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DOGMA 95
MATÉRIA
DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA
DOCENTE
KÁTIA COELHO
27 DE MARÇO DE 2007
DOGMA 95
1. As filmagens devem ser feitas em locais externos. Não podem ser usados
acessórios ou cenografia (se a trama requer um acessório particular, deve-se
escolher um ambiente externo onde ele se encontre).
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Ver anexo Anexo I – Manifesto.
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Termo usado no texto do Manifesto, derivado da palavra cosmético.
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3. A câmera deve ser usada na mão. São consentidos todos os movimentos -
ou a imobilidade - devidos aos movimentos do corpo. (O filme não deve ser
feito onde a câmera está colocada; são as tomadas que devem desenvolver-
se onde o filme tem lugar).
4. O filme deve ser em cores. Não se aceita nenhuma iluminação especial. (Se
há luz demais, a cena deve ser cortada, ou então, pode-se colocar uma única
lâmpada sobre a câmera).
6. O filme não deve conter nenhuma ação "superficial". (Em nenhum caso
homicídios, uso de armas ou outros).
Devemos avaliar cada uma das três reivindicações separadamente para entender a que
veio e o que apresenta como solução o Dogma 95.
Por “cosmetização” dos filmes, o Dogma 95 entende qualquer filme que utilize
elementos a parte da realidade para explorar a cena, como trilha sonora que induza
determinado clima, locução de narrador, efeitos especiais, cenografia e truques de
fotografia, além de técnicas que escondam a verdade da representação, como maquiagem,
composição de cenário e marcações de movimentação dos atores. As regras do Voto de
Castidade que mais dizem respeito a esta reivindicação vão da primeira até oitava regra.
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Esta bronca com o mainstream cinema3 já vem de outros movimentos
cinematográficos como o Expressionismo alemão, na década de 1920; o Neo-Realismo na
Itália, na década de 1950; a Nouvelle Vague na França e o Cinema Novo no Brasil, na
década de 1960; além das produções do cinema iraniano; na década de 1990. Mas o
movimento que mais se assemelha ao Dogma 95 é o Soviet Troikh (Conselho de Três) do
cineasta russo Dziga Vertov, no final de 1922, com o primeiro manifesto, entitulado Nós,
redigido neste mesmo ano.
3. Disciplinando a democratização
3.
Filmes feitos para entretenimento, principalmente pela cinematografia norte-americana.
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pessoal é decadente por definição (LEITE, Sávio. Pág 21 – citando KELLEY,
2001, p.325).
Com o barateamento dos equipamentos necessários para realização de um produto
audiovisual, o cinema deveria passar por uma experimentação, uma retomada as origens
onde o limite não era conhecido e o desejo de descobrir algo novo existia. É a falta deste
desejo que o movimento cinematográfico Dogma 95 acha um absurdo e procura retomar, se
auto afirmando como um exercício de criatividade para realizadores cinematográficos que
sentem que precisam se exorcizar do cinema artificial.
Another factor is the inherent challenge contained in the Dogma 95
manifesto itself. It throws down the gauntlet to all filmmakers who read it,
challenging them to follow the examples provided by the Dogma 95 group. This
is analogous to the typical schoolboy game of daring others to follow one’s
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example. (SCHEPELERN, Peter )
CONTRADIÇÕES
A criação das 10 regras serve para impulsionar a criatividade, o que parece ser
contraditório, afinal, como a imposição de regras pode gerar a liberdade? Usando como
comparação uma passagem bíblica — o que combina muito com o Dogma 95 — seriam as
regras do movimento como as provações que Jó passou em decorrência de uma aposta do
diabo com deus, para provar se realmente a humanidade continuaria fiel, mesmo nas mais
adversas condições. Esse é o espírito do Dogma 95: testar e levar ao limite a criatividade de
toda produção audiovisual “dogmática” através de dificuldades que devem ser contornadas
e mandamentos que devem ser seguidos.
O fato do diretor não ser mais um artista e renunciar assim a assinar a obra
cinematográfica, é no mínimo estranho. Mesmo sem ser creditado no filme, o diretor
desempenha um papel fundamental no processo e contribui consideravelmente em quase
todas as etapas criativas e operacionais, sendo ele a dar uma cara ao filme, um ritmo e um
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Texto no site http://www.dogme95.dk/news/interview/schepelern.htm
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aspecto mais humano. Quando “promete prescindir do gosto pessoal”, o diretor do filme
Dogma está na verdade prometendo em falso, pois não há como se abster de uma
preferência estética quando decide colocar determinada câmera em determinado local. O
mais correto seria prometer pensar todo o fazer cinematográfico em função do ator,
buscando a verdade da interpretação com a câmera e não interpretando para a câmera.
The camera is the object that is most contrary to the natural order! And
what about the actors? Why should the locations and the props be authentic
when the people – i.e., the actors - are not? No explanation is forthcoming.
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(SCHEPELERN, Peter )
Como eu disse, mesmo contraditórias, as regras devem ser seguidas para que o
Dogma 95 faça sentido. Comparando mais uma vez com a religião, por que os padres
prometem o celibato se gerar a vida é uma das maiores dádicas da vida? Os seres que –
muitos afirmam, mas ninguém comprova – estão mais próximos de deus são exatamente
aqueles não podem realizar o maior dos milagres. O porque é simples. O maior dos
milagres é considerado o maior dos pecados, e estes, representantes de deus, devem dar o
exemplo.
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Texto no site http://www.dogme95.dk/news/interview/schepelern.htm
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Não há como o diretor se abster de decisões estéticas, mas o fato de não assinar o
conjunto da obra, prezar por regras que sabe que não podem ser totalmente cumpridas e
depois do filme concluído ter que se confessar (procedimento obrigatório para submeter o
seu filme a análise de um comitê para decisão se deve ou não ser considerado um filme
Dogma 95), mostra que o Dogma 95 é como uma religião: sabe-se que é utopia, mas
acreditando no seu poder, coisas melhores acontecerão: seja uma benção, ou seja um
exorcismo – no caso dos diretores de cinema.
O PRIMEIRO DA ESPÉCIE
Não fugindo a nenhuma das regras do voto de castidade, o filme causa uma
sensação de liberdade e ao mesmo tempo aprisionamento. Estamos em constante
movimento com a câmera, mas sempre presos aos desdobramentos do roteiro. Não temos
como sair daquele hotel onde está a família, não temos pausa para respirar nos campos
próximos ao hotel. Acontecendo aqui e agora, o filme toma um ritmo alucinado, com
pausas não menos densas em momentos onde o conteúdo dramático é tão pesado que a cena
parece congelar. Mas a câmera não cessa.
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verdade. Se buscamos no quadro algo para ver, a câmera não mais nos direciona. Se nos
colocamos no lugar do personagem e sofremos em intensidade igual durante o drama, o
ator não mais nos engana.
QUEBRANDO A REGRA
Criador do Dogma 95, Lars Von Trier lançou em 2000 o filme Dançando no
escuro, um musical... Opa, mas de cara vemos que uma das regras não está sendo
cumprida. O filme começa e as regras vão caindo uma a uma, todas sendo quebradas. Mas
não é bem assim.
Quando ela canta, somos transportados para seu inconsciente onde, apaixonada por
musicais, ela se vê dançando e cantando, seja qual for o momento de sua vida, em um
estado de felicidade estonteante e em total contradição ao estado de sua visão, escura. Do
mundo bagunçado, agitado, trepidante, opaco da realidade da operária, somos levados a um
mundo estático, claro, limpo, colorido, da fantasia de Selma. E isso nós entendemos por
que a câmera nos mostra. Alternando a câmera na mão nas cenas do real com a câmera still
das cenas fantasia, compreendemos os sentimentos de Selma, seus desejos e suas
dificuldades. Somos jogados no escuro de sua vida e no colorido de sua fantasia.
Lars Von Trier pode ter quebrado todas as regras do Dogma 95 com este filme, mas
continua fiel na busca pela verdade no cinema. Unindo o artificial da linguagem ao
verdadeiro do drama, esquecemos que é uma história, abraçamos Selma e vibramos,
choramos, rimos e nos questionamos junto com ela: por que a vida tem que ser assim?
Esquecemos do ator e a verdade aparece.
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O Dogma 95 é utópico, é uma afronta pelo escárnio ao modelo atualmente existente
de cinema.
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ANEXO I – O Manifesto
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BIBLIOGRAFIA
Livros
MOURÃO, Maria e LABAKI, Amir. O cinema do real. 2005. Editora Cosac Naify
Estudos
LEITE, Sávio. Dogma95: Tudo é Angústia. Dissertação pela Escola de Belas Artes /
UFMG
Sites
http://www.dogme95.dk/menu/menuset.htm
http://www.dogme95.dk/news/interview/schepelern.htm
http://www.revistaetcetera.com.br/18/lars_von_tier/index.html
FILMOGRAFIA
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