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3 – Jurisdição

3.1 – Noções iniciais - Justiça privada e justiça pública: Somente em casos


emergenciais, expressamente ressalvados pelo legislador, é que subsistiram alguns
resquícios da justiça privada, capazes de legitimar, ainda hoje, a defesa dos direitos
subjetivos pelas próprias mãos da parte, como se dá com a legítima defesa (CC de
2002, art. 188, I), com a apreensão do objeto sujeito a penhor legal (CC de 2002, arts.
1.467 a 1.472) e com o desforço imediato no esbulho possessório (CC de 2002, art.
1.210, § 1º). Assim, a prestação estatal de justiça, que começou com o encargo de
apenas definir os direitos, envolvidos em litígio, acabou encampando também a missão
de executá-los, quando injustamente resistidos (art. 4º, NCPC). Por outro lado, se nas
origens a prestação de justiça era monopólio apenas do Poder Público, mais
modernamente se registra a tendência de admitir que entes particulares também se
encarreguem da composição de certos conflitos, como é o caso, v.g., do juízo arbitral.
Mas, essa atribuição de função jurisdicional é restrita a determinados temas de direito
e não atinge a intervenção forçada no patrimônio do devedor, para fazer cumprir a
resolução do litígio, que continua retida, exclusivamente, pela Justiça estatal. Assim, no
estágio atual do Estado de Direito, a jurisdição, em sua plenitude, se apresenta como
função tipicamente estatal.

3.2 - As instituições básicas do sistema processual civil (jurisdição, processo e ação):


formam a estrutura e o arcabouço sobre os quais a ciência do processo civil foi
construída. Todos os demais institutos do processo guardam relação, imediata ou
mediata, com um deles. Funcionam como uma espécie de núcleo, em torno do qual
gira toda a ciência do processo.

Obs.: A jurisdição é a atividade do Estado, exercida por intermédio do juiz, que busca
a pacificação dos conflitos em sociedade pela aplicação das leis aos casos concretos.
A ação é o poder de dar início a um processo, e dele participar, com o intuito de
obter do Poder Judiciário uma resposta ao pleito formulado. O processo é um
conjunto de atos destinados a um fim, que é a obtenção de um pronunciamento
judicial a respeito dos pedidos formulados.
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3.3 - Conceito de Jurisdição: Pode-se conceituar a jurisdição como: Função do Estado,


pela qual ele, no intuito de solucionar os conflitos de interesse em caráter coativo,
aplica a lei geral e abstrata aos casos concretos que lhe são submetidos. É o poder
soberano e atividade do Estado de dizer o direito ao caso concreto, manifestando a
vontade da lei ao caso concreto. Com base na etimologia da palavra jurisdicao,
originada do latim, obtemos o seguinte conceito: Jurisdicao = juris (direito) + dictio
(ato de dizer) = dizer o direito ou aplicar a norma abstrata ao caso concreto. No
Brasil, o exercício da jurisdição é monopólio do Estado, e tal atividade é
desempenhada exclusivamente pelo Poder Judiciário, nos termos fixados na
Constituição da Republica (arts. 92 a 135), sendo absolutamente repudiada a justiça
privada para prevalência do juiz natural e competente nos termos da lei processual.
"Função do Estado que é exercida no intuito de solucionar conflitos de interesses em
caráter coativo mediante a aplicação da lei geral e abstrata aos casos concretos que
lhe são submetidos" (Marcus Vinicius Rios Gonçalves).

A JURISDIÇÃO É UMA FUNÇÃO ATRIBUÍDA A TERCEIRO IMPARCIAL PARA (Quando se


diz isso, que a jurisdição é uma função atribuída a terceiro imparcial, se está dizendo
que a jurisdição é um exemplo de heterocomposição. Hetero = diferente, outro;
composição = solução (outro soluciona)), MEDIANTE UM PROCESSO, TUTELAR
(RECONHECENDO, EFETIVANDO E RESGUARDANDO) (O exercício da jurisdição
demanda a existência de um processo. Tutela de conhecimento (reconhecendo),
tutela de execução (efetivando) tutela cautelar (resguardando)) SITUAÇÕES
JURÍDICAS CONCRETAMENTE DEDUZIDAS DE MODO IMPERATIVO E CRIATIVO
(jurisdição é ato de império, soberania, força. Não é um conselho. O juiz, ao julgar,
também cria, tem um papel criativo. Ele não é um mero reprodutor do que está na
lei. Ele parte da lei para criar a solução jurídica do caso concreto) EM DECISÃO
INSUSCETÍVEL DE CONTROLE EXTERNO (a decisão jurisdicional na pode ser revista
por nenhum outro poder) E APTA A TORNAR-SE INDISCUTÍVEL PELA COISA JULGADA
MATERIAL (a única que tem a propriedade de se tornar definitiva) ”.

A doutrina ao analisar a jurisdição o faz sobre três aspectos distintos:


PODER Jurisdição é o poder estatal de interferir na esfera
jurídica dos jurisdicionados, aplicando o direito
objetivo ao caso concreto e resolvendo a crise
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jurídica. IMPOR O DIREITO (JURIS SATISFAÇÃO)


FUNÇÃO É o encargo atribuído pela constituição federal ao
Poder Judiciário
ATIVIDADE Complexo de atos praticados pelo agente estatal
investido de jurisdição no processo.

O poder é um só (UNO), mas o Estado possui diversas funções:

FUNÇÕES DO ESTADO LEGISLATIVA Atividade de


elaboração de normas gerais e
abstratas prévias ao conflito de
interesses
JURIS Resolver, pacificar os conflitos de
DICIONAL interesses. Aplicar as normas
gerais aos casos concretos.
ADMIN Atingir determinado fim almejado
ISTRATIVA pelo Estado. Consecução das
finalidades do Estado.

3.4 - Características: A jurisdição distingue-se de outras funções do Estado por forca de


certas características que lhe são peculiares. As principais características da jurisdição
são:

a) Substitutividade: é a mais peculiar delas. Pode ser mais bem compreendida com a
lembrança de que as soluções de conflitos de interesses eram, originariamente, dadas
pelas próprias partes envolvidas. Desde que o Estado assumiu para si a incumbência
de, por meio da jurisdição, aplicar a lei para solucionar os conflitos em caráter
coercitivo, pode-se dizer que ele substituiu as partes na resolução dos litígios para
corresponder a exigência da imparcialidade. E a substituição das partes pelo Estado-
juiz que permite uma solução imparcial, muito mais adequada para a pacificação
social. A jurisdição substitui a atividade das partes na solução do litígio. Não são as
partes que decidem o conflito, mas o Estado, que, emitindo um provimento
jurisdicional - uma tutela determina qual das partes tem razão. A vontade da lei,
manifestada pelo Poder Judiciário, substitui a vontade das partes. É a mais evidente
característica da jurisdição. O Estado substitui as partes na solução do conflito
evitando a solução pelas próprias forças e astúcia.
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b) Definitividade: Somente as decisões judiciais adquirem, após certo momento,


caráter definitivo, não podendo mais ser modificadas. Os atos jurisdicionais tornam-
se imutáveis, e não podem mais ser discutidos. Os atos advindos do Poder Judiciário,
em especial as sentenças e os acórdãos, uma vez transitado em julgado, são
definitivos, não comportando novas discussões. Esse fenômeno e que se denomina de
coisa julgada, efeito de imutabilidade que recai sobre a sentença ou o acórdão capaz
de impedir a sua reapreciação, mesmo que sejam atingidos por nova lei. Ressalte-se
que nem mesmo uma nova lei poderá modificar o que foi decidido pelo Poder
Judiciário em relação ao caso posto em juízo. Somente as decisões judiciais possuem
após certo tempo caráter de definição do conflito, não podendo mais ser
modificadas.

c) Imperatividade: As decisões judiciais tem forca coativa, e obrigam os litigantes. De


nada adiantaria o Estado substituir as partes na solução dos conflitos de interesses,
formulando uma decisão imutável, se não lhe fossem assegurados os meios
necessários para que fossem cumpridas. As decisões judiciais são impostas aos
litigantes, que devem cumpri-las. A sua efetividade depende da adoção de
mecanismos eficientes de coerção, que imponham submissão aos que devem cumpri-
las. As decisões judiciais tem força coativa. As decisões são impostas aos litigantes
que devem cumpri-las.

3.5 - Princípios fundamentais: Na ordem constitucional, em que o poder jurisdicional


deita suas raízes, encontram-se princípios fundamentais que informam a substância ou
essência da jurisdição, e que podem ser assim enunciados:

a) O princípio do juiz natural: só pode exercer a jurisdição aquele órgão a que a


Constituição atribui o poder jurisdicional. Toda origem, expressa ou implícita, do poder
jurisdicional só pode emanar da Constituição, de modo que não é dado ao legislador
ordinário criar juízes ou tribunais de exceção, para julgamento de certas causas,
tampouco dar aos organismos judiciários estruturação diversa daquela prevista na Lei
Magna. Nem mesmo os órgãos hierárquicos superiores podem, em princípio, suprimir
a competência do juiz natural.
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b) O princípio da investidura: a jurisdição somente pode ser exercida por juízes


regularmente investidos, providos em cargos de magistrados e que se encontram no
efetivo exercício desses cargos. Apenas juízes nestas condições se consideram
investidos no poder jurisdicional.

c) O princípio da improrrogabilidade: os limites do poder jurisdicional, para cada


justiça especial, e, por exclusão, da justiça comum, são os traçados pela Constituição.
Não é permitido ao legislador ordinário alterá-los, nem para reduzi-los nem para
ampliá-los.

d) O princípio da indeclinabilidade: o órgão constitucionalmente investido no poder


de jurisdição tem a obrigação de prestar a tutela jurisdicional e não a simples
faculdade. Não pode recusar-se a ela, quando legitimamente provocado. Trata-se do
dever legal de responder a invocação da tutela jurisdicional assegurada pela
Constituição. Na lei, porém, há uma exceção que consiste na permissão a que o juiz se
abstenha de atuar sob alegação de suspeição por motivo íntimo (art. 145, § 1º, CPC).

e) O princípio da indelegabilidade: não pode o juiz ou qualquer órgão jurisdicional


delegar a outros o exercício da função que a lei lhes conferiu, conservando-se sempre
as causas sob o comando e controle do juiz natural. Costuma-se falar em exceção do
princípio nos casos de cartas precatórias ou de ordem. Na verdade, contudo, não se
trata, na espécie, de delegação voluntária, mas de simples caso de colaboração entre
órgãos judiciários, cada um dentro de sua natural e indelegável competência. O
deprecante não delega poderes, já que o ato a ser praticado pelo deprecado nunca
estaria compreendido nos limites da competência do primeiro. O que se pede é
justamente que o único competente (o deprecado) pratique o ato que o deprecante
não pode realizar, mas que é necessário para o prosseguimento do processo a seu
cargo.

f) O princípio da aderência territorial: todo juiz ou órgão judicial conta com uma
circunscrição territorial dentro da qual exerce suas funções jurisdicionais, que pode ser
a comarca, o Estado, o Distrito Federal ou todo o território nacional, conforme
disposto na Constituição e nas leis de organização judiciária.
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g) O princípio da inércia: o acesso de todos à justiça é garantido pela Constituição (art.


5º, XXXV), mas o Poder Judiciário não pode agir por iniciativa própria, somente o fará
quando adequadamente provocado pela parte (NCPC, art. 2º).

h) O princípio da unidade: o Poder Judiciário é único e soberano, embora a partilha de


competência se dê entre vários órgãos. Dessa maneira, qualquer que seja aquele que
solucione o conflito, manifestará a vontade estatal única atuável diante dele. Nem
mesmo a divisão constitucional entre várias justiças implica pluralidade de jurisdição,
mas apenas “a existência de estruturas diversas, estabelecidas de acordo com a
especialidade de cada uma dessas justiças, com o objetivo de assegurar a maior
eficiência no seu desempenho”.

3.6 - Jurisdição Civil: Direito Processual Civil, que é o que interessa ao nosso estudo,
compreende as atividades desenvolvidas pelo Estado no exercício da “jurisdição civil”
(NCPC, art. 13). Seu âmbito é delineado por exclusão, de forma que a jurisdição civil se
apresenta com a característica da generalidade. Aquilo que não couber na jurisdição
penal e nas jurisdições especiais será alcançado pela jurisdição civil, pouco importando
que a lide verse sobre direito material público (constitucional, administrativo etc.) ou
privado (civil ou comercial).

3.6.1 Espécies de Jurisdição: A jurisdição, emanação do poder estatal, é una e não


comporta distinção de categorias. Mas razões didáticas justificam a sua classificação
em diversas espécies. Algumas serão examinadas a seguir.

a) Contenciosa: Jurisdição contenciosa é a jurisdição propriamente dita, isto é, aquela


função que o Estado desempenha na pacificação ou composição dos litígios. Pressupõe
controvérsia entre as partes (lide), a ser solucionada pelo juiz. Na ordem
constitucional, a justiça foi expressamente concebida como a prestadora da função
jurisdicional necessária para tutelar os direitos lesados ou ameaçados de lesão (CF, art.
5º, XXXV). Assim, na base do processo, por meio do qual atua a jurisdição, nos moldes
constitucionais, está sempre “um conflito de interesses”, do qual decorre a pretensão
deduzida em juízo, que, por sua vez revelará o litígio a ser composto pelo provimento
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jurisdicional. A parte busca obter uma determinação judicial que obrigue a parte
contraria; a sentença sempre favorece uma das partes em detrimento da outra, já que
ela decide um conflito entre ambas; pede-se ao juiz que dê uma decisão, solucionando
um conflito de interesses, que lhe é posto, diretamente, para julgamento.

Solução para conflitos de interesses, Presença de lide, Partes (autora e re), Sentença
de mérito (magistrado emite um juízo de valor decidindo qual das partes tem razão
no litígio.

b) Voluntária: ao Poder Judiciário são, também, atribuídas certas funções em que


predomina o caráter administrativo e que são desempenhadas sem o pressuposto do
litígio. Trata-se da chamada jurisdição voluntária, em que o juiz apenas realiza gestão
pública em torno de interesses privados, como se dá nas nomeações de tutores, nas
alienações de bens de incapazes, divórcio e separação consensuais etc. Aqui não há
lide nem partes, mas apenas um negócio jurídico-processual envolvendo o juiz e os
interessados. Não se apresenta como ato substitutivo da vontade das partes, para
fazer atuar impositivamente a vontade concreta da lei (como se dá na jurisdição
contenciosa). O caráter predominante é de atividade negocial, em que a interferência
do juiz é de natureza constitutiva ou integrativa, com o objetivo de tornar eficaz o
negócio desejado pelos interessados. A função do juiz é, portanto, equivalente ou
assemelhada à do tabelião, ou seja, a eficácia do negócio jurídico depende da
intervenção pública do magistrado.Busca uma situação que valha para ela mesma; é
possível que a sentença beneficie as duas partes; ainda que haja uma questão
conflituosa, não e ela posta diretamente em juízo para apreciação judicial. A jurisdição
voluntaria não serve para que o juiz diga quem tem razão, mas para que tome
determinadas providencias que são necessárias para a proteção de um ou ambos os
sujeitos da relação processual.

Administração pública de interesses privados, Ausência de lide, Requerentes ou


interessados, Sentença meramente homologatória (o juiz não julga, tão-somente
ratifica a regularidade do ato).
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