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wu tn . A sie Morin Fores Com a Metafice do Amore 2 Metafiica da Morte ~ sobre a morte ¢ 1a relgdo ‘com a inderruibilidade de mst term 1 Schopenhauer pretende sldifcat, por tam lado, a concepsio do amor sexoal enquante manifesagio a eaia dita da ‘vstacia do mundo, a Vontade cega de da, sedenta por exstndia, por outro, & morte enquanto mero desaparccimento do organismo gerado no ato sexual, con- ‘cernindo apenas 10 fenbineno, aio 0 ‘er intimo de cada pariclaridade, Em realidad, vida © morte, um jogo ince sant, sio emanagies dessa nica € mes ma Vontade como coia-em, da qual 0 ‘mundo multfacerdo diane de née € mero espelho Embora 0 ponto de partida tedrico do ‘ldsfoseja pessimist, o objetivo de suas cexposigher, por veres demasiado crs, por assim dizer, erapéutico, ou sei, {tateae de um pensamento trigico no sentido ariatdlico do terme. ‘Alowofia de Schopenhauer, a0 conccber tragicamente a existenci,colocs 20 mes: ‘mo tempo com objec 0 provocar uma pice de caatsediante dela. Dai po- dermos denominé-Ia uma flosofis do consoo, a oxi entre pessimism ted ‘oe otimiame pritica, o que o leitorpo- derdaveriguar nos dois textos desta ei ora ofereida ao pablco brasileiro on pin Ko Ha Tea METAFISICA DO. AMOR METAFISICA DA MORTE METAFISICA DO AMOR METAFISICA DA MORTE Arthur Schopenhauer raiso spat taioza sani eta MEL OLVERA CACCIOLA Martins Fontes Fao 2000 Yndice Prefcio. Introdusao. Bibliografta sumdrta ronologia. Metafsica do amor. Metafsica da mone. - «Bes 7 Prefacio {Uma filosofia do consolo Contexto Publicado em 1818, © mundo como vontade e re- _presentagao® a obra mixima de Aur Schopenhauer. Este filésofo alemao, nascido em Danzig em 1788, po- de ser considerado 6 autor de uma obra 6. O restan- te desua producio intelectual € como que comenti- ros e desenvolvimentos de temas ja li abordados. {6 caso do volumaso conjunto de suplementos publi- cados em 1844, que incluem a Metajiica do amor (nGimero 44) e a Metafsica da morte~ sobre a morte ‘esua relagdo com a indestrutblidade de masso ser em ‘i (imero 41). Com elas pretende solidificar, por ‘um lado, a concepeio do amor sexual enquanto mani festagao a mais direta da esséncia do mundo, a Von- tade cega de vida, sedenta por existEncia, por outro, ‘a morte enquanto mero desaparecimento do orga- rismo gerado no ato sexual, concernindo apenas a0 fendmeno, ndo 20 ser intimo de cada partcularidade. Em realidade, vida e more, num jogo incessante, si0 ‘emanagbes dessa nica e mesma Vontade como coisa aa Are Sbpenave ‘emi, da qual o mundo multifacetado diante de nds & mero espelho. As metalisicas do amor e da morte apresentam-nos fllosoficamente a trama conceitual do grande drama césmico que é a existéncia, pois a Vontade ¢ intrinsecamente uma autodsedrdia const fio mesma, 0 que z do enredo dessa pega algo rmuitas vezes trigico, traduzido na famosa frase schopenhaueriana alles Leben Leiden ist toda vida & sofrimento). No entanto, embora 0 ponto de partida te6rico do fldsofo seja pessimista, 0 objetivo de suas ‘exposigdes, por vezes demasiado cmuas,é, por assim dizer, terapeutico, ou sea, tat-se de um pensamen- to tigico no sentido aistoxéico do termo, Arsttcles define a tragédlia como a encenagio de uma ago de ‘ariter elevado que, despertando o terror e a pieda- de, conduz a catarse dessas emogbes, por ele consi- detadas ruins. Ora, a filosofia de Schopenhauer, 20 ‘concebertragicamente a existéncia, coloca ao mesmo tempo como objetivo 0 provocar uma espécie de ca- tarse diante dela. Dai podermos denominé-la uma fi- losofia do consolo, a ascilar entre pessimism te6ri- 0 € otimismo pritico, o que o letor poderd averiguar nos dois textos desta edigao ora oferecida ao pabl- co brasileiro, 7 Averdade doamor autor de O mundo como vontadee representa~ (eo observa que em geral os poetas ¢ fiecionistas se rjc ‘ocupam principalmente com a descrigio do amor entre os sexos. No entanto, este tema quase no foi ‘rabalhado pelos fil6sofos, e, embora Plato 0 abor- de com certa extensio, especialmente no Banquete ‘eno Fedro, 0 que ele diz se circunscreve “ao domi- rio dos mitos,fabulase ditos espirituosos, e concer- ne na maior parte das vezes apenas a0 amor grego pelos rapazes" (MA, p. 6). Ainda segundo Schopen- hauer, Rousseau escreveu falsidades, Kant foi su- perficiale Spinoza, ingénuo, a ponto de ter afitmado: *O amor € uma cécega acompanhada da idéia de uma ‘causa exterior’: sentenga que merece mais © nosso regozijo, em vez de poder ser considerada ua con- tribuigio importante ao estudo do assunto. De modo que 0 filésofo se sente pioneiro nessa matéria. Antes cde mais nada, ele afirma: ide Eas nase quem pense o cantrisio. Como, pergunta-se, ‘Gm senfimento que coloca de lado todas as conside- rages, move o individuo para enfrentar todos 0s obs- {culos, mesmo se a custa da propea vida, seria uma {quimera? Nao, o amor existe; ¢ bem 0 demonstram a literatura € a cotidianeidade. Uma investigagio mais aapurida revelari: ele nada mais é do que 0 “impulso. ‘sexual" (Geschlechisirieb) que, com suas “gradages ‘E nvangas", ocupa a maior parte do pensamento das jovens, coloca em confusio as mais sérias cabecas, iniscui-se na céncia, na politica, na are, e &, a0 lado “Ws imor vida, 2 mais fore e ativa das molas impulso- Ma = Mea do amor MM = Meta ca more, Abr Sepntaner——— ras do homem, onipresete em qualquer vida, ej na de um aldedo ou na de um chefe de Estado, No undo, apesar de todos esses desvosGaublimagdes, diam os ‘sicanalisas)“aa-se aqui simplemente de cada Jo30 encontat a sua Mara’ vale dizer, de um par de aman- is seu peat pa, drm ge osa, de cada esforgo por unito com 0 sexa.aposto, Vontadé de vida, cuja principal manifestaga0 & exa- ‘uimente a sexualidade. (© amor também € para ser chamado de ilusao, pois o individuo pensa perseguir fin préprios, ima- ‘gina procurar um gozo particular, quando em verdade \tabalha para algo universal, a espécie. A prova des- se laborar em favor do bioligico & o fato de o esse cial no envolvimento entre duas pessoas no sera si piles comespondéncia, a afinidade de almas, mas a POSSE, 0 go20 fisico. O fim de todo impulso sexual 6 a cOpula, Ora, aqui, talver alguns criticos julgassem ‘uma tal visio por demais éspera e realist; diante dos quais Schopenhauer se defenderia: "Pois nlo & a de- terminagao precisa das individualidades da proxima ‘gerac2o um fim muito mais elevado e mais digno que aquéles seus sentimentos extremados e bolas de s- ‘ao supra-sensiveis? Sim, pode mesmo haver, entre 0s. fins terrenos, um mais importante e elevado? Apenas cle comtesponde a profundeza com a qual o amor apai- gt xonado é sentido, & seriedade com a qual ele entra ‘em cena, € importincia que atribul até as mais in- signifcantes ninharias que 0 cercam e ocasionam" GMA, p.1D, “Muitas vezes o individuo um vaso por demais frill para carregar uma tio pungente Vontade, e que- bra-se. Foi o caso do Werther, personagem de Goethe {que se apaixonou por uma mulher casada, a qual no podia coresponderthe, pois nio era uma Bovary Jpronta para o adultério: como desenlace, o suicio. ‘Sea Vontade nido podia ser satisfeta no peito de um. ‘mortal (Werther), no havia mais lugar para a subsis- téncia de uma vontade individual ineficiente em favor do biologico. E, como o sofimento foi grande demais, ‘nica saida foi Werther colocar fim ao viver. A no. nterviesse a loucura, a qual, quando ocasiona- dla por amores infelizes, significa um mecanismo uti lizado pela natureza para proteger do mal maior. Mottvagdes inconscientes e sexualidade Na Metafsica do amor digna de nota a noo cde motivagao inconscients) uma conieituagio tio cara 3 psicandlise. Isso se pereebe quando n0s € exposto tum leque variado de fitores que, secretamente, sem conseitnia do S020, ativam o Tmpulso sexual em Javor da espécie e tomam ditva a incinagdo entre duas pessoas. Por exemplo, os homens dio preferén- Gia as mulheres entre 05 18 ¢ 28 anos, pois estas se encontam no melhor do seu periodo fet, enquanto prj. er ep clas preferem os homens entre os 30 e 35 anos, por que a sua forca de reproducio esti: no apogeu. A satide, a consttuigdo do esqueleto, a abundiincia de ‘came € a beleza do rosto, nesta ordem, si0 outros atributos deveras atraentes para o varlo, em vista da constituigio « manutencao da futura pro. Ja 0 Uni vverso feminino leva em conta a firmeza de vontade, a forga e coragem masculinas; uma mulher ama um hhomem feio, mas nio aquele destituido de masculi- nidade: no seu inconsciente atuam motivagdes pri- ticas, ela anseia por protecio para sie para a erianca por vir. E8sas so partes das, como as chama Scho- penhauer, "consideragdes absolutas" que definem cescolha matua de parceiros. Hal um complemento a ‘elas, as chamadas consideragoes relativas, de cunho individual, vilidas para cada caso especifico de aman- tes, € que visam a corrigit desvios do tipo adequado da espécie, conduzindo entio a uma sua melhor ex- pposicio. Desse modo, no amor apaixonado, € impor- tante, em dado casal, que o grau de masculinidade cdo homem corresponda ao grau de feminilidade da ‘mulher, Ninguém & cem por cento homem, nem cem por cento mulher. Do encontro feliz destas duas pro- ‘porgdies, acende-se e lameja a chama amorosa. Mas, diz Schopenhauer, 0 inteiro ajuste desse mecanismo @ inconsciente, “ algo sentido instintivamente”. Ca- dda uim aspira sem o saber a suprimie as proprias fr cquezas, caréncias e desvios do tipo adequado da es- ppécie mediante o outro. Daf homens fracos gostarem. cde mulheres fortes, e vice-versa, ou eto louros pre- ferirem morenas ou negras, individuos com narizes aachatados sentirem um prazer indelével diante de na- rizes de papagaio, etc. Por tris de semelhantes incl rnagdes atua 0 deus de amor, Eros, wabalhando para ‘husiano em geral, ou seja,arquitetando a vinda de Lim novo ser a0 mundo. © impulso sexual, portanto, encontra-se em to- dda parte a todo momento, usando variados disfarces, @ recorrendo a sinuosos desvios. Freud, no preficio, A quarta edicio dos Trés ensaias de teoria sexual, re conhece com senso de justica nos seguintes termos ‘© enraizamento da psicandlise na conceituacao scho- ppenhaueriana, onde até o conceito de sublimagio ~ ‘0 desvio da sexualidade do seu fim privilegiado, a ge nitalidade ~ jf € para ser antevisto: “‘Pois o filésofo ‘Amthur Schopenhauer ja mostrou hi muito tempo aos ‘homens em que medida 0 seu agir e ambicionar s20 determinados por esforgos sexuais ~ no sentido co- ‘mum da palavra -, € um mundo de letores devia de certo ter sido incapaz, para assim perder de vista to completamente uma tio envolvente adverténcia!”* Até os softimentos de amor seriam compreensf- veis a partir da perspectiva metafisico-imanente do amor. Eles S10 0 signo da efervescéncia do sentimen- to de imortalidade congénito a cada um de nbs. [Noutros termos, caso 0 amor atnja o seu fim privile- siado, pode o amante viver nas geragoes vindouras, 2. eu, S Game rk. cher, Prank, 19689. px Ant Sopa {que a futuracrianga herdarcaractersticas pater nas e muaternas. O apaixonado pressente valetem ‘pena os perigos a serem enfrentados no intuto de si- tsfazer esse clamor, pois € 0 nileo do seu ser que desea persis. Amorte, musa da flosofia ‘A mote no € 0 oposto da vida, mas um aconte- cimento complementar que a define. © homem, co- ‘mo vida, um ser para a morte. Refleir sobre esta € lancar luz sobre o viver e a natureza intima das coi- sas, do mundo em geral como reflexo especular da ‘Voontade, mero impeto cego para a existéncia, Dai po- der-se dizer: a morte € a “musa” da flosofia “ifiil- mente se teria filosofado” sem ela. Se 0 animal frui imediatamente toda a imortalidade da especie, sem qualquer angistia diante do fururo, no homem nas- ‘ceu, com a faculdade racional que 0 animal nao pos- sui, certeza amedrontadora da moralidade, Todavia, ‘4 metafisica pode fornecer um consolo, ea flosofia Schopenhaveriana exposta na Metafisica da monte ‘se inscreve justamente nesta chave, ou seja, ela ten- {2 nos ajudar a “encarar com um olhar tranquilo af ‘ce da morte’. Como? Tentando provar que no ser em. side cada um reside um Kern aus der Fwighet (nt- cleo de eternidade), que de modo algum se aniquila «quando do desaparecimento do organismo. O que de resto coincide com a metafisica do amor, pois 0 ato Pegi voluptuoso possibilta o germe de uma nova vida que etpetua a de seus autores, que portanto so imor- redouros. Sim, morte vida nao sto em género inteiro di- ferentes. Todavi, este € um ponto de chegada, e antes de li estar, coloque-se uma pergunta condutora: de conde ver o temor da morte? De modo algum do conhecimento, responde Schopenhauer, pois a partir deste ele parece até to- lo, ft que 0 valor objetivo da vida bastante incerto, Permanece em aberto se, devido a tantos softimentos (alles Leben Leiden is), no seria preferivel 0 no-ser 0 ser. Diante da reflexao ¢ rsivel preocupar-se tan- to como sucumbir, i que o conhecer revela a ausén- cia de valor que envolve os viventes, combatendo as- sim o'medo diante daquele. © apego 3 vida & iracio- zal, e isto € uma explicago, ou sea, todo 0 nosso ser ‘em si é uma concentracio da Vontade de vida, que esta inteia tanto em nosso proprio Eu quanto em um milhao de Nao-Eus; e, para a Vontade, a existéncia tem de valer como 0 supremo bem, pois, por ser ir- zacional, total nconsciéncia volitiva, impeto cego es- forcando-se por objetivaga0 fenoménica, ndo possui parimetros de avaliagi, i que o intelecto, a conscién- ia, no Ihe € originario, mas meramente uma ferri- mena acrescida ao organismo tendlo em vita a sobre- vivencia em meio as adversidades do meio ambiente. Em verdade, os homens temem a morte porque tmagt- ‘nam que o ndo-ser se seguird a ela. Mas, contra-argu- Arr ceptor smenta Schopenhauer, se assim 0 & entZo teriam de temer 0 nio-ser anterior a0 nascimento, pois & certo que 0 nao-ser ap6s a morte, enquanto ndo-ser, na0 pode ser diferente daquele anterior ao nascimento, por conseguinte nao ¢ lastimavel Se ofosse, terfamos de lasimar também o tempo em que ainda niio ért- ‘mos, mas isso nto ocorte. Além do mais, 0 ndo-ser pbs a mone, caso de fto Fosse real, nd0 poderia ser ‘um mal, “pois cada mal, como cada bem, tem a exis- {€acia por pressuposto, até mesmo a consciéncia essa, entyetano, cesa com a vida, come também no sono © no desmaio" (MM, p. 67); logo, a auséncia da mesma, como nao sendo um mal, ¢ conhecida. Tam- bem no sono ha um desaparecmento da consciéncia ‘© sono é imo da monte, o desmaio € 0 gémeo. Por conseguint, sea consciéncia desaparece com a more, esaparece 30 mesmo tempo qualquer vestiglo de algo capaz de perceber uma coisa sum. Enfim,are- ‘mauao flsofo,nlo €a pate cognoscente de n6s que teme a mone, mas exclusivamente a nosa cois-ems, 2 Vontade de vida. “Quando entio, mediante as ind viduos, a Vontade de vida avista a mort, como o fim, do fenémeno, com o qual eas dentfiou e pelo qual se vé poranto limitada, todo 0 seu ser se insurge con- tea ele com viokéncia” MM, p. 68). Na more, sublinhe- se; teme'seo fim do organism, com 0 qual Vonts- de se dentificara; no entanto, é um medo infundado, pois 0 desaparecer do corpo nit significa aniquila: (0 do principio vivificame que o anima, assim como, rfc. se um péndulo encontra 0 seu ponto gravitacional, chegando ao repouso, nio se concluiré dai a aniqui- ago da gravidade’. Mas Schopenhauer esti empe- ‘nhado em consolidar a sua filosofia do consolo,e sabe que para muitos tis colocagdes nao seriam suficien- tes, Entao langa mio de uma idéia materialista: quem ino € capaz de conceber 0 quanto € quimérico 0 na- {da apésa mone, pelo menos se console com a mona Tidade da matéria, Esta se consolida em cristal, brilha como metal, sola fascas eléticas, transfigura-se em. plantas e animais, enfim, nada se perde, tudo se trans- forma, Essa constincia da matéria € um testemunho da indestruibilidade de nosso verdadeieo ser em: ‘Outro fator que nos levaria a duvidar da realidade dda morte como aniquilagio € que, 20 se observar a natura, percebe-se a sobrevivencia do imperfeito, do inorginico, diante dos seres mais perfeitos e com- pplexos, 08 orginicos. Enquanto, por um lado, as pe ddras est2o at hai centenas de milhares de anos, por ‘outro, uma vida onginica animal raramente dura mais ‘de cem anos. Entio, pergunte-se, a nasureza oferece ‘em pressa suas crages infinamente engenhosas, en- ‘quanto as mais simples permanecem intacas. Nao, Tesponde 0 flésofo, "sso & algo to evidentemente absurdo, que no pode ser nunca a ordem verdadeira 5. pardon, obser Schopeniave: © que en 16s tee 2 mone Yonnde, noo deve, pols metal qu om a 80 ‘Teme, osueso do conieciena, oc, deer tem, pols —_ ar Sepeaner—— das coisas, mas antes s6 um invélucro, que a escon- de ou, falando de modo mais correto, um fendmeno condicionado pela constituiglo de nosso intelecto" (MM, p. 80). Quer dizer, Schopenhauer trbalha com a disingo Kantiana entre coisi-emsi e fendmeno. Para Kant, aquela a realidade das coisas, este € 0 mo- do como as mesmas nos afetam no tempo e no espa- 60, formas a prion de nossa sensiblidade, porém sem sevelarem a sua indole, ito €, 0 entendimento iio co- hece a esséncia delas. Schopenhauer mune-se de tis conceitos quando concebe a more. Percebemos 0 de- “saparecimento dos organismos no tempo e no espago, mas isso mio € o sucumbir do seu verdadeiro ser, 0 ‘qual ¢ imorredouro, nao estando submetido as formas. A priorida percepsio. Se ndo se é aniquilado pela morte, &se levado de ‘modo até natural ao pensamento de uma especial me- tempsicose. A nossa consciéncia pode desaparecer, sim, todavia nascer, dura efindar sio meras concep. (eS tempos, e 0 tempo ndo € absoluto, mas apenas ‘uma forma de conhecimento que temos das coisas, pelo que tal conhecimento ¢ limitado as aparéncias ¢ Imperfeito, portanto nao se apica a0 ems. O homem, como fenémeno, € tansitério, sem diivida, mas co” ‘mo coisa-emsi & imperecivel € reaparece, pois dele hi de sobreviver um germe, um nicleo de existéncia, ‘que pode vivificar-se num outro individuo: “..a mor. te 60 perder de uma individualidade e o obter de wma ‘outra, por conseguinte uma mudan¢a de individuali- dade sob a condugao exclusiva de sua propria vonta- ne Pre de" (MM, p. 128), Tal mudanca de individualidade, porém, no implica de modo algum a consciéncia de existencias anteriores. Octerno retorno do mesmo Antes de Nietzsche, Schopenhauer teorizou filo soficamente 0 mito do eterno retorno do mesmo, as- sociando-o 8 metempsicose, Em vez de postular uma Tinha retahistérca, condutora do genero humano a um bom fim, postu 6 circulo como emblema da existen- ia, Tudo ji esteve af inimeras vezes e volta. "Sem- pre e por toda parte o circulo € 0 auténtico simbolo a natureza, porque ele & 0 esquema do retorno. Este é de fato a forma mais geral na natureza, que ela ado- ta.em tudo, desde 0 curso das estrelas até a more & nascimento dos seres orginicos, e apenas por meio do ual, na torrente incessante do tempo e de seu con- tetido, torna-se possivel uma existencia permanente, isto é uma natureza” (MM, p. 84). O cuidado com que 0 inseto prepara uma cela para pdr 0 seu ovo 40 Jado de provisbes para a larva que surgri na primave- ra seguinte, e depois more tranquilo € no todo seme- Thante ao cuidado com o qual o homem prepara o seu cdesjejum para a manha seguinte, e depois vai dormir: fem esséncia, 0 inseto que morte € idéntico 20 que rnasce, assim como © homem que dorme & 0 mesmo {que acorda, ou, em termos mais globais, o homem Anbar epee org = que morre (um grande sono) & 0 mesmo que um dla renascerd (despertaré) num recém-nascido. Cada novo € lepido ser ganha sua existéncia a ‘custa da velhice e morte de um defunto que sucum- Diu. No entanto, ambos os acontecimentos expressam © equilibrio do eterno retorno do mesmo, a grande douttina de imoralidade da natureza, Se uma folha de 4rvore chort no outono o seu destino, ji que cai e te- ‘me o proprio aniquilamento, restaria, a parti da pers pectiva dessa doutrina, chamar-he de tola e conso- lardhe dizendo que as folhas verdejantes da proxima primavera sao ela mesma revigorada, enquanto a ar- vore é 0 seu principio vivificante. Ha uma Gnica es- séncia cosmica, a Vontade presente indivisa em cada particularidade, revenescendo a cada nascimento. Se © organismo desaparece, nao desaparece 0 seu inti- mo. F certo, tudo se demora 6 um instante e corre para a more: plantas, animais, homens. A morte ceifa ‘sem parat; no entanto, malgrado isso, € como se no fosse assim. As plantas sempre verdejam, os insetos sempre zunem, 0s homens sempre estio ai em vigo- ‘a juventude, também os povos sempre estio ai, em- bora mudem os seus nomes. E Schopenhauer coloca 4 peda de toque da sua argumentagio: *malgrado mi- Tenios de more e decomposicio, nada ainda se per- ddeu, nenhum étomo de matéria, muito menos algo do ser intimo, que se expe como natureza. Por iss0 po- demos a cada momento exclamar animados: ‘Ape sar do tempo, da morte e da decomposigao, estamos todos reunidos!” (MM, p88. “Exclamar animados" Veja-se como ¢ parcial a let tra (especialmente por parte de alguns nietzschianos) ‘que pretend ver em Schopenhauer o grande e radi- ‘al pessimista, Na verdade, com sua metalisica da mor te pretende nos apresentar uma filosofia do consolo, ‘mostrar-nos 0 “lado posiivo da coisa” (0s termos $10 dele), para assim encararmos tranquilamente 0 su- ‘cumbir corporal, pois neste no perdlemos a nossa es- séncia € sempre estaremos de volta Conclusao ‘As metafisicas do amor e da morte schopenhaue- rianas, perceba-se, apresentam-nos 0 decisivo jogo centresimpulso sexual, que tende a ertar unidades or- inicas, expondo a Vontade césmica numa misiade de seres complexos, e a moe, que poe fim temporal a esses fendmenos. ‘Aqui, 60 momento de convidaro leitor a compro- var o parentesco entre os pensamentos de Schopen- hauer ¢ Freud. Ambos postulam uma luta continua centre Eros (vida) e Ténatos (morte) como resultado da qual se tem propriamente a efetividade. Freud mes- smo efetua a aproximagio na lilo introdut6ria 3 psi- candlise inttulada Angustiae vida do impulso. Depois. de desenvolver a teoria de que 0s impulsos eréticos trabalham para a constituicfo de unidades cada vez ‘maiores, culminando com a propria sociedade huma- nna como um todo, enquanto os impulsas de morte se Anrep ‘opdem a eles, procurando desfazer as suas constru- bes, Freud afirma: “Vés talvez direis encolhendo os Ombros: isso no & ciéncia natural, mas fllosofia scho- penhaueriana, Mas por que, minhas senhoras e meus senhores, nao devia um pensador audaz ter anteci do 0 que de modo objetivo e arduo a investigag0 mi ‘nuciosa confirma?" No entanto, logo em seguida rela~ tiviza essa aproximacio, e sentencia: “Além do mais, ‘0 que dizemos nao é nem sequer um Scbopenbauer correto. N6s nao afirmamos que a morte seja 0 Gnico fim da vida; n6s no deixamos de observar a0 lado «da monte a vida. Nés reconhecemos dois impulsos fun damentais e deixamos a cada um o seu fim." De fato, para Schopenhauer ndo existem dois impulsos aut rnomos que jogam entre si para constituir 0 mundo, ‘mas apenas a Vontade de vida & 0 mais real das obje- 10s, € 0 jogo entre vida e morte é emanagao dela - & ‘© chamado monismo da Vontade. E aquele jogo, en- ‘quanto fendmeno no espago e no tempo vinculados. pela causalidade, & uma aparéncia ndo-essencial, € ‘uma grande iusto: “Assim como, pela entrada da noi- te, desaparece o mundo, e todavia apesar disso em ne- ‘nhum momento deixa de ser, do mesmo modo em aparéncia perecem pela more o homem ¢ 0 animal, € ‘no entanto apesar disso subsiste indestutivel 0 seu. verdadero ser. Pense-se na mudanga da morte e da vi- da em vibragto infintamente veloz,e se tem diante de sia objetivagio constante da Vontade..” (MM, p. 88). “read op ft XY p15 eat Pree — (© mais real € a voligao origina, ¢ viver © morrer slo fendmenos superfciais dessa chama_primeva. Em todo 0 caso, etendo-se essa diferenca (Freud pre- tendia fazer cincia, i Schopenhauer metafsica), no se pode negar 0 parentesco entre ambas os pensa- rmentos, que definem 0 jogo entre impulso sexual (de vida) e morte como constitutive da efetividade. ‘Mas, para além das comparagoes, no deixe o lei- tor de eter da leitura dos dois textos que se seguem 2 proposta subjacente a eles: se amor € morte ocasio- ‘nam softimento, o enigma deles pode ser metafisica- mente deciftado, e isso € reconfortante, € otimismo pritico. Schopenhauer, uma flosofia do consolo. Frankfurt sobre-o-Meno, novembro de 1997 i Jae Bawoza Introducao Pode parecer que, 20 publicar sob a forma de li- vros separaclos os dois textos de Schopenhauer inti- tulados Metafsica do amore Metafisica da morte, que ‘constituem dois capitulos dos Complementasao Mun- cdo como vontade e representacao, estejamos indo con- tra as intengdes do autor, que nos adverte que, para ‘compreendé-o, temos de ler integralmente tudo © que esereveu, "De um modo geral", nos diz ee, “quem qui- ser se familiarizar com a minha flosofia devers ler-me ‘até a Glima linha, Tenho essa pretensio. Pois no sou ‘um escrevinhador, um fabricante de manuals, um ra Discador a soldo.." No entanto essa exigéncia, que no fundo € a de todos 0s filésofos, é na realidade menos Jimperiosa quando se trata de Schopenhauer. Com efet- to, nao sendo a sua obra, como ele nao se cansa de repeti, sendo “o desenvolvimento de um pensamento 7. te monde comme rl pibntation Compemento do lo ap Marae rops td Buen, Pats, 18.27, [Nes redo os textos de Schopenhauer Fram azo para © pong pri ds edie por Guero ET = Ar epee “nico, cujas partes tém entre si, na sua totalidade, a ‘mais intima ligag0", este pensamento,latente em tu- do, revela-sefacilmente em tudo. Chave magica que proporciona, a cada vez, a solugao dos problemas os _mais diversos, ela encontra neles outras tantas novas ilustragdes. Pode-se, pois, muito mais impunemente ddo que numa flosofia dedutiva, destacar da doutrina ‘um ou outro de seus fragmentos. Como ela nao se de- senvolve linearmente numa cadeia de conseqiéncias, ‘mas substitu a sucessdo do discurso a presenga per ppétua de uma intuicao imanente, € sempre possivel ligar imediatamente a “idéia do momento” a0 pensa- ‘mento tinico que nao cessa de Ihe estar subjacente. Sendo tinico, esse pensamento ¢ também um pen ‘samento simples: "Nao ha sistema filoséfico t2o sim- piles e construido com tio poucos elementos como 0 ‘meu, acrescenta, preendemos & primeira vista.” Por isso mesmo, po- ‘demos exprimi-lo em poucas paginas. ‘Avontade constitu o fundo das coisas. Ela nao é apenas ive, €todo-poderosa, O que sai dela nao so 7G temonde. demo 1, $54, ea fe Baden, p29. 5 Poagmonte sur Gosche dor Pape, § 14 Carp od Palpomens) Ea Recs, 1, pp. 1956 ra. ‘somente suas agées, €0 mundo em que ela atu, a¢30 ‘e mundo no sendo outra coisa que o procedimen- to que ela emprega para chegar a conhecer 2 si mes- ‘ma. O mundo, sendo aquilo em que ela se objetiva para se representar a si mesma, € 0 espelho no qual ‘ela se contempla, Mas € um espelho onde sua unidade se quebra, pois ela s6 0 produz ao se refratar através {das formas do espago, do tempo, da causalidade, em ssuma através do intelecto, que, enquanto principio de rizio, € principio de individuagi0, © mundo € assim ‘seu fendmeno imutivel, abarcando nele a infinidade dos fendmenos panticulares mutiveis, provenientes de sua forma constituinte. Gragas a ele e a0 seu de- ssenvolvimento de reino em reino até o homem, a vor tade consegue saber 0 que ela quer e o que é aquilo {que ela quer. Ora, o que ela quer é precisamente esse ‘mundo mesmo, a vida tal como se realiza nele, Von- tade e querer-viver io portanto uma s6 ¢ mesma co sa,¢, sendo a vontade eterna, igualmente 0 & 0 que- ret-iver, como 0 & também, por conseguinte, o mun- do ou vida, que é sua manifestagio necessia, E por {sso que, estando preenchidos pelo querer-viver, nao temos que temer por nossa existéncia, mesmo no mo- mento da mone. Com isso acham-se introduzidos 0 problema da morte e, a0 mesmo tempo, o do amor, uma vez que 0 ‘amor é aquilo pelo que a vida aparece neste mundo. ‘© que compreendemos por morte € nossa mor- te, dos individuas que somos. Mas os individuos sto ‘apenas aparéncias fugidia, provindas da objetivagao, Abr Spooner cterna da vontade, SO eles nascem e morrem, € no 0 querer-viver que se exprime neles. Nascimento € mor- te sdo pois dois acidentes eternas que pertencem, a ‘mesmo titulo, a vida eterna da vontade, os pélos do fenémeno da vida, tomado em seu conjunto, Assim, ‘hindus reGnem em Schiwa o linguam e © colar de ccabecas de mortos, ¢ 0s greco-latinos ornavam seus ‘mulos com cenas alegres e erdticas, querendo si. nificar com isso que 0 nascimento ¢ a morte dos in- dlividuos se neutraizam na vida eterna da humanida- de, idéia suprema da natureza como aspecto objetivo da vontade. Encontraremos na certeza dessa vida eterna, ima- nente aos individuos, um consolo supremo para as alligdes da morte, um remédio para 0 temor que ela inspira? Certamente quem se prende a vida pela vida, ‘quem estima que, quaisquer que possam ser os soft ‘mentos que a acompanham, ela & o bem supremo, encontrar neste caso aquilo que Ihe permite vencer 0s terrores que a morte inspira, pois cle nao temerd ‘mais um tempo qualquer, passado ou futuro, em que cle nio seja. Continuando entdo a querer viver, nao ‘mais como antes por um desejo cego, mas com conhe- cimento de causa, estari no estado de completa afir- ‘magi da vontade. ste €, no entanto, um estado deficiente e preci? so, $6 pode ser concebido se nos iludimos sobre a bondade intinseca a toda vida, se imaginamos quc, 0 afirmé-ta, asseguramos para n6s uma etemidade de felicidade e de alegria. Mas se, por acaso, a vida = ee ee fosse na sua esséncia dor e mal nlo nos condenaria- ‘mos, por isso, deliberadamente ao inferno? (Ora, precisamente, logo que entrevemos a na- tureza da vontade, ¢ impossivel conservar a menor ilusio sobre a bondade da vida. Em primeiro lugar, a ‘experigncia basta, neste ponto, para instruir qualquer ‘um, Ela testemunha que tudo € conflito,sofrimento, desespero e que-a miséria preenche o mundo. Do seu nascimento até sua morte, o animal lta para escapar a fome e ao inimigo que o espreita. Para o homem, a vida nao € sendio um combate perpétuo, no somen- te contra os males abstatos,a miséria ou 0 tédio, mas contra os outros homens. Na vida dos povos, a his- {ria mostra apenas guerras e sedigdes: os anos de paz parecem apenas curtas pausas, sobrevindo por ‘caso os entreatos: “A vida é uma guerra sem trégua © morremos com armas na mao." Além disso, toda felicidade e toda satisfagio slo tio-somente negati- vas, pois s6 fazem suprimir um desejo ¢ acabar com ‘uma pena satisfazendo uma necessidade. A esta sa- ledade sucedle logo uma outra necessidade, por sua vex provisoriamente apaziguada etc., a0 infinito, “a satisfagio que o mundo pode dar 208 nossos desejos. parece a esmola dada hoje a0 mendigo e que o faz viver o suficiente para ficar faminto amanha’*, Além disso, as alegria ficam sempre abaixo de nossa ex: pectativa e as dores acima de nossa imaginag0. En- fim, se falar um objeto para a vontade e que ela nao. te mon. 00,68 p 408 - — Antu Stops tenha mais nenhum motivo de desea, caimos num vazio apavorante: tédio. *A vida oscil pois como um pendulo, da dreta para a esquerda, do sofimen- to a0 tédio.” A flesofa demonstra a necessidade desse mal cua realidade ¢atestada pela experiéncia. Com efeto, eS tando acima de todas as formas representativas, a von- tade orginal é em si, necessariamente, sem pluraid- de, nem causas, nem motivos, nem fins, nem conhe- cimentos. Por iso ea 6 pode ser essencialmente um Jmpulso cego, sem repouso, sem finalidade sem ‘obtencao de um fim, poranto sem satisfasao,Jamais contentada, sempre incontentvel, famintae devoran- o a si mesma, ela s6 pode se exprimis, no mundo que ela move de dentro, por meio de lutase tumul- tos, Sem dvida, como sua esséncia€ por toda parte mesma, ela impde a seus fendmenos uma cert uni- formidade que se manifesta pelo sev encadeamento, sua organizagio e uma cert finalidade externa ein: tema. Mas, no interlordesse quad, desencadeiam-se confltesinexpiives, tanto mais profundos e encar- nigados quanto mais nos elevamos aos esigios supe- sores da objtivacao da vontade. Se, no estigio mais baixo, as Forgas naturas se disputam no nivel da causa- lidade isi, mais acima, o inferior é devorado surda- ‘mente pelo Superog a matéria nutre a plant; a planta, 6 animal o animal, o homem:; enfim, © homem, no contente em devorar os animais eas plantas, devora “3. Lemonde oN, $5, . 326 rec. © proprio homem ~ homo bomini lupus chega a se sucidar. Por outro lado, as foreas infriores eto em conflito perpétuo com as forgas superiors & gr ‘dade lta contra oesforgo muscular, 0 sono volta in- ‘essantemente para suprimira atividade do cérebro «de acordo com as palavras de Bichat, avid anal ‘lo € Sento" conjunto das Forgas que resem mor- ter Essa guerra de todos conta todos, que recomeca 2 cada estgio,caracteriza a via que a vontade roma para avancar no mundo. Nao ha af nenhiom alvo fs fal. Os atores do drama perseguem apenas fins apa- rentes, saisfages lusbrase precérias ‘Se e compara o ela val com o conteddo da vida animal, percebe-se que esse conetido &esgotado pe- In conservaio da espéciee do individvo ome, bus- ca doalimento a0 prego de mil sofimentose aba thos; nado se resume em aliments ereproduzirse Se se compara seguir com seu destino 0 sofrimento «que o animal se inflige para viver, a desproporgio € state Todi vids, animale humana, enquanto con ere 3 consercago do indviduo € “um negocio ave rio cobre seus gastos. Quem poder desejr uma tal existencia se tivesse dante dos ethos o que ea val, se esvesse em condigoes de conhect-a? E verdade, porém, que a natureza nao persegue enum alvo? Afar isso no € fala de horizonte? O que a naureza visa consewar & a espéce, nao 08 individuos. para perpetuar a espécie que ela sedi wide na sua muliplcidade. Consierada de fora, tudo Se passa pois como sea natureza quisese, a0 const Abr Segue beri evidentemente encontrar na certeza de sua eter riidade um consolo soberano 6 aflies da morte. Certamente, s6 poderia ter horror 8 vida e a0 amor, (ou melhor, ndo poderia ter outro amor que 0 da morte €96 a more poderia ser seu consolo, se nao soubesse ue essa morte nao ¢ a da vida, mas apenas a do seu individvo. De toda maneira, nfo poderia contentarse ‘em continuar “com conhecimento de causa’ a querer viver, pois sso seria, com toda a cereza, querer a eter- nidade de sua infelicidade. Desse conhecimento, por- tanto, surgira apenas 0 desejo de escaparinfelcida- de, negando a vida. Como conseqiéncia 0 estigio da completa afirmagio do querer viver deveré dar lugar 0 estigio de sua completa negagio. Nao poderiaja- ‘mais haver outro fim de nossa existéncia a no ser 0 de aprender que, para nés, é melhor nao existir, que querer-vver esti preso a uma ilusio, que Ihe & ne- cessirio comigir 0 seu erro negando todas as suas aspi- ragOes anteriores. Em suma, € preciso recusar a vida Esta recusa poderia ser o suicidio? De modo ne- ‘nhum. O suicidio suprime o individu, nao suprime vida, 0 querer-viver universal. Melhor ainda, longe de ser sua negacio, € uma das suas mais enérgicas, afirmagdes. Quem se suicida s6 nega a vida sob cer tas condigdes: jd no pode viver sem sua bem-ama- dda, sem seus bens, sem sua posigao social etc., mas quera existencia feliz, Afirma, pois, com uma rude- 72 selvagem a vontade de viver. Cessa de viver unica ‘mente porque nao pode cessar de querer e porque ji no pode afirmat-se de outra maneira, No entanto, 0 au softimento do qual entdo se aparta € o da morifiea- ‘0 da vontade, quer dizer, o que teria podido levi-lo A negago do proprio querer-viver. Também a recusa do suicidio por um sofrimento aceito ndo tem outro sentido a nao ser este: “Nao quero subtrairme a dor. Quero que a dor possa suprimir 0 querer-viver cujo fendmeno € coisa tio deplorivel; que ela fortfique em mim conhecimento, que comega a despontar, da verdadeira natureza do mundo, a fim de que es. se conhecimento se tore o calmante supremo da mi- tha vontade, a fonte da minha eterna redengio.™ Mas nao poderia a are ser um calmante? Na con- templacio estétca, com efeito, 0 individuo, unindo-se as Idéias, em que se objetiva imediatamente a vonta- de, tomando-se sujeto puro idéntico ao objeto puro, além do mundo das coisas apreendidas somente se- _gundo suas relagdes com as necessidades da Vida cor- poral, liberta-se da vontade por meio de um conheci- _mento desinteressado, puro e verdadeiro da natureza. cdo mundo. Experimenta, entio, um sentimento de li Dertaglo e de entusiasmo. Mas esse conhecimento pu 10 no 0 liberta definitivamente da vida. $6 o liberta por breves instantes. $6 Ihe oferece um consolo pro- visorio até que, cansado desse jogo e sentindo sua for- ‘62 aumentada, chegue as coisas sérias e tente enfim entrar verdadeiramente no caminho da salvagio. © primeiro ato de sua libertacio sera entio renun- car Aquilo em que se afirma absolutamente sua von- TR semen them, § 9.418 Anrep lade de viver, saber, 3 exigncia intransigente de sua individualidade, em Suma, a essa afirmagao de si sem limite nem restrigao, que caracteriza 0 egoismo, Pela visto da identidade do querer nos individuos para além do principio de individuacao, desaparece toda dliferenca entre eu € 0 outros ¢ 0 egoismo aparece, entZo, como sendo a vontade devorando a si mesma, pporanto como a mais tervel ea mais absurda das ilu- ses. Sabendo que essa vontade € idéntica em todos ce que, pela esséncia de seu fendmeno, ela consagra ‘© conjunto dos homens e dos animais ao softimento continuo, 0 flésofo experimenta a dor deles como a ‘sua propria, assume os males do mundo e substitu as atrocidades do 6dio e da maldade pela dogura da pie dade e da caridade universais, Por mais lenitiva que seja, essa dogura no entan- ‘o.ndo € ainda 0 *calmante” supremo. Permite, em t0- do caso, chegar 2 iss0, pois qualquer um que tena se elevado a piedade s6 pode fazé-1o pela visdo da in- felicidade de tudo 0 que vive. Ascende entlo a0 es- tado de abnegacio voluntira, de cessiclo absoluta de seu querer-viver. Sua vontade, retraindo-se, recusa-se a afirmar sua existéncia, rejita sua manifestacao pri- ‘mordial, quer dizer, o querer-viver encamado em seu corpo, encarnicado em conservar-se nesse Corpo, 2 sobreviver pela procriagio, impelindo com esse fim as volGpias da nutriglo ¢ da geragio. Essa retraga0, voluntaria, essa recusa de todos os goz0s € 0 ascetis- ‘moe a castidade, cuja pritica perseverante levaré pro- _ressivamente @ extingao da vida do corpo. Se a mit- aa oreeae ima de uma tal condita se tornasse universal, a hu- ‘manidade se anlar, tal como # animalidade, com {estas 08 cérebos, com 0s eérebros as formas do co- ‘hecimento segundo o espaco,o tempo ea causal- dade, por consezuitc, 0 mundo, Tudo ent se pre- “ipitaria no nada, Maso nada do mundo nao € mais ‘te o naa dos fendmenos. Permite supor, pela ne- acto do negatvo, um pestivo inefvel, font de &x- tase ¢ de gozo, Este g070, do qual a arte nos dé foe sgazmente um anegozo, quando, elevande-nos cima da pesada atmosfera terest, lbera-nos da tania dos deseo, ¢ininitamente mas pleno que o prazet etic, ja que a vontade, af, n4o est apenas apazi- guada por um insane, mas, salvo a Gkima centelha indispensivel a manutencio do corpo, defnivamen- te extn, Nao sendo nada mas do que o syjeto puro do conhecimento o calmo espelho do mundo, o ho- mem, depois de tantos combates, escapa doravante 2 dor, “Nada mais pode tonuri-lo, nada mais pode ‘emocioné-lo, pois todas exsas mil cadeias da vonta- de que nos ligam 20 mundo: cobigs, medo, ckime, colera,.. nao tém nenhum poder sobre ele. Rompe todas essas amaras. Com um sotiso nos bios con- templacalmamentea farsa do mundo que artigamente péde emocioni-lo ou ago, mas que, agora, 0 de a indiferente. Ve tudo isso comno as pega dem a- blero de xadrez depois que a pana acabou, 00 como contempla, pla manhi, as fanasiasdispersas, jas formas 0 itigaram eagitaram por toda a noe Abr ego de camaval.” Misticismo que 0 proprio autor aprox ‘mou do Nirvana budista ¢ de certas formas do asce- tismo monastico cristo. A caracteristica dessa doutrina @ ade ser uma filo- sofia do imanente e da eterna presenca, que confere nlidade ao devir, no apenas da matéria, mas do espi- Tito, Jé que 0 devi, junto com o tempo, é um fendme- no ilusorio que surge da forma representativa, como poderia engendrar qualquer coisa de real que fosse? ‘Hique a ldéia€ a imutivel objetivago da vontade eter- ‘na, como poderia estar implicada no devir e const tuir-se intimamente por uim processo? Sendo tio-s6 lugar da miséria, estéil,absurdo e inextinguivel, 0 devir nada produz e nao leva a lugar nenhum, E uma perseguiglo 20 infnito dos fendmenos, em que © ho- ‘mem segue sem termo e sem fim, como 0 esquilo na sua gaiola. O devir da humanidade nao ¢ ascensio, ‘nem declinio, mas repeticio va das mesma ilusdes € dos mesmos sofiimentos. A roda de fxion,o labor sem. fim de Sisifo € que sio seus simbolos. ssa esterilizagio do devir ligase a uma deprecia- ‘lo correspondent do conceito de humanidade como ser coletivo. © homem é, por certo, a mais alta objeti- 5 temond. $68 9.40. tec vvacio da vontade. & nele que finalmente ela pode se ‘contemplare se aniquilar. Mas & na interioridade dos individuos que o milagre pode se realizar. A humani- dade mo é uma entidade dominante, mas uma abstra- ‘20. Nada se realiza nela. Ela no é nem fim em si, ‘nem instrumento para a realizacao de um fim univer. sal de Deus ou do Espirito". Menos ainda porque a vvontade primordial nao tem nem intengoes, nem fins. E por isso que a flosofia 6 diz respeito a0 individuo que sofre, 3 sua salvacao, salvagao que s6 ele pode assegurar por uma iniciativa independente, A Cidade ‘de Deus como aboliga0 do mundo fenomenal s6 pode resultar das agdes pessoals de cada um, aio que ema 1a diretamente da liberdade absoluta nele encarnada, ago que visa no 0 outro, mas o seu pr6prio compor- tamento a respeito de si mesmo: ascetismo, castidade, destinados a levi-lo a um cero estado de desligamen- toe de éxtase. Por certo, o individu deve vencer sua individualidade, porém esta vit6ria $6 ser completa por uma supressio do querer que chegue até a com- pleta extingio da espéce. Assim, a humanidade tomna- da in globo nao traz nada e nic leva a nada, “5S indo e loa espe humana post nid real «ime de concn uniade de ce tu ens da pe Sic umana 6 posy er fo. Alm de do meno modo ue futur, pce € ele nea genes mere Hees, ‘Shim tamisn, expe humana a eldadepenence apes aot incvsduos es via sengo os pore sine exits et abe goes” Zo monte Complements 20 lo cap XV, Sobre (THe de, 253, a. Arar pnb essa anulago simulinea do devire da huma- nidade resutam por fimo total desaparecimento da ogo de progress coltvo, a negacio radical de to- do valor signifcagio metaisicas da hist’, 0 rept- dio de todo processo dialético, a condenagio sem pelo de toda flosofia por menos que sea historic zante: “Todas as filosofias em forma de hist6ra, t0- és, por mais majestosas que possam ser, fazem como se Kant jamais tivesse existido: tomam 0 tempo co- ‘mo um carite inerente 2s coisas em si ficando pois 1a regia.) dos fendmenos por oposigao 20 ser em si.."E por isso que *ndo iremos fazer relatos de his- ‘Gra oferecer isso como flsolia. Na nossa opinito é estar nos antipodas da flosofiaimaginar que se possa ‘explicara esséncia do mundo com ajuda des procedi- rmentos da hist, por mais bem disfargades que est jim: € 0 vio em que caimos quando, numa teora da ‘eséncia universal tomada em si, inriuz-se um devi, sea ele presente, passado ¢ futuro, quando o antes .€0 depois desempenham tum papel, mesmo que sea ‘© menos importante do mundo, quando consequen- temente se admite,abera ou furivamente, no des- ‘no do mundo, um ponto incl e um pono terminal depois um camino que os reine e no qual o indivi 4u0, flosofando, descobre o lugar aonde cheyou'.” 5. sera 8 mem ds amanda ea tao apenas pee cnc sob formas dives“ conto een € spt © "eso" tudo 253 Badom el ar, de p25. 10. dom p. 2885 f que a manfestagio do querer na forma da vida eda realdade reside unicamente no presenta O futuro 0 pasado exitem apenas como nogdes para nos- So conecimento, submetido a0 principio de razao “Nenhum ser humano jamais vivew no seu passado, nem viveri no seu futur; apenas o presente € for sma de toda vid.” O presente & a nica realidade ‘que nada poderd trathe.O passado do génerohu- ‘mano, dos mihoes de homens que nee vveram, é, tal como nosso passado, mesmo 0 mas recent, tm Sonho vio da fantasia. A realidade € 0 eterno presen- te da vontade e da vida, ndiferente& sucesso dos fe- ‘némenes, Masa forma representa a fragmenta nos indviduos numa seqiéncia de presentes pontuais, fora dos quis, para cada um deles, tudo sogobra no nada do passado,enquanto ese eterno presente sub- site em si. Quem se pergunia “por que 0 agora de minha existéncia € precsamente agora” concede ave sua exiséncia e seu tempo sto duas coisas indepen- dents uma da outra, que sua exintncia se enconta Tangada no meio do tempo, que hi dois agora um aque pertence a0 objeto, oro 20 suet: e que € pre~ Ciso que este se alegre com o acaso que fez com que ambos coincidssem, Também & questo: Quid fi? E necessirio responder Quid est A questao Quid cerit? Quod fuit. Artspan. ‘Ao excomungar as nogdes de humanidade, de devir, de progresso, de historia, de dialética, fundan- dovse diretamente numa experiéncia su generis do presente vivido, ponto de contato sentido com o pre= sente imanente da vontade eterna, Schopenhauer fe ‘usa em bloco, de um lado, as doutrinas de emanac0 e de queda, de outro as de Fichte, de Schelling e, & claro, sobretudo a de Hegel. Ja em 1818, como rea- ‘80 3 filosofia especulativa que reinava soberanamen- te na €poca, ele surge como uma espécie de existe Calista, que opunha aos “sistemas” dedutivos, ditos “cientficos’, ea historia substantivada, uma filosofia cla vida, patética, concretae colorida, pertencente, co- mo dita Jaspers, a0 género proftico. Sardénico e logo ‘rispado no sarcasmo ¢ na invectiva, langa um desa- fio a toda a filosofiaalema de seu tempo, a esta “mu- Iher pablica que, por um sabiio vil, entregou-se ontem 42 um, hoje @ um outro”, enquanto, exaltando essas vimudes crisis mais altas e mais dices, tais como a caridade, a castidade e 0 asceismo, faz figura ao mes- ‘mo tempo de ateu satinico e destruidor. ‘Assim, explica-se provavelmente 0 fracasso, de inicio total, de sua doutina, numa época tomada pelo hegelianismo, por sistemas dialéticos, logics e hisort- cizantes ou, ainda, pela fllosofia religiosa 2 Schleier- ‘macher, até mesmo 3 Schelling. Durante mais de tin- ta anos, professor sem alunos, escritor sem litores, permanece um isolado, duplamente amargurado no ‘seu pessimismo natural por seus dissabores perssten- tes pela arrogante conviego de sua imensa superio~ — oe ridade sobre qualquer um. Em 1818, seu Mundo co- ‘mo vontade e representagdo, do qual espera maravi- Tas, cai na indiferenca geral. Seus cursos na Univer- sidade de Berlim, onde se habilitou em 1819 como ‘rivat-docent, atraem to poucos ouvintes (nove 20 todo) que tem de renunciara eles jé no més de agos- to de 1820, Seus outros ensaios: A vontade na natu- reza (Frankfurt, 1836), 08 Dois problemas funda- mentats da Erica (Frankfurt, 1841), 2s segundas edi- ‘ges de seu Mundo e seus escrtos de juventude: A ‘quadrupla raiz do principio de razdo suficient, for ram acolhidos com o mesmo desdém. Em compensagio, essa flosofia simples, direta, es- ‘rita numa linguagem clara e num estilo brilhante, ali- _mentado por todas as cultures, greg, latin, hind, in- lesa, francesa, espanhola ealema,vilizando — quan- do a tilza ~ uma téenica pouco complicada, apoiada diretamente na experiéncia, seja césmica, sja inter- ‘na, embora pouco adequada para reter os técnicos da flosofia, os exigentes especialistas das universidades, tina tudo para seduzir a multido de lektores mé dios, honestamente cultos. Confrontava-os dramat ceamente com 0s problemas vias, viscerais para qual- quer um: sua existénci, seu destino, sua vida, sua ‘morte, o amor, a mulher etc. por isso que ~ numa época em que se comega ase sent um grande cansago das colossais maquina- tas metafscas ~ 0 sucesso € fulminante a pari do momento em que Schopenhauer se dirigediretamen- te ao grande piblico, fora de todo aparelho técnico, Artur pra ‘numa seqiiéncia de ensaioslterdsios: “os Parerga und Paralipomena (Acessérios e Restos) (novembeo de 41851), onde comenta com brio seus temas essenciais relagbes do real e do ideal, destino individual, espi- ritualismo, dor universal, sucidio,instinto sexual etc. 0s Jabrzetten de Hamburgo (1851), a Westminster Re- view (1852), 2 Reowe des Dewe Mondes (agosto de 1856), anunciam ao universo a aparigao, na Alemanha, de um novo filésofo, iconoclasta ¢ fora de série. Os discipulos surgem: advogados, juris, juizes, precep- tores, profesores, estudantes de direto e de flosofia ‘etc. O juiz Dorguth, o jornalsta Lindner na Gazeta de Voss, 0 estudante Frauenstic, e, a pani de 1856, 0 professor de inglés Asher, se langm numa propagan- dda desenfreada em seu favor. O mundo como vontade €@ representagao, que nunca tinha sido vendlido, esgota- se com rapidez e novas edigdes se sucedem. a ghia Richard Wagner dedicathe um exemplar especial de seu Ring, 0 dramanurgo Hebbel, dustes franceses — Foucher de Carel, Challemel-tacour ~ vém visiti-lo ‘em Frankfurt, sentam-se com ele para vélo discorer mesa do Hotel d Angleterre Ble teve razto em ter esperangas. Na época do abandono, no prefiio a tradugao latina da Teoria das cores, escrevera: tempo & galantuomo; agora, as vés- eras de sua mont, pode inscrever, no frontispicio da terceira edicao do Mundo (1859), estas palavras de Petrarca: Si quis foto die currens, pervenit ad ves- ‘peram, sais et. Nao é um singular timismo da parte de um fildsofo to pessimista em sua doutrina? . rag. HA, com efeito, primeira vista, um contraste per- turbador entre 6 homem e sua obra, Decerto pode-se considerar que, em grande parte sua visio pessimista das coisas esti de acordo com seu sentimento intimo, Melancolia incuravel, humor critco e pesaraso, esses ‘sio certamente os tragos fundamentas de seu carter, ‘que as penosas peripécias de sua vida no podiam ‘choso, despoticoe, todavia, senhor dos deuses e dos homens loved dear topawe xenon “Eps! (Tu, deoram bominumgue tyranne, Amor!) Fechas mortferas, cepucira € axis S80 seus at bostos As tkimasindicam a inconstnci: va de eg, ‘xs entra em cena com a deslsio, ue € consetien ‘a da satsfacto, Visto que @ paixto repousava sobre wna iusto ‘que mascarava como pleno de valor para o individvo Auilo que 36 tem valor para aexpécie, 2 ilvsdo tem ‘de desaparecer depois que os fins da espéce foram aleangados.O esprit da espécie, que tina tomado posse do individvo, deixao novamente livre. Assim handonado por ele, o individu ecai em sa limita ‘80 e pobreza origina, evé com espanto que, ap6s {Sforgos to elevados, herbicos eifinos, nada obte- ve para seu gozo a nko sro que da qualquer satisfa (io sexual: contra sua expectativa, ele nfo se encon- tra mais feliz que antes, Nos que foi o enganado pela do Ts Ta amor anode dese e homens! ° —— Anta pner Md mer vontade da espécie, Por isso, via de regra, um Teseu feliz abandonari a sua Ariadne, Se a paixto de Pe- trarca tivesse sido satisfeta 0 seu canto teria emude- ido como © do paissaro, logo que 0s ov0s sto poste. Observe-se aqui de passagem que, por mais que ‘minha metafsica do amor desagrade justamente as pessoas enredadas nesta paixio, todavia, se consi deragdes racionais pudessem em geral alguma coisa contra essa paixo, a verdade fundamental por mim descoberta, mais que qualquer outra coisa, tera de ca pacitar a exercer um dominio sobre ela. Mas a sen- tenga do antigo comico permaneceri: Quae resin se neque consilium, neque modum babet ullum, eam Consilio regere non potes|O que nio possul em sira- ‘a0 nem medida, nao pode ser regido pela razio. Te- réncio "Eunuchus", verso 57] (s casamentos de amor so contraidos no inte- resse da espécie, n2o dos individuos. Os envolvidos presumem promover sua propria felicidade, mas 0 seu verdadeiro alvo € alheio a eles mesmos, na medida ‘em que reside na produ de um individuo apenas possivel por meio deles. Reunidos por esse fim, de- ‘vem procurar doravante entender-se o melhor pos- sivel. Mas, com muita freqdéncia, o par unido pela ‘lusio instintiva que € a esséncia do amor apaixonado serd, no que resta, de indole 2 mais heterogénea, Iso vem luz quando ailusto, como necessariamente tern de acontecer, desaparece. Em conseqincia, 0s c2- samentos contraidos por amor, via de regra, tomnam-se Infelizes, pois, por meio dele, se cuida da geracio vin- so ddoura a custa da presente: Quien se casa poramores, ‘ba de vivircon dolores|Quem se casa por amor, hi de viver com dorl, diz 0 provérbio espanhol. - © con ‘wisi sucede nos casamentos de conveniéncia, contra dos na maioria das vezes por escola dos pais. As com sideragdes que o governam, sejam do tipo que forem, ‘sio pelo menos reais, e nao podem desaparecer por si mesmas, Mediante tis consideragdes se cuida da felicidade da geragio presente, mas certamente em. ‘detimento da vindourae, ainda assim, aquela primeira Felicidade € problematica, O homem que, 20 se casar, ‘v@ 0 dinheiro em ver da satisfacao de sua inclinagio, vive mais como individuo do que como espécie, o que se opbe dizetamente a verdade, ¢ por isso apresenta-se ‘como contririo 4 natureza, provocando um certo des- pprezo, Uma moga que, contra 0 conselho de seus pais, recusa 0 pedido de casamento de um homem rico € que ainda ndo é velho, e que, colocando de lado to- das as consideragbes de conveniéncia, escolhe ape- nas segundo sua inclinagio instintva, sactifica seu bem individual em favor do bem da espécie. Mas jus- tamente por isso ndo se Ihe pode recusar uma certa Aaprovagdo: pois ela preferiu 0 mais importante e agi ro sentido da natureza (vale dizer, da espécie) en- ‘quanto 0s pais aconselhavam no sentido do egofsmo individual. - De tudo isso resulta @ aparéncia de que se deveria, na contraglo de um casamento, ou lesar 0 ‘ndividuo ou o interesse da espécie. Na maioria das vvezes é realmente assim, pois que a conveniéncia e ‘0 amor apaixonado andem de mos dadas & um raro ‘olpe de sorte. A misera constituiga0fisica, moral ou rn Arr Sept {intelectual da maioria dos homens pode, em pate, ter (0 seu fundamento no fato de que os casamentos, de ‘ordinasio, sdo contraidos nao a parti da pura escolha e inclinagao, masa partir de consideragdes totalmente exteriors e segundo circunstincia fortutas. Se, t0- davia, 0 lado da conveniéncia também a inclinacio, ‘em certo grau, for levada em conta, o que & como que tum arranjo com 0 génio da espécie. Casamentos feli- 2s, sabe-se, sio raros;justamente porque na esséncia do casamento esta que seu fim capital nao € a geraca0, presente, mas a vindoura. No entanto, acrescente-se para consolo das almas ternas e amantes que, as ve- 7es, a0 amor apaixonado se associa um sentimento de origem bem outra, a saber, uma amizade efetiva, bbaseada na concordncia de mentalidades, que, toda- via, na maioria das vezes $6 aparece quando 0 amor sexual propriamente dito se extinguiu na satisfagdo. sta amizadee nasce, na maior parte das vezes, a par- tir das qualidades fisicas, moras ¢ intelectuais cor plementares e correspondentes de ambos 08 indi ‘duos, das quais nasceu o amor sexual tendo em vista uma erianga a ser proctiada, e que também se refe- ‘em a0s propos individuos como qualidades de tem- ‘Peramento opostas e tragos espirinais em relagto de ‘complementaridade métua, fundando assim uma ha ‘monia de Animos. TToda a metafsica do amor aqui abordada esté em ligacio estreita com a minha metafisca em geral ea luz due ela lanca sobre esta pode ser resumida como se segue. 2 — Mec do ame Vimos que a escotha cuidadosa da satisfacio se- xual, que cresce por intimeros graus até o amor apai- ‘xonado, baseia-se no mais sério interesse que tem 0 ser humano pela constituigao especial e pessoal da aca vindoura, Este interesse, sobremaneira digno de ‘nota, confirma assim duas verdades evidenciadas nos capitulos precedentes: 1) A indestrutibilidade do ser ‘em-si do homem, que continua a viver na geragao vin- doura, Pois aquele interesse tio vivaz ¢ zelos0, origi nado no de reflexdo ¢ propésito, mas de aspiragdes ¢ impulsos os mais intimos de nosso ser, ndo poderia cexisir de modo to indelével e exercer um tio gran- de poder sobre o ser humano se este fosse absolut ‘mente transitério, ¢ se uma raga de fato totalmente dlistinta se seguisse a ele apenas segundo o tempo. 2) 0 ser-em-si do homem reside mais na espécie do {que no individu, Poiso interesse na consttuicao es- pecial da especie, que forma a raiz de todo trato amo- +080, desde a inclinagio mais fugaz até a paixio mais séria,€ para todos propriamente a questio suprema, ‘ow seja, aquela cujo sucesso ou insucesso 0 toca mais. sensivelmente; por iso, de preferéncia, ela & chantiada de assunto do coragdc: também a ese interesse, quan do ele se pronunciou de maneira forte e decisiva, se subordina e se sactifica todo outro que conceme ape- ‘as & propria pessoa. Com isso, o ser humano atesta (que a espécie estd mais proxima dele que o individuo, ce que ele vive mais diretamente naquela do que nes- {e.—Por que, ento, o enamorado se entrega com to- tal abandono aos olhos da elitae esti pronto a the fa- 8 Abe Sspenbauer zee qualquer sacri? ~ Porque @a sua paste imortal que anseia por ela, provndo tudo mais da parte ronal. ~ Esse anscio vivaz, ou ardente,direcionado para uma mulher determinada,é, poranto, uma pro- ‘a imediata da indestrublidade do aiicleo de nosso set ede sua subsisténcia na espécie. Considerar se- melhante subsstEacia como algo insignificant e in- sufciente € um esto que se origina do fato de que sobre a continuacao da vida da espécie no se pensa nada além da existéncia Futura de seres semelhantes ns, mas, em nenhum aspect, idéntics,e iso por ‘que, parindo do conhecimento direcionado para 0 exterior, considera-se apenas a figura exterior da es- pétie, al como a concebemos intuitivamente, 120 sua esséncia intima. Mas esta essénca etima éjus- tamente a que esti no fundamento de nossa propria conscigncia, como seu ncleo,€ por sso mais imedia- ta do que a propia consciénca, e, como coisi-ensi live do principio indiiduations [principio de indi. viduacaol, propsiamente a mesma e idéntica em to os 0s indviduos, quer eles existam um a0 mesmo tempo que o outro ou tum apés © outro, Ess esséncia a Vontade de vida, e ponantojutamente aquilo que anseia pela vida e sua continuidade de modo to pre- mente. & justamente 0 que € poupado pela more, ficando incdlume. Mas também ela nao pode chegat aanenhum estado melhor que o seu estado presente, estando assegurados, junto com a vida, 0 sofrimento ‘¢ a mort continvos dos individuos. Olivar-se deles ‘est reservado a magago da Vontade de vida, median- “ s Md ame tea quala vontade individual se separa do tronco da cespécie e renuncia a existir nela, Para dizer 0 que & depois essa Vontade nos faltam conceitos, e mesmo fallam-nos dados para eles, Podemos apenas desig- riclo como aquilo que tem a liberdade de set Von- tade de vida, ou nao. © budismo designa este dlkimo caso com a palavea nirvana, cuja etimologia & dada a observagio a conclusto do capitulo 41. E.0 ponto que permanece para sempre inacessivel a todo co- hecimento humano enquanto tal. Se nés, a partir do ponto de vista desta itima con- siderac2o, submergimos nosso olhar na agitagio da vida, entao divisaremos a todos ocupados com a ne- cessidade e o suplicio, empregando todas as forcas para satisfazerem necessidadesinfindas e para se de- fenderem do sofrimento multiforme, sem todavia po- derem esperar algo outro a nfo sera conservagao, por corto periodo de tempo, dessa existéncia individual e atormentada. Entetanto, no meio do tumulto, verios os olhares de dois amantes se encontrarem cheios de ddesejo; ~ todavia, por que com tanto mistério e temor ‘es escondidas? - Porque esses amantes so 0s tai- dores que secretamente tramam perpetuar toda a sériae atrbulagao que, sem eles, logo atingiiam um fim, fim que eles querem obsta, do mesmo modo que seus semelhantes anteriormente obstaram. - Mas esta ‘consideragao jé invade a do préximo capitulo, -METAFISICA DA MORTE sobre a morte e sua relagdo com a indestrutiblidade de nosso ser em si A mote é propriamenteo génio inspirador, ou a ‘musa da flosofia, pelo que Socrates a defini como Savarov yehém (preparagio para a more. Dific- mente se teria losofado sem a more. Por conseguin- te, 6 justo que uma consideracio especial sobre ela tenha um lugar aqui, no fecho do dkimo, do mats sé- fio e do mais importante de nostos livros. ‘© animal vive sem conhecimento verdadeiro da smexte: por sso 0 individu animal gozaimediatamente de todo o carter imperecvel da expécie, na medida em que s6 se conhece com infinto. Com a ra240 apa- feceu, necessariamente ene os homens, a certeza assustdora da more. Mas, como na natureza a todo mal sempre é dado um remédio ou, 20 menos, uma compensagio, entio a mesma reflex, que originou ‘oconhecimento da more, ajuda também nas concep- (bes metafiicas eonsoladoras, das quais o animal no ‘Recessita, nem & capaz. Sobretudo para esse fim es- to orientadas todas as religibes e sistemas flos6f- cos, que sto, poranto, anes de tudo, o antidoto da cerieza da morte, produzido pela razioreflexionan- » Ante Scpnbaner = Maca da mente. te a partir de meios pr6prios. © gra, todavia, em que se atinge esse fim é bastante diverso, e com certeza uma religito ou flosofiacapacitaréo homem,rmuito mais do que outa, a encarar com um olhar tangdi- loa face da mone. 0 bramanismo e o budismo, que censinam ao homem a se considerar como 0 proprio se orgindro, o Brama, 20 qual odo nascer © pere- cer € em essénciaestranho, servitio para esse fim ‘muito mais do que os que fizeram o homem a pati do nada e deixam efetivamente a sua existéncia, e- «ebida de um outro, comecar com 0 nascimento. Em conformidade com isso, encontramos na india uma confanga na mote e um desprezo por ela, dos quais no se tem nenhuma nogdo na Europa. £, de fat, Luma coisa questionavel imprimir precocemente no hhomem, nesse assunto tio importante, conceit f- os ¢ insustentveis, assim tordlo para sempre in- capaz de admit o que é mais corretoe seguro. Por exemplo,ensinarle que 56h pouco veio do nada, conseqientemente nada tena sido durante uma ete nidade,e, nio obstante, devendo ser, no Futuro, imor- tal, € exatamente como ensinarthe que, emboraseja por completo a obra de um outro, deva ser todavia res- ponsivel por toda a eternidade pelas prbprias agbes © omissoes. Quando, pois, com o espirito maduro a entrada em cena da reflexio, a insustentabilidade de tal doutina se impuser, entre ele nada teri ce me- thor para colocarno seu lugar, mesmo nem ser ca- paz de entender isso, erdendo assim 0 consolo que 4 natureza The destinara como compensagio para a @ ‘ceneza da morte. Em conseqjiéncia de tal desenvolvi- ‘mento, vemos agora (1844) mesmo, na Inglaterra, en- tee tabalhadores de fabrica corrompidos, 0 socialis- 1s, ena Alemanha, entre estudantes corrompidos, 08 jovens hegelianos’se afundarem uma visto fisica absoluta, que conduz 20 resultado: edie, bibite, post ‘mortem nulla voluptas [comei, bebei, depois da mor- tendo ha prazer] e que, portanto, pode ser designada como bestalismo. Entretanto, de acordo com tudo 0 que foi ensinado sobre a morte, nao se pode negar que, pelo menos ‘na Europa, a opinio do vulgo, muitas vezes até de ‘um mesmo individuo, oscile de novo com frequéncia. de c4 para i entre a concepeo da morte como ani ‘quilagio absoluta ea hipGtese de que, por assim dizer, somos imortais, em carne e osso, Ambas s8o igual- mente falsas: a esse respeito nés ndo temos de en- Contrar um justo meio, mas antes conquistar 0 ponto de vista superior, a pani do qual tas concepges se suprimem por si mesmas. ‘Quero, nestas consideragdes, antes de mais nada, partir de um ponto de vista inteiramente empitico. — De inicio esti diante de nds 0 fato inegavel de que, de acordo com a consciéncia natural, o homem teme ‘mais a morte do que qualquer outra coisa, no s6 para 1 sua pessoa, mas também chora com veeméncia a dos seus préximos, e em verdade, € manifesto, no egoisticamente devido a sua propria perda, mas por ‘compaixao pela grande desgraca que Ihes acontece; por isso ele também censura como duro de coragio a — Abr Spear = ein damon. « destitufdo de amor aquele que, em tais casos, no chor € no mostra afligio. Em paralelo com isso es- Ho fato de que a sede de vinganca, em seu grau mais clevado, procura a morte do adversério como © maior ‘mala he ser inflingido. ~ As opiniges mudam com 0 tempo e o lugar, mas a vor da nanureza permanece ‘sempre e em toda parte igual e por isso é para ser ‘ouvida antes de tudo 0 mais. Ela parece entao dizer aqui claramente: a morte € um grande mal. Na lin- ‘guagem da natureza, morte significa aniquilacao. E que a mone € algo sério, deixa-se jf inferir do fato de que a vida, como cada um sabe, ndo € nenhuma brincadeira, Nada temos de melhor a merecer do que ambas. De fato, 0 temor da morte € independente de to- do conhecimento: pois © animal o possui, embora no conheca a more. Tudo o que nasce jo traz consigo a0 mundo, Esse temor da monte a prior! é, entretan- to, justamente apenas o reverso da Vontade de vida, que nés todos somos, Por isso, em cada animal, a0 lado do cuidado com sua conservagao,¢ inato 0 me- do diante da propria destruicao: este portanto, e nao ‘0 mero evitar a dor, € 0 que se mostra na precaucio angustiosa com a qual o animal procura colocar a si, ‘e ainda mais a sua prole, em seguranga diante de ca- dda coisa que possa ser perigosa. Por que 0 animal fo- Be, treme e procura esconder-se? Porque ele & pura Vontade de vida; como tal, entretanto, destinado & ‘morte, quer ganhar tempo, O homem é por nature- 2a assim mesmo, O maior dos males, o que de piot «em geral pode nos ameacar, é a monte; a maior anguis- tia € a angistia da mone. Nada nos arrebata to irce- sistivelmente a mais viva participagao quanto o peri- 2g0 de vida de um outro: nada € mais horrvel do que ‘uma execugio. O apego sem limites a vida que aqui aparece no pode, todavia, ser originado do conhe- cGimento e da ponderagao: diante destes parece antes tolo; pois 0 valor objetivo da vida é bastante incento, « resulta pelo menos duvidoso se a ela no seria pre~ ferivel o no-ser, ¢ mesmo se a experiéncia e a pon- deragio tiverem a Glkima palavra, 0 no-ser tem de triunfar. Se se batesse nos timulos para perguntar ‘aos mortos se querem ressuscitar, eles sacudiiam a cabeca negando. Nesta mesma diresao vai também a opiniao de Socrates na apologia de Platio, e mes- ‘mo 0 jovial ¢ amével Voltaire ndo pode sendo dizer. ‘on aime la vie; mais le néant ne laisse pas d’avoir du bom lama-se a vida; mas 0 nada nao deixa de ter 0 seu lado bom, E ainda: je me sais pas ce que c'est que a vie éternelle, mais celle-ci est une mauvaise plai- santerie|ndo sei o que € vida eterna, mas esta é uma brincadeira de mau gostol. Além do mais, a vida, de ‘todo modo, logo tem de finda, assim, os poucos anos ‘que talvez ainda se tenham para viver, desaparecem por completo ante o tempo sem fim no qual nto mais. se existiré. Por isso, diante da reflexio, parece até ‘mesmo ridiculo preocupar-se tanto com to breve es- pago de tempo, tremer tanto quando a propria vida ‘ou a de um outro se encontra em perigo, € compor tragédias, cujo horror tem seu nervo s6 no temor da “ Arar epee = mone, Aquele poderoso apego a vida é, poranto, iracional e cego: 96 € explicivel pelo fato de que todo o nosso ser em si mesmo jéé Vontade de vida, para © qual, portanto, esta vida tem de valer como © bem supremo, por mais amarga, breve e incerta que cla sempre possa ser; e pelo fato de que a Vontade, ems eoriginariamente,é destituida de conhecimen- to € cega. © conhecimento, 20 contro, bem longe de sera origem do apego a vida, tua até contra este, na medida em que desvela a auséncia de valor da mesma e, assim, combate o temor da monte. - Quan- do 0 conhecimento vence, e por conseguinte 0 ho- mem vai corjosoe sereno de encontso 3 mort, en- tio € honrado como grandioso e nobre e festejamos ‘triunfo do conhecimento sobre a Vontade de vida ‘cega, que, em verdade, € 0 nicleo de nosso proprio set. De maneira similar desprezamos © homem no qual o conhecimento é derrotado naquele combate, {que poranto se apega incondicionalmente via, i surgindo-se contra a morte que se aproxima, rece- bbendo-a com desespero' enele se express, no entan- to, apenas a esséncia onginria de nosso si-mesmo & da natura. Pdie-se perguntar aqui de passagem co- ‘mo 0 amor sem limite vida eo esforgo para de to- om plato pgs os of maple oa wer cat, lect a ane sles forte anim ae acer ce ‘mont arenes soar capi Nal de ladders desamos {Ss quetindossopleaestnploram po sua vida cs ales ane {moty que oa ae een teepesions Amey Sas osamesdeconserars vila Cee, Pro sone 4 o Mic de mere — {da maneira conservé-la 0 mais longamente possivel poderiam ser consideradios mesquinhos, desprezivets, ‘edo mesmo jeito indignos dos seguidores de cada re- ligito, se a mesma vida fosse um presente de deuses bbenevolentes, a ser reconhecido com gratidao, E co- ‘mo poderia pois o desprezo a vida aparecer grande ‘enobre? Entretanto, por meio dessas consideragdes se confirma: 1) que a Vontade de vida € a esséncia ‘mais intima do homem; 2) que ela é em si destituida de conhecimento, cega 3) que 0 conhecimento é um principio originalmente estranho, acrescido 3 Vonta- de; 4) que 0 conhecimento luta contra a Vontade © nosso juizo concede aprovagio a vitéria daquele so- bre esta Seo que faz-a morte aparecer-nos tio terrvel fos- se 0 pensamento do ndo-ser, entdo teriamos de pen- sar, com calafrio igual, no tempo em que ainda nao éramos. Pols & incontestavelmente certo que © n0- ser apés a morte no pode ser diferente daquele an- terior ao nascimento, e portanto também nao ¢ lasti- smavel, Uma infinidade inteira fuiu, quando ainda ndo ramos: mas iss0 nao nos aflige de modo algum. Ao Contririo, ofato de que ap6s 0 intermezzomoment’- neo de uma existencia efémera deva seguir-se uma segunda infinitude, na qual nao maisseremos, 0 acha- ‘mos duro e mesmo insuportivel. Deveria ento essa sede de existéncia ter nascido do fato de que n6s a degustamos e a achamos deveras adorivel? Como ji foi abordado acima de passagem: com certeza nao, Antes, a experiénciafeita bem poderia ter despentado 6 Arb Spear uum anelo infinito pelo paraiso perdido do nao-ser ‘Também a esperanca de uma imoralidade da alma vvem sempre atrelada & de um “mundo melhor" - um signo de que 0 mundo presente nao vale muito. ~ Ape- sar de tudo isso, a pergunta pelo nosso estado apés a ‘monte foi com certeza mil vezes mais abordada, em livros e oralmente, do que a do nosso estado antes ddo nascimento. Em termos te6ricos, entretanto, um problema é to préximo e legitimo quanto 0 outro: ‘quem tivesse resolvido um, talvez também estivesse do mesmo modo as claras com 0 outro. Temas belas declamages sobre como seria chocante pensar que © espirito do homem, que abarca 0 mundo © tem pensamentos to elevados, também descesse para 0 ‘mulo: mas sobre ofato de como esse espirito deixou twanscorrer uma infininude ineira, antes de ter nascido ‘com estes seus atributos, e 0 mundo tenha se arran- Jado por to longo tempo sem ele, no se ouve nada, No entanto, a0 conhecimento no corrompido pela ‘Vontade nenhuma pergunta se apresenta mais natural cdo que esta: um tempo infinito lui antes do meu nas- ‘cimento; 0 que eu era durante tio esse tempo? ~ Em termos metafisicos talvez se pudesse responder: “Eu fui sempre eu: em verdade todos aqueles que durante aquele tempo diziam eu, eram eu mesmo” Mas volte- ‘mos ao nosso ponto de vista ainda inteiramente empi- ‘co, ao aleance de nossa milo, e admitamos que eu no fora, Mas ento eu posso'me consolar sobre 0 tempo infinito apés a minha morte, quando nao serei, ‘como com 0 tempo infinito, quando nao fui, como um. « ey to more estado bem comum e em verdade bastante conforti- vel. Pois a infinitude a parte post |posterior| sem mim pode ser tio pouco terrvel quanto a infinitude a par- fe ante anterior] sem mim, na medida em que ambas ‘em nada se diferenciam a nao ser pela mediagio de ‘um sonho efémero de vida. Também todas as demons- rages em favor da perduracdo apds a morte se dei- xam igualmente bem aplicar in partem ante na par- te anterior, e entio demonstram a exisiéncia antes da vida, admissio na qual os hinduistas e budistas se mos- tram, portanto, basante consequentes. $6 a idealidade do tempo de Kant resolve todos esses enigmas, mas ainda nao € 0 momento de tratarmos dela. Do que ja foi dito, entretanto, resulta que € tio absurdo aligi-se sobre o tempo em que nao mais se ser, quanto 0 se- fia sobre o tempo em que ainda nao éramos: pois € indiferente se o tempo, nao preenchido pela nossa cexisténcia,relaciona-se como futuro ou passado aque- le que ela preenche. ‘Abstraindo totalmente essas consideragdes tem- porais, € obviamente absurdo considerar 0 ndo-ser ‘como tum mal; pois cada mal, como cada bem, tem a cexisténcia por pressuposto,¢ até mesmo a conscién- cia; essa, entretanto, cessa com a vida, como também ‘no sono e no desmaio; assim, auséncia da mesma, co- ‘mo nao contendo nenhum mal, € bem conhecida e familiar e, em todo caso, a entrada em cena de uma tal auséncia € coisa de um momento. A partir desse pponto de vista Epicuro considerou a morte, dizendo portanto com inte acerto6 BévartosjnBEv mpd fas o = Anta Spend. (a mone nao nos concere};elucidando que, quando somos, a morte nao é, e, quando a mone €, no s0- ‘mos (Di6genes Laércio, X, 27). Ter perdido algo cuja falta ndo poder ser sentida, manifestamente no & ne- ‘hum mal: portnto, o tomarse mo-ser ndo pode tam- _pouco nos incomodar tanto quanto 0 nao-tersido. Do pponto de vista do conhecimento, portanto, parece no haver fundamento algum para temer a more: ora, @ ‘consciéncia consiste no conhecimento; por isso, para ela a morte no é um mal. De fato, ndo € essa parte cognoscente de nosso eu que teme a morte, mas & ‘unicamente da Vontade cega que provém a fga mor- fis (faga da motel, que preenche todo vivente. Para este, entretanto, como jf foi mencionado acima, ela € essencial, justamente porque todo vivente € Vontade de vida (cuja esséncia inteira consiste no impeto de vi- da e de existéncia), para a qual o conhecimento nao esti presente de modo originario, mas s6 depois de ‘sua objetivagao nos individuos animais. Quando en- ‘20, mediante tai individuos, a Vontade de vida avis- ta a morte, como o fim do fendmeno, com o qual ela se identiicou e pelo qual se vé poranto limitada, to- do o seu ser se insurge contra ele com violéncia, Se, de fato, hd algo na morte para ser temido pela Von tade, nbs investigaremos 2 seguir, €, nesse €3s0, nos recordaremos da verdadeira fonte, aqui demonstrada, do temor da morte, com a diferenciacio propria entre ‘a parte volitva e a parte cognoscente do nosso ser [Em conformidade com 0 dit, o que torna a mor- te do temivel para n6s ndo é tanto o fim da vida, pois « : Moa da mi : isso ndo pode parecer a ninguém como particular. mente digno de receio; mas antes a destruigo do or- ganismo: porque este € a propria Vontade de vida que se expoe como corpo. Mas essa destruigio nos a sen- timos efetivamente s6 nos males da doenga, ou da ‘dade: 20 contririo, a more mesma, para 0 sujelto, ‘onsiste apenas no momento em que a consciéncia desaparece, na medida em que cessa a atividade do cérebro. A difusto a todas as partes restantes do orga nismo que se segue a essa parada jé é propriamente ‘um evento apés a morte. A morte, em termos subje- tivos, conceme portanto apenas a consciéncia. Quan- 10 a0 que seja o desaparecer desta, cada um pode de ‘certo modo julgar a partir do adormecer: melhor o Cconheceri, entretanto, quem jé teve um verdadeiro ‘desmaio, no qual a transigo ndo é tio gradual nem intermediada por sonhos, mas primeiro desaparece, ainda com plena consciéncia, a capacidade visual, © depois imediatamente entra em cena a mais profun- da auséncia de consciéncia: a sensagao aqui, enquan- to dura, é apenas desagradivel, e sem dOvida, assim ‘como 0 sono € 0 imo, 0 desmaio € 0 gémeo da mor- te. Também a morte violenta nao pode ser dolorosa; mesmo feridas graves via de regra quase nao slo sen- tidas, mas s6 depois de algum tempo, e freqiente- ‘mente s6 sio notadas por seu aspecto exterior: clas. io rapidamente mortiferas assim a conscigncia de- saparecerd antes dessa descoberta: caso matem len- tamente, € como em outras doengas. Também todos (0s que perderam a consciéneia na Agua, ou por va- @ ne Spot —— pores de carvao, ou por enforcamento, declaram, co mo € sabido, que isso aconteceu sem tormento. E por fim até a propria morte conforme & natureza, por ve- Ihice, a eutandsia, € um gradual desaparecer e per dderse da existacia, de maneira inobservavel. Pouco ‘a pouco, extinguem-se na velhice as paixdes e os ape- Utes, junto com a suscetibilidade para seus objetos; os aferos nao encontram mais nenhum estimulo, pois @ forga de representagao se tora cada vez mais fraca, suas imagens mais foscas, as impressOes ndo aderem ‘mais, transcorrendo sem vesigio, os dias passam sem- pre mais ripido, os acontecimentos perdem sua im- portincia e tudo se empalidece. O anciio cambaleia de cé para I, ou repousa num canto, apenas uma ‘sombra, um fancasma de seu ser anterior. O que ain- dda resta nele para ser destruido pela morte? Um dia ‘entio ea soneca € a tltima, e seus sonhos sio...aque- les pelos quais Hamlet pengunta, no famoso monélo- go. Bu acredito que nés 0 sonhamos justamente agora, Deve-se ainda observar aqui que a conservagio do processo vital, embora tenha um fundamento me- tafisco, no se di sem resisténcia, por consequéncia, rndo sem fadiga. £ a esta que 0 organismo sucumbe todo fim de dia, © devido a qual suspende a funga0 cerebral e diminui algumas secregbes, a respiracio, 0 pulso e a temperatura, Disso é para se concluir que {odo o cessar do processo vital em de ser, paraa sua propria forca motri2, um alivio maravilhoso: o qual talvez tenha participacio na expressao de doce con- tentamento na fisionomia da maior parte dos mortos. Sande moe _ Em ger o instante da morte pode ser semelhante 30 acordar de um grave pesadelo 'Né aqui o que resulta €que a mome, por mats te- ‘ida que sea, ndo pode se propramente mal algum. Muitas vezes ela aparece alé como um bem, como algo desejado, como uma amiga bem-vinda, Qualquer "um que deparou com obsticulos intransponiveis pa- 1 sua existéncia, ou para suas aspiragdes, que sofra oengas incurives, ou desgostos inconsolve's, tem como tltimo refgio, que muita vezes se oferece por 5imesmo, 0 retorno ao vente da natureza, do qual, como também toda outra coisa, por breve tempo ‘emergira,seduzido pela esperanga de condigbes mais propicias de existncia do que as ai encontradas,e, 4 paris da qual, o mesmo caminho de saida sempre Ihe petmanece aberto. Esse retorno é a cessio bono- rm {cessio dos bons poderes] do vivente. Enretanto também esse s6 se dari depois de uma lua fsica ou mor tanto que cada um se recusa a volar Ii de conde proveio to fille solicto para uma existéncia {que tem a oferecertantos sofrimentos e tio poucas alegrias, ~ Os hindus dio 20 deus da mone, Yama, dduas faces: uma bastante temivel e terivel, e uma bastante alegre e benévola. Iso se explica em parte jf mediante a consideracao recémrexposta ‘Do ponto de vita empiico,no qual ainda perma- rnecemos, a consideragio a seguir se oferece por si ‘mesma, ¢ portanto merece, mediante esclarecimento, ser determinada de modo preciso e, assim, ser reme- tida aos seus limites. O exame de um cadaver mos- Anbu Steger trasme que a sensibilidade, a initabilidade, a circula- ‘lo sangtinea, a reprodugio etc. aqui cessaram, Con luo disso com seguranga que aquilo que até entio rele atuava, e, no entanto, era algo sempre desconhe- ‘ido para mim, no mais atua nele agora e portant dele se afastou, ~ Se eu, entretanto, quisesse acres Centar que esse algo teria sido justamente 0 que eu conheei apenas como consciéncia (alma), portanto co- mo inteligéncia, entio essa seria no apenas uma con- clusto injusta, mas manifestamente falsa, Pois a cons- ciéncia sempre se mostrou para mim no como causa, ‘mas como produto ¢ resultado da vida organica, au- mentando ¢ diminuindo, em consequéncia dela, 2 sa- ber, nas diversas idades da vida, na satide e doen¢a, ‘no sono, no desmaio, no acordar etc, tendo poran- to sempre aparecido como efeito, nunca como causa dda vida ongnica, sempre se mostrado como algo que surge e desaparece, ¢ surge de novo, enquanto exis- tirem condigdes para tal, mas no fora disso, Sim, pos- so também ter visto que a completa perturbagio da consciéncia, a loucura, longe de conseguir reduzir € deprimir as ourasforcas, ou colocar em perigo a vida, ‘em verdade as aumenta, sobretudo a initablidade ou 4 forga muscular, prolongando a vida em vez de en- ‘curté-la, caso no concorram outras causas. ~ Alem. do mais conheci a individualidade como qualidade de ‘cada organismo e, por consequéncia, se o mesmo & autoconsciente, também da consciéncia, Nao existe ‘motivo algum para concluir agora que tal individua- lidade sejainerente a0 principio gerador que confere st a vida, de mim desconhecido por completo, tanto me- ‘nos quando vejo que em toda parte na natureza cada fendmeno particular & a obra de uma forga geval, satuante em milhares de fendmenos iguais.~ Mas, por ‘outro lado, também nao ha tampouco motivo para concluir que, porque a vida orginica cessou, por isso também aquela forca que até entio nela atuava tor nnou-se nada; tampouco quanto deva se concluir da imobilidade da roda de fiar a morte do fiandeiro. Se um péndiulo, mediante o reencontro do seu ponto gr Vitacional,finalmente chega a0 repouso, cessando as- jm a aparente vida individual do mesmo, ento nin ‘guém presumiri que a gravidade esteja agora aniqui- Jada, mas cada um concebe que ela esti ativa, tanto {quanto antes, em inumeriveis fendmenos. Ceramente pode objetar-se contra essa comparagio que, também aqui, nesse pendulo, a gravidade nao cessou de ser ativa, mas s6 de externar de modo evidente a sua ati- vidade: quem insistr nesse ponto pode, em vez do pendulo, pensar num corpo eletificado, no qual, de- pois de sua descarga, a eletricidade de fato cessou de ser ativa, Quis apenas mostrar com isso que nos mes- ‘mos reconhecemos imediatamente a forgas mais bai xxas da natureza uma eternidade e ubiquidade, das (quais a transtoriedade de seus fenémenos fugazes em rnenhum momento nos desencaminha. Tanto menos, portanto, pode nas ocorrer de tomar 0 cessar da vida pela aniquilago do principio vivificant, logo a mor- te pelo inteito sucumbir do homem. Porque o braco. forte, que, ha trés mil anos, retesou o arco de Odis- Ar shopotaner- su, nao mais exist, nenhum entendimento razodvel ¢ bem regrado considerari a forga, que atuava no ‘mesmo Wo energicamente, como totalmente aniqui- Jada, mas também, por conseguinte, nio considerara, em ulteriores reflexdes, que a forca que hoje retesa ‘© arco comegou a exist com esse brago, Muito mais correto é 0 pensamento de que a forca, que antes ati- ‘vava uma vida agora evadida, € a mesma que é ativa ra vida agora florescente: sim, isso & quase incontes- tavel. Com certeza, entretanto, sabemos que (como {oi exposto no segundo livro) apenas o transit6rio & cconcebivel na cadeia causal: mas esse transitrio S30 apenas os estados e as formas. Ao contrério,imunes 4 mudanga produzida mediante causas, permanecem por um lado @ matéria, por outro as foras naturals: pois ambas sto 0 pressuposto de todas as mudangas. (0 principio que nos vivifica, entretanto, temos antes de pensi-o, pelo menos no momento, como uma for- (62 natural, até que uma investigagio mais profunda ‘nos faca reconhecer 0 que mesmo ele seja emsi. As considerada como forca natural, a forca vital ppermanece por inteira imune a mudanga de formas e estados que a série de causas ¢ efeitos produz, e so- mente 2 qual estio submetidos 0 nascer € 0 perecer, ‘como se mostra na experiéneia. Até aqui, portanto, deixa-se é demonstrar com seguranca a imortalidade de nosso verdadeiro ser. Mas isso, € certo, ndo satis fari as exigencias que se esté acostumado a fazer em relagio as provas do nosso subsists ap6s a monte, nem. proporcionara o consolo, que se espera delas. No en- ” — Mca de mre tanto, € sempre alguma coisa, e quem teme a morte ‘como sua aniquilagio absoluta nio pode desdenhar a plena cemteza de que o principio mais intimo de sua vvida permanece intocado por ela. ~ Sim, pode-se es- tabelecer 0 paradoxo, que também aquela outra coisa, (ou seja, a matéria, que, 20 lado das forgas natura, ‘permanece intocada pela mudanga continua dos es- tados no fio da causalidade, assegura-nos mediante sua constincia absoluta uma indestruibilidade, em vinude da qual quem nao é capaz de conceber ne- ‘nhuma outra poderia ao menos se consolar com uma {imomalidade cert. "Como?" dirse-a, °o perdurar do ‘mero po, da matéria bruta, devera se visto como uma ccontinuagao de nosso ser?” ~ Oh! Conheceis entao es- se p6? Sabeis 0 que ele € e 0 que pode? Aprendei a conhecé-lo, antes de desprezi-lo. Essa matéria, que ‘agora estd af como p6 e cinza, se dssolvida na agua, logo se consolidard como cristal, brilharé como me- tal, solar fascas eletricas, exteriorizari mediante sua tensio galvnica uma forea que, desfazendo a mas ir sme ligagao, reduz terra a meta: sim, ela se wansfigu- ‘ari por si mesma em planta e animal e desenvolverd, 4 partir do seu ventze pleno de mistério, aquela vida, dante de cuja perda, em vossa limitaglo, vos inquie- tais to angustiosamente. Entio, é de todo nulo con- ‘inuar como uma tal matéria? Eu afirmo com seriedade ‘que mesmo essa permanéncia da matéria testemunha «favor da indestrutibilidade de nosso ser verdadeiro, ‘mesmo se apenas em imagens e alegorias, ou, antes, apenas em silhueta. Para nos convencermos disso, te- 8 Antsy ‘mos apenas de recordar a abordagem do assunto ji feita, a partir da qual resukou que a matéria pura, sem forma (base do mundo da experiéncia, nunca percebida por si s6, mas pressuposta como sempre existente), € 0 reflexo imediato, a visibilidade em ‘ger da coiss-em-si, portanto da Vontade; por conse- ‘uinte, para ela, sob as condigdes da experiéncia, vale 0 que concerne de modo absoluto a Vontade em Si, que reproduz sua verdadeira eteridade sob a ima- ‘gem do tempo imperecivel. Se, como ji dito, a natu- reza no mente, entlo nenhuma consideracio nascida de uma sua pura concepcdo objetiva, e concluzida com _pensamento consequent, pode ser no todo falsa, mas. , no pior dos casos, apenas bastante unilateral ein- completa. Tal ¢indiscutivelmente 0 caso do materia- lismo consequente, como o de Epicuro, tio bom quan- 100 idealismo absoluto que the € oposto, como o de Betkeley, em geral qualquer consideragio filosofica fundamental provinda de um apperculinteleccao] use to.¢ honestamente desenvolvido, Todavia todas essas ‘concepsdes si altamente unilateras; por consequén- ia, apesar de suas oposigdes, sio ao mesmo tempo vverdadeiras, a saber, cada uma a partir de um deter- ‘minado ponto de vista. Mas assim que nos elevamos cima deste elas aparecem agora como relatva e con- dicionalmente verdadeiras. Apenas 0 mais elevado pponto de vista, a partir do qual se as vem todas e se as reconhecem meramente em sua verdade relativa (in- cdo mais além, entretanto, se as reconhecem em sua falsidade), pode ser o da verdade absolut, até onde 16 = Mac de mre. - uma tal verdade € em geral alcangivel. Em conformi-

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