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Seminário - Sintaxe Do Português Clássico
Seminário - Sintaxe Do Português Clássico
conjunções no século
XVI
Therezinha Maria Mello Barreto
Grupo
• Uso da partícula “e” no texto de maneira repetida, como conectivo. No texto de João
de Barros a repetição não se emprega tanto, esse uso irá ligar:
a) Itens lexicais: ... tenho entendido a muita parte que naquele Reino vam tendo os
ministros da secta luterana sequaces, e o crédito e autoridade... (CR, nº 75, l. 04-6).
b) Sintagmas: ... e apos esto beixarlhe as mãos por cousas que mãdou dezer a el Rey,
meu senhor e a my sobre negocjos d’Yngalaterra e de Milã. (CIDL), nº 8, l. 11-6).
c) Sentenças: ... vos agradecerey muito escreverdesme com tal brevidade se o devo
fazer, e o que em tal materia lhe devo de mandar dizer, e se sera por pessoa propria que
a isso envie, e que devo para isso escolher, e de que calidade deve ser (CR, nº 75, l. 21-
5).
Itens Coordenativos
É ainda constante o seu emprego como encadeador da narrativa;
a) quer em posição inicial absoluta: E disse que se consolasse porq molheres e filhos lhe
seriam entregues... (DA – cap. II, l. 203).
b) quer precedendo uma outra conjunção: ... e porque o dia dantes ouveram vista das nossas
náos... (DA, 1º vol. Cap. I, l. 165)
... mas, como vos muy beĕ sabéis eu nom tenho outra Renmda de que possa soprir as despesas
de minha casa, neem de que paguar as moradias aos que me servem... (CR, nº 51, l. 04-7).
E q[ue] assi seja nem por isso julgam os lavradores q[ue] provém isto da maldade da térra mas
da sua grossura. (DVV, p. 429, l. 22-3).
Itens Coordenativos
• Todavia irá receber nesse século o seu processo de gramaticalização tanto na escrita
quanto na semântica, uma vez que já é empregado nos textos, com a forma
justaposta e como conjunção, estabelecendo uma relação de contrajunção:
• A conjunção como expressa até o séc. XII relações de causa, finalidade, modo,
comparação e tempo; a partir disso a conjunção também passa a expressar relações
de conformidade:
Causa: Como faleceo João Moniz, eu pedi a elRey, meu senhor, que me fizesse merce da
sua comeda para Luis de Saldanha. (CIDL, XL, l. 01-3).
Finalidade: “Como”, disse el, “nom vos poderei eu aver se nom por morte de vosso
padre? “Certas, nom”, disse ela. “Pois eu me trabalharei, como moira, disse el. (DEM,
Cap. DCXVII, l. 20-2).
Modo: Tervosey e merce mandarme a provisão como vos mandey pedir. (CT, 152, l. 11).
Itens subordinativos
Comparação: E por qu’eu nã posso cuydar que a tezã de sua alteza a de sser fazerme
tamanha desomrra como mãdarme tornar preso, quãdo a este tempo nã vyr Recado ylo
ey esperãdo polo camynho, e dygovos que os prepostos cõ que vou já oje derã gosto
d’este pequeno trabalho que levey. (CIL, XVIII, l. 10-4).
Temporal: E como sober que isto he feito, o mandarei logo mudar e, isto feito, sera h" !
pedaço de descanso por agora para mi... (CIDL, XLVI, l. 48-9).
Conformidade: Como diz David em espirito (sal. XVII): Em toda térra saiu o som deles, e
nos fins da térra as suas palavras. (DVV, p. 438, l. 14-5).
• A forma segundo que entra em desuso e começa aparecer de forma isolada (sem o
que) na Carta de Caminha:
Elle seja muito louvado, que ordena tudo mylhor do que ome cuyda e
merece. (CIL, XXXIX, l. 01-7).
quanto... mais… tanto mais; quanto… mais... tanto… meos; tan... mais
pouco... quanto moor; quanto mais... tanto mais pouco; quanto mais...
tanto... mais; quanto... mais... tanto... meor.
Correlações conjuncionais
... ainda que alguua cousa d’ísto pareça nõ se cumpra - ne alvaras de promessas, ne
dividas, ne cousa nenhuua. (CJ, CXIX, l. 144-6).
Deixará de frutificar a sementeira, ou pelo embaraço dos espinhos ou pela dureza das
pedras, ou pelos descaminhos dos caminhos.
Empero qual ome quer que outro algũa cousa der, nõ lha possa poys tolher, pero se
lho descõnhecer e nõ lho gracir aquelho que lhy deu assi como se o ferir ou destoar ou
desonrrar... (FR, liv. III, l. 853-6).
O marido da molher qual quer nĕ possa uender nĕ alhear arras que der a as molher,
pero que ella outorgar. (FR, liv. III, l. 145-6).
Como concessivas, empero ou empero que já não aparecem nos textos do séc. XVI,
pero e pero que, entretanto, ainda são empregadas:
E peró que algũas vezes, em materias graves, deçessem as cousas jocósas e fizéssem
degressões, recitando ditos e opiniões gentias, nem por isso ôs envergonhou o juízo
alheo. (DVV, p. 345, l. 05-8).
Ca ou qua
A conjunção explicativa ca ~ qua, muito frequente no português dos sécs. XIII a XV, aparece, ainda, em
todos os textos do séc. XVI consultados para esta pesquisa, porém numa frequência já bem menor. Nas DA o
seu emprego já é raro:
Dom Antonyo amigo. Qua me derã cartas vossas e, querendovos responder a ellas por
este correo... (CIDL, l. 01-2).
... mandoulhe dizer pelo Xéque que tinha consigo, que seguramente podiam algu!s sair
em térra se vinham buscar suas molheres e filhos ca elle lhos mandaria resgatar e assy o
lugar. (DA, cap. I, l. 185-8).
Quer como temporal, quer como explicativa alternava com pois que ~ poys
que ~ poisque:
Pois que Lançarot ouve feito, quanto a cavalleiro convinha, disse:
Filho Gallaaz, ora sode cavallero. (DEM, cap. VII, l. 13-4) – temporal.
Desque, desde, desde que
Desque ocorre uma única vez ainda nas Cartas do Infante Luís, o que parece indicar ser, na época,
uma forma já quase em desuso:
... e cõ tudo isto, desque a Salvaterra ate bespora de pascoa, não passou
mais que h" ! so dia que deixasse de Ter grãde trabalho em escrever
cousas…
Apesar de Antônio Cunha (1991: s.v. desde) afirmar que a forma desde data
do séc. XIV, na documentação analisada, só em textos do séc. XVII, ocorre
a forma desde que, fruto de uma nova gramaticalização que se processa
através de uma nova morfologização:
Des + de > desde
ex.: ... mas por mim nã me da nada, antes folguo porque me mostrã a cõta que
faz de mim ho mundo, e me desobrigã pera eu fazer a mesma d’ele se podesse.
Cõ tudo sera pouco trabalho mandar-lhe as cartas a Arraiolos. (CT, CLXVI, l. 20-
1).
● Conjunção modal “de modo que”
Conjunções que passaram a ser empregadas no séc. XVI
ex.: E se sua alteza tem võntade que eu Receba d’elle esta merce, seja esta
Resposta de feição que me pareça a mi que quer sua alteza conclusão; (CJ,
LXXXIX, l. 71-3).
● Conjunção temporal “já que” - grafada ya que
ex.: Todo pecádo é obrár e todo obrár é voluntário, quér seja torpe quer honesto:
logo todo pecádo é voluntário. (DVV, p. 433, l. 03-5).
● Concessivas “por mais que” e “cõ quanto”
● Conforme´´, começa a aparecer como locução prepositiva, seguida da
preposição a e apresentando as variantes gráficas: cõforme a, confforme a e
conforme a.
ex.: E trabalhay quanto poderdes por que vos Responsa conforme ao que peço.
(CDJIII, VI, l. 233-4).
Conjunções que passaram a ser empregadas no séc. XVI
ex.: Ela sera embora, e emtã vos dyrey o mays que nesta fyca por dezer, por
m’o tempo nã dar lugar a mays. (CIL, I, l. 08-9).
ex.: E nam te pareça, depois que máis idade teveres pera julgar, ô que óra disse,
que usei o modo dos médicos que preambulam cousas primeiro que dem suas
mézinhas aos enfermos pera lhes ser doçe e suave ô que, no seu gosto, é azedo
e àspero. (DVV, p. 433, l. 06- 10).
Conjunções que passaram a ser empregadas no séc. XVI
ex.: Per semelhante módo os pronomes e partiçipios que temos se ajuntam com
os nomes sustantivos, ainda que na órdem de preçe derem àçerca de nós tem
deferença, cá o nome ajetivo ora se antepõe, como os bons hómens ora se
pospõe, como os hómens bons. (CLP, l. 1766-8)
ex.: Nã há glutio omrrado, canto mais christão sesudo, que nã simta mais a
culpa que ho castigo. (l. 26-7).
04
Itens conjuncionais que só
ocorreram em textos do
séc. XVI
Conjunções que ocorreram apenas no séc. XVI
Conjunção Exemplo de uso Semântica
Muito... Que (tão que) Depois de Luis Afõso partido, esteve o Proporcionalidade
duque muito mal que me pareceo que esta
noirte acabasse. (CT,CXXXII, l. 03-4).
(Idiossincrasia do autor)
Mais... Quanto mais (não... E pouco tempo abastaraa pera me S.A. Proporcionalidade
Quanto mais) ouvir, que nom quero mais que dos
negocios; escusado tenho de cuydar mais,
quanto mays falhar. ( l. 07-9 )
“Não quero nem tomar banho, quanto mais
lavar o cabelo.”
Mais... Que ... e q nã fazia mais cõta q de cõprar e Proporcionalidade*
veder e tornasse a sua natureza. (DA, cap.
III, l. 86-7).
Conjunções que ocorreram apenas no séc. XVI
Conjunção Exemplo de uso Semântica
Nam... que E assi este tel como outras vergas e pontos que Contrajunção
tem a nóssa escritura, prinçipalmente ôs da
lêtera tiráda, que máis se pódem chamar atálhos
dos escrivães, por nam gastárem tempo, e
papél que [por] outra algũa neçessidade. (GLP,
l. 1990-3).
“Mais para não gastar tempo e papel, do que por
outra alguma necessidade.”
Tanto como se E com ysto soo de ha sua alteza querer ver Comparação
toda, me averey agora por satisfeito tanto como
se me visse agora sem dor de cabeça. (CT,
LXXXV, l. 15-7)
05
Itens conjuncionais que,
aparentemente já em desuso,
voltam a ocorrer no séc. XVI
Conjunções que voltaram a ocorrer no
séc. XVI
Conjunção Exemplo de uso Semântica
nom... senon ~ nom... senam ... e tendo-se-lhe concedido tudo o que nos limites Alternativa
da justiça era possível não lhes fica que pretender ou
senão o injusto. (CVM, LXXIV, l. 194-6). adversativa
ante ... e meu filho nõ perde em dar-lho, ante ganha e Oposição
ffaz virtude, e minha bĕçam ganha. (CJ, XIX, l.
199-200).
Antes ~ pois ~ em lugar disso Todos, na escola, eram rigorosos, mas ele, não,
(no português contemporâneo) antes, era compreensivo e amável.
Como se pode observar, o processo de desaparecimento e de
aparecimento de itens ocorre continuamente na classe das conjunções a qual
não deve ser considerada uma classe de inventário fechado, mas uma classe
produtiva, diferente, portanto, dos chamados “instrumentos gramaticais”.
Analisada a constituição mórfica das conjunções detectadas,
especificamente, em corpus do séc. XVI, verificou-se terem sido conservados
muitos dos processos de formação de itens conjuncionais observados no
português arcaico; alguns processos, entretanto, não mais se verificaram,
enquanto outros surgiram, o que se pode concluir observando a fórmula geral
estabelecida por Barreto (1992), para os itens conjuncionais do português
arcaico, e a fórmula ora estabelecida, que apresenta os processos de
formação de itens conjuncionais no séc. XVI:
Formação dos itens conjuncionais no Português Arcaico:
Exemplos:
1. Art + N + Conj. = uma
vez que
2. N + Conj. = caso que
3. [Pron + N] = todavia
4. Pron. + Conj. = cada
que tanto que
Formação dos itens conjuncionais no séc. XVI
Exemplos:
1. Prep. = segundo, conforme
2. Prep. + Conj. = até que, porque,
para que, a que, salvo que
3. Prep. + Pron. = cõ tudo, por
quanto, cõ quanto, em quanto,
entre tanto, portanto, por isso, em
tanto
4. Prep. + Pron. + N + Conj. = em tal
caso que
5. Prep. + N + Conj. = de maneira
que; de modo que
Processo de formação
Uma vez ciente dos processos mórficos formadores dos itens conjuncionais da língua
portuguesa, no séc. XVI, é possível determinar quais os processos mais produtivos.
Como se pode verificar, são as preposições, por excelência, os principais elementos
formadores de conjunções, através de processos diversos:
Processo formação
Depois das preposições, são os advérbios os elementos mais importantes
para a constituição de itens conjuncionais, também através de processos
variados:
Tomando por base o continuum apresentado por Hopper e Traugott (1993:104)
para a recategorização de categorias lexicais:
● BARRETO, T. M. M. . Observações sobre as conjunções no século XVI. In: Rosa Virgínia Mattos e
Silva; Américo Venâncio Lopes Machado Filho. (Org.). O Português Quinhentista: estudos
lingüísticos. Salvador: Edufba / UEFS, 2002, v. 1, p. 161-193.