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Ministério da Educação

Universidade Federal do Oeste da Bahia


Centro das Humanidades - CEHU

Welber Costa Possidoneo de Souza

UMA RESENHA DE: COMO AS DEMOCRÁCIAS MORREM

LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro:


Zahar, 2018.

Steven Levitsky é professor de Ciência Política na Universidade Harvard. A


pesquisa de Levitsky se concentra na América Latina e no mundo em desenvolvimento.
É autor de Competitive Authoritarianism, tendo recebido diversos prêmios por
excelência no ensino. Daniel Ziblatt é professor de Ciência Política na Universidade
Harvard estuda a Europa do século XIX aos dias de hoje. Publicou, mais recentemente,
Conservative Parties and the Birth of Democracy. Tanto Levitsky quanto Ziblatt
colaboram para publicações como The New York Times e Vox.
Os renomados professores da Faculdade de Governo e Ciências Políticas da
Universidade de Harvard, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, conceberam uma obra
essencial e fluida que explora minuciosamente o atual panorama político global.
Especialistas em democratização, partidos políticos e colapsos democráticos, os autores
abordam em "Como as democracias morrem" os elementos que caracterizam a
decadência dos regimes democráticos. A atual ascensão desses cenários e a premente
necessidade de compreendê-los conferem a esta obra uma relevância inquestionável. A
fluidez excepcional do texto deriva da abordagem didática adotada pelos autores,
tornando acessíveis temas que, de outra forma, seriam considerados complexos. Mesmo
para aqueles não familiarizados com o intricado espectro dos assuntos políticos, o texto
mantém-se envolvente e descomplicado. Levitsky e Ziblatt apresentam esses tópicos
através de metáforas e analogias, facilitando a assimilação. Ao frequentemente
retornarem a exemplos de líderes autoritários, os autores oferecem uma visão
abrangente dos regimes discutidos, mesmo para leitores não habituados aos governos
analisados.
Logo no primeiro capítulo intitulado "Alianças Fatídicas", os autores mergulham
nas complexidades que cercam a fragilidade das democracias, sugerindo uma
provocante teoria sobre a conexão entre a morte democrática e as alianças
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comprometedoras. A tese central propõe que democracias podem perecer quando líderes
democraticamente eleitos, em busca de apoio político ou para alcançar objetivos
imediatos, formam alianças improváveis e perigosas com forças anti-democráticas. Este
fenômeno, segundo os autores, desencadeia um processo de erosão gradual, corroendo
os fundamentos essenciais da democracia. Ao longo das páginas, os autores exploram
meticulosamente exemplos históricos e contemporâneos, iluminando a trajetória sinuosa
que tais alianças podem seguir e a ameaça iminente que representam para a saúde das
democracias. Revelam como líderes, muitas vezes em uma busca desenfreada por poder
ou por necessidades políticas momentâneas, podem inadvertidamente abrir as portas
para a subversão de princípios democráticos fundamentais. A obra não apenas teoriza,
mas desce às entranhas de casos ao redor do globo, oferecendo uma análise aprofundada
sobre os padrões e dinâmicas que conduzem à fragilidade e ao declínio institucional.
No segundo capítulo de "Como as Democracias Morrem", intitulado "Guardiões
da América", Steven Levitsky e Daniel Ziblatt abordam a importância dos guardiões
institucionais e culturais na preservação da democracia nos Estados Unidos. Os autores
ressaltam a relevância histórica das instituições e da cultura política na sustentação da
democracia, identificando os "Guardiões da América" como figuras que
desempenharam historicamente um papel crucial na defesa das normas democráticas.
Ao examinarem episódios históricos e destacarem o papel desses guardiões, como
partidos políticos, mídia e sociedade civil, Levitsky e Ziblatt iluminam a
vulnerabilidade da democracia frente aos desafios contemporâneos. Apesar da
profundidade da análise, algumas críticas podem ser apontadas, especialmente em
relação à possível falta de ênfase na globalização e nas mudanças socioeconômicas
como fatores impactantes na democracia. Além disso, embora o livro ofereça uma
análise aprofundada da situação nos Estados Unidos, a aplicabilidade de algumas
conclusões a contextos globais diversos pode ser motivo de questionamento.
Nos dois capítulos subsequentes, os autores apresentam exemplificações de
líderes políticos oriundos de diversas nações, todos os quais se enquadram nos critérios
delineados pelo mencionado checklist. Nesse contexto, eles detalham a decadência
democrática em países como Bélgica, Finlândia, Chile e Venezuela, destacando a
ascensão de demagogos por meio de processos constitucionais. Dessa maneira, os
esforços dos autores concentram-se na análise da separação entre democracia e ordem
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constitucional, um tema previamente abordado na obra "Competitive Authoritarianism:


Hybrid Regimes after the Cold War" (LEVITSKY, 2010) que foi citado no início desta
resenha.
Os últimos capítulos abordam o primeiro ano do governo Trump e a
desintegração de normas democráticas, a qual permitiu a tentativa ou ascensão ao poder
de outsiders que desafiam a continuidade do regime democrático. Os autores destacam,
aqui, o papel das instituições informais na prevenção desse cenário. Enfatizam a
importância de pilares democráticos, como a tolerância mútua entre os adversários
políticos e a reserva institucional, que seria uma subutilização do poder, ou seja, evitar
ações que, mesmo dentro da lei, extrapolem os limites da civilidade e do jogo limpo
democrático.
É crucial ressaltar que, ao longo da narrativa, a classe trabalhadora figura de
forma periférica. Esse posicionamento decorre da percepção de que a verdadeira
salvaguarda contra aspirantes autoritários não repousa exclusivamente no engajamento
da população com princípios democráticos, mas, primordialmente, na atuação dos
"guardiões da democracia": os partidos políticos e as elites governantes. Portanto,
incumbe a esses guardiões a responsabilidade de uma ação concertada, visando isolar e
derrotar potenciais demagogos, mediante a construção de uma frente unida de oposição.
Neste contexto, torna-se essencial reconhecer a necessidade de fortalecer não apenas a
consciência democrática da sociedade, mas também a capacidade de discernimento e
vigilância exercida pelos estratos políticos e lideranças. A efetividade desse esforço
coordenado reside na habilidade dos guardiões em antecipar e neutralizar quaisquer
ameaças à ordem democrática, consolidando uma resistência sólida e coesa contra
tentativas autoritárias.
Assim, o chamado é para que os guardiões da democracia assumam não apenas a
função de defensores, mas também de construtores ativos de uma sociedade
democrática robusta, onde a participação cidadã se entrelace com a liderança política
para forjar uma união capaz de preservar os valores fundamentais da democracia e
resistir a investidas autocráticas. s autores ressaltam que a ascensão de Trump à
candidatura foi possibilitada não apenas pela influência dos cidadãos comuns, mas
também pela dinâmica complexa de descontentamento social e econômico, que
encontrou terreno fértil para prosperar mesmo sem o apoio do establishment político.
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Neste cenário, as elites políticas norte-americanas perderam não apenas sua


função tradicional de guardiãs democráticas, mas também revelaram fissuras e
desconexões profundas com a base, abrindo espaço não apenas para a ascensão de
Trump, mas para um questionamento mais amplo do sistema político vigente.
Apesar das críticas incisivas de Levitsky e Ziblatt ao governo Trump, seu livro
se destaca não apenas pela análise imparcial, mas também pela capacidade de
transcender o viés ideológico. Ao explorarem exemplos de líderes autoritários, tanto
progressistas quanto conservadores, os autores enfatizam as características
antidemocráticas desses políticos, destacando a importância de uma abordagem
desapaixonada na avaliação das ameaças à democracia.
Assim, a obra não apenas oferece uma perspectiva crítica do passado recente,
mas também serve como um chamado à reflexão sobre as fragilidades democráticas e a
necessidade de um engajamento cidadão mais profundo e informado para fortalecer as
instituições democráticas frente a potenciais desafios autoritários no futuro.
Em linhas gerais, "Como as Democracias Morrem" ressalta de maneira
impactante a vulnerabilidade das democracias modernas, sublinhando a
indispensabilidade da salvaguarda das normas democráticas e instituições robustas
como anteparo contra o declínio democrático. Os autores proporcionam perspectivas
esclarecedoras acerca dos obstáculos que as democracias contemporâneas precisam
superar, ao mesmo tempo em que alertam para indicadores sutis de erosão que
demandam vigilância e ação imediata. Este trabalho não apenas aponta os perigos
iminentes, mas também fornece um chamado à ação, incentivando um
comprometimento contínuo com os valores fundamentais que sustentam o tecido
democrático, visando a construção de uma sociedade mais resiliente e inclusiva.
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REFERÊNCIAS:

Anderlany Aragão dos Santos. Fri, 04 Feb 2022 in Antropolítica - Revista


Contemporânea de Antropologia. Disponível em:
https://periodicos.uff.br/antropolitica/article/view/42042/31088#citations Acesso em:
27/11/2023

R FERRAZ. Steven Levitsky: por que este professor de Harvard acredita que a
democracia brasileira está em risco: BBC News Brasil, São Paulo, 2018. Acesso em:
27/11/2023

STREECK, W. Tempo Comprado: a crise adiada do capitalismo democrático. São


Paulo: Boitempo, 2018. Acesso em: 28/11/2023

WEYLAND, K. Neoliberalism and Democracy in Latin America: a mixed record. Latin


American Politics and Society, v. 46, n. 1, p. 135-157, Spring 2004. Acesso em:
29/11/2023

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