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Unidade II

Unidade II
5 A ORGANIZAÇÃO DIDÁTICA DA AULA: PRÁTICAS E PROCEDIMENTOS

Segundo Lima e Moura (2015, p. 91), "Não cabe mais ensinar a todos os alunos como se estivéssemos
ensinando a um só".

Falar sobre formação de professores indica que temos que nos autoconhecer, além de explorar as
várias formas de ensinar para atender às necessidades individuais dos educandos. Em outras palavras,
ensinar a todos significa contemplar os sujeitos das aprendizagens como seres constituídos de
integralidade social, cultural, histórica e emocional.

O educador contemporâneo é aquele que ensina e, ao mesmo tempo, aprende, isto é, o processo
dialógico presente no processo de ensino e aprendizagem faz com que as alternâncias de ensinar e
aprender sejam frequentes durante todas as interações que emergem em sala de aula.

Em consonância com esta ideia, Freire sinaliza que:

Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si


mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo.
Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática “bancária”, são
possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos
passivos (apud VEIGA, 2008, p. 87).

Guiados pela reflexão freiriana, é preciso que, ao ensinar, o profissional da educação esteja aberto a
novas aprendizagens, assim como assuma o papel de mediador do conhecimento, o qual se constrói a
partir da comunhão dos indivíduos.

Segundo Meirieu (2006), o espaço escolar não é apenas um local em que se passam anos, mas
consiste em um ambiente de alteridade. Sobre isso, o autor aponta que a escola é:

[...] uma instituição onde as relações entre as pessoas, o conjunto da gestão


cotidiana e todo o ambiente material conspiram – etimologicamente,
“respiram juntos” – para instituir uma forma particular de atividade humana
fundada em valores específicos: o reconhecimento da alteridade, a exigência
de precisão, de rigor e de verdade, a aprendizagem conjunta da constituição
do bem comum e da capacidade de “pensar por si mesmo” (2006, p. 68).

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As reflexões de Meirieu nos levam a compreender que o aprender e o ensinar são construídos na
interação, no diálogo na ação coletiva, em que as experiências de cada indivíduo contribuem para
compreensões de si, do mundo e do próprio conhecimento que está sendo produzido.

Nesta perspectiva, podemos afirmar que o ensinar articula‑se diretamente com o aprender,
além disso, não se restringe às movimentações cognitivas, mas configura‑se no desenvolvimento de
múltiplas habilidades, pelas quais são geradas atitudes em relação à realidade e à convivência social
(SANTOS, 2004).

Ainda segundo Santos (2004, p. 92), “ensinar conteúdos ultrapassa os limites aparentes de nosso
discurso e das afirmações nele contidas”, isto é, ao entrar em contato com conteúdos de quaisquer
componentes curriculares, os aprendizes têm a oportunidade de dominar os conhecimentos específicos
de determinada área do saber, como também de, por meio do pensamento crítico, sistematizar, criar
hipóteses, refinar ideias e colocar em prática suas ações.

Lembrete

Ensinar e aprender são processos concomitantes para a construção


do conhecimento.

Figura 11

Disponível em: https://bit.ly/3IYY7Ah. Acesso em: 27 fev. 2023.

A imagem anterior reflete o pensamento de Zabala (1998, p. 37), segundo o qual para que os
estudantes aprendam, é importante ir além dos conteúdos:

[...] é necessário que, diante destes, possam atualizar seus esquemas de


conhecimento, compará‑los com o que é novo, identificar semelhanças e
diferenças e integrá‑las em seus esquemas, comprovar que o resultado tem
certa coerência.

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Em consonância com a proposta de Zabala, Fernandes (2008) salienta que as relações de ensinar
e aprender são organizadas pela comunicação multidimensional e pluriepistêmica, momento em que
as diferentes concepções e histórias articulam‑se, em encontros e desencontros, a fim de estabelecer
sentidos para construção do conhecimento.

Saiba mais

No vídeo a seguir, a filósofa Viviane Mosé discute aspectos resistentes


da educação tradicional que perpetuam nos dias de hoje e aponta questões
para reflexão sobre a educação, o papel da escola e o do professor.

O QUE a escola deveria aprender antes de ensinar. 2017. 1 vídeo (49 min).
Publicado pelo canal Viviane Mosé Oficial. Disponível em: https://bit.ly/3ZnhvfR.
Acesso em: 27 fev. 2023.

Conheça também este ebook gratuito, que mostra 13 escolas com


propostas didáticas alternativas à educação tradicional, situadas em vários
pontos do mundo. Nele, é possível conhecer diferentes concepções de
estudante, de professor/tutor/mediador e de escola, subjacentes às propostas
desenvolvidas. Uma leitura importante para a reflexão sobre os papéis
do professor.

GRAVATÁ, A. et al. Volta ao mundo em 13 escolas. São Paulo: Fundação


Telefônica: A. G., 2013. Disponível em: https://bit.ly/3XZv8AM. Acesso em:
27 fev. 2023.

A reportagem do programa Fantástico mostra a democracia presente


na EMEF Presidente Campos Salles, a “escola sem muros”, que luta contra a
violência na periferia da cidade de São Paulo.

G1. Escola em comunidade de SP derruba barreiras e integra alunos.


Fantástico, 23 mar. 2014. Disponível em: http://glo.bo/3mcxyi1. Acesso em:
27 fev. 2023.

Diante deste contexto, apresentamos, a seguir, um breve percurso do aprender e do ensinar segundo
as correntes pedagógicas.

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Quadro 9 – Ensinar e aprender segundo as correntes pedagógicas

Tendências Período Características


O professor apresenta‑se como modelo de
Postura Década de 1920 autoridade e a ser imitado pelos estudantes. Processo
tradicional ensino‑aprendizagem pautado na memória e simbologia
hierárquica – Professor/Cultura/Aluno
Postura Década de 1920 O professor coordena as ações do aluno, o qual deve
escolanovista expressar‑se com criatividade e liberdade
Postura O professor, pautado nas ideias freirianas, estabelece
libertadora Década de 1950 um diálogo problematizador, em que todos educam‑se
concomitantemente
O professor, pautado nas premissas de Taylor, estabelece
Postura Década de 1960 ações e técnicas, que visam a tornar os estudantes cada
tecnicista vez mais eficientes
Postura O professor realiza uma mediação cultural durante o
crítico‑reprodutivista Década de 1970 processo ensino‑aprendizagem, cuja interlocução com o
estudante não é priorizada
O professor segue um caminho diferente do que se coloca
nas posturas escolanovistas e crítico‑reprodutivistas,
Postura propondo uma aproximação entre o docente e o estudante
Década de 1970
histórico‑crítica durante o processo de ensino‑aprendizagem. Trata‑se
de uma postura que parte da visão de que a escola é
determinada socialmente
O professor – com base na teoria de Piaget e Claparède,
Postura representantes do escolanovismo na Europa – busca
Década de 1920
construtivista revitalizar a centralidade no estudante durante todo o
processo de ensinar e aprender

Adaptado de: Veiga (2008).

Como podemos observar, as correntes pedagógicas são transversalizadas basicamente por duas
formas de ensinar e aprender, que ora se alternam na centralidade professor‑conteúdo a ser dado, ora
priorizam a interação entre professor e estudante, com ênfase no protagonismo do aprendiz.

Não estamos querendo dizer com isso que o processo e surgimento das tendências pedagógicas são
simples, nem desconsiderar o contexto histórico e social a que pertenceram. O que queremos apresentar
é que o ensinar e o aprender sempre oscilaram através dos tempos, para atender as ideologias de suas
respectivas épocas.

Esclarecidos possíveis simplificações e/ou equívocos, apresentamos, a seguir, dois grupos sobre as
tendências e posturas pedagógicas:

• Grupo 1: refere‑se às posturas pedagógicas que concebem o ensinar e o aprender como elementos
distintos, em que o ensinar cabe ao professor e o aprender, ao estudante.

• Grupo 2: refere‑se às posturas pedagógicas que associam o ensinar e o aprender, isto é, esses
elementos acontecem em comunhão durante todo o processo e alternam‑se entre professor e
estudante, ou seja, ao ensinar se pode aprender ou vice‑versa.

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Ensinar e aprender Ensinar e aprender


Processos distintos Processos síncronos

- Tradicional - Libertadora
- Escolanovista - Histórico-crítica
- Tecnicista - Construtivista
- Reprodutista

Figura 12 – Aprender e ensinar em duas perspectivas

Independentemente da categorização das tendências pedagógicas, é preciso ter em mente que a


sociedade contemporânea exige práticas pedagógicas que prevejam a participação dos estudantes nas
decisões escolares, nos encaminhamentos dos conteúdos e nos temas de relevância para sua vida social.

É preciso que, durante a formação inicial e continuada, prevaleça a consciência de que todas nossas
ações sejam voltadas para o desenvolvimento de competências e habilidades que reconheçam a voz dos
estudantes e coloquem o professor em um constante movimento dialógico, isto é, ao mesmo tempo que
ensina, também aprende com seus alunos.

Exemplo de aplicação

Faça o seu próprio quadro com os grupos 1 e 2 com profissionais de seu cotidiano, depois pense nos
critérios que determinaram tal escolha.

Neste processo de formação inicial e continuada é importante compreender as características da


sala de aula, por exemplo:

não é apenas o aspecto institucional a conferir sociabilidade à aula, posto


que ela se desenvolve, ou pode se desenvolver, como semente, como se
fosse um viveiro em que se cultivasse o desenvolvimento intelectual como
planta: esse é, aliás, o sentido do termo seminário em latim, vinculado ao
termo semente, que se configura como uma técnica de ensino. A aula seria,
dessa forma, semeadora de ideias, desde que gerasse o debate, a discussão,
o diálogo (ARAÚJO apud VEIGA, 2008, p. 72).

Desse modo, iremos estudar como a sala de aula tem se apresentado nos últimos tempos, assim
como as ações que se desenvolvem nela.

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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Figura 13

Disponível em: https://bit.ly/3KK7g18. Acesso em: 27 fev. 2023.

Como podemos observar, a sala de aula transcende seu caráter estático e espacial, uma vez que, dentro
dela, estão sujeitos históricos e culturais que expressam suas ideias e buscam consolidar conhecimentos
e projetar suas expectativas frente à vida social.

Portanto, antes do percurso que pretendemos fazer, sobre as várias configurações da sala de aula,
concordamos que, acima de tudo, é um terreno fértil para debater ideias, interagir com temas relevantes,
conviver com opiniões antagônicas e aprender que o conhecimento é construído a partir das relações
dialógicas entre os sujeitos que nela estão.

Segundo Araújo (apud VEIGA, 2008), a aula consiste em um fenômeno cultural, que promove
sociabilidade em seu interior com objetivos de aprendizagem sistematizados, organizados e
formalizados para o desenvolvimento de habilidades e competências dos participantes do processo
de ensino e aprendizagem.

Meirieu (2006, p. 68) acrescenta que:

Uma sala de aula não é um grupo de pessoas escolhidas em razão de suas


afinidades. Não é, tampouco, um conjunto de pessoas que compartilham
as mesmas convicções ideológicas ou religiosas. Não é uma família cujos
membros são unidos por relações de filiação. Não é um bando submetido
ao comando de um líder, nem um cenário de televisão onde o espetacular é
a lei. É um espaço e um tempo estruturados por um projeto específico que
alia ao mesmo tempo e indissociavelmente a transmissão de conhecimentos
e a formação dos cidadãos.

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À luz da citação, a sala de aula é definida como um espaço de heterogeneidade de ideias, de origens
diversas, em que o professor não se configura como detentor do saber, mas participa ativamente do
processo de construção de cidadania e autonomia dos membros constituintes deste espaço e tempo escolar.

Nesta perspectiva, podemos compreender a sala de aula como a dimensão física, local destinado
para a realização de ações pedagógicas; enquanto a aula possui uma dimensão de organização do
processo educativo, tempo e espaço da aprendizagem (VEIGA, 2008).

Em outras palavras, enquanto a sala de aula caracteriza‑se por um espaço específico para acolher
estudantes e profissionais da educação, a aula dinamiza o processo de desconstrução e construção
de conhecimentos, a partir de metodologias que propiciem a interação permanente entre estudantes
e professores.

Observação

Aula é espaço social, lugar dialético entre os sujeitos; gestora da história


de gerações, interlocução de sonhos, realidades, disciplinas, indisciplinas,
insatisfações, realizações, cultura e, por fim, transformação dos sujeitos.

Lembrete

A sala principal era situada logo em seguida à entrada das casas, no


antigo mundo romano. “Lugar do fogo sagrado, dos altares dos deuses‑lares
e de distribuição dos demais espaços” (HOUAISS, 2001, p. 187).

Etimologicamente, o termo aula tem origem latina, cujo uso em língua portuguesa data de
1679 (HOUAISS, 2001), em um entendimento contemporâneo, a significação de aula está associada
diretamente à sala de aula, por isso, apresentaremos a seguir as várias concepções de aula e sala de aula
trazidas por Veiga (2008):

Escola Europeia Medieval

A Escola Europeia Medieval era voltada para o ofício sacerdotal dos jovens e velhos, assim, todos
eram admitidos, sem a preocupação com o atendimento por idade. Todavia, a definição de um local com
vistas à alfabetização das crianças em espaço específico – uma sala de aula – começava a ser vislumbrada,
embora os processos e métodos de ensino e aprendizagem não acompanhassem as mudanças.

Assim, a difusão do termo sala de aula, bem como a necessidade de configuração de um espaço
próprio para a infância, ocorreram à medida que os métodos pedagógicos foram divulgados, propondo
uma nova organização do ensino em grupos escolares, por idade ou nível de aprendizagem, sinalizando
a preocupação da sociedade com um tratamento especial para a criança, ser que adentra a escola com
necessidades diferentes (VEIGA, 2008, p. 21).
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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Escola Primária

No Brasil, a preocupação em organizar um espaço para abrigar as crianças da Escola Primária na


educação pública começou a surgir a partir da segunda década do século XIX, em algumas cidades
da então colônia e, após a independência de várias províncias do império, no bojo do debate entre
intelectuais e políticos em torno da necessidade de renovar os métodos e as modalidades de ensino nas
escolas brasileiras (VEIGA, 2008, p. 28).

Ensino Simultâneo

A partir de meados do século XIX, a concepção do Ensino Simultâneo – criado e sistematizado por São
João Batista de La Salle, centrado na ação do professor e na atenção simultânea aos alunos – opunha‑se
aos métodos em voga no século XIX, que reuniam em uma mesma sala alunos de várias idades e de diversos
níveis de ensino, e sugeria uma nova organização de classes de alunos por nível de conhecimento e por
idade, sob a responsabilidade de um professor que conduzia a execução de atividades comuns a todos e
envolvia “interações pluridimensionais de ordem intelectual, comportamental, corporal, psíquica, social,
ética, pedagógica, metodológica etc.” (ARAUJO, 2006, p. 21). A implementação do Ensino Simultâneo
somente tornou‑se possível com a produção de materiais didático‑pedagógicos, como livros didáticos
adaptados às matérias do currículo, cadernos e quadros de giz. A aula foi invadida por materiais que a
reconfiguraram, e exigia do docente uma revisão de sua organização, superando a forma preponderante
na época (VEIGA, 2008).

Método Intuitivo

Criado nos Estados Unidos e na Inglaterra, no final da década de 1870, chegou ao nosso país nos
anos de 1880, por meio de alguns compêndios de lições de coisas, inspirados em similares franceses
leçons de choses. Ele foi adotado como reação ao ensino tradicional e consagrou‑se como símbolo de
renovação do ensino no período republicano brasileiro. Com o objetivo de “[...] fazer da intuição a base
de todo o método, de todo o ensino, de toda a educação humana” (apud SCHELBAUER, 2003, p. 92), o
método deu ênfase à intuição e observação como momentos de aprendizagem, bem como à necessidade
de observância dos ritmos de aprendizagem dos alunos, e colocou como centro desse movimento de
renovação pedagógica os professores e o método, levantando a discussão sobre a profissionalização
do magistério e o método como caminho orientador, com vistas ao alcance de objetivos baseados nos
princípios de racionalização dos sistemas educativos para atendimento à grande massa populacional.
Nesse intuito, as aulas assumiram outra organização, baseada nas lições de coisas – momentos em que
o professor criava condições para que os alunos pudessem ver, sentir e observar os objetos. Havia a
utilização de recursos didáticos diversificados do próprio ambiente do aluno e estratégias como visitas
e excursões (VEIGA, 2008, p. 34).

A Escola Nova

Surgiu como reação sistemática às tendências passivas, intelectualistas e verbalistas da escola


tradicional, afirmando ser função social da escola formar as pessoas conforme suas capacidades
individuais. Com a intenção de servir aos interesses do indivíduo, e não aos interesses de classes,
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“transfere para a criança e para o respeito de sua personalidade o eixo da escola e o centro de gravidade do
problema da educação” (MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA, 1932, p. 53). A organização
da aula sofreu grandes modificações, a começar pela grande importância atribuída a métodos e
técnicas de ensino, pesquisas, projetos e atividades de grupo (VEIGA, 2008).

Aula Tecnicista

A Pedagogia Tecnicista surgiu no Brasil na década de 1960, no bojo do período desenvolvimentista,


momento em que a busca pela qualificação de mão de obra com vistas ao aumento da produtividade
acentuou‑se; sendo atribuída à educação de baixa qualidade, com altos índices de evasão e repetência,
a responsabilidade pela inexistência de trabalhadores qualificados para assumir as funções requeridas
pelo mercado de trabalho. A aula tecnicista é invadida por materiais de instrução programada e
instrução modelar, técnicas e recursos audiovisuais e forte utilização do livro didático, enfatizando
a tendência de reprodução da realidade por modelos predefinidos, fortalecendo a ideologia política do
momento. Havia também a utilização dos multimeios para a educação de massa, nos moldes do ensino
supletivo e da teleducação, e a avaliação escolar com função somativa, que reproduzia os interesses
da política dominante no momento, visando ao controle sistemático e contínuo (VEIGA, 2008).

Aula Crítica e Emancipatória

A Pedagogia Histórico‑Crítica começou a ser sistematizada em 1979, no debate instituído pela


necessidade política e pedagógica de “encontrar saídas para a questão pedagógica na base de uma
valorização da escola como instrumento importante para as camadas dominadas” (SAVIANI, 2005,
p. 72). Assim, na década de 1980, essa nova concepção pedagógica desenvolveu‑se na intenção de uma
interferência mais direta na prática pedagógica dos professores, construindo uma síntese superadora
dos aspectos significativos da Pedagogia Tradicional e da Escola Nova. A aula supunha a presença de
professor e aluno, e o ato de "dar aula" seria indissociável da produção desse ato e também
de seu consumo, o que atribuiu ao professor a responsabilidade por pensar o seu trabalho e representou
a possibilidade de definir objetivos, conteúdos, metodologias e estratégias de avaliação para um processo
que pressupunha uma relação fundamental, a relação professor e alunos inseridos em um contexto
social complexo e multirreferencial. No que tange aos conteúdos e métodos de ensino, não havia
oposição entre cultura erudita e cultura popular, mas uma relação de continuidade, que passou
da experiência imediata ao saber sistematizado – em que os métodos subordinam‑se aos conteúdos e
favorecem a articulação desses com os interesses dos alunos – possibilitando a participação crítica deles
e excluindo a não diretividade (VEIGA, 2008).

Aula Social e Tecnológica

A incorporação das novas tecnologias à escola exige que professor e aluno saibam o que fazer com
elas, para que adquiram sentido nas práticas realizadas em aula e possam efetivamente contribuir para a
aprendizagem, isso porque a maioria das tecnologias educativas não garante a atividade do aluno. Assim, o
que poderia parecer novo, na verdade, representava um retorno ao método tradicional, condenado
por inúmeras razões, uma delas a passividade do aluno, tratado como "receptor" ou "tábula rasa".

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É preciso que o professor reconheça o seu importante papel como agente promotor do processo
de aprendizagem do aluno, construtor do conhecimento, e crie condições para que esse se
sinta desafiado, motivado a explorar, refletir e rever ideias, conceitos e teorias, planejando suas
aulas com o auxílio das novas tecnologias ou não, com clareza em relação à maneira de articular
os componentes do processo de ensino – objetivos, conteúdos, métodos e avaliação –, de maneira a
construir uma unidade de sentido e significado que permita que a aula seja realmente um espaço/tempo
de ensinar/aprender e de transformar (VEIGA, 2008).

Escola Europeia Escola Primária Ensino Simultâneo


Medieval
Sala de aula - surgimento Sala de aula - abrigo do Sala de aula - organização
tímido ensino primário público por classes e idades
Aula - alfabetização e Aula - atendimento à Aula - surgimento e apoio
ofícios sacerdotais educação brasileira com materiais didáticos

Aula Social e Método Intuitivo


Tecnológica
Sala de aula - inserção CONFIGURAÇÕES DA AULA Sala de aula - símbolo de renovação
de tecnologias no período republicano brasileiro
Aula - motivação de Aula - ambiente aluno
condições para aprendizagem e recursos didáticos

Aula Crítica e Aula Tecnicista Escola Nova


Emancipatória
Sala de aula - instrumento para Sala de aula - espaço para Sala de aula - serviço de interesses
camadas dominadas qualificação de mão de obra dos indivíduos e de classes
Aula - assume a presença do aluno Aula - ampliação de uso de Aula - métodos e técnicas
e do professor para aprendizagem materiais livros didáticos de ensino

Figura 14 – Configurações da aula

Como podemos perceber, a sala de aula e o ato de ensinar sempre serão influenciados pelo contexto
sociocultural e as tendências pedagógicas que o acompanham. Dessa forma, podemos entendê‑la como
local próprio para realização das ações pedagógicas, a aula.

Segundo Dussel e Caruso (2003, p. 26):

Habitar a sala de aula significa formar esse espaço de acordo com gostos,
opções, margens de manobra; considerar alternativas, eleger algumas e
descartar outras. Habitar um espaço é, portanto, uma posição ativa.

A partir dessa reflexão, o professor deve utilizar aula e sala de aula como elementos inerentes à
construção de seu trabalho pedagógico, em um contexto colaborativo, planejado e com propostas de
avaliar o desenvolvimento de todo o processo vivido.

Ademais, é preciso vislumbrar a aula como momento de criação, interação, troca, confronto de ideias,
abordagem de temas relevantes, em que haja constituição da integralidade humana, com autonomia
consolidada e motivação para participação autônoma e cidadã em nossa sociedade.
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Um fator bastante importante que perpassa a sala de aula é a ética, Libâneo (2008, p. 47)
afirma que “o professor tem com o aluno um compromisso social e ético, no seu processo de
formação”, assim, continuaremos nossas discussões sobre o papel da aula e as práticas pedagógicas
no contexto da ética.

Figura 15

Disponível em: https://bit.ly/3EL48hz. Acesso em: 27 fev. 2023.

A partir da epígrafe, percebemos que as metodologias adotadas pelos professores devem


considerar o caráter ético em suas ações, cuja responsabilidade seja conduzir os estudantes para
uma formação cidadã e a fim de que sejam partícipes autônomos e altruístas na família, no trabalho
e na vida social.

Em outras palavras, as relações de sala de aula, fundamentalmente socioculturais, devem contribuir


para a formação cultural e científica da sociedade, compromisso indispensável para conquistas
participativas e democráticas.

Não se pode perder de vista que a tarefa pedagógica é realizada em um espaço e tempo político, em
que se deslocam relações de poder, acordos, desacordos e negociações, daí a necessidade de articular
tais elementos com a ética.

Desta forma, pensar na dimensão ética da docência, especificamente durante o processo de


ensino e aprendizagem, é considerar seus princípios na elaboração e prática pedagógica, uma vez
que a construção do conhecimento é uma exigência ética, de compartilhamento e respeito do outro
e de ideias diferentes.

Em consonância com esta concepção, Rios (2011) afirma que ética consiste em uma dimensão
estruturante do trabalho competente e coerente do professor. Segundo a autora, considera‑se um
bom trabalho aquele que é bem realizado nas perspectivas técnica, política e ética. Acrescenta, ainda,
que a prática pedagógica pautada pela ética é aquela que revela consciência de que os ensinamentos
convergem para o contexto social, a promoção e a construção da cidadania.

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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Portanto, a ética na sala de aula necessita que as práticas pedagógicas contemplem o desenvolvimento
e a humanização dos indivíduos, com o intuito de que eles estejam em harmonia a fim de aprender em
um contexto de justiça, equilíbrio e solidariedade para compreender o outro e para o autoconhecimento.

Segundo Rios (2011), a ética deve estar presente nas práticas pedagógicas por meio da reflexão
crítica que associe conteúdos aos aspectos morais do homem e conduza os estudantes à transformação
pessoal e social.

No entanto, é preciso muita atenção para o descompasso entre discurso e ação, isto é, criar situações
que realmente efetivem a presença da ética na sala de aula.

Vázquez (2005, p. 22) concebe que “a Ética depara com uma experiência histórico – social no terreno
da moral, ou seja, com uma série de práticas morais já em vigor e partindo delas, procura determinar a
essência da moral [...]”, assim, está intimamente articulada com a vida humana e suas interações sociais,
em um tempo e espaço histórico.

Exemplo de aplicação

Após esta breve conceituação de ética, ouça a música "Ideologia" de Cazuza e responda: Que
princípios éticos podem ser identificados? Como você abordaria esta temática em sala de aula?

Rios (2011) assevera que a dimensão ética do trabalho docente articula‑se em três, são elas:

Dimensão técnica
Domínio de conteúdos e técnicas
importantes para a intervenção pedagógica
no trabalho docente
Dimensão ética

Dimensão estética
Sensibilidade na relação pedagógica, com
orientação para uma perspectiva criadora

Dimensão política
Participação na construção coletiva da
sociedade, com vistas ao exercício dos
direitos e deveres cidadãos

Figura 16 – Dimensão ética no trabalho docente

Adaptada de: Rios (2011).

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Unidade II

As três dimensões propostas pela autora indicam que a ética passa pela escolha dos conteúdos
e técnicas dos professores (dimensão técnica), pelo contexto de liberdade de criação e expressão
de professores e estudantes (dimensão estética) e, por fim, pelo respeito aos diferentes percursos
socioculturais e posicionamentos dos indivíduos na sociedade (dimensão política).

Exemplo de aplicação

Selecione uma unidade temática de um livro didático ou apostila e identifique se há presença das
três dimensões da ética para auxiliar o trabalho docente.

Esperamos que você tenha percebido que a sala de aula é um espaço de prática social, com interações
complexas, posicionamentos diversos, tomadas de decisões, cujas ações, tanto de alunos quanto de
professores, devem estar alicerçadas pela dimensão ética, por meio de um processo de parceria e
construção coletiva e colaborativa do conhecimento escolar.

Continuaremos a estudar a organização didática no contexto do processo colaborativo, pautado no


diálogo, compreendido por Freire (1985) como o homem sendo um ser de contato, de relações e que
interage com o mundo, refletindo e agindo sobre ele.

Estudaremos agora a organização didática como processo dialógico, cuja centralidade está no
homem, que se transforma constantemente e transforma o mundo no qual está inserido.

Em conformidade com Freire (1985), no contexto da dialogia, os indivíduos trazem em sua trajetória
a consciência de inacabamento e vocação ontológica de intervir no contexto social, assumindo o papel
de sujeitos da história.

Na sala de aula é comum nos depararmos com dois elementos muito frequentes: a conversa e o
diálogo; no entanto, segundo Castilho e Muraro (2019), embora ambos façam parte do ato humano,
são compostos de características distintas. De acordo com eles, a conversa não demanda organização
sistematizada do pensamento reflexivo e estruturado, além de não estar comprometida com a resolução
de problema; caracterizando‑se, basicamente, como troca de informações cotidianas.

Por outro lado, afirmam que o diálogo consiste em um discurso mais elaborado, que requer
pensamento estruturado, criativo e argumentativo frente à articulação das ideias em torno de uma
questão problemática.

Lipman (1995, p. 87) compreende a conversa como “troca de sentimentos, de pensamentos, de


informação ou de compreensão”; enquanto o diálogo “é exploração mútua, uma investigação, uma
inquirição”.

Assim, se queremos possuir uma organização didática que promova a dimensão colaborativa e
dialógica, precisamos um pouco mais das concepções, aproximações e distanciamentos entre os dois
construtos da comunicação, que transpassam as relações humanas durante a aula.

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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Lembrete

O diálogo é o pensamento crítico, elaborado, argumentativo e


criativo, já a conversa é o pensamento comum, cotidiano, informativo
e compartilhado.

Segundo o dicionário de filosofia Abbagnano (2007, p. 274):

[...] o diálogo não é somente uma das formas pelas quais se pode exprimir
o discurso filosófico, mas a sua forma típica e privilegiada, isso porque não
se trata de discurso feito pelo filósofo para si mesmo, que o isole em si
mesmo, mas de uma conversa, uma discussão, um perguntar e responder
entre pessoas unidas pelo interesse comum da busca.

Diante desta definição, podemos entender que o diálogo em sala de aula não somente exterioriza
ideias, mas coloca o sujeito em contato com o outro, estabelecendo consensos e dissensos em relação
às várias temáticas que emergem do processo de ensino e aprendizagem.

A partir da construção partilhada de conhecimento, podemos considerar o diálogo interdisciplinar


(SANTOS, 2004) uma vez que gera aprendizagens além das essenciais, mas que determinam articulação
da razão e da emoção, cujas relações interpessoais são espontâneas e o conhecer tem sentido para a
vida cotidiana do ser humano.

Dito de outra forma, ao conceber o diálogo como cerne da organização didática, estamos
oportunizando espaço para que professores e alunos experimentem novas experiências, testem novas
formas de expressão e assumam o protagonismo de seus próprios processos de ensinar e aprender.

Figura 17

Disponível em: https://bit.ly/3EJieQE. Acesso em: 27 fev. 2023.

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Não podemos perder de vista que o diálogo nunca ocorre no vazio, pelo contrário, cria teias de
relações que envolvem o conhecimento em permanente construção, com força de intencionalidade
de um processo educativo que tinha sido pensado antes pelo professor através dos elementos que
constituem a organização didática (FREIRE, 1996).

Portanto, a organização didática como propulsora das interações colaborativas reconhece a prática
educativa:

[...] como um processo histórico, existencial, social, político, cultural de


transmissão de valores e criação de valores, conhecimentos e saberes para
uma socialização que desenvolva consciência e autonomia dos sujeitos em
modos próprios de sentir, pensar e decidir (FREIRE, 1996, p. 175).

Em consonância com esta ideia, de aulas e metodologias dinâmicas e colaborativas, Freire e Shor
(apud VEIGA, 2008, p. 177) afirmam que as conexões estabelecidas pela práxis educacional consolidam
“a dialética da aula libertadora. Lugar em que pensamos criticamente sobre as forças que interferem em nosso
pensamento crítico”. Isto é, a organização didática pautada no dialógico traz luz às interações em sala de
aula e cria condições para que os indivíduos conectem uns aos outros, a fim de ajudar e serem ajudados.

Neste contexto, ao organizar as ações didáticas, é preciso consciência do diálogo que deve ser
estabelecido entre dois mundos, o produzido no ambiente escolar e aquele que abarca a sociedade em geral.

Assim, a fim de viabilizar, cada vez mais, práticas educativas fundadas na conexão da realidade
escolar e da realidade social, Fernandes (apud VEIGA, 2008, p. 166‑167) sugere alguns procedimentos a
serem considerados no planejamento docente:

• Aplicação de formulários ou outros tipos de sondagem que envolvam identificação escolar, origem
histórica e geográfica, assim como perfil da trajetória acadêmica a partir do viés social e político;
pontuando, ainda, os modos de aprender e de planejar os estudos nas áreas do conhecimento que
compõem o currículo.

• Discussão e construção sobre a realidade em suas representações, com possibilidades de recriar


e interpretar as próprias experiências, permitindo ressignificações do contexto, do tempo e de
espaços históricos, políticos e culturais.

• Elaboração de referências e análises provisórias do contexto inicial do processo educacional, o que


possibilita compreender as trajetórias de professores e estudantes em suas teias de relações com
o conhecimento, responsabilidades, autonomia e atuação na vida.

• Problematização da realidade e inserção no cotidiano escolar de práticas pedagógicas que


conduzam os sujeitos à tomada de consciência da situação interpretada, problematização de
pontos relevantes e elaboração de estratégias baseadas na resolução de problemas; realizando
conexões entre o “conhecimento existente e o conhecimento novo” (FREIRE; SHOR apud FREIRE,
1996, p. 63).
66
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Como é possível observar, todas as sugestões de Fernandes (2008) estão embasadas na teoria
pedagógica freiriana, uma vez que ela traz, em suas premissas, a busca de ações libertadoras para os
seres humanos oprimidos com apoio da ética, a qual deve transitar nos seguintes aspectos:

• Humanização: centrada nas ações das pessoas, suas aspirações, subjetividades e pontos
de vista.

• Conscientização: efetivada no ajuste e organização dos entraves coletivos e dicotomias geradas


pelas diversas percepções de mundo.

• Constituição política: processada nas ações socioculturais, tomadas de decisão, atuações autônomas
e cidadãs.

• Formação profissional cidadã: relacionada à articulação entre conhecimento técnico, científico


e social.

Diante dos apontamentos e reflexões realizados, o profissional da educação deve considerar a


instabilidade e provisoriedade do conhecimento e das relações humanas (FELDMANN, 2009), agindo de
forma investigativa, a fim de compreender as transformações na realidade social e educacional e propor,
por meio de exercício democrático, intervenções que conduzam ressignificações do trabalho pedagógico.

Como último ponto, não menos importante e relacionado ao diálogo, temos a comunicação, processo
inerente ao ser humano, elemento necessário para receber e transmitir ideias, informações, percepções,
sentimentos, hipóteses, conclusões e interpretações das experiências vividas.

Segundo Abbagnano (2007, p. 161), a comunicação é definida como:

[...] termo para designar o caráter específico das relações humanas que
são ou podem ser relações de participação recíproca ou de compreensão.
Portanto, esse termo vem a ser sinônimo de “coexistência” ou de “vida com
os outros” e indica o conjunto dos modos específicos que a coexistência
humana pode assumir, contanto que se trate de modos “humanos”, isto
é, nos quais reste certa possibilidade de participação e de compreensão.

À luz desta definição, é possível afirmar que os processos colaborativos e a dimensão dialógica
são mediatizados pela comunicação, que se estabelece nas múltiplas convivências e compreensões do
mundo, permitindo aos indivíduos expressarem‑se verbal e não verbalmente, compartilhando o mesmo
sistema de signos e códigos linguísticos, mas gerando amplitude de entendimentos.

Para Dewey (1979, p. 3), a comunicação proporciona, ainda, a transmissão da cultura, em que o
homem é capaz de pensar por meio da oralidade, registros escritos e artísticos (pintura, dança, música,
esculturas), aprimorando a vida social do sujeito. Acrescenta, também, que a comunicação retroalimenta
as gerações, seus hábitos, ideias, objetivos e opiniões.

67
Unidade II

Saiba mais
Amplie seus conhecimentos lendo o seguinte artigo:

VARÃO, R.; CUNHA, R. C. O conceito de comunicação em John Dewey:


de 1884 a 1927. Comunicologia, Brasília, v. 7, n. 2, p. 129‑143, jul./dez. 2014.

A partir das reflexões que relacionam organização didática, diálogo e dimensão colaborativa,
podemos concluir que os conteúdos abordados no processo de ensino e aprendizagem precisam estar
concatenados com metodologias que propiciem amplitude de ideias e, principalmente, de caminhos à
construção do conhecimento.

Se o aprender, segundo Paro (2007), é resultado do ato de vontade que somente o aluno pode
ter, precisamos cada vez mais oportunizar espaços de interações colaborativas e compartilhamento
de vivências, os quais cultivem a aprendizagem como processo histórico e cultural e que contribui
efetivamente para a vida de ações autônomas e cidadãs.

6 ESPAÇOS INOVADORES EM SALA DE AULA: CRIATIVIDADE E


AMBIENTES DIGITAIS

De acordo com Rajadell,

[...] transcender o conhecimento de conteúdos, requer alguns passos


interessantes que vão desde a curiosidade, a demonstração, a sensação,
a incerteza, a lógica, a imaginação, a corporeidade e a conexão”, pois
“[...] produtos orvalhados de criatividades impactam, motivam o aluno,
aproximam o aluno, transmitem bem‑estar (2012, p. 108).

A formação de professores para o mundo contemporâneo está pautada nas palavras de Rajadell
(2012), isto é, uma educação que desperte a curiosidade, a imaginação e esteja associada a ambientes
digitais e que promovam a criatividade.

Figura 18

Disponível em: https://bit.ly/3kChFkQ. Acesso em: 27 fev. 2023.

68
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

A imagem selecionada expressa a relação direta entre questionamentos e imprecisões com ideias e
soluções criativas; dito de outra forma, antecipamos nossas reflexões destacando que, independentemente
de conceituações, o processo criativo e inovador irá emergir de tensão, dúvidas e desafios impostos
pelos diversos contextos da vida em sociedade.

Retomando o item "Organização Didática: processo colaborativo e dialógico", reafirmamos a


necessidade de práticas educativas que partam da vida para a vida, com valorização da investigação,
da livre criação e de ações inovadoras; com superação do ensino tradicional e suas priorizações ao
ensino transmissivo e reprodução do saber.

Suanno, Dittrich e Maura (2013) afirmam que, para que as mudanças ocorram, é necessário
interagir com os sujeitos e promover interações, uma vez que as práticas inovadoras e criativas
partem dessas ações, pois estão fundamentadas na dimensão ontológica, epistemológica e
metodológica do conhecimento.

Lembrete

A dimensão ontológica relaciona-se ao ser e à sua realidade;


a dimensão epistemológica refere-se ao conhecimento humano e a
dimensão metodológica refere-se aos movimentos realizados durante o
processo ensino-aprendizagem.

Cunha (2006, p. 40‑41) propõe espaços renovadores para a educação a partir da associação inovação
e novas tecnologias, sugerindo que:

[...] a inovação requer uma ruptura necessária que permita reconfigurar o


conhecimento para além das regularidades propostas pela modernidade.
Ela pressupõe, pois, uma ruptura paradigmática e não a inclusão de
novidades, inclusive as tecnológicas. Nesse sentido envolve uma mudança
na forma de entender o conhecimento.

As reflexões da autora apresentam o conceito de inovação como principal elemento a fim de equalizar
as práticas pedagógicas às dimensões tecnológicas e criativas. Para isso, nos próximos parágrafos,
discutiremos as principais concepções dos termos inovação e criatividade.

De acordo com Rajadell (2012), embora tenham diferentes processos de criatividade, esses termos
estão relacionados à concretização de um produto; segundo a autora, temos a seguinte definição:

• Criatividade: presente em todos os sujeitos, já que eles podem gerar ideias, desde as mais simples
às mais complexas.

• Inovação: capacidade sistemática e organizativa de transformar boas ideias em exitosas (produto).


69
Unidade II

Complementando a associação dos conceitos anteriores, Suanno (2013, p. 31) afirma que a
“criatividade e capacidade crítica aliadas, no dia a dia, são grandes diferenciais para o surgimento de
ações inovadoras”.

Ou seja, para a chegada ao produto inovador, é necessário que os sujeitos passem pelo processo
de resolução de problemas, cujos alicerces são: percepção crítica do mundo, desejo de mudança e
pensamento criativo.

Olhar
Inovação crítico

Criatividade

Figura 19 – Ciclo da atividade criadora

Em uma proposta visual, podemos conceber a educação criativa e inovadora como um processo
cíclico, em que se parte do olhar crítico e autônomo, o qual gera situações problemas; essas, por sua
vez, acionam, por meio de ações colaborativas, estratégias criativas para a resolução de problemas, cuja
culminância é o produto inovador, isto é, a consolidação prática e concreta do conhecimento construído.

Saiba mais

Confira as organizações identificadas pelo MEC como inovadoras e


criativas e tidas como referência para a Educação Básica no link seguir.

MEC. Inovação e criatividade na educação básica. Brasília, [s.d.].


Disponível em: https://bit.ly/3SyoH6u. Acesso em: 27 fev. 2023.

De acordo com Cunha (apud SUANNO; DITTRICH; MAURA, 2013, p. 214), a inovação é:

[...] o resultado de tensões de movimentos políticos que marcam a história


do país e aqui se inclui a influência das relações internacionais, as quais
estabelecem avanços e recuos na construção do projeto educacional,
dependente das estruturas de poder dominante, e não da simples inserção
do novo ou da novidade.

70
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

A partir das reflexões dos autores, o ato de inovar na educação não se restringe ao espaço
escolar, além de reverberar na alteração de políticas públicas e na reorganização da realidade
comunitária e social.

Nesta mesma linha, Zwierewicz (2013, p. 173) ressalta que as práticas pedagógicas devem estar
voltadas para a realidade e necessidades da atualidade, com vistas:

[...] ao ser, à sociedade, à natureza, à vida, em um processo que não tenha


uma visão dicotômica do ensino, pois é “[...] necessário um novo pensar
capaz de estabelecer relações, vital para se formar um todo, víavel e visível
tanto no nível global como no de cada ser humano em particular".

Na busca por articular criatividade e inovação a serviço de ambientes escolares cada vez mais
autônomos e engajados com as novas tecnologias e demandas da contemporaneidade, apresentamos,
a seguir, resultados de pesquisas de diferentes autores, publicados por Mitjjáns Martínez (2003, p. 193),
que apontam as seguintes ações como possíveis gatilhos para um contexto fértil à criação e inovação
em sala de aula:

- formulação de perguntas interessantes e originais;

- questionamento e problematização da informação;

- percepção de contradições e lacunas no conhecimento;

- estabelecimento de relações remotas e pertinentes;

- proposição de várias alternativas e hipóteses ante os problemas


a resolver;

- solução inovadora de problemas;

- elaboração personalizada de respostas e proposições;

- procura de informações e realização de atividades que vão além das


solicitadas pelo professor.

Em consonância com a ideia de que a formação de professores deve contemplar práticas criativas
e inovadoras, Abrahão e Schmidt (2015) apontam a necessidade de considerar a criatividade como
eixo norteador do processo de ensinar e aprender, com o objetivo de estimular ações emancipatórias
dos sujeitos.

Em outras palavras, gerar condições para um espaço criativo nas escolas requer considerar nos
estudantes a capacidade de investigar, questionar, indagar, divergir, motivar, arriscar, vivenciar, construir
e transformar novas possibilidades de aprender e elaborar o conhecimento.
71
Unidade II

Diante deste contexto, as instituições de Ensino Superior devem ser o primeiro local de formação
docente para a criatividade e inovação. A este respeito, Castro (2015) ressalta a necessidade de os
formadores serem orientadores do processo criativo, enfatizando que os professores devem atrelar à
sua formação específica aptidões para lidar com ações experimentadoras que favoreçam conhecimentos
inovadores; a partir disso, faz as seguintes recomendações, as quais devem permear a prática docente
como manifestação criativa:

• Planificar e integrar o currículo dos cursos de formação docente com base nas dimensões da
criatividade e inovação.

• Trabalhar o caráter interdisciplinar, com proposta de integração de conhecimentos e transformação


do espaço escolar em um ambiente motivador, desafiador e estratégico.

• Promover práticas criativas que consolidem o ato educativo inovador, cujas resoluções de
problemas sejam colaborativas, dialógicas e originais.

• Utilizar estratégias que propiciem o pensamento crítico, a observação e a construção de


criatividade, elevando a qualidade do processo de ensino e aprendizagem.

• Promover intercâmbios de vivências entre os docentes de diferentes cursos da própria instituição


e de outras, através de eventos diversos para promoção de metodologias inovadoras.

• Trazer para o campo da pesquisa e extensão a temática da criatividade e inovação, a fim de


fortalecer a formação de professores e a participação engajada dos futuros profissionais das
demandas da sociedade atual.

As recomendações apresentadas reafirmam a relação da inovação com a qualidade e o engajamento


da educação, considerando seu caráter histórico‑social pautado em atitudes que confiram conhecimentos
produzidos além dos padrões escolares, assim como procedimentos pedagógico‑formativos que se
expressem através das (re)configurações dos saberes e diminuição de dualidades, como teoria/prática,
popular/erudito, científico/popular, ciência/cultura e educação/trabalho.

Segundo Carneiro (2013), currículos desvinculados com a realidade, práticas pedagógicas


desassociadas do contexto crítico e colaborativo, assim como a vida escolar rotineira desmotivam os
sujeitos, prejudicando o processo de criatividade.

Diante disso, é preciso resgatar, nos cursos de formação de profissionais da educação e nas práticas
de sala de aula, o trabalho em equipe, além de momentos que oportunizem a discussão, o debate, o
planejamento e tomadas de decisões, a fim de contemplar a diversidade de opiniões, vivências e a
construção criativa e inovadora do conhecimento (RAJADELL, 2012).

Trataremos na sequência acerca da necessidade de reconhecer a criatividade como um dos caminhos


possíveis para a emancipação de quem ensina e de quem aprende.

72
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Exemplo de aplicação

Que tal propor uma prática que tenha como base criatividade e inovação? Procure elencar as etapas
e observe o que está coerente com a resolução de problemas e abertura ao novo.

Segundo Martínez,

A criatividade no processo de aprendizagem escolar implica operações e


estratégias que se caracterizam pela transformação personalizada dos
conteúdos a serem aprendidos, processo no qual emergem sentidos subjetivos
que, de forma recursiva, alimentam o processo de aprender criativamente
(MARTÍNEZ, 2006, p. 90).

Consequentemente, pensar criatividade durante a aula é conceber o processo de ensino e aprendizagem


além do espaço físico da sala, criando este ambiente como potencializador de trocas culturais e sociais,
“lócus que constitui um dos múltiplos desafios que o desenvolvimento das tecnologias da comunicação
e da informação propõe para os processos educativos” (MARTÍNEZ apud VEIGA, 2008, p. 127).

Ainda, de acordo com Mitjáns Martínez (2004, p. 21):

Considerar a criatividade como princípio funcional da aula significa que


a criatividade deve caracterizar as principais ações, as inter‑relações e a
subjetividade social dominante nesse espaço social, ou seja, que a criatividade
esteja presente de forma significativa nos processos sociorrelacionais e
especialmente nos processos educativos que nesse espaço acontecem. A
criatividade, dessa perspectiva, implica um funcionamento diferente daquilo
que tem sido dominante nesse espaço social.

A autora realizou pesquisas em Cuba, nos Ensinos Médio e Superior, na década de 1990, com o
objetivo de identificar ações sistêmicas sobre o uso qualitativo de criatividade em sala de aula.

Ao conjunto das referidas ações deu o nome de sistema didático integral (MARTÍNEZ, 1997), este
sistema propõe elementos fundamentais que podem contribuir para a mudança significativa da forma
tradicional e alcançar níveis elevados de criatividade em sala de aula, sendo eles:

• Atentar para a forma de trabalho com os alunos, desde a formulação e seleção de


objetivos de aprendizagem até estratégias metodológicas que contemplem autonomia,
criatividade e inovação.

• Selecionar e organizar habilidades e competências, destacando possíveis características criativas.

• Organizar o processo de ensino e aprendizagem em um contexto desafiador, mediado, e propor


vários caminhos para as subjetividades dos estudantes.

73
Unidade II

• Considerar a natureza das tarefas a serem realizadas dentro e fora da sala de aula, com
orientações claras e oportunidade de acatar questionamentos e encaminhamentos dos estudantes
durante o processo.

• Contribuir para a relação professor‑aluno a partir de um clima dialógico, interativo, emocional e


criativo, favorecendo processos de aprendizagem e desenvolvimento.

Tais elementos não devem ser considerados como prescrição para o trabalho criativo na sala de
aula, mas como pontos de partida para sensibilizar professores e estudantes no trabalho associado à
criatividade e inovação das práticas pedagógicas.

Dito de outra forma, estamos diante de possibilidades de realização de transformações significativas


no trabalho dos profissionais da educação, fundamentação e exemplificação de como o ato educativo
pode desenvolver o sistema didático integral (MARTÍNEZ, 1997).

Segundo Baptista (apud VEIGA, 2008, p. 88), é “possível ensinar criatividade na medida em que se
estimula, motiva e/ou facilita o pensamento criativo do aprendiz”. No entanto, é preciso que o professor
seja o primeiro a experimentar as múltiplas oportunidades que permeiam o ser criativo, apropriando‑se
ora de vivências espontâneas, ora de técnicas para o desenvolvimento da criatividade.

Nesta perspectiva, a construção do conhecimento com base na dimensão criativa envolve as


seguintes fases:

1 2 3 4 5

INSIGHT PREPARAÇÃO INCUBAÇÃO ILUMINAÇÃO VERIFICAÇÃO


Observação Observação do Raciocínio e Revelação Momento de conferir
do meio com problema, aspectos elaboração da solução e avaliar a validade da
curiosidade negativos e relações de conexão. criativa de iluminação. Finalização
e interesse de proporção Intuição ativa forma repentina da ideia criada

Figura 20 – Fases do processo criativo

Adaptada de: Baptista apud Veiga (2008).

74
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Exemplo de aplicação

Pense em uma atividade que considere criativa, depois busque identificar as cinco fases do
processo criativo.

As fases destacadas anteriormente reafirmam a criatividade como conceito inerente aos


indivíduos, assim como responsável por estimular estratégias para resolução de problemas e
aprendizagem contextualizada e significativa para os estudantes. Logo, Alencar (1995, p. 13) afirma
que “não basta ensinar o que é conhecido. É também necessário preparar o aluno para questionar,
refletir, mudar e criar”.

Por esta razão, a criatividade, como componente essencial do processo de ensino e aprendizagem,
pode alternar ou alterar o atual paradigma educacional, se considerarmos sua perspectiva formativa
como apontado por Petraglia e Vasconcelos (2017, p. 77):

O pensar sobre a educação requer uma mudança de mentalidade e de


posicionamento diante do mundo, portanto, uma mudança de paradigma,
uma nova forma de conceber a realidade de maneira a compreendê‑la em
suas múltiplas dimensões, de modo relacional e integrador.

A mudança de mentalidade pode estar relacionada à criatividade, pois ela propicia diversos olhares
sobre a realidade, assim como múltiplas concepções de compreender e agir sobre o mundo, em uma
integração entre saber e sociedade contemporânea.

Com isso, os cursos de licenciatura, cuja principal diretriz é formar professores, devem considerá‑la,
a fim de reconhecer o processo de ensino e aprendizagem como momento de interações ativas,
contextualizações de conteúdos, construção coletiva e colaborativa do conhecimento e articulação de
habilidades e competências que interfiram e transformem a vida social e cultural dos sujeitos (BAPTISTA
apud VEIGA, 2008).

Deste modo, contemplar a criatividade nos cursos de formação é estar de acordo com os
pressupostos de Nascimento (2013), que entende o ato de criar como propulsor da liberdade de pensar
e agir além dos padrões estabelecidos, apresentando, ainda, a característica de corresponsabilidade dos
sujeitos envolvidos.

Saiba mais

A fim de compreender como funciona a criatividade na aprendizagem,


leia a seguinte reportagem:

GAVRAS, D. Criatividade abre as portas para melhor aprendizagem.


Nova escola, 22 ago. 2018. Disponível em: https://bit.ly/2MKqWEy.
Acesso em: 27 fev. 2023.

75
Unidade II

A partir da perspectiva histórico‑cultural, a criatividade reafirma o desenvolvimento humano


com possibilidades de praticar ações personalizadas de pensar e agir, além de valorizar o processo
complexo de subjetividades na relação sujeito‑contexto, isto é, a confluência de saberes pessoais
e acadêmicos.

Em consonância com as ideias apresentadas, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),


documento prescritivo da ação pedagógica nacional e da política curricular da Educação Básica,
aponta a criatividade como elemento necessário nos currículos das instituições de ensino de
todo o país. Apresentamos, a seguir, os principais momentos em que a criatividade é requerida no
documento citado:

Quadro 10 – BNCC e criatividade

Contexto da BNCC Concepção de criatividade


Introdução Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências,
incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade,
Apresentação das para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e
10 competências para criar soluções (inclusive tecnológicas), com base nos conhecimentos das diferentes
Educação Básica áreas (p. 9)
Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com
diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seu acesso a
Direitos de Aprendizagem – produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas
Educação Infantil experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e
relacionais (p. 38)
[...] Educação Infantil precisa promover a participação das crianças em tempos e
Campo de Experiência espaços para a produção, manifestação e apreciação artística, de modo a favorecer
"Traços, sons, cores e formas" ‑ o desenvolvimento da sensibilidade, da criatividade e da expressão pessoal das
Educação Infantil crianças, permitindo que se apropriem e reconfigurem, permanentemente, a cultura,
e potencializem suas singularidades [...] (p. 41)
Campo de Experiência
Utilizar o corpo intencionalmente (com criatividade, controle e adequação) como
"Corpo, gestos e movimentos" – instrumento de interação com o outro e com o meio (p. 54)
Educação Infantil
Práticas contemporâneas de linguagem por parte dos estudantes podem ter lugar,
mas deve‑se ter em mente mais do que um “usuário da língua/das linguagens”,
Linguagens na direção do que alguns autores vão denominar de designer: alguém que toma
Ensino Fundamental algo que já existe (inclusive textos escritos), mescla, remixa, transforma, redistribui,
Multiletramentos produzindo novos sentidos, processo que alguns autores associam à criatividade.
Parte do sentido de criatividade em circulação nos dias atuais (“economias criativas”,
“cidades criativas” etc.) (p. 70)
Proporcionar uma cultura favorável ao desenvolvimento de atitudes, capacidades e
valores que promovam o empreendedorismo (criatividade, inovação, organização,
planejamento, responsabilidade, liderança, colaboração, visão de futuro, assunção de
Ensino Médio riscos, resiliência e curiosidade científica, entre outros) (p. 466)
Juventudes e Criatividade Esta etapa da escolarização deve ser desencadeada a partir de desafios e problemas
abertos e contextualizados, para estimular a curiosidade e a criatividade na
elaboração de procedimentos e na busca de soluções de natureza teórica e/ou
experimental (p. 551)
Utilizar, propor e/ou implementar soluções (processos e produtos) envolvendo
diferentes tecnologias, para identificar, analisar, modelar e solucionar problemas
Projeto de Vida complexos em diversas áreas da vida cotidiana, explorando de forma efetiva o
raciocínio lógico, o pensamento computacional, o espírito de investigação e a
criatividade (p. 475)

Adaptado de: Brasil (2018).

76
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Como é possível perceber, a BNCC traz em seu bojo a criatividade como elemento primordial para as
práticas pedagógicas e desenvolvimento dos educandos desde sua introdução, perpassando por todas
as etapas da Educação Básica.

Neste contexto, o uso proposto recorrente da criatividade supõe uma concepção do processo de
ensino e aprendizagem cujos sujeitos estejam engajados na produção de sentidos em uma relação
indissolúvel entre as unidades cognitiva e afetiva.

Por fim, é preciso considerar, valorizar e incentivar experiências criativas e inovadoras, estimulando
professores e estudantes a seguirem direções de transformação e ressignificações da educação e das
demandas sociais e culturais, que emergem dos espaços escolares. Um elemento que pode contribuir
para a criatividade e inovação são as Tecnologias Digitais da Comunicação e Informação (TDCI), uma
vez que “A tecnologia tem de ser compreendida como resultado da inteligência humana e, portanto,
há que se colocar a serviço do sujeito aprendiz e da educação” (OLIVEIRA apud VEIGA, 2008, p. 124).

Figura 21

Disponível em: https://bit.ly/3EHO5kF. Acesso em: 27 fev. 2023.

Ao contrário do que afirma o senso comum, a tecnologia precisa da ação humana, assim como
está a serviço dela. Em se tratando de educação, professores devem utilizar as novas tecnologias a
fim de tornar mais robusto e consistente o conhecimento, enquanto os estudantes precisam estar no
centro das movimentações tecnológicas para construção do conhecimento e inserção autônoma na
sociedade contemporânea.

Nesta perspectiva, as tecnologias da comunicação digital podem ser compreendidas como


instrumentos que potencializam a capacidade humana, revitalizam as práticas pedagógicas e
reconfiguram espaços e tempos nos ambientes escolares, ampliando e/ou agregando a produção cultural
gerada pela humanidade.

77
Unidade II

Como a imagem que abre nossa seção de estudos sobre a relação tecnologias e prática docente, é
preciso compreender que o uso de TDCI não traz o contexto tecnicista, mas reivindica uma preparação
do formador que esteja aberta às diferentes maneiras de ler o mundo, interpretar e interagir com a
pluralidade que se entrecruza nos meios cibernéticos. Desse modo, é urgente descobrir novas maneiras
de ensinar as pessoas a partir de informações processadas pelas interações oportunizadas pelas
tecnologias digitais.

Portanto, o contexto educacional e, consequentemente, de formação de professores, precisa


acompanhar as novas demandas do mundo digital, assim como a velocidade em que são apresentadas
as informações, revendo sua função social e a maneira de organização pedagógica para promover
formação e ensino de qualidade para todos.

Sobre a necessidade de ampliação da formação e papel do professor no contexto das tecnologias,


Moran (2015, p. 43) pontua que o docente reafirma seu papel de mediador do processo de construção
do conhecimento, articulando momentos presenciais e virtuais:

o professor continuará “dando aula”, e enriquecerá esse processo com as


possibilidades que as tecnologias interativas proporcionam para receber
e responder mensagens dos alunos, criar listas de discussão e alimentar
continuamente os debates e pesquisas com textos, páginas da internet, até
mesmo fora do horário específico da aula.

A partir dessas reflexões, fica evidente que as novas tecnologias na educação não desconsideram
o papel do professor, pelo contrário, enfatizam o protagonismo docente e sua função de mediar o
processo social e cultural da aprendizagem.

O autor ressalta, ainda, a necessidade de romper com velhas crenças que impedem a incorporação
das tecnologias digitais como aliadas ao trabalho docente. Em outras palavras, assim como o professor,
ferramentas digitais de comunicação propiciam aos alunos momentos em que possam criar, construir,
resolver problemas, pesquisar temas e caminhos que desenvolvam o pensamento crítico e autônomo.

Sobre tecnologia e educação, Bortolini et al. (2012, p. 142) apresentam uma importante contribuição,
ao afirmarem que:

É preciso, contudo, perceber a inserção dos recursos das tecnologias da


informação e da comunicação na escola para além da inclusão digital,
mediante a apropriação destes recursos enquanto instrumentos que
estendem a capacidade humana de armazenar, resgatar, explorar e divulgar
a informação [...] se apresentam também no espaço escolar como um
desafio no que diz respeito a observar, reconhecer, apropriar‑se e contribuir
para com a consolidação de uma nova cultura de aprendizagem, e para que
isso ocorra de maneira eficiente e eficaz o professor em sala de aula assume
o papel de um dos principais autores neste processo, tendo sua formação
grande influência para tal.
78
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

A assertiva dos autores acentua o desafio de harmonizar, cada vez mais, as metodologias do
professor e a cultura digital, ou seja, incluir práticas pedagógicas que utilizem as tecnologias para o
enriquecimento curricular, apropriação do conhecimento e formação integral dos estudantes.

Exemplo de aplicação

Pense em recursos digitais de interação ou criação de conhecimentos (redes sociais, aplicativos


educacionais), em seguida, escolha um deles e proponha uma situação de aprendizagem.

Em consonância com esta ideia, Behrens e Carpim (2013) pontuam que o processo educacional
requer evolução e compreensão de aspectos culturais da humanidade, o que exige, de formadores
e professores, atenção às mudanças de paradigma da ciência e da educação, como também
adesão, no ato educativo, de técnicas e inovações tecnológicas que integrem a complexidade das
relações humanas.

Dito de outra forma, o espaço escolar não ficará de fora das mudanças deflagradas pelo advento das
tecnologias digitais, uma vez que se trata de um espaço que forma indivíduos, os quais transformam
e são transformados pelo contexto no qual estão inseridos. Nesta perspectiva, Oliveira e Pereira (2018,
p. 3) apontam que a presença da tecnologia no ambiente educacional proporciona:

[...] a construção de outros saberes necessários para o bom desenvolvimento


das práticas docentes. E assim, passamos a perceber que já não são mais
suficientes os saberes científicos e pedagógicos (escolares) na carreira
docente, mas devemos verificar a necessidade de uma formação que contemple
também os saberes digitais, para facilitar o processo de explanação do
conteúdo visto em sala de aula, e que já não é o suficiente para a formação
intelectual do indivíduo.

A citação reitera a concepção de diversos saberes profissionais (TARDIF, 2014), como discutido
anteriormente, destacando a importância da inserção dos saberes digitais no processo de formação de
professores e nas práticas em sala de aula.

Consequentemente, as Tecnologias Digitais da Comunicação e Informação (TDCI) não devem


ser vistas como elemento secundário no processo formativo de professores e estudantes, mas
como inerentes ao cenário atual e à constituição de conhecimentos interligados, inventivos
e transformadores.

Segundo Faria (2004), o uso de novas tecnologias na atualidade atribui ao professor o papel de
inventor, no sentido de compartilhar com estudantes ideias e estratégias criativas durante o processo
de ensino e aprendizagem. Com isso, o seu papel consiste em:

79
Unidade II

[...] orientar e mediar as situações de aprendizagem para que ocorra


a comunidade de alunos e ideias, o compartilhamento e a aprendizagem
colaborativa para que aconteça a apropriação que vai do social ao individual,
como preconiza o ideário vygotskyano. O professor, pesquisando junto
com os educandos, problematiza e desafia‑os, pelo uso da tecnologia, à qual
os jovens modernos estão mais habituados, surgindo mais facilmente a
interatividade (2004, p. 1).

À luz da citação, fica evidente a proposta de uma mudança de postura do professor, isto é, atuação
compartilhada de conhecimentos em que sejam considerados momentos de interação mediada pelas
novas tecnologias.

Dito de outra forma, a transformação que estamos propondo não é radical e de substituição de
metodologias já exitosas, mas contempla o equilíbrio entre as abordagens didáticas e a inserção das
novas tecnologias no contexto de sala de aula.

Saiba mais
Conheça cinco recursos digitais que podem ser integrados à prática de
sala de aula (Plickers, Sway, Mentimeter, Padlet e GoConqr) no link a seguir:
ROCHA, J. 5 recursos digitais poderosos para você integrar às suas
aulas. Geekie, 19 ago. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3KDX1ev. Acesso
em: 27 fev. 2023.

A BNCC apresenta a importância das tecnologias digitais na competência 5 das 10 competências


gerais para Educação Básica:

• Competência 5 – Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação


de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares)
para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas
e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva (BRASIL, 2018, p. 9).

Como é possível observar, as tecnologias digitais de informação e comunicação estão alicerçadas em


três verbos, os quais se articulam de maneira progressiva: compreender, utilizar e criar.

Em outras palavras, a proposta é que todas as áreas do conhecimento, a partir de contextos e práticas
culturais, oportunizem aos estudantes momentos de investigação e compreensão de ferramentas e
ambientes digitais, passando pelo momento de utilização e concretizando‑se em criações que gerem
resoluções de problemas e encaminhamentos autônomos e inovadores.

Apresentaremos, no quadro a seguir, alguns exemplos de habilidades considerando‑se componentes


curriculares, para que você perceba a importância da inserção das tecnologias na prática pedagógica
do professor:
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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Quadro 11 – Habilidades no Ensino Fundamental


e Tecnologias Digitais

Componente Ano Temática Habilidade


curricular
(EF03MA16) Reconhecer figuras congruentes, usando sobreposição e
Matemática 3º Geometria desenhos em malhas quadriculadas ou triangulares, incluindo o uso de
tecnologias digitais (p. 289)
(EF03MA28) Realizar pesquisa envolvendo variáveis categóricas em um
Probabilidade universo de até 50 elementos, organizar os dados coletados utilizando
Matemática 3º e Estatística listas, tabelas simples ou de dupla entrada e representá‑los em gráficos de
colunas simples, com e sem uso de tecnologias digitais (p. 289)
(EF05MA18) Reconhecer a congruência dos ângulos e a proporcionalidade
entre os lados correspondentes de figuras poligonais em situações de
Matemática 5º Geometria ampliação e de redução em malhas quadriculadas e usando tecnologias
digitais (p. 297)
(EF04HI08) Identificar as transformações ocorridas nos meios de
Circulação de comunicação (cultura oral, imprensa, rádio, televisão, cinema, internet e
História 4º pessoas, produtos demais tecnologias digitais de informação e comunicação) e discutir
e culturas seus significados para os diferentes grupos ou estratos sociais (p. 413)
(EF05LP13) Assistir, em vídeo digital, à postagem de vlog infantil de
Português 3º ao 5º Leitura e Escrita críticas de brinquedos e livros de literatura infantil e, a partir dele,
planejar e produzir resenhas digitais em áudio ou vídeo (p. 121)

Adaptado de: Brasil (2018).

Como vimos, as habilidades podem ser compreendidas como estratégias metodológicas que fazem
a conexão entre conteúdos e aplicabilidade a situações que permeiam a sociedade atual.

Partindo da concepção de Mishra e Koehler (2006), as habilidades podem ser entendidas como
intersecção entre conteúdo, metodologia e tecnologia; os autores reforçam, ainda, que o uso de
tecnologias no processo de construção de conhecimento deve estar concatenado com objetivos
de aprendizagem. Nesta perspectiva, criam um modelo nomeado de TPACK.
Conhecimento
pedagógico
do conteúdo

C P

Conhecimento tecnológico
Conhecimento e pedagógico
T
tecnológico Conhecimento tecnológico e
do conteúdo pedagógico do conteúdo

Figura 22 – Modelo TPACK – Conhecimento tecnológico e pedagógico do conteúdo

Fonte: Mishra e Koehler (2006, p. 1025).

81
Unidade II

Recomendam, ainda, o uso do TPACK como premissa para pensar a integração pedagogia, tecnologia
e conteúdos, a partir de um contexto de interdependência à prática metodológica dos professores.

Assim, durante o processo de interseção dos três diferentes tipos de conhecimento, temos os
seguintes grupos:

• C – Conteúdo: ensino de determinado conteúdo.

• T – Tecnologia: utilização de recursos tecnológicos/digitais no processo de ensino e aprendizagem.

• P – Pedagogia: seleção de metodologias/estratégias para ensinar determinado conteúdo.

Diante deste contexto, é importante conhecer não só o conteúdo (C) a ser ensinado, mas quais
ferramentas (T) podem auxiliar na progressão da aprendizagem dele, e as estratégias (P = metodologia)
que podem viabilizar conteúdos e tecnologia (C+T).

Observação

Na teoria de Mishra e Koehler (2006), compreendemos a seguinte


equação do aprendizado:

C (conteúdo) + T (Tecnologias) + P (Metodologia) = Aprendizagem


do século XXI.

Diante das reflexões, compactuamos com as ideias de Almeida (2005), que não vê o uso da tecnologia
isolada durante o processo de ensino e aprendizagem, mas como instrumento que integra estudantes
e professores, conteúdos e metodologias, informação e conhecimento, em uma trajetória de vivências,
experimentações, criações e sofisticação das aprendizagens.

Nesta perspectiva, avistamos o profissional de educação na concepção apontada por Gatti (apud
VIDAL; MIGUEL,2020), ou seja, inserido no contexto educacional, alternando suas práticas em local
e nacional, contemplando a inserção global dos indivíduos, suas condições geográficas, sociais e
culturais e atendendo a heterogeneidade dos sujeitos e suas expectativas em relação à construção
do conhecimento.

Gostaríamos agora de compartilhar um quadro, a fim de ilustrar como as gerações representam, em


determinado tempo e espaço, significado, aprendizados e atitudes.

82
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Quadro 12 – Gerações e evolução tecnológica

Geração Período Principais características


Prezam pela estabilidade, como, por
exemplo, empregos fixos e estáveis. Apreciam
Baby boomers Nascidos entre 1946 e 1964 a qualidade de produtos e são pouco
influenciáveis às opiniões alheias
Possuem certa resistência ao novo, embora
busquem o conhecimento. Aprendem em
Geração X Nascidos entre 1960 e 1980 contextos de tentativa e erro
Seu método de pesquisa está relacionado às
bibliotecas físicas
Caracterizam‑se por fazer várias atividades
Geração Y ao mesmo tempo, como, por exemplo, ouvir
Nascidos entre 1980 e início música e estudar
Millennials da década de 2000
Seu método de pesquisa está relacionado a
buscas no Google
Possuem facilidade na utilização de recursos
Geração Z tecnológicos. Por vivenciarem a velocidade
Nascidos no início da internet, são impacientes, no entanto, são
Nativos digitais da década de 2000 habilidosos na leitura visual, mapas mentais
e projeções hipotéticas

Adaptado de: Fava (2014); Gabriel (2013).

Exemplo de aplicação

Ouça a música "Pela internet", de Gilberto Gil, acompanhando atentamente a letra. Em


seguida, liste os conhecimentos locais (tradicionais) e o conhecimentos digitais (inovadores).
Disponível em: https://www.letras.mus.br/gilberto-gil/68924. Acesso em: 27 fev. 2023.

83
Unidade II

Resumo

Nesta unidade, vimos que, para entender a didática em sala de aula, é


preciso ter claro que este processo está pautado na interação, no diálogo
e na ação coletiva dos indivíduos. Na concepção de Zabala (1998), o
processo ensino‑aprendizagem transcende os conteúdos e deve motivar
os estudantes a atualizarem seus saberes a partir da articulação entre
conhecimentos prévios e novos.

Com isso, é necessário compreender as várias correntes pedagógicas e


suas diversas concepções sobre o ensinar e aprender: a postura tradicional
traz o modelo de autoridade do professor, cuja aprendizagem se dá pela
memória; a postura escolanovista apresenta a figura do professor como
coordenador de ações e do aluno como indivíduo criativo; a postura
libertadora está alicerçada nas ideias de Freire e na prática do diálogo; a
postura tecnicista estabelece técnicas a fim de tornar o estudante eficiente;
a postura crítico‑reprodutivista propõe a mediação cultural do professor
durante o processo ensino‑aprendizagem; a postura histórico‑crítica
enfatiza a relação aluno e professor; e a postura construtivista apresenta o
propósito de trazer centralidade ao aluno durante o processo de ensinar e
aprender (VEIGA, 2008).

Apresentamos as várias posturas assumidas pelos professores,


também demonstramos a importância de conhecermos as várias
configurações da sala de aula nos mais variados contextos históricos,
sendo as principais: escola europeia (a sala surge de maneira tímida);
escola primária (a sala de aula surge como espaço de acolhimento);
ensino simultâneo (organiza a sala por idades e classes); método intuitivo
(destaca a sala como símbolo de renovação do período republicano
brasileiro); escola nova (concebe a sala de aula como espaço a serviço
dos interesses dos indivíduos); escola tecnicista (compreende a sala
como ambiente de qualificação de mão de obra); aula crítica (destaca a
sala de aula como espaço de emancipação das camadas dominadas); e
aula social/tecnológica (insere neste espaço instrumentos tecnológicos
para motivar a aprendizagem).

Outro ponto relevante é a ética em sala de aula, a qual deve permear


toda a prática pedagógica, uma vez que o ambiente escolar é um espaço
político em que se deslocam relações de poder.

84
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Segundo Rios (2011), a ética durante as aulas precisa propiciar


reflexões que associem conteúdos aos aspectos morais e sociais da vida
contemporânea dos indivíduos. Para isso, a autora aponta três dimensões
que têm de permear o trabalho docente: técnica, estética e política.

Além da ética, a organização didática necessita ser pautada no diálogo


entre os sujeitos e momentos que estimulem ações colaborativas e criativas.

Rajadell (2012) alegou que as salas de aula devem ser espaços inovadores,
cuja busca de conhecimento desperte curiosidade, imaginação dos indivíduos.
Em outras palavras, ele precisa considerar a criatividade humana, ideias do
simples ao complexo; e inovação, capacidade de organizar e transformar
boas ideias em produtos do conhecimento.

De acordo com Baptista (apud VEIGA, 2008), é importante considerar


as etapas do processo criativo: insight, preparação, incubação, iluminação
e verificação.

Por fim, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) apontou a criatividade


como elemento‑chave para práticas pedagógicas e apresentou as TDCI como
potencializadores de contextos criativos e inovadores em todas as etapas
da Educação Básica.

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Unidade II

Exercícios

Questão 1. Em relação às várias correntes pedagógicas, avalie as afirmativas.

I – Na corrente pedagógica tradicional, o professor é a autoridade responsável pela transmissão dos


conhecimentos, feita por meio de aulas expositivas e da realização de exercícios repetitivos.

II – Na corrente pedagógica escolanovista, o estudante ocupa o núcleo do aprendizado e é encarado


como um ser autônomo e apto a conquistar o saber.

III – Na corrente pedagógica histórico‑crítica, há a visão de que a escola é determinada socialmente,


de modo diferente do que se propõe na postura crítico‑reprodutivista.

É correto o que se afirma em:

A) I, II e III.

B) I, apenas.

C) II, apenas.

D) III, apenas.

E) I e II, apenas.

Resposta correta: alternativa A.

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DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Análise da questão

Veja, no quadro a seguir, uma adaptação do que é apresentado por Veiga (2008).

Quadro 13 – Ensinar e aprender segundo as correntes pedagógicas

Tendências Período Características


O professor apresenta‑se como
modelo de autoridade a ser imitado
Postura Anterior à pelos estudantes. O processo
Tradicional década de 1920 ensino‑aprendizagem é pautado na
memória e na simbologia hierárquica –
Professor/Cultura/Aluno
O professor coordena as ações do
Postura A partir da aluno, que deve se expressar com
Escolanovista década de 1920 criatividade e liberdade
O professor, pautado nas ideias
Postura Final da década freirianas, estabelece um diálogo
Libertadora de 1950 problematizador, em que todos se
educam concomitantemente
O professor, pautado nas premissas de
Postura Final da década Taylor, estabelece ações e técnicas que
Tecnicista de 1960 visam a tornar os estudantes cada vez
mais eficientes
O professor realiza uma mediação
cultural durante o processo
Postura Início da década ensino‑aprendizagem, em que a
Crítico‑Reprodutivista de 1970 interlocução com o estudante não
é priorizada
O professor segue um caminho
diferente do que se coloca
nas posturas Escolanovistas
e Crítico‑Reprodutivistas,
Postura Final da década propondo uma aproximação de
Histórico‑Crítica de 1970 professor‑estudante durante o processo
ensino‑aprendizagem. Trata‑se de uma
postura que parte da visão de que a
escola é determinada socialmente
O professor, com base na teoria de
Piaget e Claparède, representantes
Postura Desde a década do Escolanovismo na Europa, busca
Construtivista de 1920 revitalizar a centralidade no estudante
durante todo o processo de
ensinar e aprender

Adaptado de: Veiga (2008, p. 58‑72).

87
Unidade II

Questão 2. Leia a charge e o texto a seguir.

Figura 23

Disponível em: https://bit.ly/41uFXxF. Acesso em: 25 jan. 2023.

A moral e a ética no desenvolvimento das crianças – a imposição moral e ética

Assis Ribeiro

Yves de La Taille, psicólogo especializado em desenvolvimento moral, fala sobre como, apesar
da crise por que passam, sobretudo na família e na escola, a moral e a ética continuam a ser pontos
fundamentais na educação e desenvolvimento das crianças. Educar. Palavra de apenas seis letras
que traz consigo um amplo leque de responsabilidades que deixa qualquer pai ou educador que
se proponha à árdua tarefa de ensinar uma criança a trilhar os caminhos do mundo inseguro.
A violência, a falta de respeito e o individualismo — algumas das marcas registradas dos dias
atuais — levantam questões sobre como andam e como transmitir dois conceitos fundamentais da
boa educação e do convívio social: a moral e a ética.

Para La Taille, a situação do mundo hoje é paradoxal. “De um lado, verificamos um avanço
da democracia e do respeito aos direitos humanos. Mas, de outro, tem‑se a impressão de que
as relações interpessoais estão mais violentas, instrumentais, pautadas num individualismo
primário, num hedonismo também primário, numa busca desesperada de emoções fortes,
mesmo que provenham da desgraça alheia”, afirma [...]. Segundo ele, a crise moral e ética atinge
tanto a escola quanto as famílias, e uma empurra a responsabilidade da educação das crianças
para a outra. “Muitos professores acusam os pais de não darem, por exemplo, limites a seus
filhos, e muitos pais acusam a escola de não ter autoridade e de não impor a disciplina”, diz.
Mas completa que tanto uma quanto a outra têm grande responsabilidade no desenvolvimento
moral e ético das crianças.

88
DIDÁTICA E FORMAÇÃO DOCENTE

Em sua entrevista, coloca que a definição de moral e ética é muito discutida atualmente [...]
moral é o conjunto de deveres derivados da necessidade de respeitar as pessoas, nos seus direitos e
na sua dignidade. Logo, a moral pertence à dimensão da obrigatoriedade, da restrição de liberdade,
e a pergunta que a resume é: “Como devo agir?”. Ética é a reflexão sobre a felicidade e sua busca, a
procura de viver uma vida significativa, uma “boa vida”. Assim definida, a pergunta que a resume é:
“Que vida quero viver?”. É importante atentar para o fato de essa pergunta implicar outra: “Quem
eu quero ser?”. Do ponto de vista psicológico, moral e ética, assim definidas, são complementares.
É possível vivermos sem moral e ética? A situação parece‑me de certa forma paradoxal. De um
lado, pelo menos no mundo ocidental, verificamos um avanço da democracia e do respeito aos
direitos humanos. Logo, desse ponto de vista, saudosismo é perigoso. Assim, penso que, neste clima
pós‑moderno, há avanços e crise. É como se as dimensões política e jurídica estivessem cada vez
melhores, e a dimensão interpessoal, cada vez pior. Agora, como não podemos viver sem respostas
morais e éticas, urge nos debruçarmos sobre esses temas. De modo geral, penso que as pessoas
estão em crise ética (que vida vale a pena viver?), e essa crise tem reflexos nos comportamentos
morais. A imoralidade não deixa de ser tradução de falta de projetos, de desespero existencial ou
de mediocridade dos sentidos dados à vida [...].

Adaptado de: https://bit.ly/3EHPE21. Acesso em: 27 fev. 2023.

Com base na leitura, avalie as asserções e a relação proposta entre elas.

I – Ao mostrar que os estudantes chegam à escola sem noções de ética e de moral, a charge opõe‑se
ao texto, que afirma que tanto pais quanto professores são responsáveis pela formação da criança.

porque

II – Segundo o texto, a moral refere‑se a comportamentos socialmente preconizados, e a ética


relaciona‑se à reflexão sobre o modo de viver.

Assinale a alternativa correta.

A) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira.

B) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira.

C) A primeira asserção é verdadeira, e a segunda é falsa.

D) A primeira asserção é falsa, e a segunda é verdadeira.

E) As duas asserções são falsas.

Resposta correta: alternativa D.

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Unidade II

Análise das asserções

I – Asserção falsa.

Justificativa: a charge não faz oposição à ideia desenvolvida no texto de que tanto pais quanto
professores sejam responsáveis pela formação da criança.

II – Asserção verdadeira.

Justificativa: segundo o texto, “moral é o conjunto de deveres derivados da necessidade de respeitar


as pessoas, nos seus direitos e na sua dignidade. Logo, a moral pertence à dimensão da obrigatoriedade,
da restrição de liberdade, e a pergunta que a resume é: ‘Como devo agir?’. Ética é a reflexão sobre
a felicidade e sua busca, a procura de viver uma vida significativa, uma boa vida. Assim definida, a
pergunta que a resume é: ‘Que vida quero viver?’. É importante atentar para o fato de essa pergunta
implicar outra: ‘Quem eu quero ser?".

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