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14.

DOENÇAS DO SISTEMA GÊNITO-URINÁRIO QUE PODEM


ESTAR RELACIONADAS COM O TRABALHO

I. Síndrome Nefrítica Aguda (N00)


II. Doença Glomerular Crônica (N03.-)
III. Nefropatia Induzida por Metais Pesados (N14.3)
IV. Insuficiência Renal Aguda (N17)
V. Insuficiência Renal Crônica (N18)
VI. Cistite Aguda (N30.0)
VII. Infertilidade Masculina (Relacionada com o Trabalho) (N46)

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.I

Doença: “SÍNDROME NEFRÍTICA AGUDA” (Relacionada com o


Trabalho)
Código CID-10: N00.- Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
A Síndrome Nefrítica Aguda é caracterizada patologicamente por alterações inflamatórias difusas no
glomérulo, e clinicamente, pelo início abrupto de hematúria e proteinúria leve e, freqüentemente,
hipertensão, edema e azotemia.

As alterações que clinicamente a caracterizam, vão desde a hematúria assintomática (cerca de 50%
dos pacientes) e proteinúria leve, até formas exuberantes de nefrite, com hematúria franca ou
microscópica (urina cor de Coca-Cola, até presença de sangue), proteinúria franca, oligúria, edema,
hipertensão e insuficiência renal.

Intoxicações agudas por hidrocarbonetos alifáticos halogenados podem causar lesão aguda do fígado
e dos rins, sendo que o efeito predominante depende da via de absorção. Geralmente, a inalação
leva a efeitos predominantemente renais.

Manifestações renais geralmente aparecem sete a 10 dias após as manifestações sistêmicas da


intoxicação aguda (acometimento do sistema nervoso central).

Ocorre comprometimento da função renal associado a diminuição do débito urinário (por efeito tóxico
em nível de túbulos renais) que geralmente vem acompanhada de uma síndrome hemorrágica com
hematúria macroscópica.

O diagnóstico é feito através dos exames de urina de rotina e de exames que avaliam a função renal.

Em relação ao quadro causado pelos hidrocarbonetos alifáticos halogenados, constituem elementos


chaves para o estabelecimento de nexo com o trabalho os seguintes:
- História de exposição ocupacional a hidrocarbonetos alifáticos halogenados (especialmente o
tetracloreto de carbono);
- História de intoxicação aguda recente (7-10 dias);
- Aparecimento de comprometimento da função renal associado a hematúria e proteinúria.

Embora não patognomônico, os halogenados causam graus elevados de hematúria e proteinúria, não

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vistos em outras causas de insuficiência renal aguda induzida por toxinas.

O diagnóstico diferencial é feito com as glomerulonefrites agudas. A relação entre a exposição


crônica a solventes e desenvolvimento de glomerulonefrite ainda está por ser estabelecida.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
A Síndrome Nefrítica é a forma de apresentação de uma grande variedade de doenças renais,
especialmente as glomerulonefrites e vasculites, e a incidência na população reflete a incidência de
cada uma destas patologias. O protótipo de uma síndrome nefrítica aguda é a glomerulonefrite pós-
estreptocócica.

A intoxicação ocupacional aguda por solventes, especialmente os hidrocarbonetos alifáticos


halogenados, pode cursar com quadro de síndrome nefrítica aguda. Destes hidrocarbonetos, o
tetracloreto de carbono (CCl4) é o composto mais freqüentemente responsável por este quadro.

Já exposição crônica a solventes parece estar relacionada com o desenvolvimento de


glomerulonefrite, geralmente associada à presença de anticorpos anti-membrana basal glomerular ou
na presença de uma síndrome de Goodpasture.

Em trabalhadores expostos a estes produtos químicos, a síndrome nefrítica aguda, com as


características acima descritas, e excluídas outras causas não ocupacionais, deve ser considerada
como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling, isto é, “doença
profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação” constituem causa necessária. Se não ocorresse a
exposição ocupacional, seria improvável que esta doença, com as características descritas,
ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o

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ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,


SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “síndrome nefrítica aguda”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia da gravidade,
das repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção, como o esquema que se apresenta a seguir:

 Classe 1: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 75-90 L/24 hs (52-62,5 mL/min); ou sintomas e sinais intermitentes de
disfunção do tratato urinário superior estão presentes, os quais não requerem tratamento
contínuo ou vigilância.

 Classe 2: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo

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clearance de creatinina de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja maior que 75 L/24 hs (52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do trato
urinário superior necessitam de vigilância contínua e tratamento freqüente.

 Classe 3: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior estão incompletamente controlados por tratmento cirúrgico ou tratamento médico
contínuo.

 Classe 4: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina inferior a 40 L/24 hs (28 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior persistem a despeito de tratamento cirúrgico ou tratamento médico contínuo.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional

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 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.II

Doença: “DOENÇA GLOMERULAR CRÔNICA” (Síndrome Nefrítica


Crônica) (Relacionada com o Trabalho)
Código CID-10: N03.- Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
O termo Doença Glomerular Crônica expressa uma variedade de doenças glomerulares que possuem
curso crônico, com declínio progressivo da função renal. Representa o estágio evolutivo de qualquer
das doenças glomerulares, previamente ao desenvolvimento da doença renal terminal.

A glomerulonefrite provocada pela exposição crônica ao mercúrio é secundária a depósitos de


imunocomplexos circulantes na membrana basal glomerular.

A lesão tecidual é conseqüente a eventos envolvendo ativação de complemento e liberação de


substâncias quimiotáxicas, provocando recrutamento de leucócitos com liberação de enzimas
proteolíticas, alterações funcionais e morfológicas da membrana basal e podendo haver proliferação
de células mesangiais, endoteliais e epiteliais.

A perda protéica na urina pode levar ao aparecimento de edema. Estes casos podem também cursar
com hiperlipidemia (hipercolesterolemia) e aterosclerose acelerada.

Nos casos causados pelo exposição ao mercúrio, o paciente pode apresentar sinais/sintomas de
“mercurialismo crônico”, também conhecido por “hidrargirismo crônico”.

Nos estágios iniciais a doença glomerular crônica pode ser diagnosticada de forma precisa pela
biópsia renal e, ocasionalmente, tratada com êxito. Nos pacientes crônicos, com rins hipotrofiados e
depuração da creatinina inferior a 15mL/min, as alterações à biópsia renal raramente fazem o
diagnóstico, e a reversibilidade dos danos renais é pequena.

A biópsia do rim pode mostrar glomérulos hipo ou acelulares, escleróticos e freqüentemente


substituídos por material colágeno, além de atrofia tubular, fibrose intersticial e infiltrados celulares
generalizados.

O mercúrio pode ser identificado nas células dos túbulos proximais, e este achado, juntamente com
proteinúria e glomerulopatia membranosa, é fortemente sugestivo de lesão renal induzida pelo

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mercúrio.

A expressão clínica típica do dano renal causado pela exposição crônica ao mercúrio é uma
proteinúria do tipo glomerular (albuminúria), isolada ou fazendo parte de uma síndrome nefrótica
(proteinúria > 3,5g/dia) característica.

Proteinúria tubular (excreção de 2-microglobulina) não é característica de exposição crônico ao


mercúrio, mas já foi descrita, juntamente com o encontro de antígenos e enzimas renais (N-acetil--
glucosaminidase) na urina, ambos sugerindo um dano em nível tubular.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
Cerca de 60% de todos os casos de doença renal terminal são o resultado de alguma forma de
glomerulopatia crônica.

A exposição de longo prazo a doses relativamente baixas de mercúrio pode produzir lesão renal
glomerular. Exposições intensas, “agudas”, produzem necrose das células tubulares proximais.

Portanto, em trabalhadores ocupacionalmente expostos a vapores de mercúrio, a doença glomerular


crônica, com as características acima descritas, e excluídas outras causas não ocupacionais, deve
ser considerada como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling,
isto é, “doença profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação” constituem causa necessária. Se
não ocorresse a exposição ocupacional, seria improvável que esta doença, com as características
descritas, ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o

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“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,


SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “doença glomerular crônica”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia da
gravidade, das repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção, como o esquema que se apresenta a seguir:

 Classe 1: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 75-90 L/24 hs (52-62,5 mL/min); ou sintomas e sinais intermitentes de
disfunção do tratato urinário superior estão presentes, os quais não requerem tratamento
contínuo ou vigilância.

 Classe 2: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja maior que 75 L/24 hs (52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do trato

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urinário superior necessitam de vigilância contínua e tratamento freqüente.

 Classe 3: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior estão incompletamente controlados por tratmento cirúrgico ou tratamento médico
contínuo.

 Classe 4: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina inferior a 40 L/24 hs (28 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior persistem a despeito de tratamento cirúrgico ou tratamento médico contínuo.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que

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o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.III

Doença: “NEFROPATIA INDUZIDA POR METAIS PESADOS”


(Relacionada com o Trabalho)
Código CID-10: N14.3 Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
A designação Nefropatia Túbulo-intersticial Induzida por Metais Pesados descreve um grupo de
distúrbios agudos e crônicos, que acometem primariamente os túbulos e o interstício renais, sendo
causados por metais pesados.

O quadro clínico da nefropatia túbulo-intersticial pode variar desde alterações discretas em exames
laboratoriais até quadros como a insuficiência renal aguda oligúrica e não-oligúrica. Pode ainda
progredir para insuficiência renal crônica.

A lesão renal causada pelo cádmio geralmente manifesta-se por proteinúria tubular (2-
microglobulina), glicosúria, aminoacidúria, fosfatúria e diminuição da capacidade de acidificar a urina.
A prevalência de litíase renal é maior em trabalhadores expostos ao cádmio do que na população
geral.

A intoxicação aguda pelo chumbo produz efeitos tubulares semelhantes ao do cádmio, geralmente
reversíveis. O quadro crônico caracteriza-se por comprometimento da função renal, hipertensão
arterial, hiperuricemia e, freqüentemente, “gota saturnina”..

O quadro de intoxicação aguda pelo mercúrio caracteriza-se por aparecimento de anúria que
geralmente desenvolve-se em 24hs e dura cerca de nove dias. Azotemia elevada pode perdurar por
80 dias e é acompanhada de distúrbios hidro-eletrolíticos e proteinúria (<1g/dia).

Deve-se estar atento a outros sinais de intoxicação por metais pesados.

O diagnóstico das nefropatias túbulo-intersticiais pode ser feito pelos achados laboratoriais. A biópsia,
que define o diagnóstico, raramente é necessária.

Muitos destes metais podem ser dosados no sangue e/ou na urina, o que serve para indicar
exposição/absorção excessiva, compatível com efeitos adversos sobre a saúde. A Norma
Regulamentadora 7, do Ministério do Trabalho disciplina os exames laboratoriais para monitorização
biológica e controle médico da Saúde Ocupacional, que no caso dos metais pesados, inclui o cádmio
(dosagem na urina), chumbo (dosagem no sangue e na urina), mercúrio inorgânico (na urina)

9
O diagnóstico deve ser feito com as nefropatias túbulo-intersticiais por outras causas, tóxicas ou não.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
Estima-se que as doenças túbulo-intersticiais (por todas as causas) são responsáveis por cerca de
30% dos casos de doença renal terminal.

As nefropatias tóxicas de origem não ocupacional são relativamente comuns, destacando-se as


causadas por antibióticos (aminoglicosídeos, sulfonamidas, anfotericina B, polimixina, bacitracina,
rifampina, cefaloridina, meticilina, ácido aminossalicílico, pentamidina, etc.); agentes biológicos e
botânicos (venenos de serpentes, toxinas de aranhas, insetos, aflotoxinas, etc.); indutores de imuno-
complexos (penicilamina, captopril, sais de ouro, etc.); formadores de metemoglobina; imuno-
supressores e drogas antineoplásicas (ciclosporina, cisplatina, metotrexate, nitrosuréias, etc.)

Nas exposições ocupacionais, destacam-se os metais pesados. A exposição ocupacional ao cádmio,


ao chumbo e ao mercúrio pode cursar com este quadro. Compostos de mercúrio inorgânico são
clássicos exemplos de agentes que causam necrose tubular e insuficiência renal aguda.

O cádmio circula na corrente sangüínea ligado a uma proteína, a tioneína. Este complexo cádmio-
tioneína é filtrado pelo glomérulo e absorvido pelas células do túbulo proximal, onde a proteína é
degradada e cádmio passa a exercer seu efeito tóxico.

A exposição ao chumbo leva a um dano renal primariamente tubular ou túbulo-intersticial que parece
estar ligado a efeito tóxico em nível mitocondrial. Parece também existir um componente vascular,
que causa vasoconstrição renal e diminuição da taxa de filtração glomerular.

A patogênese da nefrotoxicidade tubular induzida pelo mercúrio é explicada por um distúrbio da


circulação sangüínea intra-renal, que leva a uma menor irrigação da célula tubular, com conseqüente
lesão isquêmica. O mercúrio liga-se ainda aos grupos sulfidrila da membrana basal glomerular,
alterando a permeabilidade.

Outros metais têm sido incriminados como produtores de dano renal túbulo-intersiticial, como o cromo
(especialmente trióxido de cromo), tálio, selênio, vanádio, bismuto, arsênio, cobre e urânio.

Portanto, em trabalhadores ocupacionalmente expostos a metais pesados, a nefropatia túbulo-


intersticial, com as características acima descritas, e excluídas outras causas não ocupacionais, deve
ser considerada como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling,
isto é, “doença profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação” constituem causa necessária. Se
não ocorresse a exposição ocupacional, seria improvável que esta doença, com as características
descritas, ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;

10
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,


SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “nefropatria induzida por metais pesados”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia
da gravidade, das repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente

11
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção, como o esquema que se apresenta a seguir:

 Classe 1: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 75-90 L/24 hs (52-62,5 mL/min); ou sintomas e sinais intermitentes de
disfunção do tratato urinário superior estão presentes, os quais não requerem tratamento
contínuo ou vigilância.

 Classe 2: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja maior que 75 L/24 hs (52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do trato
urinário superior necessitam de vigilância contínua e tratamento freqüente.

 Classe 3: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior estão incompletamente controlados por tratmento cirúrgico ou tratamento médico
contínuo.

 Classe 4: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina inferior a 40 L/24 hs (28 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior persistem a despeito de tratamento cirúrgico ou tratamento médico contínuo.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições

12
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

VI – OBSERVAÇÕES ADICIONAIS ÚTEIS PARA OS


PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS
Leituras Recomendadas:

SALGADO, P.E.T.; LEPERA, J.S. & LARINI, L. - Indicadores biológicos de exposição aos metais.
Revista de Ciências Farmacêuticas, 15: 27-39, 1993-1994.

TURCI, S.R.B. - Avaliação toxicológica, clínica, laboratorial e citogenética de soldadores da indústria


naval. Rio de Janeiro, 1994. [Dissertação de Mestrado, Escola Nacional de Saúde Pública, FIOCRUZ]

MELO, A.M.C. - Disfunção renal e exposição ambiental a chumbo e cádmio. Salvador, 1993.
[Dissertação de Mestrado, Faculdade de Medicina da UFBa].

SANTOS, A.C. - Efeitos renais crônicos em trabalhadores expostos ao chumbo e suas relações com
a pressão arterial. São Paulo, 1992. [Tese de Doutorado, Faculdade de Saúde Pública da USP].

DELLA ROSA, H. & GOMES, J.R. - Cádmio: efeitos patológicos. Revista Brasileira de Saúde
Ocupacional, 16(61): 43-8, 1988.

DELLA ROSA, H. V, - Avaliação da proteína ligada ao retinol, na urina, como índice biológico da
exposição ocupacional ao cádmio. São Paulo, 1985. [Tese de Doutorado, Faculdade de Ciências
Farmacêuticas da USP].

ALMEIDA, A.R.P. - Alterações renais em operários expostos ao chumbo inorgânico. Salvador, 1984.
[Dissertação de Mestrado, Faculdade de Medicina da UFBa].

13
PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.IV

Doença: “INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA” (Relacionada com o


Trabalho)
Código CID-10: N17 Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
A Insuficiência Renal Aguda (IRA) é uma síndrome caracterizada por diminuição relativamente rápida
da função renal, levando a acúmulo de água, solutos cristalóides e metabólitos nitrogenados no
organismo. A oligúria (débito urinário < 400mL/dia) é comum mas em alguns casos o débito urinário
pode exceder este limite (IRA não-oligúrica). A interrupção completa do débito urinário (anúria) é rara.

A lesão renal isquêmica ou nefrotóxica provoca uma necrose tubular aguda em que, independente do
mecanismo, alguns denominadores comuns estarão presentes:
- Insuficiência hemodinâmica – agentes nocivos têm a capacidade de provocar uma intensa
vasoconstrição cortical por provável produção de angiotensina II;
- Obstrução mecânica – os túbulos distais e coletores podem ser obstruídos por detritos de células
necróticas e cilindros hemoglobínicos ou mioglobínicos;
- Edema intersticial – comprime a parte externa dos túbulos renais dificultando a formação e
eliminação da urina;
- Retrodifusão de constituintes do líquido tubular – causada pela obstrução do fluxo normal de
urina.

O tempo entre o evento causador e a instalação da IRA pode demorar de algumas horas a alguns
dias. O primeiro sinal é uma redução do volume urinário, geralmente acompanhado de edema, ganho
de peso e até mesmo edema agudo de pulmão.

Distúrbios eletrolíticos (como a hipercalemia) podem provocar arritmias e estas podem ser até mesmo
fatais.

Hematúria está presente nos casos que se apresentam com síndrome nefrítica, freqüente nos casos
causados por exposição a hidrocarbonetos alifáticos halogenados.

A síndrome urêmica desenvolve-se gradativamente e é caracterizada pelo aparecimento progressivo


de náuseas, vômitos, irritabilidade, convulsões e até o coma.

O diagnóstico é clínico-laboratorial. São importantes para a condução dos casos a monitorização do


débito urinário, as dosagens séricas de uréia, creatinina, sódio, potássio, cloro, cálcio e fósforo e o
exame de urina de rotina. O eletrocardiograma é necessário nos casos que cursam distúrbios do
potássio e do cálcio.

Estudos radiográficos, ultra-som e cintilografias com radioisótopos podem ser úteis para a condução e
a definição da causa.

Os níveis séricos de uréia e creatinina elevam-se, com um aumento diário de cerca de 10,0 e
0,5mg/dl, respectivamente.

O sedimento urinário está alterado e sua análise pode sugerir a localização do dano renal primário.

As dosagens séricas e urinárias simultâneas da creatinina e do sódio, além da osmolalidade urinária


podem ser úteis para diferenciar a IRA pré-renal da intra-renal.

Em relação aos casos desencadeados pela exposição ocupacional aos hidrocarbonetos alifáticos

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halogenados, constituem elementos chaves para o estabelecimento de nexo com o trabalho os
seguintes:
- História de exposição ocupacional a hidrocarbonetos alifáticos halogenados com intoxicação
aguda;
- Aparecimento de comprometimento da função renal associado à hematúria e proteinúria
(geralmente sete a10 dias após).

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
A IRA é uma síndrome relativamente comum, acometendo cerca de 5% de pacientes internados em
hospitais, sendo que destes, mais da metade podem ser iatrogênicos. A incidência na população
geral é desconhecida.

A IRA pode ser classificada em pré-renal, intra-renal e pós-renal, de acordo com a localização do
distúrbio primário.

A intoxicação aguda ocupacional por solventes, particularmente por hidrocarbonetos alifáticos


halogenados (como exemplos o cloreto de metileno e o tetracloreto de carbono), e pelo mercúrio
pode cursar com insuficiência renal aguda.

Portanto, em trabalhadores ocupacionalmente expostos a solventes halogenados ou ao mercúrio, a


insuficiência renal aguda, com as características acima descritas, e excluídas outras causas não
ocupacionais, deve ser considerada como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da
Classificação de Schilling, isto é, “doença profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação”
constituem causa necessária. Se não ocorresse a exposição ocupacional, seria improvável que esta
doença, com as características descritas, ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?

15
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,


SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “insuficiência renal aguda”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia da gravidade,
das repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção, como o esquema que se apresenta a seguir:

 Classe 1: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 75-90 L/24 hs (52-62,5 mL/min); ou sintomas e sinais intermitentes de
disfunção do tratato urinário superior estão presentes, os quais não requerem tratamento
contínuo ou vigilância.

 Classe 2: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min); ou embora o clearance de creatinina

16
seja maior que 75 L/24 hs (52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do trato
urinário superior necessitam de vigilância contínua e tratamento freqüente.

 Classe 3: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior estão incompletamente controlados por tratmento cirúrgico ou tratamento médico
contínuo.

 Classe 4: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina inferior a 40 L/24 hs (28 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior persistem a despeito de tratamento cirúrgico ou tratamento médico contínuo.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

17
Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.V

Doença: “INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA” (Relacionada com o


Trabalho)
Código CID-10: N18 Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
Insuficiência Renal Crônica (IRC) é um diagnóstico funcional caracterizado por uma diminuição
progressiva e, geralmente, irreversível na taxa de filtração glomerular (TFG). Quando sintomática
recebe o nome de uremia.

O quadro clínico é vasto. Como já dito, nenhum sistema é poupado e as manifestações dependem da
gravidade e da duração da IRC e ocorrem em graus diferentes em cada paciente. A ocorrência de
gota em pacientes com IRC é sugestiva de lesão renal causada pelo chumbo.

O diagnóstico é feito baseado no achado laboratorial de diminuição da TFG (que correlaciona-se com
a depuração ou clearance da creatinina). A sintomatologia estará presente nas fases avançadas
(uremia).

Os níveis séricos de uréia e creatinina estarão elevados. Anemia, hiperuricemia, acidose metabólica e
alterações eletrolíticas podem estar presentes. A determinação do tamanho renal através de exames
radiológicos ou de ultra-som pode ser útil na determinação da cronicidade da doença renal, além de
visualizar a via urinária e diagnosticar ou afastar outras patologias.

Os critérios para diagnóstico da nefropatia crônica causada pelo chumbo são:


- ausência de história pregressa de nefropatia de outra origem;
- exposição prolongada ao chumbo no ambiente de trabalho ou fora dele;
- demonstração de um estado de intoxicação atual ou pregresso;
- presença de um quadro clínico e eventualmente bióptico de comprometimento renal.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS

18
Em alguns estudos a doença glomerular crônica tem sido citada como a causa mais freqüente de
IRC, em outros hipertensão arterial e diabetes mellitus são as principais. Entretanto, existe uma
grande porcentagem de causas desconhecidas que potencialmente podem estar relacionadas à
exposição ocupacional crônica a nefrotoxinas.

A exposição ocupacional ao chumbo está relacionada ao desenvolvimento de IRC, quer nos estudos
experimentais e clínicos, quer nos estudos epidemiológicos.

Em trabalhadores ocupacionalmente expostos ao chumbo, a insuficiência renal crônica, com as


características acima descritas, e excluídas outras causas não ocupacionais, deve ser considerada
como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling, isto é, “doença
profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação” constituem causa necessária. Se não ocorresse a
exposição ocupacional, seria improvável que esta doença, com as características descritas,
ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

19
A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,


SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “insuficiência renal crônica”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia da gravidade,
das repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção, como o esquema que se apresenta a seguir:

 Classe 1: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 75-90 L/24 hs (52-62,5 mL/min); ou sintomas e sinais intermitentes de
disfunção do tratato urinário superior estão presentes, os quais não requerem tratamento
contínuo ou vigilância.

 Classe 2: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja maior que 75 L/24 hs (52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do trato
urinário superior necessitam de vigilância contínua e tratamento freqüente.

 Classe 3: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 60-75 L/24 hs (42-52 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior estão incompletamente controlados por tratmento cirúrgico ou tratamento médico
contínuo.

 Classe 4: A diminuição da função do trato urinário superior está presente e é evidenciada pelo
clearance de creatinina inferior a 40 L/24 hs (28 mL/min); ou embora o clearance de creatinina
seja de 40-60 L/24 hs (28-42 mL/min), os sintomas e sinais de doença ou disfunção do tratato
renal superior persistem a despeito de tratamento cirúrgico ou tratamento médico contínuo.

20
V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO
MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

21
VI – OBSERVAÇÕES ADICIONAIS ÚTEIS PARA OS
PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS
Leituras Recomendadas:

TURCI, S.R.B. - Avaliação toxicológica, clínica, laboratorial e citogenética de soldadores da indústria


naval. Rio de Janeiro, 1994. [Dissertação de Mestrado, Escola Nacional de Saúde Pública, FIOCRUZ]

HERTZ-PICCIOTTO, I., CROFT, J. - Review of the relation between blood lead and blood pressure.
Epidemiological Reviews, 15(2):.352-73, 1993.

SANTOS, A.C. - Efeitos renais crônicos em trabalhadores expostos ao chumbo e suas relações com
a pressão arterial. São Paulo, 1992. [Tese de Doutorado, Faculdade de Saúde Pública da USP].

ALMEIDA, A.R.P. - Alterações renais em operários expostos ao chumbo inorgânico. Salvador, 1984.
[Dissertação de Mestrado, Faculdade de Medicina da UFBa].

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS No. 14.VI

Doença: “CISTITE AGUDA” (Relacionada com o Trabalho)


Código CID-10: N30.0 Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
Cistite aguda é o termo que descreve qualquer processo inflamatório agudo que acometa a mucosa
vesical.

Os sintomas da cistite aguda são variados e incluem polaciúria, disúria, dor em caráter de queimação
à micção, desconforto suprapúbico, eliminação de urina turva e/ou com presença de sangue
(hematúria macroscópica).

Os pacientes com cistite aguda infecciosa podem ainda apresentar febre e outros sinais sistêmicos de
processos infecciosos, além do risco de evolução para pielonefrite, se não tratados.

O diagnóstico de cistite aguda irritativa devido à exposição a aminas aromáticas é feito baseado na
história de exposição ocupacional, no quadro clínico e laboratorial (presença de hematúria ao exame
de urina de rotina) e ainda pelo desaparecimento gradual dos sintomas após a cessação da
exposição. Nestes casos a hematúria geralmente cessa em dois dias e a disúria em uma semana.

A principal diferenciação é feita com a infecção do trato urinário (bacteriúria vesical), onde o exame
de urina de rotina mostra piúria, além de uma possível hematúria. Nestes casos febre pode estar
presente e o diagnóstico pode ser confirmado pela urocultura.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
A bacteriúria vesical é a causa mais freqüente de cistite aguda.

Sintomas de irritação do trato urinário inferior também podem ocorrer em trabalhadores expostos a

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agentes que possuem ação irritante sobre a mucosa vesical, como as aminas aromáticas e seus
derivados, entre elas os praguicidas do grupo da formamidina e da toluidina.

Queixas semelhantes também são relatadas em joalheiros expostos excessivamente ao cádmio,


embora não seja estabelecido que este metal tenha ação irritante sobre a bexiga.

Em trabalhadores ocupacionalmente expostos a aminas aromáticas, a cistite aguda (não bacteriana)


com as características acima descritas, e excluídas outras causas não ocupacionais, pode ser
considerada como doença relacionada com o trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling, isto é,
“doença profissional”, em que o “trabalho” ou a “ocupação” constituem causa necessária. Se não
ocorresse a exposição ocupacional, seria improvável que esta doença, com as características
descritas, ocorresse.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

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IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,
SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.
A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “cistite aguda”, por sí só é insuficiente para dar uma idéia da gravidade, das
repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, permitem definir quatro níveis
ou graus de disfunção.

Contudo, não existem parâmetros para avaliar disfunção ou deficiência mais perenes, nos processos
de cistite aguda.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto

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trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença
 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

PROTOCOLO DE PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS

Doença: “INFERTILIDADE MASCULINA” (Relacionada com o


Trabalho)
Código CID-10:N46 Versão de 6/99

I - DEFINIÇÃO DA DOENÇA E CRITÉRIOS PARA SEU


DIAGNÓSTICO
Infertilidade Masculina é o termo que define a incapacidade do homem de fertilizar a mulher. É um
dos possíveis efeitos da ocupação sobre a reprodução. Outros exemplos de efeitos no homem que
poderiam ser citados são o aumento de perdas fetais do casal e o aumento de defeitos congênitos e
de câncer nos filhos.

Os efeitos sobre a reprodução podem manifestar-se em várias etapas do processo reprodutivo, desde
a gametogênese até o desenvolvimento da criança, passando pela fertilização, pelo desenvolvimento

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embrionário, pelo desenvolvimento fetal e pelo nascimento.

As “toxinas reprodutivas” podem agir por ação direta ou indireta nestas várias etapas, causando,
como resultado final, danos macromoleculares e celulares. Os danos na gametogênese do homem é
que terão com resultado final a infertilidade masculina.

Estes efeitos sobre o sistema reprodutor masculino estão centrados em parâmetros do


espermograma, como morfologia, motilidade, viabilidade, concentração e outros, que se traduzem em
um quadro clínico de infertilidade.

Estudos em trabalhadores expostos ao chumbo, com plumbemia aproximada de 53g/dl,


encontraram 68% destes com anormalidades na espermatogênese, 44% com hipospermia e 58%
com teratospermia.

Outro agente que mostrou toxicidade testicular em humanos foi o dibromocloropropano (DBCP), um
nematocida. Estudos mostraram diminuição da contagem (oligospermia e azoespermia) de
espermatozóides e esterilidade, além de anormalidades hormonais, tanto em trabalhadores que
fabricam e manipulam o DBCP, como em aplicadores do DBCP em cultivos de banana. Outrossim,
nestes casos, a atrofia testicular foi bem documentada, clínica e anatomo-patologicamente.

Um inseticida a base de hidrocarboneto clorado, o Kepone, também mostrou toxicidade. Estudos


mostraram anormalidades na espermatogênese e na contagem de espermatozóides em
trabalhadores envolvidos na produção deste pesticida.

O calor tem sido citado com um agente que pode levar a alterações na espermatogênese. Um estudo
epidemiológico de caso-controle sugeriu que existe uma relação entre ocupações que expõem
homens ao calor e esterilidade masculina. Entretanto, não existe consenso sobre este fato e mais
estudos são necessários.

Os efeitos das radiações ionizantes sobre a reprodução no ser humano são bem documentados. As
alterações sobre a fertilidade masculina são a diminuição da produção espermática e as
anormalidades da morfologia dos espermatozóides. Estas alterações podem ser transitórias ou
definitivas, dependendo da dose de radiação recebida.

O diagnóstico é feito baseado no espermograma, onde vários parâmetros já citados podem estar
alterados, e na incapacidade de fertilizar a mulher.

O estabelecimento do nexo com o trabalho é feito pela história de exposição ocupacional a “toxinas
reprodutivas” e pelas alterações encontradas no espermograma compatíveis, após afastar outras
possíveis causas de infertilidade.

II – FATORES ETIOLÓGICOS (GERAIS) E IDENTIFICAÇÃO DOS


PRINCIPAIS “AGENTES PATOGÊNICOS” e/ou FATORES DE RISCO
DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
Em relação aos efeitos adversos da ocupação sobre a reprodução, datam de meados do século
passado as primeiras evidências epidemiológicas quando foi documentado abortamento espontâneo
e outros efeitos sobre os conceptos de mulheres de trabalhadores expostos ao chumbo.

Posteriormente, além do chumbo, outros agentes químicos ou não foram identificados como possíveis
causadores de danos sobre a fertilidade masculina, como o dibromocloropropano (DBCP, “Dibromo”,
“Femafume”, “Nemagon”), o chlordecone (“Kepone”, “Composto GC 1189”, “Kelevan”, “Mirex”), o calor
e as radiações ionizantes. Consta que a fabricação tanto do DBCP como do Chlordecone estaria
proibida nos países de origem, informação importante que, contudo, não garante que eles não
estejam sendo utilizados, como se viu, recentemente, em cultivos de banana na América Central.

No caso do calor - o mais controvertido dos possíveis agentes causais da infertilidade masculina - a

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criptorquidia e a oligospermia pós crises de hipertermia ou febre extremamente elevada sugerem a
possibilidade de efeito similar, a partir de fontes externas, aqui, fontes externas presentes no
ambiente de trabalho. Contudo o mecanismo de ação ainda não está definitivamente esclarecido
(MITCHELL & DeHART, 1998).

Conclui-se que, em homens ocupacionalmente expostos ao dibromocloropropano (DCBP), ao


chlordecone, a radiações ionizantes ou a fontes de calor excessivo, de origem ocupacional, a
infertilidade, após exclusão de causas não ocupacionais, segundo protocolos específicos de Serviços
Especializados no Estudo da Infertilidade, poderá ser considerada como doença relacionada com o
trabalho do Grupo I da Classificação de Schilling, isto é, “doença profissional”, em que o “trabalho” ou
a “ocupação” constituem causa necessária.

III – PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS PARA O


“RECONHECIMENTO TÉCNICO DO NEXO CAUSAL ENTRE A
DOENÇA E O TRABALHO” (Art. 337 Decreto 3048/99)
De acordo com a Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, aplicável a todos os médicos
em exercício profissional no país, “para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de
saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
 A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo
causal;
 O estudo do local de trabalho;
 O estudo da organização do trabalho;
 Os dados epidemiológicos;
 A literatura atualizada;
 A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
 A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros;
 O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
 Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da
área de saúde.” (Artigo 2o da Resolução CFM 1488/98).

Recomenda-se, ademais, incluir nos procedimentos e no raciocínio médico-pericial, a resposta a dez


questões essenciais, a saber:
 Natureza da exposição: o “agente patogênico” é claramente identificável pela história ocupacional
e/ou pelas informações colhidas no local de trabalho e/ou de fontes idôneas familiarizadas com o
ambiente ou local de trabalho do Segurado?
 “Especificidade” da relação causal e “força” da associação causal: o “agente patogênico” ou o
“fator de risco” podem estar pesando de forma importante entre os fatores causais da doença?
 Tipo de relação causal com o trabalho: o trabalho é causa necessária (Tipo I)? Fator de risco
contributivo de doença de etiologia multicausal (Tipo II)? Fator desencadeante ou agravante de
doença pré-existente (Tipo III)?
 No caso de doenças relacionadas com o trabalho, do tipo II, foram as outras causas gerais, não
ocupacionais, devidamente analisadas e, no caso concreto, excluídas ou colocadas em hierarquia
inferior às causas de natureza ocupacional?
 Grau ou intensidade da exposição: é ele compatível com a produção da doença?
 Tempo de exposição: é ele suficiente para produzir a doença?
 Tempo de latência: é ele suficiente para que a doença se desenvolva e apareça?
 Há o registro do “estado anterior” do trabalhador segurado?
 O conhecimento do “estado anterior” favorece o estabelecimento do nexo causal entre o “estado
atual” e o trabalho?
 Existem outras evidências epidemiológicas que reforçam a hipótese de relação causal entre a
doença e o trabalho presente ou pregresso do segurado?

A resposta positiva à maioria destas questões irá conduzir o raciocínio na direção do reconhecimento
técnico da relação causal entre a doença e o trabalho.

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IV – PARÂMETROS QUE TÊM SIDO UTILIZADOS PARA AVALIAR,
SOB O PONTO DE VISTA ESTRITAMENTE MÉDICO, A NATUREZA E
O GRAU DA “DEFICIÊNCIA” OU “DISFUNÇÃO” EVENTUALMENTE
PRODUZIDOS POR ESTA DOENÇA
“Deficiência” ou “disfunção” (“impairment”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é
“qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica”. Por
exemplo, após um acidente vascular cerebral (AVC), a paralisia do braço direito ou a disfasia serão
“deficiências” ou “disfunções”, isto é, sistemas ou partes do corpo que não funcionam, e que,
eventualmente irão interferir com as atividades de uma vida diária “normal”, produzindo, neste caso,
“incapacidade”.

A avaliação médica da deficiência - se e quando necessária - está justificada pela constatação de que
o diagnóstico de “infertilidade masculina” sí só é insuficiente para dar uma idéia da gravidade, das
repercussões sobre o desempenho do paciente, e mesmo do prognóstico.

Entre as várias tentativas para se organizar, sistematizar, qualificar e, se possível, hierarquizar (em
bases semi-quantitativas) as eventuais deficiências ou disfunções provocadas pelas doenças do
sistema gênito-urinário, em bases objetivas, os critérios propostos pela Associação Médica
Americana (AMA), em seus Guides to the Evaluation of Permanent Impairment (4a. edição, 1995),
parecem-se úteis como referência nesta direção. Outros critérios e “baremos” existem em outros
países e mesmo recomendados internacionalmente, porém, a opção pelos critérios da AMA pareceu
vantajosa e menos vinculada a tabelas quantitativas exageradamente rígidas e fortemente
impregnadas com o viés médico-legal, em detrimento dos propósitos que norteiam o sistema
previdenciário brasileiro, aliás a própria lei e sua regulamentação.

Assim, os indicadores e parâmetros desenvolvidos pela AMA e apresentados em seus Guides, para
avaliar a natureza e o grau de disfunção ou deficiência na esfera renal, não se prestam para definir
graus de disfunção sexual.

V – INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O PRONUNCIAMENTO


MÉDICO-PERICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA (ou não) DE
“INCAPACIDADE LABORATIVA” DO SEGURADO COM
DIAGNÓSTICO DESTA DOENÇA
“Incapacidade” (“disability”), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é “qualquer redução
ou falta (resultante de uma “deficiência” ou “disfunção”) da capacidade para realizar uma atividade de
uma maneira que seja considerada normal para o ser humano, ou que esteja dentro do espectro
considerado normal ”. Refere-se a coisas que as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, após
um acidente vascular cerebral (AVC), que produziu as “deficiências” ou “disfunções” acima referidas,
a pessoa poderá não conseguir caminhar, vestir-se, dirigir um automóvel, etc.

Para fins previdenciários é valorizada a “incapacidade laborativa”, ou “incapacidade para o


trabalho”, que foi definida pelo INSS como “a impossibilidade do desempenho das funções
específicas de uma atividade (ou ocupação), em conseqüência de alterações morfopsicofisiológicas
provocadas por doença ou acidente. (...) Para a imensa maioria das situações, a Previdência trabalha
apenas com a definição apresentada, entendendo “impossibilidade” como incapacidade para atingir a
média de rendimento alcançada em condições normais pelos trabalhadores da categoria da pessoa
examinada. Na avaliação da incapacidade laborativa, é necessário ter sempre em mente que o ponto
de referência e a base de comparação devem ser as condições daquele próprio examinado enquanto
trabalhava, e nunca os da média da coletividade operária”.

Portanto, para o pronunciamento médico-pericial sobre a existência (ou não) de “incapacidade


laborativa” do segurado, é imprescindível considerar as seguintes informações:
 Diagnóstico da doença

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 Natureza e grau de “deficiência” ou “disfunção” produzida pela doença
 Tipo de atividade ou profissão e suas exigências
 Indicação ou necessidade de “proteção” do segurado doente, por exemplo, contra re-exposições
ocupacionais a “agentes patogênicos” sensibilizantes ou de efeito cumulativo
 Eventual existência de hipersuscetibilidade do segurado ao “agente patogênico” relacionado com
a etiologia da doença
 Dispositivos legais pertinentes (por exemplo: Normas Regulamentadoras do Ministério do
Trabalho, ou de órgãos da Saúde, ou acordos coletivos, ou profissões regulamentadas, etc.)
 Idade e escolaridade do segurado
 Suscetibilidade ou potencial do segurado a readaptação profissional
 Mercado de trabalho e outros “fatores exógenos”

Em bases técnicas, a “incapacidade laborativa” poderia ser classificada em:


 Total ou parcial
 Temporária ou indefinida
 Uniprofissional
 Multiprofissional
 Oniprofissional

Contudo, a legislação previdenciária vigente não contempla todas estas alternativas, e se espera que
o médico-perito se pronuncie sobre:
 A existência (ou não) de “incapacidade laborativa” no curto-prazo, com o correspondente
benefício previdenciário do “auxílio-doença”, como regulamentado pelos Arts. 71 a 80 do Decreto
3048/99.
 A concessão (ou não) de “auxílio-acidente”, “concedido, como indenização, ao segurado
empregado (...) quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente de qualquer
natureza, resultar seqüela definitiva” que se enquadre nas condições estabelecidas pelo Art. 104
do Decreto 3048/99.
 A concessão (ou não) de “aposentadoria por invalidez” devida ao segurado que, “estando ou não
em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação
para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” , nas condições estabelecidas pelos
Arts. 43 a 50 do Decreto 3048/99.

VI – OBSERVAÇÕES ADICIONAIS ÚTEIS PARA OS


PROCEDIMENTOS MÉDICO-PERICIAIS
Leituras Recomendadas:

FRAZIER, L.M. & HAGE, M.L.(Eds.) - Reproductive Hazards of the Workplace. New York, Van
Nostrand Reinhold, 1998. 572 p.

MITCHELL, L.V. & DeHART, R.L. - Temperature, Hypoxia, and Atmospheric Pressure. In: FRAZIER,
L.M. & HAGE, M.L. (Eds.). - Reproductive Hazards of the Workplace. New York, Van Nostrand
Reinhold, 1998. p. 415-28.

APOSTOLLI, P. et al.- Male reproductive toxicity of lead in animals and humans. Occupational and
Environmental Medicine, .55:.364-74, 1998.

McDIARMID, M.A.&, AGNEW, J. - Efeitos do trabalho sobre a reprodução. In: MENDES, R. (Ed.) -
Patologia do Trabalho. Rio de Janeiro, Atheneu, 1995. p.389-427

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