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INDICE © vendedor ambulante € sua condigdo «sess 33 68 80 Do contrabando & Liv iros honrados e grande cor ros de sucesso ¢ Revolugao sf eos 162 ANEXOS 1. As obras mais encomendadas: diviso por generos 197 Indice remissivo aie eee 209 8 LIVROS DE SUCESSO E REVOLUGAO Estamos certos de que alguns acreditam termos deliberadament deixado para o final o que julgariam a melhi ‘cdo de algumas das obras mais vendidas Poderiamos convencé-los de que nfo foi esse 0 caso ¢ de que sim- plesmente nos limitamos a subordinar & ordem de nossas investiga- bes a de nossa exposicéo? ‘Terao talver observado, em nossa dissertacdo, a sinonimia que XVII é que ele se faz corpus e & mercado. Ao contr: cito e das obras setecentistas que a posteridade consagrou como clés- sicos literarios, a leitura d io pode ser feita ape- nas segundo os critérios canénicos da gr ratura: a singulari- dade de uma escrita, a invengdo de um tom, Tal leitura deve ser feita considerando 0 dos elementos que tornaram possi fatura, como a de Voltaire, Mercier ou Hol aos negécios do Estado junta-se ‘uma forte demanda, menos ros — crénicas escandalosas, is, numa espécie de equivaléncia ger .0. Essa demanda € satisfeita pela oferta de um mercado clan- destino e flamentoso, 0 qual, dos livreiros-editores que geralmente lam nas vizinhangas do reino aos livreiros ¢ feirantes que 162 atuam por toda a Franga, juntura mult caso de agravamento desta, o mer ‘sanhos esperados silo proporcionais aos perigos corridos) que po- ,circulam ainda os panfletos contra Luis xv). ‘Os rumos politicos do Estado tém sobre o mercado clandestino efei- tos nao s6 de natureza comercial — 0 reforso repressivo da legisla- fo livreira, em 1777, eda fiscalizagdo alfandegéria, em 1783 — mas também de conjuntura literdria: cabe ao chanceler Maupeou, mais ‘que a qualquer outro, ter suscitado uma fieira de textos cuja explo- ragdo sobreviverd a ele por muito tempo. Ler atualmente os livros que fizeram a felicidade do mercado {que primeiro se abarquem todas as con- digdes — materi financeiras — do setor livreiro, de sevido desse comércio. E 0 que obser- ‘varemos expondo as trés melhores vendas do livro pornografico, do escrito filoséfico e da crdnica escandalosa: Thérése philosophe ou ‘mémoires pour servir & Vhistoire du pere Dirrag et de mademoiselle Eradice (1748), L’an 2440, réve s'il en ft jamais (1771) ¢ Les anec- dotes sur mme. la comtesse Du Barry (1775). yphe — obra atribuida a Jean-Baptiste de Bo- yer, marqués D’Argens, ou a outro autor andnimo, permanecendo encoberta por mistérios bibliogrdficos a origem do texto — & essen cialmente um romance galante, mesmo se certos temas possam le- a de filosofia. Em forma autobio- intervalos de seus fogosos embates, os parcel ‘gas. O tom é elevado; as observagdes so respeitosas tanto das con- ‘vengGes da sociedade quanto das autoridades politicas. Sé a religiio ce escamnecida, num estilo desabusado e galhofeiro, como se a hist6- ria de Thérése fosse narrada apenas para uso e deleite das elites, dos preconceitos populares Instala-se entre o autor € 0 leitor uma espécie de cumplicidade, ‘mesmo se a confissdo de Thérése € supostamente feita ao conde de... Colocado no lugar do conde, o leitor usufrui as cenas de toucado- res, bordéis e claustros. Thérése as desereve mais como as viu do 163 que como as viveu, pois é sobretudo uma espectadora da devassi- dio de suas amigas; e, quando dé livre curso a seus furores uteri- nos, oferece-se em espetéculo a0 conde, 0 qual a observa ac se, através da fenda de uma porta, exatamente como antes Thi se observou suas comparsas. Assim, nada ha de inconvencional nesse género galante, em que tudo consiste no voyeurismo. As con- vengdes do género reforcam o efeito da leitura, porque, afinal de vel nas diversas edigdes, dao outra dimensio a esse jogo de espelhos, nos quais se refletem por varias vezes os voyeurs ob- servados. A parte propriamente filos6fica do texto est em unfsso- jengdo geral: o artazoado elogio da masturbacio visa a provar que essa pritica ainda é 0 melhor meio de conservar a satide ¢ evitar os riscos da gravidez. Todos os aspectos do texto trabalham para lisonjear o leitor, atenuar seus escriipul gozar 0 prazer do texto, até mesmo a s6 mao". A sual ¢, a0 me Pois 0 autor entende que, longe de se contradizerem, sensuali- dade e metatisica se original do romance, Os ia em geral, remetem com freqiiéncia as crOnicas escandalosas. © autor extrai seu mel tanto dos panfletos da época quanto dos es- crtitos tesricos, como L’examen de la religion, outro classico do cor- pus de obras proibidas.' A mistura de géneros fica evidente desde as primeira irigindo-se ao conde de..., seu amante, Théré- se adverte 0 Desejas que eu te narre as cenas mistcas de mile. Eradice com o mui reverendo padre Dirrag, que eu te informe das aventuras de mme. C.. com o abade T... Desejas um quadro em que as cenas.com as quais retive, aquelas em que fomos os atores, ndo percam nada de sua ; que os argumentos metafisicos conservem toda a sua ener- as aventuras de uma cortesd; e a propria educacdo sexual de Théré- se. A heroina relata como testemunha as trés primeiras partes. O 164 conjunto destas constitui a educagao de Thérése, uma educagao no prazer, o qual € 0 p Tongo da narrati ‘mance de formagdo, a parte final em que o leitor descobre como ‘Thérése se entrega por inteiro ao conde. Jean-Baptiste Girard (cujo anagrama, bastante dbvio, é “Dir acusado de haver seduzido uma jovem dama, Marie-Catherine Ca- dda qual era confessor. 1731 — data em que o storia excitou as sua narrativa num tom mat bertina e picante. A se cter nele, a estraté siste em convencer a vitima de que as sensagdes er da espiritualidade, pois mortificando a carne purifica-se a alma alcanga-se 0 éxtase religioso. Na realidade, a mortificagao revela-se apenas a excitacdo sexual provocada pelo bom padre quando este introduz seu “‘cordio de slo Francisco" na bela dama ajoelhada para vé em seus orgasmos um sinal de beatificagao; al do dualismo car- tesiano, exatamente quando sua devocdo particular a conduz 20 ‘posto, ao prazer enraizado na matéria: — exclamou Eradice — que prazer me aguilhoa! to esté completa bom... © cor... 0 cardio, ‘Aqui, a metafisica, com o apoio das experiéncias denunciar 0 dualismo pregado pelo confessor: 0 espirito € apenas a matéria em movimento. ‘Tal tema é mais desenvolvido na segunda parte da narrativa, em que 0 abade T.... estabelece os fundamentos da educagio moral de Thérése, fazendo-Ihe o mesmo sermao que o padre Dirrag, mas sob uma luz positiva. Enquanto 0 jesuita usa o sensualismo para ‘fo recorre a essa doutrina 165 O prazer é uma coisa natural, disposto por Deus para nossa fe- licidade, mas deve ser governado pela razao, pois s6 esta sabe tensificd-lo e evitar a dor. Na vida, o célculo hedonista é suficiente como principio de conduta — desde que nao seja entravado pelas convengdes sociais, sobretudo as que exigem que a noiva chegue vir- ‘gem ao altar e que a esposa continue virtuosa. O celibato nao adianta nada, de tal modo a natureza o repele: uma mulher que renunciasse a todo prazer sexual arruinaria a satide. Portanto, sé ha uma saida: a masturbacdo. © abade se apresenta como exemplo, jd que se exercita na pra tica de “la petite oie” com mme. C..., sua companheira, ‘Zo gran- de masturbadora quanto ele é masturbador. Mme. C... quase mor- rera num parto, e a crianea ndo sobrevivera por muito tempo; em conseqiiéncia, cla decidiu que, dali em diante, 0 objetivo supremo de sua existéncia seria gozar sem moderagao nem risco de gravidez. A masturbacéo permite que o abade e sua parceira, uma vez sa da a paixdo, mantenham verdadeiro intercurso filos6fico. Thérése 108 observa ¢ 08 escuta pelo rasgdo de uma cortina. Assim, aprende do abade que Deus néo é sendo a prépria “Dama Natureza”, o gran- de Todo, que ignora o bem e o mal e determina a sorte dos seres mediante 0s “principios do movimento que estabeleceu em tudo que existe”. Embora convengdes morais tenham sido estabelecidas pela sociedade, elas nao tém nenhuma base nas leis da natureza. Pelo contrario: so um instrumento para que os fortes dominem os fra- cos, especialmente as mulheres. Pois estas so aprisionadas numa ‘moralidade da qual tém tudo para recear: ‘‘As mulheres s6 tém que temer trés coisas: 0 medo do di itagdo ¢ a gravidez”? © abade insiste em que essas verdades s6 devem ser conhecidas pela elite das “pessoas que sabem pensar”,® O comum dos mortais deve ser governado pelas diversas religides, que perpetuam a domi- ago dos fortes sobre os fracos. Todas essas religides se equiva- lem, cada qual explorando a credulidade do povo, escondendo-lhe cional do prazer. Tal é a ligdo de filosofia que vem do outro lado da cortina: a metafisica ¢ ensinada pelo voyeurismo. Completada sua educacdo, Thérése vai tor segue na terceira parte da obra. Gragas a “la petite o roina recobrou a satide, engordou e recuperou o equilibrio intelec- tual — tudo que perdera no convento. Esté pronta para o amor. Mas como se entregar a ele na capital, cidade da perdi¢do, sem dei- xar ali sua reputacdo e virgindade? A questo é ainda mais premente 166 Porque Thérése s6 tem quatrocentos luises, herdados de sua mae, e nfio conhece ninguém. Instalada numa penséo mambembe, trava amizade com mme. Bois-Laurier, ex-cortesa, Esta lhe conta sua vi- da galante, o que vale ao leitor nova série de quadros hibricos, sem ‘que a narrago progrida muito. Para terminar, Thérése encontra 0 conde de... no Opéra. Tomam-se de uma *‘simpatia dos coragBes”” — afinidade sentimental determinada pela conformidade dos 6r- silos.’ O conde se oferece para sustentar Thérése como sua aman- te, mas ndo para desposé-la, pois ele tem um horror a0 casamento que sé se iguala & repugnancia de Thérése pela gravidez. Eis, enti, o dilema com que se defronta nossa herofna quan- do se abre a quarta e tiltima parte desse Bildungsroman: poder ela aceitar a condicdo de teiida e mantetida, numa vida de prazeres, de- vendo assim renunciar a respeitabilidade de uma posigo na socie- dade? A resposta torna-se objeto de um célculo racional. Em vez de deixar-se levar pela paixdo e atirar-se nos bragos de Thérése, 0 conde propée a esta um contrato de nao-casamento: ele a levar pa- 1a seu castelo e Ihe assegurara uma renda vitalicia de 2 mil libras; Thérése, por seu lado, aceitard viver com ele como amiga. Depois, como amante, se o prazer o estimular. Trata-se de um raciocinio hedonista, 0 oposto do amor apaixonado de La nouvelle Heloise. Ao fim de um arrazoado que pondera ganhos e perdas, praze- res e dores, Thérése resolve aceitar a proposta. Instalado no caste- Jo, 0 casal dedica-se tanto & masturbagdo quanto a filosofia, Disci- pulo das teorias do abade, o conde professa “[..] que a alma no é senhora de nada e s6 age em conseqiigncia das sensagdes e facul- dades do corpo”.* Esse materialismo ingénuo nao o impede de de- sejara felicidade de Thérése, pois a me”). 0 idilio, contudo, é perturbado por uma coisa: 0 conde de- seja desfrutar plenamente sua amiga. Como fazé-o sem quebrar 0 ‘compromisso que assumiu, enquanto cavalheiro, de res sejos ¢ aversies de Thérése? O conde a instala em sua bi seguird estudar sua colegdo de livros e quadros galantes sem recor- rer & masturbacdo. Apés quatro dias passados a devorar Dom B***, portier des Chartreux, La tourigre des carmélites, L'académie des dames e outras obras semelhantes — todas classicos do mercado clan- destino —, Thérése esta vencida. A leitura desses livros termina 0 que 0 discurso filos6fico do conde comegara. Tanto para Thérése quanto para o leitor, a excitagao dos sentidos confirma a teoria do 167 sensualismo: no auge da perturbacdo, Thérése se acaricia com o de- do; depois, implora ao conde que venha possui-la. Num atimo, 0 conde, que a observava por detrés de uma porta, precipita-se na bi- blioteca e possui vigorosamente a jovem. Thérése se abandona por completo ao prazer, mas o conde, fiel a seu ideal de cavalheiro, sa- be permanecer “'senhor de si mesmo". Para poupar & amante os horrotes de uma gravidez, retira-se no momento critico ¢ derrama sua semente em outro lugar. A obra termina com esse coitus inter- ruptus, A ligo & a0 mesmo tempo filos6fica e demogrifica. O que rio nos surpreende muito, pois é no século XVIII que, em face da mortalidade nos partos, difundem-se as primeiras medidas contra- ceptivas em certos estratos da populagdo francesa. Fica uma per- gunta: seria absurdo crer que uma obra téo vendida quanto Thérése hilosophe (e outras semell como Le triomphe des religieuses [0 mriunfo das religiosas, ou as freiras tagarelas) tenha contribuido para a evolucdo peculiar & demografia francesa, com queda nas taxas de mortalidade infantil e, pouco de- pois, queda na natalidade?"? A hipétese ¢ menos extravagante do ‘que se poderia pensar: s6 agora comecamos a compreender melhor a importincia da alfabetizac20, da difusdo do livro e dos habitos de leitura no fim do Ancien Régime." Seja como for, na historia dda emancipagdo da mulher um lugar de honra deve ser dado a Thé- rese philosophe: redigida por um homem, a obra expde uma sen- sualidade feminina que nao esta subordinada aos prazeres ¢ desejos do homem., Recusando o papel de esposa respeitavel e mae de fami , Thérése abre uma brecha no conformismo social e na funea0, ‘A histéria de Thérése 6 fice, falta-lhe verossimilhanga: em vista das realidades da época, quantas jovens podem escolher uma vida de prazeres num castelo, com 2 mil libras de renda, sem se dei xar apanhar pela rede do casamento? Quem procurar nesse roman- encontrar apenas o aroma da filoso- fia. Uma filosofia austera, apesar de seus ares de voluptuosidade, pois ndio sabe 0 que fazer do amor. Essa palavra quase nao aparece no texto, em que se trata apenas do amor-préprio ¢ do prazer. Mes- ‘mo assim, o prazer é reduzido a um agradavel prurido na epiderme, transmitido ao o€rebro pelos fluidos vitais e armazenado na |, torna-se objeto de reflexdo. A sexualidade é essencialmente cerebral. Nela, 0 coracio nao desempenha papel algum, ¢ as perso- nagens do romance sfio autOmatos impulsionados unicamente pelo prazer. Seu universo desconhece as efus6es do coracio, as légrimas 168 doces, as angiistias sentimentais. Nenhum outro mundo poderia ser mais oposto ao de La nouvelle Héloise, nem mais préximo do ra cionalismo das Luzes em seu apogeu, nos meados do século, quan- do a filosofia prometia dissipar as trevas triunfando sobre a superstigao. A filosofia da obra é um amélgama de idéias extraidas tes dispares, destilada, em doses acuc manesco, como uma mistura de espi mundano, e dirigida sobretudo contra a Igreja cat6li — apesar do respeito as convencdes sociais e as autoridades polit- ccas que no cessa de apregoar, especialmente no sumério filos6fico da vida de Thérése, mediante o qual se conduz a narrativa —, pois, a0 contestar abertamente a Igreja, mina o pilar de todas as orto xias da monarquia. Seu ataque ¢ desfechado em nome da felicida. de, idéia revolucionéria que sera proclamada 28'anos depois do apa recimento de Th nia Declaracao de Independéncia dos Estados Unidos, evo. veis direitos do homem: “life, liberty, and the pursuit of happiness”. Nao é que precisemos arrolar Thérése entre os pais da Repiiblica americana, mas todos co- ‘mungam no mesmo cul to, esse culto, que resulta totalmente do géne- equ tuosidade e a filosofia. Ta cio da obra, com uma legenda que resume o essencial da fi theresiana: A voluptuosidade e a flosofia fazem a fel Ele abraga a voluptuosidade pelo prazer e Lan 240, de Louis-Sébastien Mercier, respira um: completamente diversa. Iniciado em 1768, publicado pela primeira vez em 1771 e emendado varias vezes em edigdes posteriores, o livro est tor esforga-se para fazer vibrar as cordas sentim res, jogando alternadamente com o assombro e a indi digoa 0 espirito zombador, 0 riso voltairiano, a autoridade da razdo: “Infeliz este século, em que se racio ‘Segundo 0 p Spica, a visdo do futuro é uma projegdo da visdo cri ‘Onarrador adormece e, entdo, acorda em 2440, setecentos anos depois. Paris transformou-se numa utopia. Quase néo se reconhece 169 a cidade, a tal ponto ela se tornou limpa e ordenada. As carruagens rodam lentamente pela rua, mantendo a direita e parando para dei- xar os pedestres atravessar. Nelas s6 viajam os ancidos enfermos € ‘9s senadores, os quais inspiram respeito pelos servigos que presta- ram & pétria. Os outros parisienses vio a pé, vestem-se com simples togas, bebem 4gua pura que jorra de fontes piiblicas, localizadas em todas as esquinas, e habitam casas dominadas por terracos nos quais a abundancia de flores e frutos é tal que os telhados formam. vvastos jardins suspensos. A cidade ndo é maior que no século XVI, ‘mas a zona urbana reduziu-se, em beneficio da rural; a populaco, embora tenha crescido 50%, distribuiu-se mais harmoniosamente; a agricultura prospera, os negécios se reduziram ao minimo neces- sério, 0 luxo niio existe. Em vez de ser uma metrépole dos prazeres, Paris tornou-se capital de uma reptiblica tao florescente quanto austera. A fungio moral da cidade é visivel nos monumentos ptiblicos € no uso do espaco. Um Templo da Cleméncia se eleva na Place de Ja Bastille, e um Templo da Justica, construido diante do Louvre, substituiu o antigo parlamento. A prefeitura foi transportada para junto do Louvre, com o objetivo de abrir uma area imensa na Place de Gréve para que ali ocorressem festas civicas. O H6tel-Dieu, a Sal- pétriére, Bicétre* e as prisdes desapareceram — pois néo ha indi- ‘gentes, a criminalidade praticamente inexiste e a melhoria da hig de centro piblico de inoculagao encarna o triunfo da satide, que be- neficia toda a populacdo, gracas ao desenvolvimento de uma me cina natural. A educagdo é universal. No primario e no secundétio, aprende-se francés, Algebra, cincias fisicas e, sobretudo, moral vica. Na universidade, estudam-se apenas ciéncias praticas, como a anatomia, tnica disciplina ensinada sob a ciipula da Sorbonne. Da teologia s6 subsistem alguns velhos livros, armazenados sob a terra como as munigdes e balas envenenadas que serio disparadas .0 em caso de ataque. A ameaca de guerra, contudo, 1nd pesa mais sobre os povos, jd que todas as nagdes reconheceram as fronteiras naturais; o estabelecimento de uma paz perpétua as dis- névola. Alids, 0 risco de desordens no mais existe, pois a boa ct 1c, de inicio concebidos com fungi curaiva ¢ assstencal, com o tempo adquiriram caréter marcadamente penal. (N. T.) 170 duta dos cidadaios € determinada pelos efeitos da _monumentos piblicos instruem 0 povo oferecendo-Ihe imagens das virtudes civicas, enquanto 0 transito civilizado e 0 igual acesso As uagens € aos espagos abertos — es ries, Fechados ao zé-povinho no século x’ sentimentos de igualdade e liberdade. Em todo bs mena, armada de punhal, enfiava-o num tirano, de todos o coragdo dele, devorado por serpentes No interior do teatro, o piblico derrama doves légrimas ante a representagao de um drama sobre o caso Calas,* depois de uma peca que exalta a meméria do bom rei Henrique IV. O culto aos bons reis perpetua-se principalmente gracas as estdtuas erguidas sobre as pontes, sobretudo na Pont-Neuf, rebatizada ponte Henrique 1v. Ao longo das calgadas, estétuas de estadistas como L’HOpital, Sully e Colbert fazem cortejo & estétua eqiiestre do rei Henrique, de modo a formar um texto que seja lido por todos os passantes: E uma visdo curiosa, pelos menos para o leitor moderno, a quem a ficgdo cientifica empanturrou de maravithas tecnolégicas. Para Mercier, o futuro nao tem de modo algum foguetes intergaldcticos, revélveres ultra-sOnicos, guerras nas estrel ‘As Fantasias do século x’ sem as engenhocas. Ao con- trério: as dimensdes do futuro imaginado por Mercier so exclusi Foi condena da perseguicdo sos protestants. (N.E.) m7 vamente morais. A obra, embora nao tenha como nos entreter hoje em dia, fascinou um piiblico imenso em sua época: Lan 2440 é 0 supremo best seller na lista dos livros proibidos. Teve pelo menos 24 reedigdes entre 1771 ¢ 1789." Enquanto os fabricantes de contrafacdes se langam sobre a obra, Mercier trata de explorar sucesso, modificando constantemente 0 texto: com adigdes, correpdes, notas, discursos preliminares, pre- Fécios do autor, capitulos novos sobre tudo que Ihe vem & mente, Mercier nao parece mais se preocupar muito com a verossimilhanca dos episédios narrados. Em conseqiigncia, 0 pequeno volume in- oitavo de 6, atinge a di mensio de trés grossos tomos. Esse inchaco prejudica a forga do relato, mas éncia, pois a obra descreve apenas uum passeio 0. O leitor segue passo a passo 0 nar- rador, maravilhando-se com a transformagio da cidade. Se as ve- es perde o fio da meada, pouco importa; mais adiante, tornard a encontré-lo. Dez anos dep ard essa mesma estra tégia expositiva no Tableau de Paris, outra obra destinada a sensa- cional carreira comercial, mas dessa vez oferecendo uma descri¢ao sombria da Paris sua contempordnea. Os dois livros se completam como duas verses de um mesmo livro que Mercier seria capaz de estender até o infinito, ‘Como explicar esse espantoso sucesso? L’an 2440 est longe de ser © primeiro romance utdpico, mas ¢ o primeiro situado no futu- ro, Assim, 0s leitores do século XVitI podem transportar-se setecen tos anos adiante, para uma Paris que Mercier descreve em seus me- nores detalhes cotidianos. Da mesma forma, os trajes: no inicio da historia, Mercier leva 0 leitor a uma loja de roupas usadas, onde ‘ narrador se veste & maneira dos parisienses de 2440 — uma toga, presa a cintura por uma faixa e vestida sobre uma espécie de calea- ‘meia, num conjunto sen icios que possam atra- palhar 0 movimento natural do corpo e, sobretudo, sem espada, sim bolo do ‘‘velho preconceito da nobreza gética”."* Os chapéus so descritos com todos os pormenores, permitindo a Mercier explicar, num pequeno sermao moral, que a th ingdo expressa pelos costumes ¢ a do mérito: se um homem é excepcional em seu oficio, salvou a vida de outro cidado, prestou & patria algum servico ex traordindrio, cabe a seus concidadaos solicitar ao rei um chapéu bor- dado com o nome desse homem. Tal honra the confere uma nobre- za pessoal ¢ Ihe da direito de entrada em toda A antiga nobreza sobrevive alguma. Quando o estalajadeiro”, ai ém uma mesa aberta a todos os estrangei- a rentagao é boa, mas s6- bria: sopa, legumes, caga, frutas. O principe conversa amavelmente com 0 narrador, o qual Ihe descreve o Iuxo e a decadéneia dos gran- des senhores do século XVII: — Abt — digo-the — vossos p a lo gene rosos quanto vossa senhoria! Passavam o dia na caca ¢& mesa. Se ma- tavam lebres, era Gastaram milhdes c ladores. lesempenharam 0 oficio de cortesdos; abandonarar 9 Diante disso, todos os ow ram exclamagoes de s presa, ergueram as maos para 0 céu e se assombraram com a barba- rie da Franca de outrora. Esta 6, retrospectivamente, a Franga do leitor contemporiineo ‘a Mercier. Por mais banal que essa expatriacdo no tempo possa pa- recer hoje, ela proporciona uma sensacdo delici tecentista, o qual faz a si mesmo uma pergunta insidiosa: sob que luz presente sera visto, quando se tiver tornado pasado? Mercier sabe insistir na violéncia da confrontagdo das duas épocas, usando todo um sistema de notas de rodapé em que fala com outro tom. ‘Assim, & passagem consagrada aos nobres do século XVI acrescenta esta observacio: A caga deve ser ndbil e baixo. Sé se de- vem matar 0s a Jos 0s usos esse édecer- (0.0 mais triste. Releio sempre com renovada atencZo o que M ne, Rousseau e outros fildsofos escreveram contra a caga[..1 A nota ao pé da pagina é nada menos que um pequeno ensaio de 250 palavras contra a caca e, por extensdo, contra os cruéis cos- tumes da nobreza. Mercier se dirige ao leitor diretamente, no pre- sente, enquanto 0 “ew” do tglato deve ser encarado como um nar- rador anénimo que conversa com um guia-fil6sofo na Paris do futuro. A justaposic&éo de ambiéncias temporais tem efeitos mais for: 10 espacial com sociedades afastadas, como a Pér- sia de Montesquieu ¢ o Eldorado de Voltaire. Pois Mercier trata bém sobre o futuro do pasado, abrindo perspectivas historias at. doantes. A personagem mais infam« XIV, desprezado em 2440 como o inventor do sistema despético que, 173 setecentos anos atras, conduziu a Franga: sracdo de sua alma para o corpo de um inclui a metempsicose nas Fantasias filoséficas do texto —, 0 rei rea- parece para chorar seus erros sobre as ruinas de Versalhes. No fi- nal, numa cena melodramética tirada dos Night thoughts (Pensa- ‘mentos noturnos] de Young, 0 narrador reencontra o rei e escuta sua confissio; depois, uma serpente sai de uma coluna derrubada € pica o narrador, que desperta na Paris de Luis xV. ‘A deniincia do suntuoso despotismo de Luis XIV percorre to- do o texto. Para torn: edo de 1771 dois cay torze”. Neles, ex} 05 livros da historia, depois de haverem resumido o essen volume muito fino. Este conta que o passado é apenas um espeté- culo de crueldade e opressdo produzido por tiranos, dos quais Luis XIV 6 0 pior. Do lado da virtude, havia apenas alguns reis, como Henrique 1V; um ou dois bons regimes, como a democracia suica; ‘mas, sobretudo, autores patriotas que, por terem difundido as Lu- zes apesar da perseguigdo, asseguraram a longo prazo a vitéria do progresso. Essa verso da historia celebra 0 culto do escritor, mas Mercier restringe muito o niimero de beneficiarios dessa exaltaco, No capi- tulo dedicado a Bibliotheque Royale, ele evoca mais um auto-de- Tendo decidido que a maioria dos livros esta repleta de menti vaidades, os pais da pétria extrairam deles 0 que podia ser uma fragdo infima, guardada em quat © da Inglaterra s6 alinharam o: que exalam virtude. none dos cldssicos parece alterado de alto a baixo: Fénclon triunfa sobre Bossu: suprimido, da mesma forma que todos os ‘beaux es branche desapareceu, junto com todos os Padres da lerej -onsultos e quase todos os historiadores e romancistas. € Racine sobreviveram a imolacdo, pois perscrutaram © coraco humano. Mas Moliére s6 existe em versdo resumida, a tal Ponto sua critica dos costumes ndo tem mais sentido'para as pes- s0as virtuosas. © mesmo ocorre com Voltaire: a defesa de Calas é aapreciada, assim como a Henriade eas tragédias, mas sua frivolida- de causa aversio. Sé a metade de suas obras sobreviveu, ao passo ‘que se preservou devotamente toda linha de Rousseau, 0 géni sublime do século, Outros filésofos — Montesquieu, Buffon, Hel- vvétius — silo conservados, sendo a causa da sobrevivéncia de suas ‘obras os servigos que prestaram & humanidade, Contudo, os eseri- ‘ores contemporaneos de Mercier que estavam mais em voga — La Harpe, por exemplo — so omitidos, caindo no esquecimento. Em sua escolha do que a posteridade guardard da histéria lite- © révia, Mercier certamente esta exercendo uma vinganca retrospecti va, em nome dos eseritares obscuros ¢ perseguidos que encarnam a virtude, Tal ressentimento eclode em sua metempsicose fantasista: ¢ as intligéncias amigas da humanidade.** is, existe na Paris do futuro um local dedicado unicamente 05 Fildsofos, liderados por Voltaire e Rousseau, marcham sobre os inimigos das Luzes. E bvio que, em sua representagao do passado, os franceses do ano 2440 concedem lugar preponderante aos Fil6- i porneos acerca do nas uma seqiiéncia de horrores condenada ao esqueciment tdtuas dos escritores stio o complemento das dos bons mit Pont-Neuf: elas ensinam o patriotismo e celebram o culto ao escri- Ito que esté no Amago da religido civica, 0 civica é, sobretudo, uma religido do livro. Tem sando de seus foros se tenham tornado grandes leitores nao é nada surpreendent Mercier vai mais longe. Faz dos franceses ‘um povo todo autor ‘A qualidade de cidadao implica a de escritor. Antes de morrer, ca- dda um destila o essencial de sua experigncia ¢ sabedoria nu {que é lido no funeral e que se torna *‘a alma do defunt ce escrever sto os ritos fundamentais da religido civica imaginada por izago do impres- 80, na qual o autor e 0 leitor passam a tocha um ao outro a fim. de assegurar progresso. 175 Oculto civico iamente religiosas. Todas as manhas, durante uma hora, todo cidadéo participa de um culto ao Ser supremo, mplo coberto por um domo de vitrais transparentes; nas paredes, apenas a palavra “Deus”, escrita em di versas linguas. Esse culto parece muito mais préximo da religido do {rio saboiano de Rousseau que do racionalismo deista de Voltai re, Sao iniciados apenas os meninos, jé que as meninas, assim co- mo as mulheres, ocupam-se apenas das tarefas domésticas. Quando Co adolescente comesa a suspirar ¢ erguer os olhos para o céu, éleva- do noite para contemplar as estrelas por um telescdpio. Depois, pedem-Ihe que estude num microscépio uma gota de agua. Essa “co- ‘munhao de dois infinitos"” o faz chorar copiosamente e o cura para igo do atefsmo. Se um ateu aparecesse algum dia no seio da repiiblica, seria convertido mediante ‘‘um curso intensivo 2% pois as leis da natureza proclamam a exis- téncia do criador do universo ¢ no Todo a ordem moral se conjuga com a ordem fisica. Esse deismo extatico leva todos a participar da vida da cidade. Em vez de se ocuparem com querelas teolégicas, os padres consa- ‘gram-se a0 consolo das vtivas e dos 6rfaos. Os “santos” so 0s he- réis da humanidade — os que, com o risco de suas vidas, salvaram desafortunados em incéndios ou trabalharam nas minas para pou- par & coletividade um trabalho penoso e perigoso. As festas sdo re s, no decorrer dos quais todos dao livre curso a seu ica de Mercier baseia-se, essenci mente, em Rousseau. (© mesmo rousseaunismo inspira também o sistema politico de (0. A Franga do futuro se governa pela ‘‘vontade geral””,?¥ mas 0 mecanismo desse poder permanece to obscuro quanto no Contrat social. O narrador aprende de seu guia que o governo "..] nd0. tocratico””2* -a”" composta de uma mistura de ins- igdes: um senado encarregado da administracao dos negécios pi: ela pela execucdo das leis” empregando meios ], a8 dnicas a ter e uma vez a cada dois o se estende sobre esse ponto. A des cionamento do sistema prefere 0 tocante retrato do fc amor pelo povo, seu desdém pela pompa, seu cora¢do justo, sua tendéncia a derramar 176 mais, Na infancia, é, como Emile, criado por gente modesta que lhe esconde seu augusto destino. Trabalha ao lado dos eamponeses, vestido como um deles; depois, percorre todas as informando-se das atividades de seu povo, compar cm suas choupanas. Quando atinge a idade de vinte cado a uma audigncia na sala do trono. Para sua e © proclama seu sucessor, e todo mundo se desfaz em ce esposa, escolhe uma moca do povo, a qual ele sempre adorou se- cretamente — mas, antes, deve lutar com um carregador, que 0 der ruba respeitosamente para dat Tudo isso nos distancia d: wersagao de Mercier s6 progride gracas a golpes teatrais e cenas lacrimosas. Ima- gina uma repiiblica sentimental em que a bondade, sustentada pela religito 2 ‘do se preocupa muito com as contradigdes que recheiam seu relato. A reptiblica do uro é perfeitamente igualitaria, mas mantém uma nobreza here- ditéria; 0 povo nao é rico nem pobre, mas os “santos” dedicam a luta contra a pobreza; a imprensa é livre, mas os autores de artigos que ofendem os juizes patriotas deverdo usar uma més- cara até que reconhecam seus erros; as artes e as cincias florescem, ‘mas livros s4o queimados; os cidadaos gozam total dicam 0 oficio que devem exercer.* Na Paris de Mercier, tudo ¢ transparéncia: os cidadaos Item 08 coragdes uns dos outros" ¢ 0 “olho absoluto’” de Deus penetra todos os designios.®° Os censores zelam pela vida pr to guardas postados nas dos cidados vismo.*! A propria cidade sustenta o conformismo, jé mentos e pracas agem sobre as sensagdes e sentimentos de todo dado, de maneira a formar ¢ a manter em todos o mesmo espi civico. Essa educagao universal se faz segundo modalidades que Mer- cier rouba descaradamente do Emile; ela visa a que ninguém esca- pe ao dominio exercido sobre suas idéias pelo ambiente. A cidade persegue as trevas heterodoxas do foro intimo dos cidadiios, da mes- ia forma que suas lanternas levam a todos os recantos e ruas uma claridade impiedosa: ‘(..] suas luzes combinadas no deixam ne- 7 nhuma sombra”’2? Tudo conspira para que os parisienses de 2440 sejam esmagados pelo peso de uma virtude normativa, intolerante e estatal Essa iltima leitura, porém, é a de uma época que ja conheceu € combateu 0s totalitarismos. Os leitores contempordneos a Mer- cier ainda desconheciam o Terror e nfo podiam imaginar semelhantes fenémenos, Se nada — ou quase nada — nos informa sobre a ma- neira com que se apropriaram do texto ao Ié-lo, 0 prdprio sucesso do livro faz supor que o acolheram do modo almejado pela retérica do autor; deviam indignar-se com todos os abusos do Ancien Régi- me, tais como a futura Paris 0s cor pressiona principalmente pelo que no contém: nela no hé nem corte extravagante nem nobreza poderosa; nenhum intendente, parlamen- to, Receita, Exército; nenhum convento, dizimo, gabelles,* ordens régias ¢ outras injusticas que os franceses denunciariam nas petigdes cenviadas aos Estados Gerais em 1789. Mercier ¢ 0 precursor da Re- volucdo? Depois de 1789, ele quis posar de profeta: ‘Ouso dizer que jamais uma predicdo se mostrou tdo acurada e descr: detalhadamente a espantosa série de todas as metamorfoses as. Portanto, sou 0 verdadeiro profeta da revolucao [..J.” speci Certamente, Mercier fala de uma “‘revolugdo” no curso de sua obra; mas trata-se apenas de uma mudanga pacifica que um “‘rei- filésofo" efetuou na constituicdo da monarquia.™ Longe de forne- cer a base para a pretensdo profética de Mercier, isso demonstra até que ponto era impossivel a um autor audacioso pensar o impensé- vel em 1771, j4 que o conceito de revoluedo, no sentido moderno do termo, nasceu com a prépria Revolucdo. No final do Ancien Ré- zgime, o imaginario permanece estancado pelos limites do sistema tural mondrquico. Entéo, Mercier imagina uma sociedade igua- ja com uma nobreza hereditéria; uma repaiblica em que a edu- cacdo do monarca importa tanto quanto a vontade geral; uma ad- ministragio libertdria regida pelos censores e pela . Se Mercier nao chegou 20 ponto de lancar um improvavel cha- ‘mamento & Revolug&o, permitiu a seus leitores pensar na alteridade politica e social — isto &, compreender ficticiamente que 0 mundo tal como € no é 0 mundo tal como poderia ser; em conseqiléncia, a realidade poderia ser antes transformada que perpetuada. Por meio da gindstica mental, essa nova percepedo da projesdo-retrospeccdo eto sobre o sal; vgente do século XW a 1789, (N. T.) m2 ON ©) Imposto sobre o futuro era um primeiro passo para o engajamento utépico, asso que, junto com outros, levou o piiblico letrado a uma verda. deira revolucdo do pensamento, mesmo se Mercier nao a profet ra. Observando 0 sucesso do utopismo pré-revolucionario de Mer- cier, ndo se pode deixar de lastimar que Daniel Mornet nao haja estudado a difusdo de L’an 2440 ao lado da do Contrat social; ele teria visto, em Mercier assim como em outros autores, a marca da existéncia de um rousseaunismo popular, explosivo, mais dissemi- nado que o do proprio tratado de Roussea ‘As Anecdotes sur mme. Ia comtesse Du Barry, a obra de Mathieu-Francois Pidansat de Mairobert, vém logo depois de L’an 2440 na lista dos mais vendidos do comércio livreiro clandestino. Essas Anecdotes repercutiram num piblico mais amplo que o das

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