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‘SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Coordenadoria de Processamento Inicial 48:12 107708 28/08/2008 AUTEN AL A ARGUICAO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENT IR, iy 1° 173 = ARGUENTE: Partido Socialismo e Liberdade - PSOL ARGUIDOS Governador e Assembléia Legislativa do Estado de Sao Paulo e Prefeito e Camara Municipal do Estado de Sao Paulo Relator: Ministro Carlos Britto Constitucional. Leis estadual ¢ municipal que profbem ao servider piiblico referéncias depreciativas, em informacdes, parecer despacho ou pela imprensa, as autoridades e aos atos da “Administragao Piblica. Proibigdo legal imposta aos funciondrios ppiiblicos do Estado de Sdo Paulo de expressarem manifestagdo de ‘apreco ¢ desupreco, dentro das repartighes pidblicas, ¢ de praticarem alos de sabotagem no servico ptiblico, Ofensa aos ipreceitos fundamentais da liberdade de pensamento ¢ de expressao ‘ndo conjigurada, Norma legal que proibe aos funciondrios piiblicos do mencionado ente incitarem ¢ aderirem a greve, bem como furdarem e se filiarem a sindicatos. Preliminar de nao conkecimento quanto a essa disposi¢do, diante da auséncia de especificagdo correta do dispositive que a regula. Mérito Incompatibilidade com a nova ordem constitucional, em face do disposto nos aris, 8°. caput, ¢ 37, Vie VIL, ambos da Lei Fundamental. Manifestagao pela procedéncia parcial do pedido veiculado na presente arguicao. Precedentes do STF. Egrégio Supremo Tribunal Federal, © Advogado-Geral da Unido, em face do despacho proferido nos autos em epigrafe, vem, nos termos do art. 5°, § 2°, da Lei n° 9.882, de 10 de novembro de 1999, manifestar-se quanto a presente arguicio de descumprimento de preceito fundamental. I-DA ARGUICAO, é Trata-se de arguicao de descumprimento de preceito fundamental, 7 ¥ com pedido de medida cautelar, proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade - PSOL, tendo como objeto os incisos I, VI, VII e XII do art. 242 da Lei estadual n° 10.261, de 28 de outubro de 1968, ¢ 0 inciso 1 do art. 179 da Lei Municipal n° 8.989, de 29 de outubro de 1979. Bis o teor dos textos impugnados: Lei Estadual n° 10.261, de 28 de outubro de 1968 “Estatuto dos Funciondrios Piiblicos Civis do Estado de Sio Paulo Seco Il - Das proibigies Artigo 242 - Ao funcionario é proibido I~ referir-se depreciativamente, em informagéio, parecer ow despacho, ou pela imprensa, ou qualquer meio de divulgacao, as autoridades constituidas ¢ aos atos da Administragdo, podendo, porém, em trabatho devidamente assinado, aprecié-los sob 0 aspecto doutrinario e da organizagdo e eficiéneia do servigo; a VE ~ promover manifestagdes de aprego ou desapreco dentro da repartig@o, ou tornar-se solidério com elas; VII - exercer comércio entre os companheiros de servigo, promover ou subscrever listas de donativos dentro da repartigao,” Lei Municipal n° 8.989, de 29 de outubro de 1979 “Estatuto dos Funcionarios Pablicos do Municipio de Sao Paulo Titulo VI- dos Deveres e da acio disciplinar Capitulo I — Das Proibigdes ADPF n° 173- Rel. Min, Carlos Britto 2 SPE Me i) Art. 179 - E proibida ao funciondrio toda agdo ou omissiio conte comprometer a dignidade e 0 decoro da funcdo publica ¢ a hierarquia, prejudicar a eficiéncia do servico ou causar dano a Administragdo Piblica, especialmente: I = referir-se depreciativamente em informagdo, parecer ou despacho, ou pela imprensa, ou por qualquer meio de divulgagdo. as autoridades constituidas ¢ atos da Administragdo; ¢...)” [grifos apostos] Sustenta o arguente, em suma, que 0 art. 242, incisos I, VI, da Lei estadual n° 10.261, de 1968, ¢ 0 art. 179, caput e inciso 1, da Lei Municipal n° 8.989, de 1979, nao teriam sido recepcionados pela Constituigio Federal de 1988, porquanto contrarios aos preceitos fundamentais previstos nos arts. 5°, caput e incisos IV ¢ 1X, ¢ 220 da Constituigao Federal, que garantem aos servidores piblicos a liberdade de manifestagdo do pensamento © de expressio. Alega que o inciso VII do art. 242 do diploma estadual “proibindo o funciondirio pitblico do Estado de Sdo Paulo de incitar greves ou a elas aderir, ou praticar atos de sabotagem contra o servigo piblico, é flagrantemente contrario ao art. 37, VII, da CF”. Registre-se que o referido inciso trata de assunto diverso do alegado pelo autor, a evidenciar equivoco no ajuizamento da presente arguigao, no ponto especifico. Afirma 0 arguente, por outro lado, que o inciso XII do mencionado art. 242 também nao teria sido recepcionado pela Constituigao da Repiblica que, em seu art. 37, VI, asseguraria ao servidor puiblico civil 0 direito de associagao sindical. Note-se, mais uma vez, haver o autor incorrido ADPF n® 173- Rel. Min. Carlos Britwo 3 is, + eae em equivoco, a0 mencionar inciso néo existente no referido dispositivo WR@1— Defende que os “ditames da liberdade de expressdio, de opinido e de manifestagéo dos servidores piiblicos municipais e estaduais devem prevalecer sobre razdes de Estado tendentes a preservar os conceitos de ordem, de seguranca piiblica e de disciplina”. Cita, visando defender a sua tese, 0 precedente consubstanciado na Arguigéo de Descumprimento de Preceito Fundamental n° 130-DF, em que se questiona dispositivos da Lei federal n° 5.250, de 1967 (Lei de Imprensa), por contrariedade & nova ordem constitucional. Requer © autor, ao final, a concessio de medida liminar para suspender a aplicabilidade e a eficdcia do art. 242, I, VI, VII e XII, da Lei estadual n° 10.261, de 1968, e do inciso I do art. 179 da Lei Municipal n° 8.989, de 1979, bem como para determinar que 0 Governador € 0 Prefeito do Estado de Sao Paulo suspendam os processos administrativos instaurados com fundamento nos artigos questionados, até posterior decisio de mérito. Pleiteia, ainda, que seu pedido seja julgado procedente e com efeitos retroativos 4 data da promulgagao da Carta de 1988. O Prefeito Municipal prestou as informagées de fls. 278/287, manifestando-se pela improcedéncia da agio. Por sua vez, 0 Governador do Estado suscitou as preliminares de aglutinacao indevida de atos normativos editados por entes distintos, bem assim de falta de comprovagio do descumprimento e da controvérsia judicial relevante. No mérito, informou ADPF n° 173- Rel, Min. Carlos Britto 4 ae ° 2 (1) \e 2 hi i ji de i ‘a inci de . 242, aver enviado projeto de lei para revogar o inciso I do art. 242 da LR = es 10.261, de 1968, e defendeu a procedéncia parcial da ado, somente no que tange ao art. 243, inciso XII, da Lei estadual n° 10.261, de 1968 (fls. 289/305). Apés distribuigéo, foram os autos conclusos 20 Ministro Carlos Britto, que adotou o rito do art. 5°, § 2°, da Lei federal n° 9.882, de 1999, solicitando informagées aos arguidos. II- PRELIMINAR Do néio conhecimento da agéio quanto aos incisos VII e XH do art. 242 da Lei estadual n° 10.261, de 1968 Destaque-se, inicialmente, que a arguigio nao merece ser conhecida quanto aos mencionados incisos VII ¢ XII do art. 242 da Lei estadual n® 10.261, de 1968, porquanto tais dispositivos nao tratam dos temas contra os quais se insurge 0 arguente. Vale registar que o referido art, 242 sequer contém o inciso XI. Na verdade, a proibigio de “incitar greves ou a elas aderir, ou praticar atos de sabotagem contra o servigo piiblico” ¢ de “fundar sindicato de funcionarios ou deles fazer parte" esté prevista nos incisos VII ¢ XII do ari, 243 do referido diploma legal, que prevé, in verbis: “Artigo 243 - E proibido ainda, ao funciondrio, VII incitar greves ou a elas aderir, ou praticar atos de sabotagem contra o serviga piiblico; bd ADPF n® 173- Rel. Min. Carlos Britto 5 A par da auséncia de correlagio entre 0 texto normativo impugnado ¢ os dispositivos de lei trazidos como referéncia, verifica-se, também, a impossibilidade de se conhecer da presente agao, no ponto especifico, tendo como objeto os mencionados incisos do art. 243 da Lei estadual n° 10.261, de 1968. Com efeito, os incisos VI e XII do art. 243 nao foram identificados como objeto da causa no instrumento procuratério de fl. 25. Nesse contexto, nao houve outorga de poderes para a propositura de arguigao de descumprimento de preceito fundamental em face de tais dispositivos. Note-se que a irregularidade na representagao processual retira do procurador poderes para a propositura da acao, a resultar, no caso concreto, incapacidade postulatéria do proprio Partido Pol Nesse sentido foi a posigéo adotada por essa Corte Suprema, ao julgar a Acao Direta de Inconstitucionalidade n° 2.187', cuja ementa esta assim redigida: “Agi direta de inconstitucionatidade que ndo se conhece por néo haver sido cumprida a diligéncia destinada @ regularizagéo da representagdo processual (procuracao com poderes especificos para atacar a norna Impugnada)”". (Rel. Octavio Gallotti, Pleno, DJ de 12.12.2003). [grifos apostos}. Assim, como a arguigao de descumprimento de preceito fundamental tem a mesma natureza da ado direta de inconstitucionalidade, Rel. Min. Octavio Gallotti, Pleno, DJ de 15.06.2000. ADPF n° 173- Rel, Mir. Carlos Britto 6 ABET o % z ‘ le ‘ uma vez que ambas constituem mecanismos de controle concentrad QQ es ~y precedente ora suscitado merece aplicagao. Argumente-se, ainda, haver essa Suprema Corte negado seguimento a Arguicao de Descumprimento de Preceito Fundamental n° 110, com esteio na auséncia de especifi cao da norma impugnada no instrumento procurat6rio. Extrai-se 0 seguinte teor da decisao: “2, A procuragao trazida aos autos especifica ox poderes nela contidos: ‘da cldusula ad judicia para Argitigio de Descumprimento de Preceito Fundamental ~ ADPF" (fl. 44). O instrumento de mandato néo indicou qual a norma especifica autorizaria ao advogado ajuizar argiticho de descumprimento de preceito fundamental’. (Decisdo publicada em 28.06.07, Rel. Min, Carmen Liicia). [grifos apostos}, Desse modo, a presente acao nao deve ser conhecida no tocante aos incisos VII e XII do art. 242 da Lei estadual n° 10.261, de 1968, bem como quanto a impugnacéo das expressdes “incitar greves ow a elas aderir, ou praticar atos de sabotagem contra o servigo publico” e “fundar sindicato de funciondrios ou deles fazer parte”, contidas, respectivamente, nos incisos Vil e XH do art. 243 da Lei estadual n° 10.261, de 1968. Il - DA ALEGADA CONSTRARIEDADE AOS ARTS. 5°, CAPUT E INCISOS IV E 1X, E 220 DA CONSTITUIGAO FEDERAL E improcedente a alegagio do autor no sentido de que o art. 242, incisos Le VI, da Lei estadual n° 10.261, de 1968, ¢ art. 179, caput e inciso I, da Lei Municipal n° 8.989, de 1979, nao teriam sido recepcionados pela Constituigao Federal de 1988. Tais normas proibem que o servidor publico ADPF n® 173+ Rel. Min. Carlos Britto 7 se refira, depreciativamente, em informagées, parecer, despacho ou pom ~ imprensa, ts autoridades e aos atos da Administragao Publica, bem como promova manifestagio de apreco e desapreco dentro das repartigoes publicas. Contudo, tais proibigées, no ambito do servigo ptblico, ao contririo do alegado na peticao inicial, nao ofendem os preceitos fundamentais previstos no art. 5°, caput ¢ incisos IV e IX, da Constituigao Federal, que consagram, respectivamente, a livre manifestagio do pensamento € a livre expresso da atividade intelectual, artistica, cientifica e de comunicacio, independentemente de censura ou licenga. Note-se que a liberdade de manifestacao do pensamento, segundo José Afonso da Silva’, constitui um dos aspectos externos da liberdade de opiniio e se exterioriza entre interlocutores presentes ou ausentes. Pode, também, nao ser exteriorizada, em nome do direito de permanecer calado previsto no art. 5°, LXIII, da Constituigao Federal. Salienta 0 mencionado autor’, ainda, que “a liberdade de manifestagdo do pensamento tem seu dnus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, em sendo a caso responder por eventuais danos a terceiros. Dai por que a Constituigdo veda 0 anonimato”. Veri ica-se, pois que a liberdade de pensamento nao é absoluta, “Curso de Direito Constitucional Positive, 29 edigdo, rev, e atual., So Paulo: Matheiros, » Mesma obra citada, p. 245 2007, p. 244, ADPF n? 173- Rel, Min, Carlos Britto 8 de seu manifesto. Ademais, a liberdade de pensamento, assim como os demais direitos fundamentais, encontra limites em outros direitos igualmente importantes previstos na Constituigao Federal, Nesse sentido, sio oportunos ‘os ensinamentos de Alexandre de Moraes*, ao asseverar que: “os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituiggo Federal, portanto, ndo sao ilimitados, uma vez que encontram nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (principio da relatividade ou da convivéncia das liberdades ptiblicas)’ Do mesmo modo, a liberdade de expressao de que trata o inciso IX do art. 5° da Constituigao Federal também no possui a amplitude que pretende Ihe dar o arguente. José Afonso da Silva’, ao comentar sobre tal garantia, adverte que ““@ liberdade de expressdo’ da atividade intelectual, artistica, cientifica e de comunicagdo, assegurada neste inciso, é a liberdade de exteriorizagdo dessas atividades. As manifestagdes intelectuais, artisticas e cientificas sao formas de difusdo e manifestagdo do pensamento, tomado esse termo em sentido abrangente dos sentimentos e dos conhecimentos intelectuais, conceptuais e intuitivos”’. Na hipdtese em questao, 0 art. 242, incisos Ie VI, da Lei estadual * Direito Constitucional, 14° Edigdo, Sido Paulo: Atlas, 2003, p 61 > Comentério Contextual Constituigdo, 3° Edicao, 2007, Sto Paulo: Mathetras Editores LTDA, p. 98. ADPE n® 173- Rel. Min. Carlos Britto 9 n? 10.261, de 1968, ¢ 0 art. 179, caput, e inciso I, da Lei Municipal n° & de 1979, proibem ao funcionério piblico de “referir-se depreciativam em informacdo, parecer ou despacho, ou pela imprensa, ou qualquer meio de divulgagdo, as autoridades constitufdas e aos atos da Administracdo, podendo, porém, em trabalho devidamente assinado, aprecid-los sob o aspecto doutrindrio e da organizagao e eficiéncia do servigo”. 0 fato de haver tal proibiggo nao afronta o direito de liberdade de manifestacio do pensamento, porque o cidadio, quando investido em cargo ou funcio piblica, esta sujeito a principios especificos que norteiam a administracao piblica, ex vi do art. 37, caput, da Constituigéo Federal, bem como a um regime juridico proprio, por forca do art. 39, caput, da mesma Carta, que podera prever, inclusive, 0 regime disciplinar aplicavel, com direitos, deveres e proibigdes de condutas que causem prejuizo ao interesse pUblico ou sejam contrérias & ética profissional e 4 moralidade. Com efeito, o principio da moralidade que rege a administracao piblica no permite que o funciondrio, no exercicio da fungao publica, adote conduta de desdenhar ou desacreditar autoridades publicas em informagio, parecer, despacho, ou pela imprensa, ou qualquer outro meio de divulgacéo. Argumente-se, ainda, que as normas tidas pelo arguente como nao recepcionadas pela Constituicio Federal de 1988 estio em perfeita consonancia com tais preceitos, na medida em que nao proibem que os funcionarios publicos estaduais possam apreciar os atos da administracio, sob 0 aspecto doutrinario e da organizacio e eficiéncia do servigo, desde que assumam a autoria dessa manifestagio e se ADPF n° 173- Rel. Min. Carlos Britto 10 a aa IS responsabilizem por ela. 2 Enfim, a garantia da liberdade de manifestagdo do pensamento nao autoriza 0 funcionirio pablico a desdenhar ou aviltar atos administrativos que, por sua prépria natureza, so protegidos pela presuncio de legitimidade e de veracidade. A propésito, ao comentar sobre os atributos do ato administrativo, Hely Lopes Meirelles® assevera que “os atos administrativos, qualquer que seja a sua categoria ou espécie nascem com a presungdo de legitimidade, independentemente de norma legal que a estabeleca”. Adverte 0 mencionado doutrinador’, ainda, que a presungao de legitimidade “decorre do principio da legalidade da Administracao (art. 37 da CF), que nos Estados de Direito, informa toda a atuagao governamental, & “autoriza imediata execugGo ou operatividade dos atos administrativos, mesmo que arguidos de vicios ou defeitos que o levam @ invalidade’” Ademais, 0 texto impugnado esté em consonancia com a parte final do inciso [V do art. 5° da Lei Fundamental, que veda o anonimato. Assim, as normas atacadas nao ferem o direito de livre manifestagio do pensamento, tampouco o direito de livre expressao previsto no inciso IX do art. 5° da Constituigao Federal, que confere aos cidadaos liberdade de exteriorizagao de atividades de produgao de obras intelectuais, “Direito Administrative Brasileiro, 30" Edicdo, Sao Paulo: Matheiros LTDA, 2005, p.158. Mesma obra citada, p. 158 ADPF n? 173- Rel. Min, Carlos Brito iT artisticas cientificas ou filosdficas, sem albergar a pratica de ™Qku30? incompativeis com os principios que regem a administragao publica. Cumpre trazer a baila, especificamente em relagio ao ja mencionado inciso VI do art. 242 da Lei estadual n° 10.261, de 1968, que profbe a manifestacio de aprego e desaprego nas repartigées ptiblicas, 0 entendimento de Mauro Roberto Gomes de Mattos", ao comentar o art. 117, inciso V, da Lei federal n° 8.112, de 1990, que prevé idéntica proibigao. Veja- se: “entende-se por aprego a estima desproporcional, que tumultua a prestacdo de servigos por uma inflada ou desmedida consideragdo. Nao resta divida que todos os servidores ptiblicos deverGo ter apreco e respeito uns pelos outros. Mas essa manifestagdo deve ser cordada e ordeira, sem exageros e demonstragées de atos que prejudiquem 0 bom andamento dos trabalhos no interior da repartigdo. Esse respeito mituo que deve coexistir entre os servidores nao é reprimido pelo legislador. Ele pretende apenas estabelecer com 0 tipo legal sub oculis, a proibigdo de exageros, manifestados por atitudes indevidas, no local de trabalho do servidor piiblico. Jé 0 desaprego seria 0 menosprezo que o servidor ptiblico nutre pelo seu colega dentro do recinto do drgdo piiblico, onde exercem suas fungées”. Também Francisco Xavier da Silva Guimaries’, a0 tratar do mencionado dispositivo federal, ressalta os objetivos visados pelo legislador federal ao proibir manifestagdes de aprego e desaprego no espaco das repartigdes. Por ser pertinente, destacam-se os seguintes excertos de seus "Lei n° 8112/00, interpretada e comentada, 4" Edioio, rev. e atual, Rio de Janciro: América Juridica Lida, 2008, 4” edicao, p. 685/686, Regime Disciplinar do Servidor Piiblico da Unido, Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 26°27 ADPF n? 173- Rel. Min, Carlos Britto 12 comentarios: Diante de tais comentarios, veri a oF ZO TRY gi < > % @ ; “0 dispositivo objetiva coibir manifestacaes estranhas que, de forma direta ou indireta, possain prejudicar 0 bom rendimento do ‘servico piiblico ou ter reflexo negativo na produtividade do trabalho. Cuida-se de vedar as manifestagdes ¢ outras atividades perturbadoras do ambiente do trabalho, na consideragdo de que a repartigito péiblica, sendo wm local de trabalho, nao pode servir de ponto de encontro ou de espaco para reuniéo politica estranha aos fins a que se destina, como por exemplo, atividades tidicas, de leituras, de palestras ¢ outras incompativeis como 0 exercicio do cargo ou da funcao, durante 0 horério de trabalho. Impée-se evitar constrangimento, néo sé para a chefia, como para os priprios servidores. Dentre os atos que, de certa forma, coagem, estio os de participagio ou de adesio, nem sempre do agrado do servidor, ou por se situarem além de sua posse. O servidor puiblico foi admitido e é pago para servir ao piiblico, e a repartigdo é destinada ao trabalho, devendo nela reinar clima de dedicagéo exclusiva ao servico. A proibicao aqui prevista objetiva evitar 0 desvio de finalidade a que se destina 0 ambiente de trabalho, com pnitica de atos por motivos ¢ com fins diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse piiblico. Registre-se, finalmente, que a restrigio se dirige a forma coativa e constrangedora, sob qualquer modalidade de aliciamento, de convite, de apelo sentimental ou financeiro e de catequese de companheiro de trabalho, A proibicao, assim, ndo se refere as manifestacies espontaneas contra ou favor de determinadas situacdes”. [grifos apostos}. ‘a-se que a proibigao contida na lei estadual, por ser idéntica 4 prevista pela Lei federal n° 8.112, de 1990, comporta semelhantes objetivos, quais sejam, evitar 0 desvio de finalidade, preservar o interesse piblico © garantir a observancia do principio da impessoalidade. ADPF n° 173- Rel. Min. Carlos Britto 13 \ > Nowa? eo - oe ‘. > Vale trazer, ainda, os comentarios de Mauro Roberto Gomes &@yyaS? Mattos”, ao demonstrar que o principio da impessoalidade impede que 0 servidor piblico possa fazer manifestagdes de aprego e de desaprego no local de trabalho. Confira-se: “O principio da imparcialidade, consagrado na impessoalidade (art, 37, da CE), impede que 0 servidor piblico tenha preferéncias ‘pessoais na conducdo dos seus servigos, Nesse sentido, é vedada a manifestacéo de apreco ou desapreco no local de serviga dos servidores piibicos. Esse dispositivo legal inibe a atividade politico-partiddria, cujo efeito seria, inevitavelmente, criar divergéncias entre os servidores, com o surgimento de animosidades prejudiciais & disciplina e d ordem interna no interior da reparticéo piblica. O tipo legal em questéo objetiva manter a disciplina e a boa ordem no servico piblico federal, sendo vedada a manifestacdo de apreco ou desapreco no recinto do drgdo Publico, pois tais atos perturbariam 0 bom e normal andamento do servico a ser executado pelos servidores piiblicos. Assim, € vedada a enunciagao piblica de opinides ou sentimentos coletivos (manifestagdes) de apreco ou desapreco quando o servidor piblico estiver dentro dos limites ou do espaco fisico do seu local de trabalho”. [gritos apostos}. Com efeito, as manifestagdes de apreco e desaprego, por serem incompativeis com 0 principio da impessoalidade ¢ da preservagio do m ser coibidas no Ambito da interesse piblico na prestagao do servigo, preci administracao publica. Assim, tendo em vista, especialmente, a aplicagio do principio da Mesma Obra citada, p. 687. ADPF n? 173- Rel, Min, Carlos Britto 4 relatividade ou convivéncia das liberdades piiblicas, conclui-se que~xu3o”” proibigéo de que trata o inciso VI do art. 242 foi acolhida pela nova ordem constitucional. IV - DO LIVRE EXERCICIO DO DIREITO DE GREVE ‘Acaso afastada a preliminar de nao conhecimento parcial da presente acdo, cumpre destacar que a Constitui¢do Federal, em seu art. 9°, assegura aos trabalhadores do setor privado 0 direito de greve, que estd, contudo, sujeita as limitagdes constitucionais e outras a serem definidas em lei. Tal direito, no ambito da iniciativa privada, foi regulado pela Lei federal n 7.783, de 28 de junho de 1989, que, “dispde sobre o exercicio do direito de greve, define as atividades essenciais, regula 0 atendimento das necessidades inadidveis da comunidade, e da outras providéncias”. Ao tratar do direito de greve dos trabalhadores em geral, Sérgio Pinto Martins assevera ser ‘possivel dividir as limitagées ao direito de greve sob o aspecto objetivo, da previsdo da lei, e sob 0 aspecto subjetivo, dos abusos cometidos”, bem assim que “as limitag6es ao direito de greve encontram-se inicialmente na prépria Constituigao”. Comenta 0 mencionado autor: “Verifica-se de modo genérico que 0 inciso VII do art. 4° da Constituigdo adota nas relacdes internacionais a soluedo pacifica dos conflitos. E claro que, indiretamente, essa regra deve ser ADPF n? 173- Rel. Min. Carlos Britto 1s empregada internamente, tanto que o préprio art. 2° da Lek n°... 7.783/89 esclarece que a greve deve ser pacifica, vedandey ys” portant, greves violentas, inclusive por meios violentos, de tortura oun de tratamento desumano e degradante (art. 3°, III, da CF). O art, 5% caput, da Lei maior assegura 0 direito a vida, a liberdade, & seguranca e¢ a propriedade. Greves que venham a violar esses direitos jd estarto excedendo os limites constitucionais. O inciso XH do art. 5° da mesma norma ainda determina o direito de propriedade, nio sendo possivel que a greve venha a danificar bens ou coisas. 0 § 3° do art, 6° da Lei n° 7.783789 & claro nesse sentido, ao determinar que os atos empregados pelos grevistas néo poderéto causar ameaga ou dano é propriedade ou pessoa. O inciso IV do art. 5° da Lei Magna prescreve o direito a livre manifestacdo do pensamento, vedando apenas 0 anonimato. Haveré liberdade de pensamento quanto i greve em relacao aos que so contrérios a ela. Ainda dentro da liberdade de pensamento, deve-se respeitar na greve as conviccées politicas, filoséficas ¢ as crencas religiosas das pessoas (art. 5°, VIL, da CF). Os danos causados & moral, d imagem da pessoa ou danos de cardter material terdo de ser indenizados pelos responsiiveis (art 5° V, da CF). Com isso também se quer dizer que a greve deverd respeitar a moral e a imagem das pessoas e suas coisas materiais. Assegura-se 0 direito & vida privada (art. 5°, X), bem como o direito de livre locomogdo (art. 5°, VI, da CF”. {grifos apostos] No setor piblico a situago nao é diferente, porque o direito de greve é assegurado no art. 37, VII, da Lei Fundamental, aos servidores civis da Unido, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municipios, mas sofre limitagdes constitucionais, pois no seu exercicio devem ser igualmente observados os preceitos fundamentais previstos nos arts. 4°, VII, ¢ 5°, caput, € incisos III, TV, V, VI, VII, e XXII, da Constituigao Federal. Na mesma linha, o mencionado art. 37, VII, da Carta da Republica impée ao legislador ordindrio federal 0 estabelecimento de ADP n® 173. Rel. Min, Carlos Brito 16 restrigdes ¢ de limites para o exercicio do direito de greve, mediante I especifica. Tal lei ainda nao foi editada, mas isso nao impede o servidor. ptblico de exercer tal direito. Nao foi por outra razio que esse Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Mandados de Injungao n°s 670 ¢ 708, reconhecendo a omissao legislativa quanto ao direito de greve dos servidores civis em respeito a seguranca juridica, determinou a aplicagio da Lei federal n° 7.783, de 1989, nos conflitos € nas aces judiciais que envolvam a interpretagao do direito de greve dos servidores piiblicos. Eis excertos da ementa do acérdao proferido no MI n° 670: “4, DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PUBLICOS CIVIS. REGULAMENTAGAO DA LEI DE—sGREVE_—- DOS. TRABALHADORES EM GERAL (LEI No 7.783/1989). PIXACAO DE PARAMETROS DE CONTROLE JUDICIAL DO EXERCICIO DO DIREITO. DE GREVE — PELO — LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL. (..). 4.2 Considerada a omissdo legistativa alegada na espécie, seria 0 caso de se acolher a pretensio, tdo-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissio nao for devidamente regulamentada por lei especifica para os servidores piiblicos civis (CF, art. 37, VI). () “6. Em raztio da evolucdo jurisprudencial sobre 0 tema da interpretactio da omissao legistativa do direito de greve dos servidores piiblicos civis e em respeito aos ditames de seguranca juridica, fixa-se 0 prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisie sobre a maiéria. 6.7. Mandado de injuncto conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicagdo das Leis nos 7701/1988 & 7.783/1989 aos conflitos e as acdes judiciais que envolvam a interpretacdo do direito de greve dos servidores piiblicos civis’” (Rel. para Acérdio Ministro Gilmar Mendes, pleno, DJ de 31.10.2008). [grifos apostos). A propésito, a Lei federal n° 7.783, de 1989, prevé, em seu art. 6°, ADPF n° 173- Rel. Min. Carlos Brito Wy Bs inciso T'', que “sdo assegurados aos grevistas, dentre outros direitos 0 hae emprego de meios pacificos tendentes a persuadir ou aliciar os trabathadores” a aderirem a greve". 0 mencionado dispositivo estabelece, ainda, no seu § 1°, que “em nenhuma hipdtese, os meios adotados por empregados ¢ empregadores poderdo violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem”. Na hipétese em exame, alega o arguente que a proibigio imposta ao funcionario piblico do Estado de Sao Paulo — de “incitar greve ¢ de aderir a esse movimento ~ é contraria ao art. 37, VII, da Constituigao Federal. Cumpre destacar que a incitacio a greve é atitude perfeitamente compativel com a ordem constitucional instaurada pela Carta da Repiblica de 1988, desde que observados os preceitos fundamentais previstos nos arts. 4°, VII, e 5°, caput ¢ incisos Ill, IV, V, VI, VII, e XXII, da Constituigéo Federal, assim como as disposigdes da Lei federal n° 7.783, de 1989. De fato, nao contraria a Carta de 1988 a incitagéo 4 greve realizada com o objetivo de convencer, induzir, aconselhar, mover, persuadir ou aliciar outrem a participar dela, desde que respeitados o principio da tt 4r4, 6 Slo assegurados aos grevistas, dentre outros direitos: 1 -oemprego de meias pacificas tendentes a persuadi ou aliciar os trabalhadores a aderirem & greve; bo) § 1° Em nenhuna hipétese, 03 meios adotados por empregados e empregadores poderiio violar ow ‘constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem. ADPF n? 173 Rel. Min, Carlos Britto 18. . ; a 1) af 7 lm solugao pacifica dos conflitos, bem como a liberdade de —e © direito de livre locomogao € as convicsdes politicas, filoséficas e erencagyy 36” religiosas daqueles servidores, cuja adesio se busque alcancar. Sob tal dtica, verifica-se que a norma legal estadual que, de forma irrestrita, proibe © funcionario pablico do Estado de Séo Paulo de “incitar greves", nao encontra amparo na Constituigio Federal de 1988. Portanto, 0 art. 243, inciso VII, da Lei estadual n° 10.261, de 1968, na parte especifica a tal ato, fere os preceitos fundamentais indicados pelo arguente. Diga-se 0 mesmo no que tange & proibicio imposta ao servidor pliblico do Estado de $0 Paulo de aderir ao movimento grevista. Embora tal direito ndo seja auto-aplicdvel, foi viabilizado 0 seu exercicio mesmo na auséncia da disciplina legal exigida pelo art. 37, VII, da Constituigio da Repiiblica, conforme ja decidiu essa Suprema Corte. Pelo exposto, a proibigao contida no inciso VII do art. 243 da Lei estadual - incitar greves ou a elas aderir - nao foi recepcionada pelo art. 37, VII, da Lei Fundamental. Excetua-se, porém, a previsdo inserta na parte final do mesmo dispositivo, que veda a pritica de atos de sabotagem contra 0 servico pablico, a qual se encontra revestida de constitucionalidade, conforme se vera a seguir. V- DA PROIBICAO DE PRATICA DE ATOS DE SABOTAGEM ADPF n° 173+ Rel. Min. Carlos Britto 19. No que tange a proibigao de pritica de atos de sabotagem contra 0 servigo publico, nao h4 contrariedade a Constituicéo Federal € consequentemente, aos preceitos fundamentais que Ihe conferem densidade normativa. O termo “sabotagem”, segundo De Placido ¢ Silva, vem do francés saboter (pisar), sendo “expressdo usada para indicar 0 ato ou os atos executados por alguém no sentido de deteriorar coisas, ou indicar dificuldades materiais, a fim de impossibilitar 0 trabalho, ou causar prejuizos ao dono da empresa, ou do estabelecimento. Assim, qualquer meio utilizado para impossibilitar, ou para prejudicar o trabalho, mesmo que ndo se cumpra por uma deterioracdo & maquinaria ou material empregado pela empresa, importa numa sabotagem, desde que pelo ato se consigne um impedimento ao trabalho efetivo”. Tal conduta, no ordenamento jurfdico brasileiro, é considerada delituosa pelo Cédigo Penal, que, ao dispor sobre os crimes contra a organizagao do trabalho, tipifica, em seu art. 202'%, a sabotagem — alo de danificar © estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor — como delito, sujeito a pena de reclusio, de 1 (um) a ({rés) anos, e multa. Estabelece, ainda, 0 art. 163 do Cédigo Penal’, que conduta de Art. 202. Invadir ow ocupar estabelecimento industrial. comercial ou agricola, com o intuito de impedir ow ‘embaracar 0 curso normal do trabalho, ou com o mesmo fim danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor: gritos apostos) 18% Art, 163 - Destruir, inutilizar ou detertorar coisa alheii Pena - detencdo, de um a seis meses, ow muta im) Dano quatificado Pardgrafo tntco - Seo crime & comettdo: ADPF n° 173+ Rel. Mir. Carlos Britto 20 destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia é considerada crime contra patriménio, sujeito a pena de detengao, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. Essa pena pode ser aumentada quando a ago delituosa € praticada contra 0 patrimOnio da “Unido, Estados, Municipios, empresa concessiondria de servigos ou sociedade de economia mista”. Como visto, tanto atos de sabotagem como os de dano sujeitam o individuo as penas previstas no Cédigo Penal. Trata-se, pois, de comportamento reprovavel, que pode vir a afetar diretamente, nao sé 0 patrim6nio privado, mas também o patriménio pablico e a seguranca das pessoas. Especificamente em situagio de greve, a conduta que possa resultar dano & propriedade ou a pessoa ¢, igualmente, rejeitada pela Lei de Ge: “as manifestacdes e atos de persuasdo Greve que, no seu att. 6°, § 3°, dis utilizados pelos grevistas ndio poderdo impedir 0 aceso ao trabalho nem causar ameaga ou dano & propriedade ou pessoa”. ‘A reprovagao dessas condutas objetiva, por certo, preservar a propriedade e a seguranca (art. 5°, caput) e, no caso da lei de greve, estimular a solugio pacffica dos conflitos. Dessa forma, nao ha dbice na proibicio de praticas de sabotagem no ambito do servigo pablico, como medida disciplinar legalmente adotada pelo Poder Pablico. UIE contra 0 patrimanio da Unio, Estado, Municipio, empresa concessiondria de servicos piblicos ou sociedade de economia mista; (Redascio dela pela Lei n° 5.346, de 311.1967. Pena ~ detengéo, de seis meses a tres anos, € multa, além da pena correspondente & violencia’. (gritos apostos} ADPF n? 173+ Rel. Min. Carlos Britto 21 Assim, a exptessao “praticar atos de sabotagem contra o servi¢g publico” contida no art. 243, VI, da Lei n° 10.261, de 1968, do Estado de Sao Paulo, ndo fere 0 direito de greve assegurado pela Constituigao Federal, tampouco os preceitos fundamentais da liberdade de manifestagao do pensamento e de expressao. VI— DA PROIBICAO DE FUNDAGAO E FILIACAO A Conforme consignado, 0 referido art. 242 nao contém 0 inciso XII impugnado pelo arguente. A cléusula contestada “fundar sindicato de funciondrios ou deles fazer parte” consta do inciso XII do art. 243 da Lei n° 10.261, de 1968, que nao constit i objeto de impugnagio na inicial. Entretanto, caso ultrapassado tal bice ao conhecimento do tema, passa-se 20 seu exame de mérito. E procedente a alegagao do autor no sentido de que a norma proibitiva de fundar sindicato ou dele participar nao encontra amparo no art. 37, VI, da Constituigao Federal. A referida Carta Politica, de fato, prestigia, em scu art. 8°, caput, a liberdade de associagio sindical. Essa possibilidade de instituir sindicatos auténomos e livres “constitui instrumento eficaz para a efetividade dos direitos sociais dos trabalhadores”, conforme assinala José Afonso da Silva". % Curso de Direito Constitucional Positivo, 29" edicao, rev. e attal., Sao Paulo: Matheiras, p 465/466. ADPF n° j73- Rel. Min. Carlos Britto 22 wo Tp © aoa . oa eee Bee eeer eee >? No Ambito do servico piblico, o direito a livre associagao sindidak¥ 2° nao era assegurado ao servidor pablico civil. Contudo, a partir da Constituigao Federal de 1988, esse direito Ihe foi conferido, expressamente, pelo art. 37, V1, revogando-se as disposigGes infralegais em contrario. ‘Ao tratar do tema, Alexandre de Moraes'? destaca que “o constituinte adotou tendéncia moderna em relacdo aos direitos sociais consagrada na Convengiio 87, da Organizagéo Internacional do Trabalho, sobre Liberdade sindical e Protegdo do Direito Sindical, e Convengao 151, de 1978, que trata da Protegdo Especial ao Direito de Organizagao e aos Procedimentos de Determinagéo das Condigdes de emprego na fungdo Publica”. Essa tendéncia inovadora trouxe novos paradigmas que nio comportam a proibigéo contida no inciso XII do art. 243 da lei estadual, imposta na vigéncia da Constituiggo Federal de 1967, até porque contrétia, também, aos preceitos fundamentais previstos nos art. 5°, incisos XVII, XVIIL, XXL, todos da Constituigao Federal de 1988. Destaque-se, finalmente, ter esse Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Agao Direta de Inconstitucionalidade n° 962, reconhecido, de forma indireta, a liberdade de associagao sindical do servidor pibico, Confira- se: CONSTITUCIONAL. AGAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA LIMINAR. CONTRIBUICAO SINDICAL. DESCONTO EM FOLHA. " Direito Constituctonal, 14" Edigdo, Sdo Paulo: Atlas, 2003, p.331 ADPF n° 173+ Rel, Min, Carlos Britto 23 SERVIDOR — PUBLICO. TRIBUNAL DE CANCELAMENTO, (..). 0 cancelamento do desconto, em folha, da contribuicao sindical de servidor publico do Poder Judiciario, salvo se expressamente autorizado, encerra orientacao que, prima facie, se revela incompativel com 0 principio da liberdade de associacdo sindical, que garante aos sindicatos 0 desconto automatico daquela parcela, to logo haja a filiagdo e sua comunicacdo ao érgdo responsdvel pelo pagamento dos vencimentos. (...) Dessa maneira, fica evidenciado que a proil sindicato ou dele participar nao foi recepcionada pela Constituigao Federal de 1988. VII—DA CONCLUSAO Ante 0 exposto, manifesta-se 0 Advogado-Geral da Unido, em preliminar, pelo néo conhecimento da presente aco quanto ao art. 242, incisos Vile XII, da Lei estadual n° 10.261/1968. No mérito, no tocante aos incisos I e Vi do art. 242 da Lei estadual n° 10.261/1968; & expresso “praticar atos de sabotagem'" contida no inciso XII do art, 243 do mencionado diploma legal ¢ a0 inciso I do art. 179 da Lei Municipal n° 8.989/1979, manifesta-se pelo reconhecimento da recepcao de tais dispositivos pela Carta da Repablica. Por fim, no que tange a expresso “incifar greves ow a elas aderir, ou” contida no inciso VII do art, 243 da Lei estadual n° 10.261/1968 ¢ ao seu inciso XII, manifesta-se no sentido da auséncia de recepgio pela nova ordem constitucional. ADPF n? 173- Rel. Min. Carlos Britto 24 Sao essas, Excelentissimo Senhor Relator, as consideracde§ Qe CoP BD se tem a fazer, cuja juntada aos autos se requer. Brasilia, 23 de agosto de 2009. GRACE MARIA FE 'ANDES MENDONCA. Secretaria-Geralde Contencioso MARCIA aE PSONCALVES DA SILVA Advogada da Unido ADPF n? 173- Rel. Min, Carlos Britto 25

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