Você está na página 1de 13
OS BEST-SELLERS PROIBIDOS DA FRANCA PRE-REVOLUCIONARIA 569205" SIS\| loos x 249%, 05,067 5: Eftocost 154 gitimava a monarq 's. Os episédios individuais desaparec iva, mas os padroes gerais persistiram, Formavam fa que se podia aplicar 3s situagdes conforme ias. Conquanto estivesse preso aos fatos do momen- 10, 0 significado dos textos in também derivava de um metatextoelaborado.ao longo de trés séculos. Assim, os libelles con Luis xv faziam parte da Maupeou e os parlament tempo expressavam tude de desafio em relagao a fade real que remontava & Liga Catdlica e a Fronda. Evo- cavam imagens de Henrique 11 e Mazarin e com isso faziam Luts xv assemelhar-se a Luts Capeto, uidade na hist6ria dos libelles nio significa uma repe- I da mesma coisa. A medida que ev libelles assumiam novos motivos e novas formas. Da engenhosa a Fronda, & biografia tica e ao protesto cont libelo reuniu forcas e transformou-se numa grande dentin« regime, ainda que s8€ 0s franceses & revolugto. de, antes de 1787 ninguém previu ou pregou a Re gens ideolégicas devem ser ‘magao do Antigo Regime, E nada solapou a legitimic de libelo. Pelomenos é essa a conclusto que nos sugere um exame pr minar da literatura, Conclusdo provis6ria, pois o assunto ni 232 9 AREACAO DO LEITOR AApesar de algumas incursses preliminares na hist ra, pouco sabemos sobre as reagdes dos leitsres no Antigo Regime. ‘Aprendemos apenas o suficiente para descontiar de nossa intuiga0, reagdes ocorreram num univer- erente do nosso que mos projetar nossa na dos leitores franceses que se confrontaram com os atras t, acho valido fazer uma pequenina assergio: as es, embora variassem, tendiam a ser intensas. [Numa época em que a televisioe o dio nao disputavam a supre- cia da palavra impressa, os livros tinham um poder de susitar es e pensamentos que hoje em dia nar. Richardson, Rousseau e Goethe nio se limitaram a provocar rimas em seus leitores, porém nnudaram vérias vidas, Pamela € yelle Héloise 25, esposos e pais areconsiderar suas relagdes mais intima nduta. Os sfrimentos do jovem Werth) ores de Goethe atirar a pr6pria vida, embora a tavam certos alemaes. Esses primeiros romances romanticos podem parecer hoje em ‘mas para os leitores do século XVIIL el. Estabeleceram wre entre leitore texto, Evidente- sespécies de leitores no mente, havia muitos outros géneros e mui 233 caracteristico de uma nagao de Dichter: (poetase pensadores).A tese tinha uma simplicidade tentadora, mas baseava-se em poucas evidéncias, exceto no caso das r protestantes e comerciais, situadas ao redor de cidades ,, Hamburgo e Bremen, Na medida em que podia ces produziu uma experiéncia 3 leram viras vezes Os soft Werther (Napoleio leu sete vezes),e alguns até decoraram o livointeiro? bem verdade que os leitores se voltavam cada vez mais para patriarca declamando as Escrituras para a familia. Mas esse quadro 234 Restif de la Bretonne evocé-lo s I que em 1649, quando as tipo; ‘ocorreu nada que se pudesse cor ipresso, a organizagio do mercado. sno diferiam fundamentalmente do que exis- es. Os gostos mudaram ¢ o pt ‘aexperiéncia da leitura ni se e variada, porén geral. No séc isso. A tecnologia da toriadores tém descoberto e desc tas do passado que poderiamos trang goRegime. Se: taramumaati io. Até nova investigacZ0, s6 posso aprese! tar pequenos indicios colhidos na correspondéncia de autores, editores, livreirose Asresenhas, ‘vam praticamente a publicar excertos ou promover as obras de seus nsa oficial —os gazet vam seus prdprios livros e os dos amigos: desinibidas o bastante para mas pistas sobre arecepgdo da literatura legal nos circu- ‘orrespondance Littéraire, ini- ciadoem 1753 porF. M. Grimm coma colaborago de Diderot, Ray- nal e outrose mantido por J. H. Meister nas décadas de 1770¢ 1780, {a.coisa, pois foram eseritos por holbachianos d ras.?Cor resenhas dos libelles contra’ Ieitoress ficar os autores de Vie privée de Louis XV e Anecdotes sur Mme la comtesse du Barry, Meister nfo demonstrou nenhuma simpatia por eles: 0 primeiro esereveu como um lacaio ¢ o segundo como um ‘camareiro, declarou. No entanto,a substincia de seus escritos mere- cia ateng2o, Ao tentarsepararfato de fieglo, a Vie privée forneceu tum quadro bastante equilibrado do governo de Luis xv.°E as Ane ddotes mereciam notasaltas pela imparcialidade e verossimilhana, yente verdadeira: conquanto esteja aquém da verdade, na maior parte do tempo chega perto del ‘Meister tinha uma opinidio ainda melhor das Lettres originales d Mme la comtesse di uma coletinea de cartas obviamente apécrifas, que eram “tanto mais verdadeiras por ter sido inventa- das” Elas captaram o espirito do reinado de Luis xv: ‘© andnimo autor dessas cartas parece nfo s6 estar m mado sobre todas as pequenas intrigas que preencheram anos do governo de Luts xv, mas também conhecer a fu ‘© a mentalidade da maioria das personagens que ele representa [..] ‘Sem embargo, a primeira reflexco que somos tentados a fazer depo 236 social que rodeava Mme du Barry em set ‘verdadeiramente ninguém, mais merecedor de respeito do que ela. Vemos os maiores rebaixarem-sea seus Em suma, a visio folel6rica da condessa e da p de Luis xv parecia convincente aos olhos de um contemporaneo sofisticado que fazia parte da intelligentsia patisiense. ‘AS cartas de editores que chegaram até nés demonstram o fas- inio do pablico por meia dtizia de autores de livros ilegais — Voltaire, Rousseau, Raynal, Linguet e Mercier —, mas quase nunca ‘comentam as teagoes dos leitores. Uma rara excegio nos arquivos dda STW € uma carta de um comerciante de Nantes, chamado Barre, que paralelamente vendia livros. Barre no tinha nada de bom para dizer sobre o comércio livreiro de sua cidade: “Os mercadores no esto sequer pensando em literatura”. A Histoire philosophique de ia exceeto: parte da venda| deenxergara verdad.” ‘A stwrecebeu um informe semelhante de Pierre Godeffroy, comerciante de Rouen, que também trabalhava com livros e era um centusiasta do lado mais racionalista do Huminismo. Godeffroy pediu & stv que Ihe enviasse umas seis c6pias do Systeme de la natu- re, para satisfazer 0 apetite de alguns amigos por frutos proibidos. [Em seu cfrculo todos “veneravam” Voltaire, escreveu; eele proprio ‘admirava especialmente a liberdade nistica dos sugos, que opunha aoespirito servil dos franceses. Jerum livro sobre uma vviagem as montanhas da Sui que aliberdade produz. Precisamos mostrar tantos exemplos quan- 237 tos pudermos para as pessoas daqui, que néo t8m nem mesmo uma idgin do que vema ser lberdade Os livreiros profissionai como esse, mas, conforme ex inidade de depoimentos sobre a procura por livres — “o género filos6tico, que parece ser 0 favorito registroua pecul ‘0 local por obras obscenas e blasfemas notou um grande interesse por antclericalismo: “Asnovas obras de M. Voltaire certamente tro grande procura. [..] Quanto aos ser- Sempre mencionavam. ‘0s mesmos textos, sobretudo Anecdotes sur Mme sobre a maneira como seus clientes os Enaturalqueostextosemsico ies pre irae da leitura”, onde 0 conde provo- cca Thérése a masturbar-se, col portier des Chartrewt, Hi podemos verificar tais suposigdes em face da experincia real dos leitores? Departamento do Comércio de Em junho de 1771, o subdelegado do intendente de Caen informou as autoridades que a Normandiaestava inundada de livros proibidos desses maus itemente os in ia e do respei mudar o rumo| sar filosofie: assuntos governamel ‘mundo discursa sobre tais questdes e corre a comprar as obras que Nao que os informan- Os profissionais de ambos os lados da lei entendiam que os nde ‘modos diferentes. Num mem Guy, que mascateava livres b ppara'a Veuve Duchesne, em Paris, descreveu as virias espécies de leitores: receber informagao, est itores tr ra ilegal e reagiam de mui /a que as reagbes fossem idénticas. Poré: proibida como coisa séria, suficientemente i Naturalmente, 0s arqu conceitos. Os inspetores do setor livreiro pox a seus superiores em Versalhes detectando e “les grands”. Convém ler com especial s anos que anteceder 0, porque ele os redigiu em diferentes épocas, entre 1790 & 1807, quando fugiu da Franca. Lenoir tentou defender sua adminis- ‘ra raos revoluciondi saram de abuso do poder bém tentou entender o que hhavia provocado a qu tas conhecia muito bem — tanto que no rascunho das memérias que ele nunca c ‘mages valiosas sobre as atitudes e p 9s livros proibidos nos De acordo com Lenoir, 0s belles ndo causaram maiores preo- cupagdes em Versalhes durante os primeiros anos do reinado de Luts XVI. O comte de Maurepas, principal ministro do governo ev triga palaciana, colecionavacangdes injuriosase epigra “Em reunides fntimas, M. de Maurepas declamava 0 poema elabo- Dizia que tais coisas sempre foram e sempre seriam igo para ocupar os parisienses que nao muitos afazeres e desejavam 1780, 0s ministros secretamente pagavam escritores para difamar os ccolegas. Libelles que nos iltimos anos tempestuosos de Luis Xv cir- 240 laramem to agora eram impressos e atacavam o proprio ‘monarca, Depois os ataques se voltara impoténc nesmo.em Maurepas, que inverteu sua polit fat misses secretas encarregadas de deter a produgio de libelles em outros paises. O comte de Vergennes, mi rior, enviou agentes secretos a Londres com a incumbéncia de s surgiam com maior rapidez do que sua capacidade de repri- de modo que “a lei foi particularmente ineficaz contra os yverno nos anos anteriores Revolugao”.* ‘tris, Lenoir achou que as‘injtrias “causaram dade interna, ao civismoe ao [espirito] de sub- Opablicoacreditavanas| mais absurdas, malgr doas tentativas do governo de neutr ‘com sua propria pr ‘ganda: “Os parisienses davam mais crédito 0s libelles que circulavam clande ite do que aos fatos, os pressose publicados por ordem do governoe com sua !bornara multidao para que ores enos arquivosda Bastilha. Em 1783, o ministro do Exterior dedicou praticamente o mesmo tempo snciar os libellistes de Londres: jue pds fim A guerra americana. A ca escreveu ele ao representante diplor slibellistes para ques \cafiou na Bastilha.” Pouco depois, toda- 241 nas criadas para produzir efeitos”, ¢ 0s ‘eptores dotados de um cérebro semelhants cages para esperar ras diversas. Mesm ditavam que os liv ilosophiques po vigorosas ¢ os libelles tinh tado. Nao temos acesso 4 mente dos homens usearam textos duzentos anos atrés, $6 podemos . Por meio do testemunho de autores, editores, 8 do governo e do ida —com exceco de um documento Em seu Tableau de Paris, Louis-Sébastien Mercier minimizar os efeitos dos libelles: contrabalanga uma excessiva concentragio de poder; ul limites da decncia da mesma for seu poder. Freqlentemente o suscitaram pequenos déspotas inso tes, €0 piblico percebe a verdade entre dois extremes, Esse trecho realmente sugere que o pablico nao acreditavaem tudo 0 que os libellistes diziam, mas nao prova que os leitores se recusavam a encarar os /ibelles com seriedade. Ao contritio, esta- bbelece uma distingao entre a caliinia exagerada, capaz de acarretar 242 ‘uma contra-reagiio, ¢ os ataques mais comedidos aos abusos do poder, capazes de incitar o piblico contra os déspotas. Nesse caso jo que Mercier faz de “o pil smelhantes — quer dizer, as pessoas bem informa- das, que estavam a par do que se passava no mundo editorial e das sociais e politicas do momento. Numa discussio seme- Thante de eartazes e panfletos satiricos, ele observou que “as pes- 5. conquanto os vejam s € os policiais, jores comuns, timos, porém escreveu um sugestivo ensaio " que considerou um indefi- vel”, com caracteristicas sociais variadase incompativeis.” Ape- existéncia de um pabli conflitantese pronunciava a verdade.”*A.com to modesto podiam fazer um ministro estremecer e chegou a afir- foi derrubado por um dos ellers, Correspondance Nao obstant sugestivo, no podemos abrisse uma janela para observarmos a mente dos parisienses centistas, Como todos os textos, possui uma subcorrente retori ‘mais nas referéncias & leitura, pois por um palavra impressa como o poder supremo da historia e, por outro, uguel e os libelles Por que essaavers20 3s formas mi Basicamente,creio, porque Merce om elas. Ganhara fama de “Rousseau da sarj seat), como Restif de la Bretonne, para quem se cunhara a expresso, Na correspondéncia literaria de Jean-Frangois de Ia Harpe, Mercier figura como dram: vulgare amigo intimo de Restif* Nas Mémoires secrets de Bachau- 243 ‘mont, cle aparece de lixo no Tableau de Paris obter o méximo de lucro.” Todas as resenhas concordam q _governoedordemsocial apresentada por Mercier. Como L'an 2440, © Tableau de Paris tornou-se um best-seller philosop! seria também um libelle’’ Ao analisar a primeira edigo, volumes, o artic ogio feriu profundamente Mercier, dedicou um capitulo ‘¢do de uma resenha: “A cri do! Vés, que me lestes, dizei-me: essa obra pode evocar alguma idéia relacionada com a odiosa palavra libelle? Por q\ Ela me oprime”. Esse horror aos libelles expressava se due sua obra viesse a ser inclufda nessa categoria, assim como sua condenagio dos escribas de aluguel denunciava. temorque ele sen- de ser visto como um deles, Na verdade, tudo o que Mercier pul egisladores ndo reconhecidos do mundo; o prelo é a is poderosa maquina do progresso; ¢ a opinio pablica é a forga .queumexemplo basta para 244 upavauma pos! js. Mercier recorreu as in cos para descrever 0 proc: vel como a gravidade o dade, era gerada por um génio, ada de sua pena, transmitida por meio da tipografia e gravada naalma do leitor-* Dat o capitulo sobre a imprensa em De la lirtéra- ture et des litt va,(..) Tre imagem. Nas livros indig escritores ¢transformou ibertamente cor uma trama dos j Ima do herdie transformé-1o em padre, obri obras de teologia e devogdo num internato de mascate aborda o herGi na rua.e oferece-the alguns livres sburgo. Um dia hilo 245 sophiques. Levado pela curiosidade, o jovem compra quatro textos ico de Voltaire; a assertiva do mascate de qi ‘coisas vendem sem parar; a emogao de abrir as primeit 1c de portar os pequet a camisa e no bolso; e o mergulho final amecha do candeeiro estala e queima até 0 t0c0. A feita na primeira pessoa, estende-se por dois c forecendo um quadro da leitura tal qual um autor de livros proi Apesar de bombastica, essa descrigto realmente correspon experiéncia de muitos leitores setecentistas.* Claro esté que repre- ideal do que uma prética comum. Mas esse € 0 ponto: longe de fornecer evidéncias inequivocas da forga reduzida da palavra impressa e da displicéncia dos leitores, Mercier expos uma conviceao, ada por muitos, de que a leitura podia mover montanhas—e remover déspotas, sobretudo se os livros eram “fi s6ficos”, ‘Como os livres philosophiques conseguiam produzirefeitos| extraordindrios? Nem Mercier evocou simples noges de causé de, Como muitos de seus contempordneos, imaginou um processo 246 em grandes ‘que faz nfletagem. Pode serque em seu pe 1789 (Parise Oxford 19) nrelagio “Die Wertherwirkung, Ei Mille Barre 3 Sry 15 de sete 2) Barre sr, 23 de (17) Peta srs, 31 deg Careza sr, 8 1785, com excessiva, especial lade: "Discours surlalec- Acres

Você também pode gostar