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C yd NX Ie as Ke f Mario de. a, ll POESIAS COMPLETAS ila Zanoto Mant EDITORA ITATIATA XN BeloHorizomte ABS 4 ~ den’ Erne Dados de Calpain publ (TP) nmin (Can Brasterado Livin, PBs) 36H Posas comple Mio de Anite: cicinericade Dia Zante Mana Belo vert hate 208, (Ota comple de Miso de |, Pesaran, Mao, Di Zan. HU, Sie, loroeas eop-seoais Indices pr cues |. Poel: Sul 20 Lissa asia 869915, 2 steulo 20: Paes: Brann 863.915 200 Direito de Propredade Literivia adquiridos pela EDITORA ITATIAIA, Belo Horizonte Impress no Brasil Printed in Brazil EM BOA HORA Poesias Compleras representa, quando da primeira edicio em 1955, dez anos apés a morte de Mario de Andrade, o cum. primento de um projeto dele, integralizando, nas Obras Com- pletas, 0 faver postico a partir de Paulicéia desvairada, de 1922, 0 que vem antes, a estrdia prémodernista resguardada pelo psetiddnimo Mario Sobral — Hd uma gota de sangue em ‘ada poema — 0 autor a deposita na coletinea Obra Imatura ‘Coma acontece diversas vezes na produgéo de Mario, um livro presente em listas e até anunciado como "em prepara”, pode fer interrompido, cedendo lugar a outros textos, os quis, por rrzBes em geral desconhecidas, sio terminados com priorida de, Além disso, a ordem proposta para as Obras Completas, ‘que em 1942 a Livraria Martins comeca a imprimir, nfo signi fica seqigncia na publicagio. O empalhador de passerinho , volume XX, fica pronto nesse ano e Possias Completas, 0 se jgundo, mantém-se em compasso de espera em 1945, para quan- {o, alias, esté previsto, fora da colegdo e com o mesmo editor José de Barros Martins, Lira Paulistana seguida de O carro da ‘Miséria. E em 45, pouco antes de morrer, 0 poeta esta as vol tas com Café, destinado & obra reunida. Este assunto engloba ainda Poesias de 1941 (Martins), selecio de Paulictia desvaira dda, Losango cégui, Cla do Jabut e Remate de Males ¢ aparec mento inaugural de A costela do Gra Cao e Livro Azul. Em Poesias, Mario de Andrade far alteragbes nos quatro primeiros livros; em Cla do Jabuti, screscenta aos poemas eseritos em Campos do Jordio, 0 "Soneto do Homem Moria”. Esse mesmo Poesias ganha depots o “exemplar de trabalho”, isto ¢, refusio “CAFE” CONCEPCAO MELODRAMATICA Sio Paulo, 1933 - 1939-1942 a Liddy Chiaftareli PRIMEIRO ATO — PRIMEIRA CENA PORTO PARADO Desde muito que os donos da vida andavam pertur- bando a marcha natural do comércio de café. Os resul fados foram fatais. Os armazéns se entulharam de milhoes dde sacas de café indestinade. E foi um crime nojento. Mandaram queimar o café nos subsrblos escusos. da Cidade, nos ‘mangues desertos, A exportacao decresceu tanto que 0 porte quase parou. Os donos viviam no ter se agtientavam bem com as sobras do dinkeiro ajunta fo, mas e os trabalhadores, e os operarios, € 0s colonos? [A fome batera na terra tio farta © boa, Os jomais acon: Selhavam paciéncia ao povo, anunciavam medidas a tomar. Futuramente. A inquictagio era brava e nos peitos dos stivadores mais sabidos do porto parado, nua hesita- ‘so desgracada, entre destnimos, « colera surda esbrave java, se assanhavam os desejos de arrebentar ‘A orquestra, de sopetao, est agitadissima, desagra devel, quase tho lrrespiravel como o turbilhio que agita interiormente os estivadores. O pano se ergue ripido no armazém do porto. O armazém esta sombrio, apenas no fundo a fresta da vasta porta de correr. As pilhas de sacas de café sobem até 0 teto no fundo, dos dois lados. NNa frente, as sacas se amontoam mais desordenadas, as ‘quatro, as tres, outras sozinhas, Sobre elas, deitados, sen {ados, aos grupos, os estivadores quase imévels esperam, Mais deixam raivar 0 turbilho que tém do peito do que aot cexporam, esperar 0 que! A um lado, junto & ibaa, um {ipo deles no chao quer matar 0 tempo no jogo do {ruco. A'vestimenta de todos én mest, algas Ccuras, larga, © as camisas de mela com lista vivainente clo: ‘dss, verinelho ebranco, azul marinho e Branco, amarelo ¢ ono, verde ¢ encarado” Eta alga de weudo corde. haruto denuncia um espanol, asim como a boing que tle trax. Ents bigodes ho eativador gordo, denunciario © portugues. Tem a palheta de batida deste rapae amula tate dois negon de cabesa a0 vento, enorme, Iiindo ‘Gs frenta da porta do fondo entra als um estivadr. ‘Vem desanimado, lento, lerdo, se arrastando até o centro ds cena. jormal-que tinham mandado ele buscar nao, troure noticla nenbuma e ele o arasta no chlo, da mo Pendida, Todos os estvadores se inerssam. pelo que {ira o recemetiegado, mas cle nem fal, cotta, fae tim {gto x6: amarfana o joral de paolagem eo ara com ‘ojo po cho. Eo desinimo agora sbafa a todos, mats Compete Agus homens ores org bray te Sentom feito erancas na decisao a tomar. Como seré Slvel que agucla terra dees, sempre to alia, tie pene: Tosa também, tenha perdido assim o seu porte de gran deva?_” O-que farer,apors que o caf est bao, sem ‘alo. E mano, melanciico, sofido © queinume daquces hhomens fortes enche 0 bojo.sombrio. do armazém, smorre num abafamento implacivel. Talvez Fosse milhor ‘orrer... E os extivadore se eliram por a, na fraquera ul da pasmaccira. Os Jogadores voltart a seu truce die fargador, Fosse domingo rian ser sugadoslntelramentc de suas forgas morals, no futebol apataonante, que "so, os generosos donos da vida nto se esquecem de arranjr E ainda um ftallano o rapar da palhcta se adormecom no jogo da morra.E parece que naga vat suceder Mis ci que dat mulheres de repene eopiam pela frost da porta, Sbo elas sim, 80 on compantoios que elas andartm buscando pelos botequins do cals Mas portuga do boteco deu 0 basta no fada e eles vieram al. rime, cove & porta do aren {oda's extensdo. E agora se enterga bem nitido 0 porto parado, a linha reta do cals vazio, verde gasto do mar varo, ¢ um céu claro, branquigado, sem nuvens, da mes: ma impassivel desolagzo. Eo grupo agitado de umas vinte mulheres corre pars ‘centro da cena. Esto quase delirantes,nzo podem mais, 6 filhos choram em casa pedindo pao, clas também estio famintas, eos maridos, os companheiros, © que fazem? Os seus vestidos femininos de fazendas lavradas, botam luma nota turbulenta e multicor no ambiente. "Eu quero fo meu pio!” que elas gritam, quase desvairadas.. Mas aqueles homens, amolentados ainda pela indeeisio, num ‘desalento cinico nao tém mais esperanca em nada. "Quem pode dar pio”, eles murmuram, ecoando em cinza de 260, 0 grt0 vive das mulheres. ‘Quem pode dar pio?... 0 café pode dar pio, Sem: pre dera 6 pio, a roupa e a paz relativa dos pobres. Mas agora aguele companhelro generoso de outros tempos, jaz ali iit, vazio de forga, como 0 eas, como 0 porto: Vario, Eas mulheres e or homens, numa alucinacio, contemplam as pilhas mudas de sacas. Eles amam, sem: pre amaram aquele café paterno, que agora parece falhar. Mas ainda hide estar nele a salvagdo de todos. AS mu Iheres se aproximam das sacas, se abragam com elas, contando os seus sepredos de miséria, acarinham 0 gro pequenino que nao falhard. E o grio pequenino Thes se freda 0 segredo que eles ndo se animavam a se revelar. AAqucla forme que cles sentiam nao era apenas uma fome de alimento, mas outra maior, a fome milenar dos sub jugados, fome de outra justica na terra, de outra igual: ‘dade de direitos para luiar e vencer. E 0 pano desce lentamente, dando tempo a que segredo que a cena revelou, se grave para sempre no ‘oragi de todos os oprimidos, SEGUNDA CENA A. COMPANHIA CAFEEIRA, S.A. ‘Também noutras partes daquelas terras a fome ¢ a angistia vai feroz. A orquestra, muito triste © abafada 403 chega coleando, fazendo esforgo pra saber o que seri da fxistencia, Mas els que se aclara porgue o pano sobe nos dando o eéu claro das dez horas da mana, cafezal pleno. ‘A cen mostra uma encruzinhada de carreadores, vo. res ja taludas, com oito anos, saias grandes pousando ha terracroxa. Na ponta dum dos carreadores esta uma fanjeira carregadinha de fruta madara, Eo nico gesto de altura, vivo de cor, variando os horizontes longinguos, largos, levemente ondulados no edlebre cafezal da Com: panhia Cafeeira S.A 0s colonos estio por ali, terminando de almocar. E facil de pereeber dade ¢ condigso deles pela roupa. AAs mogas solteiras estao de vestido vermelho, cor sexual de quem deseja homem na vastidao dos campos. Os rapa- ves Jno querem mais a cassa das camisas bordadas, com que os pais deles cheyaram da Europa bestia das aldeias, Estio de azulso vivo, e algum jé tera seu chapéu e cauboi, aprendide no cinema, As mulheres casadas, te lembram a "Colona Sentada” de Candido Portinari,« sala de um vermelho ja bem gasto e lavado, aquela espécie de matiné largo de um azul quase cinza, bem neutro, & 0 Tengo tambem de vermelho gasto, protegendo ot cabelos. Os seus maridos, calgas de brim cinzento que aglienta @ semana, camisas’brancas, sem brancura. As velhas est80 de preto completamente, e os velhos estio ridicules, com suas caleas grossas, muito largas, pardacentas, e aqueles blusoes de Cores que foram vivas, rosadas, amareladas, esverdeadas. As meninolas de vermelho, «08 menines da cor do chao. Pois um destes nio se conteve. Percebendo que todos estavam distraidos na arrumagio dos badulaques do almo- 0, roubon uma laranja da drvore, a furou com 0 dedinho vai chupésla. Uma velha viu, mostra o menino a outra [lids varios colonos viram, mas fingem que no: que 0 fanimalzinko sprenda por si. Eo menino, se imaginando livre de olhares, chups fruta com ansiedade, Faz uma eareta e joga a Taranja Tonge, enquanto velhos e velhas feaem na risada. Agora o bobo vai fiear conhecendo pra sempre o provérbio da terra: "Laranja no café ¢ azeda ou tem vespetr Mas a mocidade e os casados, menos filésofos pra se divertirem ‘com os provérblos da experiéncia, J agar raram no trabalho da colheita. Nada dispostos, als, me tanizados, fatalizados apenas pela obrigagSo, 0 almogo fol insuficiente, ja de muito que os colonos nao recebem pagamento, ocalé pra nas estagSes do trem de ferro, 0s Armazéns no fiem mais. A visto da fome espia nas ‘esquinas dos carreadores, Os velhos enfim se decidem @ trabalhar também, Mas imediatamente Ihes volta a du: reza da realidade © um deles, num assomo de desabafo ‘20 menos fisico, coga a cabeca com raiva € dé um pon: {apé na saia da arvore que devia colher. Ora sucedeu que justamente no Instante do pontapé, chegavam pela boca esquerda da cena, os donos da Com. panhia Cafeeira S.A. € os comissdrlos. Exdonos alids, porque se vendo na possibilidade de curtir alguns anos fastando o que jé tinham amontoado, eles acabaram de ‘entregar a fazenda aos comissdrios, como pagamento de divida, E gente bem vestida, esta claro, vestindo brim do bom, 86 que os comissirios estio de “brim de linho S. 120", como se diz, branco, corte de cidade, pra luzir nos ceseritorios e na bolsa, Os donos ainda trazem o brim ‘qui, de Fazenda, calga de montar, polainas bem engra- xadas, chapéus largos, panama legtims. Bsquecidos de que a fazenda }é nio thes pertence mais, ficam indignados com o velho e a colheita distratse dls, passam pito, Os colonos vBo pra baixar a cabesa, mas as mulheres, sempre a mulher que € mals perfeita, inter vem irritadas, desesperadas, a discussio cresce rapida, se azeda. Tem um momento em que tudo esté pra estourar Os colonos vio perder 0 tino, vio “amassar” aqueles senhores impiedosos que nao arranjam nada, no querem pagar 0s ordenados de meses, pouco estio se amolando com a fome des pobres. E um instante breve de siléncio faguele da decisao. E os donos se preparam também pra brigar, buscando sem disfarce os revolveres no bolso tr selro da calga ou da cinta. Qual, assim nio vai mesmo rnem adianta: 0 milhor é abandonar a fazenda, desistir ddaquela espera improvavel, ir buscar pio onde ele se fesconder. E os colonos anunciam que abandonario & fae 405 zenda. Nao era isto exatamente © que os senhores que- Fain. Querfam era a submissio, a sujegao total. Em todo Caso livraram as epidermes, e aproveitam a decisio dos ‘olonos pra Tugir dali, um bocade apressadinhos ni tem ‘avida, mas bancando gestos de Indignagio, 'E agora os colonos estio sos, Estio consiga de novo, a orguesira com eles, cai na realidade terrivel. Acaso no teriam sido precipitados por demais?... Eo desem- prego, €o caminhar nas estradas do acaso, é 0 bater nas portas, €0 mofar na impledosa indiferenga das cidades, Se sentem inetmes, desprotegidos, inspazes. Tém a nogio muito vaza ainda de que tudo € um erime iniame. Nao po- derdo gritar. A pocira dos caminhos vai secar a vor nas jgargantas. Ou poderio gritar! Nao sabem, ndo conhecem, ‘io entendem, Parece que tem momentos nesta Vida dura mente se revollar, mas porque uma forgs maior move a enle cs fics sri aparade mals pra rio se Toole “fs vetha je partir en busca da colin ata Se tastes, suas trouxas, As mulheres casadas principiam par tindo também. Melancolicamente. E 0 pano cai depress, bbem depresss. SEGUNDO ATO — PRIMEIRA CENA CAMARA-BALLET E bem dificil explicar, © que teria levado © autor & invenedo subitinea deste “Camara-Ballet”, que até pelo home, Ja denuncia a sua intengao de vaia’ E possivel se rer, se deve crer numa humanidade to elvilizada que permita a existéncia de cimaras eficazes. E afinal $40 Sempre cimaras a cachimbada dos Velhos na tribo at ‘alas improvisadas dos sovietes, Por isto, a intengio de “Cimaraballet” se limita, ¢ vaia, mas por tudo quanto de falsifieagio e de ridiculo, os andes subterrancos do ser- vilismo, fizeram das cdmaras que a historia conta, Incl cientes,traidoras e postas a0 servigo dos chefes. ‘Estamos em plena farsa, e até 0 pano “Tarseia”, nfo a querendo subir, caindo de repente. Os personagens sio Virios, pois o enredo cai em cheio numa sessio de cémara de deputades. 1 € por tris dela se ve as ban bbranguinko dum branco alvar. Ao passo que todos os personagens da cimara estio de preto. Mesa e deputados fe sobrecasaea, e tim plastron gordo com uma enorme pérola branca de enfeite. Os serventes também de proto, com botoes de prata no dolms. E os jornalistas? Si os Serventes 530 cinco, de pé, do lado direlto da cena, na ‘mesma linha da Mesa, na mesma linha ainda da Mesa sas do outro lado, os jornaistas também sho cinco, se tados em cadeiras enfileiradas, uma atris da outra, Sucede que as cadeiras jornalisticas estao de perfil pro piiblico, néo deixando por enquanto ler o titulo do jornal 42 que cada uma pertence, por honra e graga inusitada dessa forga enorme e to facilmente servil que € 0 jomal. Ora os titules dos jornais da terra, que se ferguem do encosto das cadeiras, sio 0 Patativa, Didrio da Luz, O Clarim, O Presidente e-0 Jornal das Modas. Os jor nalistas também se vestem seriamente de preto, mas nso lusam sobrecasaca mais, si0 modernos, Usam tm palito: zinho eurto, ealgas apertadas ainda mais curtas acabando ‘um palmo acima do tornozelo, deixando ver as lindissimas metas braneas de sea © os escarpins de verniz. E quanto a gravatas airosamente, os jornalistas s6 aceitam enormes gravatas corderosa, com um lago borboleta bem pintor, Sho lindos. Francamente, esse tal de jornalista éum amor, Como se vé, tudo 6 branco e preto, O que vai variar de colorido muito € 0 pessoal das galerias, que serd 0 mais berrantemente colorido possivel. Repeto-se as cami sasddemeia dos estivadores, 0 azulgo proletéeio, del ‘quepes, 0 caqui de um soldado-raso. Mas as mulheres, aor & 408 :muitas ¢ também com tons vivos, sero fazendas lavradas, fazendas de ramagens, fazendas “uturstas” com desenhos abstratos de multas cores berrantes. Nada de tecido duma cor 86. Logo se pereebera porque, E da mesma forma que o presidente e o Vice, alguns personagens tém seus nomes distintivos, Tem por exen- plo, o Deputsdo do Som-S6, 0 Deputado da Ferrugem, 0 Deputado Cinza eo Secretario Dormido. 2 Deputado do dos de magnatas © banquetes of 0 Quinteto dos Serventes, Eeste ¢ que acaba musicalmente porque o Deputado do SomSé nio scabaria nunca, si nio forse entrar o Deputadino da Ferrugem, muito novo ainda, filho. de chefe politic nio ha duvida, com ar de quem descobris 4 polvora. Nio vé que tendo estudado direto e se forma do em nove anos ripidos, percorreu o Corpus Juris e toda 2 legislacdo existente, e com assombro (Is dele) descabrie ‘que ainda ninguém nio leyislara sobre o fnelito fendmeno dda ferrugem nas panelas de cozinha, E decidiu salvar @ pétria. Se fechou Seis meses a flo ntim cabaré, 6 saindo pra comer dinkeiro piblico na cimara, e escreveu um Aliseurso de embolada maravilhoso sobre o dito assunto, Ele € que entrou pimpante, na emocio gavotstica da estréia felicissima gue os jornals J elogiaram. Esté claro, ‘durante todo o bailado ¢ um entra-esal de deputados que nfo se acaba, Ao passo que as galerias vo se enchendo ouco a pouco e quando arrebentar a bagunsone, estar repleta, Pois o Deputadinho da Ferrugem esta louco pra falar, mas quem disse © Deputado do Som-S6 dar fim a0 lero 96 lero. Agora todos acordaram, menos o Secretério Dorm dl, sempre de brugo, sonhando sobre a mesa. O resto nio, ‘quer escutar a estrdia do Deputadinho da Ferrugem. Os jornalistas aspiram tomar muitas notas. Pegam do chio, 0 lado, os seus magos de papel pra notas, que pelo mago o tamanho server também pra outra coisa, © os lapis, ‘gue lapis! desses pigantescos, feitos pra amtinclo nos mos tradores das papelarias, Mas vamos ter 0 discurso, porque entrou um poliela muito lindo, até polainas brancas, batew hho ombro do Som-S6 ¢ fer pra ele parar. Ele para que & 5 pm isso mesmo que ele existe e principiara dobrando do que mals dobrando até o fim do ppuladinho da Ferragem fala enfim. Fala bem, fala verdade, e € tio gostosa a fala “andantino grazioso” dele, ‘que entie splausos e gostosa salisfagio toda a cémara fentra no movimentinho suave se movendo pendulamente {e cf pra la, de la pra ch, Menos © povo das galerias que procura saber 0 que se decide da vida. Um operatio Se contém afinal, "Prague falar em ferrugem de panela, si nfo tem 0 que cozinhar!” ele estoura. Outros querem {que se trate do problema do cafe. Os deputados se com- troriam muito, 0 presidente bate no sino enorme. Ora, no principio do discurso da ferrugem, 0 Secretirio Dor ‘mido, que j4-estava cansado da posigio, se aninhara no colo do secretirio seu vizinho e lhe dormira no ombro. Mefo que scorda com a baguneinha do povo, muda de po- sigfo otra vez. Se ajoelha no chio, com a bunda nos calcanhares e se debra no assento da sus propria cadet ra, af pondo sobre os bragos, a eabeca dormida ‘Ora nos bastidores estava esperando que 0 discurso ‘acabasse 0 Deputado Cinza, Nao gue pretendesse fazer 0 diccurso também, no ve que ele fa se comprometer, Mas 6 Deputado Cina ¢ desses uns que gostam multo de estar bem com todos. Eu ca sou pelo que € justo, como eles dizer. Dai se vestirem completamente de cinzento, que & fa cor neutva por exceléncia, Pois do que mais ele havia fe se lembrar! Industriou bem (pensou que industrion) 44 Mie, uma colona cheia de filhos, fer ela decorar um diccursinho bem comodamente infeliz, contando que os 409 410 {ilhos tinbam escola dada, pelo Governo, roupa de inver- tho dada pela Liga das Senhoras Desusadas e muito feljao om arrar que o Ministério da Abastanga irla plantar no fano que vem. Remédio entao era mato, remédio, dentists, salista, manicura, boninas, warercloset e balangandas, ‘A'Mte decorou, decorou, cistava decorar aquele final di endo que a vida estava triste © Governo era muito bor, no havia jeto de lembrar as palavras! Mas enfim estava al nos bastidores com o Cinza, esperando muito nervosa, dizque era pra ela falar naguele meio de tanta gente ele vada ta0 limpa, De forma que quando, amedrontado com ‘8 baguncinha © Deputadinho da Fermigem acabou, uf! la nio quis entrar e Deputado Cinza teve que arrastar 4 infeliz pro recinto lustroso da céimara, Ea Mie entra Ghamando a atengio de todos. Coitada, botou 0 unico vestido completo que ainda possula, F aguele vestide to dinko encarnado vivo, duma cor s6. Na cabeca, esconden ‘os cabelos destratados no Tengo de setineta verde vivo. E traz consigo os trésfilhinhos que no tinha com quem deixar. Os dois maiores, que andam, se agarraram horror ‘ados na saia dela, O recémmnascido The dorme no braco, envolto no xale amarelo cor-de-ovo. E de condeovo estio também os outros dois, [azendinha que sobrou do ince. dio, Ea Mie com os filhor botam a cor do alsrma no recinto. Que sera! que nao sera! Eo Deputado Cinza ges. ticulava pra ela: Fala, abo de mulher! Mas a Mae estava horrorizada, queria, pedia pra sai, fugir dali, “Fala, dis bot” que ele gesticulava. Entio a Mie se viu perdida. Numa espécie de del- Flo que a toma, se evapora todo @ discurso decorado. Sem resolver, sem decidir, sem eonseiéncta, sem nada, apenas movida por um martirio secular quo a desgraca transmite nos seus herdeiros, cla se pe falar, Nao sio dela as palavras que movemihe a bocs, so do martrio secular, Sio palavras duma verdade nao bem sabida, nio ‘bem pensada, so palavras bobas, Muitos deputados vio se embora pra no perder tempo, Outros adormecem. Falar nisto: © Secretério Dormida mudou de posigi outta vex A cadeira esiava incomoda decerto, O fato € que ele aempurra e sempre de joelhos, pée os bragos no thio € ms sobre cles descanss a cara dotmida agora se amostrando te pulic, «a bundn a sont, erga como parte Ph Giptl dor sccreidrioe de cama. ‘Bom, os demais no extio muito se amolando com a fala da Mae, s6 as galeris Ihe devoram as palavas. E203 Poucos, deputades, jornelists,seryentes, a Mesa, todos Execs ander subterrdneos do serviismo, utllzados pelos gantes da mina de our, todos, pra no escuar tanta Ein, se botam recordando © marailhoso discurso sobre a ferrugem’ das panelas de corinha. Eo mesmo Fimo talangado de antes vata aon poucos e afinal se Mira franco, quando as palavrasslucinadas da Mae se qomam insuportivels de owit Tado se mene, tudo ea {arola sudo danga na Camara, Os Jornalstas montaram avalo mm suas cadlrs © som palinhos vio formando fora, afinal mortrando os ttulos dos jrnais 2 public. Gaserentes tambem dangam de roda, se dando ss mies. O que fezo presidente? E que, ndo padendo mais escutar (0s Brito lamentosos da Mae, mas eorresponJendo a ele, {uleria, relistamente se move se revota insult, bers, {imei om sr, 0 preeeis, movende @ Sino engragado, nto ve que se caqusceu da vida est ‘brncando com o sino, Jogsnde ele no ar. Também o Deputado Cina, quando vis bagungona estoura,dise consign, Bem, capri como ineu dever, agora lavo as fnfos Lavo mesmo pa gua astral do cinisme, © pra nuuglas, puxou do bolso aqusla especie de Tengo" de ‘cobaga, lego nto, lengl vaso, de todas, mas todas 35 Cores. De todss as core au

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