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Quando falamos em história da informática, logo nos vem à mente os

computadores 8088, o MS-DOS, o Windows 3.11 e o Unix. Mas muita gente se esquece
– ou talvez nem saiba – da história brasileira da Informática, uma fábula marcada pela
vergonha.

Na década de 80, o Brasil estava vivendo seus últimos anos de Ditadura Militar.
Os homens de farda que comandavam o país viram que a tecnologia estrangeira era
muito superior à produzida pela indústria nacional. Como eram um governo militar, não
podiam deixar a sua Pátria ser humilhada desta maneira e, então, tiveram uma ideia
genial. Alguém disse: “Vamos proibir a importação de todo e qualquer material
relacionado à indústria da informática para que as empresas nacionais se desenvolvam
e, quando reabrirmos o mercado, elas poderão concorrer em pé de igualdade  com as
americanas”. Sim, você pode estar tendo um treco ao ler isso, mas foi exatamente o que
aconteceu: os militares criaram a famosa Reserva de Mercado, através da qual comprar
qualquer computador ou software no estrangeiro era proibido.

Com isso, várias empresas nacionais, como a Itautec e a Convergente, ganharam


destaque. Embora sempre houvesse algum espertinho que conseguisse trazer um
programa de fora, legalmente apenas os programas produzidos aqui existiam. Os planos
militares estavam dando certo, mas não terminaram conforme o esperado pois, quando o
presidente Fernando Collor acabou com a Reserva de Mercado, a indústria de
informática americana simplesmente esmagou a brasileira, que era sustentada em
carroças com processador 8088 e softwares piratas.

A pirataria, naquela época, no entanto, não era como a de hoje, onde se baixa um
programa e este é usado sem uma licença: era mais grave: os “programadores”
brasileiros pegavam um software estrangeiro e, através de engenharia reversa, mudavam
o nome do programa e diziam que eram eles quem tinham feito. E o fabricante nem
podia reclamar, pois as empresas eram protegidas pelo governo, que dava aval a esta
prática.

Abaixo, selecionamos uma pequena lista de programas nacionais que foram


sucesso na década de 80 mas caíram no baú do esquecimento e, ao final, damos
referências onde você poderá encontrar mais informações dessa passagem esquecida de
nossa história tecnológica.

SISNE Plus
Trata-se de um sistema operacional desenvolvido pela Itautec e pela Scopus. Na
verdade, é um clone do MS-DOS, com algumas pequenas falhas (por exemplo: quando
aparecia uma mensagem “Quer continuar (S/N)?” era preciso apertar Y). Dizem que ele
teria sido escrito em Turbo Pascal. Quando a Microsoft soube de sua existência, tentou
processar as fabricantes para que parassem de vender esta cópia ilegal de seu sistema
mas, como a empresa era protegida do governo, todos os apelos do tio Bill foram
solenemente ignorados. Com o fim da reserva de mercado e a grande disseminação do
MS-DOS original, este sistema foi descontinuado.

SOx Unix
Nós também tínhamos um sistema Unix-Like. O SOx Unix talvez tenha sido um
dos mais bem-sucedidos projeto da informática nacional chegando, inclusive, a ser
certificado como UNIX-compatible pela X/Open em 1989. Foi desenvolvido pela
COBRA Tecnologia e projetado para rodar em seus próprios computadores. Apesar de
ter sido um sucesso tecnológico, o SOx veio muito tarde, quando a COBRA deixou de
dar suporte a ele. Depois disso, ele foi descontinuado e o governo optou pelo System V
4.0. Você pode encontrar mais informações sobre o SOx neste blog.

Redator
Um dos mais bem-sucedidos projetos da Itautec. Tratava-se de um processador
de textos em modo texto. Uma curiosidade é que o produto ainda existe mas mudou de
ramo: atualmente, ele é um clone da versão clássica do Microsoft Word com ênfase em
Gramática, Concordância e Literatura da Língua Portuguesa, sendo muito usado em
escolas de ensino fundamental e médio.

Carta Certa
Foi o processador de textos nacional que mais fez sucesso durante a Reserva de
Mercado, respondendo por 40% dos editores do Brasil. O único erro do Carta Certa era
que ele era um processador de textos para DOS e sua desenvolvedora, a Convergente,
tinha apenas um grande cliente:a Caixa Econômica Federal. Quando a Reserva acabou,
a Convergente prometeu que iria desenvolver uma versão do editor para o Windows
3.11, mas a Caixa não quis esperar e o substituiu pelo Microsoft Word. Como resultado,
o programa que outrora dominava 40% do mercado foi descontinuado e a Convergente
acabou sendo vendida.

Onde obter mais informações?


Se, depois de ler esse pequeno texto, você ficou curioso ou ficou com aquela
saudade, um ponto de parada obrigatório é o site DataCassete, que reúne um grande
acervo de revistas e manuais da época. O site tem, inclusive, esses programas citados
para download, mas vale um aviso: mesmo que eles não estejam mais no mercado, eles
ainda estão protegidos pela lei de direitos autorais e utilizá-los sem licença é ilegal.

E você? Conhece ou se lembra de mais algum programa antigo? Então conte pra
gente nos comentários!

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