c
c · inf A ≥ c · x > c · inf A − ε.

Logo c · inf A é o supremo do conjunto c · A. Por fim, para todo x ∈ A, ainda temos que

x ≤ sup A ⇒ c · x ≥ c · sup A.

Isto significa que c · sup A é cota inferior do conjunto c · A. Assim, dado ε > 0 qualquer,
existe x ∈ A tal que
ε
sup A + < x ≤ sup A,
c
ε
pois < 0. Logo,
c
c · sup A + ε > c · x ≥ c · sup A.

Portanto c·sup A é o ı́nfimo do conjunto c·A e, diante disto, está demonstrado o problema.

Problema 2.3 Sejam A, B conjuntos não vazios de números reais, tais que
x ∈ A, y ∈ B ⇒ x ≤ y.
Prove que sup A ≤ inf B.
Demonstração. Inicialmente notemos que, como A e B são não vazios e, para todo
x ∈ A e todo y ∈ B, tem-se x ≤ y, então os conjuntos A e B são respectivamente
limitados superiormente e inferiormente, donde, existem sup A e inf B. Dessa maneira,
todo y ∈ B é cota superior de A e, consequentemente, sup A ≤ y para todo y ∈ B, pois
sup A é a menor das cotas superiores do conjunto A. Além disso, como sup A ≤ y para
todo y ∈ B, temos que sup A é cota inferior de B. Logo, sup A ≤ inf B, pois inf B é a
maior cota inferior do conjunto B. Isto prova o desejado.

Problema 2.4 Sejam A, B conjuntos não vazios de números reais e limitados superior-
mente. Se para cada x ∈ A, existe um y ∈ B tal que x ≤ y, prove que sup A ≤ sup B.
Demonstração. De fato, pois caso fosse sup A > sup B, pela Definição 2.6, existiria
x ∈ A tal que
sup B < x ≤ sup A.

Daı́, se para cada x ∈ A, existe um y ∈ B tal que x ≤ y, então existiria um y ∈ B de


modo que
sup B < x ≤ y ⇒ sup B < y ∈ B.
24

Isto é um absurdo, pois sup B ≥ y para todo y ∈ B. Logo, deve necessariamente ser
sup A ≤ sup B, conforme o desejado.

Problema 2.5 Sejam A, B conjuntos não vazios de números reais e limitados inferior-
mente. Se para cada y ∈ B, existe um x ∈ A tal que x ≤ y, prove que inf A ≤ inf B.
Demonstração. De maneira semelhante ao problema anterior, supondo que inf A >
inf B, então, pela Definição 2.7, existe y ∈ B tal que

inf B ≤ y < inf A.

Daı́, se para cada y ∈ B, existe um x ∈ B tal que x ≤ y, então existe um x ∈ A de modo


que
x ≤ y < inf A ⇒ inf A > x ∈ A.

Isto é uma contradição, pois inf A ≤ x para todo x ∈ B. Logo, deve necessariamente ser
inf A ≤ inf B, o que prova o desejado.

Problema 2.6 Sejam A, B conjuntos limitados não vazios de números reais. Suponha-
mos que, para quaisquer x ∈ A e y ∈ B seja x ≤ y. Então sup A = inf B se, e somente
se, para cada ε > 0 existem x ∈ A e y ∈ B tais que y − x < ε.
Demonstração. (⇒) Se sup A = inf B então, dado ε > 0, existe um x ∈ A tal que

ε ε
sup A − < x ≤ sup A ⇒ −x < − sup A +
2 2

e um y ∈ B de modo que
ε
inf B ≤ y < inf B + .
2
Diante disso, temos que

ε ε
y −x <
infB

+ −
sup
A + = ε.
2 2

Portanto y − x < ε.
(⇐) Sabemos que sup A ≤ inf B. Se para cada ε > 0, existem x ∈ A e y ∈ B tais que
y − x < ε, supondo que sup A < inf B e tomando ε = inf B − sup A > 0, então, para
quaisquer x ∈ A e y ∈ B terı́amos

x ≤ sup A < inf B ≤ y ⇒ −x ≥ − sup A e y ≥ inf B


⇒ y − x ≥ inf B − sup A = ε
⇒ y − x ≥ ε,

uma contradição, pois contrariaria a hipótese de y − x < ε. Logo, não se pode ter sup A <
inf B e, portanto, tem-se sup A = inf B.
25

Problema 2.7 Seja Y um conjunto não vazio limitado de números reais. Se m = inf Y
e M = sup Y, então, M − m = sup{|x − y|; x, y ∈ Y }.
Demonstração. Sendo A = {|x − y|; x, y ∈ Y }, queremos mostrar que M − m = sup A.
Dados x, y ∈ Y arbitrários, consideremos sem perda de generalidade x − y ≥ 0 (ou seja,
x ≥ y). Assim, como m = inf Y e M = sup Y, temos

m ≤ y ≤ x ≤ M ⇒ −y ≤ −m e x ≤ M,

o que nos dá


|x − y| = x − y = x + (−y) ≤ M − m.

Logo M − m é uma cota superior de A. Por outro lado, para todo ε > 0, pelo fato de
M = sup Y, podemos encontrar um x ∈ Y tal que

ε
M− <x≤M
2

e, pelo fato de m = inf Y, um y ∈ Y de modo que

ε ε
m≤y <m+ ⇒ −y > −m − .
2 2

Segue-se que

ε ε
M − m ≥ |x − y| ≥ x − y = x + (−y) > M − + −m − = (M − m) − ε
2 2
⇒ M − m ≥ |x − y| > (M − m) − ε.

Isto mostra que M − m é a menor cota superior de A e, portanto, M − m = sup A, como


querı́amos demonstrar.
26

3 INTEGRAL DE RIEMANN

Nesta seção, foram extraı́dos do livro de Lima (2012), definições e resulta-


dos da integral de Riemann, com o intuito de apresentar de forma mais clara possı́vel a
veracidade das informações constatadas nas demonstrações, facilitando o leitor no enten-
dimento das etapas. Além disso, acrescentamos resultados e informações que estavam de
maneira implı́citas na obra, para uma melhor visualização dos passos estabelecidas nas
demonstrações pelo leitor. A seção termina com uma abordagem sobre caracterização das
funções integráveis, mediante a noção de conjunto de medida nula (segundo Lebesgue).

3.1 Integral superior e integral inferior

Neste tópico, apresentamos definições e trabalhamos resultados da Integral


superior e inferior, alicerçados nos conceitos de supremo e ı́nfimo de uma função em um
intervalo compacto.
Consideramos funções f : [a, b] −→ R, definidas num intervalo compacto
[a, b] e limitada nesse intervalo. Isto significa que existem números reais m, M tais que
m ≤ f (x) ≤ M, para todo x ∈ [a, b], ou seja, que os valores f (x) pertencem todos ao
intervalo compacto [m, M ]. O menor desses intervalos contendo os valores f (x), x ∈ [a, b],
é obtido quando

m = inf{f (x); x ∈ [a, b]} e M = sup{f (x); x ∈ [a, b]}.

Por simplicidade, escreve-se também m = inf f e M = sup f.


Para que f seja limitada em [a, b] é necessário e suficiente que exista k > 0
tal que |f (x)| ≤ k, para todo x ∈ [a, b], basta tomar k = max{|m|, |M |}.

Definição 3.1 Uma partição P do intervalo [a, b] é um subconjunto finito P ⊂ [a, b] tal
que a ∈ P e b ∈ P.

Quando escrevermos P = {t0 , t1 , . . . , tn−1 , tn } convencionamos sempre que


a = t0 < t1 < · · · < tn−1 < tn = b. Os intervalos [ti−1 , ti ], i = 1, . . . , n, são chamados os
intervalos da partição P.
O conjunto {a, b} é uma partição do intervalo [a, b], em que a = t0 < t1 = b
e o próprio intervalo [a, b] é o único dessa partição. Indicamos sempre por P0 a partição
{a, b} de [a, b] e chamamos de partição trivial de [a, b].
Sejam f : [a, b] −→ R uma função limitada e P = {t0 , t1 , . . . , tn−1 , tn } uma
partição de [a, b]. Para cada i = 1, . . . , n indicamos com mi o ı́nfimo e Mi o supremo dos
valores de f no intervalo [ti−1 , ti ].

Definição 3.2 Definimos a soma inferior s(f ; P ) e a soma superior S(f ; P ) da função
27

f relativamente à partição P pondo:


n
X
s(f ; P ) = m1 · (t1 − t0 ) + · · · + mn · (tn − tn−1 ) = mi · (ti − ti−1 )
i=1

e n
X
S(f ; P ) = M1 · (t1 − t0 ) + · · · + Mn · (tn − tn−1 ) = Mi · (ti − ti−1 ).
i=1

Proposição 3.1 Se m é o ı́nfimo e M o supremo de f em [a, b], temos

m · (b − a) ≤ s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) ≤ M · (b − a)

para toda partição P do intervalo [a, b].


Demonstração. Seja P = {a = t0 , t1 , . . . , tn−1 , tn = b} uma partição qualquer do
intervalo [a, b]. Como m = inf f e M = sup f, então m ≤ mi ≤ Mi ≤ M, para todo
i = 1, . . . , n. Assim,
n
X n
X n
X n
X
m · (ti − ti−1 ) ≤ mi · (ti − ti−1 ) ≤ Mi · (ti − ti−1 ) ≤ M · (ti − ti−1 ),
i=1 i=1 i=1 i=1

ou seja,
n
X n
X
m · (ti − ti−1 ) ≤ s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) ≤ M · (ti − ti−1 ). (1)
i=1 i=1

Note que,
n
X
m · (ti − ti−1 ) = m · (t1 − t0 ) + · · · + m · (tn − tn−1 )
i=1
= m · (t1 − t0 + t2 − t1 + 
.
.. +  − tn−2
tn−1

 + tn − 

 tn−1
)


= m · (−t0 + tn )
= m · (tn − t0 )
= m · (b − a), (2)

e (de maneira análoga) que,


n
X
M · (ti − ti−1 ) = M · (b − a). (3)
i=1

Logo, por (1), (2) e (3),

m · (b − a) ≤ s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) ≤ M · (b − a),


28

para toda partição P do intervalo [a, b]. O que prova o desejado.

Figura 1 – Representação das somas como áreas de polı́gonos, um inscrito e


outro circunscrito, ao gráfico de f.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Quando f é uma função positiva, as somas s(f ; P ) e S(f ; P ) podem ser re-
presentadas como áreas de polı́gonos, um inscrito e outro circunscrito ao gráfico de f ,
respectivamente. Portanto, também podem ser interpretados como valores aproximados
(por falta e por excesso) da área compreendida entre esse gráfico e o eixo das abcissas,
conforme a Figura 1.

Definição 3.3 Sejam P, Q partições de [a, b]. Quando P ⊂ Q, diz-se que a partição Q
é mais fina do que P.

A maneira mais simples de refinar uma partição P é acrescentar-lhe um único


ponto. Por exemplo, sendo P = {t0 , . . . , tn }, consideremos Q = {t0 , . . . , ti−1 , r, ti , . . . ,
tn }, em que ti−1 < r < ti . Como Q = P ∪ {r} então P ⊂ Q e, pela definição acima, temos
que Q é mais fina do que P.
A partição trivial P0 = {a, b} é a “menos fina” de todas as partições do
intervalo [a, b]. Pois caso exista uma partição Q0 menos fina do que P0 (com Q0 6= P0 ),
terı́amos que Q0 ⊂ P0 e P0 6⊂ Q0 , donde, {a, b} 6⊂ Q0 . Isso significa que a ∈ / Q0 ou b ∈ / Q0 ,
o que é absurdo, pois na Definição 3.1 está expresso que, para um conjunto P qualquer
ser considerada uma partição do intervalo [a, b], a e b devem pertencer a P.
Dadas duas partições quaisquer P, Q de [a, b], a união P ∪ Q também é uma
partição de [a, b], porém mais fina do que P e Q, uma vez que: a união contém todos
os extremos dos intervalos das partições de P e Q (inclusive os extremos a e b), e valem
as inclusões P ⊂ P ∪ Q e Q ⊂ P ∪ Q. Além disso, sendo P0 a menos fina de todas as
partições do intervalo [a, b], como toda partição tem como condição ter a, b ∈ P, ou seja,
ter {a, b} ⊂ P, segue-se que P = P ∪ P0 .

Teorema 3.1 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Quando se refina uma partição P, a soma
29

inferior não diminui e a soma superior não aumenta.


Demonstração. Seja Q = {t0 , . . . , ti−1 , r, ti , . . . , tn } uma partição do intervalo [a, b]
que resulta do acréscimo de um ponto r à partição P = {t0 , . . . , tn } com ti−1 < r < ti .
Para mostrar o caso geral, primeiramente provemos o caso particular

s(f ; Q) ≥ s(f ; P ) e S(f ; Q) ≤ S(f ; P ).

Inicialmente mostremos que s(f ; Q) ≥ s(f ; P ).


Sejam mi , m0 , m00 os ı́nfimos de f nos intervalos [ti−1 , ti ], [ti−1 , r] e [r, ti ], respectiva-
mente. Perceba que,

s(f, Q) − s(f ; P ) = [m1 (t1 − t0 ) + · · · + m0 (r − ti−1 ) + m00 (ti − r) + · · · +


+mn (tn − tn−1 )] − [m1 (t1 − t0 ) + · · · + mi (ti − ti−1 ) + · · · +
+mn (tn − tn−1 )]
= m1 (t1 − t0 − t1 + t0 ) + · · · + mn (tn − tn−1 − tn + tn−1 ) +
+m0 (r − ti−1 ) + m00 (ti − r) − mi (ti − ti−1 )
= m1 · 0 + · · · + mn · 0 + m0 (r − ti−1 ) + m00 (ti − r) − mi (ti − ti−1 )
= m0 (r − ti−1 ) + m00 (ti − r) − mi (ti − ti−1 ).

Escrevendo ti − ti−1 = (r − ti−1 ) + (ti − r), vem que

s(f, Q) − s(f ; P ) = m0 (r − ti−1 ) + m00 (ti − r) − mi (r − ti−1 ) − mi (ti − r)


= (m0 − mi )(r − ti−1 ) + (m00 − mi )(ti − r).

Ora, como [ti−1 , r] ⊂ [ti−1 , ti ] e [r, ti ] ⊂ [ti−1 , ti ], tem-se mi ≤ m0 e mi ≤ m00 . Logo,

s(f, Q) − s(f ; P ) = (m0 − mi )(r − ti−1 ) + (m00 − mi )(ti − r) ≥ 0,

o que implica em s(f, Q) ≥ s(f ; P ).


Agora mostremos que S(f ; Q) ≤ S(f ; P ).
Sendo Mi , M 0 , M 00 os supremos de f nos intervalos [ti−1 , ti ], [ti−1 , r] e [r, ti ], respecti-
vamente. De modo análogo ao resultado anterior temos que

S(f, Q) − S(f ; P ) = M 0 (r − ti−1 ) + M 00 (ti − r) − Mi (ti − ti−1 )


= M 0 (r − ti−1 ) + M 00 (ti − r) − Mi (r − ti−1 ) − Mi (ti − r)
= (M 0 − Mi )(r − ti−1 ) + (M 00 − Mi )(ti − r).

Neste caso, como [ti−1 , r] ⊂ [ti−1 , ti ] e [r, ti ] ⊂ [ti−1 , ti ], tem-se Mi ≥ M 0 e Mi ≥ M 00 .


30

Desta maneira,

S(f, Q) − S(f ; P ) = (M 0 − Mi )(r − ti−1 ) + (M 00 − Mi )(ti − r) ≤ 0,

o que acarreta em, S(f, Q) ≤ S(f ; P ). Portanto está provado o caso particular.
O caso geral é uma consequência imediata deste. Como todo refinamento de
uma partição P é gerada a partir do acréscimo de qualquer quantidade finita de n ele-
mentos (n ∈ N), usando indução matemática em n, mostremos que ao refinar a partição
P, a soma inferior não diminui e a soma superior não aumenta, ou seja, que as condições
do teorema sejam satisfeitas.
Com efeito, acrescentando um único elemento à partição P dada arbitrariamente, pelo que
acabamos de mostrar no caso particular, satisfazemos as condições deste teorema. Supo-
nha, como hipótese de indução, que ao acrescentar uma quantidade finita de n elementos
r1 , r2 , . . . , rn à partição P, obtemos uma partição Pn tal que

s(f ; Pn ) ≥ s(f ; P ) e S(f ; Pn ) ≤ S(f ; P ).

Independente de quantos pontos são acrescidos para refinar uma partição, sempre se obtém
uma outra acrescentando um ponto. Assim, segue imediatamente do caso particular acima
que, ao acrescentar mais um elemento rn+1 a partição Pn , obtemos uma nova partição
Pn+1 de modo que

s(f ; Pn+1 ) ≥ s(f ; Pn ) ≥ s(f ; P ) e S(f ; Pn+1 ) ≤ S(f ; Pn ) ≤ S(f ; P )


⇒ s(f ; Pn+1 ) ≥ s(f ; P ) e S(f ; Pn+1 ) ≤ S(f ; P ).

Ora, mas isto equivale a dizer que acrescentamos uma quantidade n + 1 de elementos
r1 , r2 , . . . , rn , rn+1 à partição P. Logo, para qualquer refinamento de uma partição P,
ou seja, para qualquer acréscimo n de pontos à P, a soma inferior não diminui e a soma
superior não aumenta. Isto prova o desejado.

Corolário 3.1 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Para quaisquer partições P, Q de [a, b],
tem-se s(f ; P ) ≤ S(f ; Q). Em outras palavras, toda soma inferior de f é menor do que
ou igual a qualquer soma superior de f.
Demonstração. Sabemos da Proposição 3.1 que s(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ∪ Q). Como
P ⊂ P ∪ Q e Q ⊂ P ∪ Q, pela Definição 3.3, a partição P ∪ Q refina P e Q. Logo, pelo
Teorema 3.1,

s(f ; P ) ≤ s(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; Q)


⇒ s(f ; P ) ≤ S(f ; Q),
31

para quaisquer partições P, Q de [a, b], como querı́amos demonstrar.

Dada f : [a, b] −→ R limitada, consideremos o conjunto σ das somas inferiores


e o conjunto Σ das somas superiores de f. Segue-se do Corolário 3.1 que para toda s =
s(f ; P ) ∈ σ e toda S = S(f ; Q) ∈ Σ temos s ≤ S. Logo, o conjunto σ das somas inferiores
da função f é limitado superiormente por qualquer soma superior S ∈ Σ, havendo portanto
sup σ. De forma similar, o conjunto Σ das somas superiores de f é limitado inferiormente
por qualquer soma inferior s ∈ σ, existindo portanto inf Σ.
Usualmente denotaremos por sup s(f ; P ) o supremo de σ e inf S(f ; P ) o ı́nfimo
P P
de Σ, tomadas relativamente a todas as partições P do intervalo [a, b].
Z b Z b
Definição 3.4 Definimos a integral inferior f (x) dx e a integral superior f (x) dx
a a
de uma função limitada f : [a, b] −→ R como
Z b Z b
f (x) dx = sup s(f ; P ) e f (x) dx = inf S(f ; P ).
a P a P

As seguintes propriedades, que seguem imediatamente das duas condições que


definem o ı́nfimo e o supremo (respectivamente) de um conjunto, caracterizam as integrais
Z Z
e da função f :
Z b
1. Para qualquer partição P de [a, b], tem-se s(f ; P ) ≤ f (x) dx;
a
Z b
2. Dado ε > 0, existe uma partição P de [a, b] tal que f (x) dx − ε < s(f ; P );
a
Z b
0
1 . Para toda partição P de [a, b], vale f (x) dx ≤ S(f ; P );
a
Z b
0
2 . Dado ε > 0, existe uma partição P de [a, b] tal que f (x) dx + ε > S(f ; P ).
a

Proposição 3.2 Se m ≤ f (x) ≤ M para todo x ∈ [a, b], então


Z b Z b
m · (b − a) ≤ f (x) dx ≤ f (x) dx ≤ M · (b − a).
a a

Demonstração. Sabemos da Proposição 3.1 que,

m · (b − a) ≤ s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) ≤ M · (b − a)
32

para toda partição P do intervalo [a, b]. Então é imediato que


Z b Z b
sup s(f ; P ) = f (x) dx ≤ f (x) dx = inf S(f ; P ).
P a a P

Z b Z b
Resta-nos mostrar que m · (b − a) ≤ f (x) dx e f (x) dx ≤ M · (b − a).
a
Z ab
Com efeito, supondo por absurdo que m · (b − a) > f (x) dx, pela propriedade 1, existe
a
uma partição P de [a, b] tal que
Z b
m · (b − a) > f (x) dx ≥ s(f ; P ) ⇒ m · (b − a) > s(f ; P ),
a

o que é uma contradição, pois contraria a Proposição 3.1. Diante disto, temos que
Z b
m · (b − a) ≤ f (x) dx.
a

Z b
De maneira semelhante, supondo por absurdo que f (x) dx > M · (b − a), pela propri-
a
edade 10 chegaremos em uma contradição e, consequentemente, ter-se-á
Z b
f (x) dx ≤ M · (b − a).
a

O que prova o desejado.

Em particular, se |f (x)| ≤ k para todo x ∈ [a, b], então


Z b Z b
f (x) dx ≤ k · (b − a) e f (x) dx ≤ k · (b − a)
a a

pois |f (x)| ≤ k significa −k ≤ f (x) ≤ k, donde segue da Proposição 3.2 que


Z b Z b
−k · (b − a) ≤ f (x) dx ≤ f (x) dx ≤ k · (b − a),
a a

o que implica em,


Z b Z b
f (x) dx ≤ k · (b − a) e f (x) dx ≤ k · (b − a).
a a

Lema 3.1 Sejam a < c < b e f : [a, b] −→ R limitada. Se considerarmos ape-


33

Z b
nas partições que contém o ponto c, obteremos os mesmos valores para f (x) dx e
a
Z b
f (x) dx.
a
Demonstração. Inicialmente, consideremos os seguintes conjuntos:
σ = {s(f ; P ); P é partição de [a, b]};
σc = {s(f ; P 0 ); P 0 é partição de [a, b] que contém o ponto c};
Σ = {S(f ; P ); P é partição de [a, b]};
Σc = {S(f ; P 0 ); P 0 é partição de [a, b] que contém o ponto c}.
Sendo f limitada, pela Proposição 3.2 temos que

m(b − a) ≤ sup σ ≤ inf Σ ≤ M (b − a).

Então, como σc ⊂ σ e Σc ⊂ Σ (pois σ e Σ são, respectivamente, o conjunto de todas as


somas inferiores e superiores de [a, b], enquanto σc e Σc representam apenas as somas em
que as partições contém o ponto c), os conjuntos σ, σc possuem supremo e os conjuntos
Σ, Σc possuem ı́nfimo. Além disso, pela Definição 3.4,
Z b Z b
sup σ = f (x) dx e inf Σ = f (x) dx.
a a

Afirmamos que sup σ = sup σc e inf Σ = inf Σc .


Com efeito, sabe-se que para cada partição P, podemos obter uma partição P 0 = P ∪ {c}.
Diante disto, pelo Teorema 3.1 temos que para cada s(f ; P ) ∈ σ e S(f ; P ) ∈ Σ existem
s(f ; P 0 ) ∈ σc e S(f ; P 0 ) ∈ Σc tais que

s(f ; P ) ≤ s(f ; P 0 ) e S(f ; P ) ≥ S(f ; P 0 ). (4)

Pondo e = sup σ, e0 = sup σc , d = inf Σ e d0 = inf Σc , temos os seguintes casos:


(i) e > e0 ;
(ii) e < e0 ;
(iii) d0 < d;
(iv) d0 > d.
Se o primeiro ocorre, como e = sup σ, existe uma partição P, com s(f ; P ) ∈ σ, tal que
e0 < s(f ; P ) ≤ e. Daı́, por (4), existe também uma partição P 0 , com s(f ; P 0 ) ∈ σc , de
modo que
e0 < s(f ; P ) ≤ s(f ; P 0 ) ⇒ e0 < s(f ; P 0 ) ∈ σc ,

o que é absurdo, uma vez que e0 = sup σc .


Se o segundo ocorre, pelo fato de e0 = sup σc , existe uma partição P 0 com s(f ; P 0 ) ∈ σc
tal que e < s(f ; P 0 ) ≤ e0 . Como σc ⊂ σ, tem-se e < s(f ; P 0 ) ∈ σ, o que chega em outro
absurdo, pois e = sup A.
34

Se (iii) ocorre, pelo fato de d0 = inf Σ, existe uma partição P 0 com S(f ; P 0 ) ∈ Σc tal
que d0 ≤ S(f ; P 0 ) < d. Diante disto, como Σc ⊂ Σ e d > S(f ; P 0 ) ∈ Σ, temos mais um
absurdo, visto que d = inf Σ.
Se (iv) acontece, pelo fato d = inf Σ, existe uma partição P com S(f ; P ) ∈ Σ tal que
d ≤ S(f ; P ) < d0 . Por (4), existe também uma partição P 0 com S(f ; P 0 ) ∈ Σc de modo
que
S(f ; P 0 ) ≤ S(f ; P ) < d0 ⇒ d0 > s(f ; P 0 ) ∈ Σc ,

o que mais uma vez é um absurdo, pois d0 = inf Σc .


Logo, de (i) e (ii), só nos resta o caso em que e = e0 , isto é, que sup σ = sup σc e, de (iii)
e (iv), o caso em que d = d0 , ou seja, que inf Σ = inf Σc .
Portanto, ao considerarmos apenas partições que contém o ponto c, os valores das integrais
Z b Z b
f (x) dx e f (x) dx não se alteram, como querı́amos demonstrar.
a a

Lema 3.2 Sejam A, B conjuntos não vazios limitados de números reais. Pondo A + B =
{x + y; x ∈ A, y ∈ B}, tem-se inf(A + B) = inf A + inf B e sup(A + B) = sup A + sup B.
Demonstração. Encontra-se no Problema 2.1.

Corolário 3.2 Sejam f, g : [a, b] −→ R limitadas. Então sup(f + g) ≤ sup f + sup g e


inf(f + g) ≥ inf f + inf g.
Demonstração. Sejam A = f ([a, b]), B = g([a, b]) e C = {f (x) + g(x); x ∈ [a, b]}.
Inicialmente mostremos que C ⊂ A + B.
De fato, dado x ∈ [a, b] temos que

f (x) + g(x) ∈ C ⇒ f (x) ∈ f ([a, b]) = A e g(x) ∈ g([a, b]) = B


⇒ f (x) + g(x) ∈ A + B
⇒ C ⊂ A + B.

Agora, mostremos que sup C ≤ sup(A + B) e inf C ≥ inf(A + B). Com efeito, supondo
por absurdo que sup C > sup(A + B), então existe x ∈ [a, b] tal que

sup C ≥ f (x) + g(x) > sup(A + B).

Absurdo, pois f (x) + g(x) ∈ A + B. Assim, obtemos que sup C ≤ sup(A + B).
De maneira semelhante, supondo que inf C < inf(A + B), existe um x0 ∈ [a, b] de modo
que
inf C ≤ f (x0 ) + g(x0 ) < inf(A + B),

o que novamente é absurdo, visto que f (x0 ) + g(x0 ) ∈ A + B. Logo, tem-se inf C ≥
inf(A + B). Portanto, como sup C = sup(f + g), sup A = sup f e sup B = sup g, temos
35

que
sup(f + g) ≤ sup f + sup g e inf(f + g) ≥ inf f + inf g,

como querı́amos demonstrar.

Teorema 3.2 Sejam a < c < b e f : [a, b] −→ R limitada. Então,


Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
a a c

e Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Demonstração. Sejam σ1 = {s(f ; P ); P é partição de [a, c]}, σ2 = {s(f ; T ); T é partição


de [c, b]} e σ = {s(f ; L); L é partição de [a, b] que contém o ponto c}. Afirmamos que
σ1 + σ2 = {s(f ; P ) + s(f ; T ); s(f ; P ) ∈ σ1 e s(f ; T ) ∈ σ2 } é igual a σc .
De fato, seja L uma partição qualquer de [a, b] que contém o ponto c. Assim, s(f ; L) ∈ σc
e, pondo t0 = a, ti = c e tn = b, temos que

s(f ; L) = m1 · (t1 − a) + · · · + mi · (c − ti−1 ) + mi+1 · (ti+1 − c) + · · · + mn · (b − tn−1 )


= [m1 · (t1 − a) + · · · + mi · (c − ti−1 )] + [mi+1 · (ti+1 − c) + · · · + mn · (b − tn−1 )]
= s(f ; P ) + s(f ; T ),

em que P = {a = t0 , t1 , . . . , c = ti } e T = {c = ti , ti+1 , . . . , b = tn }. Isto mostra que


s(f ; L) ∈ σ1 + σ2 e, consequentemente, σc ⊂ σ1 + σ2 .
Por outro lado, sejam P = {a = p0 , p1 , . . . , c = pk } e T = {c = t0 , t1 , . . . , b = tn }
partições de [a, c] e [c, b] respectivamente. Segue-se que

s(f ; P ) + s(f ; T ) = [m01 · (p1 − a) + · · · + m0k · (c − pk−1 )] + [m001 · (t1 − c) + · · · +


+m00n · (b − tn−1 )]
= m01 · (p1 − a) + · · · + m0k · (c − pk−1 ) + m001 · (t1 − c) + · · · +
+m00n · (b − tn−1 ).

Pondo m0r = mr , m00l = mk+l e pi = qi , tj = qk+j (para r = 1, . . . , k, l = 1, . . . , n, i =


0, 1, . . . , k e j = 0, 1, . . . , n), obtemos uma nova partição L = {a = q0 , q1 , . . . , c =
qk , qk+1 , . . . , b = qk+n } de [a, b] tal que

s(f ; P ) + s(f ; T ) = m1 · (q1 − a) + · · · + mk · (c − tk−1 ) + mk+1 · (qk+1 − c) + · · · +


+mk+n · (b − q(k+n)−1 )
= s(f ; L).
36

Logo, s(f ; P ) + s(f ; T ) ∈ σc , donde, σ1 + σ2 ⊂ σc . Pela dupla inclusão acima, tem-se


σc = σ1 + σ2 .
Considerando Σ1 = {S(f ; P ); P é partição de [a, c]}, Σ2 = {S(f ; T ); T é partição de [c, b]}
e Σc = {S(f ; L); L é partição de [a, b] que contém o ponto c}, de maneira análogo com
suas devidas alterações, obtém-se Σc = Σ1 + Σ2 .
Diante disso, pelo Lema 3.1 temos que
Z b Z b
f (x) dx = sup σc = sup(σ1 + σ2 ) e f (x) dx = inf Σc = inf(Σ1 + Σ2 ),
a a

e, pelo Lema 3.2, que


Z b
f (x) dx = sup(σ1 + σ2 ) = sup σ1 + sup σ2
a
Z b
⇒ f (x) dx = sup σ1 + sup σ2
a
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
a a c

e
Z b
f (x) dx = inf(Σ1 + Σ2 ) = inf Σ1 + inf Σ2
a
Z b
⇒ f (x) dx = inf Σ1 + inf Σ2
a
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Está verificado a tese do teorema.

3.1.1 Exemplos

Exemplo 3.1 Seja f : [a, b] −→ R definida pondo-se



1, se x ∈ Q;
f (x) =
0, se x ∈ R − Q.

Dada qualquer partição P = {t0 , t1 , . . . , tn } de [a, b], temos mi = 0 e Mi = 1 para todo


i = 1, . . . , n, uma vez que todos os intervalos [ti−1 , ti ] de P são compostos de números
racionais e irracionais. Logo,

s(f ; P ) = 0 · (t1 − t0 ) + · · · + 0 · (tn − tn−1 ) = 0


37

e
S(f ; P ) = 1 · (t1 − t0 ) + · · · + 1 · (tn − tn−1 ) = tn − t0 = b − a,

para qualquer partição P de [a, b]. Consequentemente:


Z b Z b
f (x) dx = 0 e f (x) dx = b − a,
a a

pois inf S(f ; P ) = inf{b − a} e sup s(f ; P ) = sup{0}.


P P

Exemplo 3.2 Seja f : [a, b] −→ R constante: f (x) = c para todo x ∈ [a, b].
Então temos mi = Mi = c em todos os intervalos de qualquer partição P de [a, b]. Por
conseguinte,

s(f ; P ) = S(f ; P ) = c · (t1 − t0 ) + · · · + c · (tn − tn−1 )


⇒ s(f ; P ) = S(f ; P ) = c · [(t1 − t0 ) + · · · + (tn − tn−1 )]
⇒ s(f ; P ) = S(f ; P ) = c · (tn − t0 ) = c · (b − a),

e, portanto, Z b Z b
f (x) dx = f (x) dx = c · (b − a).
a a

Exemplo 3.3 Sejam f, g : [−1, 1] −→ R, f (x) = x e g(x) = −x para todo x ∈ [a, b].
Então, pelo Corolário 3.2,
sup(f + g) ≤ sup f + sup g

e
inf(f + g) ≥ inf f + inf g.

De fato, pois sup f = sup g = 1 e sup(f + g) = 0. Além de inf f = inf g = −1 e


inf(f + g) = 0. Donde,

sup(f + g) = 0 < 2 = sup f + sup g

e
inf(f + g) = 0 > −2 = inf f + inf g.

Exemplo 3.4 Seja a < c < b. Definamos f : [a, b] −→ R pondo


38


α, se a ≤ x < c;
f (x) =
β, se c ≤ x ≤ b.

Z b Z b
Mostremos que f (x) dx = f (x) dx = α(c − a) + β(b − c).
a a
Sabemos do Teorema 3.2 que,
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
a a c

e Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Como f |[c, b] é uma função constante igual β, pelo Exemplo 3.2 temos que
Z b Z c
f (x) dx = f (x) dx + β(b − c).
a a

Analogamente, Z b Z c
f (x) dx = f (x) dx + β(b − c).
a a

Diante disto, resta-nos mostrar que


Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx = α(c − a).
a a

Perceba que a função f |[a, deixa de ser constante no ponto c. Assim, para provar a
c]
Z c Z c
igualdade acima, é necessário estudar as integrais f (x) dx e f (x) dx olhando para
a a
c de maneira isolada, ou seja, analisando o intervalo [a, c] como [a, c − ε] ∪ [c − ε, c], em
que ε > 0 seja tão pequeno quanto se queira, isolando ao máximo o ponto c dos demais
pontos do intervalo [a, c].
Então, para fixar as ideias, suponhamos α ≤ β. Assim β = sup f e, consequentemente,
para todo ε > 0 tal que a < c − ε < c, tem-se
Z c
f (x) dx ≤ β · [c − (c − ε)] = β · ε. (5)
c−ε

Temos também que α = inf f e, por conseguinte, para qualquer desses ε > 0,
Z c Z c−ε Z c
α(c − a) ≤ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c−ε
39

Como f |[a, c−ε] é uma função constante, pelo Exemplo 3.2 e por (5), vem que
Z c
α(c − a) ≤ f (x) dx ≤ α · [(c − ε) − a] + β · ε
a
= α · c = α · ε − α · +β · ε
= α · (c − a) + ε · (β − α),

ou seja, Z c
α(c − a) ≤ f (x) dx ≤ α · (c − a) + ε · (β − α).
a
Z c
Note que, se α(c − a) < f (x) dx, então existe n0 ∈ N (suficientemente grande) tal que
a

Z c
1
α · (c − a) + · (β − α) < f (x) dx,
n0 a

e um n1 ∈ N (suficientemente grande) de modo que

1
a<c− < c.
n1
 
1 1
Escrevendo ε0 = min , temos que a < c − ε0 < c, donde segue que,
n0 n1
Z c
α(c − a) + ε0 (β − α) < f (x) dx ≤ α(c − a) + ε0 (β − α),
a

o que é absurdo. Assim, temos necessariamente que


Z c
α · (c − a) = f (x) dx. (6)
a

Z b
Quanto a f (x) dx, é imediato que deve ser também igual a α · (c − a), pois α = inf f
a
e para qualquer partição P = {a, t1 , t2 , . . . , tn−1 , c} de [a, c] se tem

s(f ; P ) = α · (t1 − a) + · · · + α · (c − tn−1 ) = α · (c − a).

Como toda soma inferior de f |[a, c] tem esse valor, temos que
Z c
sup s(f ; P ) = α · (c − a) = f (x) dx. (7)
P a
40

Logo, de (6) e (7), temos


Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx = α · (c − a),
a a

Z b Z b
e, portanto, f (x) dx = f (x) dx = α(c − a) + β(b − c).
a a

Note-se no exemplo a seguir que poderı́amos ter tomado um valor arbitrário


para f no ponto a, sem alterar o valor das integrais.

Exemplo 3.5 Seja f : [a, b] −→ R definida por





 γ, se x = a;

f (x) = α, se a < x < c;


β, se c ≤ x ≤ b.

Z b Z b
Mostremos que f (x) dx = f (x) dx = α(c − a) + β(b − c).
a a
Perceba que, de maneira análoga ao Exemplo 3.4, para provar isto, basta mostrar que
Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx = α · (c − a),
a a

pois f |[c, b] continua sendo uma função constante igual a β.


Para fixar as ideias consideremos γ ≤ α ≤ β. Assim, para qualquer partição P =
{a, t1 , . . . , tn−1 , c} de [a, c], temos que

S(f ; P ) = α(t1 − a) + α(t2 − t1 ) + · · · + α(tn−1 − tn−2 ) + β(c − tn−1 )


≥ α(t1 − a) + α(t2 − t1 ) + · · · + α(tn−1 − tn−2 ) + α(c − tn−1 )
= α(c − a)
Z c
e, consequentemente, α(c − a) ≤ f (x) dx. Por outro lado, para todo ε > 0 tal que a <
a
c − ε < c, tem-se α = sup f |[a, c−ε] e para qualquer partição Q = {a, q1 , . . . , qn−1 , c − ε},

S(f ; Q) = α(q1 − a) + α(q2 − q1 ) + · · · + α(qn−1 − qn−2 ) + α[(c − ε) − qn−1 ]


= α[(c − ε) − a)],
Z c−ε
donde segue que, α[(c − ε) − a] = f (x) dx. Além disso, como β = sup f, de maneira
a
41

idêntica a (5) no exemplo anterior, vem que


Z c
f (x) dx ≤ β · ε.
c−ε

Por conseguinte, para qualquer desses ε > 0, temos:


Z c Z c−ε Z c
α(c − a) ≤ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
a a c−ε
≤ α · [(c − ε) − a] + β · ε
= α · c = α · ε − α · +β · ε
= α · (c − a) + ε · (β − α).

Logo, de maneira semelhante a (6) no Exemplo 3.4, temos que


Z c
f (x) dx = α · (c − a). (8)
a

Agora observe que, como γ = inf f |[a, c] , para todo ε > 0 tal que a < a + ε < c, tem-se
Z a+ε
f (x) dx ≥ γ[(a + ε − a)] = γ · ε. (9)
a

Pelo fato de α = sup f |[a, c] , pelo Teorema 3.2 e por (9), segue-se que para qualquer desses
ε > 0, temos:
Z c Z a+ε Z c
f (x) dx = f (x) + f (x)
a a a+ε
≥ γ · ε + α · [c − (a + ε)]
= γ·ε+α·c−α·a−α·ε
= α · (c − a) + ε · (γ − α),

ou seja,
Z c
f (x) dx ≥ α · (c − a) + ε · (γ − α). (10)
a

Z c Z c
Suponhamos que f (x) dx > α(c − a). Como f (x) dx = sup s(f ; P ), existe uma
a a P
42

partição P = {a, t1 , . . . , tn−1 , c} tal que


Z c
f (x) dx ≥ γ(t1 − a) + α(t2 − t1 ) + · · · + α(c − tn−1 ) > α · (c − a)
a
⇒ γ(t1 − a) + α(t2 − t1 ) + · · · + α(c − tn−1 ) > α(t1 − a) + α(t2 − t1 ) + · · · + α(c − tn−1 )
⇒ γ(t1 − a) > α(t1 − a)
⇒ γ > α, (11)

o que é absurdo, pois γ ≤ α. Logo, por (10) e (11), tem-se


Z c
α · (c − a) ≥ f (x) dx ≥ α · (c − a) + ε · (γ − α).
a

Z c
Agora, supondo que α(c − a) > f (x) dx, existe um k0 ∈ N (suficientemente grande)
a
tal que
Z c
1
α(c − a) + (γ − α) > f (x) dx. (12)
k0 a

Note que a necessidade de k0 ser grande vem do fato


 de γ − α ≤ 0. Tomando k1 ∈ N de
1 1 1
modo que a < a + < c e escrevendo ε0 = min , , vem que a < a + ε0 < c e
k1 Z k0 k1
c
α(c − a) + ε0 (γ − α) > f (x) dx, donde segue, por (10) e (12), que
a

Z c
α(c − a) + ε0 (γ − α) > f (x) dx > α(c − a) + ε0 (γ − α).
a

O que gera mais um absurdo, restando apenas o caso em que


Z c
f (x) dx = α(c − a). (13)
a

Portanto, por (9) e (13), podemos concluir que


Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx = α(c − a)
a a

e, consequentemente, que
Z b Z b
f (x) dx = f (x) dx = α(c − a) + β(b − c).
a a

Os Exemplos 3.5 e 3.4 mostram que os sinais < e ≤, nos intervalos que de-
compõe o domı́nio da função, são irrelevantes para o resultado final das integrais.
43

Definição 3.5 Seja P = {t0 , t1 , . . . , tn } uma partição de [a, b] dada arbitrariamente.


Uma função f : [a, b] −→ R, constante (digamos igual a ci ) em cada intervalo aberto
(ti−1 , ti ), chama-se uma função escada.

Vejamos no próximo exemplo que uma repetição dos Exemplos 3.5 e 3.4 mostra
que as integrais da função escada f são dadas por
Z b Z b n
X
f (x) dx = f (x) dx = ci · (ti − ti−1 ).
a a i=1

Perceba que o Exemplo 3.6, a seguir, é uma generalização dos Exemplos 3.5 e 3.4.

Exemplo 3.6 Seja f : [a, b] −→ R definida por





 c1 , a ≤ x < t 1 ;


c2 , t1 ≤ x ≤ t2 ;


f (x) = .

 ..



n−1 < x ≤ b.

c , t
n

Aplicando o Teorema 3.2 n − 1 vezes da seguinte maneira:

Z b Z tn−1 Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
a a tn−1
Z tn−2 Z tn−1  Z b
= f (x) dx + f (x) dx + f (x) dx
a tn−2 tn−1
..
. Z t1 Z tn−1  Z b
= f (x) dx + · · · + f (x) dx + f (x) dx
a tn−2 tn−1
Z t1 Z b
= f (x) dx + · · · + f (x) dx,
a tn−1

obtemos que: Z b Z t1 Z b
f (x) dx = f (x) dx + · · · + f (x) dx.
a a tn−1

Pelos Exemplos 3.4 e 3.5 temos que os sinais < e ≤ não fazem diferença. Logo
Z b n
X
f (x) dx = c1 (t1 − a) + · · · + cn (b − tn−1 ) = ci (ti − ti−1 ).
a i=1
44

De modo análogo ao da integral inferior, obtemos também que


Z b n
X
f (x) dx = c1 (t1 − a) + · · · + cn (b − tn−1 ) = ci (ti − ti−1 ).
a i=1

Z b Z b n
X
Portanto f (x) dx = f (x) dx = ci (ti − ti−1 ).
a a i=1

Novamente observamos que os valores que f assume nos pontos da partição P


não afetam as integrais. A Figura 2 é uma das formas de ilustrar o Exemplo 3.5.

Figura 2 – Função escada

Fonte: Elaborado pelo autor.

Lema 3.3 Seja A um conjunto limitado e não vazio de números reais. Dado c ∈ R,
ponhamos c · A = {c · x; x ∈ A}. Então sup(c · A) = c · sup A e inf(c · A) = c · inf A caso
c > 0. Quando c < 0, tem-se sup(c · A) = c · inf A e inf(c · A) = c · sup A.
Demonstração. Encontra-se no Problema 2.2.

Teorema 3.3 Sejam f, g : [a, b] −→ R limitadas. Então


Z b Z b Z b Z b Z b
1. f (x) dx+ g(x) dx ≤ [f (x)+g(x)] dx ≤ [f (x)+g(x)] dx ≤ f (x) dx+
a a a a a
Z b
+ g(x) dx.
a
2. Quando c > 0,
Z b Z b Z b Z b
c · f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx.
a a a a
45

No caso de c < 0, tem-se


Z b Z b Z b Z b
c · f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx.
a a a a

3. Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b], então


Z b Z b Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx e f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a a a

Demonstração. 1. Inicialmente mostremos que


Z b Z b Z b
f (x) dx + g(x) dx ≤ [f (x) + g(x)] dx. (14)
a a a

Indiquemos, respectivamente (para todo i = 1, . . . , n), com mi (f ), mi (g) e mi (f + g)


os ı́nfimos das funções f, g e f + g em cada intervalo [ti−1 , ti ] de uma partição qualquer
P = {t0 , . . . , tn } de [a, b]. Segue-se do Corolário 3.2 que

mi (f ) + mi (g) ≤ mi (f + g),

donde,
n
X n
X n
X
mi (f ) · (ti − ti−1 ) + mi (g) · (ti − ti−1 ) ≤ mi (f + g) · (ti − ti−1 )
i=1 i=1 i=1
⇒ s(f ; P ) + s(g; P ) ≤ s(f + g; P ). (15)

Sabemos do Teorema 3.1 que, dados arbitrariamente as partições P e Q, temos

s(f ; P ) ≤ s(f ; P ∪ Q) e s(g; Q) ≤ s(g; P ∪ Q)


⇒ s(f ; P ) + s(g; Q) ≤ s(f ; P ∪ Q) + s(g; P ∪ Q). (16)

De maneira semelhante a (15), segue-se de (16) que

s(f ; P ) + s(g; Q) ≤ s(f ; P ∪ Q) + s(g; P ∪ Q) ≤ s(f + g; P ∪ Q)


⇒ s(f ; P ) + s(g; Q) ≤ s(f + g; P ∪ Q).

Isto exprime que para quaisquer partições P e Q de [a, b], tem-se s(f ; P ) + s(g; Q) ≤
s(f + g; P ∪ Q). Daı́, pelo Problema 2.4, vem que

sup [s(f ; P ) + s(g; Q)] ≤ sup s(f + g; P ∪ Q). (17)


P, Q P, Q
46

Ora, o Lema 3.2 nos dá que sup [s(f ; P ) + s(g; Q)] = sup s(f ; P ) + sup s(g; Q). Dessa
P, Q P Q
maneira, substituindo essa igualdade em (17), obtemos que

sup s(f ; P ) + sup s(g; Q) ≤ sup s(f + g; P ∪ Q). (18)


P Q P, Q

Assim, como toda partição L de [a, b] pode ser representada por L = L ∪ P0 , em que P0 é
a partição trivial {a, b} (a menos fina de todas as partições), e dadas quaisquer partições
P, Q de [a, b] temos que P ∪ Q pode ser visto como uma partição L de [a, b], segue-se
Z b
da Definição 3.1 que sup s(f + g; P ∪ Q) = sup s(f + g; L) = [f (x) + g(x)] dx. Diante
P, Q L a
disso, a desigualdade (18) equivale a
Z b Z b Z b
f (x) dx + g(x) dx ≤ [f (x) + g(x)] dx, (19)
a a a

o que demonstra (14).


Z b Z b
Agora mostremos que [f (x) + g(x)] dx ≤ [f (x) + g(x)] dx.
a a
Com efeito, sabemos do Corolário 3.1 que, para quaisquer partições P e Q de [a, b], tem-se
s(f + g; P ) ≤ S(f + g; Q). Logo, pelo Problema 2.3, obtemos que

sup s(f + g; P ) ≤ inf S(f + g; Q)


P Q
Z b Z b
⇒ [f (x) + g(x)] dx ≤ [f (x) + g(x)] dx. (20)
a a

Desta maneira, por (19) e (20), temos


Z b Z b Z b Z b
f (x) dx + g(x) dx ≤ [f (x) + g(x)] dx ≤ [f (x) + g(x)] dx. (21)
a a a a

Diante disto, para concluir a primeira tese do teorema, resta-nos mostrar que
Z b Z b Z b
[f (x) + g(x)] dx ≤ f (x) dx + g(x) dx.
a a a

De modo análogo a primeira desigualdade, pondo Mi (f ), Mi (g) e Mi (f + g) como os


supremos das funções f, g e f + g em cada intervalo [ti−1 , ti ] de uma partição P qualquer.
Segue-se do Corolário 3.2 que

Mi (f + g) ≤ Mi (f ) + Mi (g)
47

donde, para toda partição P de [a, b],


n
X n
X n
X
Mi (f + g) · (ti − ti−1 ) ≤ Mi (f ) · (ti − ti−1 ) + Mi (g) · (ti − ti−1 )
i=1 i=1 i=1
⇒ S(f + g; P ) ≤ S(f ; P ) + S(g; P ). (22)

Daı́ (pelo Teorema 3.1), dadas quaisquer partições P e Q de [a, b], temos

S(f ; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ) e S(g; P ∪ Q) ≤ S(g; Q)


⇒ S(f ; P ∪ Q) + S(g; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ) + S(g; Q),

donde, segue de (22), que

S(f + g; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ∪ Q) + S(g; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ) + S(g; Q)


⇒ S(f + g; P ∪ Q) ≤ S(f ; P ) + S(g; Q). (23)

Dessa forma, pelo Problema 2.5, vem que inf S(f + g; P ∪ Q) ≤ inf [S(f ; P ) + S(g; Q)]
P, Q P, Q
e, pelo Lema 3.2, que inf [S(f ; P ) + S(g; Q)] = inf S(f ; P ) + inf S(g; Q). Logo,
P, Q P Q

inf S(f + g; P ∪ Q) ≤ inf [S(f ; P ) + S(g; Q)] = inf S(f ; P ) + inf S(g; Q)
P, Q P, Q P Q
⇒ inf S(f + g; P ∪ Q) ≤ inf S(f ; P ) + inf S(g; Q)
P, Q P Q
Z b Z b Z b
⇒ [f (x) + g(x)] dx ≤ f (x) dx + g(x) dx. (24)
a a a

Portanto, por (21) e (24), a primeira tese do teorema está demonstrada.


2. Agora, verifiquemos a segunda tese. Segue diretamente do Lema 3.3 que, para cada
intervalo [ti−1 , ti ] de uma partição P qualquer de [a, b],

mi (c · f ) = c · mi (f ) e Mi (c · f ) = c · Mi (f )

para c > 0, enquanto

mi (c · f ) = c · Mi (f ) e Mi (c · f ) = c · mi (f )

quando c < 0.
Logo, sendo σ = {s(f ; P ); P é partição de [a, b]} e Σ = {S(f ; P ); P é partição de [a, b]},
novamente pelo Lema 3.3 temos, para c > 0,

sup(c · σ) = c · sup σ e inf(c · Σ) = c · inf Σ


Z b Z b Z b Z b
⇒ c · f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx,
a a a a
48

e para c < 0,

sup(c · σ) = c · inf Σ e inf(c · Σ) = c · sup σ


Z b Z b Z b Z b
⇒ c · f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx.
a a a a

Isto prova a segunda tese do teorema.


3. Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b], tem-se mi (f ) ≤ mi (g) e Mi (f ) ≤ Mi (g), em que
mi é o ı́nfimo e Mi o supremo de cada intervalo [ti−1 , ti ] de uma partição P de [a, b]. Dessa
maneira, dada uma partição P de [a, b], temos s(f ; P ) ≤ s(g; P ) e S(f ; P ) ≤ S(g; P ).
Logo, pelos Problemas 2.4 e 2.5 (respectivamente), temos
Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx
a a

e Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a

Está verificado a tese 3 e, portanto, concluı́mos a demonstração deste teorema.


Z b Z b
Corolário 3.3 Se f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b] então f (x) dx ≥ 0 e f (x) dx ≥ 0.
a a
Demonstração. Basta considerar g : [a, b] −→ R como a função identicamente nula.
Daı́, pela tese 3 do Teorema 3.3, temos
Z b Z b
f (x) dx ≥ g(x) dx
a a

e Z b Z b
f (x) dx ≥ g(x) dx,
a a

onde mi (g) = Mi (g) = 0. Dessa forma, temos que s(g; P ) = S(g; P ) = 0, o que implica
em, Z b Z b
f (x) dx ≥ g(x) dx = 0
a a
e Z b Z b
f (x) dx ≥ g(x) dx = 0.
a a

O que prova o desejado.

3.2 Funções integráveis

Neste tópico, estudamos uma classe especial de funções: aquelas para as quais
o supremo das somas inferiores é igual ao ı́nfimo das somas superiores.
49

Definição 3.6 Uma função limitada f : [a, b] −→ R chama-se integrável quando


Z b Z b
f (x) dx = f (x) dx.
a a

Este valor comum é chamado a integral de f e indicado com


Z b Z b
f (x) dx ou, simplesmente f.
a a

Z b Z b
Pelo Exemplo 3.2 sabemos que, f (x) dx = f (x) dx = c · (b − a). As-
a a
Z b
sim, toda função constante, f (x) = c, é integrável, com f (x) dx = c · (b − a). Mais
a
geralmente, pelos Exemplos 3.4 e 3.5, se f : [a, b] −→ R é uma função escada, então f é
Z b X
integrável e f (x) dx = ci · (ti − ti−1 ), em que os ci são os valores que f assume nos
a
intervalos (ti−1 , ti ). Por outro lado, pelo Exemplo 3.1, toda função f : [a, b] −→ R, igual
a 0 nos númerosZ irracionais e a 1Znos racionais, não é integrável. Pois vimos que, quando
b b
isso acontece, f (x) dx = 0 e f (x) dx = b − a.
a a
Z b Z b
Quando f (x) ≥ 0 para todo x ∈ [a, b], as integrais f (x) dx e f (x) dx
a a
resultam de tentar medir a área do conjunto plano A = {(x, y) ∈ R2 ; a ≤ x ≤ b, 0 ≤
y ≤ f (x)}, limitado pelo gráfico de f, pelo segmento [a, b] do eixo das abscissas e pelas
Z b
retas verticais x = a e x = b. Além disso, em f (x) dx usamos áreas de polı́gonos
a
Z b
contidos em A como aproximações (por falta) da área de A, enquanto em f (x) dx
a
tomamos polı́gonos que contêm A, isto é, aproximações por excesso (ilustrado na Figura
Z b Z b
1). Podemos dizer que f (x) dx é a “área interna” do conjunto A, e que f (x) dx é
a a
sua “área externa”. A afirmação de que f é integrável significa que as aproximações por
falta e por excesso para a área de A conduzem ao mesmo resultado, isto é, que o conjunto
Z b
A possui, de fato, uma área, igual a f (x) dx. No caso da função do Exemplo 3.1, o
a
conjunto A tem uma área interna igual a 0 e uma área externa igual a 1, logo não possui
uma área bem definida.
Para toda s = s(f ; P ) ∈ σ e toda S = S(f ; Q) ∈ Σ, temos s ≤ S. Pelo
Z b
Problema 2.3, isto nos dá sempre sup σ ≤ inf Σ. Como sup σ = f (x) dx e inf Σ =
a
Z b
f (x) dx, então dizer que f é integrável significa afirmar que sup σ = inf Σ.
a

Lema 3.4 Sejam σ, Σ conjuntos limitados não vazios de números reais. Suponhamos
50

que, para quaisquer s ∈ σ e S ∈ Σ seja s ≤ S. Então sup σ = inf Σ se, e somente se, para
cada ε > 0 existem s ∈ σ e S ∈ Σ tais que S − s < ε.
Demonstração. Encontra-se no Problema 2.6.

Definição 3.7 Dada f : [a, b] −→ R limitada, sua oscilação no conjunto não vazio
X ⊂ [a, b] é definida por
ω(f ; X) = sup f (X) − inf f (X).

O Lema 3.5, a seguir, implica em uma definição equivalente para oscilação.

Lema 3.5 Seja Y um conjunto não vazio limitado de números reais. Se m = inf Y e
M = sup Y, então, M − m = sup{|x − y|; x, y ∈ Y }.
Demonstração. Encontra-se no Problema 2.7.

Corolário 3.4 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Para todo X ⊂ [a, b] não vazio, tem-se
ω(f ; X) = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X}.
Demonstração. Sabemos da Definição 3.7 que

ω(f ; X) = sup f (X) − inf f (X).

Tomando Y = f (X), sup f (X) = M e inf f (X) = m, pelo o Lema 3.5, temos

ω(f ; X) = sup f (X) − inf f (X) = M − n = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X}


⇒ ω(f ; X) = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X},

o que prova o desejado.

Definição 3.8 Dadas f : [a, b] −→ R limitada e uma partição P do intervalo [a, b],
indicaremos com ωi = Mi − mi a oscilação de f no intervalo [ti−1 , ti ]. (Às vezes se
escreve ωi (f ))

Perceba que, pondo X = [ti−1 , ti ] ⊂ [a, b], tem-se

ωi = Mi − mi = sup f (X) − inf f (X) = ω(f ; X).

Assim, pelo Corolário 3.4, temos ωi = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]}. Além disso,
para quaisquer x, y ∈ [ti−1 , ti ], tem-se f (x) ≤ Mi = sup f ([ti−1 , ti ]) e f (y) ≥ mi =
inf f ([ti−1 , ti ]). A última desigualdade pode ser escrita como −f (y) ≤ −mi . Assim, temos,
f (x) − f (y) ≤ Mi − mi , ou seja, f (x) − f (y) ≤ ωi .

Teorema 3.4 Seja f : [a, b] −→ R limitada. As seguintes afirmações são equivalentes:


1. f é integrável;
51

2. Para todo ε > 0 existem partições P, Q do intervalo [a, b] tais que S(f ; Q) −
s(f ; P ) < ε;
3. Para todo ε > 0, existe uma partição P do intervalo [a, b] tal que S(f ; P )−s(f ; P ) <
ε;
4. Para todo ε > 0, existe uma partição P = {t0 , t1 , . . . , tn } do intervalo [a, b] tal
n
P
que ωi · (ti − ti−1 ) < ε.
i=1
Demonstração. Inicialmente mostremos que (1) ⇔ (2), em seguida que (3) ⇔ (4) e,
por fim, que (2) ⇔ (3).
Z b
Perceba que, dizer que f é integrável, pela Definição 3.6, é o mesmo que f (x) dx =
a
Z b
f (x) dx, ou ainda, que sup σ = inf Σ. Ora, segue diretamente do Lema 3.4 que f é
a
integrável se, e somente se, para cada ε > 0 existem s(f ; P ) ∈ σ e S(f ; Q) ∈ Σ tais que
S(f ; Q) − s(f ; P ) < ε. Logo, (1) ⇔ (2).
Por outro lado, pela Definição 3.8, temos que
n
X n
X
ωi · (ti − ti−1 ) = (Mi − mi ) · (ti − ti−1 )
i=1 i=1
Xn
= [Mi · (ti − ti−1 ) − mi · (ti − ti−1 )]
i=1
n
X n
X
= Mi · (ti − ti−1 ) − mi · (ti − ti−1 )
i=1 i=1
= S(f ; P ) − s(f ; P ).

Assim, temos também que (3) ⇔ (4).


Por fim, sendo P = {t0 , . . . , tn }, ponhamos Q = {t0 , . . . , ti−1 , r, ti , . . . , tn } com
ti−1 < r < ti . Pelo Teorema 3.1, segue-se

S(f ; Q) ≤ S(f ; P ) ⇒ S(f ; Q) − s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε


⇒ S(f ; Q) − s(f ; P ) < ε.

Dessa maneira, (3) ⇒ (2). Além disso, se S(f ; Q) − s(f ; P ) < ε, tomando L = P ∪ Q,
pelo Corolário 3.1, temos

s(f ; P ) ≤ s(f ; L) ≤ S(f ; L) ≤ S(f ; Q) ⇒ −s(f ; L) ≤ −s(f ; P ) e S(f ; L) ≤ S(f ; Q)


⇒ S(f ; L) − s(f ; L) ≤ S(f ; Q) − s(f ; P ) < ε
⇒ S(f ; L) − s(f ; L) < ε.

Isto mostra que (2) ⇒ (3) e, portanto, que (2) ⇔ (3). O que encerra a demonstração.
52

Teorema 3.5 Sejam f, g : [a, b] −→ R integráveis. Então:


1. Para a < c < b, f |[a, c] e f |[c, b] são integráveis e se tem
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Reciprocamente, se f |[a, c] e f |[c, b] são integráveis, então f é integrável, e vale a


igualdade acima.
2. Para todo c ∈ R, c · f é integrável e
Z b Z b
c · f (x) dx = c · f (x) dx.
a a

3. f + g é integrável e
Z b Z b Z b
[f (x) + g(x)] dx = f (x) dx + g(x) dx.
a a a

4. Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b], então


Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a

Em particular, se f (x) ≥ 0, para todo x ∈ [a, b], então,


Z b
f (x) dx ≥ 0.
a

5. |f (x)| é integrável e se tem


Z b Z b
f (x) dx ≤ |f (x)| dx.
a a

Segue-se de (4) e (5) que se |f (x)| ≤ k para todo x ∈ [a, b], então
Z b
f (x) dx ≤ k · (b − a).
a

6. O produto f · g é integrável. Z c Z c Z b
Demonstração. (1) Sejam α = f (x) dx, A = f (x) dx, β = f (x) dx e
a a c
Z b Z b Z b
B= f (x) dx. Então, pelo Teorema 3.2, f (x) dx = A + B e f (x) dx = α + β.
c a a
Assim, pela Definição 3.6, dizer que f, f |[a, c] e f |[c, b] são integráveis é o mesmo que dizer
α + β = A + B, α = A e β = B respectivamente. Ora, pela Proposição 3.2 temos que
53

α ≤ A e β ≤ B, o que implica em α + β ≤ A + B. Assim,

α + β = A + B ⇔ α = A e β = B, (25)

pois se supormos que α 6= A ou β 6= B, temos que α < A ou β < B, o que implica


em α + β < A + B. Caso α + β 6= A + B, temos que α + β < A + B, o que acarreta
em α < A ou β < B. Logo, a contrapositiva da equivalência (25) está demonstrada e,
consequentemente, está provado que f é integrável se, e somente se, f |[a, c] e f |[c, b] são
integráveis. Isto prova a afirmação (1).
(2) Inicialmente, analisemos o caso onde c = 0. Note que, neste caso, c · f é a função
identicamente nula: (0 · f )(x) = 0, para todo x ∈ [a, b]. Daı́, pelo Exemplo 3.2, temos que
Z b Z b
0 · f (x) dx = 0 · f (x) dx = 0 · (b − a) = 0. (26)
a a

Logo, pela Definição 3.6, c · f é integrável.


Z b Z b o caso em que c 6= 0. Se fZ éb integrável, por
Agora, analisemos Z bdefinição, temos que
f (x) dx = f (x) dx, o que implica em, c · f (x) dx = c · f (x) dx. Segue-se da
a a a a
Afirmação 2 do Teorema 3.3 que, para c > 0,
Z b Z b Z b Z b
c· f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx
a a a a
Z b Z b
⇒ c · f (x) dx = c · f (x) dx (27)
a a

e, para c < 0, que


Z b Z b Z b Z b
c· f (x) dx = c · f (x) dx e c · f (x) dx = c · f (x) dx
a a a a
Z b Z b
⇒ c · f (x) dx = c · f (x) dx. (28)
a a

Isto mostra, pela Definição 3.6, que c · f também é integrável para c 6= 0. Portanto, por
(26), (27) e (28), c · f é integrável, para todo c ∈ R.
Z b Z b Z b
(3) Se f, g são integráveis, por definição, temos f (x) dx = f (x) dx e g(x) dx =
a a a
Z b
g(x) dx, o que acarreta em,
a

Z b Z b Z b Z b
f (x) dx + g(x) dx = g(x) dx + f (x) dx.
a a a a
54

Segue-se da Afirmação 1 do Teorema 3.3 que


Z b Z b Z b Z b
f (x) dx + g(x) dx ≤ [f (x) + g(x)] dx ≤ [f (x) + g(x)] dx
a a a a
Z b Z b
≤ f (x) dx + g(x) dx
a a

Z b Z b Z b Z b
⇒ f (x) dx + g(x) dx = [f (x) + g(x)] dx = [f (x) + g(x)] dx
a a a a
Z b Z b
= f (x) dx + g(x) dx.
a a

Z b Z b Z b
Logo, f + g é integrável e, além disso, [f (x) + g(x)] dx = f (x) dx + g(x) dx.
a a a
(4) Como f, g são integráveis, segue diretamente da Definição 3.6 que
Z b Z b Z b Z b Z b Z b
f (x) dx = f (x) dx = f (x) dx e g(x) dx = g(x) dx = g(x) dx
a a a a a a

e ainda que, particularmente, f, g são limitadas. Daı́, sendo f (x) ≤ g(x), para todo
x ∈ [a, b], pela Afirmação 3 Teorema 3.3, temos
Z b Z b Z b Z b Z b Z b
f (x) dx = f (x) dx ≤ g(x) dx = g(x) dx ⇒ f (x) dx ≤ g(x) dx.
a a a a a a

O que prova (4).


(5) Em primeiro lugar, mostremos que a função x 7→ |f (x)| é integrável. Sabemos do
Corolário 3.4 que, para qualquer subconjunto X ⊂ [a, b],

ω(|f |; X) = sup{||f (x)|−|f (y)||; x, y ∈ X} e ω(f ; X) = sup{|f (x)−f (y)|; x, y ∈ X}.

Pela relação (iii) do Teorema 2.2, para quaisquer x, y ∈ [a, b], temos que ||f (x)|−|f (y)|| ≤
|f (x) − f (y)|. Logo, ω(|f |; X) ≤ ω(f ; X). Em particular, dada uma partição arbitrária P
de [a, b], tem-se ωi (|f |) ≤ ωi (f ). Diante disso, se f é integrável, segue-se do Teorema 3.4
que, para todo ε > 0, existe uma partição P = {t0 , t1 , . . . , tn } do intervalo [a, b] tal que
Pn
ωi (f ) · (ti − ti−1 ) < ε. Como ωi (|f |) ≤ ωi (f ) para toda partição, temos que
i=1

n
X n
X
ωi (|f |) · (ti − ti−1 ) ≤ ωi (f ) · (ti − ti−1 ) < ε
i=1 i=1
Xn
⇒ ωi (|f |) · (ti − ti−1 ) < ε.
i=1
55

Dessa maneira, pelo mesmo Teorema 3.4, |f | é integrável. Além disso, para todo x ∈ [a, b],
(pela Observação 2 da Definição 2.9) vale −|f (x)| ≤ f (x) ≤ |f (x)|. Como |f | é integrável,
podemos usar a afirmação (4) para obter
Z b Z b Z b
−|f (x)| dx ≤ f (x) dx ≤ |f (x)| dx
a a a

e a afirmação (2), com c = −1, para ter


Z b Z b Z b
− |f (x)| dx ≤ f (x) dx ≤ |f (x)| dx.
a a a

Portanto, pela equivalência das afirmações (i) e (iii) do Teorema 2.1, temos
Z b Z b
f (x) dx ≤ |f (x)| dx.
a a

(6) Como f, g são integráveis então, particularmente, são limitadas. Seja K tal que
|f (x)| ≤ K e |g(x)| ≤ K, para todo x ∈ [a, b]. Dada uma partição P = {t0 , . . . , tn } de
[a, b], indiquemos com ωi (f · g), ωi (f ) e ωi (g) as oscilações dessas funções no intervalo
[ti−1 , ti ]. Para x, y ∈ [ti−1 , ti ] quaisquer, temos

|(f · g)(x) − (f · g)(y)| = |f (x) · g(x) − f (y) · g(y)|


 
= f (x) · g(x) − f (x) · g(y) − f (x) · g(y) − f (y) · g(y)
= |f (x) · g(x) − f (x) · g(y) + f (x) · g(y) − f (y) · g(y)|
   
= f (x) · g(x) − g(y) + g(y) · f (x) − f (y)
   
≤ f (x) · g(x) − g(y) + g(y) · f (x) − f (y)
= |f (x)| · |g(x) − g(y)| + |g(y)| · |f (x) − f (y)|
≤ K · |g(x) − g(y)| + K · |f (x) − f (y)|
 
= K · |g(x) − g(y)| + |f (x) − f (y)| .

Isto significa que, para quaisquer x, y ∈ [ti−1 , ti ], tem-se


 
|(f · g)(x) − (f · g)(y)| ≤ K · |g(x) − g(y)| + |f (x) − f (y)| . (29)

Ora, pondo
A = {|(f · g)(x) − (f · g)(y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]} ,
B = {|f (x) − f (y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]},
C = {|g(x) − g(y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]},
56

temos que

B + C = {|f (x) − f (y)| + |g(x) − g(y)|; |f (x) − f (y)| ∈ B e |g(x) − g(y)| ∈ C}


= {|f (x) − f (y)| + |g(x) − g(y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]}

Sendo f limitada (em particular, f |[ti−1 , ti ] também é limitada), na demonstração do Pro-


blema 2.7 está explı́cito que os conjuntos A, B e C são limitados superiormente (pois
possuem cotas superiores) e consequentemente, pelo demonstração do Problema 2.1, que
o conjunto C + B é limitado. Logo, pelo Lema 3.3, K · (B + C) também é limitado e,

como K ≥ 0, sup K · (B + C) = K · sup(B + C). Aplicando o Problema 2.4 em (29),
vem que

sup A ≤ sup K · (B + C) = K · sup(B + C)
⇒ sup A ≤ K · sup(B + C),

donde, pelo Lema 3.2,


sup A ≤ K · [sup B + sup C].

Como, pelo Corolário 3.4, temos ωi (f · g) = sup A, ωi (f ) = sup B e ωi (g) = sup C.


Segue-se que
ωi (f · g) ≤ K · [ωi (f ) + ωi (g)].

Daı́,
n
X n
X
ωi (f · g)(ti − ti−1 ) ≤ K · [ωi (f ) + ωi (g)] (ti − ti−1 )
i=1 i=1
n
X
= K · [ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 )]
i=1
n
X
= K· [ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 )]
"i=1n n
#
X X
= K· ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 ) . (30)
i=1 i=1

Ora, pelo Teorema 3.4, dizer que f e g são integráveis equivale a dizer que, para todo
57

ε > 0, existe uma partição P = {t0 , t1 , . . . , tn } do intervalo [a, b] tal que


n n
X ε X ε
ωi (f ) · (ti − ti−1 ) < e ωi (g) · (ti − ti−1 ) <
i=1
2K i=1
2K
n n
X X ε
⇒ ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 ) <
i=1 i=1
K
" n n
#
X X
⇒ K· ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 ) < ε,
i=1 i=1

donde, por 30,

n
" n n
#
X X X
ωi (f · g)(ti − ti−1 ) ≤ K · ωi (f )(ti − ti−1 ) + ωi (g)(ti − ti−1 ) < ε
i=1 i=1 i=1
Xn
⇒ ωi (f · g)(ti − ti−1 ) < ε.
i=1

Logo, f · g é integrável, conforme a equivalência das afirmações (1) e (4) do Teorema 3.4.
Está demonstrado o Teorema 3.5.
Z b Z c Z b
Observação 5. A igualdade f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx tem sentido apenas
a a c
quando a < c < b, conforme as definições e resultados até então apresentados. A fim
de torná-la verdadeira sejam quais forem a, b e c reais, serão adotadas as seguintes
convenções:
Z b Z a
Convenção 1 Se a = b, definimos f (x) dx = f (x) dx = 0.
a a
Z b Z a
Convenção 2 Se a > b, definimos f (x) dx = − f (x) dx.
a b
 
Assumindo essas convenções, para toda função f : min{a, b, c}, max{a, b, c} −→ R
integrável, vale, a igualdade
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx, (31)
a a c

independente da ordem dos números reais a, b, c. De fato, perceba que há seis possibili-
dades a considerar:

1. a ≤ b ≤ c, 4. b ≤ c ≤ a,
2. a ≤ c ≤ b, 5. c ≤ a ≤ b,
3. b ≤ a ≤ c, 6. c ≤ b ≤ a.

Para mostrar a veracidade da igualdade (31) em todas as possibilidades, basta admitir a


58

integrabilidade de f no intervalo maior e usar o Teorema 3.5, bem como as Convenções


(1) e (2). Inicialmente, se a = b = c, temos
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx = f (x) dx = 0
a a c

e, consequentemente,
Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Esse é um caso trivial, em comum, dentre as seis possibilidades de ordem dos números
reais a, b, c. Agora, analisemos os demais casos.
1. Sejam a ≤ b ≤ c e f : [a, c] −→ R integrável. Se a < b < c então,
Z c Z b Z c Z b Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx f (x) dx −
a a b a a b
Z b Z c  Z c 
⇒ f (x) dx = f (x) dx + − f (x) dx
a a b
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Se a = b < c,
Z b Z b Z c Z c
f (x) dx = 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx f (x) dx −
a a b b
Z b Z c  Z c 
⇒ f (x) dx = f (x) dx + − f (x) dx
a b b
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Caso a < b = c,
Z b Z c Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a a a c

2. Consideremos a ≤ c ≤ b e f : [a, b] −→ R integrável. Se a < c < b, temos de imediato


que Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Caso a = c < b,
Z b Z b Z b Z c Z b
f (x) dx = 0 + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a c a a c
59

Se a < c = b,
Z b Z c Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a a a c

3. Sejam b ≤ a ≤ c e f : [b, c] −→ R integrável. Se b < a < c, então


Z c Z a Z c Z a Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx − f (x) dx
b b a b b a
Z a Z b Z c
⇒ f (x) dx = − f (x) dx − f (x) dx
b c a
Z a Z b Z c
⇒ − f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
b c a
Z b Z b Z c
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a c a

Se b = a < c,
Z c Z c Z c Z c Z a
f (x) dx = f (x) dx + 0 ⇒ f (x) dx =
f (x) dx + f (x) dx
b a b a b
Z a Z c Z c
⇒ − f (x) dx = f (x) dx − f (x) dx
b a b
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Caso b < a = c,
Z b Z b Z b Z c Z b
f (x) dx = 0 + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a c a a c

4. Sejam b ≤ c ≤ a e f : [b, a] −→ R integrável. Se b < c < a, então


Z a Z c Z a Z b Z b Z c
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx ⇒ − f (x) dx = − f (x) dx − f (x) dx
b b c a c a
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Caso b = c < a,
Z b Z c Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a a a c

Se b < c = a,
Z b Z b Z b Z c Z b
f (x) dx = 0 + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a c a a c
60

5. Consideremos c ≤ a ≤ b e f : [c, b] −→ R integrável. Se c < a < b, então


Z b Z a Z b Z b Z a Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx ⇒ f (x) dx = − f (x) dx + f (x) dx
c c a a c c
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Se c = a < b,
Z b Z b Z b Z c Z b
f (x) dx = 0 + f (x) dx ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a c a a c

Caso c < a = b,
Z a Z b Z a Z b
f (x) dx = f (x) dx ⇒ 0 = − f (x) dx + f (x) dx
c c c c
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

6. Consideremos c ≤ b ≤ a e f : [c, a] −→ R integrável. Se c < b < a, então


Z a Z b Z a Z a Z a Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx ⇒ f (x) dx −
f (x) dx = f (x) dx
c c b b c c
Z b Z c Z b
⇒ − f (x) dx = − f (x) dx − f (x) dx
a a c
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

Se c = b < a,
Z b Z c Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a a a c

Caso c < b = a,
Z c Z c Z c Z c
f (x) dx = f (x) dx ⇒ 0 = − f (x) dx + f (x) dx
a b a b
Z c Z b
⇒ 0=− f (x) dx − f (x) dx
a c
Z c Z b
⇒ 0= f (x) dx + f (x) dx
a c
Z b Z c Z b
⇒ f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

 
Isso mostra que, para toda função f : min{a, b, c}, max{a, b, c} −→ R integrável, vale
61

a igualdade Z b Z c Z b
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx,
a a c

independente da ordem dos números reais a, b, c.

Teorema 3.6 Toda função contı́nua f : [a, b] −→ R é integrável.


Demonstração. Como f é contı́nua e [a, b] compacto, segue-se do Teorema 2.19 que f
é uniformemente contı́nua, donde, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que

ε
x, y ∈ [a, b], |x − y| < δ ⇒ |f (x) − f (y)| < . (32)
2(b − a)

b−a b−a
Seja n ∈ N tal que < δ. Pondo ti = a + i · , para i = 0, 1, 2, . . . , n, temos
n n
b−a b−a
t0 = a, t1 = a + , t2 = a + 2 · , . . . , tn = a + b − a = b. Assim, obtemos uma
n n
partição P = {t0 , t1 , . . . , tn } de [a, b] de modo que
   
b−a b−a
ti − ti−1 = a+i· − a + (i − 1) ·
n n
b−a b−a b−a
= a+i· −a−i· +
n n n
b−a
= < δ.
n

Dessa maneira, por (32),

b−a
x, y ∈ [ti−1 , ti ] ⇒ |x − y| ≤ ti − ti−1 = <δ
n
ε
⇒ |f (x) − f (y)| < .
2(b − a)

ε
Isto mostra que é uma cota superior para o conjunto {|f (x) − f (y)|; x, y ∈
2(b − a)
[ti−1 , ti ]} em cada intervalo [ti−1 , ti ]. Daı́, como o supremo de um conjunto é a menor
das cotas superiores e a oscilação ωi de f em cada intervalo [ti−1 , ti ] é tal que ωi =
ε
sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ [ti−1 , ti ]}, vem que ωi ≤ . Segue-se que
2(b − a)
n
X
ωi · (ti − ti−1 ) = ω1 · (t1 − a) + ω2 · (t2 − t1 ) + · · · + ωn · (b − tn−1 )
i=1
b−a b−a b−a
= ω1 · + ω2 · + · · · + ωn ·
n n n
b−a
= · (ω1 + ω2 + · · · + ωn )
n
b−a ε
≤ ·n·
n 2(b − a)
ε
= < ε.
2
62

Ora, ainda pelo fato de f ser contı́nua e [a, b] compacto, segue-se do Teorema 2.17 que

f [a, b] é compacto e, consequentemente, que f é limitada (Definição 2.8). Portanto, f
é integrável, conforme a afirmação (4) do Teorema 3.4. Isto prova o desejado.

Teorema 3.7 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Se, para cada c ∈ [a, b), f |[a, c] é integrável,
então f é integrável.
Demonstração. Já que f é limitada, para todo x ∈ [a, b], seja |f (x)| ≤ K. Além disso,
dado ε > 0, tomemos c ∈ [a, b) tal que

ε ε
b− <c<b⇒b−c< . (33)
4K 4K

Como f |[a,c] é integrável, pelo Teorema 3.4, existe uma partição {t0 , . . . , tn } de [a, c] tal
Pn ε
que ωi · (ti − ti−1 ) < . Pondo tn+1 = b, obtemos uma partição {t0 , . . . , tn , tn+1 } de
i=1 2
[a, b]. Segue-se do Teorema 2.2 que, para quaisquer x, y ∈ [tn , tn+1 ],

|f (x) − f (y)| = |f (x) + [−f (y)]| ≤ |f (x)| + | − f (y)|


= |f (x)| + |f (y)|
≤ 2K.

Assim, 2K é cota superior de {|f (x) − f (y)|; x, y ∈ [tn , tn+1 ]} e, consequentemente,

ωn+1 = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ [tn , tn+1 ]} ≤ 2K. (34)

Logo, por (33) e (34), vem que

ε ε
ωn+1 · (tn+1 − tn ) = ωn+1 · (b − c) < 2K · =
4K 2
ε
⇒ ωn+1 · (tn+1 − tn ) < .
2

Portanto,

n+1
X n
X
ωi · (ti − ti−1 ) = ωi · (ti − ti−1 ) + ωn+1 · (tn+1 − tn )
i=1 i=1
ε ε
< +
2 2
= ε

e, novamente pelo Teorema 3.4, f é integrável. O que prova o desejado.

Observação 6. Analogamente, com suas devidas alterações, prova-se a seguinte afirmação:


seja f : [a, b] −→ R limitada. Se, para cada c ∈ (a, b], f |[a, c] é integrável, então f é
integrável.
63

Corolário 3.5 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Se, para a < c < d < b quaisquer, f |[c,d] é
integrável, então f é integrável.
Demonstração. Com efeito, fixemos um ponto p, com a < p < b. Assim, por hipótese,
f |(a, p] e f |[p, b) são integráveis. Segue, imediatamente do Teorema 3.7, que f |[a, p] e f |[p, b]
também são. Logo, pelo item (1) do Teorema 3.5, podemos concluir que f é integrável.
Isto prova o desejado.

Corolário 3.6 Seja f : [a, b] −→ R limitada, com um número finito de descontinuidades.


Então f é integrável.
Demonstração. Com efeito, sejam t0 , . . . , tn os pontos de descontinuidade de f em
[a, b]. Dessa maneira, para ti−1 < c < d < ti quaisquer (com i = 1, . . . , n), f |[c, d] é
contı́nua. Assim, pelo Teorema 3.6, f |[c, d] é integrável e consequentemente, pelo Corolário
3.5, f |[ti−1 , ti ] também é (para cada i = 1, . . . , n). Daı́, aplicando o item (1) do Teorema
3.5 n − 1 vezes, da seguinte maneira:

f |[t0 , t1 ] , f |[t1 , t2 ] integráveis ⇒ f |[t0 , t2 ] é integrável,


f |[t0 , t2 ] , f |[t2 , t3 ] integráveis ⇒ f |[t0 , t3 ] é integrável,
..
.
f |[t0 , tn−1 ] , f |[tn−1 , tn ] integráveis ⇒ f |[t0 , tn ] é integrável,

obtemos que f |[t0 , tn ] é integrável. Há quatro casos a analisar:


(i) a = t0 e tn = b;
(ii) a < t0 e tn < b;
(iii) a < t0 e tn = b;
(iv) a = t0 e tn < b.
Se a = t0 e tn = b, é evidente que f é integrável. Se a < t0 e tn < b, de modo análogo aos
intervalos [ti−1 , ti ], obtemos que f |[a, t0 ] e f |[tn , b] são integráveis, donde, aplicando o item
(1) do Teorema 3.5 mais duas vezes, do seguinte modo:

f |[a, t0 ] , f |[t0 , tn ] integráveis ⇒ f |[a, tn ] é integrável,


f |[a, tn ] , f |[tn , b] integráveis ⇒ f |[a, b] é integrável,

obtemos novamente que f é integrável. Os casos (iii) e (iv) se resumem aos dois primeiros.
Isto prova que f é integrável, conforme querı́amos demonstrar.

3.2.1 Exemplos

Exemplo 3.7 Sejam f, g : [a, b] −→ R funções limitadas que diferem apenas num sub-
conjunto finito de [a, b]. Então f será integrável se, e somente se, g o for. No caso
64

Z b Z b
afirmativo tem-se f (x) dx = g(x) dx.
a a
Com efeito, seja {t1 ,
t2 , . . . , tn−1 }
⊂ [a, b] o conjunto dos pontos em que f difere de g.
Considerando a partição P = {a = t0 , t1 , t2 , . . . , tn−1 , tn = b} de [a, b], notemos que a
função f − g : [a, b] −→ R é constante (igual a 0) em cada intervalo (ti−1 , ti ). Assim, f
é uma função escada, conforme a Definição 3.5. Dessa maneira, pelo Exemplo 3.6,
Z b Z b n
X
(f − g)(x) dx = (f − g)(x) dx = 0 · (ti − ti−1 )
a a i=1
Z b
⇒ (f − g)(x) dx = 0.
a

Z b
Isto mostra que f − g é integrável e (f − g)(x) dx = 0. Ora, como
a

Z b Z b  
Z b  
f (x) dx = f (x) + g(x) − g(x) dx = g(x) + f (x) − g(x) dx,
a a a

segue-se da afirmação (3) do Teorema 3.5 que


Z b Z b Z b
f (x) dx = g(x) dx + f (x) − g(x) dx
a a a
Z b Z b
= g(x) dx + (f − g)(x) dx
a a
Z b
= g(x) dx + 0
a
Z b
= g(x) dx.
a

Z b Z b
Logo, f é integrável se, e somente se, g o é, com f (x) dx = g(x) dx.
a a

Exemplo 3.8 A partir do Corolário 3.6, também podemos garantir a integrabilidade da


função escada f − g do Exemplo 3.7.
Seja c ∈ [a, b]. Caso c 6= ti (para i = 1, . . . , n − 1), tem-se c ∈ (ti−1 , ti ), c ∈ [a, t1 )
ou c ∈ (tn−1 , b]. Como f, g diferem somente nos pontos t1 , t2 , . . . , tn−1 , em qualquer
intervalo apresentado, (f − g)(x) = 0 e, em particular, (f − g)(c) = 0. Daı́, dado ε > 0,
existe δ = min{|c − a|, |c − t1 |, . . . , |c − tn−1 |, |c − b|} > 0 tal que

x ∈ (c − δ, c + δ) ∩ [a, b] ⇒ (f − g)(x) = 0 ∈ (−ε, ε)


⇒ (f − g)(x) ∈ (0 − ε, 0 + ε)

⇒ (f − g)(x) ∈ (f − g)(c) − ε, (f − g)(c) + ε . (35)
65

|(f − g)(c)|
Caso c = ti , para algum i = 1, . . . , n − 1, pondo ε = > 0, tem-se, quando
3
(f − g)(c) > 0,

(f − g)(c) > ε ⇒ (f − g)(c) + ε > (f − g)(c) − ε > 0



⇒ 0∈/ (f − g)(c) − ε, (f − g)(c) + ε ,

e, quando (f − g)(c) < 0,

|(f − g)(c)|
(f − g)(c) < ε ⇒ (f − g)(c) − ε < (f − g)(c) + ε = (f − g)(c) +
3
(f − g)(c)
= (f − g)(c) −
3
3(f − g)(c) − (f − g)(c)
=
3
2
= · (f − g)(c) < 0,
3

o que implica em,



0∈
/ (f − g)(c) − ε, (f − g)(c) + ε .

Daı́, para todo δ > 0, existe um x pertencente a um dos intervalos (c − δ, c + δ) ∩


(ti−1 , ti ), (c − δ, c + δ) ∩ (a, ti ), ou (c − δ, c + δ) ∩ (ti , b), donde, (f − g)(x) = 0. Em
sı́ntese, existe um número ε > 0 tal que, para todo δ > 0, pode se encontrar um x ∈ [a, b]
com x ∈ (c − δ, c + δ), mas

(f − g)(x) = 0 ∈
/ (f − g)(c) − ε, (f − g)(c) + ε

⇒ (f − g)(x) ∈
/ (f − g)(c) − ε, (f − g)(c) + ε . (36)

Isto significa, por (35) e (36), que f − g é descontı́nua apenas nos pontos t1 , t2 , . . . , e
tn−1 . Por outro lado, como f, g são limitadas, existe uma constante K (suficientemente
K K
grande) tal que |f (x)| < e |g(x)| < , para todo x ∈ [a, b]. Daı́,
2 2

K K
|f (x)| + |g(x)| < + ⇒ |f (x)| + | − g(x)| < K.
2 2

Segue-se, do item (1) do Teorema 2.2, que

f (x) + [−g(x)] ≤ |f (x)| + | − g(x)| < K ⇒ |f (x) − g(x)| < K


⇒ |(f − g)(x)| < K,

e, consequentemente, que f − g é limitada. Portanto, como f − g é limitada com uma


quantidade finita de descontinuidades, a partir do Corolário 3.6, também podemos concluir
que a função escada f − g é integrável.
66

Contudo, cabe destacar que o Exemplo 3.7 não contém o Corolário 3.6 na
demonstração de sua afirmação.

Exemplo 3.9 A função f : [−1, +1] −→ R, definida por

sen 1 , se x 6= 0,

f (x) = x
0, se x = 0,

é integrável.
De fato, pois se x 6= 0, tem-se

1
−1 ≤ sen ≤ 1 ⇒ −1 ≤ f (x) ≤ 1 ⇒ |f (x)| ≤ 1
x

e, caso x = 0, |x| = 0 < 1. Assim, |f (x)| < 1, para todo x ∈ [−1, +1] e, consequen-
temente, f é limitada. Além disso, dado a ∈ [−1, +1], perceba que, se a 6= 0, tem-se
1
f (a) = sen , donde,
a
1 1
lim f (x) = lim sen = sen = f (a).
x→a x→a x a
Contudo, lim f (x) não existe, basta observarmos que a sequência definida, para todo
x→0
1 1
n ∈ N, por xn = π converge para 0, mas a sequência f (xn ) = sen diverge, pois
+ nπ xn
2

1  π  1, se n for par,
lim f (xn ) = lim sen = lim sen + nπ =
n→∞ n→∞ xn n→∞ 2 −1, se n for ı́mpar.

Isto exprime que f é descontı́nua apenas no ponto 0. Portanto, como f é limitada com
uma quantidade finita de descontinuidades, pelo Corolário 3.6, f é integrável.

Exemplo 3.10 Seja f : [a, b] −→ R definida por



0, se x ∈ (R − Q) ∪ {0},

f (x) = 1 p
 , se x = é uma fração irredutı́vel com p 6= 0.

q q

Mostraremos agora que f é integrável no intervalo [a, b] e, mais precisamente, que


Z b
f (x) dx = 0.
a  
ε0
Com efeito, dado ε > 0, afirmamos que o conjunto F = x ∈ [a, b]; f (x) ≥ é
b−a
ε ε0
finito, onde ε0 = . Note que, se x ∈ (R − Q) ∪ {0}, então f (x) = 0 < , o que
2 b−a
implica em, f (x) ∈
/ F. Assim, F é vazio (por sua vez, finito) ou seus elementos são da
67

p p
forma x = , em que é uma fração irredutı́vel com p 6= 0. Daı́, se ocorre a segunda
q q
opção,
ε0 1 ε0 b−a
f (x) ≥ ⇒ ≥ ⇒q≤ .
b−a q b−a ε0
Isto exprime que F é o conjunto das frações irredutı́veis pertencentes a [a, b] cujos deno-
b−a
minadores são menores ou iguais que . Ora, como a quantidade de inteiros positivos
ε0
b−a b−a
q≤ é finito (pois se não fosse, era um limitante superior dos inteiros) e, para
ε0 ε0
p1 p2 pm
cada denominador q, existem no máximo uma quantidade finita de frações , , . . . ,
q q q
pertencentes a [a, b] (pois caso contrário, q · b era um limitante superior para o conjunto
dos inteiros ou q · a um limitante inferior, o que é um absurdo, visto que Z é ilimitado),
temos que F é finito. Isto prova o afirmado.
Agora, tomemos uma partição P = {t0 , . . . , tn } de [a, b] tal que a soma dos compri-
mentos dos intervalos de P que contêm algum ponto de F seja menor do que ε0 , ou seja,
dada uma partição Q = {q0 , . . . , qm } qualquer de [a, b], basta refinarmos Q n − m vezes
(com n > m suficientemente grande) de modo que (t0i − t0i−1 ) < ε0 , onde assinalamos
P

com um apóstrofo os intervalos [t0i−1 , t0i ] de P que contêm algum ponto de F. Por outro
lado, assinalando com dois apóstrofos os intervalos [t00i−1 , t00i ] de P que são disjuntos de F,
observemos que F ∩ [t00i−1 , t00i ] = ∅, donde, para todo x ∈ [t00i−1 , t00i ], temos

1 ε0 ε0
x ∈ [a, b] − F ⇒ f (x) = 0 ou 0 < f (x) = < ⇒ 0 ≤ f (x) < .
q b−a b−a
ε0
Diante disso, é uma cota superior do conjunto B = {f (x); x ∈ [t00i−1 , t0i ]} e,
b−a
ε0
consequentemente, Mi00 = sup B ≤ . Em seguida, notemos que a soma S(f ; P ) =
P b−a
Mi (ti − ti−1 ) se decompõe em duas parcelas:
X X X
Mi · (ti − ti−1 ) = Mi0 · (t0i − t0i−1 ) + Mi00 · (t00i − t00i−1 ). (37)

(t0i
− t0i−1 ) < ε0 e, além disso, 0
P
Assim, como  Mi ≤ 1 (uma vez que 1 é uma cota superior
1
do conjunto C = f (x) = ; x ∈ [t0i−1 , t0i ] e Mi0 = sup C), o primeiro somatório é tal
q
que
X X
Mi0 · (t0i − t0i−1 ) ≤ 1 · (t0i − t0i−1 ) < 1 · ε0 = ε0
X
⇒ Mi0 · (t0i − t0i−1 ) < ε0 . (38)

ε0
O segundo também é menor do que ε0 , pois Mi00 ≤ e (t00i − t00i−1 ) < b − a, o que
P
b−a
68

acarreta em,
X ε0
Mi00 · (t00i − t00i−1 ) <
· (b − a) = ε0
b−a
X
⇒ Mi00 · (t00i − t00i−1 ) < ε0 . (39)

Logo, por (37), (38) e (39), vem que


X X X
S(f ; P ) = Mi · (ti − ti−1 ) = Mi0 · (t0i − t0i−1 ) + Mi00 · (t00i − t00i−1 )
< ε 0 + ε0
= ε.

Isto mostra que, para todo ε > 0, existe uma partição P de [a, b] tal que S(f ; P ) < ε, ou
Z b
seja, 0 ≤ S(f ; P ) < 0 + ε. Segue-se que f (x) dx = inf S(f ; P ) = 0 e, como f (x) ≥ 0
a P
(para todo x ∈ [a, b]), temos
Z b Z b Z b Z b
0≤ f (x) dx ≤ f (x) dx = 0 ⇒ f (x) dx = f (x) dx = 0
a a a a
Z b
⇒ f (x) dx = 0.
a

Z b
Portanto, concluı́mos que f é integrável e que f (x) dx = 0, como querı́amos mostrar
a
anteriormente.
Perceba que f é descontı́nua num conjunto infinito, a saber: o conjunto dos
números racionais do intervalo [a, b]. Basta ver que, dado a ∈ Q, existem p, q ∈ Z tal que
p 1 1
é uma fração irredutı́vel com p 6= 0 e q > 0. Daı́, f (a) = , donde, pondo ε = > 0,
q q q+1
devido a densidade dos irracionais em R, para todo δ > 0, existe um x ∈ [a, b] ∩ (R − Q)
de modo que |x − a| < δ, mas

1 1
|f (x) − f (a)| = 0 − = ≥ ε ⇒ |f (x) − f (a)| ≥ ε.
q q

Além disso, note-se que 0 ≤ f (x) ≤ 1, ou seja, f é limitada. Logo, o Exemplo 3.10 acima
mostra que a recı́proca do Corolário 3.6 não é verdadeira.

3.3 O Teorema Fundamental do Cálculo

Este tópico será dedicado ao estudo de certas conexões entre os conceitos de


derivada e integral. Essas conexões são expressas pelo Teorema Fundamental do Cálculo
que nos fornece, entre outras coisas, uma maneira de calcular integrais de certas funções
desde que conheçamos uma de suas infinitas primitivas.
69

Seja f : [a, b] −→ R integrável. Pelo item (1) do Teorema 3.5, para todo
x ∈ [a, b], f |[a, x] é integrável. Assim, nestas condições, será possı́vel sempre definirmos
uma função F : [a, b] −→ R pondo
Z x
F (x) = f (t) dt.
a

Proposição 3.3 Se f : [a, b] −→ R é uma função integrável, então F : [a, b] −→ R é


(uniformemente) contı́nua.
Demonstração. Com efeito, se f é integrável, particularmente, f é limitada. Assim,
existe um K > 0 tal que |f (t)| ≤ K, para todo t ∈ [a, b]. Dessa maneira, pondo g(t) = K
para todo t ∈ [a, b], temos |f (t)| ≤ g(t) para qualquer t ∈ [a, b], donde, pelo item (4) do
Teorema 3.5, Z Z y y
|f (t)| dt ≤ g(t) dt,
x x

e, pelo item (5) do Teorema 3.5,


Z y Z y Z y
f (t) dt ≤ |f (t)| dt ≤ g(t) dt
x x x
Z y Z y
⇒ f (t) dt ≤ g(t) dt.
x x

Além disso, segue da integrabilidade de f que, dados quaisquer x, y ∈ [a, b],


Z y Z x Z y Z a
|F (y) − F (x)| = f (t) dt − f (t) dt = f (t) dt + f (t) dt
a a a x
Z a Z y
= f (t) dt + f (t) dt
x a
Z y
= f (t) dt .
x

Z y
Daı́, sendo g(t) dt = K · (y − x) ≤ K · |y − x| (ver Exemplo 3.2), vem que
x

Z y
|F (y) − F (x)| = f (t) dt ≤ K · |y − x|
x
⇒ |F (y) − F (x)| ≤ K · |y − x|.

Portanto, F é lipschitziana e, consequentemente, (uniformemente) contı́nua no intervalo


[a, b]. (Ver a Observação 3 da Definição 2.25 e o Teorema 2.19.)
Z x
Definição 3.9 Seja f : [a, b] −→ R integrável. A função F (x) = f (t) dt chama-se
a
uma integral indefinida de f.
70

Teorema 3.8 Seja f : [a, b] −→ R integrável. ZSe f é contı́nua no ponto c ∈ [a, b], então
x
a função F : [a, b] −→ R, definida por F (x) = f (t) dt é derivável no ponto c e se tem
a
F 0 (c) = f (c).
F (c + h) − F (c)
Demonstração. Queremos mostrar que lim existe e é igual a f (c), ou
h→0 h
seja, que F 0 (c) = f (c). De fato, como f é contı́nua no ponto c, dado ε > 0 arbitrário,
podemos achar δ > 0 tal que

ε
t ∈ [a, b], |t − c| < δ ⇒ |f (t) − f (c)| < .
2

Então, se 0 < h < δ e c + h ∈ [a, b], temos


Z c+h Z c
F (c + h) − F (c) = f (t) dt − f (t) dt
a a
Z c+h Z a
= f (t) dt + f (t) dt
a c
Z a Z c+h
= f (t) dt f (t) dt
c a
Z c+h
= f (t) dt,
c

donde,
Z c+h
F (c + h) − F (c) 1
− f (c) = f (t) dt − h · f (c)
h h c
Z c+h
1
= f (t) dt + (c + h − c) · [−f (c)]
h c
Z c+h Z c+h
1
= f (t) dt + −f (c) dt
h c c
Z c+h
1
= [f (t) − f (c)] dt
h c
1 c+h
Z
≤ |f (t) − f (c)| dt
h c
1 ε
≤ · · (c + h − c)
h 2
1 ε
= · ·h
h 2
< ε.

Isto mostra que

c + h ∈ [a, b], 0 < c + h − c < δ ⇒ c + h ∈ [a, b], 0 < h < δ


F (c + h) − F (c)
⇒ − f (c) < ε,
h
71

ou seja, que F+0 (c) = f (c). De modo análogo, se mostra que

c + h ∈ [a, b], 0 < c − (c + h) < δ ⇒ c + h ∈ [a, b], 0 < −h < δ


F (c + h) − F (c)
⇒ − f (c) < ε,
h

isto é, que F−0 (c) = f (c). Basta ver que ao adotar a Convenção 2, não importa se c + h <
c, pois, diante dela, conseguimos usar o mesmo processo acima para mostrarmos que
F−0 (c) = f (c). Logo, sendo F+0 (c) = f (c) = F−0 (c), podemos concluir que F 0 (c) = f (c),
como querı́amos demonstrar anteriormente.

Corolário 3.7 Dada f : [a, b] −→ R contı́nua, existe F : [a, b] −→ R derivável, tal que
F 0 = f.
Demonstração. De fato,Z como toda função contı́nua é integrável (ver o Teorema 3.6),
x
basta tomarmos F (x) = f (t) dt. Assim, como f é contı́nua em todo x ∈ [a, b], pelo
a
Teorema 3.8, F é derivável em todo x ∈ [a, b] com F 0 (x) = f (x). Portanto, F : [a, b] → R
é derivável e, além disso, F 0 = f. Isto prova o desejado.

Definição 3.10 Chama-se primitiva de uma função f : [a, b] −→ R a uma função


derivável F : [a, b] −→ R tal que F 0 = f.

Proposição 3.4 Se f : [a, b] −→ R possui uma primitiva, então possui uma infinidade
delas. Duas primitivas de f em [a, b] diferem por uma constante, pois têm a mesma
derivada f.
Demonstração. De fato, seja F : [a, b] −→ R uma primitiva da função f, ou seja,
F 0 = f. Daı́, dado k ∈ R e pondo G(x) = F (x) + k, para todo x ∈ [a, b], temos que
F e G são deriváveis (a primeira pela definição de primitiva e a segunda por ser a soma
das funções deriváveis F com uma função constante igual k), o que implica na função
G − F, dada por (G − F )(x) = k para todo x ∈ [a, b], ser derivável. Donde segue que,
(G − F )0 (x) = 0 para todo x ∈ [a, b] e, consequentemente, para todo c ∈ [a, b],

(G − F )(x) − (G − F )(c) G(x) − F (x) − G(c) + F (c)


lim = 0 ⇒ lim =0
x→c x−c x→c x−c
G(x) − G(c) F (x) − F (c)
⇒ lim − lim =0
x→c x−c x→c x−c
G(x) − G(c) F (x) − F (c)
⇒ lim = lim
x→a x−c x→c x−c
0 0
⇒ G (c) = F (c).

Logo, G0 = F 0 = f e, como c pode ser qualquer valor real, f : [a, b] −→ R possui uma
infinidade de primitivas. Por outro lado, se F, G : [a, b] −→ R são primitivas da função f,
então G, F (por serem deriváveis) são contı́nuas (ver o Teorema 2.20) e, consequentemente,
a função G − F é contı́nua e tem derivada nula. Segue do Teorema do Valor Médio, de
72

Lagrange (Teorema 2.22), que para qualquer x ∈ (a, b], existe c ∈ (a, x) tal que

(G − F )(x) − (G − F )(a)
= (G − F )0 (c)
x−a
⇒ (G − F )(x) − (G − F )(a) = (G − F )0 (c) · (x − a)
⇒ (G − F )(x) − (G − F )(a) = 0 · (x − a)
⇒ (G − F )(x) = (G − F )(a)
⇒ G(x) − F (x) = (G − F )(a).

Logo, duas primitivas de f em [a, b] diferem por uma constante, na qual seria (G − F )(a)
se tratando das primitivas F e G.

Proposição 3.5 Se F : [a, b] −→ R é de classe C 1 então


Z b
F 0 (t) dt = F (b) − F (a).
a

Demonstração.
Z x Com efeito, sendo F 0 contı́nua, pelo Teorema 3.8 a função
ϕ(x) = F 0 (t) dt e a função F são ambas primitivas de F 0 em [a, b]. Logo, pela Pro-
a
posição Z3.4, ϕ(x) − F (x) = constante, para todo x ∈ [a, b]. Como, pela Convenção 1,
a
ϕ(a) = F 0 (t) dt = 0, segue-se que
a

ϕ(b) − F (b) = constante = ϕ(a) − F (a) ⇒ ϕ(b) − F (b) = 0 − F (a)


⇒ ϕ(b) = F (b) − F (a)
Z b
⇒ F 0 (t) dt = F (b) − F (a),
a

o que prova o desejado.

Mostraremos agora que não é preciso supor F 0 contı́nua para comprovar a tese
da Proposição 3.5.

Teorema 3.9 (Teorema Fundamental do Cálculo) Se uma função integrável


Z b
f : [a, b] −→ R possui uma primitiva F : [a, b] −→ R, então f (x) dx = F (b) − F (a).
a
Em outros termos, se uma função F : [a, b] −→ R possui derivada integrável,
então Z b
F (b) − F (a) = F 0 (t) dt.
a

Demonstração. Como F é derivável (e, consequentemente, contı́nua), para qualquer


partição P = {a = t0 , t1 , . . . , tn−1 , tn = b} de [a, b], o Teorema do Valor Médio
(Teorema 2.22) nos garante, para todo i = 1, . . . , n, a existência de ξi ∈ (ti−1 , ti ) tal
73

F (ti ) − F (ti−1 )
que = F 0 (ξi ), donde, F (ti ) − F (ti−1 ) = F 0 (ξi ) · (ti − ti−1 ). Dessa maneira,
ti − ti−1
temos que
     
F (b) − F (a) = F (b) − F (tn−1 ) + F (tn−1 ) − F (tn−2 ) + · · · + F (t1 ) − F (a)
= F 0 (ξn ) · (b − ti−1 ) + F 0 (ξn−1 ) · (tn−1 − tn−2 ) + · · · + F 0 (ξ1 ) · (t1 − a),
n
F 0 (ξi ) · (ti − ti−1 ).
P
o que implica em, F (b) − F (a) =
i=1
Indicando com m0i e Mi0 (respectivamente) o inf e o sup de F 0 no intervalo [ti−1 , ti ], temos,
para todo i = 1, . . . , n, m0i ≤ F 0 (ξi ) ≤ Mi0 , donde
n
X n
X n
X
m0i · (ti − ti−1 ) ≤ F 0 (ξi ) · (ti − ti−1 ) ≤ Mi0 · (ti − ti−1 )
i=1 i=1 i=1
⇒ s(F 0 ; P ) ≤ F (b) − F (a) ≤ S(F 0 ; P ),

para qualquer partição P de [a, b]. Logo,

sup s(F 0 ; P ) ≤ F (b) − F (a) ≤ inf S(F 0 ; P )


P P

e portanto, como F 0 é integrável,

sup s(F 0 ; P ) = F (b) − F (a) = inf S(F 0 ; P )


P P
Z b Z b
0
⇒ F (x) dx = F (b) − F (a) = F 0 (x) dx
a a
Z b
⇒ F (b) − F (a) = F 0 (x) dx.
a

Isto prova o desejado.

A Proposição 3.4 em conjunto com o Teorema Fundamental do Cálculo diz


que as únicas primitivas de uma função integrável f : [a, b] −→ R (se existirem) são da
forma Z x
f (t) dt + constante.
a

3.3.1 Exemplos

Exemplo 3.11 Seja f : [0, 2] −→ R definida por



0, se 0 ≤ t < 1,
f (t) =
1, se 1 ≤ t ≤ 2.
74

Z x
Tomando F : [0, 2] −→ R, F (x) = f (t) dt, vem que
a

0, se 0 ≤ t ≤ 1,
F (x) =
x − 1, se 1 ≤ t ≤ 2,

pois f |[0, 1) e f |[1, 2] são funções constantes iguais a 0 e 1, respectivamente. Dessa maneira,
pelo Exemplo 3.2,
Z x
F (x) = f (t) dt = 0 · (x − 0) = 0, ∀ x ∈ [0, 1)
0

e Z x
F (x) = f (t) dt = 1 · (x − 1) = x − 1, ∀ x ∈ [1, 2].
1

Em particular, quando x = 1 ∈ [1, 2], temos


Z 1
F (x) = f (t) dt = 1 · (1 − 1) = 0,
1

donde, também vale, Z x


F (x) = f (t) dt = 0, ∀ x ∈ [0, 1].
1

Figura 3 – Gráfico da função f

Fonte: Elaborado pelo autor.


75

Figura 4 – Gráfico da função F

Fonte: Elaborado pelo autor.

Observe nos gráficos acima que F é contı́nua, mas não é derivável no ponto
x = 1, que trata-se de uma descontinuidade de primeira espécie em f.
O Corolário 3.7 diz que toda função contı́nua f num intervalo compacto possui
primitiva F. Entretanto, nem toda função integrável f possui uma primitiva F. Pois, ao
observar o Exemplo 3.11 acima, notamos que f é uma Z função escada e, como já vimos,
x
é integrável. Mas, a função definida por F (x) = f (t) dt não é derivável no ponto
0
x = 1, não podendo ser a primitiva de f. Além disso, sabemos do Corolário 2.1 que: se
f = F 0 então f não pode ter descontinuidades de primeira espécie, ou seja, se f admite
pelo menos uma descontinuidade de primeira espécie, então f não possui uma primitiva
F 0 = f.

Exemplo 3.12 A função f do Exemplo 3.11 não possui primitiva em intervalo algum
que contenha o ponto 1 em seu interior. Por outro lado, a função descontı́nua no ponto
0, dado por
2x · sen 1 − cos 1 se x 6= 0,

f (x) = x x
0, se x = 0
possui a primitiva
x2 · sen 1 , se x 6= 0,

F (x) = x
0, se x = 0.
Para verificar isso, basta usar a regra do produto usada até mesmo nos cursos de Cálculo.
A existência da primitiva, neste caso, pode ocorrer devido a descontinuidade em f no
ponto x = 0 ser de segunda espécie, não existindo os limites laterias lim+ f (x) e lim− f (x).
x→0 x→0
76

Exemplo 3.13 Como uma aplicação do Teorema Fundamental do Cálculo, pode-se obter
o desenvolvimento de Taylor de log em torno do ponto 1 (ou de log(1 + x) em torno de
x = 0).

Observação 7. O número log x, neste caso, seguindo a notação de Lima (2012), é o


logaritmo natural de x ou, simplesmente, o logaritmo de x em que nos cursos de Cálculo
vê-se majoritariamente o logaritmo natural de x com a notação: ln x. Vale lembrar que
log x está definido apenas para x > 0.

Observação 8. A “base” dos logaritmos naturais é indicado pelo sı́mbolo e, que segundo
Lima (2012) é uma das constantes mais ubı́quas na Análise Matemática.

Observação
 n9. O número e pode ser definido pela igualdade: log e = 1, ou pelo limite:
1
lim 1 + = e. A prova da existência deste limite Pode ser consultada em Erguidor
n→∞ n
(2008, p. 119) ou nos Exemplos 8, 9 e 16 do Capı́tulo IV de Lima (2012). Já a equivalência
do limite com a igualdade acima, na subseção 7 do Capı́tulo IX de Lima (2012).

Enfatizadas as observações acimas, voltemos para o Exemplo 3.13. De fato,


pondo q = 1 + t + · · · + tn−1 , vem que

q − t · q = (1 + t + · · · + tn−1 ) − (t + t2 + · · · + tn−1 + tn )
⇒ q · (1 − t) = 1 − tn
1 − tn
⇒ =q
1−t
1 − tn
⇒ = 1 + t + · · · + tn−1 ,
1−t

1 − tn
para t 6= 1. Como 1 + t = 1 − (−t), segue-se da fórmula = 1 + t + · · · + tn−1 que,
1−t
6 −1,
para t =

1 − (−t)n
= 1 + (−t) + (−t)2 + · · · + (−t)n−1
1 − (−t)
1 − (−1)n tn
⇒ = 1 − t + t2 − · · · + (−1)n−1 tn−1
1+t
1 − (−1)n tn tn tn
⇒ + (−1)n = 1 − t + t2 − · · · + (−1)n−1 tn−1 + (−1)n
1+t 1+t 1+t
1 − (−1)n tn + (−1)n tn tn
⇒ = 1 − t + t2 − · · · + (−1)n−1 tn−1 + (−1)n
1+t 1+t
n
1 t
⇒ = 1 − t + t2 − · · · + (−1)n−1 · tn−1 + (−1)n . (40)
1+t 1+t
77

Sendo F (t) = log(1 + t), note que, para qualquer t > −1,

F (t + h) − F (t) log(t + h + 1) − log(t + 1)


lim = lim
h→0 h h→0
 h 
1 
= lim log(t + h + 1) − log(t + 1)
h→0 h
  
1 t+h+1
= lim log
h→0 h t+1
 1
t+h+1 h
= lim log
h→0 t+1
  h1
t+1 h
= lim log +
h→0 t+1 t+1
  h1
h
= lim log 1 + .
h→0 t+1

h
Pondo u = , perceba que u → 0 se e só se h → 0, donde
t+1
  1
F (t + h) − F (t) u(t + 1) u(t+1)
lim = lim log 1 +
h→0 h u→0 t+1
1
= lim log(1 + u) u(t+1)
u→0
 
1 1
= lim log(1 + u) u
u→0 t + 1
1 1
= lim log(1 + u) u
t+1 u→0
 u
1 1
= lim log 1 +
t + 1 u→∞ u
 u
1 1
= log lim 1 +
t+1 u→∞ u
1
= log e
t+1
1
= ·1
t+1
1
= .
t+1

1
Assim, para todo t > −1, F 0 (t) = f (t) = e, consequentemente, F é uma primitiva de
1+t
f. Além disso, pode ser consultado em qualquer livro de Cálculo (em particular, Guidorizzi
ti+1
(2008, p. 145)) que: se i ∈ N − {1} e G(t) = então G0 (t) = g(t) = ti , isto é, G é
i+1
78

uma primitiva de g. Diante disso, pelo Teorema Fundamental do Cálculo, temos:


Z x Z x
dt dt
F (x) + F (0) = ⇒ log(1 + x) + log(1 + 0) =
0 1+t 0 1+t
Z x
dt
⇒ log(1 + x) + 0 =
1+t
Z x 0
dt
⇒ log(1 + x) =
0 1+t

e
x Z x
xi+1 0i+1
Z
i
G(x) + G(0) = t dt ⇒ + = ti dt
0 i+1 i+1
i+1 Z x 0
x
⇒ +0= ti dt
i+1
i+1 Z x 0
x
⇒ = ti dt
i+1 0

para todo x > −1 e i ∈ N − {1}. Dessa maneira, tomando a integral de 0 a x de ambos


os membros da igualdade (40), obtemos
Z x Z  x n

1 2 n−1 n−1 n t
dt = 1 − t + t − · · · + (−1) ·t + (−1) dt
0 1+t 0 1+t
Z x Z x Z x Z x
2
⇒ log(1 + x) = 1 dt − t dt + t dt − · · · + (−1)n−1 · tn−1 dt +
0 0 0 0
Z x n
t
+ (−1)n dt
0 1+t
Z x n
x2 x3 n−1 x
n
n t
⇒ log(1 + x) = x − + − · · · + (−1) · + (−1) · dt
2 3 n 0 1+t

para todo x > −1. Daı́, escrevendo


x
tn
Z
n
rn (x) = (−1) dt,
0 1+t

para cada x > −1, podemos obter um t > −1 tal que −1 < x ≤ t, pois cada valor x
do domı́nio de F é extraı́do
Z x do nconjunto dos valores t, que representam o domı́nio da
t tn
função f, em que F (x) = dt e f (t) = com −1 < x ≤ t. Assim, usando a
0 1+t 1+t
79

Afirmação (4) do Teorema 3.5, observemos os seguintes fatos:

1
0≤x⇒1≤1+x≤1+t ⇒ ≤1
1+t
tn
⇒ ≤ tn
1+t
x x
tn xn+1
Z Z
⇒ |rn (x)| = dt ≤ tn dt =
0 1+t 0 n+1
xn+1
⇒ |rn (x)| ≤ ;
n+1

1 1
−1 < x ≤ 0 ⇒ 0 < 1 + x ≤ 1 + t ⇒ 0 < ≤
1+t 1+x
n n
t |t| |t|n
⇒ ≤ ≤
1+t 1+t 1+x
tn |t|n
⇒ ≤
1+t 1Z+ x
x Z x
tn |t|n
⇒ |rn (x)| = dt ≤ dt
0 1+t 0 1+x
Z x
|t|n
⇒ |rn (x)| ≤ dt
0 1+x
Z x
1
⇒ |rn (x)| ≤ |t|n dt
1+x 0
|x|n+1
⇒ |rn (x)| ≤ .
(1 + x)(n + 1)

Aplicando o Teorema do Confronto, para 0 ≤ x temos,

xn+1 |rn (x)| xn+1


0 ≤ |rn (x)| ≤ ⇒ 0≤ ≤ n
n+1 xn x (n + 1)
n
|rn (x)| x ·x
⇒ 0≤ ≤

n n
x x (n + 1)

|rn (x)| x
⇒ lim 0 ≤ lim n
≤ lim
x→0 x→0 x x→0 n + 1
rn (x) |rn (x)|
⇒ lim = lim =0
x→0 xn x→0 xn
rn (x)
⇒ lim n = 0
x→0 x
80

e, para −1 < x ≤ 0,

|x|n+1 |rn (x)| |x|n+1


0 ≤ |rn (x)| ≤ ⇒ 0≤ ≤
(1 + x)(n + 1) |xn | |xn |(1 + x)(n + 1)
n
rn (x) |x|
 · |x|
⇒ 0≤ n
≤ n

x |x|(1 + x)(n + 1)

rn (x) |x|
⇒ 0≤ n

x (1 + x)(n + 1)
rn (x) |x|
⇒ lim 0 ≤ lim n
≤ lim
x→0 x→0 x x→0 (1 + x)(n + 1)

rn (x)
⇒ lim =0
x→0 xn
rn (x)
⇒ lim n = 0.
x→0 x

rn (x)
Logo, em qualquer caso acima, lim = 0 e, portanto,
x→0 xn

x2 x3 xn
pn (x) = x − + + · · · + (−1)n−1 ·
2 3 n

é o polinômio de Taylor de ordem n para a função log no ponto 1. (Ou para f (x) =
log(1 + x) no ponto 0.) Além disso, pelo Teorema do Confronto aplicado a sequências,
notemos que, para 0 ≤ x ≤ 1,

xn+1 xn+1
0 ≤ |rn (x)| ≤ ⇒ lim 0 ≤ lim |rn (x)| ≤ lim
n+1 n→∞ n→∞ n→∞ n + 1
⇒ lim |rn (x)| = 0
n→∞
⇒ lim rn (x) = 0
n→∞

e, para −1 < x ≤ 0,

|x|n+1 |x|n+1
0 ≤ |rn (x)| ≤ ⇒ lim 0 ≤ lim |rn (x)| ≤ lim
(1 + x)(n + 1) n→∞ n→∞ n→∞ (1 + x)(n + 1)

⇒ lim |rn (x)| = 0


n→∞
⇒ lim rn (x) = 0,
n→∞

pois (pelo Teorema do Confronto aplicado a sequências), sendo 0 ≤ x ≤ 1, temos

xn+1 1
0 ≤ xn+1 ≤ 1n+1 = 1 ⇒ 0 ≤ ≤
n+1 n+1
n+1
x 1
⇒ 0 ≤ lim ≤ lim =0
n→∞ n + 1 n→∞ n + 1
xn+1
⇒ lim = 0,
n→∞ n + 1
81

e, sendo −1 < x ≤ 0 (⇔ 0 ≤ |x| < 1), temos x + 1 > 0 e, de maneira semelhante ao caso
acima, obtemos

|x|n+1 1 1 |x|n+1 1 1
0≤ ≤ ⇒ 0≤ lim ≤ lim
(1 + x)(n + 1) (1 + x)(n + 1) (1 + x) n→∞ n + 1 (1 + x) n→∞ n + 1
n+1
|x| 1 |x|n+1
⇒ lim = lim = 0.
n→∞ (1 + x)(n + 1) (1 + x) n→∞ n + 1

Assim, para todo x ∈ (−1, 1], temos lim rn (x) = 0. Vale, portanto, o desenvolvimento
n→∞
de Taylor para −1 < x ≤ 1 dado por:

x2 x3 xn
log(1 + x) = x − + + · · · + (−1)n−1 · + ...
2 3 n

Em particular, pondo x = 1, obtemos a fórmula

1 1 (−1)n−1
log(2) = 1 − + + ··· + + ...
2 3 n

3.4 Fórmulas clássicas do Cálculo Integral

Neste tópico, mostramos algumas fórmulas para o cálculo de integrais de certas


funções, a saber, a fórmula da mudança de variáveis em integrais e a fórmula de integração
por partes. Também tratamos da fórmula do valor Médio para integrais e a fórmula de
Taylor com resto integral.

Teorema 3.10 (Mudança de variável) Sejam f : [a, b] −→ R contı́nua,


g : [c, d] −→ R derivável, com g 0 integrável e g([c, d]) ⊂ [a, b]. Então
Z g(d) Z d
f (x) dx = f (g(t)) · g 0 (t) dt.
g(c) c

Demonstração. Suponhamos, sem perda de generalidade, que g(c) ≤ g(d). Sendo f


contı́nua, pelo Corolário 3.7, f possui uma primitiva F = f 0 : [a, b] −→ R. Em particular
temos, f |[g(c), g(d)] contı́nua e, consequentemente, F = f 0 : [g(c), g(d)] −→ R. Daı́, segue
imediatamente do Teorema Fundamental do Cálculo que
Z g(d)
f (x) dx = F (g(d)) − F (g(c)). (41)
g(c)

Por outro lado, como g([c, d]) ⊂ [a, b], pela Regra da Cadeia e pelo fato de F = f 0 e g
ser derivável, temos

(F ◦ g)0 (t) = F 0 (g(t)) · g 0 (t) = f (g(t)) · g 0 (t),


82

para todo t ∈ [c, d]. Assim, F ◦ g : [c, d] −→ R é uma primitiva da função integrável
t 7→ f (g(t)) · g 0 (t) e, novamente pelo Teorema Fundamental do Cálculo, temos
Z d
f (g(t)) · g 0 (t) dt = f (g(d)) · g 0 (d) − f (g(c)) · g 0 (c)
c
= (F ◦ g)(d) − (F ◦ g)(c)
= F (g(d)) − F (g(c)). (42)

Logo, por 41 e 42,


Z g(d) Z d
f (x) dx = f (g(t)) · g 0 (t) dt,
g(c) c

o que prova desejado.

Observação 10. No Teorema 3.10, não se exige que, para todo t ∈ [c, d], o ponto
g(t) pertença ao intervalo cujos extremos são g(c) e g(d). Muito menos requer que g seja
monótona. Em compensação, necessita que f seja contı́nua. Na realidade, a demonstração
acima usa apenas que f é integrável e possui uma primitiva. A Proposição 3.6 abaixo,
dar-se um outro enunciado ao Teorema 3.10, no qual admite apenas f integrável mas
estipula que g seja monótona.
Z b Z b
Observação 11. A notação tradicional f (x) dx, em vez de f, encontra uma boa
a Za g(d)
justificativa no Teorema 3.10. Para mudarmos de variável em f (x) dx, tomamos
g(c)
x = g(t). Daı́ a diferencial de x será dx = g 0 (t)dt. Dessa maneira,

c = t ⇒ g(c) = g(t) ⇒ g(c) = x

e
d = t ⇒ g(d) = g(t) ⇒ g(d) = x,

ou seja, quando t assume os valores c e d, x valerá g(c) e g(d) respectivamente. Fazendo


as devidas substituições obtemos,
Z g(d) Z d
f (x) dx = f (g(t)) · g 0 (t) dt.
g(c) c

Proposição 3.6 Seja f : [a, b] −→ R integrável e g : [c, d] −→ R monótona com


derivada g 0 integrável. Se g([c, d]) ⊂ [a, b], então
Z g(d) Z d
f (x) dx = f (g(t)) · g 0 (t) dt.
g(c) c
83

Demonstração. Para fixar as ideias, consideremos g(c) ≤ g(d). Sendo f integrável, pelo
item 1 do Teorema 3.5, dado p ∈ [g(c), g(d)] ⊂ [a, b], f |[g(c), p] e f |[p, g(d)] são integráveis
e consequentemente, também pelo item 1 do teorema 3.5, f |[g(c), g(d)] é integrável. Assim,
Z g(d)
vale f (x) dx. Pondo x = g(t), por g ser derivável, temos dx = g 0 (t)dt, onde dx é a
g(c)
diferencial de x. Além disso, como g é monótona, temos que

c ≤ t ≤ d ⇔ g(c) ≤ g(t) ≤ g(d) ⇔ g(c) ≤ x ≤ g(d).

Diante disso, a medida que x varia entre g(c) e g(d), t varia entre c e d. Logo, fazendo as
devidas substituições, obtemos
Z g(d) Z d
f (x) dx = f (g(t)) · g 0 (t) dt.
g(c) c

Isto prova o desejado.

Teorema 3.11 (Integração por partes) Se f, g : [a, b] −→ R possuem derivadas in-


tegráveis então Z b Z b
0 b
f (t) · g (t) dt = f · g]a − f 0 (t) · g(t) dt,
a a

em que f · g]ba = f (b) · g(b) − f (a) · g(a).


Demonstração. Como f e g são deriváveis então f · g é derivável e, consequentemente,

(f · g) = f 0 g + f g 0 . (43)

Por hipótese f 0 e g 0 são integráveis. Além disso, da derivabilidade de f e g, segue-se do


Teorema 2.20 que elas são contı́nuas e consequentemente, pelo Teorema 3.6, integráveis.
Dessa maneira, integrando ambos os membros em 43, temos
Z b Z b
(f · g)(t) dt = (f 0 g + f g 0 )(t) dt
a a
Z b
= [f 0 (t)g(t) + f (t)g 0 (t)] dt
a
Z b Z b
0
= f (t)g(t) dt + f (t)g 0 (t) dt.
a a
84

Z b
Logo, aplicando o Teorema Fundamental do Cálculo em (f · g)(t) dt, obtemos
a

Z b Z b
0
f (b) · g(b) − f (a) · g(a) = f (t)g(t) dt + f (t)g 0 (t) dt
a a
Z b Z b
0
b
⇒ f · g]a = f (t)g(t) dt + f (t)g 0 (t) dt
a a
Z b Z b
0
⇒ b
f (t) · g (t) dt = f · g]a − f 0 (t) · g(t) dt,
a a

o que prova o desejado.

Teorema 3.12 (Fórmulas de Valor Médio para Integrais) São dadas as funções
f, p : [a, b] −→ R, com f contı́nua. Então:
Z b
A. Existe c ∈ (a, b) tal que f (x) dx = f (c) · (b − a).
a Z b
B. Se p é integrável e não muda de sinal, existe c ∈ [a, b] tal que f (x)p(x) dx =
Z b a

f (c) p(x) dx.


a
C. Se p é positiva, decrescente e possui derivada integrável, então existe c ∈ [a, b] tal
Z b Z c
que f (x)p(x) dx = p(a) f (x) dx.
a a
Demonstração.
A. Sendo f contı́nua, pelo Corolário 3.7, f possui uma primitiva F 0 = f : [a, b] −→ R.
Assim, aplicando o Teorema do Valor Médio (Teorema 2.22) em F , obtemos c ∈ (a, b)
tal que

F (b) − F (a)
= F 0 (c) = f (c) ⇒ F (b) − F (a) = f (c)(b − a). (44)
b−a

Além disso, como f é integrável (por ser contı́nua) e possui uma primitiva, pelo Teorema
Fundamental do cálculo, temos
Z b
f (x) dx = F (b) − F (a). (45)
a

Z b
Logo, por (44)e (45), temos f (x) dx = f (c)(b − a), o que prova A.
a
B. Inicialmente perceba que, para todo x ∈ [a, b], m ≤ f (x) ≤ M, em que m = inf f
e M = sup f. Além disso, como f é contı́nua e [a, b] é compacto, pelo Teorema de
Weierstrass (Teorema 2.18), existem x1 , x2 ∈ [a, b] tais que m = f (x1 ) e M = f (x2 ).
Dessa maneira, supondo p(x) ≥ 0 (a fim de fixar as ideias), temos

m · p(x) ≤ f (x)p(x) ≤ M · p(x),


85

para todo x ∈ [a, b], donde, pelo item 4 do Teorema 3.5,


Z b Z b Z b
m· p(x) dx ≤ f (x)p(x) dx ≤ M · p(x) dx.
a a a

Z b
f (x)p(x) dx
a
Agora, considerando d = Z b
, temos m ≤ d ≤ M e
p(x) dx
a

Z b Z b
f (x)p(x) dx = d p(x) dx. (46)
a a

Analisemos os seguintes casos.


1. Se m < d < M, então f (x1 ) < d < f (x2 ). Assim, pelo Teorema do Valor Intermediário
(Teorema 2.16), existe c ∈ (x1 , x2 ) ⊂ [a, b] tal que f (c) = d, donde, substituindo em 46,
temos Z b Z b
f (x)p(x) dx = f (c) p(x) dx.
a a

2. Se d = m então d = f (x1 ) ∈ [x1 , x2 ] ⊂ [a, b]. Daı́, escrevendo x1 = c e substituindo


em 46, também obtemos
Z b Z b
f (x)p(x) dx = f (c) p(x) dx.
a a

3. Se d = M, analogamente, temos d = f (x2 ) ∈ [x1 , x2 ] ⊂ [a, b], donde, escrevendo


x2 = c e substituindo em 46, detemos
Z b Z b
f (x)p(x) dx = f (c) p(x) dx.
a a

Z b Z b
Logo, em qualquer caso, existe c ∈ [a, b] tal que f (x)p(x) dx = f (c) · p(x) dx. O
a a
caso em que p(x) < 0, procede-se de modo análogo.
Z tEstá provada a tese B.
C. Definamos F : [a, b] −→ R pondo F (t) = f (x) dx. Então F 0 = f e F (a) =
Z a a

f (x) dx = 0. Como F e p possuem derivadas integráveis, podemos integrar por partes,


a
donde, obtemos
Z b Z b Z b
0
p(x)F (x) dx = [p(b)F (b) − p(a) · 0] −
p(x)f (x) dx = p0 (x)F (x) dx
a a a
Z b Z b
⇒ p(x)f (x) dx = p(b)F (b) − p0 (x)F (x) dx. (47)
a a

Agora note que, pelo fato de p ser decrescente, dado um ponto t ∈ [a, b], deve ser p0 (t) ≤ 0.
86

Pois, para todo x ∈ [a, b] − {t}, tem-se

p(x) − p(t)
x ≤ t ⇒ p(x) ≥ p(t) ⇒ ≤ 0,
x−t

uma vez que o numerador e o denominados tem sinais distintos. Daı́,

p(x) − p(t)
lim = p0 (t) ≤ 0,
x→t x−t

e, como p é derivável, temos que p0 não muda de sinal.


Dessa maneira, como F é contı́nua (por ser derivável), p0 integrável (por hipótese) e não
muda de sinal, aplicando o item B à integral do segundo membro da igualdade (47), existe
ξ ∈ [a, b] tal que
Z b Z b
f (x)p(x) dx = F (b) · p(b) − F (ξ) · p0 (x) dx.
a a

Aplicando o Teorema Fundamental do Cálculo na última integral acima, temos


Z b
f (x)p(x) dx = F (b) · p(b) − F (ξ) [p(b) − p(a)]
a
= F (b) · p(b) − F (ξ) · p(b) + F (ξ) · p(a)
= F (b) · p(b) + F (ξ) [p(a) − p(b)]
 
p(a) − p(b) p(b)
= F (ξ) · + F (b) · p(a)
p(a) p(a)
= d · p(a), (48)

p(a) − p(b) p(b) p(a) − p(b) p(b)


em que d = F (ξ) · + F (b) . Pondo α = eβ= , pelo fato
p(a) p(a) p(a) p(a)
de p ser positiva e decrescente, temos que

a ≤ b ⇒ p(a) ≥ p(b) > 0 ⇒ α ≥ 0, β > 0,

donde,

p(a) − p(b) p(b) p(a)


α+β = + = =1
p(a) p(a) p(a)
⇒ 1 − β = α ≥ 0 e 1 − α = β > 0.
87

Supondo, sem perda de generalidade, que F (ξ) ≤ F (b), temos que

F (ξ) ≤ F (b) ⇒ βF (ξ) ≤ βF (b) ⇒ F (ξ)[1 − α] ≤ βF (b)


⇒ F (ξ) − αF (ξ) ≤ βF (b)
⇒ F (ξ) ≤ αF (ξ) + βF (b)
⇒ F (ξ) ≤ d

F (ξ) ≤ F (b) ⇒ αF (ξ) ≤ αF (b) ⇒ αF (ξ) ≤ (1 − β)F (b)


⇒ αF (ξ) ≤ F (b) − βf (b)
⇒ αF (ξ) + βF (b) ≤ F (b)
⇒ d ≤ F (b).

Logo d = α · F (ξ) + β · F (b) pertence ao intervalo cujos extremos são F (ξ) e F (b). Como
F é contı́nua (por ser derivável), pelo Teorema do valor Intermediário (Teorema 2.16),
existe c ∈ (ξ, b) ⊂ [a, b] tal que F (c) = d. Portanto, substituindo essa igualdade em (48),
temos que Z b Z c
f (x)p(x) dx = p(a) · F (c) = p(a) · f (x) dx
a a
Z t
para algum c ∈ [a, b], uma vez que F (t) = f (x) dx para todo t ∈ [a, b]. Isto prova C
a
e, portanto, está demonstrado o Teorema.

No Capı́tulo VIII de Lima (2012) estuda-se, na subseção 4 os Teoremas da


Fórmula de Taylor com restos infinitesimal e na forma de Lagrange. Deduziremos agora
a formulação em que o resto fica expresso em termos de uma integral definida, razão pela
qual recebe o nome “resto integral”.

Lema 3.6 Seja ϕ : [0, 1] −→ R uma função que possui derivada de ordem n+1 integrável
em [0, 1]. Então

1
ϕ00 (0) ϕ(n) (0) (1 − t)n
Z
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + · ϕ(n+1) (t) dt.
2! n! 0 n!

Demonstração. Suponhamos que ϕ : [0, 1] −→ R possua derivada segunda integrável.


Então, pelo Teorema Fundamental do Cálculo, temos
Z 1
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ(1) − ϕ(0) = ϕ(0) + ϕ0 (t) dt.
0

Escrevendo f (t) = 1 − t e g(t) = ϕ0 (t). Então f 0 (t) = −1 e g 0 (t) = ϕ00 (t). Assim, fazendo
88

as devidas substituições, temos


Z 1 Z 1
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (t) dt = ϕ(0) + g(t) dt
0 0
Z 1
= ϕ(0) − −1 · g(t) dt
0
Z 1
= ϕ(0) − f 0 (t)g(t) dt.
0

Aplicando o Teorema de integração por partes (Teorema 3.11), obtemos:


Z 1
ϕ(1) = ϕ(0) − f 0 (t)g(t) dt
0 Z 1 
1 0
= ϕ(0) − f · g]0 − f (t)g (t) dt
0
 Z 1 
0
= ϕ(0) − f (1)g(1) − f (0)g(0) − f (t)g (t) dt
0
Z 1
= ϕ(0) + f (0)g(0) − f (1)g(1) + f (t)g 0 (t) dt.
0

Logo, como temos acima f (t) = 1 − t, g(t) = ϕ0 (t) e g 0 (t) = ϕ00 (t), obtemos
Z 1
ϕ(1) = ϕ(0) + f (0)g(0) − f (1)g(1) + f (t)g 0 (t) dt
0
Z 1
0 0
= ϕ(0) + (1 − 0)ϕ (0) − (1 − 1)ϕ (1) + (1 − t) · ϕ00 (t) dt
0
Z 1
= ϕ(0) + ϕ0 (0) + (1 − t) · ϕ00 (t) dt.
0

Isto mostra que se ϕ possui derivada segunda no intervalo [0, 1] então


Z 1
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + (1 − t) · ϕ00 (t) dt.
0

Suponhamos agora que ϕ possua derivada terceira integrável em [0, 1]. Assim, pelo mos-
trado acima, temos
Z 1
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + (1 − t) · ϕ00 (t) dt. (49)
0

2
(1 − t)
Escrevendo agora f˜(t) = − e g̃(t) = ϕ00 (t), temos f˜0 (t) = 1 − t e g̃(t) = ϕ000 (t),
2
89

donde, substituindo em (49), obtemos


Z 1
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + (1 − t) · ϕ00 (t) dt
Z0 1
= ϕ(0) + ϕ0 (0) + f˜0 (t) · g̃(t) dt.
0

Segue-se novamente do Teorema de integração por partes (Teorema 3.11) que


Z 1
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) +0
f˜0 (t)g̃(t) dt
0 Z 1 
= ϕ(0) + ϕ (0) + f˜(1) · g̃(1) − f˜(0)g̃(0) −
0
f˜(t)g (t)
0
0
Z 1
= 0 ˜ ˜
ϕ(0) + ϕ (0) + f (1)g̃(1) − f (0)g̃(0) − f˜(t)g 0 (t) dt
0
2
(1 − 0)2
   
0 (1 − 1) 00 00
= ϕ(0) + ϕ (0) + − · ϕ (1) − − · ϕ (0) −
2 2
Z 1
(1 − t)2
− − · ϕ000 (t) dt
0 2
Z 1
0 ϕ00 (0) (1 − t)2
= ϕ(0) + ϕ (0) + + · ϕ000 (t) dt.
2 0 2

Diante disso, se ϕ possui derivada terceira no intervalo [0, 1] então vale

1
ϕ000 (0) (1 − t)2
Z
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + + · ϕ000 (t) dt.
2 0 2

Seguindo por indução até a ordem n + 1 temos o resultado desejado. Com efeito, temos
para n = 1 e n = 2 que o resultado é válido, pelo o que acabamos de mostrar acima.
Considerando que ϕ : [0, 1] −→ R possui derivada de ordem n+1 integrável, suponhamos
(como hipótese de indução) que

1
ϕ00 (0) ϕ(n−1) (0) (1 − t)n−1
Z
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + · ϕ(n) (t) dt,
2! (n − 1)! 0 (n − 1)!

(1 − t)n (1 − t)n−1
Tomando p(t) = − e h(t) = ϕ(n) (t), vemos que p0 (t) = e h(t) =
n! (n − 1)!
ϕ(n+1) (t). Assim, substituindo na hipótese de indução acima, obtemos

1
ϕ00 (0) ϕ(n−1) (0)
Z
0
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + p0 (t)h(t) dt.
2! (n − 1)! 0
90

Aplicando o Teorema de integração por partes (Teorema 3.11), temos

ϕ00 (0) ϕ(n−1) (0)


ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ0 (0) + + ··· + + p(1)h(1) − p(0)h(0) +
2! (n − 1)!
Z 1
− p(t)h0 (t) dt
0
ϕ00 (0) ϕ(n−1) (0) (1 − 1)n
 
0
= ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + − · ϕ(n) (1) −
2! (n − 1)! n!
 n
 Z 1 n
(1 − 0) (1 − t)
− − · ϕ(n) (0) − − · ϕ(n+1) (t) dt
n! 0 n!
00 Z 1
0 ϕ (0) ϕ(n−1) (0) ϕ(n) (0) (1 − t)n
= ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + + · ϕ(n+1) (t) dt.
2! (n − 1)! n! 0 n!

Está provado o Lema.

Teorema 3.13 (Fórmula de Taylor com resto integral) Se f : [a, a + h] −→ R


possui derivada de ordem n + 1 integrável então
1
f (n) (a) n (1 − t)n (n+1)
Z 
0
f (a + h) = f (a) + f (a) · h + · · · + ·h + ·f (a + th) dt · hn+1 .
n! 0 n!

Demonstração. Dada f, defina ϕ : [0, 1] −→ R pondo ϕ(t) = f (a + th). Daı́, como

0 ≤ t ≤ 1 ⇔ 0 ≤ th ≤ h ⇔ a ≤ a + th ≤ a + h.

e f possui derivada de ordem n + 1 integrável, ϕ também possui derivada de ordem n + 1


integrável. Além disso, ϕ(1) = f (a + h) e, pela Regra da Cadeia,

ϕ0 (t) = f 0 (a + th)h
ϕ00 (t) = f 00 (a + th)h2
ϕ000 (t) = f 0 (a + th)h3
..
.
ϕ(n) (t) = f (n) (a + th)hn
ϕ(n+1) (t) = f (n+1) (a + th)hn+1 ,

donde, ϕ(k) (0) = f (k) (a + 0 · h)hk = f (k) (a)hk , para k = 1, 2, . . . , n + 1. Diante disso,
91

pelo Lema 3.6, segue que


Z 1
0 ϕ00 (0) ϕ(n) (0) (1 − t)n
f (a + h) = ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + · ϕ(n+1) (t) dt
2! n! 0 n!
(n)
f (a)
= f (a + 0 · h) + f 0 (a) · h + · · · + · hn +
Z 1 n!
(1 − t)n (n+1)
+ ·f (a + th)hn+1 dt
0 n!
Z 1
f (n) (a) n (1 − t)n (n+1)

0
= f (a) + f (a) · h + · · · + ·h + ·f (a + th) dt hn+1 ,
n! 0 n!

o que prova o desejado.

Observação 12. Ao usar a notação [a, a + h], está implı́cito que h ≥ 0. Porém, a mesma
fórmula vale para h < 0, pois a definição de ϕ não leva isto em conta na demonstrção
acima.

Corolário 3.8 Se f : [a, b] −→ R possui derivada de ordem n + 1 integrável então

b
f (n) (a) (b − x)n (n+1)
Z
0
f (b) = f (a) + f (a) · (b − a) + · · · + · (b − a)n + ·f (x) dx.
n! a n!

Demonstração. Com efeito, escrevendo b = a + h (⇔ h = b − a) e x = a + th, tem-se

b − x = a + h − a − th = h − th ⇒ b − x = h − th.

Por outro lado, note que

(1 − t)n · hn+1 dt = (1 − t)n · hn h dt = (h − th)n · h dt = (b − x)n dx


⇒ (1 − t)n · hn+1 dt = (b − x)n dx

e f (n+1) (a + th) = f (n+1) (x).


Além disso, perceba que

0 ≤ t ≤ 1 ⇔ 0 ≤ ht ≤ h ⇔ a ≤ a + ht ≤ a + h
⇔ a≤x≤b

ou seja, quando t varia entre 0 e 1, x varia entre a e b. Logo, aplicando o Teorema 3.13 e
fazendo as devidas substituições, temos
b
f (n) (a) (b − x)n (n+1)
Z
0
f (b) = f (a) + f (a) · (b − a) + · · · + · (b − a)n + ·f (x) dx.
n! a n!

Isto prova o desejado.


92

Observação 13. O Corolário 3.8 dar uma expressão equivalente (ou alternativa) para a
fórmula de Taylor com resto integral.

3.5 A integral como limites de somas

Neste tópico, estudamos uma condição necessária e suficiente para integrabi-


lidade da função f a partir do limite da soma de Riemann, quando a norma da partição
tende a zero.

Definição 3.11 Seja P = {t0 , . . . , tn } uma partição do intervalo [a, b]. Chamaremos
norma de P ao número |P | = maior comprimento ti − ti−1 dos intervalos de P.

Mostraremos inicialmente que a integral superior de uma função limitada f é


o limite das somas superiores S(f ; P ) quando a norma da partição P tende a zero, isto é,
Z b
f (x) dx = lim S(f ; P ),
a |P |→0

bem como, a integral inferior de uma função limitada f é o limite das somas inferiores
s(f ; P ) quando a norma da partição P tende a zero, ou seja,
Z b
f (x) dx = lim s(f ; P ).
a |P |→0

Teorema 3.14 Seja f : [a, b] −→ R uma função limitada. Para todo ε > 0 existe δ > 0
Z b
tal que S(f ; P ) < f (x) dx + ε qualquer que seja a partição P com norma menor do
a
que δ.
Demonstração. Inicialmente, mostremos o caso particular em que f (x) ≥ 0, para todo
Z
x ∈ [a, b]. Com efeito, pelas condições que caracterizam a integral da função f, dado
ε > 0, existe uma partição P1 = {t0 , t1 , . . . , tn } de [a, b] tal que
Z b
ε
S(f ; P1 ) < f (x) dx + . (50)
a 2

Como f é limitada, existe M > 0 tal que |f (x)| ≤ M , para todo x ∈ [a, b]. Tomemos δ
de modo que

ε
δ= > 0, (51)
2M · n

em que M é a constante acima definida e n o número de intervalos de P1 .


93

Afirmamos que, dada uma partição P de [a, b] com |P | < δ, tem-se


Z b
S(f ; P ) < f (x) dx + ε.
a

De fato, seja P = {r0 , . . . , rα−1 , rα , . . . , rm } uma partição arbitrária de [a, b] com


norma menor do que δ. Indiquemos com [rα−1 , rα ] os intervalos de P que estão contidos
em algum intervalo [ti−1 , ti ] de P1 , ou seja, tais que [rα−1 , rα ] ⊂ [ti−1 , ti ], para algum
i fixado. Escreveremos α ⊂ i para significar que [rα−1 , rα ] ⊂ [ti−1 , ti ] e chamemos de
[rβ−1 , rβ ] os intervalos restantes de P que, consequentemente, contém algum ti em seu
interior. Assim, como existem n pontos do tipo ti , há no máximo, n intervalos do tipo
[rβ−1 , rβ ].

Figura 5 – Elementos das partições P e P1

Fonte: Elaborado pelo autor.

Dessa maneira, quando α ⊂ i, temos claramente que Mα ≤ Mi ,


X
(rα − rα−1 ) ≤ ti − ti−1 e Mβ (rβ − rβ−1 ) ≤ M · |P | < M · δ,
α⊂i

em que Mi , Mα e Mβ denotam, respectivamente, os supremos de f em [ti−1 , ti ], [rα−1 , rα ]


e [rβ−1 , rβ ]. Notemos que tais supremos são todos maiores ou iguais a zero, pois assumimos
f ≥ 0. Diante disso,
X
Mα · (rα − rα−1 ) ≤ Mi · (ti − ti−1 )
α⊂i
e
Mβ · (rβ − rβ−1 ) ≤ M · δ.

Assim, como há no máximo n intervalos do tipo [rβ−1 , rβ ],


X X
S(f ; P ) = Mα · (rα − rα−1 ) + Mβ · (rβ − rβ−1 )
α β
n
X
≤ Mi · (ti − ti−1 ) + M · δ · n
i=1
= S(f ; P1 ) + M · δ · n,
94

donde, por (50) e (51),

ε
S(f ; P ) ≤ S(f ; P1 ) + M · δ · n = S(f ; P1 ) + M · ·n
2M · n
ε
= S(f ; P1 ) +
2
Z b
ε ε
< f (x) dx + +
a 2 2
Z b
= f (x) dx + ε,
a

Z b
isto é, S(f ; P ) < f (x) dx + ε. Isto prova o caso particular, onde f (x) ≥ 0, para todo
a
x ∈ [a, b].
Mostremos agora, o caso geral. De fato, sendo |f (x)| ≤ M , temos f (x)+M ≥ 0, para todo
x ∈ [a, b]. Daı́, pondo g(x) = f (x) + M recaı́mos no caso mostrado acima com g(x) ≥ 0.
Agora, perceba que, dada uma partição P = {t0 , . . . , tn }, têm-se, para i = 1, . . . , n, Mi
e Mi + M, respectivamente, como supremos de f e g em cada intervalo [ti , ti−1 ]. Diante
disso, temos

S(g; P ) = (M1 + M )(t1 − t0 ) + (M2 + M )(t2 − t1 ) + · · · + (Mn + M )(tn − tn−1 )


= M1 (t1 − t0 ) + M2 (t2 − t1 ) + · · · + Mn (tn − tn−1 ) +
+M (t1 − t0 ) + M (t2 − t1 ) + · · · + M (tn − tn−1 )
= S(f ; P ) + M (tn − t0 ),

ou seja,
S(g; P ) = S(f ; P ) + M · (b − a),

para qualquer partição P de [a, b] (em particular, para as partições que tem norma menor
do que um certo δ). Além disso, escrevendo A como o conjunto das somas superiores da
função g, é fácil ver que A = B +{M ·(b−a)}, em que B é o conjunto das somas superiores
de f. Segue imediatamente do Lema 3.2 que
Z b Z b
g(x) dx = f (x) dx + M · (b − a).
a a

Logo, pelo caso particular já demonstrado, dado ε > 0, existe um δ > 0 tal que, para
qualquer que seja a partição P com norma menor que δ,
Z b Z b
S(g; P ) < g(x) dx + ε ⇒ S(f ; P ) + M · (b − a) < f (x) dx + M · (b − a) + ε
a a
Z b
⇒ S(f ; P ) < f (x) dx + ε,
a
95

o que prova o desejado.

Corolário 3.9 A integral superior de uma função limitada f : [a, b] −→ R é o limite


das somas superiores S(f ; P ) quando a norma da partição P tende a zero, ou seja,
Z b
f (x) dx = lim S(f ; P ).
a |P |→0

Demonstração. De fato, dado ε > 0, pelo Teorema 3.14, existe δ > 0 tal que
Z b
S(f ; P ) < f (x) dx + ε,
a

sempre que |P | < δ, ou seja,


Z b Z b
|P | < δ ⇒ 0 ≤ S(f ; P ) − f (x) dx < ε ⇒ S(f ; P ) − f (x) dx < ε.
a a

Z b
Portanto f (x) dx = lim S(f ; P ), o que prova este corolário.
a |P |→0

Corolário 3.10 A integral inferior de uma função limitada f : [a, b] −→ R é o limite


das somas inferiores s(f ; P ) quando a norma da partição P tende a zero, ou seja,
Z b
f (x) dx = lim s(f ; P ).
a |P |→0

Demonstração. Basta provar um Teorema de maneira análoga ao Teorema 3.14, enun-


ciado da seguinte maneira:
Seja f : [a, b] −→ R uma função limitada. Para todo ε > 0 existe δ > 0 tal que
Z b
s(f ; P ) > f (x) dx − ε qualquer que seja a partição P com norma menor do que δ.
a
Daı́, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que
Z b
s(f ; P ) > f (x) dx − ε,
a

sempre que |P | < δ, ou seja,


Z b Z b
|P | < δ ⇒ 0 ≤ f (x) dx − s(f ; P ) < ε ⇒ S(f ; P ) − f (x) dx < ε.
a a

Z b
Logo f (x) dx = lim s(f ; P ), como querı́amos demonstrar.
a |P |→0
96

Observação 14. Vale ressaltar, nas demonstrações dos Corolários 3.9 e 3.10, que
Z b Z b
f (x) dx = inf S(f ; P ) e f (x) dx = sup s(f ; P ),
a P a P

o que justifica,
Z b Z b
0 ≤ S(f ; P ) − f (x) dx e 0 ≤ f (x) dx − s(f ; P ),
a a

para qualquer partição P.

Definição 3.12 Seja P = {t0 , . . . , tn } uma partição de [a, b]. Em cada intervalo
[ti−1 , ti ] escolhemos arbitrariamente um ponto ξi . Estes pontos ξi definem uma partição
pontilhada P ∗ de [a, b].

Ou seja, pontilhar uma partição P = {t0 , . . . , tn } é escolher, para cada


i = 1, . . . , n, um ponto ξi tal que ti−1 ≤ ξi ≤ ti . Com esta partição pontilhada P ∗
definimos a soma de Riemann como segue.

Definição 3.13 Seja f : [a, b] −→ R uma função integrável. Definimos a soma de


Riemann por
X n
X

(f ; P ) = f (ξi )(ti − ti−1 ).
i=1

Proposição 3.7 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Então, seja qual for a maneira de
pontilhar a partição P, temos
X
s(f ; P ) ≤ (f ; P ∗ ) ≤ S(f ; P ).

Demonstração. Sendo mi e Mi , respectivamente, o ı́nfimo e o supremo de f em [ti−1 , ti ],


temos que
mi ≤ f (ξi ) ≤ Mi ,

para qualquer i = 1, . . . , n. Assim, multiplicando por ti − ti−1 todos os membros da


desigualdade acima, segue que

mi (ti − ti−1 ) ≤ f (ξi )(ti − ti−1 ) ≤ Mi (ti − ti−1 )


Xn X n n
X
⇒ mi (ti − ti−1 ) ≤ f (ξi )(ti − ti−1 ) ≤ Mi (ti − ti−1 )
i=1 i=1 i=1
X

⇒ s(f ; P ) ≤ (f ; P ) ≤ S(f ; P ),

o que prova o desejado.


97

Definição 3.14 Dada f : [a, b] −→ R limitada, diremos que o número real I é o limite
de (f ; P ∗ ) quando a norma |P | tende para zero, e escreveremos
P

X
I = lim (f ; P ∗ ),
|P |→0

quando, para todo ε > 0, for possı́vel obter δ > 0 tal que | (f ; P ∗ ) − I| < ε, seja qual for
P

a partição pontilhada P ∗ , com |P | < δ.

(f ; P ∗ ) se, e
P
Teorema 3.15 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Existe o limite I = lim
|P |→0
Z b
somente se, f for integrável. No caso afirmativo, tem-se I = f (x) dx.
a
Demonstração. (⇐) Seja f integrável. Pelos Corolários 3.9 e 3.10, temos então
Z b
lim s(f ; P ) = lim S(f ; P ) = f (x) dx.
|P |→0 |P |→0 a

Ora, como f é limitada, pela Proposição 3.7, temos


X
s(f ; P ) ≤ (f ; P ∗ ) ≤ S(f ; P ).

Logo, fazendo |P | tender a zero em todos os membros, pelo Teorema do Confronto (Teo-
rema 2.9), obtemos
X Z b

lim (f ; P ) = f (x) dx.
|P |→0 a

(f ; P ∗ ) e mostremos
P
(⇒) Reciprocamente, suponhamos que exista o limite I = lim
|P |→0
Z b
que f é integrável, com f (x) dx = I.
a
Com efeito, pela Definição 3.12, dado arbitrariamente ε > 0, existe um δ > 0 tal que
X ε X  ε ε
|P | < δ ⇒ (f ; P ∗ ) − I < ⇒ (f ; P ∗ ) ∈ I − , I + , (52)
4 4 4

seja qual for a maneira de pontilhar P. Agora, fixemos uma partição P = {t0 , . . . , tn }
com |P | < δ e a pontilhemos de duas maneiras.
1. Em primeiro lugar, sendo mi = inf f em cada intervalo [ti−1 , ti ], pela definição de
ı́nfimo (Definição 2.7), podemos escolher um ponto ξi no mesmo intervalo tal que

ε
mi ≤ f (ξi ) < mi +
4n(ti − ti−1 )
ε
⇒ f (ξi )(ti − ti−1 ) < mi (ti − ti−1 ) + .
4n
98

Isto nos dará uma partição pontilhada P ∗ tal que


n n
X

X X ε
(f ; P ) = f (ξi )(ti − ti−1 ) < mi (ti − ti−1 ) + n ·
i=1 i=1
4n
ε
= s(f ; P ) + . (53)
4

2. Em segundo lugar, sendo M = sup f em cada intervalo [ti−1 , ti ], pela definição de


supremo (Definição 2.6), podemos escolher um ponto ξi no mesmo intervalo tal que

ε
Mi − < f (ξi ) ≤ Mi
4n(ti − ti−1 )
ε
⇒ Mi (ti − ti−1 ) − < f (ξi )(ti − ti−1 ),
4n

donde, obtemos uma partição pontilhada P # tal que


n n
X
#
X X ε
(f ; P ) = f (ξi )(ti − ti−1 ) > Mi (ti − ti−1 ) − n ·
i=1 i=1
4n
ε
= S(f ; P ) − . (54)
4

Diante disso, por (53) e (54), temos


X ε X ε
(f ; P # ) − < s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) < (f ; P ∗ ) + .
4 4
 ε ε
(f ; P ∗ ) e (f ; P # ) pertencem ao intervalo I − , I +
P P
Daı́, por (52), os números ,
4 4
donde, segue que

ε ε X ε X ε ε ε
I− − < (f ; P # ) − < s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) < (f ; P ∗ ) + < I + +
4 4 4 4 4 4
ε ε
⇒ I − < s(f ; P ) ≤ S(f ; P ) < I +
2 2
ε ε
⇒ S(f ; P ) − s(f ; P ) < I + − I +
2 2
⇒ S(f ; P ) − s(f ; P ) < ε.

Assim, pela equivalência dos itens (1) e (2) do Teorema 3.4, f é integrável. Além disso,
sabemos da Proposição 3.7 que
X
s(f ; P ) ≤ (f ; P ∗ ) ≤ S(f ; P ).

Logo,
X
lim s(f ; P ) ≤ lim (f ; P ∗ ) ≤ lim S(f ; P )
|P |→0 |P |→0 |P |→0
99

Z b Z b 
e portanto, pela integrabilidade de f f (x) dx = f (x) dx e pelos Corolários 3.9
a a
e 3.10, tem-se Z b Z b Z b
f (x) dx ≤ I ≤ f (x) dx ⇒ I = f (x) dx.
a a a

Isto conclui a demonstração.

Proposição 3.8 Seja f : [a, b] −→ R uma função integrável. Dada uma sequência (Pn∗ )
de partições pontilhadas com lim |Pn∗ | = 0, tem-se
n→∞

Z b X
f (x) dx = lim (f ; Pn∗ ).
a n→∞

Z b X
Demonstração. De fato, se f é integrável, pelo Teorema 3.15, f (x) dx = lim (f ; P ∗ ),
a |P |→0
ou seja, de acordo com a Definição 3.12, dado ε > 0, existe um δ > 0 tal que

X Z b

|P | < δ ⇒ (f ; P ) − f (x) dx < ε, (55)
a

seja qual for a partição pontilhada P ∗ . Daı́, se lim |Pn∗ | = 0, então, para o δ > 0 mencio-
n→∞
nado acima, existe um N ∈ N tal que

n ≥ N ⇒ |Pn∗ | < δ,

donde, por (55),

X Z b
n≥N ⇒ |Pn∗ | <δ⇒ (f ; Pn∗ ) − f (x) dx < ε.
a

Z b X
Portanto, f (x) dx = lim (f ; Pn∗ ).
a n→∞

Proposição 3.9 Seja (Pn ) uma sequência de partições de um intervalo [a, b]. Seja qual
for, para qualquer n ∈ N, o pontilhamento realizado em Pn , tem-se

lim |Pn | = 0 ⇒ lim |Pn∗ | = 0.


n→∞ n→∞

Demonstração. De fato, para cada n ∈ N, existem ξβ , ξβ−1 ∈ Pn∗ tais que


|Pn∗ | = ξβ − ξβ−1 em que ξβ ∈ [tβ−1 , tβ ] e ξβ−1 ∈ [tβ−2 , tβ−1 ]. Logo,

|Pn∗ | = ξβ − ξβ−1 ≤ (tβ − tβ−1 ) + (tβ−1 − tβ−2 ) ≤ 2 · |Pn |


⇒ 0 < |Pn∗ | ≤ 2 · |Pn |.
100

Ora, fazendo n → ∞ em todos os membros, pelo Teorema do Confronto para sequências


(Teorema 2.3), obtemos que lim |Pn∗ | = 0. Isto prova o desejado.
n→∞

3.5.1 Exemplos

1
Exemplo 3.14 Consideremos a função f : [1, 2] −→ R, dada por f (x) = . Mostremos
x
que  
1 1 1
lim + + ··· + = log 2.
n→∞ n+1 n+2 2n
Sabemos do exemplo 3.13 que a primitiva da função f é a função log x. Segue-se do
Teorema Fundamental do Cálculo, que
Z 2
dx
= log 2 − log 1 = log 2.
1 x

Agora, para cada n ∈ N, consideremos a partição


   
1 2 n n+1 n+2 2n
Pn = 1, 1 + , 1 + , . . . , 1 + = 1, , , ..., =2
n n n n n n

que consiste em subdividir o intervalo [1, 2] em n subintervalos


 de comprimento
 igual a
1 n+i−1 n+i
. Em seguida, pontilhemos Pn tomando em cada intervalo , o ponto
n n n
n+i
ξi = . Assim, para cada i = 1, . . . , n, temos então
n
 
n+i 1 n 1
f (ξi ) = f = = e ti − ti−1 = .
n n+i n+i n
n

Diante disso, para cada i = 1, . . . , n,

n 1 1
f (ξi )(ti − ti−1 ) = · = .
n+i n n+i

Dessa maneira, a soma de Riemann desta partição pontilhada é, portanto,


n
X X 1 1 1
(f ; Pn∗ ) = f (ξi )(ti − ti−1 ) = + + ··· + .
i=1
n+1 n+2 2n

1
Logo, como, para cada n ∈ N, temos |Pn | = , segue-se que
n
1
lim |Pn | = lim =0
n→∞ n→∞ n
101

e, pela Proposição 3.9, que


lim |Pn∗ | = 0.
n→∞

Concluı́mos então, pela Proposição 3.8, que


Z 2
X
∗ dx
lim (f ; Pn ) =
n→∞ 1 x
 
1 1 1
⇒ lim + + ··· + = log 2.
n→∞ n+1 n+2 2n

Isto prova o desejado.


Seja f : [a, b] → R uma função integrável. Dividindo o intervalo [a, b] em
b−a
n partes iguais de comprimento h = , obtemos a partição Pn = {a, a + h, a +
n
2h, . . . , a + nh = b} com
b−a
h= ⇔ a + nh = b.
n
No exemplo a seguir, a média aritmética dos n números

f (a + h), f (a + 2h), . . . , f (a + nh) = f (b)


n
1X
será indicada pela notação M (f ; n) = f (a + ih) e, além disso, definiremos o valor
n i=1
médio de f no intervalo [a, b] como se segue.

Definição 3.15 Definimos o valor médio de f no intervalo [a, b] como o limite

M (f ; [a, b]) = lim M (f ; n).


n→∞

Exemplo 3.15 (Valor médio de uma função num intervalo) Considerando as es-
pecificações acima, mostremos que o valor médio de f no intervalo [a, b] tem a expressão
Z b
1
M (f ; [a, b]) = f (x) dx.
b−a a

Com efeito, escolhendo, em cada intervalo [ti−1 , ti ] = [a + (i − 1)h, a + ih] da partição


102

Pn , o ponto ξi = a + ih = ti , obtemos uma partição pontilhada Pn∗ tal que

X n
X n
X
(f ; Pn∗ ) =
 
f (ξi )(ti − ti−1 ) = f (a + ih) · a + ih − (a + (i − 1)h)
i=1 i=1
n
X
= f (a + ih) · [a + ih − a − ih + h]
i=1
Xn
= f (a + ih) · h
i=1
n
X b−a
= f (a + ih) ·
i=1
n
n
b−a X
= · f (a + ih).
n i=1

Assim,
n n
1X b−aX
M (f ; n) = f (a + ih) ⇒ (b − a) · M (f ; n) = f (a + ih)
n i=1 n i=1
X
⇒ (b − a) · M (f ; n) = (f ; Pn∗ )
1 X
⇒ M (f ; n) = · (f ; Pn∗ ).
b−a

Daı́, fazendo n → ∞ em ambos os membros da igualdade acima, segue-se que o valor


médio de f no intervalo [a, b] tem a expressão

1 X 1 X
M (f ; [a, b]) = lim (f ; Pn∗ ) = lim (f ; Pn∗ ).
n→∞ b − a b − a n→∞

Logo, pela Proposição 3.8, tem-se


Z b
1
M (f ; [a, b]) = f (x) dx,
b−a a

como querı́amos demonstrar.

Observação 15. Em particular, se f está definida no intervalo [a, a + 1], seu valor médio
nesse intervalo é igual a
Z a+1 Z a+1
1
· f (x) dx = f (x) dx.
(a + 1) − a a a
103

3.6 Caracterização de funções integráveis

Neste tópico, mediante a noção de conjunto de medida nula (segundo Lebes-


gue), caracterizamos as funções integráveis como aquelas cujos pontos de descontinuidade
formam conjuntos que tenham medida nula. Essa maneira de identificar a integrabilidade
de uma função é chamada critério de Lebesgue.

Definição 3.16 Seja X ⊂ R. Diremos que X tem conteúdo nulo (segundo Jordan), e
escreveremos c(X) = 0 quando, para todo ε > 0, for possı́vel obter uma coleção finita de
intervalos abertos I1 , . . . , Ik tal que X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik e a soma dos comprimentos dos
intervalos Ij seja menor do que ε.

Indicando com |I| = b − a o comprimento de um intervalo I cujos extremos


são a e b. Segue imediatamente da Definição 3.16, que c(X) = 0 se, e somente se, para
todo ε > 0, pode-se fazer X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik em que I1 , . . . , Ik são intervalos abertos, com
|I1 | + · · · + |Ik | < ε.
Não é exigido que os intervalos abertos I1 , . . . , Ik sejam disjuntos. Entretanto,
o conjunto aberto I1 ∪ · · · ∪ Ik (por ser uma reunião de conjuntos abertos) pode ser
expresso, de modo único, como uma reunião de intervalos abertos disjuntos J1 , . . . , Jr ,
segundo o Teorema 2.4 (Estruturas dos abertos da reta). Além disso, pode-se constatar
na demonstração do Teorema 2.4 que, para cada x ∈ I1 ∪ · · · ∪ Ik , obtém-se os intervalos
Ji a partir da reunião de uma famı́lia de intervalos abertos que contêm x e estão contidos
em I1 ∪ · · · ∪ Ik . Assim, essa famı́lia só pode ser composta pelos intervalos I1 , . . . , Ik ou
por subintervalos contidos em algum destes citados. Porém, esses subintervalos podem
ser descartados, pois
x ∈ I ⊂ Ij ⇒ x ∈ Ij ,

e I ∪ Ij = Ij . Logo, temos que r ≤ k, pois cada intervalo Ji só pode ser expresso por um
dos I1 , . . . , Ik ou por uma reunião de uma parte deles.
Antes de irmos para o próximo resultado de Lima (2012) (Lema 3.7), lembre-
mos o que é uma função caracterı́stica, e mostremos duas proposições que serão bastantes
úteis na demonstração do lema.

Definição 3.17 Seja B ⊂ R. A cada subconjunto X ⊂ B, associamos a função


ξX : B −→ {0, 1} chamada a função caracterı́stica do conjunto X, dada por

1, se x ∈ X,
ξX (x) =
0, se x ∈
/ X.

Proposição 3.10 Dados X1 , . . . , Xk ⊂ R, com Y = X1 ∪ · · · ∪ Xk , tem-se, para todo


104

x ∈ R,
k
X
ξY (x) ≤ ξXj (x),
j=1

ocorrendo a igualdade somente se os Xj forem dois a dois disjuntos.


Demonstração. De fato, temos dois casos a analisar.
Caso 1. O primeiro é sobre o conjunto dos valores x ∈ R − Y. Donde, para qualquer
x ∈ R − Y, tem-se

x∈
/ Y = X1 ∪ · · · ∪ Xk ⇒ x ∈/ Xj (∀ j = 1, . . . , k)
Xk
⇒ ξY (x) = 0 = ξXj (x)
j=1
k
X
⇒ ξY (x) = ξXj (x).
j=1

Caso 2. Já o segundo, é sobre o conjunto dos valores x ∈ Y ⊂ R. Assim, temos sempre
ξY (x) = 1, fazendo-se necessário analisarmos mais dois casos, particulares ao Caso 2,
como se segue.
Caso 2.1. Se existir pelo menos dois conjuntos Xj e Xl (j 6= l, j, l = 1, . . . , k) tais que
Xj ∩ Xl 6= ∅, podemos encontrar um x ∈ Xj ∩ Xl ⊂ Y, donde, segue-se

k
X
ξXj (x) = 1 = ξXl (x) ⇒ ξY (x) = 1 < 2 ≤ ξXj (x)
j=1
k
X
⇒ ξY (x) < ξXj (x).
j=1

Caso 2.2. Sendo os conjuntos Xj dois a dois disjuntos, temos que, para qualquer x ∈ Y,
o número x pertence a um único Xl . Logo, temos

1, j = l,
ξXj (x) =
6 l,
0, j =

para l = 1, . . . , k. Portanto,

k
X k
X
ξY (x) = 1 = ξXj (x) ⇒ ξY (x) = ξXj (x),
j=1 j=1

o que prova o desejado.


105

Proposição 3.11 Se X é um intervalo então, existem a, b ∈ R tais que


Z b
X ⊂ [a, b] ⇒ ξX (x) dx = |X|.
a

Demonstração. Com efeito, se X é um intervalo, digamos abertos (a fim de fixar as


ideias), então, existem a, b ∈ R tais que X ⊂ [a, b]. Sendo c e d os extremos do intervalo
X, temos que |X| = d − c e a ≤ c < d ≤ b. Assim, dado x ∈ [a, b], tem-se



 0, se x ∈ [a, c],

ξX (x) = 1, se x ∈ (c, d),


0, se x ∈ [d, b].

Logo, ξX (x) é uma função do tipo escada. Segue, portanto, do Exemplo 3.6, que
Z b
ξX (x) dx = 0 · (c − a) + 1 · (d − c) + 0 · (b − d) = |X|.
a

Isto prova o desejado.

Lema 3.7 Sejam I1 , . . . , Ik e J1 , . . . , Jr intervalos abertos, com os Ji dois a dois


disjuntos. Se I1 ∪ · · · ∪ Ik = J1 ∪ · · · ∪ Jr então |j1 | + · · · + |jr | ≤ |I1 | + · · · + |Ik |, ocor-
rendo a igualdade somente quando os Ij forem também dois a dois disjuntos (e portanto
coincidirem com os Ji a menos da numeração).
Demonstração. Note que, sendo os Ji dois a dois disjuntos e [a, b] um intervalo contendo
a reunião Y = I1 ∪ · · · ∪ Ik = J1 ∪ · · · ∪ Jr , usando a Proposição 3.10 (Casos 2.2 e 2.1,
respectivamente), vemos que

r
X k
X
ξJi = ξY ≤ ξIj ,
i=1 j=1

donde, pelo item 4 do Teorema 3.5, vem que

r
Z bX k
Z bX
ξJi ≤ ξIj . (56)
a i=1 a j=1

Por outro lado, pela Proposição 3.11, temos:


Z b Z b
|J1 | + · · · + |Jr | = ξJ1 + · · · + ξJr .
a a

Daı́, aplicando o item 3 do Teorema 3.5 k − 1 vezes no segundo membro da igualdade


106

acima, obtemos:
r
X Z b r
X r
Z bX
|Ji | = [ξJ1 + · · · + ξJr ] ⇒ |Ji | = ξJi .
i=1 a i=1 a i=1

Dessa maneira, aplicando (56) na última igualdade acima, obtemos

r
X r
Z bX k
Z bX
|Ji | = ξJi ≤ ξIj . (57)
i=1 a i=1 a j=1

Ora, de maneira semelhante como fizemos acima, primeiramente aplicando o item 3 do


Teorema 3.5 r − 1 vezes e, em seguida, usando a Proposição 3.11, temos

k
Z bX k Z
X b k
X
ξIj = ξIj = |Ij |. (58)
a j=1 j=1 a j=1

Logo, por (57) e (58), temos


r
X k
X
|Ji | ≤ |Ij |,
i=1 j=1

ou seja, |J1 | + · · · + |Jr | ≤ |I1 | + · · · + |Ik |. Além disso, quando dois intervalos abertos
Ij e Il tiverem um ponto em comum, cairemos no Caso 2.1 da Proposição 3.10 e, então,
P
ξY (x) < ξIj (x), o que resulta no final |J1 | + · · · + |Jr | < |I1 | + · · · + |Ik |. Entretanto,
se os intervalos Ij forem dois a dois disjuntos, cairemos no Caso 2.2 da Proposição 3.10,
P
donde, ξY (x) = ξIj (x), resultando no final |J1 | + · · · + |Jr | = |I1 | + · · · + |Ik |. Portanto,
o lema está demonstrado.

Corolário 3.11 Seja X ⊂ [a, b] um conjunto de conteúdo nulo. Dado ε > 0, existe uma
partição P de [a, b] tal que a soma dos comprimentos dos intervalos de P que contêm
algum ponto de X é menor do que ε.
Demonstração. Com efeito, sendo X ⊂ [a, b] um conjunto de conteúdo nulo, pela
Definição 3.16, dado ε > 0, existem intervalos abertos I1 , . . . , Ik tais que

k
X
I1 ∪ · · · ∪ Ik ⊃ X e |Ij | < ε.
j=1

Ora, como I1 ∪ · · · ∪ Ik é um conjunto aberto (por ser uma reunião de conjuntos abertos),
k
[ [r
pelo Teorema 2.4, podemos escrever, de modo único, Ij = Ji (r ≤ k), em que os
j=1 i=1
107

intervalos abertos Ji são dois a dois disjuntos. Diante disso, pelo Lema 3.7, vem que

r
X k
X r
X
|Ji | ≤ |Ij | < ε ⇒ |Ji | < ε.
i=1 j=1 i=1

Escrevendo, para cada i = 1, . . . , r, Ji = (ai , bi ), Ai = Ji ∩ [a, b] e, consequentemente,


Ai = Ji ∩ [a, b], temos que
 
Ai = max{a, ai }, min{bi , b} e Ai = |Ai | ≤ |Ji |,

pois Ai ⊂ Ji , donde, segue-se que


r
X r
X r
X r
X
Ai = |Ai | ≤ |Ji | < ε ⇒ Ai < ε
i=1 i=1 i=1 i=1

e
 
A1 ∪ · · · ∪ Ar = J1 ∪ · · · ∪ Jr ∩ [a, b] ⊃ X,

pois X ⊂ [a, b] e X ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jr ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jr . Logo, podemos obter uma partição


P = {t0 , t1 , . . . , tn } (r ≤ n ≤ 2r) de [a, b], formada pelos extremos dos intervalos Ai ,
cuja soma de seus comprimentos que contém algum ponto de X é menor do que ε. Isto
prova o desejado.

Os conjuntos de conteúdo nulo gozam das seguintes propriedades, com suas


respectivas demonstrações.

1. Se c(X) = 0, então X é limitado.


Com efeito, se c(X) = 0, pela Definição 3.16, dado ε > 0, podemos obter uma
coleção finita de intervalos abertos I1 , . . . , Ik tal que X ⊂ I1 ∪· · ·∪Ik e |I1 |+· · ·+|Ik | < ε.
Daı́, para cada j = 1, . . . , k, escrevendo Ij = (aj , bj ) e pondo a = min{a1 , . . . , ak } e
b = max{b1 , . . . , bk }, temos que

X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik ⊂ (a, b) ⇒ X ⊂ (a, b).

Portanto, X é limitado.

2. Se c(X) = 0 e Y ⊂ X, então c(Y ) = 0.


De fato, segue imediatamente da Definição 3.16 que, dado ε > 0, existe uma
coleção finita de intervalos abertos I1 , . . . , Ik tal que

Y ⊂ X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik ⇒ Y ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik
108

e |I1 | + · · · + |Ik | < ε. Logo, por definição, c(Y ) = 0.

3. Se c(X1 ) = · · · = c(Xn ) = 0, então c(X1 ∪ · · · ∪ Xn ) = 0;


Por definição, para cada j = 1, . . . , n, dado ε > 0, existe uma coleção finita
ε · kj
de intervalos abertos Ij1 , . . . , Ijkn tal que Xj ⊂ Ij1 ∪ · · · ∪ Ijkj e |Ij1 | + · · · + Ijkj < ,
m
em que m = k1 + k2 + · · · + kn . Assim, temos

X1 ∪ · · · ∪ Xn ⊂ Ij1 ∪ · · · ∪ Ijkn

e, além disso,

ε · k1 ε · kn
|Ij1 | + · · · + Ijkn < + ··· +
m m
k1 + k2 + · · · + kn
= ε·
m
= ε.

Logo, c(X1 ∪ · · · ∪ Xn ) = 0.

4. Se, para cada ε > 0, existem intervalos abertos I1 , . . . , Ik e um subconjunto finito


F ⊂ X, tais que X − F ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik e |I1 | + · · · + |Ik | < ε, então c(X) = 0.
Suponhamos que, dado ε > 0, podemos obter um subconjunto finito F ⊂ X
k
X ε
e intervalos abertos I1 , . . . , Ik tais que X − F ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik e |Ij | < . Então, sendo
j=1
2
F finito (digamos, com p elementos), para cada ri ∈ F, escreveremos
 
ε ε
Ik+i = ri − , ri + ,
4p 4p

em que i = 1, . . . , p. Daı́, teremos

ε ε ε
|Ik+i | = ri + − ri + = ,
4p 4p 2p

donde,
ε ε
|Ik+1 | + · · · + |Ik+p | = p · = .
2p 2
Logo, F ⊂ X, F ⊂ Ik+1 ∪ · · · ∪ In (n = k + p) e X − F ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik implicam em

(X − F ) ∪ F ⊂ I1 ∪ · · · ∪ Ik ∪ Ik+1 ∪ · · · ∪ In
⇒ X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ,
n
X ε ε
em que |Ij | < + = ε. Portanto, c(X) = 0.
j=1
2 2
109

Observação 16. A propriedade 4 acima implica que, na definição de c(X) = 0, po-


derı́amos ter utilizado intervalos fechados, sem alterar o significado do conceito. Pois, de
fato, se X for coberto por um número finito de intervalos fechados, cuja soma dos compri-
mentos é menor do que ε, então os intervalos abertos correspondentes a cada fechado têm
a mesmo valor na soma de seus comprimentos e podem deixar de cobrir no máximo um
subconjunto finito de X formado pelas extremidades de alguns destes intervalos fechados.
Isto nos dá exatamente as hipóteses da propriedade 4 acima.

Em particular, obtemos a recı́proca do Corolário 3.11, como se segue na pro-


posição abaixo.

Proposição 3.12 Seja X ⊂ [a, b]. Se para cada ε > 0, existe uma partição P de [a, b]
tal que a soma dos comprimentos dos intervalos de P que contêm pontos de X é menor
do que ε, então, c(X) = 0.
Demonstração. Dado ε > 0, suponhamos que exista uma partição P = {t0 , . . . , tn }
de [a, b] tal que a soma dos comprimentos dos intervalos de P que contêm pontos de X
seja menor do que ε. Daı́, pondo, para cada j = 0, . . . , n, Ij = (tj , tj+1 ) e escrevendo
F = X ∩ P, vemos que

X ⊂ (I1 ∪ · · · ∪ In ) ∪ F ⇒ X ⊂ (I1 ∪ · · · ∪ In ) ∪ F
⇒ X − F ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In . (59)

Logo, como existe um subconjunto finito F ⊂ X (finito por, também, ser subconjunto
do conjunto finito P ) tal que vale (59) e a soma dos comprimentos dos intervalos Ij que
contém pontos de X é menor do que ε, pela propriedade 4 (sobre conjuntos de conteúdo
nulo), temos c(X) = 0. Isto prova o desejado.

Na Definição 3.7, vimos que a oscilação de uma função limitada f : [a, b] −→ R


no conjunto não vazio X ⊂ [a, b] é dada por

ω(f ; X) = sup f (X) − inf f (X),

ou ainda, pelo Corolário 3.4,

ω(f ; X) = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X}.

Segue imediatamente do Problema 2.4, tem-se

X ⊂ Y ⇒ ω(f ; X) ≤ ω(f ; Y ), (60)

pois para quaisquer x, y ∈ X, temos x, y ∈ Y, donde, |f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − f (y)|.


O objetivo agora é definirmos a oscilação de f num ponto x ∈ [a, b]. Ao fixar
110

x, f e escrevermos, para cada δ > 0, ω(δ) para indicar a oscilação de f no conjunto


(x − δ, x + δ) ∩ [a, b], temos que:
i. se a < x < b e δ ≤ min{x − a, b − x}, então (x − δ, x + δ) ⊂ [a, b] e, consequentemente,

ω(δ) = ω f ; (x − δ, x + δ) ;
ii. se x = a e δ ≤ b − a, então

(x − δ, x + δ) = (a − b + a, a + b − a) = (2a − b, b),

donde,
a < b ⇒ 2a < b + a ⇒ 2a − b < a

e assim,
(2a − b, b) ∩ [a, b] = [a, b) = [a, a + b − a) = [a, a + δ).

Portanto, ω(δ) = ω f ; [a, a + δ) ;
iii. se x = b e δ ≤ b − a, então

(x − δ, x + δ) = (b − b + a, b + b − a) = (a, 2b − a),

donde,
b > a ⇒ 2b > a + b ⇒ 2b − a > b,

o que implica em,

(a, 2b − a) ∩ [a, b] = (a, b] = (b − δ, b] = [a, a + δ).



Logo, ω(δ) = ω f ; (b − δ, b] .
Os três itens acima exprimem que, mantendo sempre f e x fixos, ω(δ) é uma função de δ
definida num intervalo (0, δ0 ). Além disso, ω(δ) é monótona não decrescente, pois dados
δ1 , δ2 ∈ (0, δ0 ), temos que

δ1 < δ2 ⇒ (x − δ1 , x + δ1 ) ⊂ (x − δ2 , x + δ2 )
⇒ (x − δ1 , x + δ1 ) ∩ [a, b] ⊂ (x − δ2 , x + δ2 ) ∩ [a, b],

daı́, por (60), vem que ω(δ1 ) ≤ ω(δ2 ).


Dessa maneira, como f é uma função limitada, então a função δ 7→ ω(δ)
também é limitada e, além disso, monótona não decrescente. Diante disso, conforme o
Teorema 2.10, existe o limite

ω(f ; x) = lim ω(δ) = inf ω(δ) = inf{ω(δ); δ > 0},


δ→0

uma vez que o limite acima tende a zero apenas por valores positivos, fazendo com que
111

esse mesmo limite lateral à direita recaia no limite ordinário. Logo, temos a seguinte
definição:

Definição 3.18 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Definiremos a oscilação de f em um


ponto x de seu domı́nio como

ω(f ; x) = lim ω(δ) = inf ω(δ) = inf{ω(δ); δ > 0}.


δ→0

Proposição 3.13 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Se L(x0 ) e l(x0 ) são respectivamente o


limite superior e o limite inferior da função f em um ponto x0 ∈ [a, b], então

ω(f ; x0 ) = max{l(x0 ), L(x0 ), f (x0 )} − min{l(x0 ), L(x0 ), f (x0 )}.

Demonstração. Como L(x0 ) e l(x0 ) são respectivamente o maior e o menor valor de


aderência de f no ponto x0 (ver Definições 2.17 e 2.18), queremos mostrar que

ω(f ; x0 ) = max{L(x0 ), f (x0 )} − min{l(x0 ), f (x0 )}.

Para isso, para cada δ > 0, escrevamos

Vδ = {x ∈ [a, b]; 0 < |x − x0 | < δ},

lδ = inf f (Vδ ) e Lδ = sup f (Vδ ). Dessa maneira, segue imediatamente do Teorema 2.11
que,
lim Lδ = L(x) e lim Lδ = l(x).
δ→0 δ→0

Por outro lado, para cada δ > 0, tem-se

ω(δ) = sup f (X) − inf f (X),

em que X = Vδ ∪ {x0 }. Daı́, perceba que

sup f (X) = max{Lδ , f (x0 )} e inf f (X) = min{lδ , f (x0 )}.

Diante disso, temos que

ω(f ; x0 ) = lim ω(δ) = lim sup f (X) − lim inf f (X)


δ→0 δ→0 δ→0
= lim max{L(x0 ), f (x0 )} − lim min{l(x0 ), f (x0 )}
δ→0
n o δ→0 n o
= max lim Lδ , lim f (x0 ) − min lim Lδ , lim f (x0 )
δ→0 δ→0 δ→0 δ→0
= max{L(x), f (x0 )} − min{l(x), f (x0 )},
112

como querı́amos demonstrar.

Observação 17. Notemos que se f é contı́nua, então, pelo fato de x0 ∈ [a, b] = [a, b]0 ,
lim f (x) existe e é igual a f (x0 ). Assim, pelo Teorema 2.12, f possui um único valor
x→x0
de aderência e, consequentemente, l(x0 ) = f (x0 ) = L(x0 ). Em particular, com essa pro-
posição, é fácil perceber que f é contı́nua no ponto x0 se, e somente se, l(x0 ) = f (x0 ) =
L(x0 ), ou seja, f é contı́nua no ponto x0 se, e somente se, ω(f ; x0 ) = 0. Contudo, devido
a importância desse resultado, no teorema a seguir, faremos uma demonstração indepen-
dente.

Teorema 3.16 Sejam f : [a, b] −→ R limitada. A fim de que f seja contı́nua no ponto
x0 ∈ [a, b] é necessário e suficiente que ω(f ; x0 ) = 0.
Demonstração. Inicialmente mostremos que é necessário. De fato, supondo que f é
contı́nua no ponto x0 ∈ [a, b], então (por definição), dado arbitrariamente ε > 0, existe
δ0 > 0 tal que, escevendo X = (x0 − δ0 , x0 + δ0 ) ∩ [a, b],

ε ε
x ∈ X ⇒ f (x0 ) − < f (x) < f (x0 ) +
4 4
ε ε
⇒ f (x0 ) − ≤ inf f (X) ≤ sup f (X) ≤ f (x0 ) +
4 4
ε ε
⇒ sup f (X) − inf f (X) ≤ f (x0 ) + − f (x0 ) +
4 4
ε
⇒ sup f (X) − inf f (X) ≤
2
⇒ ω(δ) < ε.

Logo ω(f ; x0 ) = lim ω(δ) = 0, pois, para qualquer ε > 0, podemos obter um δ0 > 0 de
δ→0
modo que
δ ∈ (0, δ0 ] ⇒ ω(δ) < ε.

Agora, mostremos que é uma condição suficiente. Suponhamos que ω(f ; x0 ) = 0. Assim,
por definição (Definição 3.18),

ω(f ; x0 ) = inf{ω(δ); δ > 0} = 0.

Daı́, pela definição de ı́nfimo (Definição 2.7), para todo ε > 0 dado, existe δ > 0 tal que,
pondo (x0 − δ, x0 + δ) ∩ [a, b],

ω(f ; x0 ) ≤ ω(δ) = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X} < ε


⇒ ω(δ) = sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X} < ε
113

e consequentemente, pela definição de supremo (Definição 2.6),

x, y ∈ X ⇒ |f (x) − f (y)| ≤ sup{|f (x) − f (y)|; x, y ∈ X} < ε


⇒ |f (x) − f (y)| < ε.

Em particular,
x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ ⇒ |f (x) − f (x0 )| < ε.

Logo f é contı́nua no ponto x0 . Isto conclui a demonstração.

Definição 3.19 Seja X ⊂ R. Uma função f : X −→ R. diz-se semicontı́nua superior-


mente no ponto a ∈ X quando, para cada ε > 0 dado, pode-se obter δ > 0, tal que

x ∈ X, |x − a| < δ ⇒ f (x) < f (a) + ε.

Diz-se que f é semicontı́nua superiormente quando ela o é em todos os pontos de X.

Mostraremos a seguir que a oscilação x 7→ ω(f ; x) é uma função semicontı́nua


superiormente no intervalo [a, b] e, como consequência disso, algumas propriedades que
a oscilação x 7→ ω(f ; x) carrega.

Teorema 3.17 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Dado x0 ∈ [a, b], para todo ε > 0 existe
δ > 0 tal que
x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ ⇒ ω(f ; x) < ω(f ; x0 ) + ε.

Demonstração. De fato, pela Definição 3.18, temos que

ω(f ; x0 ) = inf{ω(δ); δ > 0}.

Assim, pela definição de ı́nfimo (Definição 2.7), dado ε > 0, existe um δ > 0 tal que

ω(f ; x0 ) ≤ ω(δ) < ω(f ; x0 ) + ε, (61)

ou seja, a oscilação de f no conjunto X = (x0 − δ, x0 + δ) ∩ [a, b] é menor do que


ω(f ; x0 ) + ε. Agora, note que, para cada x ∈ X, tem-se ω(f ; x) ≤ ω(f ; X) = ω(δ), pois
pondo δ0 = min {x − (x0 − δ), (x0 + δ) − x} , vem que

(x − δ0 , x + δ0 ) ⊂ (x0 − δ, x0 + δ) ⇒ (x − δ0 , x + δ0 ) ∩ [a, b] ⊂ X
⇒ X0 ⊂ X,

em que X0 = (x − δ0 , x + δ0 ) ∩ [a, b]. Donde, por 60,

ω(δ) = ω(f ; X) ≥ ω(f ; X0 ) ≥ ω(f ; x),


114

visto que ω(f ; x) é o ı́nfimo das oscilações de f nos conjuntos (x − δ, x + δ) ∩ [a, b] nos
quais X0 faz parte. Logo, para cada x ∈ X, vale ω(f ; x) ≤ ω(δ), donde, segue de (61) que
ω(f ; x) < ω(f ; x0 ) + ε para todo x ∈ X. Em outras palavras, segue de (61) que

x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ ⇒ ω(f ; x) < ω(f ; x0 ) + ε.

Isto prova o Teorema.

Consideraremos nos corolários a seguir uma função f : [a, b] −→ R limitada,


ou seja, nas condições do Teorema 3.17.

Corolário 3.12 Se ω(f ; x0 ) < α então existe δ > 0 tal que

x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ ⇒ ω(f ; x) < α.

Demonstração. Com efeito, se ω(f ; x0 ) < α, então existe ε > 0 tal que ω(f ; x0 ) + ε = α.
Assim, pelo Teorema 3.17, para o ε mencionado, existe δ > 0 de modo que

x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ ⇒ ω(f ; x) < ω(f ; x0 ) + ε = α


⇒ ω(f ; x) < α.

O que prova o desejado.

Corolário 3.13 Para todo α > 0, o conjunto Eα = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) ≥ α} é compacto.
Demonstração. Inicialmente notemos que Eα é limitado, pois Eα ⊂ [a, b]. Assim, resta-
nos mostrar que E é fechado (veja a Definição 2.15).
Com efeito, seja α > 0. Daı́, escrevendo R − E = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) < α}, dado
x0 ∈ R − E, tem-se ω(f ; x0 ) < α. Diante disso, pelo Corolário 3.12, existe δ1 > 0 tal que

x ∈ [a, b], |x − x0 | < δ1 ⇒ ω(f ; x) < α.

Ora, pondo δ = min{x0 − a, b − x0 , δ1 }, vem que

x ∈ (x0 − δ, x0 + δ) ⇒ ω(f ; x) < α,

o que implica em,


(x0 − δ, x0 + δ) ⊂ R − E.

Isto exprime que qualquer x0 ∈ R−E é interior ao conjunto R−E. Dessa maneira, R−E é
aberto e consequentemente, pelo Teorema 2.5, seu complementar E = {x ∈ R; ω(f ; x) ≥
α} é fechado. Logo, como Eα = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) ≥ α} = E ∩ [a, b] é a interseção de
dois conjuntos fechados, pelo Teorema 2.6, Eα é fechado. Portanto, Eα é compacto, como
querı́amos demonstrar.
115

Corolário 3.14 Para todo n ∈ N, seja xn ∈ [a, b] e lim xn = x. Se existir lim ω(f ; xn ) =
n→∞
L, então L ≤ ω(f ; x). Em outros termos: lim ω(f ; xn ) ≤ ω(f ; lim xn ).
1
Demonstração. Suponhamos que seja L > ω(f ; x). Assim, tomando ε = [L − ω(f ; x)] ,
2
temos que

1 1 1
L−ε=L− [L − ω(f ; x)] = L + ω(f ; x)
2 2 2
1 1
= L + ω(f ; x) − ω(f ; x)
2 2
1
= ω(f ; x) + [L − ω(f ; x)]
2
= ω(f ; x) + ε.

Daı́, pelo Teorema 3.17, existe um δ > 0 tal que

y ∈ [a, b], |y − x| < δ ⇒ ω(f ; y) < ω(f ; x) + ε = L − ε.

Assim, sendo lim xn = x, para o δ mencionado acima, existe um n0 ∈ N tal que

n ≥ n0 ⇒ ω(f ; xn ) < L − ε.

Isto significa que lim ω(f ; xn ) 6= L, o que contradiz a hipótese. Portanto, temos necessa-
n→∞
riamente que L ≤ ω(f ; x), conforme o desejado.

Teorema 3.18 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Se ω(f ; x) < ε para todo x ∈ [a, b], então
existe uma partição P de [a, b] tal que ωi = Mi − mi < ε em todos os intervalos [ti−1 , ti ]
da partição.
Demonstração. Seja ε > 0. Se, para todo x ∈ [a, b], vale ω(f ; x) < ε, então, pela
definição de oscilação no ponto (Definição 3.18), dado x ∈ [a, b], tem-se

ω(f ; x) = inf{ω(δ); δ > 0} < ε,

em que ω(δ) = ω (f ; (x − δ, x + δ) ∩ [a, b]) . Daı́, pela definição de ı́nfimo (Definição 2.7),
existe um δ0 > 0 tal que

inf{ω(δ); δ > 0} ≤ ω(δ0 ) = ω (f ; (x − δ0 , x + δ0 ) ∩ [a, b]) < ε.

Ora, para qualquer δ ∈ (0, δ0 ), tem-se

[x − δ, x + δ] ∩ [a, b] ⊂ (x − δ0 , x + δ0 ) ∩ [a, b],


116

donde, por (60),

ω (f ; [x − δ, x + δ] ∩ [a, b]) ≤ ω (f ; (x − δ0 , x + δ0 ) ∩ [a, b]) < ε.

Diante disso, para cada x ∈ [a, b], existe um intervalo aberto Ix = (x − δ, x + δ) tal
que a oscilação de f em Ix ∩ [a, b] = [x − δ, x + δ] ∩ [a, b] é inferior a ε. Assim, pelo
[
Teorema de Borel-Lebesgue (Teorema 2.7), da cobertura [a, b] ⊂ Ix , extraı́mos uma
x∈[a, b]
subcobertura finita [a, b] ⊂ Ix1 ∪· · ·∪Ixk . Os pontos a e b, juntamente com as extremidades
dos intervalos Ixj que pertençam a [a, b], determinam uma partição P = {t0 , . . . , tn }.
Logo, para cada j = 1, . . . , k, escrevendo Ixj = (aj , bj ), temos que, para qualquer ı́ndice
i = 1, . . . , n, existe algum ı́ndice j tal que

max{aj , a} ≤ ti−1 < ti ≤ min{bj , b} ⇒ (ti−1 , ti ) ⊂ Ixj ∩ [a, b]



⇒ ωi = Mi − mi ≤ ω f ; Ixj ∩ [a, b] < ε
⇒ ωi = Mi − mi < ε.

Está provado o teorema.

Lema 3.8 Todo conjunto finito X ⊂ R tem conteúdo nulo.


Demonstração. De fato, para X = ∅ é evidente, pois qualquer conjunto Y de conteúdo
nulo contém o vazio. Logo, pela Propriedade 2 de conjuntos de conteúdo nulo, c(∅) = 0.
Por outro lado, para X 6= ∅, escrevamos X = {x1 ,. . . , xk }. Assim, dado ε > 0, tomemos,
 ε ε
para cada j = 1, . . . , k, Ij = xj − , xj + . Segue-se que,
4k 4k
ε ε 2ε ε
|Ij | = xj + − xj + = = ,
4k 4k 4k 2k

para todo j = 1, . . . , k. Logo,

k
[ ε
X⊂ Ij e |I1 | + · · · + |Ik | = k · <ε
j=1
2k

e, portanto, c(X) = 0. Está provado o lema.

Teorema 3.19 Uma função limitada f : [a, b] −→ R é integrável se, e somente se, para
todo δ > 0, o conjunto Eδ = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) ≥ δ} tem conteúdo nulo.
Demonstração. (⇒) Seja f integrável. Mostraremos inicialmente que c(Eδ ) = 0. De
fato, dados δ > 0 e ε > 0, pela equivalência dos itens 1 e 4 do Teorema 3.4, existe uma
117

partição P = {t0 , . . . , tn } de [a, b] tal que


n
X
ωi · (ti − ti−1 ) < ε · δ. (62)
i=1

Por outro lado, perceba que qualquer intervalo [ti−1 , ti ] de P está contido em [a, b].
Assim, [ti−1 , ti ] ∩ [a, b] = [ti−1 , ti ], o que implica em,

ωi = ω f ; [ti−1 , ti ] ∩ [a, b] ,

em que ωi é a oscilaçãode f no intervalo [ti−1 , ti ]. Diante disso, se um intervalo [t0i−1 , t0i ]


de P contém algum ponto de Eδ em seu interior, digamos x0 ∈ Eδ ∩[t0i−1 , t0i ], então, pondo
δ0 = min{x0 − t0i−1 , t0i − x0 }, tem-se

(x0 − δ0 , x0 + δ0 ) ⊂ [t0i−1 , t0i ] ⊂ [a, b]


⇒ (x0 − δ0 , x0 + δ0 ) ∩ [a, b] = (x0 − δ0 , x0 + δ0 )
⇒ ω(δ0 ) = ω (f ; (x0 − δ0 , x0 + δ0 ) ∩ [a, b]) ,

donde, por (60),

δ ≤ ω(f ; x0 ) = inf{ω(δ); δ > 0} ≤ ω(δ0 ) ≤ ωi0 ⇒ ωi0 ≥ δ,

ou seja, a oscilação de f no intervalo [t0i−1 , t0i ] é maior ou igual a δ. Dessa maneira, se, na
soma n
X
ωi (ti − ti−1 ) < ε · δ,
i=1

em (62), nos restringirmos às parcelas correspondentes aos k (k ≤ n) intervalos que contêm
pontos de Eδ em seu interior, teremos

k
X k
X k
X n
X
δ· (t0i − t0i−1 ) = δ· (t0i − t0i−1 ) ≤ ωi0 · (t0i − t0i−1 ) ≤ ωi (ti − ti−1 ) < ε · δ
i=1 i=1 i=1 i=1
Xk
⇒ δ· (t0i − t0i−1 ) < ε · δ
i=1
Xk
⇒ (t0i − t0i−1 ) < ε. (63)
i=1

Portanto, a soma dos comprimentos dos intervalos de P que contém algum ponto de Eδ
em seu interior é menor do que ε. Além disso, dado x ∈ Eδ , tem-se x ∈ [t0i−1 , t0i ] para
118

algum i = 1, . . . , k, donde, pondo X = {t00 , . . . , t0k }, vem que

k
[ k
[
Eδ ⊂ (t0i−1 , t0i ) ∪ X ⇒ Eδ − X ⊂ (t0i−1 , t0i ). (64)
i=1 i=1

Logo, por (63) e (64), Eδ −X tem conteúdo nulo (ou seja, c(Eδ −X) = 0) e, pelo Lema 3.8,
X também tem (isto é, c(X) = 0). Segue imediatamente da Propriedade 3 de conjuntos
de conteúdo nulo que

c(Eδ ) = c (Eδ − X) ∪ X = 0 ⇒ c(Eδ ) = 0,

ou seja, o conjunto Eδ tem conteúdo nulo.


(⇐) Reciprocamente, seja c(Eδ ) = 0 para todo δ > 0. Mostraremos que f é integrável.
ε
Com efeito, dado ε > 0, tomemos δ = . Daı́, c(Eδ ) = 0 e consequentemente,
2(b − a)
pelo Corolário 3.11, existe uma partição Pλ = {q0 , . . . , qn } de [a, b] tal que a soma dos
0
comprimentos dos intervalos [qi−1 , qi0 ] de Pλ que têm algum ponto pertencente a Eδ é
ε
menor do que , ou seja,
2(M − m)
X ε
(qi0 − qi−1
0
)< ,
2(M − m)
00
em que M = sup f e m = inf f. Por outro lado, os intervalos restantes [qi−1 , qi00 ] de Pλ ,
por não terem pontos pertencentes a Eδ , satisfazem ω(f ; x) < δ para todo elemento x
00
pertencente à qualquer um dos [qi−1 , qi00 ]. Assim, pelo Teorema 3.18, existe uma partição
Pi = {t000 , . . . , t00n } de cada intervalo [qi−1 00
, qi00 ] tal que ωi00 = Mi00 − m00i < δ em todos os
intervalos [t00i−1 , t00i ] da partição Pi . Diante disso, obtemos uma partição
[
P = Pi ∪ Pλ = {t0 , . . . , tn }

que trata-se de um refinamento Pλ , com ωi = Mi − mi < δ nos intervalos que não contêm
P ε
pontos de Eδ e (ti − ti−1 ) < nos intervalos que contêm pontos de Eδ . Dessa
2(M − m)
maneira, relativamente a P, podemos escrever
X X X
ωi · (ti − ti−1 ) = ωi0 (t0i − t0i−1 ) + ωi00 · (t00i − t00i−1 ), (65)

onde [t0i−1 , ti−1 ] são os intervalos de P que contêm pontos de Eδ e [t00i−1 , t00i−1 ] os intervalos
de P que não contêm pontos de Eδ . Então, como
X ε
ωi0 = Mi − mi < M − m e (t0i − t0i−1 ) < ,
2(M − m)
119

segue-se que
X X X
ωi0 · (t0i − t0i−1 ) < (M − m) · (t0i − t0i−1 ) = (M − m) · (t0i − t0i−1 )
ε
< (M − m) ·
2(M − m)
ε
< ,
2

ou seja,
X ε
ωi0 · (t0i − t0i−1 ) < . (66)
2

Além disso, como ωi00 < δ e


P 00
(ti − t00i−1 ) ≤ (b − a), tem-se
X ε ε
ωi00 · (t00i − t00i−1 ) < δ · (b − a) = · (b − a) = . (67)
2(b − a) 2

Logo, por (65), (66) e (67),


X ε ε
ωi · (ti − ti−1 ) < + =ε
2 2

e portanto, pela equivalência dos itens 1 e 4 do Teorema 3.4, f é integrável. Isto conclui
a demonstração.

Para obter a forma definitiva de caracterização das funções integráveis, de-


finiremos agora a noção de conjunto de medida nula segundo Lebesgue e, em seguida,
apresentaremos algumas propriedades que esse conceito dispõe.

Definição 3.20 Diremos que um conjunto X ⊂ R tem medida nula (à Lebesgue) e escre-
veremos m(X) = 0, quando, para todo ε > 0, for possı́vel obter uma coleção enumerável

X
de intervalos abertos I1 , I2 , . . . , In , . . . tais que X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . e |In | < ε.
n=1

Observação 18. Particularmente, como todo conjunto finito é enumerável, se X tem


conteúdo nulo, então X tem medida nula. Em outros termos: c(X) = 0 ⇒ m(X) = 0.

Assim como no conceito de conteúdo nulo, vale destacar as seguintes proprie-


dades inerentes ao conceito de medida nula, com suas respectivas demonstrações.

(1) Se m(X) = 0 e Y ⊂ X, então m(Y ) = 0. Em particular, m(∅) = 0;


De fato, segue imediatamente da Definição 3.20 que, dado ε > 0, existe uma
coleção enumerável de intervalos abertos I1 , . . . , In , . . . tal que

Y ⊂ X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . ⇒ Y ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . .
120


X
e |In | < ε. Logo, por definição, M (Y ) = 0. Em particular, todo conjunto de medida
n=1
nula X contém o conjunto vazio e, portanto, m(∅) = 0.

(2) Se X é compacto e m(X) = 0, então c(X) = 0;


Com efeito, sendo m(X) = 0, pela Definição 3.20, dado ε > 0, existe uma
[
coleção enumerável de intervalos abertos In tal que
n∈N

[ ∞
X
X⊂ In e |In | < ε.
n∈N n=1

Daı́, como X é compacto, pela Forma definitiva do Teorema de Borel-Lebesgue (Teorema


2.8), existe uma subcobertura finita In1 , . . . , Ink tal que

X
X ⊂ In1 ∪ · · · ∪ Ink e |In1 | + · · · + |Ink | ≤ |In | < ε.
n=1

Logo, pela Definição 3.16, c(X) = 0.

(3) Se Y = X1 ∪ · · · ∪ Xn ∪ . . . , onde m(X1 ) = · · · = m(Xn ) = · · · = 0, então m(Y ) = 0.


Em palavras: uma reunião enumerável de conjuntos de medida nula tem medida
nula.
De fato, dado ε > 0 podemos, para cada n, escrever Xn ⊂ In1 ∪ · · · ∪ Inj ∪ . . .

X ε
onde os Inj são intervalos abertos tais que |Inj | < n . Assim,
j=1
2


[ ∞
[ ∞
[
Y = X 1 ∪ · · · ∪ Xn ∪ . . . ⊂ I1j ∪ . . . Inj ∪ . . . = Inj ,
j=1 j=1 n,j=1

e
1 1
∞ X
∞ ∞
ε 2
= ε · 2 = ε.
X X
|Inj | < =ε·
2 n 1 1
n=1 j=1 n=1 1−
2 2
Logo, como uma reunião enumerável de conjuntos enumeráveis é um conjunto enumerável,
existe uma quantidade enumerável de intervalos Inj e portanto, pela Definição 3.20,
m(Y ) = 0.

(4) Se, para cada ε > 0, existem intervalos abertos I1 , . . . , In , . . . e um subconjunto


enumerável E ⊂ X tais que
X
X − E ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . e |In | < ε,
121

então m(X) = 0.
Suponhamos que, dado ε > 0, podemos obter um subconjunto enumerável
E ⊂ X e intervalos abertos I1 , . . . , In , . . . tais que X − E ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . e

X ε
|In | < . Então, sendo E enumerável, para cada ri ∈ E, escreveremos
n=1
2
 ε ε 
Ji = ri − , ri + .
2i+2 2i+2

Daı́, teremos
ε ε 2ε ε
|Ji | = ri + − ri + = = i+1 ,
2i+2 2i+2 2i+2 2
donde,

1 1
n n
ε ε 1 ε 2 ε ε
= · 2 = .
X X
|J1 | + · · · + |Jn | + · · · = lim = · lim = ·
n→∞ 2i+1 2 n→∞ i=1 2i 2 1 2 1 2
i=1 1−
2 2

Diante disso, como E ⊂ X, E ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jn ∪ . . . e X − E ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . , segue que


[ [
X⊂ In ∪ Jn ,
n∈N n∈N

em que
∞ ∞
X X ε ε
|Ij | + |J1 | < + = ε.
j=1 i=1
2 2

Logo, como a reunião de conjuntos enumeráveis é um conjunto enumerável, existem uma


quantidade enumerável de intervalos Ij , Ji e, portanto, tem-se m(X) = 0.

Proposição 3.14 Para que um conjunto X ⊂ R tenha medida nula, é necessário e


suficiente que, para todo ε > 0, exista uma coleção enumerável de intervalos fechados

X
J1 , J2 , . . . , Jn , . . . tal que X ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jn ∪ . . . e |Jn | < ε.
n=1
Demonstração. (⇒) Se m(X) = 0, então, dado ε > 0, existe uma coleção enumerável

X
de intervalos abertos I1 , I2 , . . . , In , . . . tal que X ⊂ I1 ∪ · · · ∪ In ∪ . . . e |In | < ε.
n=1
Tomando, para cada n ∈ N, Jn para ser o fecho de In , temos que cada Jn é um intervalo
fechado e In ⊂ Jn para todo n ∈ N. Logo, X ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jn ∪ . . . e, além disso, |In | = |Jn |,
X∞
donde, |Jn | < ε.
n=1
(⇐) Reciprocamente, se para todo ε > 0 dado arbitrariamente, existe uma coleção enu-
merável de intervalos fechados J1 , J2 , . . . , Jn , . . . tais que X ⊂ J1 ∪ · · · ∪ Jn ∪ . . . e
X∞
|Jn | < ε, então, para cada n ∈ N, pondo In para ser o interior de Jn e E o conjunto
n=1
122

[
das extremidades dos Jn , temos X − E ⊂ In , E enumerável e |In | = |Jn |, donde,
n∈N

X
|In | < ε. Logo, pela Propriedade (4) de conjuntos de medida nula, tem-se m(X) = 0.
n=1
Isto conclui a demonstração.

A Proposição 3.14 nos mostra que ao definirmos conjuntos de medida nula,


poderı́amos ter usado intervalos fechados, sem que isto alterasse o conceito definido com
intervalos abertos.

Lema 3.9 Seja f : [a, b] −→ R limitada. O conjunto dos pontos de descontı́nuidade D


[
da função f é dado por D = Eδ , em que Eδ = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) ≥ δ}, para todo
δ>0
δ > 0.
Demonstração. De fato, dado x ∈ [a, b], pela Definição 3.18, temos

ω(f ; x) = inf{ω(δ); δ > 0},

em que, para todo δ > 0, ω(δ) é a oscilação de f no conjunto X = (x − δ, x + δ) ∩ [a, b].


Por outro lado, pela Definição 3.7, tem-se, para todo δ > 0,

ω(δ) = sup X − inf X ≥ 0,

pois sup X ≤ inf X para qualquer conjunto não vazio e limitado X. Diante disso, 0 é uma
cota inferior do conjunto {ω(δ); δ > 0} e, consequentemente,

ω(f ; x) = inf{ω(δ); δ > 0} ≥ 0,

para todo x ∈ [a, b]. Assim, como, pelo Teorema 3.16, ω(f ; x) = 0 se, e somente se, f
é contı́nua no ponto x, segue-se que o conjunto dos pontos de descontinuidade de f é o
conjunto dos pontos em que ω(f ; x) > 0, ou seja, é o conjunto D expresso pela reunião
[
D= Eδ , em que Eδ = {x ∈ [a, b]; ω(f ; x) ≥ δ}, para todo δ > 0. Em particular, D
δ>0 [
pode ser também expresso pela reunião D = E 1 . Está provado o Lema.
n
n∈N

Teorema 3.20 Para que uma função limitada f : [a, b] −→ R seja integrável, é ne-
cessário e suficiente que o conjunto D dos seus pontos de descontinuidade tenha medida
nula.
Demonstração. (⇒) De fato, se f é integrável então, pelo Teorema 3.19, para cada
n ∈ N, o conjunto E 1 tem conteúdo nulo e, consequentemente, medida nula. Dessa
n
maneira, pelo Lema 3.9, o conjunto D é uma reunião enumerável de conjuntos de medida
[
nula expresso por D = E 1 . Logo, pela Propriedade (3) de conjuntos de medida nula,
n
n∈N
123

podemos concluir que m(D) = 0.


(⇐) Reciprocamente, pelo Lema 3.9, temos
[
D= Eδ .
δ>0

Daı́, para cada δ > 0, tem-se Eδ ⊂ D. Assim, se m(D) = 0, então, pela Propriedade (1)
de conjuntos de medida nula, m(Eδ ) = 0 para todo δ > 0. Segue-se do Corolário 3.13
que Eδ é compacto e consequentemente, pela Propriedade (2) de conjuntos de medida
nula, c(Eδ ) = 0 para todo δ > 0. Logo, pelo Teorema 3.19, f é integrável. Isto conclui a
demonstração.

Corolário 3.15 Se f, g : [a, b] −→ R são integráveis então o produto f · g é integrável.


Se, além disso, f (x) 6= 0 para todo x ∈ [a, b] e 1/f é limitada, então 1/f é integrável.
Demonstração. De fato, sejam Df e Dg o conjunto dos pontos de descontinuidade
das funções f e g, respectivamente. Daı́, pela contrapositiva do Teorema 2.13, a união
Df ∪ Dg representa o conjunto dos pontos em que a função f · g é descontı́nua. Além
disso, sendo f e g integráveis, temos, pelo Teorema 3.20, que os conjuntos Df e Dg têm
medida nula. Logo, pela Propriedade (3) de conjuntos de medida nula, m(Df ∪ Dg ) = 0 e
consequentemente, pelo Teorema 3.20, f · g é integrável. Por outro lado, se f (x) 6= 0 para
todo x ∈ [a, b] e 1/f é limitada, pela contrapositiva do Teorema 2.13, D1/f (o conjunto de
pontos de descontinuidade da função 1/f ) é igual a Df . Portanto, m(D1/f ) = 0 e, como
1/f é limitada, 1/f é integrável, conforme o Teorema 3.20. Isto prova o desejado.

Corolário 3.16 Seja f : [a, b] −→ R limitada. Se o conjunto dos seus pontos de des-
continuidade é enumerável, então f é integrável. Em particular, se existem os limites
laterais de f em cada ponto de [a, b] então f é integrável. Mais particularmente ainda,
se a função limitada f é monótona, então é integrável.
Demonstração. Seja Df = {x1 , . . . , xn , . . .} o conjunto dos pontos de descon-
tinuidade das função f. Dado ε > 0, para cada n ∈ N, existe um intervalo aberto
 ε ε
In = xn − , xn + tal que
4 4
ε
{xn } ⊂ In e |In | = < ε.
2

Assim, cada conjunto unitário {xn } possui medida nula e portanto, pela Propriedade (3)
[
de conjuntos de medida nula, {xn } = Df tem medida nula. Logo, pelo Teorema 3.20,
n∈N
f é integrável. Em particular, se existem os limites laterais de f em cada ponto de [a, b]
então, pela Definição 2.22, f deve admitir apenas descontinuidades de primeira espécie.
Logo, pelo Teorema 2.15, Df é enumerável e, pelo provado acima, f é integrável. Mais
particularmente ainda, se a função limitada f é monótona, então, pelo Teorema 2.14, f
admite apenas descontinuidades de primeira espécie e, portanto, existem os limites laterais
124

de f em cada ponto de [a, b]. Portanto, pelo caso particular anterior, f é integrável. Isto
conclui a demonstração.

3.6.1 Exemplos

Exemplo 3.16 Seja X = Q ∩ [a, b], com a < b. Mostremos que o conjunto enumerável
X (por ser subconjunto do conjunto enumerável Q) se trata de um conjunto que não tem
conteúdo nulo.
Com efeito, se fosse c(X) = 0, então pelo Corolário 3.11, dado ε < b − a, existiria
uma partição P = {a = t0 , . . . , tn = b} de [a, b] tal que a soma dos comprimentos dos
intervalos de P que contém pontos de X seria menor do que ε. Assim, como todo intervalo
não degenerado possui elementos racionais e todo intervalo da partição P está contido
em [a, b], segue-se que os comprimentos dos intervalos de P que contém pontos de X são
todos os intervalos da partição P. Entretanto, a soma dos comprimentos dos intervalos de
tal partição é tal que

(t1 − a) + · · · + (b − tn−1 ) = b − a > ε.

O que é um absurdo, pois supomos que c(X) = 0 e, consequentemente, deverı́amos ter


(t1 − a) + · · · + (b − tn−1 ) < ε. Logo, X deve ser um conjunto que não tem conteúdo nulo.
Em particular, todo intervalo [a, b], não degenerado, também não tem conteúdo
[ k
nulo. Pois, para qualquer cobertura finita de intervalos abertos [a, b] ⊂ Ij , obtemos
j=1
uma partição P, dada pelos extremos dos intervalos da cobertura que intersectam [a, b]
junto com os extremos a, b (caso necessário). Assim, de maneira semelhante ao exemplo
acima, temos que [a, b] não tem conteúdo nulo, porque todos os intervalos da partição
tem elementos de [a, b].

Exemplo 3.17 Seja K ⊂ [0, 1] o conjunto de Cantor. Tem-se aqui um conjunto não
enumerável cujo conteúdo é nulo.
Com efeito, depois da n-ésima etapa da construção do conjunto de Cantor, foram omitidos
125

1
2n−1 intervalos abertos de comprimento cuja soma é dada por
3n

2n−1 2n−1
 
1 2 4 1 2 4
+ + + ··· + n = · 1 + + + · · · + n−1
3 9 27 3 3 3 9 3
"  2  n−1 #
1 2 2 2
= · 1+ + + ··· +
3 3 3 3
n−1  i
1 X 2
= ·
3 i=0 3
 n
2
= 1− ,
3

pois,
 2  n−1  2  3  n
2 2 2 2 2 2 2 2
S =1+ + + ··· + ⇒ S= + + + ··· +
3 3 3 3 3 3 3 3
 n
2 2
⇒ S− S =1−
3 3
 n
1 2
⇒ S =1− ,
3 3

donde,
n−1  i  n
1 X 2 2
· =1− .
3 i=0 3 3

Por outro lado, perceba que após a n-ésima etapa da construção de K, podemos obter uma
partição P de [0, 1] dada pelos os extremos dos intervalos omitidos. Assim, é evidente
que os pontos de K estão contidos nos intervalos de P que não foram omitidos. Ora,
como a soma de todos os comprimentos dos intervalos de P é  1 e, pelo provado acima, a
n
2
soma dos comprimentos dos intervalos não omitidos é 1 − , temos que a soma dos
3
comprimentos dos intervalos de P que contém pontos de K é
 n  n
2 2
1−1+ = .
3 3

Logo, para qualquer ε > 0, pelo fato 


dosnaturais serem ilimitados superiormente, existe
n
2
um n suficientemente grande tal que < ε. Logo c(K) = 0.
3
Observação 19. Vale ressaltar que estamos usando a Observação 16 da propriedade 4
de conjuntos de conteúdos nulos, pois os intervalos da partição com os quais cobrimos K
são fechados.

Observação 20. A fim de entender melhor o conjunto de Cantor e suas caracterizações,


recomendamos consultar: Lima (2012, p. 172), Lima (2014, p. 56) ou Rudin (1976, p.
126

41).

Exemplo 3.18 Temos aqui as variações de algumas funções em cada ponto dos seus
respectivos domı́nios.
(a) Para a função
x
 , se x 6= 0,
f (x) = |x|
0, se x = 0,

tem-se 
0, se x 6= 0,
ω(f ; x) = .
2, se x = 0,

(b) Se 
0, se x ∈ (R − Q) ∪ {0},

g(x) = 1 p
 , se x = é irredutı́vel com q > 0,

q q
então a oscilação é ω(g; x) = g(x), para todo x ∈ R.
(c) Se 
0, x ∈ Q,
h(x) =
1, x ∈ R − Q,

então ω(h; x) = 1, para todo x ∈ R.

Agora justificaremos em cada item acima o porquê dos valores indicados para
as oscilações das respectivas funções.
(a) Perceba que f é contı́nua nos pontos em que x 6= 0, pois f é uma função constante igual
a 1 (respectivamente −1) para valores positivos (respectivamente, para valores negativos)
de x ∈ R. Assim, pelo Teorema 3.16, temos ω(f ; x) = 0, para todo x 6= 0. Por outro
lado, f possui uma descontı́nuidade de primeira espécie no ponto 0, pois lim+ f (x) = 1 e
x→0
lim f (x) = −1, donde, lim sup f (x) = 1 e lim inf f (x) = −1. Segue, da Proposição 3.13,
x→0− x→0 x→0
que
ω(f ; 0) = max{1, 0} − min{−1, 0} = 1 − (−1) = 2.

(b) Seja a ∈ R. Escrevendo g1 := g|Q e g2 := g|R−Q , afirmamos que

lim g1 (x) = 0 e lim g2 (x) = 0.


x→a x→a

Inicialmente mostremos a primeira igualdade. Com efeito, devemos mostrar que dado
ε > 0, existe δ > 0 tal que

x ∈ Q, 0 < |x − a| < δ ⇒ |g1 (x) − 0| < ε,


127

p
ou seja, para 6= a (caso a ∈ Q),
q

p 1 1
∈ (a − δ, a + δ) < δ ⇒ − 0 = < ε.
q q q
 
1
Para isso, consideremos o conjunto finito F = q ∈ N; q ≤ (finito, pois o corpo
ε
ordenado R é arquimediano, donde, N é ilimitado). Indiquemos, para cada q ∈ F, por
mq
mq ∈ Z o maior inteiro tal que mq < a · q, ou seja, < a. Como F é finito, então,
  q
mq
evidentemente, o conjunto Fm = ; q ∈ F é finito e, portanto, existe uma fração
q
m mq m
0
, que representa a maior das frações < a, com q ∈ F. Assim, 0 é a maior fração
q q q
menor do que a, com denominador em F. De maneira semelhante,  indiquemos  por nq ∈ Z
nq mq
o menor inteiro tal que a < . Daı́, como F é finito, Fn = ; q ∈ F também é
q q
n nq
e, consequentemente, existe uma fração 00 , que é a menor das frações tais que a < ,
q q
 q ∈
com F. Logo, com exceção do a (caso a ∈ Q), nenhum número racional
 do intervalo

m n m n
, pode ter denominador em F. Logo, se escrevermos δ = min a − 0 , 00 − a ,
q 0 q 00 q q
veremos que
 
p m n p
∈ , ⊂ (a − δ, a + δ) ⇒ ∈ (a − δ, a + δ)
q q 0 q 00 q
⇒ q∈/F
1
⇒ q>
ε
1
⇒ < ε.
q

Logo, lim g1 (x) = 0.


x→a
Agora, mostremos a segunda igualdade do afirmado. De fato, como g2 (x) = 0 para todo
x ∈ R − Q, dado ε > 0, escolhendo δ = 1, tem-se

x ∈ R − Q, |x − a| < 1 ⇒ |g2 (x) − 0| = |0 − 0| = 0 < ε.

Dessa maneira, lim g2 (x) = 0. Provado o afirmado, segue imediatamente que lim g(x) = 0
x→a x→a
para qualquer a ∈ R. Diante disso, g é contı́nua nos irracionais e no ponto 0, donde, pelo
Teorema 3.16, ω(g; x) = g(x) = 0, para todo x ∈ (R − Q) ∪ {0}. Por outro lado, f é
1
descontı́nua em todos os racionais não nulos, pois g(x) = 6= 0 para todo x ∈ Q − {0}.
q
Entretanto, o limite existe em qualquer ponto desse conjunto, e daı́, 0 é o único valor de
p
aderência de f em qualquer ponto x ∈ Q − {0}. Logo, pela Proposição 3.13, dado x = ,
q
128

p
em que é uma fração irredutı́vel com q > 0, tem-se
q
   
1 1 1 1
ω(g; x) = max 0, − min 0, = − 0 = = g(x).
q q q q

(c) Note que, dado x ∈ R qualquer, para todo δ > 0, tem-se (x − δ, x + δ) ∩ Q 6= ∅ e


(x − δ, x + δ) ∩ (R − Q) 6= ∅. Assim, temos que {ω(δ); δ > 0} é constante igual a 1, pois,
para qualquer δ > 0, escrevendo X = (x − δ, x + δ), tem-se

ω(δ) = sup X − inf X = 1 − 0 = 1,

donde, pela Definição 3.18,

ω(h; x) = inf{ω(δ); δ > 0} = 1,

para todo x ∈ R.
129

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização deste trabalho nos permitiu conhecer um pouco da história e


do surgimento da Análise Matemática, que se estabeleceu com o intuito de aprimorar e
impor mais rigor nos conceito que até então havia no Cálculo. Ao apreciar um pouco
da história da matemática, vemos a importância que essa disciplina tem para a formação
de licenciandos em matemática, no tocante ao conhecimento da origem do pensamento
matemático, das suas etapas de evolução e na obtenção de uma visão aprofundada do
conhecimento matemático que se estuda na Educação Básica, além de beneficiar aqueles
que querem seguir carreira acadêmica.
Assim, a fim de contribuir com o ensino da disciplina no conteúdo de Integral
de Riemann, surgiu a ideia da elaboração deste material para alunos que necessitem de
uma abordagem mais precisa e para professores que desejam adotar em suas disciplinas.
Cabe ressaltar que esse trabalho não tem o intuito de substituir os livros de análise, pois
no nosso ponto de vista, os livros ainda são as melhores fontes de busca e estudo, porém
desejamos que esse material sirva como elemento complementar aos livros e que motive
mais alunos de licenciatura em matemática a estudarem o tema.
O desenvolvimento deste tipo de trabalho possibilita o autor ter uma visão mais
ampla e abrangente acerca da disciplina de Análise Matemática e mais ainda, na teoria
da Integral de Riemann. Dessa maneira, espera-se que esse trabalho também motive
estudantes a fazerem o mesmo nas demais teorias. Portanto, através da metodologia
aplicada e ao entregar esse material para publicação, concluı́mos que cada objetivo deste
trabalho foi alcançado e deseja-se que o mesmo sirva como fonte de informação e muito
estudo para leitores interessados em se aprofundar e entender mais sobre o assunto.
130

REFERÊNCIAS

ÁVILA, Geraldo. Introdução à Análise Matemática. 2. ed. São Paulo: Edgard


Blucher, 1999. 254 p.

ÁVILA, Geraldo. O Ensino do Cálculo e a Análise. Matemática Universitária, Rio


de Janeiro, n. 33, p. 83–95. dez. 2002. Disponı́vel em:
https://rmu.sbm.org.br/wp-content/uploads/sites/27/2018/03/n33 Artigo05.pdf.
Acesso em: 15 fev. 2021.

BOYER, Carl Benjamin. História da Matemática. Tradução: Elza F. Gomide. São


Paulo: Edgard Blucher, 1974. 488 p.

FIGUEIREDO, Djairo Guedes. Análise I . 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1996. 266 p.

GIL, Antônio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4. ed. São Paulo:
Atlas, 2002.

GUIDORIZZI, Hamilton Luiz. Um curso de Cálculo. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC,


2008. 635 p.

LIMA, Elon Lages. Curso de Análise. 14. ed. Rio de Janeiro: Associação Instituto
Nacional de Matemática Pura e Aplicada, 2012. 431 p.

LIMA, Elon Lages. Análise Real: funções de uma variável. 12. ed. Rio de Janeiro:
IMPA, 2014. 198 p.

RUDIN, Walter. Principles of Mathematical Analysis. 3. ed. New York:


McGraw-Hill, 1976. 352 p.

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