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Fernando Campos Scaff

Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – Largo São


Francisco

1- Introdução ao direito das sucessões:

A palavra suceder tem o sentido genérico de virem os fatos e fenômenos jurídicos


“uns depois dos outros”. Como situação geral, consiste na substituição de um
sujeito por outro na posição de parte ativa ou passiva em relações jurídicas. A
característica principal (Betti) é a permanente identidade da posição jurídica.

- Em sentido mais específico, a sucessão decorrente da morte, entende-se a


alternância translativa de todas as relações jurídicas ativas e passivas, de uma
pessoa na sequência de sua morte.

- O Direito das Sucessões é a parte geral do Direito Civil que regula a destinação
do patrimônio de uma pessoa depois da sua morte.

Histórico

- Somente veio a ganhar corpo com a ideia de propriedade individual. Antes de


econômico, o fundamento era religioso.

- No Direito Romano, a sucessão testamentária prevalecia. Era prerrogativa do


paterfamilias decidir por testamento a sorte do conjunto de seus bens que ele
legava de modo livre para pessoa de sua escolha, o futuro chefe da domus.

- Essa liberdade sem limite foi afetada na época clássica por decisões do Tribunal
de centumvirs que havia instaurado a querela inofficiosi testamenti. O tribunal
havia considerado que a deserdação, sem motivo, de um parente próximo não podia ser
outra coisa obra de um louco, uma vez que feita contra o officium pietatis. Por
isso o tribunal outorgou aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos e irmãs, em
relação aos quais o de cujus havia preferido um estranho, uma ação de redução,
permitindo a eles obter uma parte da sucessão, chamada quarta legítima,
correspondente a um quarto do que eles teriam podido obter ab intestato. Os
herdeiros assim beneficiados eram assim denominados legitimários. Justiniano eleva
de um quarto a um terço na presença de quatro crianças ou menos, e à metade na
presença de mais de quatro crianças. A sucessão sem testamento, com o sentido de
respeitar a posição do testador, era considerada uma sucessão testamentária tácita.

- Também prevalecia em Roma, além do critério da liberdade, acima indicado, também


o da igualdade, pois na falta de testamento, a herança era transferida sem
considerações acerca da idade ou do sexo.

- No Direito da Idade Média as questões referentes à sucessão se dividiam. O


Direito escrito mantinha a tradição romana de fazer prevalecer a vontade de testar
do testador. Aumentou-se os direitos do cônjuge, mediante a outorga à viúva de um
“aumento do dote”, tal como propriedade plena na falta de filhos e como usufruto se
houvesse a presença deles.

- O Direito costumeiro, de inspiração germânica, opunha-se aos princípios romanos.


A devolução legal dos bens se impunha, ditada pela ideia de conservação dos bens na
família. A sucessão era dividida em duas: de uma parte, os imóveis provenientes da
família, denominados “próprios” e, de outra parte, os móveis e os aquestos. Os
próprios eram submetidos à reserva de quatro quintos. Esses bens beneficiavam em
princípio os descendentes. Mas, na falta desses, era considerada a origem desses
bens “próprios”, para os fazer retornar aos ascendentes ou colaterais que os haviam
doado ou legado, segundo a regra paterna paternis, materna maternis. Os móveis e os
aquestos eram em princípio submetidos à liberdade testamentária.

- Outras regras se aplicavam às sucessões ditas nobres. Para assegurar a devolução


do feudo e evitar a pulverização das terras, o direito costumeiro estabelecia o
privilégio da masculinidade e da primogenitura.

- Dentre tais costumes, o filho natural era excluído da sucessão, não tendo direito
à outra coisa senão alimentos.

Herança a título universal e a título singular

- A “título universal”: gera a transmissão da totalidade do patrimônio ao sucessor.


A sucessão legítima sempre será a título universal, transmitindo-se a cada um dos
herdeiros a totalidade do patrimônio do de cujus e a cada um deles uma quota ideal
desse patrimônio.

- A “título singular”: quando está adstrita a uma coisa ou a um direito


determinado, ou a uma fração do patrimônio, sem a individuação do bem ou do direito
transmitido.

- Origem: ato de vontade ou por determinação de lei. Pode ainda verificar-se em


vida (successio inter vivos), que decorre da vontade humana emitida de acordo com a
lei, ou pela morte (successio causa mortis), que decorre do fenômeno da morte.

- Na sucessão causa mortis, não há a exclusão da participação da vontade, que


subsiste ao lado daquela que se realiza em razão da lei.

- A sucessão hereditária poderá ser a título universal – quando alguém é instituído


como herdeiro, que herdará como se fosse herdeiro legítimo; ou a título singular,
quando o testador deixa para alguém um legado.

- Nem todos os direitos são transmitidos, mesmo na sucessão a título universal. Não
o serão os direitos de família puros (tais como o pátrio poder, a tutela e a
curatela), ou alguns a título patrimonial (direitos aos alimentos iure sanguinis).

- Conceitos:

- Autor de herança ou de cujus: é aquele por cuja morte se abre a sucessão.

- Herdeiro ou sucessor: é quem recebe ou adquire os bens. Conforme se trate de uma


ou outra modalidade sucessória, qualifica-se na situação de herdeiro legítimo ou de
herdeiro testamentário.

- Legatário: é aquele a quem o testador deixa uma coisa ou quantia certa,


determinada, individuada, a título de legado.

- Herança: é o conjunto patrimonial transmitido causa mortis. É o patrimônio do


defunto. É coisa, classificada entre as universalidades de direito.

- Legado é o bem ou o conjunto de bens certos e determinados, integrantes da


herança, deixado pelo testador para alguém.

- Sucessão é o direito por cuja força a sucessão se dá.

- Inventário é o processo judicial ou extrajudicial, não contencioso, por via do


qual se efetua a descrição dos bens da herança, lavra-se o título de herdeiro,
liquida-se o passivo do monte, paga-se o imposto de transmissão mortis causa e
realiza-se a partilha dos bens entre os herdeiros.
- Princípios Gerais

- Fundam-se na ideia da morte natural. Não existe herança de pessoa viva, proibindo
o direito todo contrato que tenha por objeto herança de pessoa viva.

- Não há, assim, direito adquirido à herança, senão depois da morte, existindo até
então mera expectativa.

- Com a morte abre-se a sucessão. Deve ser então provada pelos meios que decorrem
da Medicina Legal. Do ponto de vista jurídico, demonstra-se ordinariamente mediante
a certidão de óbito.

- Por exceção, a lei reconhece a sucessão nos bens do ausente, a princípio


provisória e depois definitiva.

- Momento da sucessão:

- No Direito Romano, ocorria em três momentos: a) com a morte, a sucessão se abria;


b) enquanto não havia a aceitação pelo herdeiro, ficava em estado de jacência; c)
tal estado se encerrava com a aceitação manifestada pelo herdeiro.

- A partir do século XIII, na Idade Média, foi instituído o chamado droit de


saisine, que estabeleceu o imediatismo na transmissão dos bens, cuja propriedade e
posse passam diretamente da pessoa do morto aos seus herdeiros. Art. 1.784 do
Código Civil.

- Efeitos:

a) A abertura da sucessão se dá com a morte e no mesmo instante os herdeiros


adquirem. Há substituição do sujeito com sub-rogação pessoal;

b) a transferência na posse ocorre sem necessidade de pedido de imissão;

c) o herdeiro passa a ser legitimado para intentar ou continuar as ações relativas


à posse;

d) falecido o herdeiro, após recebida a herança e mesmo que não tenha expressado
formalmente a sua aceitação, haverá sucessão aos seus respectivos herdeiros;

e) a herança recebida pode ser cedida no todo ou em parte por ato inter vivos. A
delação ou devolução consiste na oferta a um sujeito para entrar no todo, em parte
ou em determinadas relações jurídicas sob a titularidade do de cuius.

- Transmissão da herança. Herdeiros necessários.

- Momento de transmissão: a morte do sucedido, cujo momento é ordinariamente


provado pela certidão de óbito.

- Lugar: último domicílio do sucedido. Domicílio: sede jurídica da pessoa (art.


1.785 CC).

- Para quem se atribui a herança: herdeiros necessários e testamentários.

- São herdeiros necessários os descendentes, o cônjuge e os ascendentes.


- Objeto: em princípio, há a mutação subjetiva do patrimônio, com exceção de
direitos personalíssimos do sucedido, tais como os direitos de família puros e os
direitos políticos. Outros, ainda que meramente pessoais, também estão vinculados à
pessoa do sucedido, a despeito de serem patrimoniais. É o caso do usufruto, do uso
e das obrigações alimentares futuras.

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