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Carrunt Sanpato MutiontanD, A RESPONSABILIDADE CIVIL POR PRESUNCAO DE CAUSALIDADE a7 Giz. Run De Janene 2010) ary » edigao ~ 2009 + edigao = 2010 © Copwright aa Caitlin Sampaio Mudhotfand CAP Brasil Catalogagio-no-fonte, Singicate Nacional das Editores de Livros, RU Mulholland, Catlin Sampaio ‘A responssbilidade eivil por presungio de causalidade / Caitlin Sampaio Maihland, Rio de Janeiro » G2 Ed, 2010. 38p, Incluibibliografi ISBN 978.85.52027-04-8 1, Causalidade (Direito) 2. Danos (Dieeto). 3. Responsabilidade (Diteito). 4. Direto civil. Titulo 08-5157 COU: 347.946 ( titular cuja obra sea fanduentamentereproduzid,divulgads ou de qualquer forma utili- za poder requerer a apreensio dos exemplaresreprsdzidos ow a suspensio da divulgaedo, sem prejnizo da indenizacio cabivel (an. 102 da Lei n® 9.610, de 19.02,1998}, ‘Quem vender, exper vend, ocala, adquitr,dstsbut,tver em depbsito ou wiizar ‘obra ou fonigrama reproduzidos com fiaude, com a fnalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lero dieto ou indirero, para si ou pars outrem, sera solidariamenteresponsivel com 0 ‘contrite, 1s termes cos atigos precedents, respondendo como contafitore istrbuidor en caso de teprodgza no exterior (an, 104 da Lei 3” 9.610098) 'As teclamagies deve setts até nove das a partir da compra e vend com nota fiscal O78, de 1,09.1990) Goterpretagio doar. 26 da Lei Reservados os dretos de propriedade desta edge pela GLEDITORA email: divctorin@edivoragz com.br site: editosge.com br Trawessa do Pago a 23, salas 609,610 ¢ 1.208 ~ Centiw ‘CEP: 20010-170 ~ Rio de Janeta ~ RI “els {ONX21) 2PAU-LADG / 2240-1416 = Tel/Fax: ONX21) 2240-1311 Iimpresso no Printed in Br INDICE SISTEMATICO Isropucho Carinivo 1 ~ 0S NOVOS PROBLEMAS DA RESPONSAB LIDADE CIVIL 1.1, 0 Direito Civil Constitucional ex Repeogramagio da Obrigagio de Indenizat sob sus Orica: da Responsabilidade Civil para a Consirugio de um Direita de Dans 1.2.05 Elemenios da Respansibfidae Civil (Dano, Cupa e Risco « Nexe de Causal) sob o Prisma do Direito Civil-Constiucional e seus Questionamentos Atuais 1.2.1.0s novos danos e sua delimitag 1.2.2. Culpa ersco: a objetivagio da ealpa ea subjetivagae do rseo 1.2.3.0 nexo de causalidade e sua ampliago core ator de alrbuigao de responsabilidade 1.3. Os Novos Princpios Informadores da Responsesilidade Civil 1.3.1. Prneipio di dignidade da pessoa humana: “imdament do diteto de danos 1.3.2. Principio da soldariedade sociale sua fungio distributiva 1.4.0 Nexo de Causalidade sua Dupla Fungo na Responsbilidade Civil Atva Imputagao Judie do Resultado Danoso e Limingéa das Verbss Indenizatias 1.5.6 Paradigm Contemporinen da Responsahiliade Civil e sua Repercussio a Investigagio do Neyo de Causalidae: Pieito de Danos ea Plena Reparagio da Vivi ‘Carinvin 2 0 NEXO DE CAUSALIDADE: CONCEITO E TEORIAS 2.1. Causa e Causalidade: Conceitos ¢ Distingaes Nevessiias 2.2, Alnvestigago Causal. Causidade Material e Cuuslidde luvidice: Problemtices ‘em Torno ds MentitieaSo da Causatidade turin 2.3. Coneausas, Causa Nova ¢ Causa Estranha: Concurso de Causis, ImerFeréncia na Cai Casal ou Interrupgo do Nexo cle Cousahdade 2.3.1, Conecito e clasifcago de concauses. Dist entre concausa inerrpeda do nexo de causalidade 23.2. Inerrupede de eausatidade © concurso de causa 233. Causa nova e caus estan 2.34. Relevdncia da omissto c invest 24, Excludentes de Responsabilidade Civil pela Intestupgao do Nexo Causal Concorténeia de Condutas (ou Fato Concorrente da Vitina) 24.1, Culpa exclusiva da vita (ou fato exclisvo da vtima 2.42. Fato de tercira 3 66 6 %9 88 ” oF 7 105 106 nz na ns 120 as 29 ml CCarrun Samenis Mussionian 24.3, Caso frtvito fovga maior: concurso de conduta imputivel com causa ‘natural inimposavel 2.5 As Teotias sobre o Nexo de Cawsalidade: Aplicagbes Priticase lmportincia Jas Distingdes 2.5.1. Teoria da equivalnea das candigdes (aria dos antecedenies causa ou teoria da casa sine gus non) 2.5.2, Teoria da causalidade adequada 2.53. Teoria do dano direto eimediawe 2.5.4. ‘Teoria do escape de protegio da norma violada 2.55. Teoria da causa eficiente e da causa preponderante 2.3.6, Teoria da cause proxima 253.7. Teoria da imputagio objetiva 2.6 Teoria Causal Adotade pelo Ordenamento Juridica Brasileve, Tendéncias ‘Convergéncia da Teoria da Causalidade Adequada ¢ da Teoria do Dano Direto ¢ Inodiato Coritaco 3 ~ A PRESUNCAD DE CAUSALIDADE: HIPOTESES LEGAIS, DOUTRINARIAS [EAURISPRUDENCIAIS 3.1, Conceita de Presungio, A Presungio de Direto ea Presungio de Pato: Dist Inicinis Necessirins 5.3, Anise da Selego de Casos Jurispmidenciais de Presungio de Causalidade: Tenttiva de Indicagio de Requisitos para a Sistematizacio da Teoria Solidaista «da Responsabilidade Civit 32.1. Dana causado por am membra indeterminado de um grupo: aplicagao da tearia da eausalidade alterntiva 3.2.1.1. Co-autovia edistibuig de responsablidade:causalidade complement (concausa) ecausalidade cumulativa (causas concorrentes) goes 2.1.2, Causaidade altemativa: conceitoe aplicagbes 2.1.3. Fundamentos da responsabilidade coletiva 2.1.4 Requisitos para a responsabilaagao do grupo pela condi danoss de seu membro 22.1.5. Alguns casos brasileicos 32.1.6. Conclusio anos causados por consumo de esto nig sntlico a teoria da Fesponsabifidade por cota de mercado 3.2.3. Danos casas pelo consumo de tabaca: eausalidade rtp, causa preponderante ou inexisténcia de causatidade? 3.24, Danos decorrentes do uso de armas de fox 325. Caso Medonalds 3.2.6. Aifoie Perches responsabilidad civil pela privagio do dieito de nio nascer (wrod life 3.2.7. Dans eausudos pelo consumo de 6leo de canola (acette de cotza) 233. Fandamentos para a Construgao de Uma Teoria de Presungio de Causalilade para © Direito Brasileito: Um Nove Capitulo para 9 Dizeto de Danos 135 bs 139 166 4 79 180) 182 1880 22 23 216 26 ns 2 238 243 257 264 268 a5 os |A Resrowsanitb4nk CIVIL PO PRESUNCAO BE CaU'satiDaDr CCarinuto 4 ~ PROPOSTA DE CONSTRUCAO DE UMA TEORIA SOBRE A PRESUNCAO DE CAUSALIDADE: 0 1UiZ0 PROBABILISTICO DE CAUSALIOADE 4.1. Objetiva clo Capitulo: Sistemaizago de Una Teoria de Presungia de Cause 44.11 Avutilidade da construcao de ums teora sobre presungio do nexo de ‘ceusalidade na responsablidade civil Teoria causal proposta para anilise supesta da nex 4.2.4 Repartigto dos Riscos e 2 Probubilitade Causal: Uns Possivel Abordagem para © Dieito Brasileiro 4.2 Critrios para a Formagao da Cousalidade Presumida: a Probabiide Esitisticn 43:1, Aresponsabilidade civil abjetive:o dane ipico como Fundamemo para a causalidade provivel 4.3.2, Danos difusos: o dana de massa a propa coletvidade e na tempo 44, 0 Novo Direto de Danos ea Ampliagio das Fungdes do Nexo de Cousaidade: ‘Concretizagio da Reparagio lntegral do Dano Injusto 10 dos efeitos danosos na ‘concLusia BIBLIOGRAFIA 281 293 aT 308 35 337 38 9 PrerAcio “Tomnou-se popular a paribola eri porum autor italiano para explicar as recente transfor- rmagdes da responsabilidade civil: um curso de igua,alimentado por uma antiga fonte,atravessa um terrtrio, condicionando sua exploragie eeondmica que, na origem, era fundamentalinente agraria. Quando se daa passagem da economic agricola de subsistencia para um desenvolvimento industrial cada vez mais amp, o fuxo d'igus revelou-se insuficione, Engenheitos entéo foram chamados para construit diques e realizar todo ipa de obras, para bem wilizare melhor distribuirs escassa gua disponivel. Inesperadamente, porém, em virtude da confluéneia de pequenos rivchos eda descoberta de noves fonts, o curso dSgua transtormou-se em un caudaloso rio. Seré preciso chamar de volta ¢ com urgéneia os engenheires, agora para fazer obras ce contengao que permit evitar perigosasinundagbis.! [AS inundagies, de fato, sto ocortendo, como resultado do encontra de demandas socais or muito tempo reprimidas e um instrumental enico ainda mio consolidado ~ lembre-se que Se 6s demas ramos do direto civil slo multimilenares,o dieita da responsabilidade civil, como tal, existe ha pouco mais de um sécu Neste ambiente complexe ~ ou, talvez,hipercomplexo — torn: se cada vez mais dfiil construr uma tse jurdics que seja, a um sb tempo, cientificamente inova- dora e metologicamente fundamentada. Foi este @ desaio que a obra A Responsabilidlade Civil por Presumgdo dle Cansaidade, de Caithin Mulholland enftentou com grande éxito, Presenciamos um momento histrieo ne qual todos os trésconceitos fundamentais da tes Pponsabilidade civil, aqueles formam « tipé so} 0 qual se apovava a dseiplina estio em discusséo, Sobre o dano, consierado tradieionalmente una diminuigao de bem juridico eausada por wn ato ilicito, passa a se exigir que sea injusto pura que sejaindenizivel, como resultado de uma pond. ago dos inferesses em jogo luz dos prinepits constineionais, sob pena de que “a mulipicagio ‘de novas figuras de dno vena a fer conta kinins limites le iid Fantasia do intérprete ea exit 4a jutispruéneia"? Sobre a culpa, tampouico hi dividas de que o elemento se enco ‘mente em crise, nie apenas em Virtade da passagem dla nove de culpa psicolxica para ade culpa ormativa, mas prineipalmente pela intermin cel diseussio acerca de sua supressio nos casos de | Franeesco Donato Busnes, La parabola della responsabiliti civil, in Rivisia Critica di Divino Privaro, 1988, vol. Vid, pp. 642 e segs Stefano Rodota spa Anderson Schreiber. Novas tendéncias da responsabilidad civil brasileira, Revista Frimesial de Direito Civil, ? 22. Rio de Jancita, abeJjun. de 2008, p.60, Carts Samnato Munaon.ane responsabilitade abjetiva,’ como consequencia da aplieago do principio da solidaviedade consti- tuctonal diante de um contexto no qual os “seidentes” tornaram-se esttistieamente previsivels © ares, por mais dligentes que as pessoas possam ser, anos inustos aconte ‘Mas éno ocante-& nogio de nexo de causalidade que reside a dhiima feonteira da responsabi- lidade civil zontemporines Com a refeida objetivagia das hipsteses de responsabilidade civil e ‘o.afastamerto do elemento subjetivo da culpa na anilise da obrigag2o de indenizar,jurisprudéncia «ea cutrina se voltam para este elemento com o objetivo de determinar 2 imputagao da respon- sabilidade, No entanto, esta demanda crescente conjugada & falta de desenvolvimento cientifico do instituto no direito brasileito acarreta uma completa babel de opinides,teorias, subteorias (imdecisdes sobre o conceito de nexo de casalidade, que tormam a inves hor das hipdteses, cm um exercicio de adivinhagao, {AS afigens deste problema, coma demonstra a autora, enconlram-se em um equivoce his rico ¢repetidamente cometido: a erenga de que 0 nexo causal € uma questio de fato, eno de d to, Sem divida, qualquer andlise se inicia pela investigagdo material da eadeia ce eventos weradora do resultado daroso, e esta Eevicentemente fatal, Mas esta anslise produz uma simples indicaga0 «as condigaes que levam ao dano, que deve canduzir em seguida d indicago da condigho do dano que geraa cbrizacto de indenizar, sea ela a necessiria, a eficiente, a preponderante ou a adequada E esta indicago mio é material, de fato, mas juridica, pois se refer selegio daquele a quem sed atibuida a obvi gag3o juridia de indenizar Aqui despomntaa ese da autora: a parti da constatagsio de que a selego da causa que atibw 3 obrigaglo de indenizar costuma ser guada por meio ds adogao do instumento da presungi, sind que no explicitade no devisério, isto €, de uma anise provivel do que ordinariamente acontece, cla busca canstruir, coma imprescinivelracionalidade ~ um nivel de cientificidade que falta este processo heje ~, ums sistematizagao das hipoteses em que se admite a presungio da causalidade © ‘em que se estabelecerd a obsigacio de indenizar independemtemente da prova inequivoca da exis téncia de um nexo de causaidade A fundamentagdo para esta teoria€ impecavelmente construida, A autora inicia pela neces siria reconstrugao do campo da responsabilidade civil como atuslmente um “direto dos danas". A Juz da persaectiva eivil-constitucional, que impde a releitura dos tradivionaisinstitutos de direito civil 4 luz das norms constitucionas, 0 tabalho & guiado fundamentalmente pelo principio da solidariedae social com sun Fungo istriburiva pelo pinespio da dignidade da pessoa humana a justificar plena reparagio das vita. (0, com j se afrmou, a constinicionalizagao do dic igagSo da cause, na me- dos dans impOs a reeitura «4 propria ‘ung primordial da responsabilidade civil: @ faco que tadicionalmente recsia sobre a 3° Paraa exposigio detaada deste prablema remeto a0 avtigo Maria Celina Bodin de Moraes Rises, solidariedade responsabilidade objetiva... Revista das Tibunais, n° 854, S30 Paula, sez. de 2006, pp. 11-37 4 Stefano Rodord, /! Problema della Responsabitita Civile, cit, p. 21. V. ainda sobre o tema Marcelo lunqueira Calisto, A Cilpa nu Respansabilidade Civil: Estura e Fund. Rio de Janeiro: Renovar, 2008; ¢ Frangois Ewald, Foucault, Norma e o Dirwito, 2° ed Vein 2000, Neste sentido, v. Gisela Sampaio da Cruz, O Problema clo Nex Causal na Responsabilidade ivi Rio de Janeiro: Renovar, 2005. A RESPONSABILINADE CAVIL OK PRESUNCAO br CAUSALIDADE xt pessoa do causal do dno, que por sev sto eprowivel deveia ser punidl, destocou-se no sentido dla tutelaespeeia pelo dano causa, preceupacio pertnente ao direito penal, perdeu importincia no dmibito civel ti favor da reparagia da vtims pelos danos soridos: Entre os impactos desta guinada conceitual, ainda em processo de individualizago pela doutrina, esta certamente a teara da presuncan de causalidade desenvalvida nesta obra: em casos hos quais a prova da efetiva causaidade se toma, tal qual eeareta também com a culpa prova tiaholica ~ presents certos pressupostos e em dus hipsteses identificades pela autora, a respone ‘abilidacle objetiva © 0s danos de massa ~a Ferrarenta dla pesungio ce eausalidade possibilitaria. a realizagao da obrigagao de indenizar quando, em outras oportunidades, seria negada, Trata-se de solve lebrica que possbilita 4 vitima de uri dano injusto ser vessareida ainda quando exista o eventual impedimento processual do dnus da prova que no Ihe permittia a realizago inequivoca A prova da relago de causalidade Para atibuir& formatagio adequada s tl teova, a autora passa antes por minucioso exame {bas nuerosas teorias existmtesacerea do nexo de eausidal, examinanda semelhangase dife- engas, estruturaise funcionas, tanto as explicitas como aquelas que restam oeulas pela termina Jogia adgtada pelos seus defensores. A sua analise clas reoris ~ como oeorre em toda comparagao metodalogicamente organizaca ~ demonstra como certas semelhangas sio apenas feticias, pois snuladas por diferengas reais, enquanto anélogos resultados priticas es!20 aeultes por formas di- versas.’ Assim a autora encontra ne teoria da causalidade adequada, amplamente consagrada em ‘ssa doutrins, 0 focus para a anise probabilistica do evento danaso, pois seu fundsmento & a ‘egularidade causal, sto, detenmina-se que um evento danoso & consequénein de urna dada tiv dade porque ¢ dela efeio provivel, espera ou razodvel,em uma andlise referida abstatamen A obva revela como a presuneao do nexo ji est presente em doutrin ejurisprudéncin, em ‘bora sem 4 motivagao racional necessiria par su aplicagdo, Sempre com o evidado de vinculara ‘eoriafrealidade conereta, «autora indiea diversos exemplas da chamads causalade alternativa nos quais um memo (indeterminedo) de um grupo (determinad) causa um dan. £ o conocido ‘cso do carro alegérico “Os Cagadores”, em que dentre um grupo de pessoas fantasiadas e com «spingardas representando a cena de eagadores da regido, ao disparar para atingir pombas langadas 80 ar, um dos tos angi @rosto ce ura dos nbservadores do desile que solrew danos graves: na iimpossibitidade de identificar de qual arma fora disparado otto, todos os acupsntes responderamn pelo dono, ranida vitina do dno injusto, que merece ser reparedla a punigao de agente "Aborla ainda os casos de danos causacos pelo consumo da droga antabortiva DES ~ que, ianie do fato de ter sido inserida no mercado por diversas eompanhias Farmacia, foi resolvido ‘0mm a. aplicago da teria da responsabilidade por cota de marca (avarker sare Habis) dos ‘usados pelo consumo de tabaco; danos decerrentes do uso de armas de fog0; danos decorrentes {40 consumo de fast fod, danos eausados pelos consumo de leo de canola € até mesino ano lecorrente de ter mascido ~o amplamente dilandiceaffaie Perruche. 6 M.C. Bodin de Moraes, A constitueionalizagio do drcito civil e ses elites sobre a respon sibildade civil Divito, Estado e Sociedade, n” 29, Rio de Janeiro, jul/der. de 2006, pp 233.258, 7 Lal. Cons 800, If Metod Comparativo, 2 ed, Torino: Giappichelli, 2000, p. 228 [A partir desta rica pesquisa, @ autora pide elaborar sua propria teoria acerca da presungao de causalidade, estabelecendo pressuposis erequisits para sua aplicagdo, Recorre ao mecanisma do cileulo de prababilidade estatstica: exquanto a probabilidacle ligiea nao taballha com eleulos ‘matemiticos, mas com a andlise [bgieo-dedutiva por parte do magistrado acerca do aeontecimento ~¢,portanto, nlo oferece nem admite qualquer ipo de racionalidade a nao ser a confianga no bom ‘senso do juiz a probabilidade estatistica ter como fundamento a andliseestatistica de acontect ‘mento de determinado evento tomanda como causa a existéneia de hipsteses semethanles (e em sande niimero} de onde se pode inferir 0 aconteciment. 0 uso desta técnica permitir 20s aplicadores do Dirito a obvengio de resultados muito aproximadios 20s que seriam verdadeiramente aleangadls, e480 fosse possivel a confirmagio em pirica do resultado revelado, Por conta disso, x autora afirma que a eigncia estatistica admite que sedetermine na responssbiidede civil, om um grau de certeza elevado ~ ainda que nfo absoluto =, que uina determinads atividade ou conduta & causa de apontado dana, devido a sua incidéncia ‘ob propensto para geri-o. Contanto, é ela, que seja possivel aa magistrado ter acesso a dados cientifcos suficientes para que se posse provar que determinado dano ¢, dentro de uma série de ‘eventos semelhantes, estatisticamente provivel e, portant, dlecorréncia esperads ~ ainda que nfo «cera € exclusiva ~ de determinada atvidede ou conduta ‘A teoriaconstruida nesta obra sugere uns hipateses sugeridas parn a admisso da presungio de causalidade: a responsabilidad objetva os dans de massa, Na responsabilidade civil objetiva a atividade perigosa € inerentemente danosa, assim se pode identificar a probabilidade de dans tipicos assaciados as atividades de isco objetivamente jimputadas e, portanto, obter-se um juiao probablistica da causalidade. Nesses casos, portant, conclu! a autora que a presungio de causalidade seria decorvente de uma investigaga0 mio da propria eausalidade, mas da caracteri2agio do dano e de sua qualificapio através de uma tipicidade en) relagfo 8 atvidade desenvolvida. A.andlise esttistica se fundara, asim, na impossibiidade objetiva da prova do nexo de causalidads, na acoreéneia do desenvolvimento de atividade arrisea- «dae na veriieagio de dano tipicamentesssociade a atividade realizada, ‘Hi em relaedo aos anos difusos, asua propria configurago como dno que atinge ineresses ‘ransindividuais ~ isto &, interesses compartithados por uma eoetividale de pessoas, o que indica a naturezasolidarista da responsabilidade que advém da sua violagio~ ja permitiria a utlizagao de umn causalidade suposta. Ua vez que os danos difsos so geralmente eausados por uma varie- dade de stores (mmuliplicidade causal geralmente indefinida),alingem uma vatiedade de vitimss, também indefinidas ou indetermindveis, cuj resultado, em geral grave, dissemina-se no tempo e nn expago, lesionando a integridade psicnfisies das pessoas, conclu autora que, através da ago coletiva, a pesquisa do nexo de causaidade deve ser Rexibilizade para possibiltar a responsabil zag dos sueitos indeterminados virtats eausadores dos dans. ‘Como se vé, a teora elaborada por Caitlin Mulholland tem incontiveis mértos,sendo muito ‘bem sucedids na racionalizaglo de eritéios e na sistematizagio de requisitos¢ pressupostos com vistas tentarescapar da jstiga do "Khadi (otérica) no mbito a responsabilidad civil. No en tanto, seus méritos maiores, aqueles que devem ser imitados por pesquisidores mais jovens, esto subjazentes ¢ nito vém explicitados no corpo do trabalho porque foram os fundamentos sabve os ‘quis tese pode repousit: Por isso os infico: 2) aimpreseingibilidade da contensuaizagao espago= ‘temporal na construgto tedica, com a eensciéncia de que o drei é cultura e, portanto, é histrica © geograficamente situado; 6) 0 enorme valor das provas trazidas a0 process, a demonstra, com {odas as leas, que a maior potencalidade para a transformagio do dieito bem com, potato, da soviedade toda, pertence muito mais i ctiatividade do advagado do que a0 labor do magistrado ou A REStPNSABILIDADE CIVIL POR PRESDNCAD DE CaUSALIDADE xu json) uo tempo de cc torn pel oi a pure dor cocsos, tegen amas (giipmeris de atondae on co gents do D esto ea pesson, pois jee papel da tte de jag ox cos ieee que to cessam de surg; Com efi, em um ordemsment como trae, doutins bem pode fzeras vers du quale hcl do ju de gue fal Ronald Dian Permit conelircom une pequen ememorao, enievsa sled anion para olssas de nig cetfca ma PLC. pare um projea que oven sobre eater punitive So aro moral, made 10 anon Naguele proceso sreceu uma moga Que imagine! er no Iugar era, nto spent pel bles pelo ana. ple pore, mas prneiplmene pla angie Cela sep aan. Ao ald enti, supe pela espos, esa pronta pas chamaroeaddlo segue quand lame erpntou poeria acre eS mis uma coer Nasi extvaris emp, natn pequena lina read alr ene reas esas ho nada dees i eansda, respite fo, lei ano de ses alts (er par sina) ¢ tie “mand Baio, coro que fz ua contd, la avn Sab eu 10 ape nada porresponabidade civ Se hn frum estan, chegl pena ma hoe funioa lags, noua vga, mina conan mini admiiloc amiadee desde endo, vem, sitencarete Comprovend qo susianios vendita era els ples além de trabalhar para auxiiar © magistrada na cada vex mais dura Rio de Janeito, 2 de tevereino de 2009 Maria Celina Bodin de Moraes Professora Titular de Direito Civil da Faculdade de Dieta da UERS € Professora Associada do Departamento 4d Direito da PUC-Rio, InTRODUGAO Um direto 56 6 efetvo quando a sua vealizacdo, a suo prat- cabilidade 6 asseguradar nao ter direto, ou tendo, ficar na ‘esponsabitidode de fazé-o triuner,sdo uma coisas Em artigo publicado ha poucos anos, os Professores Alex Stein e Ariel Porat, examinando trés casos paradigmaticos julgados pelos tribunais ingleses ino inicio deste século," afirmam que hi, hoje, uma tendéncia irreversivel de flexi- bilizagdo da clissica abordagem dieotémica efetivada pelos magistrados quando da investigagao da causalidade. Sabemos que, por meio da tradicional andlise causal, é obtida uma das duas solugdes, alternativamente: imputa-se a totalidade dos danos sofridos a um de- terminado agente ou libera-se 0 réu desta obrigagaio (the winner takes all) A escolha por uma destas duas posigdes (denominada binary approach) depende exclusivamente da capacidade — ou ineapacidade ~ da vitima do dano em fazer a prova da existéncia do liame causal eonectando, assim, os danos por ela sofridos 4 atividade ou conduta que atribui como sendo a causadora da lesiio, 1 Estes casos foram julgados entre 2001 €2003 e tratam de hinéteses de eausilidade altrnat va ow indeterminads. Séo os seguintes: Holby versus Brigham & Cowar (Hall) Ld (Court ‘of Appeal); Allen versus Britsh Rail Engineering Lul(Court of Appeal); Fairchild, ef at versus Glenhaven Funeral Services Ld ea. (House of Lords). Poaat, Ariel; Stein, Alex Indeterminate Causation and Apportionment of Damages: an essay on Holby, Allen, and Fairchild, Oxford Journal of Lega! Sudies, vo 23, n* 4, Winter, 2003, pp. 668-670, Sobre a cusaidade altemativa, voltaremos na Capitulo MH, iter 3.2. Excegao a esta negra se di em casos de concausalidade da vtima (o chamado fato concor- renfe da vitina), em que, por conta da concorréncia de sua condita na causagie do dana, ‘mitiga-seo valor da indenizagzo devida pelo réu baseano-se o juiz.ma contribuigfo causal ‘ou na divisto equitativa dos danos, Sabre este tema voltaremos no Capitulo I, ters 2.4.1 2 CAITLIN SAMPAIO MULHOLLAND ‘Fodavia, o resultado alcancado pelas decisdes inglesas em referéncia nfo seguiu esta orientacao bindria do tudo ou nada, sendo por isto consideradas re- volucionitias.? Por meio dos decisorios impds-se a obrigagio de indenizar a0 réu, ainda que ao autor da ago (vitima do dano) nfo tenha sido possivel realizar as provas imprescindiveis da existéncia da causalidade juridica, tal como tra- dicional mente se esperava. Calcadas tanto no prineipio da precaugio, como no da justiga distributiva (como decorréncia do principio da solidariedade social), decidiram os magistrados pela procedéncia das agdes indenizatorias em conside- raga & vitima pelos danos injustos por ela softidos. A estas vitimas foi determinada uma indenizagao cujo quantum foi calcula- do com base na probabilidade estatistica dos riscos das atividades desenvolvidas pelos réus de gerar 0 dano objeto da agao: cada réu, provavel causador do dano, obrigou-se a indenizat as vitimas de acordo com um céleulo estatistico de pro- babilidade de dano por meio do qual se estabeleceu o percentual devido sobre resultado total da lesio. Como a vitima nao foi possivel, objetivamente, realizar a prova de que o dano que softeu foi decorréncia necesséria e preponderante de dada atividade, 0 magistrado presumiu a causatidade tomando como base para esta formulagio 0 fundamento da repartigo de riscos e de internalizagao dos seus custos por aquele que tem a melhor eapacidade para evitar os danos.* A cau- salidade, entes inequivocamente determinada, passou a ser delimitada por meio a probabilidade, avaliada através de critérios estatisticos e légicos. Esta singela divagacdo comparatista serve para introduzir 0 debate que se pretende travar neste livro, qual seja, o papel do nexo de causalidade na respon- sabilidade civil atual como fator objetivo de imputagao de danos* e sua presun- G40 em situagdes tipicas de causalidade indeterminada, nexo de causalidade, elemento formal da obrigagdo de indenizar, tem se evidenciaco, tanto na doutrina contemporanea como na jurisprudéncia mais atual de nossos tribunais, como elemento, no Ambito da teoria da responsabilidade Ponar, Atel: Sry, Alex. Op. ch, 9 669. Ponar, Ariel: Sram, Alex. Op. cit pp. 670-672, Conirposta ao conceito de later objetivo de imputagio de danos, em que ndo se invest «4 conscigncia subjetiva acerca da reprovabilidade da conduta, encontia-se a tadicio- nal acepeo ce imputaglo ow impucabilidade ulilizada tanto pelo Diteito Penal como pela Responsabilidade Civil clissica para designar “o conjunta de condigdes pessoais que dio ao agente capacidade para poder responder pelas conseqiéncias de uma conduta contritia 420 dever; imputivel € aquele que podia devia ter agida de outro modo”, Cayauient Fun, Sergio, Programa de Responsabilidade Civil, # ed, Sio Paulo: Malhirys, 2003, p. 45. A Responsatitipane Civil ron Presuneao be CausALiDAnE 3 civil, dos mais controvertidos e complesos. A nog chissica ~ e até simplista — de que um dado efeito deve ser remetido a uma causa determinada, traz con- sideragdes da maior relevancia para o direito privado € mantém um cardter de atualidade que se renova através das diferentes teorias fundamentais da respon- sabilidade civil.® Concomitantemente, a doutrina da responsabilidade civil se vé atormentada por novas questdes que geram perplexisdade na comunidade juridica e trazem como conseqiiéncia uma necesséria reformulagao das bases do sistema juridi- co, importando no desenvolvimento de novas visdes sobre velhas ¢ engessadas regras.’ Uma das revolugdes mais aguartadas ~ e finalmente positivada no art 927 do novo Cédigo Civil - foi a consolidaco de um sistema geral de responsa- bilidade civil embasado em um duplo fundamento: a culpa, tradicional elemento subjetivo na configuragao da obrigagao de indenizar;e o risco, paradigma fun- 6 As teotias subjetiva e objetiva da responssbilidade civil diferem em relagio & necessidade {de prova do elemento subjetivo ~ culpa para que se configure a obrigagio de indenizat. CContudo, a prova do nexo de causalidade was das ainda & realizada de forma semelhante, ‘havendo, no entanto, uma tendéneia ainda incipiente de tratamento diferenciado de sua pes- uisa, Sobre o tema, remetemos o letor& cbra de WioLante, Andres. Responsabilia ogget- ‘iva e causal flessiile, Napoli: Edizione Scieatfiche Kalen, 1999, 7 Marat, Ignacio de Cucvillas. La Relacion de Causalidad en fa Orbita del Derecho de ‘Daitos, Madr: Tiant lo blanch, 2000, p. 35, enumera algumes perplexidades que eeream a teoria da responsabiidade civil, Assim, "Lv s6lo se desconcocen sus actuales fundamentos ¥ limites, sino que también se ignora las funciones que ella debe realizar en la sociedsd de hestro tiempo. Solo hay que castigar al culpable de una fall? Debe limitarse el derecho de ‘daios a promovere incentivar a diligencia de los eiudadanos? Que papel ocupael riesgo yet lucto de la sctividad peligrosa en la atribuicién de un determtinado perjuicio? Debe repararse éte con total independencia de! factor subjetivo?”. Essas ponderagSes sto, de fat, univessas © perpassam as pesquisas atais no Direto de Dans em todos os ordenamentos. Sobre uns visio acera da teoria da responsabiidade evil no Directo francés aa, ver, por todos Vinev, Genevieve & Jovanan, Patrice. Droit Civil: Les Conditions de la Responsabilite Civile, Paris: LGDJ, 1998. No Direito italiano: Viswri, Giovanna. Tratado de fa Responsabilidad Gin, vols. 1M, Tred. Aida Kemelmajer de Carlueci, Madrid: Astrea, 1999. No Direito expanhol, DiezPiesz0, Luiz. Derecho de Daits, Madd: Civitas, 1999, No Diseito port ‘gues: Pensuta Costin, Francisco Manuel. OProblema da Caso Virtual na Respensebilidade Civil, Coimbra: Almedina, 1998. No Direio alemdo: VON BAR, Christian, The Common European Law of Tors, vols. 1 € 2, Oxtord: Claredon Press, 1998, No Direito Argentino: Atte, Atilio Anibal, Derecho de Datos» Otros Estudios, Buenas Aires: La Ley, 1992, (Chegou-se a considera, em époeas io to remotes, que sem culpa no haveria responsabi- Tidade civil, Neste sentido, Vow sens sustentava: “sem culpa, nenhuma reparagio”. Apu ‘AouraR Diss, Josée. Da Responsabidede Civil, Rio de Janeto: Forense, 1997, val. lp. 8. 4 CAITLIN SAMPAIO MULHOLLAND damental nos dias contemporaneos em que se evidencia a proliferagaa ¢ a anoni midade dos danos através da exploracdo de atividades potencialmente danosas. De fato, discutem-se e alteram-se os fundamentos da responsabilidade civil na medida em que se vive atuslmente a chamada “era do risco”? A revolugdo tecnol6gica, 0 ripido desenvolvimento da engenharia genética, a massificagio das relagdes sociais e contratuais so elementos que se unem para potencializar as causas de dano e que trazem novas luzes sobre a teoria da responsabilidade civil ‘Ao mesmo tempo, é cada vez maior a preocupagao em prevenir, no sentido de tentar evitar o dever juridico secundério de indenizar os danos causados, na medida em que estes esto se tarnando, em grande medida, coletivos, qualita vamente mais graves ¢ andnimos, Esta nova realidade juridica busca sua justifi- cativa na constatagao de que a responsabilidade civil contempordnea sedimenta como seu principio maior 0 principio da precaugio,"* ao lado dos prineipios da solidariedade social e da dignidade da pessoa humana. Neste sentido, a reformulagao dos principios e paradigmas da responsabili- dade civil, através de uma ética civil-constitucionalista, na qual se passa de uma Para Ulrich Beck, um dos tedricos da péssmodernidade e sesponsivel por ter eunhado 3 cexpressio sociedade de isco,“ 08 confitos da distribuigdo em relaglo aos “bens” (ren- «la, empregos, segures social), ue consttuiram 0 confito bisico da sociedade industrial clissiea e conduziram is solupdes tentadas nas instituigdes relevanes, so encobertos pelos conflitos de dstribuigo dos ‘mileficios’. Estes podem ser decodificados como conites de responsabitidade distibutiva, Eles jrompem sobre © modo como 0s riscas que seampa- ham a produgdo dos bens (megatecnologia nuclear © quimica, pesquisa genética, a ameaga 10 ambiente, supermiltarizagio © miséria crescente fara da sociedade industrial ociden tal) podem ser distribuidos, evitadas, conteolados e legitimados”. Breck, Ulich; cipoens, Anthony & Lash, Scott, Modervizagdo Reffexiva: Politica, Tradicdo e Estetica ma Ondew Social Moderna, Sto Paulo: UNESP, 1997, p. 17. A “era dos riscos" &, portant, a era da ‘anonimidade de danos e da socializagdo da responsabilidade civil a partir da nogio de jus- tiga distributiva e do principio constitucional da solidariedade social. Sobre este prinipio, ver no Capicul I item 1.3.2 9 Segundo Vine, Genevieve & Kounusky, Pattick, Le Principe de Précaution, Paris: Odile Jacob, 1999, p.12,"[Ife principe de précaution ne dot pas de interprété comme une recom ‘mandation systématique c’sbstention. A Vinverse, et méme s'il n'est pas toujours pergu de txtte maniére parle public, il doit re entendu comme une ineitation & Paction. Ao dicton, “dans fe doute abstiens-oi, le ocincipe de précaution substirve Pimperatif: “dans le doute, ‘mets fout en ouevre pour agir au micux", (Trac: “[a] principio da precaugao mi deve ser imterpretado como urna recomcndagio sistemtica de abstengdo, Pelo contririo, ¢ mesmo io sendo ainda percebido desia maneica pelo pibtico, deve ser entendido como une in- citagio a ago, Peto ditado, “ns divida,abstenta-se",o prineipio da precaugo substitu 0 imperative: “na dvds, faga tudo para agir da melhor maneiva possivel”) A Resronsaaiiapane Civit rot PRESUNCAO DE CAUSALIDADE 5 visto individuatista do diteito civil & uma 6tice personalista, 0 ponto fuleral deste livro. A percepgio de que a vitima do dano néo pode ficar irressarcida e, 29 mesmo tempo, a preocupagdo com a proliferacdo € a anonimidade dos danos, reitera a importincia acerca da precaugdo e reparagao de danos."" Dentro desta nova realidade, fica evidente que a mudanga do eixo para- digmatico da teoria da responsabilidade civil ~ da culpa ao risco ~ traz. como conseqiténcias a necessidade de se pensar novas formas de responsabilizar. Alem disso, percebe-se que 0s elementos que informam a obrigagao de indenizar ~ cul- pa, dano € nexo de causalidade ~ precisam ser reformulados com base nestas novas perspectivas A figura do ofensor, antes prioritaria na responsabilidade civil, no sentido de identificar 0 “culpado” pelo dano, abre espago a consideragao da pessoa do ofendido, que deve ser indenizada por ter softido um dano injusto. Busca-se desta maneira novas formas de se possibilitar a efetiva reparagao dos danos, seja através da adogao do principio da solidariedade social como norte da responsa- bilidade civil, seja através da utilizacdo de presurgdes, cada vez mais fregiientes, no sentido de facilitar este ressarcimento. Assim é que a propria nogao de nexo de causalidade, objeto deste livro, se vé reestruturada com vistas a permitir a efetivacao do prinefpio da reparagio integral, isto é, a de que todo dano injusto causado a uma pessoa deve ser ressar- ido. Este livro tem como objetivo primordial analisar 0 novo papel do nexo de causalidade na teotia e pritica da responsabilidade civil e a sua importancia no estabelecimento da obrigagao de indenizar. A percepeiio de que 0 liame causal é consicerado como o centro gravitacio- nal da responsabilidade civil promoven diversos debates acerca de sua fungio basilar na teoria do Direito de Danos, O seu papel clissico de ligagdo entre 0 dano ¢ a ago, omissdo ou atividade desenvolvida, abre espago diante de novas consideragdes praticas, Esta disposi¢ao inovadora do nexo de causalidade sera contextualizada em determinadas hipteses do.trinérias e jurisprudenciais em ‘que se evidencia claramente a busca de suas novas fungdes dentro da teoria da responsabilidad civil. E neste sentido que se pretende problematizar uma relevante questo acerea do nexo de causalidade: aquela que trata das presungdes do nexo de causalidade, 1 Marroa, nacio de Cuevillas. La Relacvn de Causatidad, op. itp. 36, assinala que “fs ‘nueva realidad social, con su exigencia ce defensa de Ia persona, reelama una respuests tenga por objetivo, no ya castigar los comportamientos negligenes, sino que las wietimas ‘engam un patrimonio que responelera de los datos acaecidos ‘em que a >robabilidade substitu o elemento da necessariedade para se estabele- cor a responsabilidade civil. Significa dizer que no ordenamento juridico brasilei- / roestao presentes os elementos para que se adotem novos posicionamentos acerca do papel co nexo de causalidade, justificados através da utilizagao dos prinefpios da reparagao integral e da precaucto, e embasados nos prineipios da dignidade da pessoa hunana (art, 1°, Il, da CF) e da solidariedade social (art. 3°, 1, da CF). PropSe-se, portanto, que a anzlise das presungdes se dé através da especi- ficagdo e justificacdo de hipéteses de responsabilidad civil nas quais exista no ‘mais uma.certeza.em relagao ao liame causal, mas uma probabjlidade quanto 4 ocorréncia clo dano, Exemplificando esta hipdtese, poder-se-ia apontar a chama- da responsabilidade coletiva, na qual existe a impossibilidade de prova direta da causa do dano, mas onde se estabelece uma presungdo no sentido de que o dano adveio daquela coletividade, por conta das circunsténcias especiais que ceream a ocasitio do dano."? Para finalidade de construed de uma teoria sobre a responsabilidade civil Por presungao de causalidade, dividiu-se o livro em quatro capitulos por meio dos quais se pretende identificar e demarcar nao s6 a sua importéneia teérica na atualidade como também 2 motivagao pritica em torno da escotha do tema, No Capitulo 1 (Novos Problemas da Responsabilidade Civil), busca-se delimitar a fundamentagao ideolégica e metodoldgica do livro, localizando os principais de- bates em foro do novo Direito de Danos. Através da andlise social histérica da responsabilidade civil pretende-se revelar o novo paradigma que serve de vetor interpretativo das escolhas doutrinarias e jurisprudenciais, qual seja, 0 principio da solidariedade social, Neste capitulo, portanto, trataremos do giro conceitual que a responsabilidade civil sofreu no século passado — do ato ilieito a0 dano injusto - >0r meio da andlise dos elementos da obrigagio de indenizar (dano, culpa, riseo e nexo de causalidade) e de sua nova concepeio, conseqiiéneia da consideragiio da necessidade de busear-se @ reparagao do dano softido e niio mais a eulpabilizagio pela conduta danosa. Para que se alcance este escopo, foram selecionados certos principios que servem de embasamento valorativo para a opgio ideolégiea da investiga- 80 do Direito de Danos através da aplicagao da metodologia do Direito Civil Constituc onal, Sio estes: 0 principio da solidariedade social, por meio do qual se evidencia a ebrigagdo de reparar o dano ainda quando nao possa ele ser referi- do a uma conduta culposa, mas sim a acontecimento derivado de uma atividade getadora de riscos; ¢ 0 principio da dignidade da pessoa humana, na condicdo de 12 Sobreeste tema, votaremos no item 3.2.1 A RESPONSAUILIDADE CIVIL FOR PRESUNCAO DE CAUSALIDADE 7 cliusula geral de tutela da pessoa ¢ como justificador das selegdes interpretativas que visam a ampliagao das possibiliclades de reparagio de danos."” Neste capitulo ainda, sto apresentadas as fungdes que cumpre 0 nexo de causalidade na moderna teoria do Direito de Danos e a indicagiio da necessidade dé ampliar o escopo de investigagao do liame causal como forma de garantir a reparagdo dos danos injustos. Isto é, peroebe-se pela analise da reformulagao dos demais elementos que compdem a obrigegao de indenizar que 0 nexa de causa- lidade deve também ser reinterpretado para alcangar os objetivos da responsabi- lidade civil contemporanea, No Capitulo II ( Nexo de Causatidade: Conceito ¢ Teorias), seraa indi- cados 0s conceitos de causa e causalidede e determinada a sua relevdncia na imputacao de responsabilidade. Serao também exploradas as teorias da causa- lidade mais usualmente aplicadas pela doutrina ¢ jurisprudéncia patrias —lequi- valencia das condigdes, dano direito e imediato e causalidade adequada;— com 0 objetivo de identificar aquela que melhor se adapta ao juizo probabilistico da causalidade. Por se tratar de capitulo eminentemente tedrico, a proposta para 0 seu desenvolvimento & a de examinar a jurisprudéncia de forma a sistematizar 0 entendimento dos magistrados. Por meioda analise dos conceitos de causalidade complementar, cumulativa e alternativa, demonstraremos a tendéneia que surge ainda incipiente na jurisprudéncia no sentido de presumir-se 0 nexo de causali dade por meio do exame da adequagao de causa e da probabilidade lgica de que uma determinada atividade vena a gerar determinado dano. No Capitulo Il (4 Presunedo de Causalidade: Hipdteses Legais, Doutrindrias e Jurisprudenciais), serao abordadas, através de uma anilise ca- suistica, as hipéteses legais, jurisprudenciais e doutrinarias em que se evidencia 4 presungo do nexo de causalidade. A selec destes casos ~ alguns dos quais tratados pela jurisprudéncia de outros paises, como Estados Unidos e Espanha ~ foi realizada de forma a possibilitar a observacio e sistematizagdo dos critérios que'sio utilizados para a concretizacao de um juizo suposto de causalidade, As hipoteses retratadas nestes casos sio semelhantes em pelo menos dois aspectos 1a caracterizagao da impossibilidade de provar-se a existéncia do nexo causal ~ denominada de hipossuficigneia probaléria ~, seja por conta da existéncia de Conforme veremos 30 lo do Capitulo a tela da dignidade da pessoa humana e de suldade, da Tiberdade, da integridnde e ea solida- su sata sxc (pie de rede) importa nu ami das ip ees de danos infil aja vist ech Conti onal, personalist, de prote jet ‘ama en carter prorititio em relagao quelas patrimaniais, 1 des Siuagies su is existenciais da pessoa hue causalidade alternativa, seja por conta de incapacidade objetiva de prova; ¢ 2 opcdo do julgamento por meio da utilizago da presungiio da causalidade, em evidente consideragao da necessidade de indenizar-se a vitima do dano injusta- mente sofrido, Estas conclusdes so utilizadas no Capitulo IV (Proposta de Construedo de uma Teoria sobre a Presuncdo de Causalidade: 0 Juizo Probabilistico de Causatidade) para formar a base de construgio de uma teoria acerea da pre~ sungdo de causalidade. Neste capitulo derradeiro sao indicados os pressupostos para a investigagao probabilistica da causalidade e estabelecidos os critérios para que este exame se torne adequadamente viivel. Conclui-se que esta investiga- ¢gio probabilistica pode ~ ¢ deve ~ efetivar-se, sempre que houver a necessidade de estabelecer-se a obrigagiio indenizatéria — por conta da verificagao do dano injusto ~ e nao for possivel a atividade jurisdicional localizar a ligagio causal Juridicamente, Surgem, desta constatagao, duas formas de identificagdo suposta do nexo: a andlise da probabilidade estatistica e a andlise de probabilidade logi- ca, Permitem estes dois instrumentos, especialmente 0 primeiro, a constituigaio _/ de uma teoria da causalidade presumida que identifica a existéncia — ainda que suposta — do nexo através da qualificacdo da atividade desenvolvida como arris- cada e do dano softido como tipico desta atividade. Esta nova forma de delimitagio do nexo de causalidade sugere, a principio € numa investigagdo superficial, uma ampliagio demasiada das hipdteses de da- nos ressarciveis, o que no seria recomendével neste momento histérico de and- lise mais restritiva das fungdes atribuidas ao instituto da responsabilidade civil De fato, a responsabilidade civil vem sendo cada vez mais criticada pela sua apli= cago como panacéia de todos as males sociais que afligem determinado ordena- mento. A busca de uma verdadeita identidade para o instituto leva & necessidade de revisio de suas fungdes ¢ de limitagao de sua aplicagao como iiltimo recurso Juridico © no como o primeiro, 0 que comumente ocorre hodiernamente, Antecipa-se, contudo, que a hipétese retratada neste trabalho nao busca a ampliacdo das hipdteses de dancs ressarciveis, Ainda que indiretamente esta pos- sa ser uma das conseqiiéncias pessiveis da presungo de causalidade, o desenvol- vimento do livro visa, dinica e exelusivamente, ao atendimento do principio da Solidariedade social e da reparagdo integral dos danos injustamente softidos e, ‘que de outra maneira, restariam irressarcidos. Por isso, reconhecemos que a conclusio que se busca neste livro pode so- frer alguma dificuldade para ser aplicada pelos tribunais brasileiros par conta de sua complexidade, Dois motives nos levam a esta conclusao: primeiro, porque 4 presungio de causalidade que se advoga neste livro é baseada na probabilida- de estatisticamente comprovada, o que geraria a necessidade de utilizagaio de A Resronsauitioabe C1vil POR PRESUNCAD DE CAUSALIDADE ° peritos e estudos que complexificam a decisdo do magistrado; segundo, porque 1 pesquisa da causalidade nunca foi realizada de forma sistemstica por nossos tribunais, sendo sua andlise fruto muito mais de indugdes do que de raciocinio Gr pre, ps, qu com exe peer paso em depo could pe sumida possamos permitir uma discuss acerca do tema e uma eventual sis- tematizagao deste elemento tio essencial & responsabilidade civil que é 0 nexo causal, as vezes telegado a um segundo plano. Caprituto 1 OS NOVOS PROBLEMAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL [Naxda é permanente, salvo a muckonga, Heedcio Sumimio: 1.1. 0 direito civl-constitucional ¢ a eprogramagio da obrigagao de indenizar sob sua ética: da responsabilidade civil pars a construgio de um dieita de dans. 1.2. Os elementos da responsabilidad eivil (ano, culpa, risco e nexo de causalidade) 3 o prisma do diteitocivil-constitucional¢ seus {questionamentos tunis: 1.2.1. Os novos danos e sus delimitagae; 1.2.2, Culpa Fico: a objetivacio da enlps € a subjetivago do rseo, 1.2.3. 0 nexo de cau slidade e sua ampliagso com fator de ateibuigdo de responsabilidade. 1.3.08 ‘novos princpios informadores da responsabitidade civil: 1.3. Principio da problema da responsabilidade eivil deve ado como uma simples relagdo patrimanial regulada pela idia de concordancia entre o fato € 0 dano" (Lina, Alvino. Culpa e Risca. Op. ci. p. 156). O Codigo Civil Brasileiro adota a responsabilidade do ineapaz como espesie de responsabilidad subsididria no artigo 928 ("0 incapaz tesponde pelos prejuizos que causa, se as pessoas por ele responsiveis no tiverem 8 obrigagao de faz-lo ou nio dispuserem de meios suficientes”), | | | A ResronsanitiDaoe CiVi, nok PRESUNCKO DE CausaLinADE a que, em siltima instancia, estar-se- responsebilizando uma pessoa pelo. dano ionado diretamente por outra, sem que haja ai uma imputagdo direta. iA imputabilidade refere-se a um elemento sutjetivo de possibilidade abstra- ta de reconhecimento social do ilicito ou do reprovavel, independentemente de gua previsto expressa, A contrariedade ao Direite, enquanto elemento objetivo a nogao de culpa, ¢ requisito que deve ser avaliado tanto concretamente, isto &, fem relacao & violagdo direta de uma regra (por exemplo, a0 cometer um homici- dio, ipifica-se a conduta prevista no artigo 121 do Codigo Penal), como também fbstratamente, analisando-se os principios © valores de determinada sociedade ea sua capacidade de sanedo — e, portanto, responsabilizagiio ~ ou superagio ~ excluindo a responsabilidade — daquela conduta examinada, [Em relagao a este dltimo requisito, qual seja, o da necessidade de contrarie~ dade ao Direito, nao existem grandes questionamentos. A obrigagao de indenizar existe justamente para repor a situagao da vitime de um dano a um estado an- terior ao que se encontrava antes do evento danoso, A propria realizagao de um dano considerada como sendo uma situago juridicamente contrdria ao Direito, pois se infringe ai o dever de no lesar 0 outro, Uma vez descumprido este dever, oque hé é a necesséria sangdo do ordenamento jutidica, impondo aquele que age contra um dever geral de conduta a obrigagio de indenizar a vitima. Percebe-se atualmente uma tendéncia em considerar somente este tiltimo elemento como sendo necessirio para a configuregao da obrigagtio de indenizar, Assim, quando existir a infrag3o ao Direito, haveté a obrigagao de indenizar 0 dano que dai provenha, nao se questionando se a conduta que levou a esta con- trariedade foi conscientemente prevista pelo autor do dano. A este movimento podemos chamar de “desculpabilizagao da responsabilidade civil”,”* na medida oa’ 17” Sobre a responsabilidade indireta, chamada de responsabilidade pelo fato de outrem, ver 0 antigo 932, do Cédigo Civil que estabelece: “AM. 932, Sto também responsiveis pela reparagao civ: I~ os pais, pelos filhos menores {que estiverem sob sua antoridade e em sua companhia; IL-0 tutor €0 curador, pelos pupilos © curateladas, que se aharern nas mesmas condigdes; II 0 cmpreyador ou comitente, por seus ‘empregndos,servigas © prepostos, no exervcio do trabalho que Thes competi, ou em r82H0 ele, IV ~ os donos de hogs, hospedarins, casas ou eslabelecimentos onde se albergue por 4inheiro, mesmo para fins de educag, pelos seus hospedes, moradores e educands; Vos ‘ue gratuitamente houverem participado nos produtosdo crime, até a eoncorrente quanti. 78 Shering, considerado um dos ferrenhos defensores da eulpa, afirmava que “2 historia 4a idea da culpa se resume em sua aboligio consiante™. (apud Meto Da Sitva, Wilson, Responsabilidade sem Culpa e Sociaizagdo dos Riscas. Sao Paulos Saraiva, 1974, p. 22 Paul Ricoeur salient em contrapartida, que a desperalizagdo da esponsabilidade civil, isto 2 CAITLIN Santnaio MuLnoiase ‘em que nio se busca mais uma aniilise subjetiva da conduta para se configurar a obrigagio de indenizar, mas somente se aquela conduta gerou o dano que se busca reparar, sem qualquer andlise a respeito da falha no agir. ‘Segundo Aaderson Schreiber, neste momento 4 nogio psicolégica da culpa foi definitivamente abandonada em favor de outra, que designa a culpa como a desconformidade a um mode- lo abs rato de conduta, A conseqliéncia mais ébvia desta mudanga de orientagdo foi o distanciamento do conceito juridico de culpa do cam- po da moral ¢ a indiferenga a fatores psicol6gicos na sua aferigao.”” Dai a idéia de culpa objetiva,"” aproximando-se a responsabilidade subjeti- va cada vez mais de um conceito de andlise objetiva. Esta segunda concepgao da culpa, chamada ‘ambém de normativa, sustenta-se na nogiio de erro de conduta, significando dizer que haverd a caracterizagao da culpa e, portanto, a imputagaio de responsabilidade toda @ vez que for infringido o dever geral de no lesar a «8 caracteriaagdo da obrigagio ce indenizar como forma de socializagio dos riseos, mais «do que como instrumento de sancionamento de condutas culposas¢ violadoras de interesses, nto pod ser confiunida com a desculpabilizagao da responsabilidade civil, Esta afirmagio deverse a0 fat de que ao lado desta necessria objetivagao da responsabilidage baseada no Principio da solidariedade social, a culpa permancce ainds ¢ sempre como elemento para a configuragao da responsabilidede, ndo tendo sido aholida (ainda). (Ricorut, Paul, Le ste Pais: Editions Esprit, 1995, p. $8), » ‘creer, Arderson, Novas tendéncias da responsabilidade civil brasileira. Revista Trimes- tral de Direite Civil, 22, abefiun, 2005, p. 51 80 Oconceito deculpa objetive foi defendido bravamente pelos inmos Mazeaudl (Tune, Andiés Maceauo, Henri; Maztaun, Leon. Tratadlo Tesco y Prictico de lu Responsable Civil Delictual y Contractual, vol. 2, tomo Ui, rad, Luis Aleaki-Zamora y Castillo, Buenas Aires Ediciones Juridicas Europa-América, 1963, n™ 416 ¢ 456), que sustentavar que a analise «da culpa deveria se dar através de um standard abstyato, sem se levar em eonta as eondigies subjetivas do autor do dano, nem seu estado de consciéneta, na medida em que esta inves- ‘ignedo “subjetiva” da culpa signficaria, em iltima instineia, a individualizagao © conere- ‘izagio de su analise, Por este teoria, pouco importa o elemento da impatabilidece moral € ‘o.estado de dnimo e psicologiea do agente para a configuragio da culpa, nn medida em que haveri a obrigagdo de indenizar se houver o desvio do padrio médio de conduta, indepen ‘entemente do agente scr ou no imputivel moralmente, ist gtr ou nBo & eonscignein da previsivel danosidade de sua conduta. Para maiores detathes sobre teoria da culpa objetiva, ver, por todos, Lima, Alvino, Culpa e Riseo. Op. ei, pp. 61-68 A Respowsautuapade CIVIL. sor PREsuNGAD DE CausaLipane a coutrem (neminem laedere). A culpa é assim o desvio de um padrao esperado de Conduta de alguém que age de boa-fé e diligentemente. ‘Questiona-se se @ conduta danosa fo ou ndo razodvel para afastar ou atri- buir a obrigagdo de indenizar. Isto é, se a conduta foi conforme 0 direito ou nao. Neste momento niio se analisa a previsibilidade do dano por parte do agente que ‘o cauisou, mas realiza-se uma investigacHo objetiva da conduta: violou-se ou nao o standard socialmente adequado de agir? Note-se que a diferenga principal entre estas duas concepedes (subjetiva ¢ objetiva) refere-se a analise da ilicitude. Evidentemente, tanto numa quanto poulta vertente teremos caracterizado 0 ato ilicito, base justificadora da respon- sabilidade civil por fato culposo, Mas a meneira como se analisa este ato ilicito e, portanto, a caracterizagdo da responsabilicade, é que se efetiva de forma diversa, Enquanto pela primeira concepeo € necessiria a existéncia a priori de uma norma a ser violada (seja contratual, seja extracontratual), na medida em que para haver culpa deve haver a violacZo de um dever preexistente; pela segunda, ‘culpa estaria caracterizada pela identificagdo, no caso concreto, da infragio & boa-fé ou diligéncia padrio, estabelecida de acordo com as circunstineias tipicas e adequadas do caso especifico e conforme o que se espera come conduta média, socialmente aceita."! ‘Segundo Maria Celina Bodin de Moraes, a nogo normativa de culpa, como inobservaneia de uma norma obje- tiva de conduta, praticamente substitui a nogao psicoldgica, com vistas, a permitir que se apure o grau de reprovacio social representado pelo comportamento concreto do ofensor, isto é, a correspondéncia, ou no, do fatto a um padrio (standard) objetivo de adequagao, sem que se dé relevdncia & sua boa ou ma intengao. (..) a figura do ilicito permanece ancorada no fato “culposo”, 0 qual, porém, foi redefinido, através des- sa concepgaio da culpa, como sendo um fato avaliado negativamente em relagdo a pardmetros objetivos de diligéncia."* A.culpa deixa, assim, de ser analisada através desta dtica tradicional, coma sendo a omissio de diligéncia exigida num caso canereto, Pelo contrario, a con- Cepgio de culpa na atualidade é caracterizada através de duas hipoteses: 1. condu- {5 antijuridicas realizadas através de uma negligéneia em sentido lato (hipotese 81 ibicem,p. 60. 2 Bow ne Moras, Maria Celina. Danos @ Pessoa Humana. Op. ct. p. 212. classica, mas agora utilizada sob a forma de culpa objetiva); ou 2, condutas di ligentes ¢ lici-as que geram um resultado danoso que impdem a desaprovacio da ago, por ser a conduta socialmente reprovavel." Tanto uma quanto a outra representam a atual objetivac3o do conceito da culpa, no sentido de atribuir & investigagao deste elemento um aspecto estritamente juridico, pritico, despido de qualquer pretensio de reprovabilidade moral da conduta danosa.“ A-culpa ¢, assim, relativizada, de acordo com standards ou parametros que sero avaliados dentro de categorias de relagdes humanas para se configurar a existéncia ou nao de violagio do padrao normal de conduta. A dimensao subjeti- va da culpa, contudo, € restringida substancialmente na teoria contempordnea da responsabilidede civil. Questiona-se atualmente se a configuragio da culpa ne- cessita de todos esses requisitos expostos ¢ como devem ser analisados. Quanto 40 primeiro requisito - falta no dever de conduta — pergunta-se como deve ser realizada a sua averiguagio, Por muito tempo 0 critétio utilizado era 0 do homem médio ou do pater bomus familias (reasonable man da common len). & investigagéo da conduta culposa, isto é a investigagdo sobre se determinado sujeito agiu ou nio com cul- pa, era realizada através da andlise de um standard! abstrato de conduta averigua- do de acordo com o que se imagina ser esperado de uma pessoa medianamente diligente.** Evidentemente este critério, por demais subjetivo, possibilita ao ma- 83. Diez-Picam, Luiz. Derecho de Datos, Op. cit. p. 28. 84 Segundo Régis Fichtner Perera, “mesmo nas hipdteses om que @ lei exige a configuragio da capa, tem sido observado um processo de abjerivagdo ca culpa, em virtue da massificagd0 dla atvidades das pessoas em sociedade, o que faz surgit um padréo normal de comporta- mento, ou padrdo siondard!. Para se verifcar, portanto, se uma pessca agiu culposamente, basta se eximinar se ela atuou de acorio com 0 padrio standard de eomportamento existente para aquela dada situagd0, © que nada mais € que dar um carater objetivo & confiuragao da culpa” (Pateiea, Reis Fichtner. A Responsabilidade Civil Pré-Contratual: Teoria Geral «@ Responsubildae pela Rupture das Negociagdes Contronuais. Rio de Ianeito; Renova, 2001, pp. 14-15, nota 22) As crticas&utilizagdo deste eritério si muitas. A titulo de ihsttagdo, segundo Giovana Visintni, “la supuesta coherencia del sistema del derecho general de las obligaciones di- Fandids entomo al exter, de origen romanistico, del iligencta del buen padre de familia, corstituye una aperaeién doctrinal carente de todo fundamento, tanto en et plano racional {cuanto enel plano de la concrecién de Tos datos legislaivos y dela historia de las ideas que le habian precedido”.(Viswerna, Giovanna. Trotado, tomo I, cit, p. 85 86 © paradiyma do bom pai de familia foi muito hem explicitado por Alvino Lima. Em suas Palavras, c honus pater famitiae simboliza“(..)a conduta permitida pela ordem juridica, de 'maneira que no se subverta a coordenagio de todas as atividadese, eonseqitentemente, toda i [A RESRONSABILIDADE Civil, HOR PRESUNGAO DE CAUSALIDADE 45 aistrado, ao julgar 0 caso concreto, decidi: com base em pardmetros individuais t referidos 4 sua formagdo sécio-cultural, na medida em que ndo se pode esperar gue este contetido abstrato da diligéncia mediana seja eterna e universalmente 0 vesmo. Por conta disso, este primeiro requisito € reformulado constantemente ¢ jié mesmo abandonado em determinados casos. ‘A tendéncia, portanto, é a anélise da culpa através da chamada “fragmen- tagio do modelo de conduta”,*” levando-se em conta parimetros diferenciados para cada conduta individuatizada, isto é, standards especificos para cada caso oncreto analisado. Assim, por exemplo, 0 erro médico é avaliado niio conforme uum parimetro abstrato de conduta, mas através de umm standard de eondutas mé- dicas adequadas, em que se analisam os procedimentos adotados pela classe mé- dica, naquela especifica atuagio (por exemplo, como agiriam outros anestesistas ‘numa mesma situagdo)."*A culpa passa a ser investigada a partir de critérios mais objetivos, livrando 0 magistrado da ardua tarefa de apontar a existéncia de uma culpa abstratamente considerada Esta dialética culpa subjetiva / culp objetiva, por sua vez, parece wilhar, nas palavras de Diez-Picazo.” 0 mesmo destino da dicotomia elassica entre di- reilo privado e dircito piiblico: relativamente necessiria do ponto de vista dog- itico e te6rico, mas totalmente supérflua do ponto de vista da pratica juridica ¢ dda aplicagao pela jurisprudéncia, Quande se percebe esta crescente objetivacio da culpa ~ ou subjetivagao do risco, para tanto ~ a doutrina busca novos para- digmas para a fundamentac2o da responsabilidade civil que nao sejam aqueles lassicamente adotados pela doutrina e entranhados nas fontes normativas da obrigagdo de indenizar ‘ordem evondmica e social, €2 que comumente se phe em pratica, de maneira.a nao romper © equilibri de interesses privados e socias. Ha, pots, uma eonduta normal, comum, que 08 homens de bom senso, prudentes, probos e equilibrados seyuer cotidianamente, e que set consag -gulamentos, a lee que vive na conseinciajurica do povo", Assim, “a culpa repousa no desvio io intencional da conduta normal, que teria 0 bors pater familias, s¢tivesse agida no caso conereto a ser considerado” (Lista, Alvino Culpa e Risen. Op. cit. pp. 85 € 56). 8 Soames, Anderson. Novas tendéneias: cesponsabilidade civil brasileita. Op. eit, p. 52 88 Sobrea responsabilidade médica, ver, por todos, Basnoza, Helaisa Helena, Responsabilidade Civil médica no Brasil, Revisia Trimestrof ae Direito Civil. Ria de Janeiro, vo. 5, 0” 19, pp. 49-64. ju so. 2004, 89 Diez-Pieazo, Luiz. Derecho de Dahos. Op. cit pp. 27-28, 46 Carman Sampaio Mutioutann Para Nils Jansen, um modelo adequado de responsabilidade civil requer a anilise das condutas através de um catilogo de standards graduados desde a idéia de respensabilidade absoluta (objetiva ¢ integral) até a da responsabilidade somente possivel diante de dolo ou culpa grave. Para o autor, nfo haveria inte- rresse sistematico, nem mesmo doutrinario, na separagao da responsabilidade em subjetiva e objetiva. A responsabilidade é sempre uma, somente se distinguindo © grau de staadard através do qual o magistrado investigard a responsabilidade do imputado.” Ao mesmo tampo, entende Ricardo de Angel Yagtiez que 0 que existe na atuslidade é uma progressiva deformago do conceito de culpa,’ a tal ponto que ¢ possivel afirmar-se a existéncia de uma confuusdo ~ nio s6 termino- légica, mas também nos fundamentos ~ da culpa ¢ do da responsabilidade civil Ha assim uma ampliagio dos contetidos da culpa.” Para Diez-Picazo, a anilise da culpa em dadas situagdes € feita com base em eritérios pouco defini- dos ¢ sem a necessiria abstragao. Assim, “(..) los tribunales llegan a establecer parimetros ad hoc de diligencia, de manera que se fuerza un criterio de cia, que, en muchas ocasiones queda sin definir”.”» ‘Ao mesmo tempo, a analise do risco pela jurisprudéncia é realizada cada vez mais levando em consideragao aspectos da culpa na atividade desenvolvida, seja através da chamada culpa normativa,” seja através da imputagio de uma reprovacdo de conduta realizada, 0 que, em iiltima instincia nada mais é do que a verificagaio da culpa. Esta confusio terminolégica é comunissima em agdes de Sco Como pressupostos ligen- 90 Jansen, Nils. Estructura de un Derecho Eurapeo de Deios: Desarrollo Histévico Dagmaties Moderna. Working paper n’ 128, Barcelona. Abril de 2003, Disponivel em www. Indret.com. Acesso em 14.11.2005, 91 Yaudk2, Ricardo de Angel. Adgunas Previsiones sobre ef Futuro le la Responsabitidad Cisit (con especial ateciin a la reparacion del dana). Madrid; Civitas, 1995, 92 Ditz-Preavo, Luiz, Derecho de Daitas.Op. cit, p. 235. 93 Diez-Picato, Luiz. Derecho de Darios. Op. cit. p. 286. 94 Segundo Pietro Perlingieri, « culps normativa “indica Ia contarieth del eomportamento dlls persona al modello leyale,idonco ad evitare event lesivi dellalrui ditto (eolpa in sentido nermativo), Si dice che taluno & in colpa per indicate una situaaione di ifort {del suo eemportamento rispetto al modello legale”. (Trad: “indica contrariedade do com Portamenio da pessoa em relagio a modelo legal, iéneo a evitar eventos esivos do dreito de ovtcem (culpa em sentido normative). Diz-se que alguém age cam culpa para indica uma situagio de desconfiormidade de seu comportamenta quanta ao modelo legal”) (PERLINGIFR Pictto. Manuele di Divino Civile. ¥ ed., Napoli: Edizione , 2002, p, 613) cientific alian A Risronsawiuiang Civ. roe PRESUNCKO OF CAUSALIDADE ” responsabilidade civil pelo fato do prodito € pelo Tato do servigo © em agbes de Jndenizagio intentadas contra 0 Estado, Nestes casos € usual a ulizagao de ex- pressbes tas como “Talha no dever de informer”, “falha no dever de euidado”* Nfalta no dever de vigiar”,”” “culpa objetiva na existéncia do dano”,” todas ex- 55 7Ttarws ela de comumo. Fae seri. Pass exedees. Pus fades Fea om ds angi, Dever de Infor Vara ninco reo, Nie dt es nicag 8 igo de def te conumidr Reponsbics cil obra Jee dorian, Nexo decaslafe I-A foes deere to dee de fo Terestivneclmemesobe tn henge que omolum » psa oso spi us oigr#6 inet M30 Tao edge de Deen do Cvsaor3 Provan pri do ree, 8 CAC 2005 48260 Re Lec So 200) Griese 7 fe pnt rez na pessoa de eccir,Haxdo do deve Juric de cuidado plo exe Sareea gery eet are ape ve 0 tae toe dvr ura deciddh 5 formas» elo Sever opund pl solo gts pret mais coneiente pia em vez Just Su us Sao cna spss deseo pie eu covet ere Fe de ‘Spelt d ofoor de prae reli sonst apa vein dua, een: Soa stain cules uo france Avbomet einen. ao go sing pees ston peso atm exc enters Oe ft apidanene se doves mst plate despovimena dren dao (TRI, 210A f° 20601 1072 Re Sunes Mee Cv} 11 08208). Grise “ideniatéa, Aptometo da aor po emposgn ten reed pari do tr ogc epntdo ple urs ou curacao pen copra. e aos ve conse 2 tends cams seco no eno corso de Sev pbc ie la th cneraan porting mist Acinent parc elitr dhrevoyo daca ncadapun ei obiggl ce dep evades ons (TRC ACH 20080012871 Re Cone Mos} 1102005 “aplo. Ao nderiztri Dos mri ea Devol de eq 8 inno de musa de anon oro do mesa compensa equ adler Ts do some d cena no SERASA, Cm Je is prt ead dana d9 CCF sfouese 98 4% CAITLIN Saueaio Munnoniann pressdes utilizadas em hipéteses de responsabilidade civil objetiva calcadas, por- tanto, na idéia de risco, mas que denotam a anilise da culpa como justificadora da obrigagio de indenizar. Parece, assim, uma viagem circular a lugar algum.” As diferengas praticas existentes entre a responsabilidade baseada em culpa e aquela fundada no risco so minimzs quando confrontadas em decisdes judi- ciais que analisam em eonereto um ou outro fator de atribuigao. Afora o evidente beneficio da desnecessidade da prova da culpa, a responsabilidade baseada no risco pouco difere, na prética, daquela baseada na culpa. De acordo com os teé- ricos da anilise econémica do direito, por exemplo, a principal distingao que se faz entre uma e outra é em relagdo ao momento em que se investiga os limites da responsabilidade, isto é, quando se analisa o chamado circulo de possiveis, responsaveis. No caso da responsabilidade subjetiva, esta andilise ¢ realizada em dois momentos distintos: 0 primeiro em que se determina o ambito de possiveis responsaveis pelo dano gerado (potencialidade); 0 segundo em que se analisa, dentro deste ambito, a infringéncia ao dever de cuidado devido (negligéncia). 44 na responsabilidade objetiva, somente se analisa a primeira etapa, qual seja, a de potenciais responsiiveis, na medida em que esta segunda analise fica fora do mbito de aplicagao da teoria do risco!™ BACEN, Sentenga de procedéncia parcial do pedido, Falha na prestaglo do servigo. Cheque preserito ¢ flagrantemente adulterado. Cobranga de taifa, que evideneia-se como indevida pela ilegaidade do ato da insrigao no SERASA. Valor cobrado que deve ser restituido 20 cortentista. Dano moral earacterizado, a ensejar 8 responsabilizagio do rév, por eupa obje- riva decorrente de falha no servico, Sentenga que se confirma. Apelo improvide (THRJ, 16° ‘CC, AC n 2006.001,05128, Rel. Ronald Valladares, j, 28.03.2006). Grifow-se 99 Diez-Pleazo, Luiz. Derecho de Daos. Op. cits p. 236 100 Conrce: Satvanon, Pablo; Gaxours, Nuno; Gomez, Carlos. EI Cireulo de Responsailes: la -Evanescente Distincin emre Responsabiicad por Culpa y Objetiva. Working paper n° 309, Barcelona, octubre 2005. Disponivel em www indrel.eom, Acesso ein 22.11.2005, p. 8. Para 0s tedrieos da Law and Economics, 0 que deve ser levadlo em considerago para o estab cimento da obrigagao de indenizar so os cusios eos beneficios que advem de determinada atividade ou conduta, Se 0s beneficios da atividade desenvalvida forem superiores aos cus tos que dela advém, a obrigagao indenizatdria derivada de um dano werado pela atividade deve ser desconsiderad. Para Coase, per exemplo, “he problem whieh we face in dealing with aetions which have harmful effects is not simply one of retaining those responsible for them. What has tobe decided is whether the gain from preventing the harm is reater than the loss which would be suffered elsewhere 2s a result of stopping the action which Produces the harm. ina world in which there are costs of rearranging the rights established by the legal system, the courts, in eases relating to nuisance, ae, in effect, making a decision A ResPONSAMILIDADE Civil FoR PkesuNcAo DE Causauinane “0 Para que esta investigagao se faga possive, de acordo com os teéricos da ‘anilise econdmica de direito, é preciso aplicar-se a chamada formula de Hand.’ Por esta férmula, o Juiz Learned Hand, do 2° Circuito, em 1947, estabeleceu que a responsabilidade existira se estiverem presentes, conjuntamente, trés variaveis, quis sejam: a) a probabilidade de dano (mesmo que remoto); b) a gravidade ‘onthe economic problem and determining ho (0 be employed, Iwas argued that the courts are conscious af this and that they oft make, although nol always in a very explicit fashion, a comparison between what would be geined and what lost by preventing factions which have haemfil effets”, (Trad.:"O problema que enfrentamos 20 deparar com ‘agdes que tém efeitos danosos no ¢ simplesmente o de sancionar os respansiveis por tis sobes, O que precisa ser resolvido & se © ganho obiido ao prevenir 0 dano € maior que o prejuizo que sera solrido em outras cicunstincias em decorréncia de a ago causadora do ‘ano ser suprimide, Num mundo onde reordenar os direitos estabelecides pelo sistema juri- dico acarreta custo, os tvibunas, em casos relacionados a danos, eetivamente tomam deci- bes sobre 0 problema econémica e determinam como as recursos devem ser empregados. ‘Constatou-se que 08 iibunais so cientes disso ¢ que muitas vezes comparam — se bem que nem sempre deforma muito explicita ~ 0 que seria ganho e © que seria perdido prevenindo es com eletos danosos") (Coast, Ronald H. The problem of social cost, Journal of Law and Economics, University of Chicago, October 19€0,p. 12) 101 Segundo Posner, a frmula de Hand para estabelecer a obrigagao de indenizar (com base ra culpa) & explicada através de uma simples conta matematia, baseada exclusivamente ‘em fatos, ¢ nfo em questbes juridicas, Em referéaci ao trabalho desenvolvide por Hane, explica Posner: “The defendant is negligent iFB levante€ o da previsibilidade do resultado danoso, Cavalieri sustenta que “a previsbilidade necessria para a configuragao da culpa nio é a previsibilidade generics, abstrta, sobre Aquilo que pode um dia aeontecer; mas sim a previsibilidade especifea, presente, atual, relative as ircunstincias do momento da realizagia da cond”, 127 Barwa, Roberto H, Lo Relacidn de Cousolidel en Derecho Ciil, Rosario: Juris, 1975, 20, afirma que “Ia investigacin de la relaci6n de causslidad es necesariamente previa & | detcrmsinaeign de la culpabilded de! agente, Para saber si una persona es culpable debe demostarse primeramente que es autor material del hecho con las consecuencias que se le adseriten? Recién después de haberse ajudicado las eansecuencias al acto y demostrad la ‘aworia material juridia (imputabiidad subjetiva} del agente, podra enrarse a indagar si eS culpable y, por cnde, si responder (evil y penaloente) por su accion” 128° Bernina, Roberto H. Op. cit, p. 16 A ResroNSAUILIDADE CiVIL FOR PRESUNCAO DE Causatinane o quando a teoria do risco entende fazer derivar a lei de responsabilida- de da lei de causalidade, destrdi a idgia moral que a tinica que pode Jjustificar a responsabilidade. O homem sente-se responsavel pelos prejuizos que causa por sva culpa, mas no pelos que causa pela sua agdo sem que os tena podido prever ou impedir, ou mais exatamente, ele diz que as nao causa ¢ repelindo @ imputagao da falta, destr6i a0 ‘mesmo tempo o lago de causalidade. E ainda, continua 0 autor francés, declarando que a formula que resume a tectia do risco despojada de todas as restrigdes de ordem técnica que se podem atribuir é a seguinte: todo o prejuizo deve ser atribuido ao seu autor € reparado por aquele que 0 causou, porque todo problema de responsabilidade civil resolve-se em um problema de causalidade; ou ainda: qualquer fato do homem obriga aquele que causou um prejuizo a outrem a reparé-lo. ta idéia de causalidade esta nitida no art. 1382. Uma das condigdes da responsabilidade civil cuja observancia é controlada pela Corte de Cassagao ¢ a existéncia dum lago entre a culpa e 0 prejuizo. Mas, por- que 0 elemento culpa esté no primeiro plano nfo se apereebe a impor- tincia do elemento causalidade, permitindo, aliés, a vegra da liberdade de prova para os atos materiais, a livre apreciag3o do juiz. Se se faz de- saparecer a idéia de falta, a idéia de causalidade passa para o primeiro plano, tomando a seu cargo a idéia de responsabilidad. O ato humano ‘raz consigo os seus riscos como uma conseqiiéncia necesséria. A dificuldade contempordnea em relagdo 4 pesquisa da causalidade diz res- Peito a sua possivel desconsiderag20.ou afastamento, muito mais do que o de s investigagao, Pereehe-se, aos poucos e através da pesquisa jurisprudencial, que © nexo de causalidade € relegado a um segundo plano, perdendo importancia ‘1 sua determinagao frente A investigagao do principio da culpa ou do principio «lo riseo. Dito isso, a anilise da obrigagdo de indenizar se resume @ uma inves- "igagdo da culpa e do risco, na medida em que se presume a existéncia do liame Causal entre a conduta culposa ou da atividade perigosa ¢ 0 dano, através da ani "ise antecipada e reconhecimento da existéncia de culpa ou do riseo. Isto é, em 129° Rooner, Georges. A Regra Moral nas OirigagBe Civis. Campinas; Bookseller, 2003, p. 216 130 tbidem, p. 213, 2 Carmi Sampaio Munouiann, determinadas hipdteses de dano, se ha culpa, hi responsabilidade," se hi risco, ha responsabilidade, '? independentemente da existéncia de um nexo causal pre- viamente demonstrado, Obviamente, a mitigagdo de importancia na pesquisa do nexo de causalida- de (ou o alargamento de sua atribuigdo) nao é a regra:"* 0 exame do liame causal ainda é 0 meio através do qual se estabelece a imputac3o de responsabilidade faquele que com sua conduls ov atividade gerou o resultado que se busca reparar. E, como se mostra evidente, este elemento nao poder ser apartado definitiva- mente, sob pena de instaurarse um verdadeiro sistema de seguridade social, afastando, desta maneira, a fungio primaria da responsabilidade civil A questiio em toro do nexo de causalidade a que nos reportamos, portanto, diz respeito a determinadas situagdes, previamente delimitadas pela jurisprudén- cia e pela doutrina ~ ainda qve em menor contribuigao exemplificadora ~, em que, por dificuldade da vitima em determinar com precisao a existéncia de uma ligayao de fato entre 0 dano a ela gerado € a ago ou omissio de determinado agente, se busca, por meio da técnica da prestingdo, definir que aquela aco ou ie 13 Por vezes, 2 confusto realizaca entre © conceita de culpabilidade e 0 de eauslidade (ver Dp. 8 e seguintes) leva a uma investigagia da situagio danosa exelesivaiente do ponto de vista da culpa. 1ss0 se dé em casos em que o fundamento da obrigagao de indenizar reside justamente ng investigaglo e celimitagao da conuuta eulposa do agente causador do dano, isto &, em hipdteses de responsabilidade civil subjetiva, Una vez identficada a conduts caulposa, em primeira anise, a causalidade seria um elemento que complementarin a idia {de responsabilidade, na medida ers que a culpa j levara & respansabilizacdo Iso se deve, Primordialmente, por conta da natureza da vesponsabilidade civil subjetiva, euja origem contempla um cuno moralista~e meralizante de sancionar a desvie do padre de conduta ‘esperado socialmente, Sobre aanilise da natureza da responsabilidade civil subjetiva, ver, por todos, Ditz-Pieazo, Luiz, Derecho de Datos. Op. cit, np. 2327. 0 desenvolvimento de atividade de risco é, a0 Indo da culpa, um segundo fundamento para a obrigagao de indenizar (an $27 do CC), Esta chiusula de esponssbildade objetiva funda 'menta-se em dois ieais: primeira, de que existem danas que so rut de uma avid, © no de una concita individustizada; 0 segundo, de que, em havenda 0 dano, deveri haver 3 indenizag2o por vonta do principio da solidariedade social. Nao hi na responsabilidade civil objetiva uma base moralizante com hi naresponsabiliade evil subjtiva, paso propasito aquela nfo & sancionar a eoaduta impuriy ro, mas & possibi a ressarsibildade cle um danc causado por una atividade aeiseada, Sobre os fundamentos da responsabilidade civil objotiva, ver, por todas, Meio Siva, Wilson, Responsabilidade sem Culpa e Sociatizacdo dos Riscas, > ed, Rio de Janeiro: Forens, 1974, passim. ‘em seu sentido subjel A investigagao da causalidade somente érelaivizada em hindteses espoeficas nis come em sinmagdes em que se estabelece a eausalidadealternativa, Sobre esta hipstese,remelemos @ leitor ao Capitulo I, item 3.21 ees A Resrowsantsoane Civi pox PRESUINGAG mi CaUSALIDADE « omisstio imputada seja, alé prova em contrério, 2 causadora do resultado danoso aque se quer ver reparado. f preciso ressaltar, contudo, que a presungio de que se trata na hipstese & uma presungao de fito, € nao uma presungdo juridica. 14 alertava desta diferen- ciago Diez-Picazo, ao afirmar que hé “un solapamiento del problema de la cau- salidad a través de la bisqueda de los titulos de imputacién y, en sentido estricto, de una presuncién de causalidad, que 20 es, naturalmente, una praesumptio juris, sino una praesumptio facti”."™ Esta ressalva é relevante, pois possibilita ao juiz, nna consideragao de um fato concrete, utilizar-se de sua prerrogativa de anali- sar as circunstancias do caso de acordo com o que habitualmente ocorre, isto 6, por meio do principio id quod plerumque accidit,"* resolvendo a demanda com base no que a experiéncia da vida possa demonstrar como senda razodvel e provavel Ainda que nifo seja possivel derionstrar-se atualmente e de maneira siste- rmatizada como se da este processo de presungio de causalidade realizado pela 134 Diez-Preazo, Luiz, Derecho de Datos. Op. eit, p. 28 135-0 principio referido significa “aquilo que acon freqientemente ou normalmente”. No Direito Romano, o brocardo que origivow este principio eslabelecia que: er eo quod ple rumque fit ducintur praesumptiones (as presung’es so tiadas do que acontece 25 mais das vezes). No ordenamento brasiviro, ele pode ser encontrado no tiga 335, do Cédigo de Processo Civil, onde se 18 que: “em falta de normas juridies paticulares,o ji aplca 28 regras de experiéncia comum subminisradas pela observagdo clo gue orlinariamens fe acontece « ainda as regras de expetiéncia técnica, ressalvado, quanto a esta, 0 exaine Pericial” (Grifowse}. De acordo com Marco Capeechi, a utilizagio da presungio de fito m0 meio de prova € admitida também para o nexo de causalidade, pois “per aversi pre sunzione giurdicamente valida non oecorre che Fesisienza de! fatto ignoto rappresent la Unica conseguenza possibile di quello noto secondo un legame di necessareté asoluta ed exclusiva (rego della inferenza necessaria), ri & sufficient che dal fatto noto si desumi- bile quello ignoto, secondo un giudizio di probabilitabasato suid quod plenwimque accdit (egola dell inferenza probabilstica),scché il giudice pao wae il ui libero eonvineimente all apprezzamento dserezionae de indiziri prescelti,purché dotat dei req sit legal della yravita, precisione e concordanza”.(Trad.: "Para aver a presuno juridica- mente valida no acorre que a existénea do fat ignorado representa a inca conseqiencia possivel daquele ato conhecido segundo wns ligagio de necessariedade absolut e exclusi- a (regra da inferéncia necessiria) mas sufeiente que do faro canhecidlaseja presumivel ‘aqueleignorado, segundo um juizo de probabilidade haseado na 1d guod plerumgue acciit {regra da inferéncia probabilisitica), isto &, o juiz pode uilizar seu Tie convencimento de “preciagaa disericiondria dos elemento indicivios peé-selecionados, porque dotados de re- ‘uisitos legis de gravidade, preciso e concorlincia") (Carre, Maren, 1 Nessa. Op. ci, P.224, nota 29), os CArTLIN Sampaio MULHOLLAND jurisprudéncia, percebe-se que existe uma tendéneia crescente em desconsiderar- se como necessiria a prova inequivoca da existéncia de um liame causal pelo autor da demanda (vitima do dano, portanto) para favorecer a reparagao do duno sofrido. Vejames como exemplo, 0 famoso caso da gaze, que analisaremos mais detidamente nos préximos itens ¢ capitulos, Trata-se de uma hipétese em que o magistrado teconheceu a obrigagao de indenizar os danos causados a uma pes- soa por conta de um atrapelamento, Pela hipétese, o atropelador deveria indeni- zar 0 atropelado niio s6 pelos danos causados diretamente pelo fato do acidente automobilistico, mas também por aqueles decorrentes das cirurgias pelas quais passou a vitma do dant. Mas, dito desta maneira, parece razoiivel que assim 0 fosse, se ndo existisse um pequeno detalhe para provocar a ira dos causalistas orlodoxos: « atropelador foi também responsabilizado a indenizar o atropelado por uma seginda cirurgia a que teve que se submeter (e is conseqiiéncias que dai advieram, como a perda de dias de trabalho, ete.) por conta de uma gaze “esque- ccida”” no abdémen do atropelado em decorréncia da primeira cirurgia que sofreu, cesta sim resultado direto do atropelamento." Parece ter havido neste caso uma protongagio do liame causal identifica- do por conta do primeiro acontecimento (entre o atropelamento ¢ os danos dai decorrentes, como a realizagao da primeira cirurgia) para atingir-se o segundo evento danoso (submissio a uma segunda cirurgia) e responsabilizar-se 0 agen- te causador da primeira situagaio danosa por todos os resultados que dai foram conseqtiéneia 0 que se verifica, portanto, & a erosio na apreciagtio"” da causalidade em diversas hipsteses de responsabilidade civil.!"* Nestas hipsteses, o juiz contenta- 136 STH, 4°™, REsp. 9° 326.971, Rel, Ruy Rosado de Aguiar Junior, j 11.06.2002, 137 Aexpressto € utlizada por Anderson Schreiber, Segond 0 autor, “quer a expressio si ‘ora relative perda de importinca da prova da culpa e da prova de nexo eausal na dinirnica contempordnea das ages de responsabilizagio. Para Schreiber, “(.)& semelhanga do que ‘correicom a prova da culpa, prova do nexo causal parece tendente a sofrer, no seu papel de filtoda responsabilidade civil, uma erosto cada vez mais visivel”, simbalizando wma inclinago & adogio do expediente da presungla da causaidade pela jrisprudéncia con temporinea (Scveensen, Anderson, Novas tendéncias da responsabilidade civil brasileira, Revista Trimestral de Diveito Civil, Rio de Janeiro, n? 22, aba 2005, pp. 47 e $6. 138 _Diez-Preazo, Luiz, Devecho de Daitos. Op. cit, p. 238: %..) en los casos dfs, el juer puede eantentase con Ia probabilidad de a exstencia de la elacin de causalidad o 600 un cil ctejo como dice De Angel, de lx mayor probabilidad de que exista ln causalidad pretend da por el demandante frente a la esis contari" | | | | | | | | | A Resronsamtipane Civil. roe PREsuNCAO nF CaUSALIDADE 6s se com a mera probabilidade da existéncia de um nexo causal para estabelecer a obrigagao de indenizar, na medida em que, conforme evidencia, em esclarecedo- ra passagem, Frangois Ewald, ) a realidade nao coresponde ao esquema demasiado simples de uma conduta-causa que produz um dano-efeito. As coisas, nem pelo lado da causa, nem pelo lade do efeito, nunca sdo to bem delimitadas, Essa conduta ¢ situada, tem antecedentes; ela prépria ¢ causada; no teria produzido esse efeito sem o concurso de outros elementos. A par- tir do momento em que se olhe de perto, as causalidades so sempre complexas, multiplas, entrelagadas. Se quiséssemos segui-las a todas, nao poderiamos deter-nos nequela que seria a causa do acontecimento. Para se introduzir a responsabilidade no encadeamento indefinido das

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