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Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Filosofia e Ciências Humanas


Graduação em Psicologia

Saúde Mental

Disciplina: Temas em Psicologia III – Psicologia da Saúde

Semestre: 2003.1

Palestrante: Simone Elisa Heitor Pace


Saúde Mental
 “Saúde Mental é o conjunto de ações de promoção,
prevenção e tratamento referentes ao melhoramento ou à
manutenção ou à restauração da Saúde Mental de uma
população” (Saraceno, 1999). Tem correlação com dimensões
legislativas, sociais, econômicas, culturais e políticas.

 Abordagem holística e pluridisciplinar, abordagem complexa e


orientada à comunidade e não exclui a abordagem biológica.

 Psiquiatria (modelo biomédico) X Saúde Mental (holismo


biopsicossocial)
A) Paradigma médico: influenciado pela abordagem biológica
1. linear (dano definido provoca uma condição de doença e os
tratamentos são reparações desse dano).
2. individualista (saúde e doença são determinados pelos
recursos/carências do indivíduo e os tratamentos são
intervenções exclusivamente dirigidas a ele)
3. a-histórico (ignora as interações indivíduo-ambiente)

B) Paradigma da saúde pública: saúde mental comunitária


1. sistêmico (saúde e doença como processo interativo e complexo).
2. comunitário (intervenções com grupos sociais)
3. histórico
- ações individuais: curar, promover melhora, evitar recaída
- ações dirigidas a grupos e comunidades: prevenção da doença e
promoção da saúde – identificação de grupos vulneráveis e
construção, junto a eles, de “oportunidades preventivas”.
C) Do modelo biomédico para o biopsicossocial implica em mudanças
importantes:

1. na formulação das políticas de saúde mental


2. na formulação e financiamento de programas
3. na prática cotidiana dos serviços
4. no status social dos médicos
5. descentralização dos recursos dos serviços para a comunidade
(local privilegiado da intervenção)
6. não há separação lugar da doença / lugar da saúde; profissionais /
pacientes; pacientes / comunidade.

 relação entre cidadania e saúde.


Teorias e Práticas Psiquiátricas influenciadas
por fatores econômicos, políticos e
ideológicos
 Sociedades pré-capitalistas (Antigüidade & Idade Média):
tolerância do louco  baixa expectativa de vida; pequeno
número de doentes; conceito de doença mental restrito; aptidão /
inaptidão para o trabalho não era critério na definição do normal /
anormal.

 Europa, final do séc. XV: se inicia uma nova forma de


organização do trabalho; repressão à mendicância,
vagabundagem e ociosidade  ápice no séc XVII: criação de
instituições (casas de correção, de trabalho e hospitais gerais).

 Emergência do louco como problema social: prática de


confinamento
 Final séc. XVIII / Inicio séc. XIX: surgimento da psiquiatria 
I Reforma ou Revolução Psiquiátrica: loucura passa a ser
considerada doença, passível de tratamento médico sistemático;
criação de hospitais psiquiátricos (Pinel na França; Tuke na
Inglaterra)

 Tratamento Moral: medicina educativa e pedagógica; disciplina.

 Inicio do séc. XX: II Revolução Psiquiátrica (Kraepelin; Jaspers,


Bleuler, Schneider – Alemanha): nova proposta nosográfica.

 Antipsiquiatria (Laing, Cooper, Esterson – Inglaterra): loucura como


fenômeno social

 II Guerra Mundial: movimento de crítica ao hospital psiquiátrico 


busca de alternativas, experiências de transformação da
assistência psiquiátrica
Brasil
 1852: inaugurado o primeiro hospício (Hospício Pedro II – RJ),
hospícios isolados em locais afastados; função saneadora

 Intensificação dos processos de exclusão e proposta de


recuperação do “material excluído” (doentes mentais e
marginalizados sociais)

 Surgimento das colônias agrícolas  objetivo de tratar, recuperar


pelo trabalho agrícola e devolver à comunidade como “cidadão útil”
(São Paulo: Juqueri, 1898).

 Crescimento da população de internos: ampliação dos hospitais e


construção de novos, demandas por mais verbas e mais leitos.
 Após anos 40: criação dos primeiros ambulatórios (em 1961 eram
17 em todo o país)

 Fim da década de 50: situação caótica nos hospícios (superlotação,


maus tratos, deficiência de pessoal, condições físicas); ineficiência
do setor público

 1964 em diante: psiquiatria de massa (progressiva extensão do


cuidado psiquiátrico a grupos cada vez maiores da população) –
alto custo da doença mental para o processo produtivo 
investimento em saúde mental como proposta economicamente
rentável; clientela dos hospitais psiquiátricos passaram a incluir
neuróticos e alcoolistas

 Ideologia privativista: contratação de leitos em hospitais privados:


mercantilização da loucura  função iatrogênica  incentivo às
internações  expansão de leitos.
 Final década de 70 / Início 80: movimento dos trabalhadores em
saúde mental  necessidade de transformação da realidade
assistencial

 Desmontagem do aparato de exclusão: substituição do modelo


hospitalocêntrico; resgate da cidadania.

 Segunda metade déc. 80 (Nova República): processo da reforma


psiquiátrica segue tendência dos movimentos de redemocratização
do país  8ª. Conferência Nacional de Saúde (1986); I Conferência
Nacional de Saúde Mental (1987); criação do primeiro Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), na cidade de São Paulo (1987);
apresentação do Projeto de Lei 3.657/89 (Projeto Paulo Delgado)

 Déc. 90: implantação do SUS (Sistema Único de Saúde):


reestruturação da assistência psiquiátrica passa a ser política oficial
de governo; criação de mecanismos e normas de qualificação e
fiscalização para os serviços de internação e estimulação para a
criação de redes de atenção psicossocial
 Legislação:

 Declaração de Caracas (14/11/1990)


 Lei 10.216 (06/04/2001) ou “Lei Paulo Delgado”
 Portaria / SNAS nº 224 (29/01/1992)
 Portaia / SAS nº 147 (25/08/1994)
Políticas de Saúde Mental

 Reforma Psiquiátrica: substituição progressiva dos hospitais


psiquiátricos pelo cuidado comunitário / ambulatorial.

 Ações: construção de redes  unidades básicas de saúde; NAPS /


CAPS; moradias assistidas; serviços de emergência; enfermarias
psiquiátricas em hospital geral; projetos na área de educação,
trabalho, moradia e justiça.
Tabela 1 – Percentual de gastos por estado com recursos extra-
hospitalares, sobre o total de gastos em saúde mental (2001)
UF Gastos com Gastos com recursos %
internações extra-hospitalares
hospitalares
RO 255.984 0 0.00
AC 162.611 0 0.00
AM 740.023 0 0.00
RR 0 0 0.00
PA 735.172 720.687 49.50
AP 32.032 0 0.00
TO 1.397.544 366.933 20.80
MA 8.698.791 2.258.761 20.61
PI 4.520.062 918.375 16.89
CE 9.220.127 2.603.764 22.02
RN 8.478.894 770.791 8.33
PB 8.538.848 1.471.663 14.70
PE 32.637.082 1.216.229 3.59

fonte: DATASUS/MS 
(continuação Tabela 1 – Percentual de gastos por estado com recursos extra-
hospitalares, sobre o total de gastos em saúde mental (2001)


AL 9.432.342 950.077 9.15
SE 3.221.566 290.041 8.26
BA 19.674.201 1.881.782 8.73
MG 38.661.740 7.379.133 16.03
ES 6.073.326 457.525 7.01
RJ 79.619.854 4.387.014 5.22
SP 133.887.961 12.763.391 8.70
PR 8.180.083 3.435.194 8.22
SC 12.797.266 859.529 9.51
RS 1.814.133 1.601.982 11.13
MS 3.650.969 126.225 6.51
MT 3.650.969 965.909 20.92
GO 16.268.807 749.679 4.41
DF 2.037.797 549.355 21.23
TOTAL 449.083.451 46.724.039 9.42
 Amarante (1998) e Delgado (2001) ressaltam que a reforma
psiquiátrica não implica no simples desmonte da antiga estrutura
assistencial e na sua substituição por novos equipamentos. As
transformações técnicas e institucionais, por si só, não são capazes
de resolver a questão da exclusão, do alienismo, dos mecanismos
ideológicos e de controle social: a questão crucial da
desinstitucionalização não é de caráter técnico-administrativo: trata-
se do que poderíamos designar como a progressiva “devolução à
comunidade” da responsabilidade em relação aos seus doentes e
aos seus conflitos (Delgado, 2001, p. 184-185).

 Neste sentido, o conceito de reabilitação psicossocial tem norteado


o tratamento do portador de transtornos mentais
Sugestoes Bibliograficas
 Amarante, P. (1995). Loucos pela vida: a trajetória da reforma
psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: FIOCRUZ.

 Castel, R. (1978). A ordem psiquiátrica: a idade de ouro do


alienismo. Rio de Janeiro: Graal.

 Delgado, P.G.G. (2001) Perspectivas da psiquiatria pós-asilar no


Brasil. Em: S.A. Tundis & N.R. Costa (Orgs.). Cidadania e Loucura:
Políticas de saúde mental no Brasil. 7ª ed. Petrópolis: Editora
Vozes.

 Foucault, M. (1981). Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal.

 Foucault, M. (1978). História da loucura na Idade Clássica. São


Paulo: Perspectiva.

 Goffman, E. (1974). Manicômios, prisões e conventos. São Paulo:


Editora Perspectiva.
 Machado, R., Loureiro, A., Luz, R., Muricy, K. (1978).Danação da
norma : Medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil. Rio
de Janeiro: Graal.

 Ornellas, C. P. (1997). O Paciente Excluído : História e crítica das


práticas médicas de confinamento. Rio de Janeiro : Revan.

 Pessotti, I. (1995). A loucura e as épocas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed.


34.

 Resende, H. (2001). Política de saúde mental no Brasil: Uma visão


histórica. Em: S.A. Tundis & N.R. Costa (Orgs.). Cidadania e Loucura:
Políticas de saúde mental no Brasil. 7ª ed. Petrópolis: Editora Vozes.

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