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KOSMOS, & NO BOSPICO NACIONAL (Uma visita 4 seegto das creangas ) i do Hospicio Nacional de ee bem da vez primeira em que Ha uns vinteeum annos,—eramos pouco mais «lo que cinco creangas, —estavamos cinco rapa- es, em tomo de uma meza derestaurant, conver- sunido, depois de uma ceia romantica. Roman a idade dos convivas, ¢ pelo thema da conversa desvairada eultra-mil-oitocentos-e-trin- 4a, en que nos empenhidramos. Cada um de n soguelle empo, ina dentro de sia alma ata dade um Jacques Rolla... Todos 16s sonhava- mos e pediamos aos deuses aventuras longas € terriveis; e, aos dezoito annos, ja sentiamos a necessidade de andar dizenclo em prosa e verso que a vida era um fardo pesado demais, para os niossos hombros de velhios, € anciavamos por petegrinacoes & Child Haroid, atravez de todos 6 continentes do. globo, e atraver, de todas as dores da humanidade... Ao terminar a eeia, quando sahiamos, um de n6s, 0 mais exaltado, Fembrou: *Como seria bello, agora, um passeio 4 praia da Sauidade! Ohi! ver © Hospicio, sob este ltt O romantismo de todos aceitou e applaud logo a ideia. E abslamos para Ié, a p& pela cidade deserta e pela noite clara, atraves- ido 0 luar divino, que atirava Sobre as ealea- tumia toalha de neve luminosa.., Na praia da Saudade, em frente a0 Hospicio, P E um de nds, —exeesso de rom mol, solfou. um grito violento, um grito de Touco, que se foi perder, depois de reboar pelas serras visinhas, no seio da noite esplendida.. Lembro-me ainda, como se tudo isto se tives se passado hontem, do terror que entio come- colt a apertar-meo coracito. © Hospicio, branco. e sinistro, levantava-se, cercado da indizivel me- lancolia € do indetinivel mysterio. que o Iuar costuma emprestar_ 8 cousas € aos logares.. Cada arvore da visinhanga bracejava & luz fan- tastica, como um fantasma. Por traz de nds, 6 tniar_vozeava, rouco e lamentoso,rfunna melopéa arrastada. E, respondendo a0 grito saerilego do boltemio, respondeu, sahindo de dentro do Hos- picio, um outro grito medonho, —um grito lan- 9 cinante, de féra, entrecortado, gargalhado, hort pilante..E, logo, outros gritos iguaes comeca- ram a rétalhar 0 ar... Adorinecida embora, équel- la hora mansa da noite, a Casa do Soffrimento ia, povoada de somos allucinados, E fugimos dalli, correndo, com os cabellos erigados, e com a alma cheia de horror. ae Depois dessa noite de maluquice romantica, voltel varias vezes 4 triste Casa, e visitei-a toda, ‘ein diferentes epochas. E nunca até agora, tive: ta outra impressio, que nao a daquelle mesmo horrore a d'aquella mesma dolorosa angustia Ainda ultimamente, quando a atteneao publica se fixou sobre 0 Hospicio, despertada por arti- gos alarmantes da imprensa,—arfigos que tive- ram como resultado a radical transformagio, a tehabilitagio material ¢ moral do velho estabe- lecimento, - fui de novo percorrer a Casa da Loucura, em que tudo respirava miseria e aban dono; e voltei, mais, uma vez, dessa visita, como voltaria de_uina visita ao. Inferno: a0 sahir, vi- nham-me @ memoria os versos desafogados € luminosos, em que se desereve na «Divina Co- nediay 0 termo da peregrinacao de Dante © Virgilio pelos circulos malditos

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