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Capitulo 12 FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTICA 1. INTRODUCAO A Constituigio de 1988 agrupou em um capitulo especifico disposigdes acerca do que denominou “Fungées Essenciais 4 Justiga”. Sob essa rubrica, trata o texto constitucional do Ministério Publico, da advocacia publica, da defensoria publica e da advocacia privada. Note-se que nenhuma dessas pes- s0as ou Orgdos integra a estrutura do Poder Judicidrio. S40, como afirma o proprio texto constitucional, pessoas ou 6rgdos que atuam perante o Judicidrio. Mais do que isso, sua atuagao é imprescindivel ao proprio exercicio da fung’o jurisdicional, tendo em conta, sobretudo, o fato de que o Poder Judiciario nao atua de oficio, isto é, por iniciativa propria, sem provocacao. A nao-atuagio de oficio do Judiciario é uma importante garantia do equilibrio entre os Poderes, um relevante mecanismo de contengdio recipro- ca, dentre os diversos “freios e contrapesos” estabelecidos nas Constituigdes em geral. Deveras, 0 Poder Judiciario pode controlar e declarar ilegitima a atuacio do Executivo, obstando ou anulando atos desse Poder; pode, até mesmo, retirar do mundo juridico, por considera-los inconstitucionais, atos normativos primarios do Legislativo, Poder integrado pelos representantes do povo, legitimo titular da soberania do Estado. Com todas essas prerrogativas, se tivesse 0 Judiciario a possibilidade de atuar de oficio, por iniciativa propria, cle seria, sem davida, um Poder acima dos demais, com forga para paralisd-los inteiramente, a seu alvedrio. Além disso, a exigéncia de provocagdo para que o Judicidrio atue é ga- rantia de sua imparcialidade, porquanto é evidente que o autor de uma ago 660 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrina sempre tem o objetivo de alcangar determinado resultado, predeterminado, situagdo inteiramente incompativel com a figura de um julgador equilibrado e imparcial (literalmente, 0 juiz ndo pode ser parte na agdo, no pode ser autor nem réu, deve manter-se eqilidistante das partes, sem o que nio ha como esperar uma decisao justa). Embora 0 acesso a Justica deva ser 0 mais amplo possivel, todo 0 con- junto de garantias processuais, decorrentes do principio do devido processo legal em acepgdo formal, torna bastante técnica a disciplina da postulagao em juizo, fazendo muito improvayel que se pudesse obter uma prestago jurisdicional satisfatoria, equilibrada, isonémica, se qualquer pessoa, sem preparagdo especializada, pudesse atuar diretamente perante o Judicidrio. Dai a importancia da fungao do advogado. Nesse aspecto, particularmente relevante é assegurar defesa de qualidade aos necessitados, mormente quando acusados de crimes, papel da defensoria publica. Ademais, é desejavel que existam érgaos com capacidade postulatéria que atuem em juizo em defesa dos interesses gerais da populag’0, como é 0 caso do Ministério Piblico — titular da agao penal publica e investido em diversas outras competéncias fundamentais para a prote¢do da sociedade. Também o Poder Publico precisa ter quem © represente em juizo, justificando a existéncia de uma advocacia piblica. Passemos ao estudo das disposigdes constitucionais pertinentes a essas “Fungoes Essenciais 4 Justiga”. MINISTERIO PUBLICO O Ministério Publico & instituigao permanente, essencial a funcdo jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem juridica, do regime democratico e dos interesses sociais e individuais indisponiveis (CF, art. 127). A Constituig3o Federal, em plena harmonia com o sistema de “freios ¢ contrapesos” (checks and balances), instituiu 0 Ministério Publico como um Srgio auténomo e independente, nao subordinado a qualquer dos Poderes da Republica, consistindo em auténtico fiscal da nossa Federacdo, da separagao dos Poderes, da moralidade publica, da legalidade, do regime democratico ¢ dos direitos ¢ garantias constitucionais. A autonomia e independéncia do Ministério Publico, nos termos exa- minados a seguir, conferem ao 6rgdo imparcialidade na sua atuagdo, sem ingeréncia dos demais Poderes do Estado. Cap. 12 + FUNCOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 661 21. Composicgéo O Ministério Publico abrange (CF, art, 128): 1 - 0 Ministério Pablico da Unido, que compreende: a) o Ministério Publico Federal; b) 0 Ministério Publico do Trabalho; c) 0 Ministério Publico Militar; d) 0 Ministério Publico do Distrito Federal e Territérios; II — os Ministérios Publicos dos Estados. Dessarte, 0 Ministério Publico da Unido compreende, em sua estrutura, diferentes ramos do Ministério Publico (Federal, do Trabalho, Militar, além do Ministério Publico do Distrito Federal e Territorios). O fato de o Ministério do Distrito Federal e Territérios integrar o Ministério Publico da Unido justifica-se porque, por determinagao constitu- cional, cabe 4 Unido organizar e manter esse ramo do Ministério Publico (art. 21, XIII). 2.2. Posigao constitucional A Constituigao Federal situa 0 Ministério Publico em capitulo especial, fora da estrutura dos demais Poderes da Reptblica, certamente como meio de explicitar sua autonomia e independéncia. Conforme li¢éo do Ministro Septilveda Pertence, “a colocagao tépica e o contetido normativo da Se¢ao revelam a renincia, por parte do constituinte, de definir explicitamente a posicao do Ministério Publico entre os Poderes do Estado”.' Em verdade, considerando as atribuigSes que foram constitucionalmente conferidas ao Ministério Publico, bem como a autonomia e¢ a independéncia a ele asseguradas, a discusséo sobre sua colocagao constitucional entre os Poderes da Republica mostra-se uma questao menor, secundaria, de interesse meramente tedrico. O que importa é sua feigdo constitucionalmente tragada, de 6rgao independente, nao subordinado a nenhum dos Poderes da Republica, sujeito apenas 4 Constituigdo e as leis. Ainda que admitida por alguns autores sua vinculag&o administrativa ao Poder Executivo, o relevante é que o Ministério Publico constitui érgao auténomo e independente, com fungdes institucionais expressas no texto da * RTJ 147/129-30, citado por Alexandre de Moraes. 662 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino nossa Carta Politica, no exercicio das quais nado pode, sob pena de flagrante inconstitucionalidade, sofrer ingeréncia dos demais Poderes da Republica. E 0 que leciona o Professor José Afonso da Silva, para 0 qual o Ministério Publico é uma institui¢ao vinculada ao Poder Executivo, mas “funcionalmente independente, cujos membros integram a categoria dos agentes politicos, e, como tal, hio de atuar com plena liberdade funcional, desempenhando suas atribuigdes com prerrogativas e responsabilidades proprias, estabelecidas na Constituigao e em leis especiais.” 2.3. Principios do Ministério Publico Sao principios do Ministério Publico, constitucionalmente expressos, a unidade, a indivisibilidade, a independéncia funcional e a autonomia admi- nistrativa e financeira (CF, art. 127, §§ 1.° e 2.°). 23.1. Principio da unidade A unidade do Ministério Pablico significa que seus membros integram um s6 érgdo, sob unica diregdo de um procurador-geral. O principio da unidade, porém, ha que ser visto como “unidade dentro de cada Ministério Publico”. Nao existe, em face do tratamento constitucional, unidade entre o Ministério Publico Federal ¢ os Ministérios Publicos dos estados, tampouco entre o Ministério Publico de um estado e o de outro, ¢ nem mesmo entre os diferentes ramos do Ministério Publico da Unido. 2.3.2. Principio da indivisibilidade O principio da indivisibilidade enuncia que os membros do Ministério Publico n&o se vinculam aos processos em que atuam, podendo ser substitu- idos uns pelos outros, de acordo com as regras legais, sem nenhum prejuizo para © processo. A indivisibilidade resulta do principio da unidade, pois o Ministério Publico é uno, nio podendo subdividir-se em outros Ministérios Publicos auténomos e desvinculados uns dos outros. A atuagéo dos membros do Ministério Publico é atuacio do érgio, indivisivel por expressa disposigao constitucional. Da mesma forma que o principio da unidade, a indivisibilidade também nao pode ser efetivada entre os diferentes Ministérios Publicos, devendo ser compreendida como existente somente dentro de cada um deles. Cap. 12 « FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 663 2.3.3. Principio da independéncia funcional O Ministério Publico 6 independente no exercicio de suas fungdes, nao estando subordinado a qualquer dos Poderes (Legislativo, Executivo, ou Ju- dicidrio); seus membros nao se subordinam a quem quer que seja, somente 4 Constituigdo, as leis e a propria consciéncia. No exercicio de suas competéncias constitucionais, 0 Ministério Publico nao se sujeita a ordens de ninguém, de nenhum dos Poderes do Estado; seus membros nao devem obediéncia a instrugdes vinculantes de nenhuma auto- ridade publica. Nem mesmo seus superiores hierdrquicos (Procurador-Geral, por exemplo) podem impor-lhes ordens no sentido de agir desta ou daquela maneira em um determinado processo, haja vista que a rela¢’o de subordi- nacao existente entre eles é meramente administrativa, e ndo funcional Com efeito, a hicrarquia existente dentro de cada Ministério Publico, dos seus membros em relaco ao Procurador-Geral, é meramente administrativa, e nao de ordem funcional (nao concernente a sua atuagdo no exercicio de suas competéncias). 2.3.4. Autonomia administrativa e financeira A autonomia administrativa confere ao Ministério Publico poderes para, observado o art. 169 da Constituigao Federal, propor ao Poder Legislativo a criagdo e extingao de seus cargos e servigos auxiliares, provendo-os por meio de concurso piblico de provas ou de provas e titulos, bem como propor a politica remuneratoria ¢ os planos de carreira. No exercicio dessa autonomia, 0 Ministério Publico clabora suas proprias folhas de pagamento: adquire bens e contrata servigos; edita atos de concessio de aposentadoria, exoneragdo de seus servidores etc. A autonomia financeira outorga a0 Ministério Publico a competéncia para elaborar sua proposta orcamentaria, dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orgamentarias,’ podendo, ulteriormente, administrar os recursos que Ihe forem destinados com plena autonomia. Essa autonomia, porém, nao Ihe assegura o poder de iniciativa da lei orcamentaria dirctamente perante 0 Poder Legislativo, devendo a sua proposta integrar-se ao orgamento geral que sera submetido ao Poder Legislativo pelo chefe do Poder Executivo, assim, © Ministério Publico nao dispde de recursos préprios, mas, na elaboragdo da proposta do orgamento geral, tem o poder de indicar os recursos necessarios a atender as suas prdprias despesas. 2 CR, art. 127, § 3°. 664 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrina Caso 0 Ministério Piiblico nao encaminhe a respectiva proposta orgamen- taria dentro do prazo estabelecido na lei de diretrizes orgamentarias, 0 Poder Executivo considerard, para fins de consolidagdo da proposta orgamentiria anual, os valores aprovados na lei orgamentéria vigente, ajustados de acordo com os limites estipulados na lei de diretrizes orgamentarias. Se 0 Ministério Publico encaminhar a proposta orgamentaria, mas o fizer em desacordo com os limites estipulados na lei de diretrizes orgamentarias, 0 Poder Executivo procedera aos ajustes necessdrios para fins de consolidagao da proposta orgamentaria anual. ademais, durante a execugdo orgamentaria do exercicio, nao poderd haver a realizagdo de despesas ou a assungfo de obrigagdes que extrapolem os li- mites estabelecidos na lei de diretrizes orgamentarias, exceto se previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais. Por fim, vale lembrar que a autonomia do Ministério Publico esta assenta- da, também, na outorga ao Procurador-Geral da Republica e aos Procuradores- Gerais de Justiga da iniciativa de lei sobre a organizagao, respectivamente, do Ministério Publico da Unido e dos estados (CF, art. 128, § 5.°). Essa iniciativa, porém, sera exercida concorrentemente com o chefe do Poder Executivo, por forga do art. 61, § 1.°, Il, “d”, da Constituigao Federal. 23.5. Principio do promotor natural A jurisprudéncia do Supremo Tribunal Federal j4 deixou assente que o principio do promotor natural tem sede constitucional.* Segundo a Corte Maior, 0 postulado do promotor natural, que se revela imanente ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedacao de designagées casuisticas efetuadas pela chefia da instituigdo, a figura do acusador de excegao. O principio consagra uma garantia de ordem juridica, destinada tanto a proteger 0 membro do Ministério Publico, na medida em que Ihe assegura 0 exercicio pleno e independente do seu oficio, quanto a tutelar a propria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas 0 promotor cuja intervengao se justifique a partir de critérios abstratos e predeterminados, estabelecidos em lei. Conforme ligdo do Ministro Celso de Mello, a sede constitucional desse principio assenta-se nas clausulas da independéncia funcional e da inamovibi- lidade dos membros da Instituigao. O postulado do promotor natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-Geral que, embora expresséo visivel 2 HC 67.759/R\, rel. Min. Celso de Mello, 08.08.1992 Cap. 12+ FUNCOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 665 da unidade institucional, nao deve exercer a chefia do Ministério Publico de modo hegeménico ¢ incontrastivel. Desse modo, © principio do promotor natural proibe designacdes ca- suisticas, efetuadas pela chefia do Ministério Publico, para atuagao neste ou naquele processo, impedindo a existéncia, entre nds, da figura do “promotor de exce¢ao”. Segundo o postulado, somente o promotor natural é competente para atuar no processo, como meio de garantia da impar- cialidade de sua atuagdo, e como garantia da propria sociedade, que tera seus interesses defendidos privativamente pelo érgao constitucional técnica e juridicamente competente. O principio do promotor natural impde que o critério para a designagao de um membro do Ministério Publico para atuar em uma determinada cau- sa seja abstrato e pré-determinado, que seja baseado em regras objetivas e gerais, aplicaveis a todos os que se encontrem nas situagGes nelas descritas, nao podendo a chefia do Ministério Publico realizar designagées arbitrarias, decididas caso a caso, tampouco determinar a substituigéo de um promotor por outro, fora das hipoteses expressamente previstas em lei. 24. Fungées do Ministério Publico A vigente Constituigao ampliou significativamente o rol de fungdes do Ministério Publico, erigindo-o em auténtico defensor da sociedade, nas esferas penal e civel, e incumbindo-o de zelar pela moralidade e probidade administrativas. Nos expressos termos da Constituigao Federal, sao fungdes institucionais do Ministério Publico (art. 129): I — promover, privativamente, a acdo penal plblica, na forma da lei; Il — zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Publicos e dos ser vigos de relevancia publica aos direitos assegurados nesta Cons tituigdo, promovendo as medidas necessdrias a sua garantia; III — promover o inquérito civil e a agao civil piblica, para a protegaio do patriménio piblico e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; IV — promover a ago de inconstitucionalidade ou representagao para fins de intervengdo da Unido e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituicao; V — defender judicialmente os direitos e interesses das popu- lagdes indigenas; 666 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO - Vicente Paulo & Marcelo Alexandrine VI - expedir notificagdes nos procedimentos administrativos de sua competéncia, requisitando informagdes e documentos para instrui-los, na forma da lei complementar respectiva; VII — exercer 0 controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII — requisitar diligéncias investigatérias e a instauragdo de inquérito policial, indicados os fundamentos juridicos de suas manifestagdes processuais; IX — exercer outras fungdes que Ihe forem conferidas, desde que compativeis com sua finalidade, sendo-Ihe vedada a representa- ao judicial ¢ a consultoria juridica de entidades publicas. Essa enumeragao de competéncias, como claramente deflui do inciso IX, acima transcrito, ndo é exaustiva, podendo outras competéncias ser outorgadas ao Ministério Publico pelo legislador, desde que sejam compativeis com a missao constitucional do érgio. Ao Ministério Publico é vedada a atuagdo como representante judicial ou consultor juridico de quaisquer entidades publicas. O Ministério Piblico dispée de capacidade postulatéria. Suas competén- incluem, dentre outras, promover o inquérito civil, a ago penal publica e a acao civil publica para a protegao do patriménio publico e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos, coletivos e homogéneos. Exa- minaremos a agdo civil piblica em tépico especifico, adiante. Em que pese a existéncia de divergéncia doutrindria sobre o delineamento das espécies de interesses mencionadas no pardgrafo anterior — interesses di- fusos, coletivos ¢ homogéncos -, apresentamos a seguir breves nogdes sobre eles, a partir de orientagao firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF, RE 163.231, Rel. Min. Mauricio Corréa, 29.06.2001). Interesses difusos sao aqueles que abrangem numero indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstancias de fato. A indeterminacao dos titulares é a caracteristica fundamental desses interesses. us Interesses coletivos sio aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determindveis, ligadas entre si ou com a parte contraria por uma relagao juridica base. A determinagao é a caracteristica fundamental desses interesses. Interesses homogéneos sao os que tém a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n.° 8.078/1990), constituindo-se em subespécie de direitos coleti- vos. As mensalidades escolares sio exemplo dessa categoria ~ representam interesses homogéneos de origem comum, subespécies de interesses coletivos — e, como tais, podem ser impugnadas pelo Ministério Publico em sede de ago civil publica, quando ilegais ou abusivas. Cap. 12» FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 667 Quanto 4 competéncia para promover, privativamente, a agao penal publica, é relevante observar que o Supremo Tribunal Federal possui farta jurisprudéncia reconhecendo que essa atuagéo do Ministério Publico nao pressupoe a instauracdo prévia de inquérito policial, nao depende de prévias investigagdes penais promovidas pela policia judicidria. Por outras palavras, o Ministério Publico, como titular privativo da agao penal publica (ressalvada a hipotese de cabimento da agdo penal privada subsididria da pablica, em face de inércia indevida do Parquet — CF, art. 5.°, LIX), pode oferecer a denincia diretamente, sem que tenha havido, previamente, inquérito policial, contanto que, desde logo, disponha de elementos minimos de informagao, seja evidente a materialidade do fato alegadamente delituoso e estejam presentes indicios de sua autoria.* ‘A Constituigdo Federal determina que as fungdes do Ministério Publico s6 podem ser exercidas por integrantes da carreira, que deverao residir na comarca da respectiva lotagio, salvo autorizagao do chefe da instituigdo. Determina, também, que a distribuigéo de processos no Ministério Publico ser imediata.* 2.5. Ingresso na carreira O ingresso na carreira do Ministério Publico far-se-4 mediante concurso piblico de provas e titulos, assegurada a participagao da Ordem dos Advoga- dos do Brasil — OAB em sua realizaco, exigindo-se do bacharel em direito, no minimo, trés anos de atividade juridica e observando-se, nas nomeagoes a ordem de classificagao. © Conselho Nacional do Ministério Pablico regulamentou 0 conceito de “atividade juridica”, determinando que se considera atividade juridica aquela desempenhada exclusivamente apés a obtengao do grau de bacharel em dircito, e exercida por ocupante de cargo, emprego ou fungao, inclusive de magistério superior, nos quais prepondere a interpretagao e aplicago de normas juridicas.* O Conselho Nacional do Ministério Publico fixou, ainda, que a exigéncia do periodo de trés anos de atividade juridica deverd ser comprovada no ato da inscrigao definitiva do concurso, por intermédio de documentos e certidées que demonstrem efetivamente 0 seu exercicio no triénio exigido. ‘ $80 exemplos, dentre muitos outros: RTJ 76/741, rel. Min. Cunha Peixoto; Al AgR 266.214/ SP, rel, Min. Sepulveda Portence; HC 63.213/SP, rel. Min. Neri da Silveira; HC 77.770/SC, rel. Min. Néri da Silveira; RHC 62.300/RJ, rel. Min. Aldir Passarinho; RTJ 101/571, rel. Min, Moreira Alves; HC 80.405/SP, rel. Min. Celso de Mello. + CF, art. 129, §§ 2° @ 5°. * Resolugdo n.° 4, de 20.02.2006 668 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrina 2.6. Nomeacao dos Procuradores-Gerais A forma de nomeacao do chefe do Ministério Publico — seja do Minis- tério Publico da Uniao (Procurador-Geral da Republica), seja dos Ministérios Publicos dos estados (Procurador-Geral de Justiga) — consubstancia mais uma garantia da institui tem a cle a nece: 10, pois as regras constitucionalmente estabelecidas garan- ia imparcialidade para o exercicio de suas atribuigdes. O Ministério Publico da Unido tem por chefe.o Procurador-Geral da Re- publica, nomeado pelo Presidente da Republica entre integrantes da carreira, maiores de trinta ¢ cinco anos, apés aprovacao do seu nome pela maioria absoluta do Senado Federal. A nomeagao é para o exercicio de mandato de dois anos, permitidas sucessivas recondugdes. Porém, em cada recondugao, haverd a necessidade de nova aprovacio do Senado Federal, sempre por maioria absoluta (nao ha limite para o nmero de recondugées). A destituigao do Procurador-Geral da Republica, por iniciativa do Presidente da Republica, devera ser precedida de autorizagao da maioria absoluta do Senado Federal. Conforme vimos, o Ministério Publico da Unido é chefiado pelo Procu- rador-Geral da Republica e compreende quatro diferentes ramos, a saber: 0 Ministério Publico Federal, 0 Ministério Pablico do Trabalho, 0 Ministério Publico Militar e 0 Ministério Publico do Distrito Federal e Territérios. Cabe esclarecer que, embora o Procurador-Geral da Republica seja o chefe do Ministério Publico da Unio, ele nao chefia todos os ramos desse Ministério Publico, pois trés deles dispdem de chefia propria. Com efeito, dentre os quatro ramos do Ministério Publico da Uniao, somente o Minis- io Publico Federal - MPF é também chefiado pelo Procurador-Geral da Republica. Assim, 0 Ministério Publico do Trabalho e o Ministério Publico Militar tém Procurador-Geral proprio, nomeados pelo Procurador-Geral da Republica, na forma estabelecida em lei complementar (Procurador-Geral do Trabalho e Procurador-Geral de Justi¢a Militar, respectivamente). Por sua vez, 0 Ministério Publico do Distrito Federal e Territorios é chefiado pelo Procurador-Geral de Justiga, nomeado pelo Presidente da Re- publica, a partir de lista triplice elaborada pelo respectivo Ministério Publico, dentre integrantes da carreira, para mandato de dois anos, permitida uma reconducao. Observe-se que 0 Procurador-Geral de Justia do Distrito Federal e Ter- ritérios nao é nomeado pelo Procurador-Gera] da Republica (como acontece com os Procuradores-Gerais do Trabalho e da Justi¢a Militar), tampouco pelo Governador do Distrito Federal (como acontece com os Procuradores-Gerais de Justiga nos estados, que sio nomeados pelos respectivos Governadores). A sua nomeagao é feita pelo Presidente da Republica, tendo em vista que, no Distrito Federal, compete a Unido organizar e manter 0 Ministério Publico Cap. 12 « FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 669 (CF, art. 21, XIII). Da mesma forma, sua destituigado, se for o caso, nao sera por deliberagdo da maioria absoluta da Camara Legislativa do Distrito Federal, mas sim por deliberagéo da maioria absoluta do Senado Federal. A nomeagao do Procurador-Geral de Justiga nos estados também obedece A regra constitucionalmente prevista, segundo a qual os Ministérios Publicos dos estados formarao lista triplice entre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que sera nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondugao (art. 128, § 3.°). Anote-se que, na nomeagao do Procurador-Geral de Justiga nos Estados, ha duas diferengas em relagdo 4 nomeagado do Procurador-Geral da Republica: (i) a nao participagao do Poder Legislativo estadual na escolha e nomeagio do Procurador-Geral de Justiga (na nomeagao do Procurador-Geral da Rept- blica ha participag4o obrigatéria do Senado Federal); e (ii) a permiss&o para apenas uma reconducao do Procurador-Geral de Justi¢a (0 Procurador-Geral da Republica pode ser reconduzido no cargo indeterminadamente, desde que haja aprovagaéo do Senado Federal). Segundo a jurisprudéncia do Supremo Tribunal Federal, é inconsti- tucional regra da Constituigdo estadual que condicione a nomeagio do Procurador-Geral de Justiga 4 prévia aprovagdo do Poder Legislativo local (Assembléia Legislativa), por consagrar critério discrepante do estabelecido no art. 128, § 3.°, da Carta Federal e do principio da independéncia e harmonia dos Poderes.” Os Procuradores-Gerais nos Estados poderdo ser destituidos por de- liberagdo da maioria absoluta da Assembléia Legislativa, na forma da lei complementar respectiva (CF, art. 128, § 4.°).* Observa-se que, apesar de nao ser constitucionalmente permitida a parti- cipagao da Assembléia Legislativa no processo de nomeagao do Procurador- stiga no estado, a destituigaéo destes somente podera ser efetivada por aprovagao dessa Casa Legislativa, por deliberagdo de maioria absoluta. 27. Garantias dos membros Sao garantias constitucionais dos membros do Ministério Publico: a vitaliciedade, a inamovibilidade ¢ a irredutibilidade de subsidio (CF, art. 128, § 5.°). 7 ADI 1.506/SE, rel. Min. limar Galva, 09.09.1999, * A destituigao 6 o afastamento compulsorio do Procurador-Geral, antes de vencido o prazo normal de duragao do mandato. 670 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO « Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino Os membros do Ministério Publico adquirem vitaliciedade apés dois anos de efetivo exercicio na carreira, mediante aprovagéo em concurso de provas e titulos, nio podendo perder o cargo senao por sentenga judicial transitada em julgado. Uma vez no cargo. os membros do Ministério Pitblico somente podem ser removidos ou promovidos por iniciativa propria, e ndo de oficio, isto é, nao por iniciativa de qualquer autoridade, salvo em uma tinica excegao: por motivo de interesse publico, mediante decisio do érgao colegiado competen- te do Ministério Pablico, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa. O subsidio dos membros do Ministério Publico é irredutivel. Essa irre- dutibilidade é nominal, no real, e nao impede a incidéncia ou o aumento de tributos sobre 0 valor do subsidio. 2.8. Vedacoes constitucionais E vedado ao membro do Ministério Publico (CF, art. 128, § 5.°, ID: a) receber, a qualquer titulo ¢ sob qualquer pretexto, honorarios, percentagens ou custas processuai b) exercer a advocacia; ©) participar de sociedade comercial, na forma da leis d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra fungao publica, salvo uma de magistério; e) exercer atividade politico-partidaria; f) receber, a qualquer titulo ou pretexto, auxilios ou contribuigdes de pessoas fisicas, entidades piiblicas ou privadas, ressalvadas as excegdes previstas em lei. Com a promulgagao da Emenda Constitucional n.° 45/2004, a vedagao ao exercicio de atividade politico-partidaria passou a ter natureza absoluta, nao comportando mais qualquer excegao. Significa dizer que a inelegibili- dade do membro do Ministério Publico passou a ser absoluta, assim como sempre foi a dos membros do Poder Judicidrio. Com isso, os membros do Ministério Piblico nao poderao mais filiar-se a partido politico, tampouco disputar qualquer mandato eletivo, exceto se optarem pela exoneracdo ou aposentadoria do cargo. Esclarecemos que o Conselho Nacional do Ministério Publico regula- mentou essa vedagdo, dispondo que ela so se aplica aos membros do Mi- Cap. 12+ FUNCOES ESSENCIAIS A JUSTICA 671 nistério Publico que ingressarem na carreira apés a publicagéo da Emenda Constitucional n.° 45/2004." Aos membros do Ministério Publico também é vedado exercer a ad- vocacia no juizo ou tribunal em que desempenhava suas fungdes, antes de decorridos trés anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneragao (CF, art. 128, § 6.°). 2.9. Conselho Nacional do Ministério Publico A Emenda Constitucional n.° 45/2004 criou o Conselho Nacional do Ministério Pablico - CNMP, ao qual compete o controle da atuagiio admi- nistrativa e financeira do Ministério Publico e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros. O Conselho Nacional do Ministério Publico compde-se de quatorze mem- bros nomeados pelo Presidente da Republica, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo (CF, art. 130-A): I~ 0 Procurador-Geral da Repiiblica, que © presid Il — quatro membros do Ministério Pablico da Unido, assegurada a representagao de cada uma de suas carreiras; III — trés membros do Ministério Publico dos Estados; IV = dois juizes, indicados um pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiga: V ~ dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; V1 — dois cidadiios de notavel saber juridico e reputagao ilibada, indicados um pela Camara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.O mandato de tais membros é de dois anos, admitida apenas uma recondugdo sucessiva. Estabelece a Constituigao que 0 Presidente do Conselho Federal da Or- dem dos Advogados do Brasil — OAB oficiara junto ao Conselho. Destarte, ele n’o podera ser membro do Conselho como representante indicado pela OAB, apenas tera direito a oficiar perante 0 érgao. Na sua missdo de controlar a atuagdo administrativa e financeira do Ministério Publico e o cumprimento dos deveres funcionais de seus mem- bros, compete ao Conselho Nacional do Ministério Publico (CF, art. 130-A, § 2): # Resolugdo n.° 5, de 20.03.2006. 672 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrina I — zelar pela autonomia funcional e administrativa do Minis- tério Pablico, podendo expedir atos regulamentares, no ambito de sua competéncia, ou recomendar providéncias; Il = zelar pela observancia do art. 37 ¢ apreciar, de oficio ou mediante provocagdo, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou érgios do Ministério Pablico da Unido ¢ dos Estados, podendo desconstitui-los, revé-los ou fixar prazo para que se adotem as providéncias necessdrias a0 exato cumprimento da lei, sem prejuizo da competéncia dos Tribunais de Contas: Ill - receber e conhecer das reclamagdes contra membros ou 6rgaos do Ministério Publico da Uniao ou dos Estados, inclusive contra seus servicos auxiliares, sem prejuizo da competéncia dis- ciplinar ¢ correicional da instituigo, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remogdo, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsidios ou proventos proporcionais ao tempo de servico e aplicar outras sangdes administrativas, assegurada ampla defesa: IV — rever, de oficio ou mediante provocagdo, os processos disciplinares de membros do Ministério Publico da Unido ou dos Estados julgados ha menos de um ano; V — elaborar relatério anual, propondo as providéncias que julgar necessdrias sobre a situagdo do Ministério Publico no Pais e as atividades do Conselho, 0 qual deve integrar a mensagem prevista no art. 84, XI O Conselho serd presidido pelo Procurador-Geral da Republica e devera escolher, em votagao secreta, um corregedor nacional, dentre os membros do Ministério Publico que o integram, vedada a recondugao, competindo a esse corregedor, além das atribuigdes que lhe forem conferidas pela lei, as seguintes (CF, art. 130-A, § 3.°): I - receber reclamagdes ¢ deniineias, de qualquer interessado, relativas aos membros do Ministério Piblico e dos seus ser- vigos auxiliares; HI — exercer fungdes executivas do Conselho, de inspegio e correigao geral: IIL — requisitar e designar membros do Ministério Pablico, delegando-Ihes atribuigdes, requisitar servidores de drgdos do Ministério Publico. Para assegurar maior efetividade a atuagao do Conselho, determina a Constituig&o que leis da Unido e dos Estados deverao criar ouvidorias do Ministério Publico, competentes para receber reclamagées e denuncias de Cap. 12 « FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 673 qualquer interessado contra membros ou 6rgaos do Ministério Publico, inclu- sive contra seus servigos auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional do Ministério Publico. 2.10. Ministério Publico junto aos tribunais de contas A Constituigéo Federal prevé a existéncia de um Ministério Publico junto ao Tribunal de Contas da Unido, devendo ser aplicados aos membros desse Ministério Publico os direitos, vedagdes e forma de investidura previstos para os demais membros do Ministério Publico (art. 130). Houve grande controvérsia sobre a posigdo constitucional desse Minis- tério Publico junto ao Tribunal de Contas da Unido: estaria ele dentro da estrutura do Ministério Publico da Unido, sob a chefia do Procurador-Geral da Republica, ou integraria ele a estrutura do proprio Tribunal de Contas da Unido, sem nenhum vinculo com o Ministério Publico da Unido? O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que o Ministério Pablico junto ao Tribunal de Contas da Unido é instituicao que nado integra o Ministério Publico da Unido, cujos ramos foram taxativamente enumerados no art. 128, inciso I, da Carta Politica. Portanto, prevaleceu a tese de que aquele Ministério Publico é vinculado administrativamente ao proprio Tribunal de Contas da Unifo."” Em consonancia com essa orientagdo, deixou assente o STF que cabe ao proprio Tribunal de Contas da Unido a iniciativa de lei sobre a organizagao do Ministério Publico que junto a ele atua, matéria que poder ser veiculada em lei ordinaria, visto que a iniciativa do respectivo Procurador-Geral ¢ a exigéncia de lei complementar, previstas no art. 128, 5.°, da Constituigao, s6 se aplicam aos ramos do Ministério Pablico comum, enumerados nos incisos Te Il do art. 128 da Carta Politica. Vale notar que o citado art. 130 da Constituigao refere-se, genericamente, 4 existéncia de “Ministério Publico junto aos Tribunais de Contas”, ou seja, a norma nao se restringe ao Tribunal de Contas da Unido. O Supremo Tribunal Federal entende — tendo em vista o fato de o art. 75 da Constituigao determinar a aplicagao, no que couber, aos Tribunais de Contas dos estados das normas de organizacao e composigao do Tribunal de Contas da Uniao — que o Ministério Publico junto aos Tribunais de Contas dos estados nao pode pertencer ao Ministério Pablico comum (dos estados), mas deve, obrigatoriamente, consti- tuir rgio diverso, diretamente vinculado ao respectivo Tribunal de Contas.'! ‘© ADI 892/RS, rel. Min, Septlveda Pertence, 18.03.2002. " “N&o se reveste de legitimidade constitucional a participacao do Ministério Publico comum perante os Tribunais de Contas dos Estados, pois essa participagao e atuagéo acham-se 674 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO = Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino Dessa forma, temos que o modelo federal — 0 Ministério Publico que atua junto ao Tribunal de Contas da Unido integra essa propria Corte de Contas, e sua organizagao sera por meio de lei ordindria federal, de iniciativa privativa do Tribunal de Contas da Unido perante 0 Congresso Nacional — é aplicavel ao Ministério Piblico que atua junto aos Tribunais de Contas dos estados, fazendo-se as devidas adequagdes. Por exemplo, o Ministério Publico que atua junto ao Tribunal de Contas do Estado do Parana integra esta Corte de Contas (c ndo o Ministério Publico estadual), sua organizagao sera por meio de lei ordinaria (e nao por meio de lei complementar) e a iniciativa dessa lei ordinaria, perante a Assembléia Legislativa, é privativa do Tribunal de Contas do Estado do Parana (¢ no concorrente entre 0 Governador e 0 Procurador- Geral de Justiga, como ocorre com o Ministério Publico do Estado). 11. Prerrogativa de foro Os membros do Ministério Publico sao processados e julgados, origina- riamente, por certos tribunais do Poder Judicidrio, garantia que consubstan- cia a denominada prerrogativa de foro, a eles outorgada em homenagem a plena autonomia funcional que deve ser assegurada no desempenho de suas atribuigdes constitucionais. O Procurador-Geral da Repiblica é processado e julgado, originariamente, pelo Supremo Tribunal Federal, nas infragdes penais comuns, e pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade. Os membros do Conselho Nacional do Ministério Publico sao julgados pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade. Nos crimes comuns, cada membro do Conselho Nacional do Ministério Publico respondera perante seu respectivo foro, de acordo com a fungao por ele ordinariamente exerci- da, se houver. Assim, 0 Procurador-Geral da Republica, membro-presidente do Conselho, respondera, nos crimes comuns, perante o Supremo Tribunal Federal. Ja os cidadaos, membros do Conselho indicados pela Camara dos Deputados e pelo Senado Federal, responderao perante a justiga comum, salvo se 0 cidadao indicado for autoridade detentora de foro especial em razio do exercicio de outra fungdo publica. Os membros do Ministério Publico da Unido que atuam perante os Tribunais do Poder Judicidrio e, também, os membros dos Ministérios Pu- blicos estaduais que atuam perante os Tribunais de Justiga sio processados e julgados pelo Superior Tribunal de Justiga — STJ. constitucionalmente reservadas aos membros integrantes do Ministério Publico especial, a que se refere a propria Lei Fundamental da Republica” (STF, ADI 2.884/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 02.12.2004). Cap. 12» FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 675 Os membros do Ministério Publico da Unido — inclusive os membros do Ministério Publico do Distrito Federal e Territérios, ramo do Ministério Publico da Unido — que atuam perante os juizos de primeiro grau sao jul- gados pelo respectivo Tribunal Regional Federal — TRF. Os membros dos Ministérios Publicos estaduais que atuam perante os jui- zos de primeiro grau so julgados pelo respectivo Tribunal de Justiga — TJ. 12. Agao civil publica 2.12.1. Introdugao Como ji analisado, a agdo civil publica encontra-se expressamente pre- vista na Constituigdo da Repiiblica, figurando sua propositura como uma das mais relevantes funcdes institucionais do Ministério Pablico. A disciplina legal da agao civil publica é estabelecida na Lei n: 7347/1985." O crescente reconhecimento da importancia dos grupos sociais na socie- dade contemporanea — os quais constituem verdadeiros “corpos intermedia- rios”, situados entre o ser humano, individualmente considerado, e o Estado — tem como corolario 0 aperfeigoamento das chamadas a¢ées coletivas, para a protegdo dos interesses desses grupos. E exatamente seguindo essa orientagdo que surge, e a partir da Carta de 1988 avulta em importdncia, a acdo civil publica, como agio especial, desti- nada a proteger certos direitos difusos antes nao especificamente amparados pelas ages existentes. Celso Anténio Bandeira de Mello, com a maestria habitual, ensina que: A agao civil pblica — a que alude o art. 129, III, da Constituigao, reportando a competéncia do Ministério Publico para promové-la — € um instrumento utilizavel, cautelarmente, para evitar danos ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artistico, estético, histérico, turistico ou paisagistico, ou, entao, para promover a responsabilidade de quem haja causado lesio a estes mesmos bens. ® Além desta, existem leis especiais que cuidam da ago civil publica no Ambito do mercado de capitais (Lei n.° 7.913/1989); na defesa do consumidor (Lei n.° 8.078/1990); na defesa da crianga e do adolescente (Lei n.° 8.069/1990); nas infragdes da ordem econdmica e da ‘economia popular (Lei n.° 8.884/1994), Nesses casos, aplica-se precipuamente a respectiva lei especial e, subsidiariamente, no que couber, a Lei da Acao Civil Publica geral (Lei n.° 7.347/1985). 676 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO « Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino Interesses difusos podem ser conceituados como aqueles dispersos por toda a comunidade, e que apenas 4 comunidade, como um todo, dizem respeito. Sao necessidades comuns a uma pluralidade de individuos, que somente podem ser satisfeitas numa perspectiva comunitaria. E 0 caso da defesa do meio am- biente, da defesa do patriménio histérico, da protegéo do consumidor ete. A aio civil piblica é, em suma, mais uma agdo de natureza coletiva que, ao lado do mandado de seguranga coletivo e da agaio popular, se destina 4 defesa de interesses de grupos sociais 2.12.2. Objeto da acdo civil publica A acio civil publica originalmente possuia um campo de aplicagao bas- tante restrito, abrangendo a protegao de apenas alguns interesses taxativamente enumerados no texto legal. Ulteriormente, no entanto, a legislagao ampliou significativamente seu espectro de proteg’o, permitindo que sejam tutelados por meio da agio civil pilblica: a) 08 interesses coletivos, difusos e individuais homogéneos relativos ao meio ambiente, ao consumidor ¢ ao patriménio artistico, estético, histérico, tu- ristico ¢ paisagistico; b) outros interesses difusos ou coletivos (aqui, nesse campo genérico, nao se incluem os intcresses individuais homogéneos). Leis posteriores ampliaram ainda mais 0 alcance da a¢gdo civil publica, que passou a ser instrumento para a defesa dos deficientes fisicos; dos in- vestidores no mercado de capitais; da ordem econdémica ¢ economia popular; e das criangas e adolescentes. Vale frisar que 0 ajuizamento da agao civil publica nfo impede a propo- situra de agdes individuais sobre 0 mesmo objeto, nem gera litispendéncia. 2.12.3. Restri¢6es ao uso da a¢ao civil publica Nao podemos deixar de anotar que, atualmente, existe uma tendéncia a utilizagao generalizada ¢ indiscriminada da agao civil pablica. Essa constatagio é sobremaneira preocupante, uma vez que a doutrina ha muito reconhece que “a generalizacdo no uso de um instituto jurfdico leva 4 sua menor eficiéncia” (Arnoldo Wald). Com efeito, o uso generalizado e indiscriminado da agao civil publica, na tentativa (ainda que quase sempre bem intencionada) de se albergar sob 0 Cap. 12+ FUNCOES ESSENCIAIS A JUSTIGA 677 seu manto direitos patentemente nado enquadraveis como difusos ou coletivos, tende a enfraquecé-la, pois sua conseqiiéncia é a tendéncia a limitagao legal ou jurisprudencial do alcance da agao, como reagao aos excessos verificados. A esse respeito, algumas orientagdes do Supremo Tribunal Federal me- recem destaque, ¢ serao a seguir comentadas: (i) a vedagdo a propositura de agao civil piiblica com base na eqitidade (fora dos casos expressamente previstos em lei); (ii) a ndo aplicagiio da ago civil publica em matéria tri- butaria; e (iii) a impossibilidade de utilizagio da ago civil publica como sucedaneo da acao direta de inconstitucionalidade. Quanto a vedag4o ao uso da aco civil publica sob o fundamento de emprego da eqitidade, ja decidiu o STF que essa ago sé € cabivel para tutela dos interesses e direitos expressamente previstos em lei, aplicando-se a ela © principio do numerus clausus (ou da taxatividade). Em suma, segundo a Corte Constitucional, nao cabe ajuizamento de acao civil publica baseada na eqiiidade, para hipdteses nao previstas em lei. O segundo ponto de grande relevancia concerne a impossibilidade de uso da agao civil publica para atacar Icis ou atos normativos, que instituam ou disciplinem tributos, cuja constitucionalidade seja duvidosa. E firme a orientago do Supremo Tribunal Federal no sentido de que o Ministério Piblico no tem legitimidade para o ajuizamento de agao civil publica com a finalidade de declarar a inconstitucionalidade de tributos e obter a restituigao dos valores indevidamente pagos. Em se tratando de tributo acoimado de inconstitucional, 0 meio idéneo para o controle da constitucio- nalidade da respectiva lei é a agao direta de inconstitucionalidade — ADI, prevista no art. 102, I, “a”, da Carta Politica. Ademais, de forma mais ampla, 0 STF ja deixou assente que a acdo civil publica nao pode ser utilizada como sucedaneo da ago direta de inconsti- tucionalidade, para o controle de constitucionalidade, em tese, de leis e atos normativos, pois nesse caso estaria havendo usurpagao da competéncia do Supremo Tribunal Federal pelos juizos inferiores. Cabe ressaltar, entretanto, que é legitima a utilizagado da agao civil publica como instrumento de fiscalizagao incidental de constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos do Poder Publico, desde que a controvérsia constitucional nao se identifique como objeto unico da demanda, mas simples questo prejudicial, indispensdvel 4 resolugao do litigio principal.'* Esse con- trole incidental em sede de acdo civil publica, como em outras agdes, pode ter por objeto leis federais, estaduais, distritais ou municipais. * RE 424.993/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 12.09.2007. 678 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO « Vicente Paulo & Marcelo Alexandrina O Prof. Alexandre de Moraes cita um bom exemplo de utilizagao da ag¢ao civil publica como meio de controle de constitucionalidade difuso, nos seguintes termos: O Ministério Publico ajuiza uma agao civil publica, em defesa do patriménio publico, para anulagdo de uma licitagao baseada em lei municipal incompativel com o art. 37 da Constituigao Federal. O juiz ou tribunal — CF, art. 97 — poderao declarar, no caso concreto, a inconstitucionalidade da citada lei municipal, € anular a licitagdo objeto da agdo civil publica, sempre com efeitos somente para as partes e naquele caso concreto. 2.12.4. Partes na acéo civil publica Podem propor aco civil publica (sujeitos ativos): I — 0 Ministério Publico; Il — a Defensoria Publica; Ill — a Unido, os Estados, o Distrito Federal ¢ os Municipios; TV — a autarquia, empresa publica, fundagdo ou sociedade de economia mis- V — a associagdio que, concomitantemente: a) esteja constituida ha pelo menos | (um) ano nos termos da lei ci- vil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a prote¢io ao meio am- biente, ao consumidor, 4 ordem econdémica, a livre concorréncia ou ao patriménio artistico, estético, historico, turistico e paisagistico. Na sujeicao passiva, podem figurar todos os responsaveis pelas situagdes ou fatos ensejadores da a¢do (danos ao meio ambiente, ao consumidor etc.), sejam pessoas fisicas ou juridicas, inclusive as estatais, da Administragao direta e indireta. 2.12.5. Atuagéo do Ministério Puiblico na acdo civil publica A promocao da acao civil publica é uma das fungées institucionais do Ministério Puiblico, ocupando 0 Parquet posicao privilegiada no seu proceso, conforme abaixo se demonstra: a) € um dos legitimados para 0 ajuizamento da ago; Cap. 12 + FUNGOES ESSENCIAIS A JUSTICA 679 b) se a ago nao for por ele proposta, atuaré como parte auténoma, zelando pela regularidade do processo ¢ pela correta aplicagao da lei; c) se houver desisténcia infundada ou abandono da ag&o por associagao legitimada, deverd assumir a titularidade ativa; d) se, decorridos 60 (sessenta) dias da sentenga condenatéria, a associagao autora da ago ndo promover a execugdo, é sua obrigagdo fazé-lo; ©) esta isento de custas e honorarios advocaticios (énus de sucumbéncia) no caso de improcedéncia da ago civil publica por ele proposta; E admitida a formagao de litisconsércio facultativo entre os Ministérios Publicos da Unido, dos estados e do Distrito Federal na agao civil publica. Ademais, qualquer pessoa podera e o servidor publico deveré provocar a iniciativa do Ministério Publico, fornecendo-Ihe informagées sobre fatos que constituam objeto da agao civil publica, indicando-lhe os elementos de convicgao. De igual modo, os juizes e tribunais que, no exercicio de suas fungdes, tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ago civil piblica, deverdo remeter pegas ao Ministério Publico para as providéncias cabiveis. Evidentemente, 0 Ministério Publico nao esta obrigado, nessas hipdteses, a propor a acao civil piiblica. Se 0 Parquet se convencer da inexisténcia de fundamento para o ajuizamento da ag4o, promoverd o arquivamento dos autos, do inquérito civil ou das pegas informativas recebidas, fazendo-o motivada- mente € remetendo sua manifestagdo ao Conselho Superior do Ministério Publico, para a deliberacdo definitiva sobre o arquivamento. Entretanto, ajuizada a agdo civil publica, dela no pode desistir o Ministério Publico, por ser indisponivel o seu objeto. Podera, porém, diante das provas produzidas no curso do proceso, opinar ao final pela improcedéncia da agao. 212.6. — Responsabilidade do réu Na ago civil publica, 0 réu tem responsabilidade objetiva perante danos causados ao meio ambiente. Significa dizer que o poluidor é obrigado, independentemente da existéncia de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente. Em face dessa responsabilidade objetiva, o autor da agao civil publica nao precisa demonstrar culpa ou dolo na conduta danosa do réu. E suficiente que fique evidenciado 0 nexo de causalidade entre a aga (ou omissio) do réu e 0 dano causado ao bem que se visa a proteger. 680 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO + Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino Desse modo, a defesa do réu na aco civil publica é restrita 4 demons- tragdo: (a) de que nao foi ele o responsdvel pela pratica do ato ou pelo fato lesivo; (b) de que a ocorréncia nao é lesiva ao meio ambiente; (c) de que nao houve a conduta impugnada. tee Sentenca A sentenga na agao civil publica condenara o réu ao pagamento em dinheiro ou a obrigacdo de fazer ou nao fazer. Comungamos com Hely Lopes Meirelles a opinido de que a sentenca que melhor se coaduna com a natureza da agao civil publica é aquela que impéde a obrigacaio de fazer ou nio fazer, haja vista sua precipua finalidade, que & obstar ou reparar a lesio ao bem juridico. Para o citado mestre: Esta imposigao judicial de fazer ou nao fazer ¢ mais racional que a condenagdo pecuniaria, porque, na maioria dos casos, 0 interesse piblico ¢ mais o de obstar a agresstio ao meio am- biente ou obter a reparagiio direta in specie do dano do que de receber qualquer quantia em dinheiro para sua recomposi¢ao, mesmo porque quase sempre a consumagao da lesio ambicntal é irreparavel, como ocorre no desmatamento de uma floresta natural, na destruigo de um bem histérico, artistico ou paisa- gistico, assim como envenenamento de um manancial, com a mortandade da fauna aquatica. A sentenga proferida na agao civil publica aplica-se em todo 0 territério de jurisdigao do juiz prolator da sentenga, conforme sua competéncia territorial. 2.12.8. Inquérito civil e ado civil publica Estabelece a Carta da Reptblica que é fungao institucional do Ministério Publico promover o inquérito civil ¢ a agdo civil publica, para a protegado do patriménio publico e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, II). O inquérito civil e a agao civil publica sao institutos distintos, embora guardem relagdo entre si, conforme explicitado a seguir. O inquérito civil é procedimento meramente administrativo, de natureza pré-processual, que se realiza extrajudicialmente, no 4mbito do Ministério Publico. Em verdade, 0 inquérito civil é um procedimento administrativo pre- paratério, que tem por objeto coligir provas e quaisquer outros elementos de Cap. 12 » FUNCOES ESSENCIAIS A JUSTICA 681 conviccio, que possam fundamentar a atuagao processual do Ministério Pa- blico. E um meio, facultativo, de viabilizar 0 exercicio da aco civil publica, evitando-se a propositura de eventuais acdes temerdrias. No curso do inquérito civil, ha possibilidade de uma melhor andlise dos elementos e provas apontados como fundamento para a propositura da acao civil publica. Permite que o Ministério Publico avalie bem a conveniéncia ou nao da propositura da agao civil. A instauragio do inquérito civil nfo obrigara 0 Ministério Publico a ajuizar a agao civil publica. Concluido o inquérito civil, desde que lhe pa- recam insuficientes as provas e demais elementos de convicgdo coligidos, poderd decidir pela ndo propositura da ado civil publica, determinando o seu arquivamento. A instauragéo do inquérito civil é facultativa; nfo constitui ele pres- suposto para o ajuizamento da ago civil publica. Ainda, a existéncia de inquérito civil, ou mesmo o seu arquivamento, n4o obsta o ajuizamento da ac&o civil publica pelos demais titulares ativos (associagdes e entidades estatais). Em suma, podemos enumerar como caracteristicas do inquérito civil: pro- cedimento administrativo, natureza instrumental, pré-processual, facultativo. 212.9. Acdo civil publica e ado popular Embora sejam agdes de natureza coletiva, e possa ocorrer de um mesmo fato ensejar a propositura da acao popular e o ajuizamento da agao civil pu- blica, as finalidades dessas agdes sao distintas, e ha entre elas dessemelhangas que merecem ser estudadas. A primeira diz respeito a legitimidade ativa, que na acdo popular é outorgada, privativamente, ao cidad&o, ao passo que na acao civil publica pertence ao Ministério Publico, entidades estatais e associagdes que atuam na defesa dos interesses por ela tutelados. A segunda diz respeito 4 natureza da sentenga proferida pelo magistrado. Na agSo popular, a sentenga é preponderantemente desconstitutiva e apenas subsidiariamente condenatéria, porquanto o dever de reparar 0 dano s6 surge com a desconstituiga0 do ato ou contrato impugnado. Na agio civil publica, a sentenca é preponderantemente condenatéria —em dinheiro ou em obrigagao de fazer ou nao fazer -, até porque, na maioria das vezes, a desconstituigao do dano causado nao é possivel (a poluigdo de um rio, com a conseqiiente morte de milhares de peixes e outros animais aquaticos, por exemplo, ndo pode ser desconstituida). 682 DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO « Vicente Paulo & Marcelo Alexandrino Por esse motivo, podemos ter a concomitancia de agdo popular e agao civil publica relativamente ao mesmo fato, vale dizer, a propositura de agao civil publica nao exclui a ago popular.'* Vale registrar, todavia, que a jurisprudéncia tem se firmado no sentido de que nao cabe ago civil publica com pedido tipico de aco popular, e vice-versa, 3. ADVOCACIA PUBLICA A Advocacia-Geral da Unido foi criada com o fim de afastar de vez do Ministério Piblico Federal a fun¢do de advocacia da Unido, regime que vigorava na vigéncia da Constituicdo pretérita. Com efeito, sob a égide da Constituigéo de 1969, os membros do Ministério Publico Federal ora desempenhavam a sua fungao tipica, ora atuavam como Procuradores da Republica no exercicio da advocacia da Unido, vale dizer, como advogados representantes da Unido. A vigente Constituigao, acertadamente, acabou com essa dualidade de fungao do Ministério Publico, criando a Advocacia-Geral da Unido, 4 qual cabe, diretamente ou por meio de 6rgao vinculado, representar a Uniio, judicial e extrajudicialmente, bem como prestar as atividades de consultoria € assessoramento juridico do Poder Executivo (CF, art. 131). Note-se que sao duas fun¢ées distintas. Pela primeira, a Advocacia-Geral da Unido representa, judicial e extrajudicialmente, a Unido, aqui engloban- do seus diversos érgios, nos trés Poderes da Republica, e ndo sé o Poder Executivo. Pela outra, cabe-lhe prestar consultoria e assessoramento juridico ao Poder Executivo federal (esta Ultima atribui¢do, insista-se, sé alcanga o Poder Executivo federal). A Advocacia-Geral da Unido é chefiada pelo Advogado-Geral da Uniao, cargo de livre nomeagao e exoneracao pelo Presidente da Republica, entre cidaddos maiores de trinta e cinco anos, de notavel saber juridico e repu- tagao ilibada. O Advogado-Geral da Unido dispde de status de Ministro de Estado, inclusive para o fim de foro por prerrogativa de fungdo perante o Supremo Tribunal Federal. Assim, sera ele julgado pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade, e pelo Supremo Tribunal Federal, nos crimes comuns.'* © O art. 12 da Lei n° 7.347/1985 dispée, expressamente, que a aco civil publica nao afasta a agao popular. © CF, arts. 52, fl, e 102, I, “c”

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