Você está na página 1de 6

26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena?

| ArchDaily Brasil

O que podemos aprender com a arquitetura indígena?

Escrito por Susanna Moreira

Publicado em 19 de Abril de 2021 Compartilhar

Arquitetas, arquitetos, urbanistas e estudantes da área têm muito a aprender com os modelos
construtivos dos primeiros ocupantes do território brasileiro, que há muito tempo produzem abrigos
adaptados ao contexto local. Estabelecer um conjunto de características comuns às soluções
arquitetônicas indígenas se mostra uma abordagem muito superficial, já que as conformações e
dimensões das ocas ou malocas indígenas variam a depender da tribo e quantidade de pessoas que
habitam ali. Porém, ao estudar os diferentes exemplares da arquitetura indígena, é possível rever a
noção de “tecnologia avançada” e assimilar soluções sustentáveis e adaptadas às condições
ambientais.

Desde a invasão dos portugueses no Brasil, a colonização impôs parâmetros que se refletem até hoje
na forma de construir, habitar e analisar a arquitetura. A relação colônia/colonizado, ou
Marcar
centro/margem persiste também no sentido que a ideia de tecnologia avançada ainda é entendida
como aquela high tech, ou seja, baseada em um ideal progressista e universal. Mas o que deve ser
Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 1/6
26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena? | ArchDaily Brasil

entendido, sobretudo nos países latino-americanos, como tecnologia avançada? A arquiteta argentina
Marina Waisman, em seu livro “O interior da história: historiografia arquitetônica para uso de latino-
americanos”, além de responder à essa pergunta, argumenta sobre a necessidade de se discutir uma
historiografia latino-americana e reflete sobre os conceitos de centro, periferia e região, fazendo uma
análise de como alguns vocábulos devem ser revistos quando aplicados na América Latina.

“ “Em uma primeira aproximação pode-se dizer que tecnologia avançada é


aquela que permite, com base em recursos humanos e materiais acessíveis,
alcançar, mediante seu aperfeiçoamento e desenvolvimento, o mais alto
grau de produtividade para conseguir um habitat adequado para cada
região e seus modos de vida, tanto em qualidade como em quantidade” -
Marina Waisman ”

No Mato Grosso, o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Tecnologias Indígenas, Tecnoíndia, atua desde
2007 com o objetivo de organizar, manter e ampliar o acervo documental de bens materiais e
imateriais indígenas, como fonte para trabalhos de pesquisa, extensão e projeto. O núcleo, criado
pelos professores Maria Fátima Roberto Machado, antropóloga, e José Afonso Botura Portocarrero,
arquiteto, busca, através da multidisciplinaridade, superar as visões tecnológicas e estéticas exógenas
e hegemônicas, realidade presente no contexto brasileiro, sobretudo naqueles lugares onde a memória
Marcar
indígena foi quase completamente apagada.

Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 2/6
26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena? | ArchDaily Brasil

O Centro Sebrae de Sustentabilidade (CSS), projetado pelo arquiteto José Afonso Portocarrero, é um
exemplo da forma que os estudos sobre tecnologias construtivas indígenas podem ser adotadas na
produção arquitetônica contemporânea. Em 2018 o edifício ganhou o prêmio de Melhor Edifício
Sustentável das Américas, o BREEAM Awards, além de outros prêmios de sustentabilidade, como o
Procel Edifica (2013) e o GBC Brasil Zero Energy (2017). Sua cobertura, conformada por duas cascas de
concreto espaçadas entre si permite a existência de um colchão de ar que mantém o interior da
edificação a uma temperatura agradável. A tecnologia foi inspirada nas construções indígenas
formadas por várias camadas de palha, que também permitem o conforto térmico através da formação
de camadas de ar entre elas.

As habitações indígenas podem influenciar a produção arquitetônica brasileira contemporânea de


diversas formas, desde uso de técnicas construtivas que são passadas entre gerações, até releituras
das formas das casas para proporcionar conforto térmico e praticidade estrutural. A construção do
Instituto Socioambiental - ISA em São Gabriel da Cachoeira, por exemplo, projeto do escritório Brasil
Arquitetura, contou com mão de obra indígena na execução da cobertura de madeira, palha e cipós, e
da estrutura periférica de 1,50m de largura que “veste” a construção central. Outro exemplo é a casa
ARCA, do Atelier Marko Brajovic, que possui uma forma inspirada na casa indígena da tribo Asurini
(Médio Xingu), com estrutura autoportante em formato de concha, solucionando com o mesmo
elemento o telhado, as paredes e acabamentos.

Marcar

Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 3/6
26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena? | ArchDaily Brasil

Nos anos 80, a chamada “arquitetura regionalista” ganhou destaque com a publicação “Towards a
critical regionalism: six points for an architecture of resistance”, de Kenneth Frampton. A publicação
lança diretrizes para uma “arquitetura de resistência” que concilia princípios modernistas a aspectos
regionais, como técnicas construtivas, materiais e adaptabilidade ao clima. No Brasil, a produção dos
anos 60 aos anos 80 do arquiteto Severiano Porto é considerada por alguns autores exemplo dessa
abordagem por tirar partido do conhecimento pré-existente para aplicá-lo às novas condições, a
exemplo do Campus da Universidade do Amazonas (1970-1980). Marcar

Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 4/6
26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena? | ArchDaily Brasil

Em tempos nos quais a sustentabilidade está no foco de discussões de como enfrentar questões
climáticas e ambientais, voltar o olhar a práticas vernaculares pode ser uma forma de aprender como
lidar com estas questões de uma maneira diversa. A partir do entendimento que tecnologia avançada é
algo que vai além de soluções inovadoras universalizantes - muitas vezes importadas de outros
contextos -, é possível adotar práticas projetuais baseadas na arquitetura indígena como forma de
responder a demandas contemporâneas, conciliando adaptabilidade ao contexto, interlocução com a
comunidade e materiais e técnicas construtivas locais.

Referências bibliográficas
CAU/RN. “Arquitetura Indígena no Brasil”. Acessado 24 Out 2019 <https://www.caurn.gov.br/?p=10213>.
HESPANHA, Sérgio Augusto Menezes. “Severiano Porto. Entre o regional e o moderno”. Arquitextos, São
Paulo, ano 09, n. 105.05, Vitruvius, fev. 2009. Acessado 24 Out 2019
<https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/09.105/76>.
PORTOCARRERO, José Afonso Botura. “Tecnologia indígena em Mato Grosso: habitação”. 2. ed. Cuiabá:
entrelinhas, 2018.
WAISMAN, Marina. “O interior da história: historiografia arquitetônica para uso de latino-americanos”.
São Paulo, SP: Perspectiva, 2019.

Publicado originalmente em 28 de outubro de 2019, atualizado em 19 de abril de 2021.

Galeria de Imagens

Marcar

Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 5/6
26/02/2024, 12:58 O que podemos aprender com a arquitetura indígena? | ArchDaily Brasil

Compartilhar

Sobre este autor

Susanna Moreira
Autor

SEGUIR

#TAGS

Notícias Artigos Arquitetura Brasileira Arquitetura Nacional Sustentabilidade Adtopic-

Marcar

Projetos Imagens Produtos Pastas Feed

https://www.archdaily.com.br/br/927142/o-que-podemos-aprender-com-a-arquitetura-indigena 6/6

Você também pode gostar