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A LEITURA COMO

INTERROGAÇÃO
DE TEXTOS
“Além dos muros da escola”
Josette Jolibert, Jeannette Jacob & cols
 Tipo de texto para ler: HISTÓRIAS

A tartaruga que queria voar

Turma: 1ª série
Idade: 6/7 anos
Número de alunos: 40
Material: história escrita no flip shart e em uma
folha impressa para cada criança.
Organização: coletiva, crianças sentadas em U
em frente ao quadro onde está fixada a
história.
Duração: duas aulas.
Uma carta! Um escrito!

Não! É uma
história!

P: O que lhes
parece? Que tipo
de texto é esse?
-Porque tem um
título aqui (e
mostrou na folha)
com letras grandes.

- Porque tem
muitas letras aqui
(nos parágrafos).

P: E por quê?
- Sim! É uma história,
se parece com os
“Porquinhos” (que já
tínhamos lido).

P: Qual é a
tua opinião?
- Porque não tem
data aqui. (nos
parágrafos).

- Não tem uma


assinatura aqui.
-Uma carta não tem
título!

P: E por que não


pode ser uma -É uma história
carta ? que está em nosso
projeto.
Leitura individual e silenciosa

As crianças sentam-se em frente à história


transcrita pela professora. Não existem ilustrações e,
no momento, as crianças não têm a cópia do texto. A
professora pede para lerem os dois parágrafos (até
“voar”) e lembra as crianças que devem entender o
texto. Caso sintam a tentação de ler “com os lábios”
devem colocar a mão sobre a boca. As crianças estão
muito concentradas na leitura.
A professora observa os seus olhos: percebe-os às
vezes em trajetória linear, às vezes saltando de um
lado para o outro ou de cima para baixo.
- Olhe só! (e mostra a
palavra TARTARUGA, do
- Eu não sei, aqui
título). Lembra no pré,
diz “um dia”...
a Rosinha tinha uma.

- Trata-se de uma
tartaruga.

P: Então é mesmo uma


história. O que vocês
entenderam da história, o
que ela conta ?
P: Olhem! Vou escrever aqui a
palavra TARTARUGA do lado do
título e você vai nos dizer se é a
mesma palavra que o Joãozinho
nos mostrou.

- Sim professora, é a
mesma!
-Não vejo.
-Não está escrito
igual.

- Sim, está aqui!

P:Então, é uma história


de tartarugas. Fala-se -Mas dá no mesmo.
da tartaruga em outro Aqui vem com letra
pequena, mas dá no
lugar, no que vocês mesmo.
leram?.
P:Eu escrevo no quadro, do
lado, na primeira linha a
palavra “tartaruga” em
letra pequena. É o mesmo
que no texto?

- Sim, professora!

P:Eu vou escrevê-la no


quadro:
TARTARUGA
Tartaruga

P: Por que está escrito de duas


maneiras?

- Porque a letra grande é


para os títulos!
A professora acrescenta uma flecha e a palavra “título”:

TARTARUGA TÍTULO
Tartaruga

-Igual à receita (com a qual


fizemos o “bavaroise de
maçã”!
- Fala de voar, mas as
tartarugas não voam.
- Como sabes
que fala de
voar?

- Porque aqui
diz VOAR.

P: E o que acontece - Aqui também:


com a tartaruga? voar.
A professora anota no quadro:

VOAR
voar

P: Agora vou lhes dar o título


completo de presente (lê em voz
alta): “A tartaruga que queria
voar”.
- Ah! É isso! - Com um
vento forte.

- Como isso
será possível?

- Era pequenina.
-Voou e voou tão
alto, que se cansou e
caiu.
- Escalou uma
- Voa sobre a montanha e se
sua casa. atirou...
P: São boas ideias. Seriam lindas histórias. Vou
registrá-las no quadro. Podemos inventar uma
história com isto. Mas, não é a história desta
tartaruga. Vou ajudar: a tartaruga não vai voar
sozinha, uns amiguinhos vão ajudá-la. Aqui há
uma palavra que muitos de vocês conhecem,
tenho certeza ( mostra “uns patos”), que diz
quem vai ajudar a tartaruga a voar.
As crianças concentram-se:

- São patos!

P:Muito bem. Agora vou ler esta


parte para vocês (lê de forma
expressiva, como quem conta
uma história):
Era uma vez uma tartaruga que vivia tranquilamente,
comendo e dando voltas. Um dia se cansou de olhar para
o chão, sozinha, e conversou com uns patos selvagens que
passavam por ali. Ficou maravilhada ao ouvir as histórias
das viagens que eles faziam. Convidada pelos patos,
decidiu voar.

- Por que
- Que bom! São selvagens?
simpáticos os
patos.
- ?
P: Porque vivem livres e estão de
passagem. Cada ano viajam
quando chega o frio, procuram
países com mais calor.

-Na costas?

- E como vão
- Com as
levar a tartaruga?
patinhas.
P:A tartaruga dessa história é grande,
não é como a que a Rosinha tinha na sua
casa. (explica-lhes bem a história.)
Vejam, vou sublinhar três palavras que
mostram isso. ( sublinhou “um pau”, “ a
boca”, “Suas patas”).

Finalmente...
 Identificam-se as três palavras
 Decide-se que, por grupos, vão desenhar a
situação do momento em que a tartaruga
combinou a viagem com os patos. Mas, antes, a
professora leu todo o parágrafo.
P: Como as tartarugas não têm asas, os
patos buscaram um pedaço de pau e
disseram à tartaruga que se agarrasse nele
com a boca. Então, os patos seguraram as
pontas do pau com as suas patas e
prepararam-se para o voo. Porém antes
lhe recomendaram: “Segure-se bem,
comadre, porque dentro de pouco estaremos
voando sobre o mar!”
Cada grupo desenha a situação. Penduram seus
desenhos no quadro, próximo ao flip shart com a
história. Averiguam a correspondência entre
todos os desenhos e o texto do flip shart.
Terminada esta etapa, a professora entrega o
pacote de cópias com o texto da história aos dois
responsáveis pelo material, para distribuição aos
colegas.

Cada um refez a leitura da parte da história cujo


sentido foi recentemente construído
coletivamente.
P:Assim a tartaruga se foi feliz,
voando com seus amigos patos
selvagens. E terminou a história
(efetivamente soa como um final de história).

- Pois é!

- Não.
- Professora...
não pode ser... - Ainda resta
toda esta parte.
(mostra a segunda
parte da história)
P: O que vai acontecer?
Amanhã veremos. Enquanto
isso, vão pensando!
Segunda aula:
No dia seguinte é construído o significado da
segunda parte da história, utilizando a mesma
estratégia de elaboração de hipóteses de significado
pelas crianças, apoiando-se no que já conhecem da
história e nas palavras que podem ler sozinhas. A
leitura final (de precisão e confirmação) é feita em voz
alta pela professora.
Esta segunda sessão termina com a leitura
expressiva da história completa feita pela professora e
com uma dramatização espontânea da história, sem
maior preparação, com grupo de cinco ou seis crianças
( a tartaruga, os dois patos selvagens e dois ou três
animais que comentam e criam a dramaticidade da
cena).
Isto motiva as crianças a se apresentarem,
encenando para os colegas. Assim, nasce um novo
projeto: “Interpretar a história da tartaruga que queria
voar para as crianças da pré-escola e para os pais”

Terminada a compreensão do texto, ao


final da segunda sessão, toma-se um
tempo para refletir sobre o que as
crianças vivenciaram.
Como conseguimos entender o texto?
Resume-se oralmente:

 Lendo-o de forma silenciosa;

 Tratando de imaginar o que foi acontecendo


a partir do que já sabemos;

 Buscando palavras que já sabemos ler;

 Escutando a leitura da professora.


Novas ferramentas elaboradas:

É iniciado um quadro de recapitulação que irá sendo


complementado pouco a pouco. Este quadro será
registrado pela professora no flip shart de referência que
será afixado na parede.
Utilizando o último quadro comentou-se o quão
poderosas são as letras, já que basta trocar um “o” por um
“a” para que mude completamente o significado da
palavra (patos – patas)
Comentário da professora:

Para as crianças do 1° semestre da primeira série é mais difícil ler


compreensivamente uma história do que uma receita ou uma carta: a silhueta
da história não ajuda tanto como a de outros textos, pois a história tem uma
dinâmica interna menos óbvia, e porque “tem muitas palavras”, como dizem
as crianças.
Mas, não há porque reduzir o tamanho e o vocabulário das histórias para
colocá-las , supostamente, “ao alcance das crianças”. Podem aprender a
interrogar as histórias, centrando sua atenção em construir hipóteses sobre seu
significado (Quem são os personagens? O que acontecerá? Como?), a partir de
alguns indícios e de algumas palavras que já conhecem ou que podem
decodificar neste momento do ano. Esta atitude de pesquisa do significado de
um texto, em geral, e de uma história, em particular, é um comportamento
leitor que se aprende, especialmente nas sessões coletivas, como a que foi
descrita. Convém notar que, apesar das aparências, a professora não interroga
as crianças. Pelo contrário, ela induz a aprender a interrogar.
Obviamente, o papel da professora como “garantia do
conteúdo dos textos” é importante, e quando vê que seus
alunos foram mais longe do que poderiam ir sozinhos na
compreensão da história, ela lhes oferece de “presente” o
resto do texto com uma leitura expressiva e em voz alta
apenas depois da elaboração das hipóteses das crianças
com a história.
Durante o ano, a autonomia das crianças na arte de
interrogar textos, em grupo e individualmente, vai se
consolidando pouco a pouco. E nessa trajetória, irão
construindo a capacidade de decodificar de forma mais
independente.

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