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COMENDO VENENO INVISIVEL Brasil lidera consumo de agrotéxicos no mundo Um terco dos alimentos que v3o para a mesa dos brasileiras esté contaminado por agratdxicos. O dade alarmante colaca e Brasil na lideran¢a do consumade agrotéxicos no mundo, De acardo com a Agéncia Nacional de Vigilancia Sanitaria (Anwisa), osetor cresceu 190% nos Ultimos dez anos. Banido em outros paises, o glifosato ainda € altamente usado no pais, principalmente no cultive de soja transgénica. Segundo a Organizaggo Mundial da Saude (OMS), o consumo de alimentos com glifosato pode provocar cncer. Os problemas de sade associados ao consumo de alimentos cultivadas com agrotéxicos tém sido abordados continuamente pela Associagaa, Brasileira de Saude Coletiva (Abrasco).Aentidade reuniu informages de publicacdes cientificas 2 publicou um dossié pare alertar a populacao sobre os riscos causados pela veneno. “Q consumo de agrotéxicos viola a soberania alimentar 2 os direitos sociais", destaca Anelise Rizzolo, professora da Universidade de Brasilia (UnB), conselheira do Consea ¢ integrante da Abrasco. “Viola porque alimenta um modelo agricola vigente, injusto sécio-ambientalmente, porque tem impactos alarmantes sobrea sade humana eo sistema de satide do pais, além de gerar inseguranca alimentar e nutricional”. A saida apontada pelos representantes da sociedade civil com assento no Consea é a implementagzo do Programa Nacional para a ReducSo da Use de Agrotéxices (Pronara). O programa foi elabarado pela Comiss3e Nacional de Agroecologia e Producdo Organica (Cnapo) contou com contribuigao de agricultores, camponeses, consumidores sociais. e@ movimentos De acordo com o secretério-executivo da Cnapo, Rogério Neuwald, 0 Ministério da Agricultura, Pecuaria ¢ Abastecimento (Mapa) questionau no momento do langamento do Pronara € sinalizou pela continuidade do didlogo. “A continuidade desse didlogo é fundamental para o langamente do Pronara. Outro fater importante & nae cairmos na andlise de que © programa pode ser um retracesso para agricultura brasileira. Pelo contraria, uma leitura atenta e com um alhar técnico na propesta do Pronara facilmente identificaré possibilidades de avangos para a agricultura e para os consumidores’, explica Rogério Neuwald, Presidente da Associapao Gaticha de Protegao ao Ambiente Natural (Agapan}, o engenheiro agrénomo Leonardo Melgareja defende a urgéncia da implantagdo do programa. O pesquisadar acredita que, com o tempo, haverd reduca na venda de agrotéxicos e sementes transgénicas, assim como medicamenta para doencas associadas ao uso de veneno, “Esta politica trard, com o tempo, forte trans- formagao na base de producdo de alimentos, nas politicas conservacionistas @ nos custos feos st] 71 do Sistema Unico de Satide (SUS)", afirma Melgarejo. “Agricultores familiares, assen- tados, povos e comunidades tradicionais serao estimulados a transitar desde matrizes produtivas dependentes de venenos agricolas para formas de produc3o mais amigaveis em relacdo a natureza, e mais saudaveis em relagdo a satide publica”, diz. Segundo Melgarejo, “os beneficios serdo enormes, te- remos fortalecimento do tecido social no campo, com maior protaganisma e autonamia dos agricultores familiares em processos de desenvolvimento local, com expansdo na oferta de alimentos limpas e redu¢3o nos ca- sos de intaxicagdo. Aa mesma tempo serda construidos elementos de autanomia nacianal, de soberania @ seguranca alimentar”. O Pronara nao determina 2 eliminagao total dos agrotéxicos, mas sim a redugdo do uso, acompanhada de controle, além de um resgate do conhecimento tradicional, buscando alter- nativas menos agressivas a satide e ao meio ambiente. “Sabemas que é possivel alimentar a mundo com ‘outro tipo de sistema de agricultura e, diante deste contextodeameacaa vida, devem-se pautar politicas ¢ ages puiblicas que orientem para uma mudanga na forma de produzir, levandoa redugao no.uso de agrotoxicos ea promogao da agricultura de base agroecolégica”, defende a professora da Faculdade de Nutri¢So, da Universidade Federal de Goids (UFG), Veruska Prado. Uma parceria entre a Abrasco, a Articulago Nacional de Agroecologia (ANA), a Associacdo Brasileira de Agraecologia (ABA), a Campanha Permanente Contra os Agrotéxicos ¢ Pela Vida, 0 Férum Brasileira de Soberania e Seguranga Alimentar. e Nutricional (FBSSAN}, a Rede Bra- 72 [Revise san sileira de Justiga Ambiental (RBJA) e a Marcha Mundial das Mulheres (MMM) resultou na produsgo da cartilha “Pronara ja! Pela Im- plementacSa Imediata do Programa Nacional de Redugdo de Agrotéxicos”, disponivel no site ttp://www.contraosagrotoxicos.org/. Agrotoxico e cancer Em 2015, o Instituto Nacional do Cancer {Inca} divulgou um documento “contra as atuais praticas de usa de agrotdxicos no Brasil”. No texto, a institui¢so “ressalta os riscas a sadide nas causas do cancer”. O Inca defende “iniciativas de regulag3oe controle destas substéncias, além de incentivos a alternativas agroecoldgicas”. Na avaliagao do Inca, “e modelo de cultivo com a intensivo uso de agrotoxicos gera grandes maleficios, como poluicao ambiental e intoxicagao de trabalhadores e da populacao em geral”. “Dentre os efeitos associados 3 exposi¢Socrénica a ingredientes ativos de agrotéxicos podem ser citados infertilidade, impoténcia, abortos, malformagées, neurotoxicidade, desregulacdo hormonal, efeitos sabre o sistema imunolégico e cancer”, revela o dacumento. “Sabemos que é possivel alimentar © mundo com outro tipo de sistema de agricuttura”: Verusko Prado De acorda com o Inca, a liberagaa do use de sementes transgénicas contribuiu para o aumento no use de agratéxicos, jé que o cultive de sementes geneticamente madificadas exige o uso de grandes quantidades de veneno. Leonardo Melgarejo Engenheiro agrénome, mestre em Economia Aural e doutor em Engenharia de Produgda. “Os agricultares familiares, quilombolas, assen- tados, os pavos e comunidades tradicionals serio estimulados 3 desenvolver linhas de trabalho mais ajustadas as suas eondigbes fundamentals, S80 milhdes de produtores de pequeno porte, que precisam trabalhar de forma a melhorar as caracteristicas do solo e a protecae das fontes de dgua, de forma a assegurar rendimentos ao longo do ciclo de vida das familias. Para isso, precisam de suspender o uso de venenos. E precisam que seus vizinhas mais afortunados, porque cultivam em grandes reas, parem de Jogar venena de avigo. Anaturezareceberd apoio paradescontaminagio gradativa de salos © dguas, © os consumidores urbanos receberao alimentos saudaveis. Tudo isso trard impactas relevantes de médio prazo, com minimizag3o dos fatores de riscos © portanto com redugao das tragédias familiares decorrentes de mortes e intoxicagdes pelo uso dos venenos agricalas. Alam disso, os ministéries, as conselhos, as empresas publicas e as arganizagies po: pulares envolvidas se perceberdo protagonistas pansdvels par pracessa de transformacio que recolocard a pais narumade um desenvolvimento auténomo, onde serSo necessarias sementes livres de patentes, adaptadas aos diferentes biomase cantroladas pelos préprios agricultares.” Veruska Prado Bacharelem Nutricéo, mestreem Nutri¢doHumana e doutoranda do Programa de Pés-Gradvocéo de Giéncios Socials em Desenvolvimento, Agricuttura e Sociedade (CPDA/UFRRI). “O tempo atual demanda uma nova forma de produzire degerarriqueza para oBrasil sejapelo fata dos consumidores estarem consumindo alimentos altamente contaminadas com resi- duas de diferentes agrotéxicas, seja porque 05 agricultores e as agricultoras e suas famili esto expastosatodos ostipos de consequéncias decorrente do uso direto deste tipo de produto quimice. Ou ainda seja porque este sistema produtiva baseado em um tipo de cultura ex. soja, milho...) altamente dependente de quimicos e das corporagées transnacionais tem gerado perda da diversidade alimentar, danos ambientais e sociais irreversiveis a longo prazo. O argumento de que o agranegdcio produr riquezas para o Brasil deve ser revisitade sobre a lente da equidade e do desenvolvimento social, os custos desta riqueza saa maiores do que os ganhos que ela leva, A vida, a saberania alimentar & a seguranca alimentar e nutricional esto ameacadas hoje no Brasil! © Pronara pode ajudar o pais a tragar um caminho que promova a vida, por meio da oferta de alimentes realmente adequades e saudavels @ a um menor impacto das priticas produtivas no ambiente.” « * Beatriz Evaristo € jornalista do Consea. estssan| 7a

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