Tecendo Quereres

Noite de Natal, 2003

Quando se l ou se ouve a palavra colcha de retalhos, quase que
imediatamente nossa mente remete a nostalgia da casa dos avs, memria de
hbitos e costumes antigos, contas a pagar debaixo do pinguim sobre a
geladeira, de um tempo medido em relgios de cuco e cdulas amarrotadas
guardadas em bules de ch na cristaleira
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J costurei algumas peas com retalhos e a sensao recorrente
sempre de juno. Um retalhinho qualquer, uma lgrima furtiva e a saudade
resgatam em que lugar j esteve ou quem vestiu aquela lembrana...
Costuro vrios pedacinhos e obtenho uma pea absolutamente nova,
sobressaindo a mudana que j estava ali, esperando o momento de se tornar
realidade.
E assim, ns nos tornamos mais do que nunca, principalmente ao
rememorar tantas perdas e ganhos nos ltimos anos, uma colcha de retalhos.
Ento, percebo que no foram meses, semanas e dias que vivemos,
choramos, sorrimos, ficamos doentes, sentimos raiva, tristeza, dor, medo,
solido...
No foram apenas palavras no ditas ou mal colocadas, alguns mal
entendidos, o vazio do desencanto, as dilacerantes decepes...
No foram ausncias incompreendidas nem presenas quase
imperceptveis...
Pasmem...foram pequeninos pedaos de retalhos!
Lindos, sujos, inesperados, descoloridos, floridos, azuis, verdes, rosa,
com motivos infantis, molhados de mgoa, aquecidos, glidos, algumas
doridas mortalhas, impermanentes instantes...
Milhares e milhares de tecidos.
Porm, como na colcha literal, h sempre um motivo pautando o desejo
de uni-los.
Ns escolhemos.Ns os preferimos.
Ns os compreendemos, suas cores e sua individualidade.
Ns os desejamos.
Nosso motivo, o meu, o seu, de quem est ou no aqui, foi, e sempre
ser o amor.
Nesta noite de Natal, o mesmo amor que uniu nossos avs, nossos pais
persiste e... nos trouxe at aqui.
Ento, hoje eu agradeo a cada um de vocs e a mim mesma pelo
trabalho em comum, pela maravilhosa colcha de retalhos que ns estamos
produzindo e, caso o Aniversariante permita, continuaremos por muito tempo
ainda confeccionando: nossa famlia!

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Espcie de armrio envidraado em que se guardavam e exibiam os cristais e louas da casa.