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ORGANIZACAO PANAMERICANA DA SAUDE lie? ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE 5 CONTRIBUIGOES SOBRE A GESTAO DE QUALIDADE EM EDUCACAO MEDICA SERIE DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS HUMANOS N° 7 REPRESENTACAO DO BRASIL BRASILIA, 1994 ORGANIZACAO PANAMERICANA DA SAUDE ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE, CONTRIBUICOES SOBRE A GESTAO DE QUALIDADE EM “EDUCAGAO MEDICA SERIE DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS HUMANOS N°7 REPRESENTACAO DO BRASIL BRASILIA, 1994 © ORGANIZAGAO PANAMERICANA DE SAUDE, As denominagdes empregadas na presente publicagio e a forma em que sao apresentados os dados na mesma contidos nao implicam, por parte da Organizacao Panamericana de Saide, juizo algum sobre a condicdo jurfdica de qualquer pai territ6rio, cidade ou zona citada, sobre suas autoridades, nem sobre a delimitagfio de suas fronteiras As opinides emitidas na presente publicagdo so de exclusiva responsabilidade dos autores © material contido nesta publicagdo pode citar-se ou reproduzir-se sem restrigdes, sempre que indique a fonte ¢ se faca referéncia ao mimero do documento. Deverd remeter-se & Representagao da OPAS/OMS no Brasil um exemplar da publicagio em ‘que aparega o material citado ou reproduzido. Esta publicagéo contou com 0 apoio do Centro de Ciéncias da Satide da Universidade Estadual de Londrina, Centro colaborador da OMS em Educagio e Pritica Médicas, € com 0 co-patrocinio do PROUNI-LD (Projeto "Uma Nova Iniciativa na Educagao dos Profissionais de Satide em Londrina: Unido em Comunidade”). FICHA CATALOGRAFICA SANTANA, José Paranagué de et ALMEIDA, Mércio José de Contribuigdes sobre a Gestdo de Qualidade em Educagio Médica. Brasilia, OPAS, 1994. 67 p. (Série Desenvolvimento de Recursos Humanos, N° 7). 1. Recursos Humanos. 2. Educacdo Médica. 3. Gestto de Qualidade, Titulo I. Série. ae ptt Vi. SUMARIO Apresentagao As transformagées da Profissio Médica e sua influéncia sobre a Educagio Médica. - : 1 FEPAFEM e OPS As recomendagées da II Conferéncia Mundial de Educagiio Médica __ 17 (Edimburgh, 1993). Uma proposta de Gestdo da Qualidade na Educagio Médica. 33 OPS. . Gestiio da Qualidade do Ensino Médico -----..------------------- 49 Roberto Passos Nogueira Declaragdo do Uruguai ——- 55 (Punta del Este, 10-14 de outubro, 1994), Relatorio dos Grupos de Trabalho do Encontro Continental de Educagio Médica. ———EEEE 56 (Punta del Este, 10-14 de outubro, 1994). APRESENTACAO. EDUCAGCAO, PRATICA MEDICA E NECESSIDADES SOCIAIS José Roberto Ferreira® discurso recente sobre 0 desenvolvimento da pritica médica ¢ sua relagio com a formagiio médica esté impregnado de um tom que & ao mesmo tempo de critica a resignagdio ou conformismo. Se refere a uma medicina institucionalizada, socialmente segmentada e dependente de um trabalho coletivo, no qual se diluem a relagio médico-paciente e os critérios de ética e responsabilidad profissional. Tudo isto a um custo superior ao que pode suportar a sociedade e 0 préprio Estado, em contextos que todavia atribuem a este iiltimo a obrigagiio de cuidar da satide da populagao. Se aceita 0 cardter hegeménico desta pritica e, sem deixar de considerar a autonomia relativa da Escola Médica, se admite como inevitavel a transmissao de uma determinada cultura profissional dominante que reforga, em tiltima andlise, aquele “status-quo", ‘A base predominantemente hospitalar, de um lado, ¢ 0 desenvolvimento e incorporagdo de tecnologia, de outro, tem induzido a um aumento da especializagao e superespecializagao. © corpo docente clinico encontra este ambiente favoravel ao seu préprio desenvolvimento e termina por priorizar as atividades de pés-graduagao, em detrimento da orientag&o basica e geral da graduagio. Ainda quando a Escola ndo chega a ter uma programacao formal de pés-graduagao, se vé reforgada précocemente a tendéncia & especializagdo, mesmo na etapa prévia a graduagio. E 6bvio, entretanto, que todo este modelo que se aceita como hegemdnico esté longe de poder atender as necessidades da populagao como um todo, restringindo-se em sua cobertura e distribuigdo geogréfica, em termos técnicos e sociais. E 0 complexo médico-assistencial e 0 médico em seu interior que determinam o padrao de assisténcia que valoriza a capacidade resolutiva pontual e dispersa a visio de conjunto do estado de satide do individuo e da sociedade. E neste sentido conta com o respaldo dessa mesma sociedade que igualmente procura a exceléncia técnica e sofisticagio assistencial, sem tomar em conta as restrigdes que isto impée para a maioria de seus membros, tanto na + Chefe do Programa Especial de Desenvolvimento de Recursos Humanos da Organizagao Pan-americana da ‘Satide/Organizagio Mundial da Sade - 1994. cobertura coletiva como na abordagem individual. Para contrabalangar esta situagdo se propde as escolas "um novo compromisso social" que resgate sua fungdo institucional e thes autorgue renovada legitimidade. Se propée a necessidade de "um novo modelo cientifico biomédico e social” que projete € fundamente um novo paradigma educativo em fungao do individuo e da comunidade. Se destaca a necessidade de um novo estatuto de valores que transcenda a influéncia das mudangas nos padrées de prética, reconstrua a ética das relagdes basicas do exercicio profissional e a fungao social de atender as necessidade de satide. Entretanto, considerando a estreita relacdo entre a visio dos responsdveis pela educagao médica, a elite populacional em que se situa o préprio médico e a clientela assistida nesse enfoque pontual, hd quem diga que dificilmente se pode introduzir reformas que desafiam sua propria sobrevivéncia ou mudam uma estrutura que, no momento presente, satisfaz a seus beneficidrios. Com a pletora de conhecimentos e informacao e o hospital docente transformado num centro de distribuigio de alta tecnologia, com a idéia de exceléncia técnica associada & superespecializaciio e os professores necessariamente incorporando este critério de valorizagdo; e finalmente com os alunos aspirando igualmente uma pratica auténoma e altamente tecnificada, € facil compreender 0 porqué da procura das especialidades, relegando a aprendizagem basica geral a um plano secundério e desaproveitando a etapa da formagio em que mais se poderia destacar a relevancia da educagio médica. Nesse contexto a resignagdo é parte de uma postura fisiolégica com a mesma concentragao de beneficios que oferece a medicina moderna, na qual frequentemente se associa a idéia de qualidade ao sofisticado e de alto custo, que se restringe a uma minoria absoluta, de maior poder aquisitivo. Importantes figuras da prépria educagio médica j4 ha mais de uma década caracterizavam a toda esta situag3o como de verdadeira crise. Entretanto, 0 que vemos hoje nos situa em uma posigao que supera 0 que se poderia chamar de crise, se a definimos, como nos ensinou André Bejin: 0 momento da verdade (no qual 0 objeto se aferra a seu enfoque atual) e a emergéncia evolutiva (a um novo espago potencial). O dilema da crise pressupde fundamentalmente a possibilidade de reversio, tanto se pode seguir aferrado ao enfoque atual como adotar uma nova orientag%o. Mas a resignagiio teforgada pela convivéncia dos préprios atores, afasta qualquer possibilidade de reversao ou pelo menos de procura de alternativas que permitam o resgate do compromisso com a sociedade como um todo. E com esta postura pessimista que retomamos no momento presente a procura de uma tabua de salvacio que oferega a oportunidade de situarnos num momento de verdade, para ndo somente liberar as amarras atuais, como também retormar um desenvolvimento mais ajustado aos princfpios éticos que se propugnam no novo contrato social. Depois de um longo perfodo de calmaria no campo da educagiio médica, que na pritica, para nés na América Latina coincidiu com a chamada “década perdida do ii desenvolvimento", entramos nos anos 90 com alguns sinais de reagio, sen’io j4 com a transformagao do processo formativo, pelos menos com claros indicios de retomada do debate que trata de transformar este processo. A reunido de Edimburgo no final da década passada, a de Havana em 1991 outra vez. a reunido de Edimburgo de 1993, independentemente das abordagens adotadas e dos resultados apresentados, se constituem em si mesmo numa demonstracio evidente desse despertar dos educadores médicos. Especialmente na América Latina este fendmeno mostrou grande intensidade incluindo nao s6 as reunides de rotina das Associagdes Nacionais de Escolas Médicas, de FEPAFEM e da ALAFEM, como também uma série de esforgos extraordinarios na etapa preparat6ria da Conferéncia de Havana e ultimamente a série de reunides que levaram a formulagdo do documento de posigao apresentado na reunidio do ano passado, que se inclui nesse volume. Movimento de intensidade equivalente se vem observando igualmente nos Estados Unidos, aonde durante todo este século se registraram 15 internvengdes importantes a nivel nacional, comegando com o famoso relatério Flexner de 1910 e culminando nos tiltimos quatro anos com 3 iniciativas de reformas que incluem relatérios preparados pela "Macy Conference on Clinical Education and the Doctor of Tomorrow", pelo "Robert Wood Johnson Foundation - Commission on Medical Education" e pela “PEW Health Professions Commission - Practioners for 2005". Posteriorimente 0 JAMA dedicou todo seu ntiimero da semana de 7 de setembro do corrente ano A educagio médica. E embora se tenha protelado para 0 préximo ano o debate sobre a reforma de satide proposta pelo Presidente Clinton, permamece {ntegra no seu interior importante intervengdio nos niveis de formacéio que trata de assegurar um melhor equilibrio entre especialistas ¢ generalistas ¢ favorecer uma distribuigéio socialmente mais adequada da forga de trabalho médica. A presente publicagdo se inclui no contexto de toda esta mobilizagéio no afa de aproveitar o "momentum" que se vem gerando com a conscientizagio de uma massa critica de especialistas e autoridades rsponsdveis, tanto da area académica como dos servigos de satide. J4 nao € possivel manter uma posi¢ao expectante e conformista frente A crise a que nos referimos anteriormente. Na verade, da referéncia inicial em quanto ao tom do discurso recente, talvez tenhamos que ser menos criticos na nossa dentincia, mas nunca resignados na conformagao da proposta prospectiva. Se impée seguir devidamente a expansiio desta onda de conscientizagdo e logo iniciar a considerar mais detidamente as alternativas de instrumetalizagdio das mudangas necessérias. Entretanto, quando se fala de mudanga, usualmente a primeira iniciativa é promover uma reforma curricular, embora a experiéncia acumulada tenha demonstrado a insuficiéncia dessa pratica, limitada quase sempre a ajustes de posicionamento disciplinar e carga hordria. Steve Iliffe num artigo recente publicado em um periddico briténico, comegava declarando que "quanto mais se modifica a educag&o médica mais ela continua a mesma", o que em ultima anilise reflete o cardter dominante do padrao de pratica profissional que supera qualquer tentativa de reorientagao formativa. Em prinefpio, estamos de acordo com Daniel Collahna quando, em seu livro “What Kind of Life", diz que seria necessario que a medicina reconhecera "que seu objeto nao pode ser a superagdo ao extremo e em cardter permanente de todos os problemas de satide, sendo que deveria estar referido a melhoria da qualidade de vida" “A dindmica da mudanga tem que considerar em forma integrada os aspectos biolégicos, sociais e econémicos, jogando com a evolugdo acumulativa das causas, 0 controle realista do potencial tecnolégico ¢ a reorientagao do apetite da mesma sociedade por uma crescente e ut6pica técnica que conduz quando muito a ganhos marginais". E em todas estas proposigées, que aqui sumarizamos, que também esto presentes nas demais contribuigdes incluidas nesta publicagao, se vislumbram os ingrendientes de um novo paradigma que possa orientar a emergéncia em que nos encontramos. Em termos gerais, estes ingredientes poderao incluir: — A redefinigiio dos conceitos de satide e doenga, englobando-os num ambito transdisciplinério que articule 0 conhecimento biolégico e social; — O redirecionamento do avango tecnolégico em fungao da necessidade politica de ajustar-se aos problemas nacionais a partir de um esforgo de pesquisa centrado na realidade; — Oredirecionamento dos espagos de pratica tomando em conta seus niveis de complexidade de uma nova pritica; e —O reconhecimento e integragiio desta prética nos avangos da cidadania e dos processos de participaciio da sociedade civil dentro do novo contexto de democracia que vive a América Latina. Porém este novo paradigma carece todavia de uma abordagem espistemolégica que permita sua total compreensio e respalde sua aplicagio na realidade em que vivemos. O que tratamos de promover com esta série de documentos é oferecer elementos & Escola Médica para assumir ela mesma a lideranga da transformagio que hoje, mais do que nunca, se sente como extremamente necessaria. Entre os artigos que aqui se incluem queremos destacar 0 que trata do enfoque de gestdo estratégica de qualidade, que se utilizou como documento basico no recente Encontro Continental de Educagdo Médica em Punta del Este. A idéia de que os elementos de um possfvel novo paradigma leve & reconsideragdio da propria nogdo de qualidade, pode superar seu vinculo exclusivo com o sentido de exceléncia técnica passando a refletir relevancia e satisfago da sociedade como um todo, a critérios éticos de eqilidade e justiga social. Qualidade, cuja legitimagdo depende nao s6 do saber profissional sendo também da valorizagio da prépria sociedade, que representa na realidade o terceiro ato do proceso de trabalho em satide. sociando-se a O papel da Escola Médica em toda esta transformagao teré que incluir 0 aprofundamento da andlise de todo este complexo, partindo da avaliagdo de suas proprias iv atividades e ampliando numa visio prospectiva a redefinigo de sua missio. Tudo isto num continuo que toma em conta a participagado da Escola em estreita relagéo com os servigos de satide e representantes da sociedade organizada. A seqiiéncia operacional deste esforgo, que se propée no mesmo documento, no deve de forma alguma ser tomada como receita, sen’io que se apresenta como um exemplo de desenvolvimento evolutivo que poderé variar em cada caso, ajustado as peculariedades de cada situagdio e enfoque metodoldgico que se adote. O importante reconhecer o potencial ¢ as limitagdes da avaliagio externa, da auto-avaliagdo ¢ do acompanhamento evolutivo da gestio de qualidade. E 0 que se procura é a transformagao a partir de um processo participativo que tome em conta a analise do entorno contextual e a extrapolagdo prospectiva do mesmo no redirecionamento da missio de formar médicos. Igualmente hé que se ter presente que 0 proprio desenvolvimento do proceso formativo dever ser objeto de uma permanente problematica, tomando em conta a integragdo entre atores e situagdes em transformacao. Estas consideragdes a0 mesmo tempo que introduzem a coletanea de trabalhos reunidos nesta publicagdo, se constituem na conseqiiéncia natural de um processo de elaboragdo que se desenvolveu durante os tiltimos 2 anos, em fungiio da realizagio da segunda reunitio mundial de Educagdo Médica em Edimburgo. No contexto da América Latina, tratamos de promover uma série de debates preparatérios sobre 0 tema Mudanca da Educagao e Pratica Médica, com base em um documento basico, que incluimos igualmente nessa publicagao. Dos debates realizados a nivel nacional e sub-regional foi possivel conformar 0 "documento de posigio da América Latina", que representou em Edimburgo o pensamento de nossos educadores médicos. A partir daf, 0 compromisso de seguir avangando e procurar mecanismos para operacionalizar as proposigdes daquele documento, conduziu a uma segunda etapa da anélise, procurando através da avaliagio institucional, planificagao estratégica e gesttio de qualidade, poder orientar uma real transformacio da educagio médica. As idéias aqui reunidas consistem um subsidio para esta andlise que tera que ser desenvolvida pelas préprias Escolas e que esperamos, possa tomar em consideragao: ' a redefinigo de satide em fungao do bem estar e da qualidade de vida; — o esgotamento do modelo de formagdo e pratica médica, centrado no que se convencionou chamar de paradigma Flexneriano; — anecessidade de um novo paradigma tomando em conta o conceito de cidadania, a transdisciplinaridade no biolégico e social, a complexidade controlivel e a integragao com a pritica; — a oportunidade favor4vel 4 mudangas de maior transcedéncia no contexto das reformas de satide e da dimensao internacional em que se desenvolve todo o processo; — ea importancia de chegar a um consenso na adogao de uma nova visao de qualidad - enfatizando a relevancia social, - envolvendo a voz do usuario, - criando consciéncia quanto as propriedades, beneficios e limitagdes dos servigos, - assumindo responsabilidades na satisfag&o de demandas e necessidades, - valorizando a capacidade cientffico-técnica, as qualidades humanas e atitudes sociais e éticas. Tudo isto para poder aplicar a critica para superar, de uma vez por todas, a Tesignagdo e a crise que restringe 0 avango a um espaco potencial que propde 0 novo contrato social da educagio e pritica médicas. Contrato que teré que se desenvolver com eqiiidade e num contexto ético e de justiga social. 4 As Transformagées da Profissio Médica e Sua influéncia sobre a Educagéo Médica* Introdugao Tema I - © Contexto Geral 1.1, Estado e Sociedade: Novas Relagdes 1.2, Situacdo da Satide e dos Servigos 1.3. A Universidade 1.4.As Expectativas Crescentes e a Diminuigao das Oportunidade ‘Tema 2- A Natureza Mutante da Pratica Médica. 2.1. A Profissio Médica sob Tensio. 2.2. Institucionalizagio da Pratica Médica 2.3. Dilemas da Educagiio Médica 2.4. Btica Individual e Btica Coletiva Tema 3 - Resposta A Expansiio do Conhecimento e ao Avango Tecnolégico. 3.1. Reconsiderag’io da Base Cientifica da Medicina: Articulagao dos Conhecimentos Biomédicos e Sociais 3.2, Interdisciplinaridade e Enfoque Problematizador 3.3. Avaliagdo Tecnolégica 3.4, Desenvolvimento do Processo de Ensino-Aprendizagem num Contexto Assistencial e de Pesquisa Conclusdes Referéncias Bibliograficas * Documento de posigio da América Latina apresentado pela FEPAFEM na Il Conferéncia Mundial de Educago Médica (Edimburgo, 8-12 de agosto de 1993). Formulado com a colaborago da OPS/OMS. ‘Traduzido por Azucena G. Oberdick INTRODUGAO Faltando sete anos para o fim do milénio ¢ para o prazo que os paises do mundo estabeleceram para conseguir a meta de “Satide para Todos no Ano 2.000", a 2* Conferéncia Mundial de Educagao Médica reune-se na mesma cidade onde hd cinco anos realizou-se a 1* Conferéncia Mundial promovida pela Federagao Mundial de Educagao Médica. Para analisar as caracteristicas da educacio médica estamos obrigados a refletir sobre as principais tendéncias sociais e politicas, bem como sobre 0 modelo de desenvolvimento econémico dominante. E em fungdo da organizagao e dinamica do Estado, da economia, do desenvolvimento cientifico e tecnolégico e das necessidades sociais, entre elas a satide e as formas em que seu atendimento € organizado, que a pratica médica se estrutura, conserva e modifica. Por sua vez, as mesmas condigoes, seja diretamente ou através da prépria pratica, orientam ¢ dao forma aos contetidos, as estratégias e mecanismos do processo de formagiio médica. Nao foi esta a abordagem da Primeira Conferéncia de Edimburgo (1988) quando a andlise se centrou nas dimensdes educacionais (curriculares) da pratica universitaria nas implicagoes individuais da pratica profissional e na extensio dos espagos institucionais de formagao, Isso nao permitiu salientar e atualizar a natureza e especificidade das relagdes entre projeto educativo e contexto s6cio-sanitério. De certo modo, para as escolas da América Latina, as conclusdes de Edimburgo significaram, essencialmente, linhas para uma maior eficiéncia educacional no contexto de um modelo educativo nao questionado. Nesta nova oportunidade, as escolas e faculdades de medicina da América Latina assistem 4 Conferéncia Mundial nao como espectadores indiferentes perante 0 complexo cenério atual, mas sim com a preocupagdo de participar na reflexdo andlise objetiva e calma das idéias, da agdo e do compromisso da educagdo médica na sociedade atual. Para a formulacio deste documento de posigdo, durante os tiltimos doze meses desenvolveu-se um amplo trabalho preparatério com 0 apoio da Organizagao Panamericana da Saide/(PAHO/WHO) e da FederagdoPanamericana de Associagdes de Faculdades/Escolas de Medicina (FEPAFEM). Neste esforgo cumpriram-se as etapas seguintes: 1. A preparagao de documentos basicos encomendados a cientistas sociais, economistas, educadores médicos e sanitaristas da regiao (1,2,3,4). 2. Realizagdo de um “task-force” na OPS/OMS em Washington, de 28 de setembro a 2 de outubro de 1992 onde foram revisados os mencionados documentos e produzido outro denominado "As mudangas da profissao e sua influéncia sobre a educagiio médica" (5), de 11 paginas mimeografadas, o qual constituiu-se no instrumento 2) motivador para consultar Faculdades e Escolas.de Medicina da América Latina. 3. Realizagao de consultas através de reunides internacionais (subregionais) e nacionais com as Associagées de Faculdades e Escolas de Medicina: - Associagao Centroamericana, incluindo representagio da Republica Dominicana, (San José, Costa Rica). - Conferéncia Andina de Educagiio Médica, com participaciio de representantes das Associagdes Colombiana, Venezuelana, Peruana, Boliviana e representantes de Faculdades de Medicina de Equador, (Cartagena, Colombia). - Corporagdo de Promogiio Universitéria do Chile, com a participagdo de todas as faculdades de Medicina do pafs, (Santiago, Chile). - Associagiio de Faculdades de Ciéncias Médicas da Repiblica Argentina, La Plata, Argentina). - Associago Mexicana de Escolas e Faculdades de Medicina, (Mérida, México). - Associagiio Brasileira de Educagaio Médica, (Londrina, Brasil). - Faculdades de Medicina da Bolivia, (Cochabamba, Bolivia). - Faculdades de Medicina de Cuba, (La Habana, Cuba). - Faculdades de Medicina de Paraguai e Uruguai, (Assungdo Paraguai). 4, Reuniido sobre Servigo Social promovido pela Josiah Macy Foundation, (PAHO/WHO e FEPAPEM, (Washington, DC, EUA). 5. Consolidago do documento de posigo da América Latina num grupo de trabalho em Caracas, com a participagdo da OPS/OMS e FEPAFEM (7). Em diferentes etapas da evolugdo desta consulta regional e quando estava elaborando-se um documento final, tomou-se conhecimento dos ajustes da programagiio da "Conferéncia", com a introdugao de novos temas e propostas de t6picos para serem considerados no interior de cada tema. Para incorporar 4 mutante estrutura da "Conferéncia” os aspectos discutidos nas diversas consultas foi necessdrio reordenar internamente os contetidos segundo so apresentados a seguir." TEMA 1 - 0 CONTEXTO GERAL 1.1. ESTADO E SOCIEDADE: NOVAS RELACOES A América Latina nao terminou de transitar seu dificil caminho de reconstrugiio democratica. As conquistas politicas e sociais obtidas vém sendo ameagadas por uma longa crise econdmica e pelas _politicas de ajuste que, quase uniformemente realizam-se 3 na maioria dos paises. © modelo de desenvolvimento nao permite compatibilizar os objetivos de estabilidade e crescimento econdmico com as exigéncias sociais de bem- estar. A constituigdo do mercado como forga dominante da dindmica econémico- social consolida 0 processo de globalizagao da economia, reconstruindo blocos econdmicos e de poder a nivel mundial, Mesmo assim, observou-se uma progressiva diminuigdo do papel do Estado nodesenvolvimento social, especialmente nos campos da satide e educagio, com a tendéncia de transferir responsabilidades fundamentais para 0 setor privado, sem a garantia necesséria de equidade na oferta dos servigos. 1.2, SITUAGAO DA SAUDE E DOS SERVICOS As consequéncias deste ajuste geraram um impacto diferenciador nas condigdes de vida e satide dos diversos grupos sociais, observando-se a convergéncia de antigos problemas tais como fome, tuberculose, lepra e 0 ressurgimento de epidemias consideradas desterradas para sempre, como a célera; com as novas patologias - como a AIDS - e os produtos nao desejados do desenvolvimento, como os desequilibrios ecolégicos, as radiagGes, o stress relacionado com o trabalho e a violéncia. Soma-se a isto uma acentuada deterioragao nos j4 insuficientes servigos de satide junto com a diminuigao das possibilidades de acesso aos_servigos de satide de grandes setores da populacao. Este impacto tem sido muito maior por causa do predominio de um modelo de atendimento & satide centrado na doenga e no individuo e com a aplicagdo de tecnologias de alto custo, sem contar com critérios racionais basicos para favorecer a utilizago equitativa dos servigos. Juntamente com estes processos evidencia-se um significativo incremento da participagdo de diversas forgas sociais em defesa de seus direitos cidadaos. Isto torna-se um desafio para as instituigdes da sociedade politica no sentido de articular seus processos de gesto com a agio da sociedade civil. Neste contexto 0 mercado de trabalho restringe a absorgio de novo pessoal, mostrando uma tendéncia para desviar a composigao da equipe a niveis de menor complexidade profissional ou a utilizagdo dos mais qualificados, subvalorizando as condigdes de emprego. O relativo excesso de oferta de médicos em alguns pafses nao significa ter conseguido a cobertura universal dos servigos. Poderia considerar-se um paradoxo a situacdo que apresenta baixa oferta de servigos ao mesmo tempo que médicos € outros profissionais encontram-se qualitativa e quantitativamente sub-utilizados. Crise - Ajuste Redugio do Estado Acumulacdo Epidemiolégica Redugao Capacidade Operativa: Servigos de Saide Universidade 1.3. A UNIVERSIDADE O impacto negativo do ajuste estrutural, que afeta tanto seufuncionamento como, © desempenho de seus professores, tem se sentido igualmente nas universidades e escolas superiores, O mercado de trabalho académico est4 em recessio, os saldrios cairam a niveis inusitados e os conflitos laborais se observam com maior frequénci: as_ univers Isto obrigou idades a redefinir suas politicas incluindo a busca de fontes alternativas no caminho de fortalecer sua capacidade de autofinanciamento. No interior das faculdades tem-se evidenciado conflitos de poder entre setores que competem pelos escassos recursos, bem como contradigdes inerentes aos interesses contrapostos na estrutura da pratica médica e na sociedade. Estes conflitos revelam crise de lideranga e de governabilidade em algumas instituigdes e, de modo mais amplo, a pouca capacidade de planificagdo e de gestéio administrativa das instituigdes académicas ca acentuada redugio da reflexio in: itucional sobre a propria educagdo médica. A tendéncia deste cenario é enquadrar as preocupagées universitérias em colocagdes que seguem uma Idgica de curto prazo encoberta pela necessidade de sobrevivéncia institucional. Deste modo, tanto a qualidade do processo educacional como o da pesquisa, podem ser afetadas, bem como a preocupagao universitaria pela reconstrugao das praticas da satide. Faz-se necessario desenvolver processos de planificagao estratégica, hierarquizar objetivos e estabelecer prioridades, especialmente a identificagao das necessidades dos grupos que nao chegam a ter uma expressio efetiva a nivel universitario e local. A universidade determina, com certo grau de autonomia, a organizacao de suas atividades e a reinterpretagdo das necessidades sociais. Consequentemente, € dentro desses limites onde se dao as possibilidades de criatividade e inovag4o. As universidades eas faculdades de medicina deverao utilizar esse espaco de autonomia para definir seu compromisso com a sociedade. 1.4, AS EXPECTATIVAS CRESCENTES E A DIMINUICAO DAS OPORTUNIDADES ‘As demandas por melhores condigdes de satide, tem sido parte de um longo & penoso processo de Iuta na América Latina. Nos iiltimos anos evidenciou-se um maior protagonismo de diferentes forcas sociais, na defesa de seus direitos e especialmente no que se refere A satide. Também € evidente um maior conhecimento do que o desenvolvimento cientifico e tecnolégico esté em condigdes de oferecer para solucionar os problemas da satide. Acrescentam-se as demandas induzidas pelo complexo médico- industrial. Tudo isto gera na populagaio expectativas cada vez maiores quanto a uma satide melhor para todos. No entanto, essas expectativas enfrentam 0 grave problema da "crise médica" que vem se manifestando cada vez com maior forga. Crise de cobertura, crise na 5 qualidade do atendimento, perante uma progressiva deterioragdo das condigées de vida da populagao. De igual modo, é questionada desde diversas perspectivas a validade da educagio e pratica médica frente as exigéncias sociais. Estudantes e profissionais queixam-se porque a Universidade nfio os prepara adequadamente para a pratica futura. Por outro lado, manifesta-se o inconformismo da sociedade perante uma profissio médica que trata os individuos como objetos, reduzindo-os a condigéio de maquina biolégica. O ser humano aliena-se diante das decisdes que tém a ver com sua satide. Além disso, existe um crescimento incontrolado do custo do atendimento médico que se torna insustentavel e inaceitével no contexto de um descontentamento generalizado. TEMA 2 - A NATUREZA MUTANTE DA PRATICA MEDICA 2.1. A PROFISSAO MEDICA SOB TENSAO. Sem diivida, a forte influéncia que sobre a pratica médica teve,desde os tiltimos anos da década de 70, a estratégia da Atengdo Priméria da Satide (APS), seja pela sincera busca de uma maior equidade no acesso aos servigos da satide, seja no desejo de Teencontrar uma sfntese de um conhecimento médico hiperfragmentado, seja na tentativa de reduzir os crescentes custos do atendimento, ou por diferentes mesclas destes objetivos, a verdade € que no mundo tém se multiplicado experiéncias com maior ou menor sucesso, seguindo tal orientagao. Porém, a grande movimentagao de recursos financeiros que se observa no setor satide nos paises desenvolvidos e a emulago provocada pelas dimensdes internacionais da pritica médica nos pafses da regidio, condicionam uma crescente influéncia da Iégica e do pensamento econdmicos sobre as constantes redefinig6es do modelo prestador. EM SITUAGOES EXTREMAS NO MUNDO DESENVOLVIDO O GASTO PER CAPITA EM SAUDE CHEGA A SER SUPERIOR AO PRODUTO BRUTO PER CAPITA DE QUALQUER PAIS DA AMERICA LATINA © resultado disto € uma tensio cujo exemplo pode ser a coliséio produzida entre © enfoque econémico que procura a reprodugdo ampliada dos investimentos do capital no setor e 0s principios basicos do que tem se procurado sob a orientagiio da APS. © primeiro destes principios € 0 do modelo de medicina ou pratica geral, medicina integral, rural e familiar. Qualquer que seja o nome, trata-se de uma proposta que em suas bases econémicas € contraria aos prinefpios de "segmentagtio de mercado" ¢ de "diversificagao de produto", os que juntamente "vis a vis" com os mecanismos de especializagao e subespecializagio resultam muito mais funcionais para o mercado. 6 Um segundo princfpio diz que mais vale prevenir do que curar considerado a concepgdo dominante na Satide Ptiblica. No entanto, a alta rentabilidade dos servigos curativos, faz com que esta concepgio seja invertida, levando em conta que é af que paciente nao tem critérios e condigées de opgao e o produto incorpora maior valor econémico. Isto condiciona um atendimento a satide organizado cada vez mais sob os mesmos paradigmas que qualquer empresa com fins de lucro. Para a rentabilidade do capital investido estimula-se 0 aumento do consumo através da expansiva diversificago de produtos e da concentragdo em servigos curativos de alta complexidade. Neste contexto, a APS representa uma contra-proposta. Num balango dos iltimos 15 anos observa-se que enquanto a APS ¢ 0 direito & satide tiveram sucesso na construgdo do discurso sanitério e conseguiram alguns avangos na situagdo da satide, 0 Complexo Médico Industrial, sem discursos, teve um sucesso muito maior em suas realizagdes, dentre outros, na reconfiguragdo da prética médica. 2.2, INSTITUCIONALIZAGAO DA PRATICA MEDICA. Nas tiltimas décadas, a prética médica muda rapidamente de uma modalidade auténoma e liberal para uma pratica coletiva ¢ institucionalmente intermediada. O vertiginoso desenvolvimento cientifico e tecnolégico promove a sucessiva e incessante divisio técnica e social do trabalho médico e o cuidado atomizado entre varios trabalhadores, sendo que frequentemente nenhum deles tem a visio holistica do paciente como ser integral e social. Em termos da divisdo social do trabalho, a medicina, considérada 0 protétipo de uma profissio, passa a segmentar-se para atender diferentes estratos da sociedade que apresentam possibilidades diferenciadas de consumir servigos de satide. Ultimamente se constata uma tendéncia para a formagao de profissionais diferenciados afim de atender esses estratos sociais, o que poder4 levar, em certo tempo, ‘a uma segmentagdo da profissio entre os especialistas e os profissionais gerais, estes Uiltimos encarregados de atender os estratos mais deprimidos da sociedade. O efeito disto poderia levar, a curto prazo, a um rompimento da unicidade profissional. Nestas circunsténcias, 0 contato singular entre o médico e o paciente passa a ter um papel secundério nas decisées sobre os processos diagnésticos e terapéuticos. As influéncias de terceiros, como sao os prestadores de servigos de satide de toda natureza, seguros sociais e/ou privados, convénios, organizagées ¢ advocacias (intermediérios) das partes interessadas passam a jogar o papel essencial nesta decisao. No entanto, existe um amplo leque de modalidades de organizagio da prestagio de servigos, e a modalidade liberal de prética médica continua estimulando e sendo 0 ponto de referéncia da maioria destes profissionais, que nao percebem a rdpida perda de graus de autonomia na sua pritica.* PRATICA MEDICA TECNOLOGICA - INSTITUCIONALIZADA “TRABALHO COLETIVO" INTER-DEPENDENTE COM OUTRAS ESPECIALIDADES "AUTONOMIA REDUZIDA" POR INSTANCIAS DE DECISAO EXTERNA "SEGMENTACAO SOCIAL" DEVIDO A PADROES ECONOMICOS E TECNOLOGICOS DE ORGANIZACAO DOS SERVICOS "ETICA SOCIAL" EXTERNA A RELACAO MEDICO PACIENTE 2.3. DILEMAS DA EDUCACAO MEDICA O enfrentamento entre complexidade e cobertura é pouco visivel e por esta razio se acha fora do debate da formagiio médica, tanto de graduacao como de pés- graduagiio O processo de formagio nao é um simples espelho do "mundo do trabalho". A educagdo é um processo social que tem elementos intermedidrios préprios de sua natureza: trabalha com o elemento simbdlico e subjetivo do fendmeno social, com a cultura e a ideologia médicas. Por isso as transformagées educativas nao respondem diretamente &s mudangas da prdtica do trabalho. Embora fagam parte de uma mesma hist6ria e apontem na mesma diregdo, a prdtica e a educagdo médica néo evoluem no mesmo ritmo, nem com os mesmos contetidos. Esta defasagem as vezes gera contradigdes de dificil solugdo. Um exemplo desta afirmago é que 0 pouco que resta da pritica médica liberal tfpica no mercado de servigos de satide corresponde a prética de alguns docentes de medicina. Isto exerce uma influéncia ideol6gica sobre os estudantes de medicina, que continuam com a aspiragio de uma pritica auténoma j4 superada, que esté em contradigdo com a realidade onde provavelmente estardo inseridos. Essa situagdo de "independéncia subordinada" ao social global e ao trabalho especifico para o qual seus agentes so capacitados define as possibilidades e limitagées da educagao médica, assim como as margens de autonomia e dependéncia. A nivel das atividades de diagnéstico, a tecnologia mudou a base de apoio da decisio técnica (cada vez € menos importante a histéria de vida e a anamnese); a nivel do plano assistencial, por causa da coletivizagiio do trabalho e a organizagdo empresarial, produziu-se uma dissociagao das dimensdes médicas do "tratar” e do “assistir". A PRATICA NO NOVO CONTRATO SOCIAL * PROMOGAO DA SAUDE E DEFESA DA VIDA EM CONDICOES QUE A FACAM POSSIVEL E DIGNA * ORIENTACAO SOLIDARIA COM EQUIDADE E POL{TICAS SOCIAIS QUE DEEM PRIORIDADE AOS PROBLEMAS SANITARIOS * IDENTIFICACAO DO "MEDICO GERAL" COMO POSICAO LEGITIMA E ATRATIVA DE VALIOSO AGENTE DE SAUDE * RECONHECIMENTO SOCIAL, ACADEMICO E ECONOMICO DA CAPACIDADE DE ATENDER E /OU RESOLVER AS PATOLOGIAS MAIS COMUNS, COM A TECNOLOGIA E OS RECURSOS REQUERIDOS E DISPON{VEIS Muitas so as faculdades que assumem um baixo compromisso perante a realidade da satide da populagdo, desde as politicas de admissio, passando pela estrutura do corpo docente, contetidos curriculares, desenvolvimento cientifico ¢ tecnolégico, metodologias pedagégicas e alternativas de especializagao. Os indicadores de sucesso orientam mais para a aprovagdo de exames de admissio para realizar residéncias no pafs € no estrangeiro, do que para dar resposta As mutantes necessidades e demandas da sociedade. Isto € muito mais evidente em muitos pafses da regio que contam com servigos sociais obrigatérios no pés-grado imediato, geralmente em dreas rurais ou urbanas marginais, ditigidos a uma prética de medicina geral com forte contetido social. Porém, em quase todos os casos, esta pritica no é utilizada para definir o perfil educativo da graduagdo nem como oportunidade para a formagio do graduado com supervisio e academicamente acreditada. 2.4. ETICA INDIVIDUAL E ETICA COLETIVA Historicamente a defesa das bases éticas da medicina, expressa no juramento hipocrdtico, bastaria para rejeitar muitas das prdticas e atitudes que hoje fazem parte da “cultura profissional". No entanto, a mudanga radical das bases da relagdéo médico- paciente € a existéncia de uma vasta estrutura intermedidria demandam a expansio das bases éticas numa dimensao mais social e coletiva. De fato, novas relagdes tem se configurado, mediadas pelo institucional, entre prestadores e consumidores, acrescentando e/ou substituindo 0 médico e seu paciente. Ambos pertencem agora a uma terceira instdncia: os servigos, sejam ptiblicos, de uma empresa médica, com ou sem fins lucrativos, ou de um seguro de satide. As faculdades da regitio perante este dilema, pretendem abrir o espago para um maior controle social da prdtica. Compreende-se, dada a velocidade com que as mudangas acontecem ¢ novas tecnologias sio introduzidas, como procedimentos e 9 formas de organizagio no atendimento médico, que so colocadas modificagdes que exigem serem acompanhadas com processos de avaliacao. Esta avaliagdo deve transcender os limites da eficiéncia e da capacidade resolutiva para incluir aspectos de relevancia perante a realidade da satide de cada pais. A Universidade, e especialmente as faculdades de medicina, podem ter um ativo papel neste campo. Ao mesmo tempo, faz-se necessério incorporar neste processo de avaliagdo os pacientes e a populagiio em geral além das instdncias institucionais onde atua o pessoal da saide, incluindo os diferentes servigos de satide, gremios e associagdes profissionais.* TEMA 3 - RESPOSTA A EXPANSAO DO CONHECIMENTO E AO AVANCO TECNOLOGICO. Este tema foi questionado quanto a sua colocagéio como "resposta” unicamente, pois deveria incluir todo 0 processo de desenvolvimento do conhecimento, com a produgao, andlise, aplicagao, divulgagdo e avaliagdo sistemética do mesmo e das tecnologias consequentes. No mesmo sentido, salientou-se a restrigao do tema para as ciéncias clinicas, sendo que deveria abranger todo o campo cientifico interessado na satide, incluindo as ciéncias sociais e a propria educagio. Igualmente deveria levar em conta o potencial cientifico extra-setorial que pode ter impacto na qualidade e estilo de vida. 3.1. RECONSIDERACAO DA BASE CIENTIFICA DA MEDICINA: ARTICULAGAO DOS CONHECIMENTOS BIOMEDICOS E SOCIA! O objeto de estudo das faculdades de medicina & 0 ser humano na sua integridade biolégica e social indivisfvel, razo pela qual deve ser superado 0 estreito conceito que outorga cardter cientifico & satide considerada somente desde o ponto de vista clinico-biolégico. Isto coloca um falso dilema entre ciéncias naturais ¢ sociais impedindo a articulagao dos diferentes campos do saber, restringindo a compreensio ¢ ago coordenada e interdisciplinar perante a problemitica da sadde da populacao. As cigncias sociais devem constituir um dos eixos articuladores do processo educativo, incorporando-se em cada um dos niveis da carreira para dar apoio & explicagdo integral dos fendmenos e determinantes do processo satide-doenca, individual ecoletivo. No entanto, deve-se levar em conta que, com reconhecidas excegées, nao existe uma cultura cientifica nas Escolas de Medicina, sen@o aplicagdo pragmética do aspecto clinico sob a pressio do incremento extraordindrio da informagio médico-cientifica e a expansio tecnolégica biomédica. Nao existe pesquisa para a geragio e adogao critica de conhecimentos afim de resolver os problemas de satide. A formacdo nas ciéncias basicas esté em crise. Nao hé resposta critica para a pergunta: basicas para 0 que? 10 Consequentemente converteram-se em unidades fechadas, impenetraveis, desarticuladas na formagao clinica e social. Esta visdo biologicista, gera 0 culto da doenga e da tecnologia, constituindo-se numa barreira para a incorporagiio das ciéncias sociais no contexto de cada disciplina. Entender a sociedade, aprender a compreender a insergo social da medicina, € cada vez mais importante. Esta lacuna de conhecimento perante a crescente complexidade de nossas sociedades, tem como resultado a formagiio de profissionais mais ou menos desadaptados, com consequéncias negativas tanto para sua vida familiar e profissional, quanto para a vida de seus pacientes e sua sociedade. Na consulta as faculdades destacou-se as ciéncias socias e no as do comportamento, dado que nao sdo termos semelhantes e 0 fenémeno social nao se explica pelos comportamentos. ENFOQUE INTERDISCIPLINAR ARTICULAGAO DO CONHECIMENTO BIOMEDICO E SOCIAL PROBLEMATIZACAO VERSUS SOLUCAO DE PROBLEMAS INTEGRAGAO DOCENTE-ASSISTENCIAL-PESQUISA RELEVANCIA E QUALIDADE TOTAL 3.2, INTERDISCIPLINARIDADE E ENFOQUE PROBLEMATIZADOR O eixo articulador fundamental da educagdo médica é a interdisciplinaridade. A formagio interdi iplinar permite uma explicagdo cientifico-técnica integral e profunda da problemética da satide, visto que desenvolve as diversas perspectivas das diferentes disciplinas ¢ se colocam as possfveis alternativas de solugdo ou de intervengdo em conjunto, enquanto abre-se 0 espago para a pesquisa e produgao coletiva de conhecimentos. A causalidade e dindmica complexas do fendmeno satide-doenga, s6 pode ser explicado com categorias interdisciplinares de andlise. Introduzido 0 enfoque interdisciplinar no inicio do curso possivel desenvolve-lo no campo da atengio primédria da satide, onde se materializa 0 compromisso social dos processos formativos e dos servigos A aplicagao do método cientifico durante 0 processo de formaciio, perante os problemas de satide da realidade concreta, exige que a abordagem interdisciplinar se sirva de procedimentos, técnicas e instrumentos que permitam conhecer e abordar a realidade, ao mesmo tempo que esbogar e comprovar alternativas para a solugdo de ditos problemas. Enquanto a educagio baseada nos problemas coloca énfase na procura de respostas terapéuticas adequadas aos problemas (geralmente clinicos), a problematizagiio u aplicada no contexto da satide coloca a énfase no processo de reflexdo e andlise dos problemas de satide, desde diversas perspectivas ¢ em toda sua complexidade. A intengo de problematizar 0 contetido da educagao médica € ultrapassar 0 conceito de educagdo baseado na incorporacdo de um receitudrio de respostas a serem aprendidas em troca da aquisigao critica de uma disciplina para analisar, refletir e estudar os problemas da sade, bem como a destreza para se utilizar de um arsenal de instrumentos titeis para a resolugaio desses problemas. Trata-se de criar oportunidades para propor de maneira sistemdtica as posstveis explicagdes e aproximagdes resolutivas dos problemas de satide. Porém, deve ser considerado o perigo potencial da implementagdo de pedagogias de solugio de problemas que podem atentar contra a diversidade na geragao de alternativas e aproximagées nos diversos contextos. Esta abordagem educativa considera os problemas reais dos servigos de saide; © grupo basico de trabalho ou equipe de satide, comprometido com a solugao do problema, aplica 0 método cientifico, clinico ou epidemiolégico segundo as caracteristicas da situagiio. Sendo assim, os curriculos devem ser desenvolvidos sob uma concepgiio multidisciplinar, baseados nos problemas de saide. O desafio colocado pelo uso adequado ou inadequado de tecnologias e conhecimentos para a solugdo de problemas relevantes da populagdo tem uma vigéncia permanente e de grandes e profundas implicagdes, requerendo espacos para a reflexdo cientifica sistemitica e séria, enfatizando especialmente o estudo da pratica institucional ou de prestagao de servigos. 3.3. AVALIACAO TECNOLOGICA Seria um erro fechar as portas do saber e a pritica médica para as realizagdes e possibilidades tecnolégicas, mas sera necessdrio fixar prioridades, critérios de eficiéncia ¢ eficdcia tecnoldgicas, integrar tecnologias autéctones e estimular tecnologias apropriadas. A pressiio que o desenvolvimento tecnolégico e cientifico geram chegou a estabelecer culturas institucionais e curriculares que, nao poucas vezes, definem a formagiio médica como aplicagiio de tecnologias na pratica clinica e nio como pesquisa para a geraco e adogio critica de conhecimentos para resolver problemas de satide. Por consequéncia, as instituigdes enfrentam o desafio de incorporar sem critica aquele desenvolvimento, supondo que constitui um bem em si mesmo, ou reformular as bases cientfficas da produgado e incorporacdo de ciéncia e tecnologia, assumindo critica e sistematicamente esse campo, afim de responder aos requerimentos sociais e éticos de cada contexto, bem como superar a dependéncia e estimular a potencialidade criativa e produtiva de estudantes e pesquisadores locais. ‘A superagao da contradi¢do entre a formago de especialistas e médicos gerais, no contexto da medicina moderna, obrigara a educagéo médica a enfrentar criticamente a determinagao tecnolégica do critério médico de qualidade, que afeta tanto a ética 12 profissional como a equidade. E nesse sentido que se dio as possibilidades de resolver este velho dilema da educacaio médica. Ser4 necessdrio continuar a formar melhores especialistas enquanto se resgata e fortalece a formagao geral de graduagao, colocando-o na equipe de satide e promovendo sua fungdo e reconhecimento sociais. Também no campo educativo tem incidido as tecnologias, acrescentando novos contetidos curriculares até sobrecarregar além de todo limite possivel o plano de estudos. Ao mesmo tempo junta-se a tendéncia que busca uma maior eficdcia educativa, incorporando determinadas tecnologias pedagégicas que promovem a selegao critica de contetidos e a autoeduca¢do permanente dos estudantes. 3.4. DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO DE ENSINO - APRENDIZAGEM NUM CONTEXTO ASSISTENCIAL E DE PESQUISA Os problemas considerados objeto de estudo, 0 modo e lugar em que os alunos ficam expostos perante eles e as abordagens que desenvolvem, tudo deve ser repensado para poder valorizar o caréter cientffico, a utilidade pratica do saber e as intervengdes sociais, assim como contextualizar a utilidade da fungao do médico clinico individual, perante a fungdo da satide publica e de outras ciéncias. Tal integrago acontece no trabalho e na pratica que enfrenta problemas reais, através da participagdo em atividades de pesquisa / docéncia / assisténcia interdisciplinares, Porém, trata-se de uma pratica comunitéria que se limita a ratificar a divisio da pratica profissional refletida no contraste entre cendrios de aprendizagem marginais e desprovidos de recursos e outros, tecnoldgica e cientificamente superequipados. Esta situagao, ocultamente inscrita nos curriculos, leva de fato a uma dupla moral dos futuros graduados médicos As experiéncias de integragaio docente-assistencial com frequéncia tem sido entendidas como sinénimos de laboratérios comunitérios ou como a utilizagio dos ambientes hospitalares para as atividades educativas, sem significar em qualquer caso a mudanga do modelo educacional ou um compromisso efetivo com a populagéio ou 0 servigo. Deve ser salientado 0 conceito de integracao docente assistencial vigente na ‘América Latina, que envolve um compromisso global da universidade e da faculdade com os servigos e com a populagio, o qual, com sua abrangéncia evidentemente supera 0 enfoque comunitério que predomina em outras regides. Uma parte da missaio de cada Centro Académico de Satide deve ser seu compromisso com uma comunidade definida, manifestado através da pesquisa, promogao e cuidado da satide, gerando por si mesmo um ambiente de aprendizagem adequado. CONCLUSOES No final desta etapa preparatéria para a 2* Conferéncia Mundial de Educagao Médica no contexto da América Latina merece destaque a consideragao de que o esforgo realizado teve a virtude de colocar novamente o tema da Educagdo Médica no debate do 1B desenvolvimento de recursos humanos para a satide na regiao. Na série de consultas realizadas estiveram diretamente representados, ou através da respectiva Associagao Nacional, um total aproximado de 230 Faculdades de Medicina, mimero que corresponde 80% do total de escolas da subregiao. As consideragées finais incluidas neste documento, nao constituem conclusdes definitivas nem receitas elaboradas; elas se apresentam como um resumo das posigdes das diferentes instituigées que responderam a consulta realizada. O que se procurou foi resgatar as idéias contidas em cada um dos documentos, s lientando os grandes problemas comuns a toda a regio. Através dos aspectos tratados destaca-se 0 seguinte cendrio: * um amplo processo de democratizagdo e constru da cidadania; * a aparente superagio da crise econémica com a adogao de politicas de ajuste estrutural; * a redugdo do Estado com impacto desfavordvel nos setores sociais; * a 6nfase no direito a satide e a reformulagao setorial; * uma significativa incorporagdo de tecnologia e incontrolavel aumento do custo no atendimento a satide; * a coletivizagio do trabalho médico que substitui progressivamente a pritica liberal; * uma ampla experimentagdo de inovagdes educativas dirigidas para a transformagiio do perfil profissional e o aprimoramento didatico-pedagdgico A partir dos debates realizados e considerando especificamente os aspectos relativos & formagao médica, foi possfvel sublinhar: * a necessidade de gerar um novo modelo cientifico biomédico e social que projete e fundamente um novo paradigma educativo, em fungio do individuo e da sociedade; * a necessidade de um novo sistema de valores que transceda a influéncia da mudanga da pratica, reconstrua a ética do exercfcio profissional e garantize a fungio social de atendimento as necessidades da satide da populagdo; * a vantagem de desenvolver estratégias de trabalho interdisciplinar e metodologias problematizadoras, que possam enfocar de novo a temitica fundamental, com maior profundidade e novos critérios de prioridade; * no entanto, € fundamental que o desenvolvimento da Integragdo docente- assisténcia-pesquisa tome a estratégia de atendimento primério como objeto de pesquisa ¢ aprendizagem e verifique o compromisso da universidade com a sociedade, afastando- se da utilizagiio do espago comunitério como simples campo de pritica; * a importancia de ultrapassar a contradigdo entre formacio de especialistas e médicos gerais exige que a educagio médica enfrente criticamente a determinagio tecnolégica do critério médico de qualidade, que envolve tanto a ética profissional 14 quanto a equidade. As consideragdes precedentes colocam em carater urgente a obrigacéio das faculdades e escolas de medicina definirem e assumirem um novo contrato social, legitimando a sua razao de ser perante a sociedade. Para o cumprimento dos propésitos colocados, a Regifio deverd continuar a Promover um intenso debate que permita a construgdo das novas relagdes entre Universidade, Servigos de Satide e Sociedade como um todo, debate este que deverd ser enriquecido com as conclusdes desta Conferéncia Mundial de Educagao Médica. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS: 1. Schreiber, L; Medici, A & Goncalves, R.B.M.: "O desafio da educagio médica perante os novos paradigmas econémico-tecnolégicos". Educacién Medica y Salud, vol 28, né 1, jan/margo 1994, 2. Lip. C.: "As mudangas na profisstio médica e suas consequéncias na educagio médica". O caso de Peru, agosto de 1992, Lima, Peru. 3. Byrne, N. & Rozental, M. : "Current trends in medical education and a proposed direction for medical education in Latin America", setembro de 1992, Toronto, Canada. 4. OPS/OMS: "Politica de pesquisa de recursos humanos em Satide", maio de 1992. Washington, DC, USA 5. Brito P., Campos F., Ferreira, J.R., Rodriguez M.L., Rovere M., Ruiz L., Santana J.P.& Vidal, C.: "As mudangas da profissdo e sua influéncia sobre a Educagio Médica", setembro de 1992. Washington, DC, USA 6. Josiah Macy Foundation, PAHO/WHO & PAFAMS: "Comunity and Social Service", margo de 1992, Washington, USA. 7. OPS/OMS & FEPAFEM : "Consolidagao das consultas realizadas em América Latina, maio de 1993, Caracas, Venezuela. 15 Recomendagées da II Conferéncia Mundial de Educacaio Médica Edinburgh 8 a 12 de agosto de 1993 1.Preambulo A Il Conferéncia Mundial de Educagio Médica de 1993 foi o maior evento a nivel internacional nesta 4rea. Os precursores deste encontro foram a Conferéncia Mundial sobre Assisténcia Primaria de Satide (1978 em Alma Ata ) onde o programa global Satide para Todos no Ano 2000 foi adotado, e a Conferéncia Mundial sobre Educagiio Médica (1988) que formulou a Declaragio de Edinburgh. A Declaragao estabeleceu as diretrizes para que a educagdio médica aprimore a satide e o bem estar da humanidade. Avangos em diego a estes objetivos tém sido considerdveis, apesar dos impedimentos provocados pelo subdesenvolvimento de alguns paises, regressdes de desenvolvimento em outros paises, ¢ a complexidade do proprio processo de mudanga. E essencial que se prossiga com a tarefa. Esta nao pode ser deixada a deriva. ‘A Conferéncia Mundial de 1988 estabeleceu uma estrutura organizacional para © avango na qualidade da educagdo médica com quatro niveis de ago: global, regional, nacional e institucional. As seis Associagdes Regionais da Federagio Mundial de Educagiio Médica(FMEM,) ligadas aos seis Escritérios Regionais da OMS, interagindo com outras agéncias e instituigdes, notadamente a UNICEF, UNESCO, UNDP e o Banco Mundial representam uma extensa rede internacional para 0 alcance das mudangas necessérias na educagio médica.A Conferéncia de 1988 lancou uma série de projetos de atividades, que continuam até hoje.. A Conferéncia Mundial de 1993 encontrou um novo conjunto de desafios. As mudangas globais em andamento estio afetando profundamente a educagdo médica: vastos aumentos na populagao de alguns pafses; extensas mudangas nas estruturas politicas nacionais ¢ regionais; recessiio econémica; enxugamento de recursos; guerras e violéncia; disseminagao da AIDS; reaparecimento de doengas consideradas anteriormente controladas; sistemas de assisténcia a satide em desarranjo devido a cobertura inadequada das populagées; descontrole na elevagao de custos. Hé uma percepgdo ptiblica de que as escolas de medicina nao estio conseguindo vencer estes desafios. ‘Traduzido por Kilda Gimenez Menicucei a7 Universidades e faculdades de medicina sao frequentemente vistas como entidades preocupadas com suas préprias questdes académicas e desligadas dos problemas concernentes a sua sociedade. A tendéncia da medicina em se tornar uma empresa de negécios é um desvio grave de seu comprometimento tradicional de assisténcia e tratamento. Os avangos na tecnologia biomédica sio as vezes vistos como uma redugéio do humanismo dentro da medicina. Os médicos tém passado uma imagem de indiferentes em relagdo a certos pacientes como os portadores de AIDS. A medicina tem estado sob intensa observagdo. Os avangos na ciéncia tém aberto novas portas para um melhor cuidado com o paciente e a comunidade; sistemas de satide melhorados prometem maior equidade; ¢ inovages na educagao médica fornecem importantes opgdes para mudanga. Porém hé ainda sérios obstéculos na educagiio médica. ‘A Conferéncia Mundial de 1993 examinou uma variedade de problemas que afetam a educagio médica, 240 delegados de 80 pafses, Iideres em seus pafses, estiveram presentes. As agéncias das Nagdes Unidas, OMS, UNICEF, UNESCO, UNDP, e 0 Banco Mundial, e muitas organizacées nfio-governamentais e organizagées de ajuda bilaterais, fundagdes e associages de profissionais forneceram apoio e foram representadas em alto nivel O desafio central para este Encontro foi desenvolver uma visdo sistematica desta variedade de problemas, identificar solugdes adequadas ¢ formular estratégias de implementagio das recomendagées a nivel mundial. 2. Os problemas 2.1. No contexto mais amplo ‘As expectativas piiblicas a respeito da medicina stio muito altas. A demanda por servigos de satide aumentard a partir do processo democrético que est se implantando em muitas partes do mundo. O papel tradicional do médico como um curador, associado a avangos dristicos na ciéncia biomédica, tem criado uma demanda maior dos servicos. Inicialmente , os beneficios da medicina moderna sio buscados por consumidores com conhecimento e 0 mercado tem sido suficiente pois os servigos tem sido fornecidos. Porém o contexto no qual o médico trabalha tem se transformado, dentro de uma din, mica que tem seus pr6prios problemas e complexidades: padrdes de demografia, morbidade e mortalidade tém sido alterados; os médicos frequentemente parecem incapazes de monitorar as implicagdes de custo de suas decigdes cl{nicas; os servicos de satide ndo tém conseguido atender os mais necessitados: os custos tém se elevado infinitamente; as forgas de mercado na drea de satide tém tratado a medicina como mero comércio; especialistas sao formados além do necessério, enquanto os clinicos gerais nfo esto disponiveis; a prevengio da doenga é minima; e a visio do médico venerado como guardido da satide ¢ companheiro durante as horas de sofrimento agora frequentemente parece ser um vest{gio do passado. 18 Diante destas mudangas e criticas, onde fica a educag&o médica e qual é a posigdo de seus guardides , as universidades?. O paradoxo é que apesar destas criticas, tm havido importantes mudangas tanto na ciéncia quanto na qualidade da medicina, e da educagio médica. Novos conceitos essenciais para a promogio da satide e do tratamento das doengas tém sido incorporados aos curriculos. Métodos mais efetivos de ensino tem surgido. A educagao médica tem ido além dos grupos académicos e chegado as realidades sociais onde as necessidades de satide sio maiores.Porém este grande progresso tem sido fragmentado demais, tem deixado ainda muitas escolas de medicina de lado , e nao tem conseguido desenvolver a massa critica necesséria para consolidar esta mudanga. A educagdo médica enfrenta a necessidade urgente de colocar a casa em ordem, diminuir suas fraquezas e expandir suas forgas. No entanto esta tarefa se toma dificil porque h& muitos aspectos de seu dominio ainda fora de controle .O contexto no qual a medicina € praticada € social, com padmetros econdmicos, culturais, politicos, burocraticos e ambientais. A medicina deve tornar-se um agente mais efetivo no estabelecimento da ordem dos ambientes e sistemas onde ela deve atuar. A base ética da prética da medicina tem contribuido em muito para a reveréncia a qual ela recebe hoje.O entendimento da medicina por si s6 em termos de valores morais que acompanham o relacionamento entre médicos e pacientes est4 aumentando. A ética médica cada vez mais € vista como parte obrigatéria dos curriculos, e seu ensinamento esté saindo da sala de aula e indo para o leito e para a comunidade onde alunos podem aprender sobre interagdes com outros.Mas a mesma confusao global que est afetando a medicina em geral é também sentida no campo ético. Avangos na ciéncia assim como as limitag6es de recursos fazem surgir novas questées éticas.O modelo apropriado de ciéncia na medicina nao é mais simplesmente biomédico, mas também social e psicolégico. Um novo campo ético diz respeito ao valor do dinheiro, e a ética da prioridade e alocagdo de recursos em relagao as necessidades dos pacientes e das comunidades. A justiga social e oportunidades iguais para todos ganha a cada dia maior apoio. Uma énfase maior esté sendo dada ‘a democracia participativa e tem levado a mudangas nas tomadas de decisées médicas, saindo do papel tradicional dos médicos como tinicos frbitros e chegando a um envol imento maior e direto dos pacientes e da comunidade. Tendéncias 4 comercializagio da medicina levantam questdes éticas muito sérias de conflitos de interesses entre médicos. A AIDS e outras doengas crénicas desafiam a sensibilidade social e presteza ética dos médicos. Desta forma, a ética tem um papel diferente e crescente na educagiio médica, enriquecendo a compreensio de valores basicos da profissao. Profundos desafios ao raciocinio e a ago moral sdo enfrentados por médicos é instituigdes que os praticam. 2.2. Desafios emergentes Entre os maiores desafios da profisstio médica esta a transi¢do da satide: hé uma mudanga de doengas de deficiéncia e infecgio em paises em desenvolvimento para 19 doengas cardiovasculares € outras afins em pafses desenvolvidos. As populagées esto envelhecendo: a média de vida global é agora de 65 anos; em pafses em desenvolvimnento é de 63 anos. O cancer, doengas cardiovasculares, e diabete siio os que matam mais em pases desenvolvidos e em desenvolvimento.O custo de uma assisténcia a doengas cr6nicas para uma persistente morbidade excede ao tratamento e cura de um infeco aguda. Ao mesmo tempo, muitos pafses em desenvolvimento ainda tém que carregar o fardo de doengas causadas por infecgdes e desnutrigdio. O conhecimento sobre infecgSes e desnutri¢aéo tem avangado além de sua aplicagdo. O tratamento de doengas tropicais exemplifica com que precariedade as descobertas e pesquisas sio aplicadas. Os sistemas de assisténcia 4 satide sdo imperfeitos. O descontentamento da sociedade com os custos mirabolantes, a baixa qualidade real ou percebida, e a falta de acesso - todos aparentemente se degenerando - se impde nos governos. Os mal servidos € no assegurados so a maioria e os que menos tém voz politica.Os médicos so insuficientemente conscientes da condigdio de satide daqueles que nfio comparecem nas suas Clinicas. Hé4 uma implementagio irregular da assisténcia priméria de satide em muitos pafses devido a pobreza, fortes interesses e prioridades competitivas, frequentemente justificados em nome da defesa. As despesas per capita com doengas em muitos pafses excedem o produto nacional bruto per capita total de paises em desenvolvimento. Os médicos frequentemente mantém uma abordagem primeiramente voltada para as doengas. Por outro lado, alguns paises de renda baixa escolheram investir na satide e em outros setores sociais para seu beneficio. As mudangas politicas e a perturbacio econémica no leste europeu ameagam as redes de seguranga social. Novas forgas de mercado podem ter efeitos imprevisiveis no setor da satide e no comportamento dos médicos. HA um desequilfbrio entre especiliastas e clinicos gerais. Nos pafses desenvolvidos, em particular, 0 puiblico prefere consultar especialistas, mesmo com queixas corriqueiras. A sociedade nao pode sustentar os mimeros exigidos, e nem deveria. Ao mesmo tempo, clinicos gerais permanecem sub-empregados em busca de qualificagées de pés-graduagdo onerosas, ou entdo emigram. Os especialistas provavelmente nao se estabelecerao em 4reas depreciadas. Um médico de famflia bem treinado frequentemente nao € visto como alguém que tenha feito um treinamento "especial", mesmo que tenha certificados relevantes de p6s-graduagio.Um departamento da escola de medicina pode formar em excesso especialistas para justificar sua existéncia. A distribuigdo desequilibrada é refletida em uma superpopulagdo de médicos contra uma escassez de enfermeiros ou qualquer outro profissional da 4rea de satide de custo menor e frequentemente mais eficaz. Os avangos tecnolégicos de nosso tempo surpreendem o piiblico e os da rea. A explosio de conhecimento biomédico dos ultimos 40 anos, dizem que ultrapassou a de todos os tempos. A sociedade tem sabidamente investido na pesquisa médica; € importante agora dar maior atengdo a seu custo , sua aplicagao das descobertas, e os fatores éticos envolvidos. Para poder acompanhar os avangos 20 profissionai cientificos, os médicos precisam de novos conhecimentos e habilidades. A AIDS por si s6, faz-nos ver as fraquezas dos médicos. Esta "catéstrofe em cAmara lenta" desafia as habilidades de comunicagio dos médicos, a responsabilidade a longo-prazo, 0 cuidado com carinho, a capacidade de enfrentar questdes como a morte, sexualidade, alternativas para o estilo de vida, a impoténcia terapéutica; ¢ o conhecimento de satide ptiblica e doengas infecciosas. Além disso, a interagao médico- AIDS é um protétipo de muitas outras doengas comuns da sociedade moderna: abuso de droga, doencas crénicas de populagdes em idade avancada, e outras doengas infecciosas novas ou recrudecentes. 3. As Respostas da Educagio Médica A ética médica empenha-se em fazer o bem e no fazer o mal. Enquanto, conhecidamente, muitas das solugdes para os desafios acima esto além do conhecimento do médico ou até mesmo das responsabilidades do proprio setor de satide, o profissional médico deve cumprir seu contrato social da melhor maneira possivel. 0 médico do Século XXI deve ser replanejado. Os médicos devem promover a satide, evitar e tratar a doenga, e reabilitar 0 deficiente de maneira ética ¢ amorosa. Cada vez mais eles devem fazer isso sem nenhuma restrigao de recursos. Porém a sociedade, a profissao e os educadores médicos pedem mais. Os médicos devem também ser melhores fornecedores dos cuidados bisicos de satide; comunicadores, pensadores criticos, motivados para aprender durante a vida toda, especialistas da informagao, praticantes da economia aplicada, da sociologia, antropologia, epidemiologia e medicina comportamental; administradores de uma equipe de satide; e advogados da comunidade. 3.1 O Rumo da Reforma Os educadores médicos em 1988, apés intensos debates, propuseram as 12 reformas da Declaragio de Edinburgh: - ambientes educacionais relevantes - curriculos baseados nas necessidades de satide aprendizagem ativa e duradoura. aprendizagem com base na competéncia. . professores treinados para serem educadores. . integragdo da ciéncia com a pritica clinica. selego de alunos por atributos intelectuais e ndo-cognitivos também. _ coordenagao da educagiio médica com os cuidados de satide. - formagio equilibrada de tipos de médicos. . treinamento multiprofissional educacaio médica continuada. 2 Estas propostas de mudangas tém sido adotadas ¢ testadas em muitas, mas de maneira alguma na maioria das escolas de medicina, e tém encontrado estratégias efetivas para superar obstéculos da educacgio médica. O conservadorismo da profissio médica e das universidades, e as complexidades da mudanga necesséria, tm resultado em uma resposta lenta aqueles que esto na lideranga das mudangas e que chamam outros para segui-los Quanto aos princfpios da Declaragao de Edinburgh, estes exigem que sua implementacio seja feita com estratégias ousadas, claras, atraentes ¢ praticdveis. 4, Recomendages para a ago As seguintes recomendagées so a conclusio do Encontro de 1993, surgidas a partir de trabalhos de convidados, das discussées em plendrias e de grupos de trabalho. Um breve comentario sobre cada questio é seguido de exemplos de agdes que podem ser tomadas junto com os resultados esperados. As respostas nao sao exaustivas nem universais ¢ aguardam uma revisdo a varios niveis, aplicacdo e interpretagao no contexto local, regional e nacional. 4.1 Pratica e Politica 4.1.1 A Disjungdo entre a Educagao Médica e o Ambiente da Pratica Médica A boa educagdo médica demanda um parceria com o sistema de atengiio & satide. Um médico contempordneo nao pode ser treinado apenas em hospitais universitérios. Sem tal parceria, o programa educacional serd limitado quanto as realidades da prdtica, e ndo fornecerd treinamento adequado para satisfazer as necessidades da populagio a ser atendida. Tal disjungdo, quando o sistema de educagio médica esté desvinculado da prestago de servigos na rea da satide, é ainda uma triste realidade em muit. s paises, Agio: RelagGes administrativas e de trabalho eficientes entre universidades e servigos de satide, incluindo as organizagées de atendimento a satide locais e as comunidades, so essenciais para alcangar interagdes coerentes entre a pratica e a educagao. As habilidades adquiridas nos curriculos reformulados deveriam ser relevantes as necessidades do ambiente desta pratica e da comunidade. Resultado: Novos acordos politicos e institucionais para assegurar a relev,ncia entre a educagio e as necessidades e padrées de pritica, e a satisfagéio profissional de que © que foi aprendido pode ser aplicado e util. 4.1.2 Planejamento Nacional de Recursos Humanos da Sdude Por uma questao de relevancia tanto das necessidades quanto da eficiéncia no 22 uso de recursos humanos € que os paises deveriam sistematicamente determinar 0 ntmero necessario de trabalhadores na rea de satide, e o perfil de competéncia de cada categoria, Quando tal planejamento nao é feito, a forca humana na drea-da satide pode se deseqBuilibar, uma taxa de desemprego onerosa e a falta de atendimento a necessidades reais se apresentardo.. Naturalmente, as habilidades, comportamento e motivagées do pessoal da satide so essenciais para sua eficdcia.Desta forma, o planejamento deveria envolver aqueles que formario o pessoal, aqueles que fariio uso deste pessoal, e aqueles que receberio 0 servico. Aco: Os Ministérios da Educagao e da Satide, as instituigdes de formagao e representantes que tenham uma perspectiva piblica deveriam cuidadosamente unir suas politicas e programas para assegurarem uma coeréncia na formagao e utilizagao de pessoal. Nas sociedades onde nao existem planos de desenvolvimento da forga de trabalho em satide serd necessdrio desenvolver abordagens de cooperagao nas instituigdes de formagio e em grupos de usuarios para uma determinagao sensfvel das necessidades. Resultado: (1) uma forga de trabalho na 4rea de saide equilibrada; (2) uma base s6lida para o desenvolvimento educacional ¢ utilizagao eficiente de estagidrios; e (3) mecanismos para o ajuste do contetido e qualidade do pessoal da assisténcia médica. 4.1.3 Sistemas de Assisténcia Médica: Implicagdes na Educagao Médica. Muitos dos sistemas de satide sio complexos, onerosos, desiguais, e nado bem entendidos pelos médicos e pacientes. Até mesmo os médicos que recebem uma ‘educagdo médica inovadora e s6lida podem nio ficar satisfeitos devido a situago em que se encontram os sitemas de satide quanto as expectativas do usuario, remuneragao, regulamentagao e inadequagdes mais importantes e fundamentais do sistema. Os sistemas de satide podem ser planejados e desenvolvidos para serem iqualitérios, eficazes e sustentaveis. Agiio: As escolas de medicina devem se envolver mais com o desenvolvimento de sistemas de satide assim como com o treinamento do pessoal. Pesquisas sobre servigos e ensino nos ambientes de trabalho expordo aos alunos modelos alternativos e possivelmente criardo padrdes de cuidados médicos nos quais eles estario mais aptos a escolher na hora de trabalhar. Resultado: Médicos melhor preparados, melhores servigos piiblicos e melhor uso dos recursos. 4.1.4 Especialistas e Clinicos Gerais: em busca de um equilibrio. Um sistema de satide eficiente e de custo-beneficio justo deve incluir clinicos gerais capazes de detectar e tratar a maioria dos problemas da satide e encaminhar apenas uma pequena parte para o atendimento especializado.Muitas nagdes desenvolvidas possuem muitos especialistas ¢ poucos clinicos gerais e, as vezes, até nestes casos, algumas especialidades como a psiquiatria esto subdimensionadas. 23 Agao: Formulagao de polfticas com base na realidade econémica e epidemiolégica do pafs, com atengo voltada para estimular e elevar 0 "status" do médico de atengiio priméria de satide. Resultado: Tipos mais apropriados e em quantidade mais significativa. 4.1.5 A Transigado da Saiide: Preparagdo Educacional Os perfis da satide em pafses desenvolvidos ¢ em desenvolvimento estio convergindo. A expectativa de vida nos paises em desenvolvimento é alta ¢ também a taxa de doengas crdnicas em adultos ¢ inclusive em velhos. As novas doengas sociais (violéncia, uso de drogas, desintegrago familiar) afetam grupos’ vulnerdveis em todo o mundo. Agio: As instituigdes de ciéncias da sadde deveriam estudar e ensinar aspectos relevantes desta transi¢ao de satide. Resultado: Os formados pelas escolas médicas que podem prever, reconhecer e atender os fenémenos comportamentais, epidemiol6gicos e demograficos que afetam as populagdes onde eles trabalham, e fornecer uma assiténcia relevante em termos de promogao, prevengio, cura e reabilitagdo dos pacientes que eles tratam e da comunidade onde trabalham. 4.1.6 A AIDS e outras doengas cronicas: 0 Desafio para a Compreenséo e 0 Carinho O efeito da AIDS sobre a satide publica ¢ dos individuos, sobre os sistemas de satide nacionais,e sobre os médicos esté cada vez mais devastador. A doenga tem revelado falhas sociais e técnicas na preparagdo dos profissionais para lidar com esta pandemia. Estas deficiéneias profissionais tém também importantes consequéncias na atengdo a outras doengas mais comuns. Aciio: Ampliar e aprofundar a educagio médica para que ela cubra: prevengiio, satide publica, ética, ciéncia social, promogéio da satide, comunicagéio, compromisso longitudinal com pacientes terminais, medicina holistica, administragao de equipe, doenga infeciosa, sexualidade e direitos humanos. Assegurar que os alunos acompanhem ativamente os pacientes ambulatoriais portadores de AIDS e/ou outras doengas crénicas através dos varios estgios da doenga, inclusive o cuidado ambulatorial, por um perfodo de tempo suficiente. Resultado: um profissional mais holistico, amoroso, competente e com um nivel de consciéncia mais agugado. 4.2 Resposta Educacional 4.2.1 A Politica institucional e a Administragao em apoio a Educagéo Médica As instituigdes apresentam varios padrdes de comportamento. Muitas escolas de medicina nado possuem uma missao estabelecida. Algumas raramente revisam os currfculos médicos que permanecem direcionados pelo departamento e/ou prescritos externamente.Sabidamente, a auséncia de missio e a presenga de curriculos impostos nacionalmente criam instituigdes passivas que por sua vez produzem profissionias passsivos. As estruturas administrativas para o planejamento e implementagao de mudangas curriculares frequentemente nao possuem autoridade, e os métodos de avaliagdo nao esto relacionados com os objetivos educacionais. Claramente ha muitos empecilhos para que ocorram mudangas. Acio: O comportamento institucional das escolas de medicina necesita ser estudado com especial atenco a formulagdo e implementagdo de sua missao. Ao mesmo tempo, as faculdades de medicina deveriam criar equipes multiprofissionais para 0 planejamento ¢ implementagio de programas de educagio médica geral que atendam as necessidades locai Resultado: Diregdes mais orientadas para o desenvolvimento institucional, esforgo mais concentrado nas questdes educacionais e maior relev,ncia para o ensino de graduagao. 4.2.2 Procedimentos de Selegao para Admisséio nas Escolas Médicas Os procedimentos de admissio nas escolas de medicina deveriam ser baseados na sua capacidade instalada e em metas nacionais para a forca de trabalho em satide. O sistema aberto de entrada est4 obsoleto. Os procedimentos de seleg&o sao essenciais e considerados em todos os lugares, porém em muitas escolas de medicina eles sio arbitrdrios e muitas vezes casticos. Ago: Os principios de selegdo deveriam ser claros, nao discriminativos e socialmente validos. As escolas médicas deveriam estabelecer critérios de admissfio que envolvam caracterfsticas tanto académicas quanto intelectuais, tais como 0 compromisso social e a condigaio de minoria. As técnicas de avaliagao de atitudes deveriam ser estudadas em todas as escolas de medicina para validagao da identificagdo da qualidades ndo-cognitivas necessdrias aos futuros calouros. Resultado: Alunos formados em escolas de medicina que melhor atendem as necessidades de satide nacionais. 4.2.3 Capacitagao dos Professores de Medicina para uma Educagdo Médica de melhor Qualidade. Os professores de medicina frequentemente so apontados como sendo aqueles com demonstrada habilidade para pesquisa biomédica mas com pouco enfoque nas habilidades de ensino e a respeito de competéncia na comunicagao. H4 uma nogio justificada de que os precdrios habitos de aprendizagem dos estudantes de medicina sio frequentemente devidos a falta de conhecimento educacional de seus professores. No 25 entanto, a competéncia aprendida na pesquisa melhora a habilidade dos professores em ajudar os alunos a entenderem os conceitos das ciéncias biomédicas sociais ¢ psicolégicas. Agiio: As escolas de medicina deveriam instituir programas para melhorar a competéncia de ensino e a capacidade de comunicagio do corpo docente. Além disso os professores de medicina devem melhorar 0 processo educacional. Eles devem ser selecionados, promovidos e recompensados, em parte, de acordo com sua habilidade de ensino e contribuigdo prestada ao desenvolvimento educacional. O controle de desempenho dos professores, incluindo informagées prestadas pelos alunos, deveria ser usado para a melhoria do ensino. Resultado: Desenvolvimento do professor ¢ do estudante de medicina. 4.2.4 Envolvimento do Estudante de Medicina no Planejamento e Avaliagdo da Educagao Médica O papel do aluno na sua prépria educacdo é vital. O aluno de hoje é o professor de amanha. Ele deveria se envolver no planejamento curricular e no ensino. Talvez. mais idealista e menos sobrecarregado do que © corpo docente e administradores o aluno é um agente poderoso na mudanga educacional necesséria. Ago: Os alunos deveriam ser parceiros valiosos em todos os passos da educacio médica: planejamento dos objetivos, administragao da escola de medicina, curriculo, ensino e avaliagio. Resultado: Uma educagdo médica de acordo com uma concepcao mais ampla: sociedade, a instituigio, 0 corpo docente e especialmente os alunos, seus destinatarios ativos 4.2.5 O Lugar da Ciéncia em Relagao a Medicina A cigncia esté no Amago de um curriculo efetivo. Os métodos cientificos sao essenciais para definir. poblemas e avaliar o impacto da intervengdo na assisténcia aos pacientes e as comunidades. O ensino da ciéncia nao pode ser departamentalizado € confinado aos anos pré-clinicos. © curriculo como um todo exige um pensamento cientifico e critico. Agao: Enfatizar a abordagem cientifica quando trabalhar com as habilidades de aprendizagem. Considerar a reconstrugao departamental que promova a integracao horizontal e vertical da ciéncia biomédica e também das ciéncias comportamentais & sociais em disciplinas clinicas e de saiide comunitéria. Enfatizar a ciéncia econémica.a estatistica, administragao e a informatica como relevantes para o trabalho clinico. Resultado: Profissional com base cientifica que pode permanecer & frente dos avangos cientificos e entender sua relevancia para o campo da pratica. 26 4.2.6 A Base Etica da Educagéo Médica Ha valores fundamentais e princfpios morais que caracterizam e permeiam a pratica médica. Os princfpios da ética sio aplic4veis em dois nfveis: na clinica e no hospital para o bem estar do paciente; e nas comunidades, para o bem estar da populaco. Ambos necessitam de relacionamentos compardveis: 0 médico com o paciente de um lado, e 0 provedor de assisténcia de satide com a comunidade do outro. O contrato social entre eles precisa ser correto e bom: correto- de padrdo técnico adequado, e bom- na manutengdo de valores e prioridades do paciente ou da comunidade.Um outro, e mais novo, campo da ética médica se refere a determinagao de prioridades e disposigéo de recursos em relagdo as necessidades. Agio: A ética deveria sempre receber atencio total da escola de medicina, em todos os encontros clinicos, e na comunidade. Grupos consultores deveriam continuamente explorar os prinefpios éticos quanto a diferentes grupos culturais e planejar modelos curriculares adequados. Resultado: Profissionais e instituigdes mais atenciosos; pacientes e comunidade melhor servidos. 4.2.7 Estratégias e Métodos de Ensino e Aprendizagem A competéncia e a motivagdo para uma aprendizagem duradoura, particularmente tendo em vista a explosio de informagées, é assegurada por métodos de ensino efetivos. A aprendizagem por solugdes de problemas (P.B.L) aprimora a habilidade de anélise, sintese, ¢ avaliagio necess4ria para solugao de problemas clinicos. O treinamento da leitura critica de trabalhos cientificos capacita os formandos a identificar avangos essenciais no seu préprio campo. A aprendizagem voltada para a comunidade enfatiza a relev,ncia. Os avangos tecnolégicos dos métodos educacionais, tais como a aprendizagem por computador, simulago ¢ a dist,ncia, podem ter suas fungdes em muitos ambientes de aprendizagem. Agio: As aprendizagem que sejam centrados no aluno e promovam a organizagio de redes nacionais € regionais de produgao de materiais de ensino relevantes e adequados. As estratégias de aprendizagem deveriam ser voltadas para a competéncia e de acordo com as necessidades locais dos profissionais da satide. Estudos de validaco de técnicas de avaliagio e avaliago das inovagées nos curriculos so necessarios. stituigdes associagdes deveriam encorajar métodos de Resultado: (1) Um médico competente para 0 contexto local e motivado a permanecer assim; e (2) materiais de aprendizagem e técnicas de avaliagdo relevantes. 4.2.8 Op¢ées Curriculares Para Acompanhar a Sobrecarga de Informagaes A sobrecarga de curriculo € um problema fundamental e crescente na educagao médica, mesmo quando a aprendizagem € agradavel e os alunos stio capazes e aplicados. 27 Aco: Os grupos de trabalho a niveis internacional regional deveriam pensar na revisio de curriculos representativos. Os exemplos incluem aqueles baseados em ensino de sistemas; ou aprendizagem P.B.L; ou materiais bésicos e opcionais com médulos essenciais, tais como ética ou assisténcia primaria de satide. Um curriculo mfnimo cuidadosamente sequenciado e suplementado com médulos especiais de estudo é bem visto, em especial se promover a auto-aprendizagem. A parte bdsica do currfculo visa uma fundamentagio através do pensamento critico e competéncia para comunicagao e entrevista, independente do caminho profissional futuro do estagidrio. As partes opcionais do curriculo fomecerdo a aprendizagem aprofundada de acordo com os interesses e necessidades especificos. Resultado: Uma competéncia basica assegurada que atenda as exigéncias da sociedade, instituigdes e alunos. 4.3 A Educacaio Médica Continuada 4.3.1 Educagao Médica a Nivel de Pés Graduagao: Uma Visdo Holistica O planejamento educacional para a pés-graduagéio pode nao ser racional sob varios aspectos. O interesse académico em um treinamento especializado pode sobrepujar 0 comprometimento com o treinamento de clinicos gerais. Os programas de treinamento para clinicos gerais frequentemente nao recebem reconhecimento profissional e confianga do piiblico. O treinamento em todas as especialidades é fraco no preparo de estagidrios para as condigdes s6cio-econémicas e epidemiolégicas da assisténcia priméria de sdude. O treinamento de especialistas e a qualificagdio por exames podem nfo estar adequadamente combinados. H4 ambiguidades nao solucionadas em que os profissionais da clinica geral so agora reconhecidos em muitos pafses como especialistas de clinica geral. Em muitos pafses em desenvolvimento os formandos sao treinados para prontamente assumirem uma prdtica independente assim que deixam a escola de medicina. As missdes das escolas de medicina deveriam especificar os tipos de alunos que desejam formar, para que as competéncias que cabem A educago de pés-graduacio e aos programas de treinamento de especialistas sejam explicitados. Agi amplos da p6s-graduagdo, com mecanismos politicos que possam apoiar a formagao balanceada de clinicos gerais e especialistas. Os programas de treinamento de pés- graduagdo precisam estar cuidadosamente relacionados com o contexto no qual eles serio colocados em pratica, e ligados a programas educacionais continuados ou de graduagdo [4 uma necessidade de uma visio holfstica no planejamento dos campos Resultado:Produgao equilibrada de médicos especialistas e clinics gerais treinados de acordo com as necessidades locais e ligados a um "continuum" da educagao a nivel de graduagio. 28 4.3.2 A Educagdo Médica Continuada e a Aprendizagem Duradoura A Educagdo médica de graduagio e pés-graduagdo, independente de sua durago, so insuficientes para assegurar uma competéncia duradoura. Além disso, a mudanga curricular institucional tem pouco impacto sobre aqueles que jé esto exercendo sua prdtica médica. Mudangas tecnolégicas, epidemiolégicas, politicas e sociais complexas afetardo sempre a competéncia de maneira imprevisivel. A educago médica continuada € essencial para manter a competéncia dos mais novos graduados, para influenciar a pratica dos mais velhos, para remediar falhas na prética médica, e para capacitar todos no atendimento dos desafios presentes no ambiente profissional. Agiio:Uma vez que a mudanga na educagdo médica depende muito da motivacdo dos estudantes, as habilidades de uma aprendizagem auto-dirigida devem ser adquiridas na educagdo anterior e posterior a graduacao. O contetido da mudanga deve atender as necessidades dos que praticam a medicina. A mudanga na educago médica requer um planejamento de educagdo bem pensado: objetivos.estratégias, habilidades ¢ avaliagdo. As redes internacionais e os centros colaboradores para a mudanga na educagiio médica so necessrios para o devido compartilhamento e apoio. Os pafses devem prover fundos e monitorar o processo global e seus resultados. Resultado:Uma forga de trabalho médico competente e bem informada, predisposta a uma aprendizagem auto-dirigida continuada, participativa e em resposta as, mudangas 4.4 Parceiros na Aprendizagem 4.4.1 Equipes de Saiide e Educagdo Multiprofissional Os médicos sozinhos nao podem fornecer toda assisténcia de satide. Os médicos contempor,neos trabalham em equipes que representam muitas profissdes diferentes. A aprendizagem junto a equipes e grupos melhora a socializagdo profissional precoce e dé oportunidade para o desenvolvimento de liderancas. Agao:A educacio multiprofissional, onde membros de diferentes profissdes da satide sdio treinados em conjunto, estabelece e aprimora o "ethos" do trabalho em equipe, ea colaboracao essencial da medicina com os demais profissionais de satide. Resultado:Médicos de maior valor que podem trabalhar como membros de equipe de satide, mais respeitados pelos colegas e em favor dos pacientes e da comunidade. 4.4.2 Participagao das Comunidades na Educagéo Médica ‘A Conferéncia aprovou as muitas iniciativas j4 em andamento em diferentes partes do mundo, tanto desenvolvido quanto em desenvolvimento, voltadas para uma orientagao da comunidade quanto a educagio médica, e voltadas para a participagdo da 29 comunidade na determinagao de uma politica de satide. As comunidades devem ter Participaco nas tomadas de decisdo e aco em relagdo a satide. As pessoas devem ser capacitadas a fazerem a escolha mais acertada e devem receber protegiio contra doengas controlaveis, Ag4o:Os muitos projetos e a crescente literatura sobre a participacdo da comunidade na satide ¢ no desenvolvimento precisam ser abragados por todas as instituigdes educacionais. A participagdo da comunidades na educagdo médica e nas. decisées administrativas institucionais é agora essencial. Resultado:A participagdo comunitéria encorajaré a aprendizagem interdisciplinar e 0 trabalho multiprofissional. Um papel maior da comunidade no processo educacional aumentaré a credibilidade e a relev,ncia da educagio médica, destacaré a concord,ncia da comunidade com iniciativas, e promoverd o desenvolvimento e a methoria da satide. 4.4.3 Comunicagao com os Pacientes e o Piiblico A habilidade de comunicagao com os pacientes, colegas e 0 ptiblico é uma necessidade basica do trabalho clfnico. Em muitos casos, a insatisfagio dos pacientes e do piiblico se deve mais a uma m4 comunii profissional. dio do que qualquer outra deficiéncia Aciio:As escolas de medicina deveriam identificar como melhorar a habilidade de comunicagao de todos os futuros médicos. Os métodos deveriam incluir observagio e participagéio em varias atividades de comunicagao, especialmente entrevistas com pacientes e apresentacgao de casos; e envolver comunicacio escrita e falada com o ptiblico, diferentes comunidades, culturas,e meios de comunicagdo. O corpo docente deveria ser capacitado a assegurar a promogao da habilidade de comunicagao. Resultado: Médicos comunicadores habilidosos capacitados a ouvir, a entender e aconselhar os pacientes; a informar e educar o piiblico; a falar aos pacientes, & comunidade ¢ a sociedade. 4.4.4 Maior Participagao nas Decisées. As comunidades procuram estar mais bem informadas e ter maior influéncia sobre seus sistemas de atendimento a satide, Os pacientes tém maior participagao e controle sobre a assisténcia prestada a eles, e por sua vez tornam-se cada vez mais responsdveis por sua prépria satide. A satide € muito influenciada por fatores externos ao setor sanitério. Quando nos distanciamos de uma doenga e buscamos orientago sobre a satide, prevengdo de uma € promogao da outra, outros setores devem ser envolvidos.Os médicos do futuro terdo que se preocupar com questées nao apenas diretamente relacionadas a satide. 30 Acdo:A aprendizagem P.B.L na comunidade far com que os alunos confrontem demandas reais de participagiio dos pacientes e do piiblico. A ateng&io dada aos pacientes com AIDS ou outras doengas crénicas exige que o aluno aprenda meios de lidar com eles como parceiros.Os grupos consultores que revisam a politica de forga de trabalho na area de satide deveriam incluir uma representagio adequada da comunidade. Resultado: Médicos acostumados e beneficiados pela compartilhagdo de forgas com pacientes e o piiblico, e abertos ao debate e a uma politica social piblica. 4.5 Ambientes Para Aprendizagem 4.5.1 Ambientes Realistas Na Educagdo Médica A educagio médica esté tipicamente ligada ao ambiente hospitalar, frequentemente concentrada no nivel tercidrio, e caracterizada por doengas raras ¢ tratamentos caros.Os habitos de trabalho e os sistemas de apoio nao sao aplicdveis ao sistema de assisténcia a satide como um todo. Enquanto de inegivel import,ncia para o treinamento de especializagdo e pés-graduagdo, ao mesmo tempo o hospital universitério pode desnortear os alunos ou frustar um treinamento geral. Ago: Varios ambientes, tanto médicos quanto ndo-médicos(local de trabalho, escolas,vilas,lares)colocardo 0 aluno diante de um leque mais realistico de problemas de satide, condigdes humanas, ¢ modelos de profissionais, a fim de aumentar e enriquecer sua experiéncia hospits Resultado:Quando baseado em principios cientfficos rigorosos, inclusive epidemiologia clinica, o uso de ambientes mais amplos produzir4 um profissional melhor capacitado, ¢ mais satisfeito, pronto para fornecer assisténcia bsica e mais consciente da necessidade de uma equipe de trabalho multiprofissional. 4.5.2 Comprometimento das Universidades com uma Educagdo Médica com base na Populagéio A educagdo médica baseada em uma sequéncia de encontros clinicos em hospitais nao percebe o contexto epidemiolégico da satide de um paciente, e a probabilidade de uma doenga.A assisténcia de satide basica exige equidade: isto 6, cobertura universal e assisténcia de acordo com a necessidade. Estas consideragdes requerem avaliag’io de grupos em populagdes definidas independente de seus pedidos de assisténcia médica. A educagdo com base na populagio atende aqueles mais necessitados, frequentemente devido a pobreza, que serio identificados pela assisténcia que até 0 momento nao tenham recebido.A educagdo com base na populacio inevitavelmente precisa de pesquisas sobre a comunidade, participagao do piblico, e feedback. Ach :Independente da fung3o de uma instituigao, interesses, ou localizacio, sua 31 eficdcia € aumentada pelo compromisso explicito assumido com a satide de uma populagdo definida e com o sistema de assisténcia e apoio. Resultado:Ensino, estudo e assisténcia inicial a individuos e comunidades, a pessoas em seus lares, no contexto das necessidades de uma populacio definida, ajudam uma instituigo a interpretar e cumprir suas obrigagdes para com a sociedade que serve. 5. Colaboragio Internacional © apélo da Conferéncia Mundial de 1988 para um programa de colaboragio global foi firmemente endossada. Somente uma parceria eficaz e responsavel, na qual todas as nagGes participem, pode implementar as muitas reformas recomendadas. Ago: Uma parceria entre todos os individuos, instituigdes, associagdes, ¢ organizagdes responsdveis deve ser formada, e esta rede deve ser encarregada de assegurar que as recomendagdes da Conferéncia recebam debates, implementagio e controle adequados. A Federag’o Mundial, as agéncias co-patrocinadoras OMS, UNICEF, UNESCO,UNDP,e 0 Banco Mundial, ¢ todos os outros érgaios representados por seus delegados no Encontro constituem a estrutura organizacional do programa. Resultado: Um médico remodelado para o século 21, com uma rede de trabalho global a fim de promover, implantar e prover recursos para as 22 recomendagées especificas e suas inevitdveis reinterpretagGes no futuro. A Conferéncia Mundial de Educago Médica registra seu compromisso para com o esforgo urgente de se trazer a tona as mudangas identificadas. A Conferéncia esta convencida de que estas mudangas so essenciais para que as instituigdes de ensino médico possam responder com eficiéncia as necessidades de suas sociedades, e para que possam formar o médico de amanh& com competéncia técnica, social e ética. 32 Uma proposta de Gestao de Qualidade na Educacao Médica* 1. Introdugio Entre os tiltimos meses de 1992 e meados de 1993 ocorreu um intenso processo de reflexao nas faculdades e escolas de medicina da América Latina s6bre o impacto que as mudangas no contexto sécio-econémico e as transformagées da pratica médica exercem sobre a educaciio médica. Neste processo participaram, direta ou indiretamente, 230 escolas da América Latina e do Canada. A OPS contribuiu significativamente para esta andlise através da elaboragdo e promogao da discussdo de um documento-base! e por meio do apoio direto A consolidago de um posicionamento latinoamericano sébre este tema. O documento com este posicionamento? foi apresentado & II Conferéncia Mundial de Educagiio Médica (Edimburgo, agosto, 1993). A organizacao da pratica médica vem experimentando importantes mudangas como consequéncia de uma conjungdo de fatores econdmicos, politicos e outros derivados do desenvolvimento da ciéncia e tecnologias médicas, com crescente institucionalizago e perda de autonomia do médico, aumento significativo do custo da atengdo e maior segmentagdo social. Estas mudangas na sociedade e na organizagao da pratica médica afetam direta e indiretamente, imediatae — mediatamente, os objetivos das instituigées, atores e processos da educacio médica. As priticas dos médicos e seus processos de profissionalizagao (educativos e corporativos) definem-se em fungio dessa estrutura estratificada de atengao médica, estando instalada uma dindmica destinada a formar profissionais diferenciados, o que leva a uma polarizagdo-segmentagdo entre especialistas e generalistas. Todavia, este processo é complexo e desigual. Na realidade existe um mosaico de formas de praticas e a ideologia liberal, estruturadora de tais praticas, continua sendo um referencial bésico para a maioria dos profissionais, muitos dos quais ainda néo perceberam a perda de sua autonomia. Nessa reprodugio cultural a escola de medicina joga um papel muito importante. A educagdo médica nfo é um espelho que reproduz mecdnicamente o mundo do trabalho. A escola é também um fator de reprodugao cultural que ativa mecanismos de intermediagiio simbélica, que produz e extende a ideologia, * _Documento preparado pelo Programa de Desenvolvimento de Recursos Humanos da OPS para o Encontro Continental de Educagdo Médica, Punta del Este, Uruguay, 10 -14 outubro, 1994. 1 OPS OMS: Los cambios de la préctica médica y su influencia sobre la Educacién Médica, Educacién Médica y Salud, No. 28:1, 1994, 2. OPS/FEPAFEM: Los cambios de Ia profesin médica y su influencia sobre Ia Educacidn Médica (inédito) 33 cultura, ciéncia e tecnologia médicas. Essas mudangas tém alterado nio sémente as regras da pritica técnica mas também tem afetado os princfpios éticos do exercicio profissional. O juramento hipocrdtico orientador do “bom trabalho" na prdtica liberal auténoma parece que perdeu sua vigéncia. As realidades de uma medicina crescentemente coletiva, comercial € intermediada institucionalmente, controlada social e jurfdicamente, obrigam a redefinir as bases éticas da prética. As faculdades respondem idiosincraticamente as exigéncias e desafios de seu ambiente externo. Sua histéria, sua cultura, suas polfticas, seus professores e alunos, seus triunfos ¢ fracassos, seus planos para o futuro e em grande medida, seus problemas e limitagdes atuais decidem seus compromissos e agGes. Essa articulagdio com a realidade Teflete-se em sua filosofia de educagao, suas politicas de admissio, na estrutura do corpo docente, nas metodologias pedagégicas, nos perfis profissionais, na utilidade de suas pesquisas. O critério de qualidade define-se neste contexto. Assim, existem instituigdes que definem sua qualidade em termos de pertinéncia social ante as demandas e necessidades populacionais, enquanto outras o fazem em fungio de indicadores como a aprovagio em exames de residencia no pais ou no exterior. Uma recente reuniao de reitores de universidades latinoamericanas para discutir © papel da universidade na satide da populagdo considerou que existe um generalizado incOmodo pela qualidade (qualquer que seja sua definigdo ou seus indicadores) dos resultados e produtos do processo académico. Identificou também sérias dificuldades financeiras para a manutengfio (ja que nfo hé crescimento) de suas capacidades instaladas para a formagdo e a pesquisa? As relagées entre a universidade e 0 estado tem se transformado e também as relagdes no interior das instituigdes de educagdo superior. Da mesma forma que em outras dreas da sociedade, tem se instalado, por exigéncia interna ou proveniente do exterior, mas em todo caso com crescente legitimidade, a preocupagao pela qualidade e pela eficiéncia dos processos académicos. Uma nova dimensdo da articulagdo da universidade em sua realidade provem da crescente competitividade em um mercado de recursos que exigem créditos crescentes de qualidade e a concordéncia em submeter-se & avaliagdo externa de suas atividades. Um niimero crescente de faculdades esto incorporando inovagées como aprendizagem baseada em problemas, curriculo orientado para a comunidade, integragio do conhecimento bisico e clinico e a busca de eixos estruturais como a biologia do desenvolvimento. Apesar das expectativas que despertam inicialmente, a andlise destas experiéncias (Byrne, 1991) demonstra que sao tentativas marginais, que expressam 0 esgotamento de alguns principios da proposta educativa de Flexner, sem chegar a 3. OPS-HRD "Perspectivas del Papel de la Universidad Latinoamericana en la Salud de la Poblacién’”, Documento inédito. Washington, D.C., 20 de septiembre de 1993. 4 Byme, N. y Rosenthal, E.: "Tendencias de la educacién médica y propuesta de orientacién para Ia educacién médi Latinoamérica”. Educacién Médica y Salud No. 28:1 ,1994. 34 conformar um novo paradigma. Em outubro de 1994, na cidade de Punta del Este, Uruguay, as escolas ¢ associagées de educagiio médica da América se reuniro para debater questées relativas & avaliagdo dos processos educativos, a preocupagao pela qualidade educacional, os novos critérios éticos, 0 compromisso com a realidade social e a cobertura de atengio ¢ 0 impacto que as mudangas na pritica médica exercem sObre a educagdo médica. Este documento pretende ser uma contribuigéo ao cumprimento das expectativas e objetivos desta reuniao. 2, Avaliagao e gestdio da qualidade Em quase todos os pafses da América Latina existe hoje, entre aqueles que se ‘ocupam da educagdo médica, um disseminado e inegdvel sentimento de insatisfagéo em relagdo aos processos educacionais vigentes e seus resultados, tendo em vista os problemas de desempenho dos novos profissionais no mercado de trabalho. Esta preocupagio pela qualidade da forga de trabalho médica tem sido expressada nao s6 por professores e dirigentes universitérios da area, mas também por Ifderangas associativas e autoridades responsaveis pelas politicas educacionais. Tal insatisfagao aponta inicialmente as limitagdes da escola médica para a produgdo e transmissio de um novo conhecimento e a contribuigdo a um novo padrdo de pritica profissional (com um papel protagnico para o médico geral). Mas também se vincula ao crescimento do numero de escolas, nem sempre contando com os recursos adequados, e ao processo de deterioragio de muitas das escolas j4 existentes que, no contexto da crise, enfrentam baixos nfveis salariais, pobreza das instalagdes, perda de qualidade do processo educacional, redugiio do esforgo de pesquisa e despreocupagiio pela reconstrugio das priticas de satide. Diante desta situagdo se procura, em geral, a adogiio de politicas regulatérias e de controle, entre as quais se incluem a introdugdo de processos de reconhecimento da capacidade profissional (p.ex. exame de Estado, titulo de especialistas), a exigéncia de acreditagao das instituigdes docentes ¢ os mecanismos orientados a frear a criagio de novas escolas (p.ex. estabelecimento de requisitos minimos para funcionamento). Estas sdio medidas de seguranga de valor relativo por atender parcialmente & insatisfago anterior e no chegar a influenciar diretamente 0 processo de desenvolvimento institucional das escolas. Limitam-se a promover a obtengao de um nivel minimo aceitavel, mas nfo contribuem para estimular 0 avango para um ideal mais amplo, incluindo neste a visdo transformadora de uma pratica em um novo contrato social. O exemplo mais significativo desta limitagio é o préprio sistema de acreditago norteamericano, que estando muito influenciado pelo paradigma flexneriano, no tem podido reorientar-se para atuar como indutor da mudanga necesséria que, sem prejuizo da qualidade cientffico-tecnol6gica, possa superar a tendéncia quase exclusiva para a especializagao. 35 Todos os processos referidos tém sua fundamentagio na avaliagdo e nela encontram seus maiores obstéculos e limitagdes. Muitas tém sido as tentativas e abordagens avaliativas neste campo, mas sem alcangar plena satisfago com qualquer delas, nao s6 no sentido de poder refletir com fidelidade a realidade funcional e produtiva da instituigo, como também em induzir a agdo corretiva dos desvios observados. Apesar da critica que se faz as consequéncias atribuidas ao que se chama “paradigma flexneriano", néo se pode deixar de admirar a eficiéncia da avaliagao realizada por Flexner, quanto a sua capacidade de frear o desenvolvimento inadequado da rede de formacao médica norteamericana e conseguir fechar um niimero significativo de faculdades. Contudo, nem neste caso de tanta tradigo hist6rica pode-se atribuir todo 0 &xito ao processo avaliativo quando se observa que na realidade podem ter sido outros os fatores determinantes da redugdo do ntimero de escolas, as quais eram 160 em 1904 e ja havia baixado a 130 no momento do informe Flexner, em 1910, Na realidade, o ritmo de redugiio continuou sendo o mesmo depois de Flexner, visto que o niimero total de escolas baixou a 100 nos seis anos seguintes.5 Os critérios externos aos processos e agentes educacionais (tipo Flexner) constituem a base para uma selegdo entre uma diversidade real e desigualdades notérias. Seu objetivo é transformar o nivel de desempenho dos mais aptos em uma meta que deve ser alcangada por todos (consequentemente nfo tem vigéncia para os que jd se situam entre os mais aptos), mas deve estimular 0 auto-aperfeigoamento dos menos aptos para alcangar os padrdes recomendados. Esta op¢do nio chegou a extrapolar para a América Latina na época de Flexner, em parte por falta de diversidade pois haviam poucas instituigdes formadoras - 40 naquele momento - e a maioria era mantida diretamente pelos governos ou por grupos religiosos muito dependentes do Estado, que reproduziam os modelos europeus. No entanto, hoje esta situago mudou e j4 mais da metade das instituigdes sio privadas com um grau de diversidade, tanto em recursos como nos programas prépriamente ditos, suficientes para permitir que os parametros externos, de natureza normativa, e de orientagio retrospectiva possam levar a identificagio de deficiéncias flagrantes e servir de motivagdo aos responsdveis para a busca de agées de maior amplitude e de longo prazo. Este enfoque que envolve um observador externo e a utilizagao de parametros normativos, ainda que seja insuficiente para oferecer um potencial de abertura representativo do conjunto de atores da instituig&io, permite em alguma medida superar um eventual corporativismo estreito que leve a que uma autoavaliagio ou anélise de situagdo tenda a registrar s6 os aspectos positivos. A limitagiio maior desta avaliagao corresponde nao a multiplicidade de alternativas de modelos educacionais entre componentes cientificos e tecnolégicos, mas a dificuldade para escolher valores e referencias gerais, como aqueles que provenham do campo da ética, das ciéncias sociais 5 Hudson, R. P.: Abrahan Flexner in Historical Perspective", in Barzansky, B & Gevitz, N: "Beyond Flexner". Greenwood Press, N. Y., 1992, pag. 8 36 dos movimentos da sociedade civil e das politicas estatais. Aqui se coloca em julgamento outra mudanga importante ocorrida recentemente e que tem a ver com a forma de conceber e executar processos de avaliagiio em uma perspectiva de modernidade gerencial. Nas novas concepges sdbre estilos gerenciais dirigidos & qualidade, vem se questionando a efetividade dos processos de avaliagio gerados externamente aos processos e aos agentes. As avaliagdes “objetivas" tém sido acusadas nao s6 de ineficientes e meramente rituais, mas também de disseminar 0 médo As iniciativas de melhoria dos processos. A definigao de critérios externos teria assim uma dificuldade adicional derivada da propria evolugdio do pensamento gerencial. Por isso se advoga por uma avaliagao no proceso, a qual compreenderia a construgio de imagens-objetivo de qualidade com base em principios educacionais amplamente aceitos e 0 acompanhamento das atividades de ensino-aprendizagem tanto intra como extra-escolares. As propostas de avaliagdo através do acompanhamento continuo pressupdem que se definam quem sao os agentes envolvidos no proceso educacional de formagio de médicos. Em primeiro lugar, h4 que considerar toda uma gama de trabalhadores, de fungées técnicas e administrativas, que também devem ser considerados atores deste processo. Eles sio, de acordo com a linguagem da gestiio da qualidade, clientes e fornecedores internos que se articulam cotidianamente nas fungdes de docéncia, pesquisa e servigos. Por outro lado, os alunos no podem ser concebidos como simples clientes, j4 que t6da verdadeira aprendizagem pressupde uma certa instauragdo do individuo como sujeito ativo e nado como receptor passivo. Portanto, 0 acompanhamento continuo, vis a vis a avaliagéio da qualidade, tem que contar também com a participagiio dos estudantes que, além do mais, so os que melhor podem indicar 0 alcance das atividades extra- curriculares j4 mencionadas. A esse conjunto de agentes (docentes, dirigentes, alunos, técnicos), que sdo atores institucionais, compete assumir integralmente todas as dreas dessa nova modalidade de avaliagdo da qualidade. Por estas razdes vem se propondo a denominagao de avaliagao total que envolve a idéia de um acompanhamento articulado continuo e uma participagao universal. Portanto deverd conceber-se que a avaliagio seja pensada e incorporada como mecanismo permanente (e nao terminal) de uma vontade de conhecer melhor a situago atual e de realizar os esforgos institucionais para o aperfeigoamento de suas agdes € resultados. Isto evitaria que os pardmetros de qualidade e os ajustes necessdrios fossem vistos como resultados de uma intervengéio exterior e que sejam considerados como autoritérios. projeto de avaliacio, antes de mais nada, tem que ser assumido inteiramente como algo de interésse de todos os agentes e que nao seja visto como algo que va produzir exclusdes nem penalizagdes, mas que trar4 para todos a oportunidade de contribuir para a mudanca permanente. Atualmente podem encontrar-se experiéncias de aplicagiio dos princfpios de aperfeigoamento da qualidade na gestdo de hospitais e outras organizagées de savide, em t6das as partes do mundo, inclusive em diversos paises da América Latina. A este 37 respeito, localiza-se nos E.U.A. a experiéncia mais antigua neste novo campo do saber médico -garantia de qualidade em satide(health care quality assurance)- cujo objetivo: "é © acompanhamento do desempenho com vistas a manter e methorar sua qualidade"®, Este enfoque identifica-se com a avaliagéio convencional baseada em parametros externos e com aquela concepgdo que propée que a melhoria da qualidade se consegue identificando, denunciando e castigando 0 érro. Isto se faz através de auditorias "post- factum" que avaliam a conduta médica, mediante amostras do universo de agdes ou consultas realizadas. E duvidoso que tais procedimentos possam exercer um efeito reeducativo sébre os médicos. A linha de aperfeigoamento continuo da qualidade? apresenta um enfoque distinto, centrado na responsabilidade no trabalho ¢ na educagiio como forma de alcangar progressivos niveis de qualidade no processo produtivo e representa uma abordagem diferente do significado e implicagdes do proprio conceito de qualidade e reconhece o julgamento do consumidor neste assunto* - Nesta perspectiva tem se identificado um interésse cada vez maior na discussdo e realizado de experiéncias de controle de qualidade total (CQT) nos servigos de satide. Apesar dos evidentes progressos na melhoria do funcionamento de tais servigos, em praticamente todas as oportunidades em que se analizaram as caracterfsticas e os resultados da aplicagdio do CQT nas organizagdes de satide, ficou patente a limitagiio do processo de melhoria da qualidade, em virtude de uma escassa participagio dos médicos, ou ainda de sua oposigdo aos novos métodos de produgao e geréncia do trabalho, por representar um risco com a possfvel redugdo de sua autonomia profissional. A este respeito observa-se que a instauragiio de verdadeiros processos de melhoria da qualidade nos hospitais exige a efetiva participagao do seu corpo clinico®. Nos E.U.A. desenvolveu-se uma experiéncia exitosa que iniciou-se em 1987, 0 National Demonstration on Quality Improvement in Health Care!®, cujos resultados permitiram que um de seus principais colaboradores, o Dr. Donald M. Berwick, pediatra de Harvard, publicasse uma andlise sbre a gestao da qualidade nos servigos de satide, onde afirma que 0 "novo" paradigma do Controle de Qualidade Total provocaré uma segunda revolucio nas relagdes entre a medicina e a sociedade, compardvel com aquela ocorrida no inicio do século relacional com as conclusées ¢ recomendagdes do Informe 6 Donabedian, A. Specialization in Clinical Performance, What It is and How to Achieve It, Quality Assurance and Utilization Review, Vol 5, No. 6, November 1990 (114-120) 7 Desarrollada por el estadistico nortcamericano Deming en la ctapa de recuperacién econsmica posterior a la segunda ‘guerra mundial 8 Para una visiOn sintética de esta propuesta ver en el Anexo 1, un listado de las principales caracteristicas de Ia gestién tradicional y de ta gestién de calidad total 9) Putting the Health Care TQM, A Model for Integrated TQM: Cli Application Research Comittee Report, Methuen, 1992. Care and Operations, A GOAL QPC, Health Care 10 Berwick, M.D., Godfrey, A.B. and Roessner, J, Curing Health Care, New Strategies for Quality Improvement, A Report on the National Demonstration Project on Quality Improvement on Health Care, Jossey-Bass, San Francisco, 1991 38 Flexner. Nesta andlise, Berwick propée as seguintes caracteristicas da avaliagio total derivadas da mencionada experiéncia: - um proceso - envolve a todos os atores ~ desenvolve-se de forma permanente. Nao é terminal. - nfio gera exclusdes, nem penaliza 3. Marco de referéncia da formacao médica As observagoes assinaladas anteriormente nos Jevam a reconhecer a necessidade de levar em considerago as intimas e complexas relagdes que ocorrem entre 0 processo de trabalho e o processo de formagao de médicos. Uma abordagem do tema das relagdes entre o trabalho e a formacao médica, Sbviamente deve partir de dois conceitos fundamentais: (i) 0 paradigma da medicina e (ii) 0 processo de trabalho. Quanto ao paradigma da medicina, aqui entendido como o conjunto de elementos que conformam sua pratica tanto como a formagdo de seus agentes, constitue um rico acervo de categorias explicativas e elementos de valor que, construfdos e reconstruindo-se permanentemente em busca de sua propria afirmagdo, dao suporte e direcionalidade aos interésses presentes neste campo de pratica. Este corpo doutrindrio, para os objetivos da discusséo que aqu{ se pretende realizar, destaca os seguintes componentes: - conceito de satide-doenga - conhecimento - tecnologia - valores consagrados pela ética - significado pratico da qualidade Todos estes micleos conceituais esto presentes de uma determinada forma no que convencionalmente se denomina "o paradigma da medicina flexneriana”: = a doenga € um estado de desequilibrio provocado por um ou varios fatores, cuja natureza ou forma de atuagao pode ser desvelada pelo conhecimento cientffico, a partir do qual também se elaboram instrumentos de intervengdo que se orientam a restaurar 0 equilibrio anterior, que é a satide; - a tecnologia médica!! est4 constitufda por todo o acervo de conhecimentos (originado predominantemente nas ciéncias biolégicas) organizados para os fins préticos € especificos de intervir sdbre aqueles estados de desequilibrio, intervengdio que requer meios de apoio diagnéstico e terapéutico colocados A disposig¢do por uma vigorosa 11 El concepto de tecnologia médica aquf expresado como base Ia aceptacién de Nilton Vargas en su articulo Tecnologia é de Deus ou do Diabo?*, in : Ciencia, Tecnologia ¢ Desenvolvimiento, Brasilia, CNPQ_ 1983, cap 4, 39 indistria de bens de consumo, considerados cada vez mais indispensdveis para a boa pritica da medicina; - os valores éticos consagrados so postulados universais referentes a uma relagio idealizada onde "todo o saber ¢ os recursos tecnolégicos"devem ser colocados pelo médico a servigo do paciente. Ainda mais, a propria consagragio desses valores éticos € uma atribuigdo da corporagio profissional; , - 0 significado pratico da qualidade, que se traduz na exceléncia da formagiio/especializagio dos profissionais e na densidade e modernidade tecnolégica que 0s mesmos manejam, significado que responde aos interesses coneretos de produgiio ¢ reproducdo do saber (através dos profissionais) e da tecnologia (industria de insumos médicos). Os compromissos implicitos ou tacitamente estabelecidos entre o doente ¢ seu médico, tanto os que se referem ao processo como aqueles relativos aos resultados da atuagdo médica, esto profundamente marcados por essa forma de entender o binémio satide-doenga ¢ as formas de intervir sébre 0 mesmo, ou seja, os valores éticos consagrados e 0 significado prético da qualidade nao se definem de modo absoluto, mas se relacionam com o significado do saber e da tecnologia médica prevalentes. Os elementos constitutivos do processo de trabalho sdo seu objeto, o agente sObre o qual atua ¢ os meios dos quais se vale para atuar: O = objeto do processo de trabalho médico, a satide (ou a doenga) de pessoas (¢ coletividades) ‘A= agente do proceso de trabalho, o profissional de satide M = meios de trabalho, o conjunto de instalag6es, equipamentos e materiais consumidos na prestacao de servigos. Na Area da satide, ou para ser mais especifico, no campo da produgio dos servigos médicos, podem ser apontados tres grupos de interesses em torno do processo de trabalho deste campo de produc’ - os interesses dos pacientes (que como consumidores de servigos deveriam se denominados usuérios), que personificam o objeto do processo de trabalho médico, isto é a satide/a doenga); ~ 0s interesses dos agentes deste processso de trabalho, que sfio os médicos; e - 08 interesses do complexo industrial fornecedor de equipamentos e insumos. © paradigma da medicina, que se tornou hegemonico ao longo deste século com sua construgdo doutrinéria (estrutura conceitual que da suporte e direcionalidade para a realizagao de seus interesses), foi elaborado predominantemente no espago da articulago entre os agentes do trabalho -os médicos- ¢ os produtores/fornecedores dos meios do trabalho médico - 0 complexo médico-hospitalar (com todos os insumos que o abastece). 40 © ator situado (ou sitiado) no terceiro polo do campo de interesses é 0 paciente que paradoxalmente teve pouca contribuigdo naquela construgo. A representagio gréfica deste processo de conformagio do paradigma (P) poderia ser a seguinte: O trabalho de Abrahan Flexner representou um dos momentos mais destacados na histéria da construgdo deste paradigma. Sua contribuigao através da educagdo médica foi de suma importncia para todo o desenvolvimento subsequente do modelo de educagio e da pritica médica americana, hoje vigentes no mundo inteiro. Na verdade, como menciona Nogueira: "O flexnerianismo representa, antes de mais nada, uma manipulagdo corporativa dos princfpios educacionais, em relagiio aos quais 0 autor do famoso informe, como uma pessoa preocupada com os aspectos formais do sistema de educagio, nfo pode ser diretamente responsabilizado. As ciéncias da vida e 0 conjunto das técnicas de intervengdo que se associam com a clinica médica servirdo de base para a construgdo de um dominio auténomo dos espagos do saber e das prerrogativas profissionais dos médicos."!2 Este paradigma, assim construfdo, conforma a prética médica e -porque nao poderia ser diferente - também a educagdo dos médicos: nao s6 a formagao escolar nos limites formais dos currfculos de graduagio, mas também a "formagio paralela" que os estudantes realizam durante sua vida académica (0 famoso curriculo informal), a formagio especializada e a educagdo continua que os médicos perseguem durante t6da sua vida profissional. ‘A abordagem analitica apresentada, ainda que evidentemente insuficiente devido ao seu caréter aproximativo e um pouco esquemitico, foi adotado propositalmente para facilitar a argumentago que retoma 0 objetivo deste documento: a 12 Su ensayo bajo el titulo "Os médicos © a Gestio de Qualidade em Saude -Superando a Heranga Flexneriana”, preparado por solicitud del Programa de Recursos Humanos de la OPS/OMS, presenta un andlisis bien fundado sobre este asunto” 4 discussio s6bre a aplicagdo da gestéo da qualidade na escola médica. Contudo, nao se pretende desenvolver uma proposta de aplicagio mecénica do enfoque gerencial na escola médica, reduzida, neste caso, & sua dimensio formal de unidade de producao de servigos educacionais, cujo desempenho funcional poderia melhorar com 0 uso de métodos inovadores de gestio. O pressuposto fundamental € 0 reconhecimento de que a gestdo de qualidade teria potencialidades para gerar transformagGes no paradigma flexneriano, na medida em gue este contém em seu nticleo um conceito de qualidade anterior ¢ agora questionado que, segundo Nogueira: " .«. imaginaria a existéncia de formas de subordinaco a controles e normas de conduta estabelecidas fora da profissio, coisa que nao existia hd duas décadas. A instancia legitimadora dos ctitérios de qualidade parece finalmente deixar de situar-se exclusivamente no corpo de profissionais médicos e nas formas consagradas de contréle do saber pela corporagao. Os médicos pretendem agora uma cooperagao no estabelecimento dos padrées de qualidade, mas nao sio mais os tinicos atores na cena, a0 contrario do que sucedia no cfrculo de qualidade flexneriano." O corolério deste pressuposto é que um movimento para um novo paradigma se realiza tanto no plano do cuidado médico como na formagdo de seus profissionais. No campo da prestagiio de servigos, este movimento vem se realizando hé mais de vinte anos, tomado dos processos de qualidade (health care quality assurance), Na escola médica: como € a situago? como poderia evoluir num futuro préximo? seré um movimento que vem na esteira das transformagées ocorridas nos servigos? onde est 0 novo Flexner? Isto € 0 que se espera poder responder com o enfoque de gestio estratégica de qualidade na medida em que esta: (i)_permita analisar permanentemente a prdtica médica, suas modalidades de organizagao e funcionamento e suas mudangas, acompanhando e atuando tanto sdbre o curriculo formal como sébre o informal, para que suas atividades possam ser avaliadas e aperfeigoadas; Gi) supere as limitagdes dos instrumentos convencionais de avaliagao centrados na selecdo dos melhores (Flexner) para constituir-se em um incentive A melhoria de todos, inclusive através da introdugao de um novo paradigma; (iii) conduza, a partir disso, a definigzio mais concreta de novos objetivos de qualidade a serem alcangados pela instituigdo, em substituigao a critérios universalistas, as vezes pouco aplicveis as diferentes realidades dos paises do continente americano; ¢ finalmente, (iv) represente uma forma de julgar os problemas da educacio médica, em sintonia com os avangos da cidadania e dos processos de participagdo da sociedade civil has questées de governo, dentro do novo contexto de democracia que vive o Continente. 42 Em termos praticos espera-se que 0 "terceiro ator" do processo de trabalho -o doente (ou as coletividades) - até agora smente "objeto" dos cuidados profissionais, também assuma papel relevante na construgio do paradigma da medicina post- flexnerian. A representagdo gréfica desta nova situacio, tomando como referéncia 0 esquema anterior, seria: ‘A construgdo deste novo paradigma, enquanto processo social de mudanga das relagdes que se dao entre os tres polos de interesse envolvidos no processo de trabalho, pressupée importante e insubstitufvel papel da escola médica, cuja atuagio deverd orientar-se segundo os seguintes princfpios fundamentais: - compromisso institucional efetivo com a sociedade, 0 que significa concretamente a integragio com os servigos de satide em fungdo dos reais interesses de satide da populagao. - participagdio de docentes e alunos no sistema de prestagao de servigos, comprometidos com a busca de satisfagio de necessidades epidemiologicamente definidas e das aspiragées ou expectativas ligadas a relagdo usudrio-prestador de cuidados de satide; e, - condigées técnico-administrativas que permitam a permanente atualizagao cientifico-tecnolégica de docentes e alunos. 4, Operacionalizacio da proposta A proposta a seguir, resultante deste posicionamento, esta orientada para a instrumentagaio de um proceso de gestio de qualidade que possa levar ao permanente aperfeigoamento dos objetivos da instituigdo, oferecendo também a possibilidade de estabelecer um padrio ideal de funcionamento que permita a cada pais estabelecer seu proprio critério de acreditagao. Este processo poderia ser desenvolvido em tres etapas, incluindo primeiro uma “a avaliagdio externa com critérios e indicadores semelhantes aos adotados por Flexner, com os devidos ajustes quanto a0 modelo conceitual e 0 compromisso social que hoje orienta a formagio de médicos. Entre a avaliagiio externa e a realizado de um semindrio de planejamento estratégico é necessério um processo de negociagio com a diregdo da instituigao, levando em conta o resultado da avaliagao e a real disposigao da escola de seguir no processo de gestdo de qualidade. Em uma segunda etapa se adotaria um enfoque estratégico, buscando democratizar 0 conhecimento da escola médica em seu meio e em seus programas, fundindo reflexio com ago na pritica médica e de pesquisa. O coletivo de atores, sensibilizado pela primeira etapa de avaliagiio externa mas ndo comprometido com ela, deve reconstruir 0 cenério, aprofundando a anilise de situagdo e a consideragao acérea dos determinantes sociais envolvidos. Em seguida explicitam seus desejos e valores na Projegdo de sua proposta de desenvolvimento: a missiio da instituigao. Em uma terceira etapa (e a partir dela, de maneira continua) se identificam as taticas e estratégias de implementa io desta proposta e que acompanham, introduzindo 0s ajustes necessdrios, toda a realizagiio do projeto em um esforco permanente de avaliagio de qualidade. Neste contexto ao contrério do que acontecia no passado, uma contribuigao substancial da capacitagio do futuro médico se dé através de sua insergio imediata em miiltiplas unidades de servigos de satide que constituem seu eventual futuro mercado de trabalho. Parte dessa experiéncia ocorre sob a orientagdo da escola, mas também en grande medida pode ocorrer por iniciativa direta do aluno, conformando-se com efeito um verdadeiro curriculo oculto ou informal. Isso leva a que seu adestramento dependa cada vez menos de estruturas e atividades mantidas pela propria unidade académica a que se vincula 0 aluno. O préprio mercado de trabalho como espaco de estdgios e capacitagio em diversas fungdes vem satisfazendo as necessidades de preparago tecnolégica do médico, ainda que nao tenha capacidade de dar uma resposta adequada as necessidades de formagao integral do futuro profissional. Naturalmente, a verdadeira educagio médica, tanto em termos de atitudes, de valores, como de conhecimentos, é muito mais do que uma simples preparagao tecnolégica e tem que envolver conhecimentos, habilidades, atitudes éticas e compromisso social. A sequéncia descrita pode ter a seguinte representagiio esqueméti Dlsoejamento yyy {desenvolvimento yyy cireulok de qualidade sensibilizagao SEGUIMENTO E AVALIACAG, st AERTERN /AUTACAO PERMANENTE EXTERNA | Patsca: tlie agers) a) . NORMATIVO... By : ESTRATEGICO, > RETROSPECTIVO PROSPECTIVO, (i) a avaliagao externa pode ser realizada com a participagao de um consultor externo, um representante local (extemo a escola) ¢ um representante da prépria escola, ¢ se estenderia por quatro dias no maximo. Nao se aconselha a aplicagio de questiondrios exaustivos e sim a utilizagdo de um guia de orientagao das visitas e entrevistas a todas as dependéncias em que se desenvolve o trabalho da instituigdo (ensino, pesquisa ¢ extenso) (passos 1 a 4). (ii) A oficina de trabalho de planejamento estratégico na qual 0 primeiro dia (passo 5) seria dedicado a analise de situagdo (prética médica-pritica investigativa- pratica educativa); no segundo dia (passo 6) se discutiria, com um enfoque prospectivo, a missdo da instituigio, levando em conta a visio de uma imagem-objetivo futura ¢ os princfpios que orientam os objetivos da escola. Nesta visdo se estaria considerando, obviamente, 0 esbogo de um novo paradigma, com base no qual se formulariam propostas para o desenvolvimento da educacao médica. Finalmente, no terceiro dia (passo 7) se analisariam as estratégias de desenvolvimento no contexto da reorganizagio da prética educativa e em fungio da identificagao dos principais obstdculos conquista da qualidade. Neste momento se estabeleceriam os critérios para o acompanhamento dos processos académicos, incluindo a sugestio e/ou selegao de "eventos tragadores" da andlise de qualidade!? (iii) A terceira etapa representa ja a incorporagio & rotina da instituigao do processo de gestio de qualidade ¢ inclui como primeiro passo a constituigao, sensibilizagao e treinamento dos circulos de qualidade da educagio médica. Em forma periédica, representantes destes cfrculos de qualidade se reuniriam em uma comisstio de coordenagao para a revisio da avaliagdo total e dos métodos de desenvolvimento pré- qualidade. Esta descrigdo corresponde a uma formulagdo muito preliminar do processo, 0 qual nao s6 deveré ser mais elaborado j4 em casos especificos de aplicago mas também podera ser adaptado de acordo com os atores diretamente envolvidos. Desde logo ressalte-se que cada um dos passos constitue-se em um processo complexo que compromete a diversos atores internos e externos e que se pode realizar através da andlise de componentes institucionais de natureza e hierarquia epistemolégica diversas, utilizando um conjunto de critérios e princfpios orientadores. Quanto a natureza dos atores e as condigées de sua ago em uma avaliagao de qualidade total, devem se considerar os seguintes critérios: = protagonismo dos atores internos tomando em conta os fatores objetivos ¢ subjetivos da ago dos mesmos, 13. Rovere Mario, Planificacién estratégica de los recursos humanos, Serie de Desarrollo de Recursos Humanos No. 96, ‘Ops, 1993. 45 ~ processo participativo comprometendo grupos que compartilhem praticas e processos de produg’o comuns ou afins - continuidade da andlise que se dé no processo educativo (carter permanente), ~ direcionalidade para o aperfeigoamento continuo da qualidade do processo educativo, de acordo com a imagem-objetivo construida, ~ problematizagao ativa (identificagao e explicagdes) caracterizando os mecanismos pelos quais se obstaculiza 0 avango para a imagem-objetivo 5. Conduciio do processo de avaliagao total Trés pré-requisitos so necessérios para que se inicie um processo de avaliagio rios moldes aqui preconizados: - decisio e apoio da direc superior da escola, - funcionamento permanente de um grupo de coordenagao da qualidade do ensino, - apoio externo em forma de consultoria em gestdo da qualidade total. A diregao da escola mais que 0 apoio formal deve demonstrar entusiasmo e interesse com a idéia de avaliagao total e estar disposta a contribuir criativamente em todas as etapas do processo. Isto implica uma mudanga de atitude e de expectativas habituais, que levam os diretores a esperar que alguma solugio milagrosa seja trazida pela consultoria. De fato, o papel do consultor 0 de alguém que facilita um processo de elaboragdo grupal a ser realizado paulatinamente e que vai emergindo da prépria instituig&io como resultado do esforgo comum, Deve ser relembrado -como objetivo pertinente- um dos pontos fundamentais da filosofia de qualidade: "Fazer com que todos na instituigdo trabalhem no sentido de alcangar a transformagao. A transformagio € uma tarefa de todos."Este compromisso da diregéo deve ser expressado ante toda a comunidade escolar através de reiterados sinais e manifestagdes que deixem claro o compromisso da diregZo com 0 processo de transformagao para a melhoria continua da qualidade do ensino. Na etapa intermediaria do processo (passos 5 a 7), como nem todos podem estar envolvidos, 6 decisive contar com uma comissdo 0 grupo de coordenagiio que seja representativo da comunidade escolar. Tal comissao deve estar integrada por pessoas que reunam atributos tais como espfrito de lideranga e desprendimento, identificagio com a instituigio, criatividade e capacidade de dedicagao e contribuigo com o processo. A indicagaio dos integrantes da comissio é de responsabilidade da direcdo, respeitando os critérios antes indicados. 46 papel do consultor, neste caso particular, é o de "advogado do diabo” frente & diregio, chegando até 0 ponto em que prevalegam os critérios mais objetivos na igdio da comissao. a) conduzir um permanente planejamento estratégico do processo de avaliagao total, b) estimular a formagio de grupos de voluntdrios circulos de qualidade) que executem a avaliagio c) apoiar a colocaciio em pratica de solugdes aos problemas identificados pelos grupos. Para realizar este conjunto de tarefas, a comissio deverd passar por um perfodo de capacitagdo, coordenado pelo consultor que envolve, por um lado, um exercicio de reflexio e anélise em profundidade da avaliagao total e, por outra parte, o treinamento no uso de conceitos e ferramentas de qualidade, tomadas como auxiliares para difundir e implantar em toda a instituigdo 0 Método de Andlise ¢ Solugao de Problemas (MASP). O papel do consultor, nesta metodologia, supde uma atuacdo eminentemente criativa e nao prescritiva, buscando apresentar sugestdes e criticas que ajudem ao esclarecimento de situagées, a investigacdo de problemas, a selegao entre alternativas de solugdo, deixando sempre em evidéncia que no conta com nenhuma formula magica para conduzir a escola a uma espécie de mundo fantastico da qualidade. ‘A OPS promove ativamente esta iniciativa com 0 propésito de contribuir aos esforgos que as universidades, faculdades e escolas de medicina da Regido realizam para responder aos desafios deste fim de século. Espera-se que este instrumento mobilize vontades, atores e capacidades para definir as novas orientagdes da miss e das politicas institucionais que transforme os objetivos e as estruturas das escolas Essas orientagdes, reiteramos, tem a ver com os novos padrdes e niveis de qualidade cientifica, educacional e de servigos; com a nova ética da satide, as respostas as demandas sociais e com o ative seguimento ¢ a incorporagio critica das mudangas da prética médica e seu impacto sobre a formagao, a cultura ¢ a ideologia dos médicos. Em Punta del Este poder ocorrer, se as ‘las de medicina latinoamericanas assim o estabelecerem, 0 ponto de partida de um novo paradigma e de uma nova educagiio médica na América Lating a7 ANEXO I+ GESTAO TRADICIONAL Qualidade € dispendiosa Baseada no supervisor A qualidade est& no controle O trabalhador € 0 maior responsdvel pelos erros Supernormatizagao do trabalho O temor e a recompensa como método eficazes de motivagio O pessoal é mercadoria: compra-se, vende-se, descarta-se Culpa os "provedores" Avalia 0 éxito pelo alcangado (avaliago retrospectiva) GESTAO DE QUALIDADE Qualidade baixa custos Baseada no trabalhador A qualidade est4 na gestio A organizago € a maior responsdvel pelos erros Normas flexiveis temor conduz ao desastre e destréi as equipes pessoal é capital: conserva-se, desenvolve-se Colabora com os provedores Preocupa-se pelo horizonte (avaliagiio retro e prospectiva) 14 Adaptado de Aguayo, Rafael. En El método Deming” Ed: Javier Vergara S.A. Buenos Aires, 1993, pag. 34 y 35. 48 Gestao da Qualidade do Ensino Médico Roberto Passos Nogueira* Falar de qualidade em um campo de atividade social tao relevante como o da educagdo médica deixa a muitos de nés possufdos de um sentimento bastante ambiguo quanto ao significado da contemporaneidade do tema. De um lado, néo podemos esconder a satisfagdo de entrarmos finalmente numa espécie de sintonia intelectual com 0 resto do mundo, que insiste em alardear o mote da qualidade. Mas, por outro lado, nfo concebemos que isso implique numa ruptura absoluta com idéias e propostas do passado e, sendo assim, queremos chamar a atengio para o fato de que conseguimos acumular historicamente muitas experiéncias e saberes que podem ajudar a encontrar o melhor caminho a ser seguido dentro da nova linha. Ao falar de gestao da qualidade, identificamos interesses e orientagdes que sao comuns com outras milhares de pessoas ¢ iniciativas que se encontram nas esferas da administragao publica e privada. Tal situagiio pode ser gratificante para muitos de nés que, durante as ultimas décadas, vfamo-nos participando de um cfrculo bastante restrito de partidérios de movimentos reformistas. Mas, por coeréncia de princfpios, entendemos que a preocupacdo com a qualidade nao corresponde a uma onda passageira das avangadas sociedades de consumo; admitimos, assim, que, mesmo em sociedades como as latino-americanas, a énfase na qualidade dos bens e servigos encontra repercussio e simpatia ndo s6 na elite, mas também entre toda uma massa populacional que esté ansiosa por fazer valer seus direitos de cidadania. Ademais, convém sublinhar que essa identificagdo com outros campos da industria e dos servicos tornou-se possivel porque mantemos h4 muito a crenca de que, para alcancar os fins préprios as atividades de satide, as pessoas devem ser mais importantes do que a tecnologia. Toda a critica que desenvolvemos e as alternativas que buscamos diante do chamado paradigma flexneriano so endossadas pelo atual enfoque gerencial da qualidade, centrado nas pessoas. Assim, para sermos contemporaneos, acreditamos ser importante manter afiada nossa razio critica. Sabemos, por exemplo, que muitas iniciativas de gestio da qualidade, sobretudo as do setor privado, tém sido marcadas por um planejamento normativo rigido € até autoritério, com uso excessivo de palavras-de-ordem e exortacdes pseudo- humanistas. O que jé alcangamos com a democratizagiio da gestiio universitaria e o que + Médico. Coordenador do Projeto de Fomento de AcSes Pré-qualidade da FIOCRUZ. Consultor em Qualidade da Fundagao Ezequiel Dias (Belo Horizonte). 49 aprendemos do planejamento estratégico nao nos permite retroceder a esse estdgio pré- critico, nem isso parece ser possivel dada a contraposigao da vontade politica dos professores e do préprio corpo de alunos. No plano de propostas substantivas, hé que se considerar que, ao longo de vinte anos, temos desfraldado bandeiras de inoyacao tais como a integraco ensino-servico, a pesquisa junto & comunidade, a reforma curricular, etc. Seria muito estranho se essas coisas nada tivessem a ver com as politicas que podem ser promovidas desde o Angulo da gestdo da qualidade, embora ainda nao saibamos bem como julgé-las com base no novo paradigma. Essas ponderagdes sao de utilidade nao s6 no sentido de preservar uma linha de coeréncia com as preocupagées do passado mas para lidar com conflitos potenciais ao se julgar o que enquadrar como agio pré-qualidade nos varios aspectos do processo institucional de ensino médico. Sera inevitével que aparega a pergunta nada do que proptinhamos ou fazfamos antes tinha em conta a qualidade?, pergunta que nao é ingénua de nenhuma maneira, porque se a qualidade é pensada a partir da perspectiva dos alunos e dos professores, 0 novo dificilmente pode representar um rompimento total com o passado. E muito provavel que a filosofia de gesto da qualidade apenas introduza diante dessas iniciativas reformistas um novo "como" e ndo um “qué” radicalmente distinto. Por outras palavras, surgir um "como" que acentua e aprofunda o compromisso com a visio dos alunos e dos professores, seguindo critérios rigorosamente participativos, que assegurem a ampliagdo e a direcionalidade da gestiio democratica da universidade. No que se segue vou procurar me deter na quest4o que me foi proposta para este encontro, que é o saber de que modo as diversas experiéncias de gestdio da qualidade que esto em curso no Ambito hospitalar e dos servigos de satide de um modo geral podem ajudar no deslanche da gestiio da qualidade na educ: Quero dizer, inicialmente, que é inegdvel que algo temos a aprender consultando io médica. autores como Berwick e a crescente literatura sobre o tema, ou revisando as experiéncias dos hospitais que ousaram ser pioneiros nesse campo. H4 uma considerdvel Area de intersecgdo entre gestio do ensino € gestio de servigos, nos hospitais universitérios, por exemplo, onde as abordagens de aperfeigoamento continuo podem ajudar a melhorar processos administrativos e clinicos. Mas quero salientar, talvez acompanhando o sentimento dos docentes, que ha algo de muito especifico no campo do ensino propriamente dito. Aqui podem ocorrer equivocos profundos se alguém fizer uma simples transposigdo de métodos. Ao entrar no terreno da educagiio, entendo que se necessita de um enfoque novo, de uma base filoséfica distinta para a qualidade, mas com alguns princfpios comuns. Essa adverténcia tem ainda maior razo de ser invocada, quando se considera que Deming e outros autores classicos da gestdo da qualidade sempre tomaram a educagiio como um insumo primério para 0 desenvolvimento da qualidade, mas pouco a tematizaram enquanto proceso de trabalho. Para reforcar essas considerag6es criticas, gostaria de por em discussio trés grandes tragos do ensino universitério que historicamente 0 demarcam como légica de 50 trabalho. Esses tragos nao constituem por si nenhuma novidade conceitual e se os seleciono aqui apenas porque entendo serem elementos importantes de sustentagao de estratégias em prol da qualidade nessa drea. Em primeiro lugar, 0 fato bem sabido de que nosso cliente principal, o aluno, caracteriza-se sempre como protagonista destacado de um trabalho que tem de ser realizado em forma compartilhada com o chamado fornecedor principal, o professor. O ensino-aprendizagem obviamente uma tarefa compartilhada. Isto vale para qualquer tipo de educagio, mas tem conseqiiéncias mais profundas na Universidade, onde os estudantes j4 apresentam um grau avangado de amadurecimento de seus esquemas de assimilagao intelectual e moral. Nesse estagio, o aluno é senhor absoluto de seu aprendizado ¢ tem universos infinitos de aprendizagem potencial, os quais usualmente so muito pouco induzidos a explorar. O que quero enfatizar aqui € que a satisfagdo deste cliente tem muito mais a ver com a ampliagdo das possibilidades de aprendizagem auténoma, do que com as do ensino comandado diretamente pelo professor. Nao existe conhecimento efetivo que nao seja despertado por um interesse pessoal, como ja demonstrara Kant h dois séculos atras. Mas 0 fato que tanto a escola como o professor no sabem como tirar partido desse potencial de interesse pela aprendizagem, que é sempre téo abundante entre os alunos. Nao o sabem porque, entre outros motivos, este nao é um assunto de conversa entre os professores, e ainda menos entre professores e alunos. Em segundo lugar, est 0 fato de que o professor universitério localiza-se normalmente por fora de esquemas normativos diretos, ou seja, labora com grande margem de autonomia docente. O professor, ao contrério de outros trabalhadores da drea de bens e servigos, no se vé obrigado a realizar atos repetitivos ou sistemdticos controlados por normas técnicas externas. Daf resulta que os processos de ensino- aprendizagem desfrutam de um notdvel espago de inovagio potencial, individual e coletiva. O ensino pode ser sempre mais original e criativo do que 0 que estamos acostumados a ver, porém infelizmente este espago de autonomia, pressuposta institucionalmente, no s6i ser usado para propiciar novas e eficazes experiéncias de ensino-aprendizagem. A escola e os professores ndo sabem como aproveitar essa autonomia para gerar novos processos tanto no nivel individual de cada professor como no coletivo. Nao o sabem porque este tampouco € assunto para ser cogitado em discussao entre professores. De um modo geral, 0 que os professores discutem em suas reunides regulares, cada um na sua posigdo de representante atomizado de algum departamento ou grupo, so matérias administrativas e de curriculo formal e ponto. Em terceiro lugar, hé o fato de que a comunicagdo constitui o veiculo essencial desse trabalho compartilhado entre o professor e aluno. O entendimento intersubjetivo através do emprego quotidiano e vivo da linguagem auditiva e visual é 0 fundamento mesmo do processo de ensino-aprendizagem e ndo apenas uma ferramenta auxiliar. Daqui que esta forma de trabalho est4 demarcada por uma interagao humana bisica e no por objetivos externalistas que sio préprios de uma agdo técnica. E exatamente essa a grande diferenga que podemos identificar quando comparamos os servigos de satide com 51 0s processos educacionais em satide. Para realizar uma consulta médica, por exemplo, a comunicagao entre o médico e paciente tem apenas um papel coadjuvante. Na educagio, a0 contrario o entendimento intersubjetivo entre professor e aluno, ¢ entre o conjunto dos alunos, é um objetivo em si mesmo e nao um meio. Podemos expressar essa diferenga nos termos divulgados pela filosofia de Jiirgen Habermas, dizendo que, quando falamos de qualidade em educagio, estamos transitando de uma esfera de predomfnio do agir instrumental para uma esfera muito distinta que € marcada pelo predom{nio do agir comunicativo. Aqui, € 0 agir instrumental que tem de ser acess6rio ao agit comunicativo, ao contrério do que ocorre no ambito dos servigos de satide. Mas deveria tratar-se naturalmente da forma auténtica do agir comunicativo, que estaria voltada, em sentido ideal, para o entendimento entre professor e aluno e nao para um fluxo unilateral de mensagens. O entendimento ideal s6 pode ser alcangado a partir da pressuposigao de que o aluno tem seus préprios esquemas auténomos de assimilagao de conhecimentos, de habilidades e de jufzo moral e que, para consolidé-los, a autonomia da aprendizagem deve estender-se como exercicio racional da linguagem discursiva. Isto exige, por sua vez, est{mulo ao didlogo tanto entre os alunos quanto entre professor e alunos. A atividade diddtica comporta uma ilimitada e franca discussdo de todos os temas de interesse, mesmo se tem por pressuposto que um dos lados da comunicagao tem peso relativamente maior, o que se expressa como autoridade do saber do professor. Para que esse exercicio converta-se numa auténtica discussio, deve langar mo ao recurso da duivida sistemética, ou seja, deve levar a uma problematizagio espontinea de todos os temas curriculares. Falo de problematizacio espontanea no sentido socrético que continua a ser uma grande inspiragdo filos6fica na pedagogia da qualidade; portanto, nao estou me referindo ao curriculo baseado em problemas, porque neste caso as questdes centrais sio pré-estruturadas. O maior impedimento ao livre fluir da interaco comunicativa entre professor e aluno decorre de que o professor costuma sempre se colocar na posigdo de quem tem o dever de transmitir algo. Aqui, naturalmente, so os professores que precisam ser convencidos das vantagens de passar de uma pedagogia da transmissaio a uma pedagogia interativa. E isto s6 pode ser realizado quando se colocarem na perspectiva do cliente, isto é, do aluno. Muitas vezes pensa-se que esse tipo de obstéculo sé possa ser transposto através de uma reforma curricular. No entanto, talvez a reforma curricular preste-se a essa finalidade apenas na medida em que for concebida como uma oportunidade de repor em discussgio todos os contetidos e os objetivos especficos da agiio pedagégica no ensino médico. Contudo o que mais faz falta é uma reforma do enfoque comunicativo do professor. Entendo que esta tematica pedagégica precisa ser antes de tudo colocada como. agenda de grupos de qualidade para discussao disciplinada e, portanto, tomada um objeto de investigaciio sistemética. Vencendo as condigdes atuais, em que o professor atua sozinho, em forma atomizada, e se reine apenas para discutir questes administrativas, os grupos de qualidade tém condigdes de restaurar as bases coletivas do entendimento entre os professores a respeito dos melhores procedimento na agdo pedagégica, com o propésito de promover o aperfeigoamento continuo das praticas docentes. 52 Tais consideragdes permitem distinguir pelo menos trés linhas de reflexio que contribuem a definir uma estratégia de desenvolvimento da qualidade em educagio médica, que, na verdade, podem ser validas para todo 0 énsino superior:~ repensar a autonomia do processo de aprendizagem, na perspectiva de conferir maior realizagio pessoal satisfagdo aos alunos;- repensar a autonomia do processo de ensino pelo professor na perspectiva de conferir aos professores maior criatividade e orgulho pelo trabalho realizado;- repensar o significado de uma comunicagao voltada para 0 entendimento, como possibilidade de interligar coerentemente os dois processos, 0 ensino e aprendizagem. Trata-se, nes: caso, de uma reflexio sobre dimensdes do processo de ensino- aprendizagem que pode ajudar a delimitar alguns pressupostos da qualidade do ensino, em contraposigdo a outros processos industriais e de servigos. B decisivo estender essa reflexdo aos componentes de pesquisa e servigos, ¢ especialmente aos programas de integrag4o docente-assistencial, visto que tais elementos curriculares costumam ser dominados por um empirismo vulgar sob o pressuposto de que para aprender basta fazer. E verdade que se aprende fazendo, mas é verdade também que é fazendo, apenas imitando o que é dominante, que se assimilam os piores hébitos, que iro perdurar por toda a vida profissional. : Como foi dito anteriormente, uma andlise teérica dessa natureza faz-se necessdria na medida em que continuamos a reivindicar a especificidade social do ensino-aprendizado, com a convicgao de que é preciso aqui um ajuste filoséfico ou doutrinério e nao apenas um ajuste metodolégico. Sabe-se, por exemplo, que a gestdo da qualidade na produgao de bens nasceu sob a preocupagao de controlar a variagdo de caracteristicas de produtos e processos. No ensino, no consigo ver nenhum papel destacado para essa forma de abordagem e, portanto, se isto verdade, haveria pouco espago legitimo para as aplicagées de controle estat{stico de processos. A maioria dos problemas a serem enfrentados talvez dependam menos de um controle técnico ou estatistico ¢ mais de um entendimento quanto a bases conceituais, entendimento compartilhado entre todos e tendo em conta os prinefpios universais da qualidade, tais quais foram formulados por Deming. Considere-se, para dar um exemplo, um problema como o dos exames de avaliagdo. Muitas vezes, as avaliagdes, na forma de exames, ndo tém qualquer papel significative num reforco & aprendizagem e servem mais que nada de fonte constante de disseminagao do medo entre os alunos. Em alguns casos, as avaliagGes so instrumentos a servigo de uma inclinag%o s4dica do professor. Este um exemplo de sério obstéculo quando se pretende criar um ambiente que estimule a aprendizagem e elimine o pavor ao erro. Envolve no apenas a selegiio de enfoques ¢ prinefpios pedagégicos mas, inclusive, aspectos éticos. 6 algo, portanto, que demanda uma demorada construgio de bases de entendimento intersubjetivo e de estimulo A renovagio de valores entre 0 professores. Segundo Deming, a avaliagao e classificagaio de pessoas deveria ser eliminada ad hoc pela diregio de uma empresa. Mas a gestiio da qualidade no ensino superior nao pode pressupor, ingenuamente, que a direcdo universitéria possa assumir o mesmo grau 53 de poder e de autonomia que se verifica na geréncia das empresas dos ramos produtivos. A Universidade tem mudado muito sua estrutura de poder ultimamente, mas continua a expressar uma arranjo de forcas que é ainda de tipo corporativo - do que decorre que todas decisées transcendentes costumam ser tomadas a base de consenso entre a diregdo € 0 corpo docente. Um problema como 0 dos métodos e méritos da avaliagio nao pode, por isso, ser solucionado sem uma longa discussio interna entre docentes e alunos através de grupos ou circulos de qualidade, em que se resguarda a autonomia docente, mas busca-se superar 0 atomismo do professor criando bases consensuais para a agiio coletiva, Quero salientar, por fim, que seguindo essa linha de raciocfnio, entendo que a gestdo da qualidade é uma forma de conferir substancia e coeréncia de princfpios ao modelo de gestdio democrética da universidade, que se vem gerando na América Latina desde a Declaragao de Cérdoba, no inicio, do século. Encontramos nos paises latino- americanos, na maioria dos casos, uma universidade que est formalmente democratizada através da agio de Orgdos representativos intemos, mas que apresenta reduzido grau de exercicio da democracia direta pelo conjunto das categorias funcionais que a integram. A gestdo da qualidade pode auspiciar uma adesdo racional e emocional a uma forma organica, isto &, disciplinada, de funcionamento da democracia direta, que deveria ser dada, por exemplo, através da constituigdo de grupos de qualidade como forma de promogao de um didlogo substantivo e construtivo entre professores, alunos e funciondrios. Declaragéo do Uruguai As Faculdades e Escolas de Medicina e as Associagées integradas na ALAFEM* ¢ FEPAFEM* , apés um amplo debate, no contexto do Encontro Continental de Educacio Médica, com a ativa participagiio de centenas de educadores médicos, representantes dos servigos de satide e estudantes de medicina, CONSIDERANDO: que as significativas transformagées politicas e econémicas e, especialmente a reforma do setor satide, iniciadas pela maior parte dos pafses do Continente, nio se refletiram positivamente no desenvolvimento das condigdes de vida no sentido de promover com eqitidade melhorias na situagdo da satide de nossas populagdes, e que neste mesmo entorno o médico e a equipe de satide vém adotando, no exercicio profissional, formas subordinadas aos mecanismos de mercado nao aplicdveis diretamente no campo da satide, com o agravante inaceitavel da segmentagio social na formagio ajustada as diferengas de poder aquisitivo entre os setores sociais. CONSCIENTES: da insuficiéncia dos esforgos desenvolvidos pelas diferentes entidades ligadas & educagdo médica, as quais nao t8m produzido mudangas concretas na posigdo das escolas perante os desafios provocados pela necessidade de satide, o agravamento do quadro social e o desenvolvimento de novos conhecimentos, tecnologias € processos. EXPRESSAM UM COMPROMISSO: orientar a formulagio de um novo paradigma que revalorize a satide, contemplando seus aspectos biolégicos e sociais, para a construgao de um desenvolvimento humano sustentavel e comprometido com as novas geragdes. UMA CONVOCACAO: para a implementagio de transformagées necessdrias que permitam uma formag&o médica de maior qualidade em termos técnicos ¢ de relevancia social e uma posterior incorporagéio a modelos assistenciais humanizados e eqititativos. UM DESAFIO: de mobilizagio da Universidade para que, partindo de uma concepg¢ao ética da vida, possa cumprir 0 novo contrato social que reconstrua as bases solidarias no exercic (0 profissional ¢ reduza as diferengas sociais, favorecendo a cobertura universal e a justiga social. Punta del Este, Uruguai, 14 de outubro de 1994 + Associagdo Latino-americana de Faculdades e Escolas de Medicina Federagao Pan-americana de Associag®es de Faculdades ¢ Ercolas de Medicina RELATORIO DOS GRUPOS DE TRABALHO DO ENCONTRO CONTINENTAL DE EDUCAGAO MEDICA (PUNTA DEL ESTE, 10 A 14 DE OUTUBRO DE 1994 ) A discussdo realizou-se em torno de 11 questdes que serviram de base para a reflexio: 1. Em que medida e de que maneira os movimentos de reforma do Setor Sade tiveram influéncia na reorientacio da pratica profissional e podem estar exigindo mudangas na formagiio dos médicos? Perante esta questo os grupos consideraram diversos aspectos da complexa problemética que a Educagao Médica vive. O relato que segue foi composto a partir do conjunto das Tespostas. A reunido de Alma Ata tem sido considerada como uma referéncia histérica, um momento em que se define um quadro teérico-conceitual de uma reforma com importante influéncia na reorientagdo da pratica profissional, demandando mudangas nos processos de formaciio médica e de outros profissionais da satide. Este momento define essencialmente 0 médico geral adequado as necessidades de Atengao Priméria & Satide. Sao numerosas as Faculdades e Escolas de Medicina que incorporam estas definigdes nos seus objetivos educacionais, sendo que alguns pafses 0 fazem sob 0 conceito de medicina familiar dentro de seus sistemas de satide. No entanto, as mudangas politicas e sociais que marcam a tiltima década, com evidente predominio de concepgdes mercantilistas neoliberais, conduzem para uma reforma real da pritica médica. O Estado desincumbe-se de sua fungio normatizadora, controladora e assistencial e a satide torna- ¢ um problema a ser resolvido pelo préprio usuario, que 0 faz de acordo A sua capacidade de percepgiio da necessidade de assisténcia e sua capacidade aquisitiva,seja individualmente ou através de diversas formas de organizagio social ( ONG, instituigdes de assisténcia médica coletiva, grémios, comissdes de bairro, etc) Isto determina uma enorme diversidade na capacidade de acesso a assisténcia médica por parte dos diferentes segmentos sociais. ‘Ao mesmo tempo e de modo relacionado, a incorporaciio de tecnologias cada vez mais sofisticadas, a sua demanda, e as restrigdes no mercado laboral médico, induzem para uma especializagao em detrimento da formagiio médica geral. Desenvolve- se deste modo, uma medicina institucionalizada, socialmente segmentada, altamente tecnificada, que leva a uma perda na eqiiidade e um retrocesso no conceit de satide como Direito social, to amplamente incorporado no discurso de diversos ambitos politicos, sociais e educacionais. Esse padrio assistencial que paulatinamente vai excluindo mais setores da sociedade est determinado pela politica de mercado na satide e pelo préprio médico que busca sua insergZio no contexto socio-cultural .Paradoxalmente, 0 alto investimento em 56 tecnologia mostra um elevado indice de insatisfagio do usuario, por causa de fatores derivados principalmente da desumanizagao na pritica médica. Perante esta realidade, a Educagio Médica entra em crise, limitada como est4 na sua capacidade de adaptagio A nova situagdio. Em muitas Faculdades e Escolas Médicas vive-se um duplo discurso: de um lado os objetivos educacionais definidos, e de outro os resultados da pressdo que exerce a realidade sobre a instituigao. A forte tendéncia para a hospitalizagdo e a especializagio , induzida pelo mercado laboral médico, os interesses das empresas médicas e as condigdes que este contexto impée sobre 0 novo graduado, funcionam como uma “quinta coluna”que opde resisténcia aos processos educacionais baseados num paradigma do médico geral, em fungao do individuo como ser social. Ao mesmo tempo, a falta de politicas educacionais por parte do estado distorce ainda mais a educagio médica, por exemplo através dos baixos salérios docentes, as multi-jornadas de trabalho e a baixa dedicagdo para as fungées universitdrias basicas. Tudo isto soma-se 4 problemAtica da massificagéo estudantil e docente, devido fundamentalmente as pobres expectativas, ou as mudangas das que traziam quando do ingresso nas carreiras bio-médicas. Em resumo, historicamente podemos definir um processo de reforma e contra- reforma que nos coloca numa etapa critica, onde € destaque a desercio do estado, a pressiio do mercado e a empresa médica e a falta de uma pressdo social que exija a eqiiidade na satide. 2. Como a Universidade e as Faculdades de Medicina poderiam comprometer-se no desenvolvimento dos processos de reorientacao setorial com vistas a lograr os objetivos de eqilidade, eficdcia e eficiéncia? Essa questo gerou um debate que incluiu, em primeiro lugar, a Universidade e sua ligagdo com a Sociedade ¢ o Estado. Os relatos informam de uma Universidade em crise, a qual em fungio de diferentes contextos pode exercer um papel progressista e renovador, bem como ter uma fungdo conservadora e/ou resistente 4s mudangas na sociedade. A autonomia Universitaria, conquistada e reconquistada em fungio dos processos democréticos da América Latina, ndo pode ser um conceito para justificar 0 isolamento da sociedade. Essa mesma sociedade que nao tem hoje um espaco de expressio na Universidade, embora seja ela que a sustenta e legitima. Tal autonomia politica, vulnerada com a redugdo dos recursos econdmicos fica ‘mais dependente e estimula intencionalmente processos de auto-privatizagao legitimados por sua prépria pauperizagio. Entretanto, esta Universidade continua sendo depositaria de um papel na dinamica de transformagio de nossas sociedades, que no consegue enxergar-se com os tragos onipotentes dos anos sessenta, nem com os tracos fatalistas dos oitenta. Pensa-se S7 uma Universidade mais modesta mas comprometida e solidéria, junto a outros atores no processo de mudanga para sociedades mais justas. A respeito do vinculo Universidade-Estado 0 que se manifesta é a existéncia de dificuldades, seja em relagdo as implicitas politicas de nao financiamento, seja pelo retrocesso de sua fungdo de garantir o direito a satide. Apesar disso as politicas de cooperacio com os Ministérios de Satide continuam a ser privilegiadas, embora agora seja pela ampliagdo da parceria para novos atores e interlocutotes, de dentro e de fora do setor satide. Essa mesma Universidade percebe-se como um desses interlocutores para incidir nas politicas de Satide dado o peso especifico de suas fungdes bisicas - formagao, pesquisa e extensiio- de tal modo que nao s6 se enxerga respondendo a politicas de satide mas também constribuindo na sua construgdo. Exemplo desta vinculacao siio as potencialidades da Universidade para Participar dos processos de Gestio de Qualidade dos servicos e a destes na Gestio de Qualidade da Educagio. Internamente verificam-se dividas da Universidade. A necessidade de methorar seus estilos e ferramentas de gestiio, a necessidade de aprofundar seus processos de democratizagiio, a necessidade de gerar mecanismos para revitalizar e aprofundar a participagao estudantil e o estabelecimento de novos pactos de governabilidade. Resolver estas dividas, dentre outras, pode ser uma contribuigdo para os conflitos internos nao serem utilizados como pretexto para protelar a necessidade de afrontar as demandas da sociedade. Os debates atingiram 0 papel da Universidade privada neste contexto e a necessidade de ser envolvida, dada a fungao social que toda Universidade deve cumprir. A necessidade de estudo dos mercados educativos e de trabalho e a geragdo de mecanismos nfo autoritdrios de regulagio, parece demandar alguma forma de gerar e socializar informagio e renovar mecanismos de planejamento consensual de recursos humanos na satide. As caracteristicas da crise parecem ter atingido os docentes, nos quais se reconhece 0 impacto dos baixos salérios, mas além disso verifica-se, em alguns casos, certo desanimo, atribufdo a certa incapacidade de leitura e compreensao da realidade, quebra dos paradigmas ou a certa incongruéncia entre discurso e pratica. Quanto A Educagdo Médica varias intervengoes assinalaram: - A importancia da formagiio de um médico geral e a necessidade de reforgar esta formagao através de mudangas no modelo de atendimento e no mercado de trabalho. - A potencialidade das experiéncias formativas e laborais interdisciplinares. - A necessidade de gerar um desenvolvimento nao antagénico entre a medicina geral e a formagdo dos especialistas ~ A importancia de incorporar desde cedo experiéncias de formacdio em cenérios comunitérios. 58 - A participagdio da Universidade nos processos de educagilo permanente nos servigos de satide e sua articulagdo com os processos de educagio popular em satide. - A necessidade de reforgar a formagiio social dos médicos e de incluir uma formagao administrativa do profissional de satide. - A formagao docente dos professores com novos paradigmas educacionais. - Finalmente, esbogou-se a possibilidade de imaginar um novo perfil profissional do médico, segundo as _definigdes do documento da posi¢ao latino- americana em Edimburgo, dando énfase a uma mudanga na_natureza de seus contratos com a populagao, colocando-o numa po (0 mais solidéria e ao lado, com fungdes de conselheiro e de defesa do Direito Satide, inclusive em suas dimensdes mais operativas. 3. O conceito de ética médica ainda continua baseado no modelo de pratica médica nao predominante em muitas realidades. Ha necessi conceitos? Como se percebe esta nova ética médica? lade de uma revisiio destes Os grupos de trabalho reconheceram que as rapidas mudangas acontecidas a nivel da ciéncia e da técnica e sua incorporacdo na investigacdo e pritica da satide, a coletivizagao do atendimento médico e sia perda de autonomia, as modificagdes das telagdes do Estado com a sociedade civil e a transformagao dos servigos de satide em mercados emergentes, impdem uma anilise critica dos valores éticos tradicionais baseadas nos principios hipocriticos. Alguns grupos consideraram a necessidade de definir uma nova ética, enquanto para outros trata-se melhor da ampliagdo da bioética e deontologia através da integracio de princfpios valorativos sociais e ecolégicos. Outros apontaram a existéncia de uma ética geral, da qual a medicina deveria extrair os novos postulados que possibilitem construir as pautas necessérias para nossa época Do anteriormente dito surge um requerimento de uma nova construgdo que deve realizar-se com a participagdo de todos os atores comprometidos com a satide: a populagdo e suas organizagées, as instituigdes gremiais, de educagdo e de servico. A Universidade cumpriria um papel fundamental nesta empreitada e nao poderia aceitar em nenhum momento desentender-se desta obrigaco por causa de sua autonomia. © avango do compromisso ético, a Escola Médica e a Universidade devem fazer uma critica da sua projegdo, pela qual é colocada numa posigao radical para fora e profundamente conservadora para dentro,da sua aceitaciio da mutante ética inerente ao ato médico, modificado de acordo a capacidade aquisitiva do paciente e o lugar de emprego ou instituigdo onde € praticado. Ao mesmo tempo deve reconhecer que as transgressdes que ocorrem no seu interior, acrescentam o problema de sua multiplicagao ¢ disseminagao, tendo em conta que a ética é aprendida fundamentalmente no contato exemplo e, nessa medida, 0 estudante ndo pode assumir um “ethos” que nao esteja presente na pritica cotidiana da instituigo universitéria e no fazer dos professores. A tentativa de uma construgiio deve visualizar os diversos espacos e problemas da realidade.Deve basear- -se no compromisso de defesa do Direito a Satide e a eqiiidade 59 como referéncia geral e inaliendvel, porém deve percorrer aspectos particulares relatives € vida institucional universitéria, com a prdtica médica, com 0 ato docente e com a vida cotidiana do paciente e a comunidade. A ética nao pode constituir-se unicamente num postulado te6rico; ela deve reconstruir-se diariamente, num respeito miituo e de modo dinamico e participativo. Trata-se de levar até o fim uma revisdo e andlise continuos de cada um dos atos que realiza a Escola Médica para consolidar criticamente os conceitos e as linhas que orientem a ago e facam possivel o avango e ampliagdo da projegio ética do trabalho médico. A Universidade tem por obrigagao sensibilizar todos seus membros: estudantes, professores e trabalhadores, sobre a urgéncia de avangar na construgao de princfpios éticos s6lidos que dirijam a agdo. Deste modo € reconhecida a necessidade de considerar desde o inicio as caracteristicas de compromisso social ¢ julgamento de valor dos aspirantes e estudantes. Em todos os momentos da formagao, a preocupagiio com a ética deve estar presente, seja nos contetidos docentes distribufdos no curriculo, ou como reflexdo constante em torno dos conhecimentos, priticas, uso das técnicas e sua aplicagao nos pacientes e comunidades. 04. Perante as tendéncias atuais de segmentacio social, de praticas assistenciais baseadas nas diferencas de poder aquisitivo, como evitar a reprodugdo deste padrao de pratica a nivel da formagio profissional, observando os objetivos de eqiiidade e qualidade? Considera-se que em parte, a resposta desta questdo esté nas respostas as perguntas anteriores, especialmente a segunda. Para alguns grupos, 0 governo deveria redefinir politicas de Estado para este, ao contrério da tendéncia atual, assumir novas e mais complexas fungdes. Outros sustentam a impossibilidade de evitar totalmente a reproducio destes modelos, porém € possivel procurar reduzir as diferengas por meio de préticas de satide com maior equanimidade. A regionalizagao do sistema deve orientar-se para garantir 0 acesso igualitério, respeitando o Direito & Satide por parte das comunidades. E preciso ir além da nogio de “paciente”- sujeito passivo - de “cliente”- comprador de mercadoria - para chegar ao de cidadao- usuario como sujeito ativo, ator critico de seu préprio processo de satide - doenga. Um dos grupos deixou a questo aberta para uma adequagao das colocagées segundo os recursos e possibilidades de cada classe. A resposta deve surgir de dentro das instituigdes. A Universidade deve: a) Pesquisar as necessidades reais de atendimento a satide para: - orientar a formagio do profissional necessério. - fazer propostas de mudanga. - exercer uma espécie de controle quando do distanciamento dos modelos 60 considerados paradigmaticos. b) Pér maior énfase nos aspectos psicossociais, com valores educativos que apontem para a conquista de uma medicina altamente humanizada, em contraposigao & concepeio biologicista pura. O potencial sensivel dos estudantes deve ser orientado no inicio da carreira, reconhecendo sua particular carga cultural. c) Aumentar os canais de participagdo e insergiio social, conservando de modo equilibrado certos valores irrenuncidveis como os de eqilidade e exceléncia. Modificagio necesséria da Universidade e do servigo em modelos de integrago docente assistencial. A gestiio de qualidade como uma das metas. d) Aprofundar a participagdo estudantil na gestao de formagao de recursos humanos, considerando que é um segmento que nao tem preconceitos sobre a realidade que se pretende corrigir, ) Resgatar os conceitos de Alma Ata para conseguir uma resposta que atenda de modo mais eqijitativo os requerimentos de satide da populagio. Deve-se formar especificamente docentes de atengio primé ria da satide. 5. As novas condigdes do contexto social ¢ as transformagées da pratica médica colocam a Universidade e as Faculdades de Medicina perante importantes definigSes sobre seu desenvolvimento futuro. Uma delas é a definigdo de sua missio institucional perante os desafios da sade da populacao neste contexte. Quais seriam os principais critérios ou pardmetros para a definigio dessa nova missio? Na lista apresentada acrescentaram-se outros itens referidos 4 missio da Universidade e das Faculdades de Medicina; dentre eles, as condigdes de satide da populagao, as tendéncias na reorganizag’o dos servigos de satide, as respostas sociais emergentes, os avangos cientifico-tecnolégicos, 0 redimensionamento da ética e 0 fortalecimento da consciéncia cidada. Situagdes que colocam para a Universidade e as Faculdades de Medicina novos desafios iniludiveis se 0 que se busca é recuperar ou manter sua legitimidade e pertinéncia social. ‘A maior parte dos grupos identificou missio com o trabalho ou as fungdes universitérias de docéncia, pesquisa e extensiio ou servigos; muito poucos recuperaram o sentido estratégico de misséio como elemento bésico de direcionalidade, que expressa a contribuigdo social, © porqué a instituigéio existe e qual é a sua identidade social. A partir desta perspectiva identificam-se diversas posigdes. Uma estabelece que nao € necessdria uma nova missio , e sim sobretudo adaptar a existente (definida como a de servir a sociedade, sendo a sua reserva intelectual e sua consciéncia critica ) as novas condigées. Outras posigdes favorecem a definigdo de uma nova missio , por meio de um novo contrato social entre Universidade e Sociedade, = baseada numa profunda autocritica; - redimensionando e integrando os aspectos académico, politico e ético; 1 - desde um enfoque estratégico, reconhecendo ¢ convocando para a participagao dos miiltiplos atores/sujeitos sociais ( corpo docente, alunos, pessoal de servigo, comunidade e outros ) para sua viabilizagdo e para possibilitar a identificagao compromisso com ela. Essa nova missio se sustentaria nos prinefpios ou valores da eqilidade, da democracia, da eficiéncia, da eficdcia, da participagdo e da integralidade, para superar 0 risco dos critérios gerenciais afogarem os principios do compromisso social da Universidade e superando as polarizagées entre os interesses institucionais e as necessidades sociais e entre o aspecto cientifico e humanista. A missio deve expressar-se no compromisso com a construgiio de um novo paradigma de satide e de medicina, na formagiio de profissionais capazes de entenderem ¢ enfrentarem criticamente as condigdes atuais da pritica médica, no desempenho de um papel protagénico nas decisdes que tém impacto na satide da populagdo ( politicas e planejamento entre outras ) e na defesa do Direito a Satide. 6. Como se vé a possibilidade de adocao de estratégias participativas no diagnéstico e ago da prética educacional para atingir a nova missio pretendida? Existe um reconhecimento de que a legitimidade e credibilidade das Faculdades niio deve ser definido somente desde e para dentro das instituigdes; de que € preciso colocar a Universidade na perspectiva social , em didlogo, ou inclusive em confronto, com outros atores sociais que condicionam o que a Universidade e as Faculdades so e podem ser no futuro. O escasso desenvolvimento de uma “cultura de participagio” no interior de muitas Universidades e Faculdades, torna necessério que sejam envolvidas nos processos de “formagdo para a participago “, formagdo esta dentro dos principios da democracia e solidariedade. A adogio de estratégias participativas fica limitada pela burocratizagdo e pela pouca flexibilidade administrativa das Universidades, pela descontinuidade na condugao e desenvolvimento de planos e projetos e pela pouca capacidade institucional de resposta rapida perante novas situages e desafios. O desenvolvimento de instancias mais pluralistas e supra-institucionais, como os grupos de trabalho.inter-setorial ou inter-institucional , os Conselhos Nacionais de Recursos Humanos ( CONARHUS ) , tem permitido a realizago de disgnésticos mais, integrais e a colocagdo dos processos educativos em contextos maiores.Recomenda-se a andlise de experiéncias documentadas para retomar elementos que fortalegam outros processos em andamento. As estratégias participativas também devem convocar os egressos das Universidades, para obter uma retroalimentagdo (feedback ) permanente de aqueles que estdo inseridos no mercado de trabalho. Isto deveria ser acompanhado de profundas 62 mudangas nos enfoques e métodos de ensino-aprendizagem , de modo a possibilitar 0 egresso de sujeitos com capacidade de autogesto e autoaprendizagem. 7 Como pode ser definida, dimensionada e avaliada a qualidade da Educagio Médica, nao sé como exceléncia técnica mas também como relevancia social? A leitura dos relatos demostram que varios grupos procuraram predominantemente estabelecer um consenso sobre o significado dos termos “exceléncia técnica” e “relevancia social” da Educago Médica. Embora tenham se apresentado variantes na extensdo ou profundidade da abordagem dos referidos termos, a consolidago das contribuig6es dos diversos grupos pode-se expressar do seguinte modo: - Exceléncia técnica 6 um termo que comumente refere-se & qualificagao do médico, & sua formacio profissional de graduacio e pés-graduaco, bem como a aparelhagem tecnol6gica com que esse médico trabalha. = Relevancia social refere-se as implicagées praticas ou aos resultados esperados pelo desempenho profissional, que se expressam através de impactos sobre as condigdes ou os perfis de satide da populacio. Idealmente, a exceléncia técnica deveria refletir os elementos da relevancia social .No entanto, nao € a situacdo real que se observa em praticamente todas as Escolas Médicas. A principal explicagdo desta dissociagdo surge do significado prdtico do termo qualidade, marcado pelo enfoque que privilegia a qualificago do agente e dos meios de trabalho,com prejufzo da razio de ser, do objeto de trabalho em satide, que consiste na prépria satide das pessoas e dos conjuntos populacionais. Com relagao & pergunta realizada , observa-se igualmente certa dispersdo na extensdo e profundidade na tomada de posigdo dos grupos de trabalho. Contudo os diversos relatos apresentaram as seguintes contribuigdes: - A definigdo de qualidade da Educaciio Médica nao deve ter validade ou aceitagdo universal, porém deve refletir 0 consenso social estabelecido nas situagdes concretas ; este processo de chegar a um acordo deve envolver os diferentes atores interessados na formagao de profissionais da satide: docentes, alunos, populacao (usudrios ) ¢ as organizagées que oferecem servigos (especialmente as piiblicas ). = Como corolério do conceito anterior, o dimensionamento e a avaliago de qualidade da Educagiio Médica deve, assim mesmo, expressar 0 consenso e constituir-se em processos participativos mais amplos, envolvendo elementos internos das escolas/universidades ( docentes, alunos e funcionérios administrativos ), bem como representantes sociais externos ( populacio ¢ instituigées ). 63 A respeito da definigdo de qualidade, é valido fazer referéncia as seguintes consideragées apresentadas por um dos grupos de trabalho: “E preciso ter consciéncia do perigo que envolve, de um lado, o fato de ndo ter clara uma definigéio, deixando espaco aberto para a nogao de qualidade que procura-se impor desde uma Iégica “gerencial”, baseada na rentabilidade econémica. Por outro lado deve evitar-se projetar uma imagem de qualidade pouco exigente, uma espécie de formagiio de “médicos de segunda”, para um atendimento médico elementar”. 8. Os conceitos de qualidade no atendimento médico e qualidade da educagio obedecem ao mesmo paradigma. Que possibilidades e limitagdes pode ter a aplicacio de modelos de melhorias de qualidade na Educacio Médi nos que sio utilizados na prética médica? inspirados As discussées dos diversos grupos se orientam no sentido de estabelecer diferentes enfoques estratégicos para a gestio de qualidade nos servigos e na educagao, como conseqiiéncia da natureza diversa desses processos. Isto nao elimina, muito pelo contrario pressupde a necessidade de um desenvolvimento sinérgico de estratégias de gestio de qualidade nos dois processos, dado seu caréter interativo. Isto é, como nao € possivel dissociar a educacao da pratica médica, tampouco seria razodvel implementar propostas de gesto de qualidade voltadas exclusivamente para um desses processos. Segundo alguns relatos de grupo, o principal risco ao propor a aplicagao direta de modelos de gestdo de qualidade em servigos para a Educaco Médica , seria o de perpetuar a formagdo biologicista e tecnicista, dado que essas sdo as pautas do atual modelo assistencialista, as que marcam os préprios modelos de gestiio desses servicos. De modo que, embora se reconhega como vélido para a melhoria de qualidade da Educagiio Médica - quando for considerado adequado - aproveitar parte da vasta experiéncia na melhoria de qualidade dos servigos, é mais recomendavel procurar desenvolver propostas mais préximas as peculiaridades do processo educativo. Quando se fala de qualidade na educagio , deve-se considerar que 0 elemento central desse processo é a comunicagao. Quando se fala de Educagaio Médica, esté em jogo um processo particular de comunicagdo entre atores peculiares, que sao os alunos e 0s professores, situados também num contexto peculiar, que € a escola médica. o exposto até aqui, o mais ponderado é reconhecer a necessidade de um melhor desenvolvimento conceitual ¢ doutrindrio do tema da gestdo de qualidade na Educagio Médica, sem descuidar a realizagio de experiéncias concretas nessa Area, inclusive porque seria esse 0 modo de convalidar esforgos no campo teérico. 9. Quais elementos deveriam considerar-se numa proposta de avaliagio da Educaciio Médica dentro do contexto que vem se analisando neste Encontro? 7 ‘A maior parte dos grupos possuem um enfoque integral e sistémico do processo de avaliagdo na Educagado Médica. Esse enfoque é integral na medida que coloca a Educagado Médica , enquanto pratica técnica e social diferenciada, interrelacionada nao s6 com a pratica médica mas também com as necessidades da satide , no contexto geral ¢ institucional que ambas se encontram . Dé-se énfase principalmente, ao fato desta visio integral basear-se numa perspectiva histérica de seu desenvolvimento . Destaca-se 0 fato de que varios grupos realizaram previamente um exercicio para identificar problemas que dificultam uma mudanga positiva na Educagdo Médica. Esse enfoque é integral, também, porque contempla outros atributos importantes: ~ 0 fato de ser um processo participativo, onde so considerados ndo somente os atores institucionais da Educagdo Médica (dirigentes, docentes, estudantes, funciondrios ), seno também outros, tanto do Estado quanto da Sociedade. - 0 fato de ser um processo de construgao coletiva de acordos ( entre os principais, a missio institucional e 0 conceito de qualidade assumido ) e de condigdes favordveis para uma mudanga definida através de determinagdes de seu proprio contexto , principalmente, com critério prospectivo. . Pot outra parte identifica-se uma concep¢do sistémica da avaliagdio na Educagio Médica Sendo assim, evidencia-se em varios grupos 0 uso de um modelo basico que destaca certas dimensdes para serem levadas em conta: 0 processo propriamente dito, os resultados e 0 impacto da Educagio Médica. Alguns grupos integram nesse modelo basico um componente de insumos ou recursos, enquanto outros referem-se ao contexto com similar intencionalidade. Nessa perspectiva, assinala-se repetidamente, a partir de experiéncias concretas,que os processos de reformulagio curricular devem observar , também, a transformagao das estruturas académicas e administrativas e as condigdes de infra- estrutura educacional , para garantir critérios minimos quanto & qualidade de ensino. interessante € verificar que esse modo de conceber a avaliagdo esté sendo praticada em varios pafses, com algumas diferengas de matizes, niveis de desenvolvimento e objetivos. Em quase todos esses casos - bem como em outros que ndo se encaixam nesta perspectiva - tem se tornado, ou vai se tornando, indispensdvel definir em comum acordo um conceito ou visdo de qualidade. 10. Quais siio as possibilidades que existem no seu pais para desenvolver critérios ¢ mecanismos de acreditagio de programas de Educacio Médica? Em todos os casos 0s grupos de trabalho tem expressado acordo a respeito da 65 necessidade de estimular processos de acreditagao de programas de formagdo médica, como mecanismos de avaliagao e instrumentos para impulsar a melhoria da qualidade educativa. No entanto, como € razodvel aguardar , as diferengas se referem aos processos de implementagao . Tais diferengas, que resgatam algumas experiéncias concretas, acontecem,desde paises que se encontram num processo de debate acerca da pertinéncia de um determinado modelo de avaliagao, pasando por outros que estio definindo convenientemente os critérios para acreditar com uma periodicidade, até paises que ja tem definido os mandatos legais e a vigéncia dos instrumentos juridicos aplicados E muito importante salientar aqueles casos que se encontram em processo de definir critérios para acreditar programas - e varios grupos se manifestaram a respeito - onde 0 programa é concebido como um processo participativo do conjunto de Faculdades e Escolas de Medicina. E justo destacar o papel positivo que tem desempenhado e vém desempenhando as associagées nacionais para motivar e tornar vidveis os acordos. Entretanto, também deve ser reconhecido 0 fato que num bom niimero de casos esas iniciativas no contemplam o papel do Estado, reivindicando nesse contexto, a autonomia universitéria. De modo semelhante, colocam sérias reservas aos mecanismos de avaliagao externa, propiciando, pelo contrario, novas formas institucionais de participagdo de pares na avaliagao. Em geral se enfatiza que a avaliagao deve ser realizada pelos pares. Os pafses do Caribe de fala inglesa, constituem um caso especial, dado que nao rejeitam a avaliagio externa; mais ainda, a recomendam, acompanhando a proposta de mecanismos sub-regionais, - embora integrados por membros dos Conselhos Médicos da sub-regiao. E interessante que, dentro deste contexto, tenham proposto a criagéo de uma Associagio de Faculdades e Escolas do Caribe. Mostra-se claramente 0 estimulo que os processos de integragdo subregional - em especial NAFTA e MERCOSUL - imprimiram sobre as iniciativas de “acreditagao” nos pafses participantes. Essas iniciativas compreendem processos de “acreditagao” de programas de formagio com a finalidade de serem homologados, assim como acordos que tém a ver com a regulacio das profissdes, considerando os novos cendrios dos mercados de trabalho e da circulagdo da forga de trabalho. 11. Proponha critérios de conciliagio de iniciativas, esforgos e processos orientados para o melhoramento de qualidade da Educacio Médica. Quais modalidades de cooperacao inster-institucional, nacional e internacional deveriam considerar-se para fortalecer esses esforcos de conciliagio? A maior parte dos grupos coincidiram na necessidade de gerar instancias de conciliagdo (adequagiio) que convoquem todos os atores envolvidos nesta problemética , especialmente & populagdo. No entanto , parece prevalecer a idéia de uma adequagdo como mecanismo de maior alcance que supera os fins da avaliago, para gerar poder 66 politico, permitindo uma projegdo externa e maiores possibilidades de obter recursos ou condigdes na atual situagao de crise. coneretas € Por outra parte, permitiria articular propostas insterinstitucionais realizar mudangas internas necessdrias para uma melhoria de qualidade na Educagao Médica. Coloca-se também a necessidade de optar pelas iniciativas concretas e de gerar para clas a viabilidade politica ¢ a base social que assegurem sua estabilidade € continuidade. Foi manifestada uma ampla aceitagao da proposta de gestiio de qualidade para a Educagdo Médica e proposta a necessidade de esclarecer_e divulgar os conceitos que formam parte dela, para superar preconceitos temores e desconfiangas que , com freqiiéncia, acompanham as propostas e mecanismos de avaliagio © acreditagao. ‘Aparece claramente a pequena diferenciacfio entre o que se entende por gestiio de qualidade, por “acreditagao”, e a relagdo que existe entre eles, embora parega fortalecer- se a idéia de ambos poderem constituir fatores de progresso e melhoria das condi nas quais a Educacio Médica se desenvolve nos diferentes pafses. Os elementos colocados como fundamentais para elevar a qualidade da Educagio Médica foram a profissionalizacao do docente, a instauragiio de mecanismos de certificagdo de seu desempenho pedagégico e 0 melhoramento das condigdes de sua pritica. Em relagdo aos novos contetidos, que refletiriam uma maior qualidade da formagao, sao incluidos os princfpios de uma nova ética para resgatar a equidade, a multidisciplinaridade e a educagdo entendida como um processo permanente, No geral, colocou-se a necessidade de uma mudanca de atitude do “demos” universitério. Alguns grupos manifestaram sua preocupacio pelos aspectos éticos e de eqilidade nos processos de escolha de curso e de selegdo dos aspirantes a esse curso: a opedio pela medicina ndo deve estar baseada somente nos critérios de status ou de incentivos econémicos. Deve haver uma insisténcia no sentido da qualidade do servigo social , intrinseca a esta profissio. Interessante € mostrar que a opinido dos grupos ainda traduz a centralizagiio do sucesso da educagao na figura do docente. Entre os mecanismos concretos a serem desenvolvidos sio mencionados a busca de integragiio nacional, regional ¢ internacional, para o desenvolvimento conjunto em assuntos como a informagio cientifico- técnica e a gestdio de qualidade, a promogiio da pesquisa e o intercdmbio de experiéncias de alunos e de docentes. Sao propostos mecanismos de organizacdo do trabalho nacional para a melhoria de qualidade da Educagiio Médica baseados numa estrutura de redes de colaboragdo interinstitucionais , que nao s6 compartilhem a informagdo ou fortalegam os processos em andamento, senio que também permitam um melhor aproveitamento das po: internacionais de cooperagio técnica e financeira. bilidades nacionais e Em alguns grupos manifestou-se claramente a necessidade de promover esforgos de integragio subregional para trocar e potencializar as experiéncias nacionais. 67 Coordenagao Grafica e Revisio: Marcio José de Almeida Editoragao: Visualité Programagao Visual Impressio: Universigraf

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