Você está na página 1de 30
O império da concorréncia: uma perspectiva histérica das origens e expansdo do capitalismo Marcelo Weishaupt Proni’ O objetivo deste artigo é apresentar um panorama da evolugdo do capitalismo, desde a longa gestagéo que antecede a Revolugdo Industrial até a eclosdo da crise contemporénea. Por se tratar de um texto sintético, ndo tem a pretenséo de aprofundar discussdes tedricas e sim de apresentar as passagens centrais relativas ao desenvolvimento das economias capitalistas avangadas, mostrando que esse percurso tem sido marcado por rupturas ¢ continuidades. Um de seus aspectos centrais é 0 papel desempenhado pela concorréncia na expansdo do sistema econémico. INTRODUCAO. O capitalismo tem-se transmutado ao longo dos iiltimos duzentos anos, seja sob a perspectiva de sua estrutura produtiva, dos atores sociais envolvidos na luta de classes, das instituig6es juridicas que regem as relagdes econémicas, dos organismos internacionais R. paran, Desenv., Curitiba, n.92, set Jdez, 1997, p.3-32 3 ‘em Cizncias Econticas pelo ‘Institwto de Econcwnia da Unicamp ¢ pesquisador do Cest. 0 IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expansio do Capitalismo que ordenam a economia mundial, do padrao de concorréncia intercapitalista, dos mecanismos de intermediagio financeira ou da forma de manifestagio e superagdo de suas grandes crises. Contudo, da ética de seus prinefpios gerais ou tendéncias de movimento, 0 capitalismo se mantém fiel A sua natureza {ntima; ou melhor, a cada nova etapa de seu desenvolvimento, sao repostas de modo amplificado suas leis imanentes: tendéncia a aumentar 0 grau de concentracdo e centralizagao do capital, a induzir o progresso técnico e revolucionar a produgao, a poupar o trabalho vivo socialmente necessério, a ampliar a capacidade produtiva instalada além das possibilidades do mercado, a englobar novas areas de valorizagdo e expandir seus dominios para além das fronteiras dadas, a espraiar sua légica de reprodugao por todas as esferas de sociabilidade (MAZZUCCHELLI, 1985). A medida que agem no sentido de desobstruir as barreiras que limitam a maxima acumulagio de riqueza, essas leis gerais do capitalismo produzem resultados contraditérios, gerando crises que Provocam mudangas importantes na organizagaéo econdémica e na propria organizagao social. Entretanto, tais mudangas sé ganham significado quando apreendidas sob uma perspectiva histérica, Com o propésito de entender as origens ¢ a evolucao do capitalismo, este texto esté divido em sete segdes. A primeira faz um rapido esbogo do processo de transig&o para o modo especificamente capitalista de produgio — processo que levou, na Europa, cerca de sete séculos, desde 0 comeco da desagregagdo do feudalismo até a implantagao de uma economia industrial. A segunda seco trata dos elementos que caracterizaram a Revolucéo Industrial na Inglaterra. A terceira procura dar uma idéia de como aquele nove modo de producdo se difundiu para outros pafses e passou a ditar a dinamica da economia mundial. A quarta segdo descreve as transformagdes ocorridas no sistema econémico internacional ao final do século passado, as quais trouxeram novas formas de concorrénciae marcaram a transigo para um novo estadio de desenvolvimento do capitalismo. A quinta procura sintetizar as razdes e implicagdes do colapso das instituigdes que sustentavam a ordem econémica auto-regulada nos anos 20 e 30. A sexta examina as décadas que sucederam a Segunda Guerra Mundial, em que se destacam os esforcos de regulagao da concorréncia € as politicas piiblicas de bem-estar social. A sétima e tiltima faz algumas consideragées sobre a crise contemporanea e 0 retorno de condutas que marcaram 0 capitalismo no final do século passado: © (neo)liberalismo e 0 (neo)imperialismo. 4 R. paran, Desens., Curitiba, n.92, setdez. 1997, p. 3-32 Marcelo Weishaupt Proni A TRANSICAO PARA O CAPITALISMO, A transigdo para uma sociedade fundada em relagdes essencialmente capitalistas foi um processo histérico longo, que envolveu a transformagdo concomitante de toda a cultura ocidental (MACFARLANE, 1989). De fato, 0 capitalismo sé foi possivel gracas a0 desenvolvimento progressivo de um certo individualismo e da aplicaedo de uma mentalidade racional e pragmitica & organizagdo da vida social, 0 que, por sua vez, foi reforgado pela crescente complexidade dos “jogos das trocas” no meio urbano (BRAUDEL, 1996, v. 2). Na Europa ocidental, essa Jenta transmutagdo do cardter das sociedades esteve associada aum conjunto de mudancas de ordem politica e econémica, que nao deveriam ser examinadas genericamente. Contudo, no cabe aqui outra escolha. A partir do século XI, com o ressurgimento das cidades (burgos) e do comércio inter-regional, as relagdes sociais' que davam coeréncia e continuidade ao antigo modo de vida feudal comegaram a ser tensionadas (SWEEZY et al., 1977). Nao obstante, 0 capitalismo s6 emergiria como um sistema econémico plenamente constituido* ©, 0 que é indissociavel, como um sistema social, no qual estao presentes uma burguesia industrial e um proletariado urbano, ao final do século XVIII, Devem ser pontuados, ao menos, alguns dos aspectos mais gerais dessa longa transigao. Inicialmente, cabe apontar que a sociedade feudal era eminentemente hierdrquica e estamentéria, sendo a relagio senhor/ servo a relagdo social basica que fundava a economia e a politica do mundo feudal. Tratava-se de uma sociedade em que prevalecia a afirmagio explicita da desigualdade entre os homens, 0 que contribufa para reproduzir uma estrutura social relativamente estavel. A idéia de direito decorria da elaboracao de tradigdes (por exemplo, 0 trabalhador estava preso & terra onde nascera), e 0 que garantia universalidade ao mundo dos camponeses e bardes era basicamente a necessidade de defesa territorial ¢ o respeito ao poder natural (sagrado). A sociedade capitalista, a0 contrério, prima pela defesa do direito a igualdade e & liberdade (mesmo que formais). A reprodugo da vida material ndo mais se assenta na ética religiosa/ militar ¢ sim numa nova ética, a do trabalho livre e do progresso material. A universalidade passa a ser garantida pelo direito positivo ¢ pela afirmagao de valores gestados no interior de uma das criaturas mais mitolégicas da nova civilizagao: 0 mercado. Este confere substrato 4 valorizag4o do livre-arbitrio e ao reinado de uma outra R. paran, Desenv., Curitiba, n.92, set /dez. 1997, p.3-32 s ' Por relagdes sociais deve-se entender mum sentindo amplo, 0 conjunto de relagses que os individuos estabelecern ‘nire si nas diversas esferas de sociabilidade: no trabalho, nos negécias, na politica, no acer * 0 captalismo pode ser entendido, genericamente, como um regime de producao, distribuigdo e apropriagto da iqueza material, cujo ‘movimento se autodelermina segundo leis gerais da acumutacao de capital. Como ‘al, implica a configuragao de relagbes sociais especificas, aseadas na divisdo da socledade em classes antagénicas ¢ na competicao {egal pelo poder econdmico no mito dos mercados O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expansao do Capitalismo mentatidade, baseada no “racionalismo econémico” (WEBER, 1987, cap. 2), © qual implica a adogaio de uma racionalidade “cientifica” pela organizacaio empresarial. Finalmente, predomina uma nova ideologia, segundo a qual a livre concorréncia, princfpio inspirador dos mercados capitalistas, aparece associada a uma aspirada mobilidade social ¢ a uma saudavel concorréncia entre “iguais”. Tal sociedade, como se pode constatar, apenas se materializou historicamente apés as intensas transformagées ocorridas ao final do século XVII, que podem ser sinteticamente apreendidas a partir de dois grandes movimentos revoluciondrios modemos: a Revolugao Francesa (1789) ¢ a Revolugdo Industrial (1780-1830). Nos limites deste texto, que privilegia as transformagées de carter econémico, importa resumir os fatores estruturais que propiciaram a ‘emergéncia de uma economia industrial na Inglaterra. ‘Como indicado, a génese do capitalismo deve ser buscada na decomposigao do feudalismo e no desenvolvimento de novas formas de organizagiio econémica e social. Esse longo perfodo que antecede a plena constituigdo do modo de produgao tipicamente capitalista (aquele fundado na acumulacdo industrial) e que prepara as condigdes para sua implantagdo, esse proceso de transigo de um sistema a outro tem sido chamado de periodo da “acumulaco primitiva de capital” (MARX, 1985, cap. 24). Em outras palavras, 0 movimento de acumulagao € concebido como “primitive” porque engendra os elementos fundamentais do capitalismo (0 trabalho assalariado e 0 capital-dinheiro) e se apoia na violéncia fisica/militar e no poder do Estado (tanto em relagdo & ordenagdo de um espago econémico nacional como & conquista de rotas comerciais transnacionais). De fato, 0 aspecto essencial dessa transi¢o ao modo de produgio capitalista foi a violenta dissociagao entre 0 produtor e seus meios de produgdo, ou seja, a progressiva expropriagao dos produtores independentes. ‘A acumulagdo primitiva foi um perfodo que englobou uma série de processos interdependentes, quais sejam: a}. valorizago do capital no comércio e na usura; b) a expansio da producao de mercadorias ¢ o posterior surgimento do putting out?¢ da manufatura; c) a formagao paulatina de um mercado transcontinental ¢ 0 estabelecimento do sistema colonial; d) o aparelhamento administrativo-financeiro do Estado e a adogao de politicas “mercantilistas”; e) ¢ a proletarizacao dos camponeses e aprendizes, ‘oque exigiu a disciplinarizagao dos trabalhadores livres ¢ a regulacio dos salarios como tarefas do Poder Piiblico. 6 R. paran, Desens:, Curitiba, n.92, set./der. 1997, p. 3-32 > Puating out era a rodugdo artesanal realizada ‘por camponeses, encomendada por comerciantes ¢ destinada integralmente aos mercados urbanos. Marcelo Weishaupt Proni Historicamente, a acumulagao primitiva se desdobrou em diferentes regides da Europa, sendo que com o passar dos séculos centro dindmico se deslocava de uma regiao a outra: das cidades italianas ¢ alemis para a Peninsula Ibérica (Portugal e Espanha), depois do advento das grandes navegagées, passando pelas terras baixas (Holanda) no século XVII, até se polarizar entre Franga e Gri-Bretanha no século seguinte. A Inglaterra foi, contudo, a nagao que reuniu as condigées hist6ricas necessarias para a maturagdo do modo de producao tipicamente capitalista, a partir do que foi chamado de Revolugdo Industrial (OLIVEIRA, 1985, parte 2, cap. 1). Mas que condigées foram essas? Em primeiro lugar, deve-se destacar a forma como se desenrolou a crise do feudalismo inglés, 20 longo dos séculos XIV e XV, a qual ocasionou um debilitamento da nobreza muito mais dramético que em outros pafses e possibilitou o desenvolvimento de uma produgo camponesa independente. O fortalecimento do rei levou a formagao de um Estado absoluto, com poderes de concentrar a tributagdo, impulsionar a monetarizaco da economia ¢ expulsar os mercadores estrangeiros, o que estimulou a expansfo mercantil nacional. Por outro lado, o surgimento de uma estrutura social menos rigida, na qual despontam novas classes sociais ligadas ao comércio, ao artesanato e & agricultura mercantil, seria fundamental para explicar a precocidade da revolucao burguesa na Inglaterra, em meados do século XVII. Em segundo lugar, frise-se a coesdo de interesses mercantis € produtivos, que passou a influenciar crescentemente a condugio da politica britinica depois da Revolugao de 1640, sejaem relagdo ao cercamento dos campos comuns, a desregulamentagao dos grémios ¢ das corporagées de oficio ou A politica externa “mercantilista”*. Em fungdo disso, j4 no século XVII, o Estado inglés sinalizava favoravelmente A desarticulagdo das tradigdes que estraturavam 0 antigo mundo do trabalho. Por outro lado, no inicio do século XVII, em fung&o do sucesso de sua politica externa agressiva, a Gra-Bretanha jé consolidava sua posigao de principal poténcia maritima e dominava os principais mercados ultramarinos. Em terceiro lugar, deve-se considerar a importancia das transformagées no campo, principalmente na primeira metade do século XVIII, as quais consolidaram uma estrutura agraria capitalista. Acchamada “revolugao agricola” propiciou uma oferta de alimentos matérias-primas em quantidade e pregos adequados & reprodugdo do nascente proletariado e ao desenvolvimento da manufatura. Além R. paran, Desenv, Curitiba, n.92, set de, 1997, p.3-32 7 * Sé0 exemplos de polis mercantilista 0s Atos de Navegacio (exigiam que 0 transpone de mercadorias -fosse feito por navios de ondeira brtinica). a ampliegto da frota naval ¢ a conquista de noves circuitos * Depois de os camponeses terem sido expropriados ¢ os campos ‘comuns incorporados @ produgao agricola mercantil, ‘novas teenicat de eultivo pemitiram aproveitar terras rodutvidade. O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expansao do Capitatismo disso, o assalariamento dos trabalhadores rurais (jornaleiros ou diaristas) contribuiu para ampliar os mercados consumidores de manufaturados, criando uma nova dinamica entre cidade e campo. Por ultimo, é necessario enfatizar a preexisténcia de um sistema embriondrio de crédito bancério, que se configurou especialmente a partir de 1694 com a criago do Banco da Inglaterra. Ao longo do século XVII, o sistema bancério britanico desenvolveu- se impulsionado pelo crescimento do comércio exterior, o que Ihe permitiu descmpenhar um papel importante no financiamento da grande indistria, ja nas tltimas décadas dos setecentos. Esses fatores ajudam a entender porque a Inglaterra conseguiu reunir os requisitos internos necessdrios & industrializagao. A constituigdo prévia de um espaco econémico europeu (BRAUDEL, 1996, v. 3), no qual o poder mercantil britanico se tornou preponderante, foi igualmente fundamental para a posterior conformagao de um mercado capitalista mundial. Com o desenvolvimento do sistema colonial e a expansio do comércio transcontinental, plasmou-se certa divisio internacional do trabalho, na qual a Gra-Bretanha se especializava na produgao manufaturcira ¢ seus parceiros e colénias se dedicavam & produgdo primaria, A superioridade briténica no cenério internacional, ao longo do século XVIII, expressava a capacidade de resposta que a produgao nacional mostrava face aos estimulos do mercado externo, assim como a eficécia da modemizago do Estado conduzida pelo Parlamento inglés. Nao obstante, quando Adam Smith publicou A Riqueza das Nagées, em 1776, defendendo justamente a tese de que cada nagio devia se especializar na produgao de mercadorias para as quais houvesse vantagens comparativas (clima, tradigdo de cultivo, disponibilidade de matérias-primas, etc.), 0 comércio internacional ainda era alvo de disputas armadas, e nenhuma das principais poténcias econémicas tinha atingido um grau de desenvolvimento tecnolégico (ou seja, um nivel médio de produtividade) que a colocasse muito acima de suas concorrentes diretas. Mas isto estava prestes a mudar. A REVOLUCAO INDUSTRIAL O capitalismo inglés, qualificado freqtientemente como “capitalismo origindrio” por causade seu pioneirismo e singularidade, tem como tracos distintivos a emergéncia de uma estrutura econémica baseada na produgao industrial e a constituigo de um proletariado 8 R. paran. Deseny,, Curitiba, n.92, setJdez, 1997, p, 3-32 Marcelo Weishaupt Proni industrial radicado nos principais centros urbanos do pais. Por definigio, a conformagdo do capitalismo s6 se completa com 0 surgimento da produgdo mecanizada, organizada como grande industria, e com a generalizagio do trabalho assalariado e a reprodugaio de uma classe operdria. Assim, a Revolugao Industrial representa a constituigdio/generalizacio de relagSes capitalistas de produgao, 0 que 6 fundamental para o pleno dominio do capital sobre as condigdes de sua valorizagao (OLIVEIRA, 1985, parte 1, cap. 2). O ponto de partida para a revolugdo na organizagao da produgao foi, como se sabe, a introdugao da méquina-ferramenta, que permitiu a superacdo dos limites impostos pela capacidade organica do trabalhador ao aumento da produtividade, As maquinas passaram a ditar o ritmo do proceso de trabalho e a homogeneizar a qualidade do produto, o que desvalorizou o preco da forga de trabalho e reduziu os custos unitérios de produgdo. A maquinaria representou, do ponto de vista da valorizagao do capital, um poderoso instrumento de subordinagao do trabalhador as condigdes impostas pelos detentores dos meios de produgdo ¢ um poderoso impulso ao ritmo da acumulagao. Mas como foi possivel essa revolugio? A introdugao de inovagdes técnicas na esfera da produgao, visando & maior lucratividade, € uma arma decisiva na concorréncia capitalista. A partir de meados do século XVIII, na Inglaterra, a existéncia de mestres de oficio, de trabalhadores especializados e de “homens préticos” propiciou a busca de solugdes tecnicamente mais produtivas para os processos de produgao, até entdo baseados na cooperagio ¢ na utilizago de ferramentas manuseadas pelos trabalhadores. Gradualmente, outras fontes de energia foram sendo testadas em substituigdo forga animal, em especial o vapor. Os conhecimentos cientificos que foram sendo adicionados empiricamente ao processo produtivo j4 estavam, em sua maioria, disponiveis desde o século anterior (LANDES, 1994, cap. 2). Como a acumulacao primitiva foi comandada pelo capital comercial, 0 capital (dinheiro) que financiaria a construgao das maquinas ¢ os investimentos em novas instalagdes, para a implantagao de grandes inddstrias, proveio inicialmente da esfera mercantil. Também os bancos provinciais, que ofereciam empréstimos de curto prazo, com taxas de juros relativamente baixas e passiveis de ser prolongadamente renovados, contribufram para financiar as novas fabricas. R. paran. Desenw, Curitiba, n.92, set./dez, 1997, p.3-32 9 O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expansio do Capitalismo O primeiro ramo industrial a se organizar foi o téxtil — cuja produgao se destinava aos mercados de consumo corrente ~, ¢ sua expansdo fabulosa criou condigdes para o surgimento de indiistrias produtoras de bens de produgdo (méquinas, equipamentos e insumos industriais). O dinamismo daquele ramo irradiou-se para o restante da economia como num efeito em cadeia. A partir de 1780, a acumulagio na inddstria téxtil estimulou a r4pida urbanizagao dos principais centros regionais, impulsionando a construgo civil e a demanda de carvao para o consumo doméstico. O surto de mineragao, por sua vez, expandiu a produgao de maquinas a vapor, permitindo 0 surgimento da indtistria mecanica, enquanto o transporte do carvao estimulou a construgao de canais ¢ estradas. Também a metalurgia acabou sendo alavancada, dada a crescente demanda de ferro resultante do processo de industrializagao. Pode-se dizer que a industrializagao inglesa foi, em contraste com outras que viriam, um proceso “organico”, que decorreu do desenvolvimento anterior da manufatura ¢ de um prolongado perfodo de acumulagao de capital e de proletarizagio dos camponeses ¢ artesios. A posigao de forga do capital inglés na economia mundial garantia tanto uma soma considerdvel de capital- dinheiro passivel de ser investida na esfera produtiva, quanto mercados externos para a produgao nacional. Dito de outra forma, as exigéncias para a implantagao da grande industria eram compatfveis com o ritmo da acumulagao de capital alcangado pela economia britanica, ¢ os investimentos industriais, além da alta rentabilidade, propiciavam um répido retorno do capital imobilizado. Isso explica por que a tipica empresa capitalista inglesa assumiu um cardter “familiar” e por que a expansao industrial péde ser financiada, em grande parte, pela reinversio dos préprios lucros ou pelo crédito bancério de curto prazo, sem necessitar de esquemas mais complexos de financiamento. Por volta de 1830, a estrutura industrial ja estava plenamente constituida, e a Inglaterra j4 podia ser considerada a “oficina mecAnica do mundo” (HOBSBAWM, 1977, cap. 2). Durante as cinco décadas nas quais se desdobrara a Revolugao Industrial, a lideranga da economia foi da industria téxtil. A partir daquele momento, quando se inicia o ciclo ferrovidrio, o crescimento econémico passaria a ser puxado pela dinmica do setor produtor de bens de produc, e os contornos essenciais do que hoje se conhece ‘como capitalismo® se tornariam nitidos. 10 R. paran. Desen:, Curitiba, n.92, set/dez 1997, p. 3-32 * Note-se que o termo “capltalismo” 6 se tornou de so corrente na segunda ‘mezade do século passado, Marcelo Weishaupt Proni Nesse sentido, ndo se pode esquecer que a industrializagaio transfigurou 0 mundo do trabalho, dissolvendo tradigées & estabelecendo novas categorias ocupacionais e novos ritmos de produgo, ao mesmo tempo que criou ou potencializou um pesadelo social sem precedentes — com sobreexploracao consentida da mao- de-obra (inclusive infantil) em interminaveis jornadas de trabalho com um actimulo de pobreza urbana em gritante desacordo com a prosperidade material aleancada. A transformacdo da forga de trabalho em mercadoria a ser consumida no processo de produgao ¢ as condigdes desumanas do mercado de trabalho so um exemplo de como a mercantilizagdo das relagdes sociais, promovida pelo avango do capitalismo, triturou as bases morais da sociedade e impés uma nova ordem social assentada na concorréncia individual (POLANYI, 1980, parte 2). Vale a pena recordar, nesse sentido, que ao publicar seus Principios de Economia Politica e Tributagéo, em 1817, David Ricardo ja reconhecia que a maquinaria era prejudicial aos interesses da classe trabalhadora, mas alertava que a nag que no propiciasse condigdes para o florescimento da produgao mecanizada estaria condenada a uma situagiio desfavoravel no intercdmbio econdmico internacional e, no limite, & estagnago econdmica. A DIFUSAO DO CAPITALISMO. Para entender de que forma o capitalismo se difundiu para outros paises, ou ainda, como a Iégica da acumulagio industrial passou aditar as regras do desenvolvimento econdmico internacional, deve- se analisar, primeiramente, o papel que a Inglaterra passou a desempenhar na economia mundial, uma vez consolidada sua posigio de principal centro industrial e financeiro. No plano do comércio internacional, a relagio de dominagdo exercida pela Inglaterra ao longo do século X VIM, baseada na forga de sua esquadra naval, foi sendo paulatinamente substituida, apés 0 término das guerras napoleénicas, por uma posigao de hegemonia econdmica, cujo ceme € a propria superioridade da producao de manufaturas britinicas, agora mecanizada. Durante a Revolugao Industrial, os baixos precos dos téxteis ingleses arrebataram os principais mercados internacionais. Depois, conforme se desenvolvia o setor de bens de produgo, a economia inglesa passou a exportar ferro, carvao, mdquinas etc., particularmente em fungdo do surto de construc de estradas de ferro que tomou conta da Europa R. paran. Desenv., Curitiba, n.92, set.fdez. 1997, p.3-32 u O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Histérica das Origens ¢ Expanso do Capitalismo edos EUA ao longo do século passado. Ao mesmo tempo, a Inglaterra intensificou suas importagdes de alimentos ¢ matérias-primas € assumiu a fungao de principal financiadora do comércio internacional, ajudando a dinamizar o mercado mundial e a fomentar o crescimento econémico de seus parceiros. Essa “aptidao” de exportador de bens industriais e importador de bens primarios, somada ao papel de centro financeiro desempenhado pela City de Londres, acabou por configurar uma relagdo de complementaridade econémica entre a Inglaterra ¢ outras nagées interessadas na expansao do mercado mundial. O capitalismo britanico passou a articular os interesses comerciais de distintas areas econémicas (Europa continental, América do Norte, América Latina, colénias britinicas, etc.), os ingleses se tornaram os principais defensores do livre-cambismo, lutando nao somente contra as barreiras tariférias ao livre comércio, mas também pela liberalizagao dos fluxos de capitais e m&o-de-obra. O liberalismo econémico foi possivel porque 0 coeficiente de abertura da economia inglesa aumentou gradativamente, gerando déficits comerciais importantes. Como o déficit na balanga comercial era mais que compensado pelo saldo com servicos (transportes, seguros, juros), os ingleses passaram a financiar a construgo ferrovidria e as obras de infra-estrutura no exterior ~ fundamentais para viabilizar a constituigo de setores exportadores modernos nos paises receptores de capital. Houve, de fato, uma convergéncia de interesses econdmicos durante grande parte do século XIX, que permitiu superar o clima belicoso do periodo da acumulagao primitiva € propiciou as bases materiais para a chamada “paz dos cem anos” (POLANYI, 1980, cap. 1). Assim, na nova ordem econémica internacional, a Inglaterra criou as condigdes para fomentar a acumulacdo industrial através da exportagdo de bens industriais. Ao fazé-lo, porém, induziu a industrializagao de outras nagoes. Paises como a Franga, os EUA € a Alemanha tiveram possibilidade de aproveitar os estimulos oferecidos pelo dinamismo da economia inglesa ¢ conseguiram desencadear o processo de industrializacaio. Em conseqiiéncia, a partir de 1870, a industria nascente desses pafses passou a concorrer com a inddstria britanica, contribuindo para o reaparecimento de politicas econémicas protecionistas. A difusio do capitalismo no século XIX, portanto, significou o surgimento de novas poténcias industriais, que viriam competir com a economia inglesa e transformar as relagdes econémicas internacionais. R R. paran. Desenv., Curitiba, n.92, ser/dez, 1997, p. 3-32 Marcelo Weishaxpt Proni Os processos de industrializago que se seguiram & Revolugao Industrial podem ser qualificados como responsaveis pela constituigao de “capitalismos atrasados”, em contraposi¢o a “capitalismo originario” briténico (OLIVEIRA, 1985, parte 1, cap. 3). A peculiaridade desses processos seria ocorrerem num periodo em que a Inglaterra era hegeménica no cenério econdmico internacional, a ideologia dominante era o liberalismo econdmico, € ainda nao existiam sérios obstéculos & industrializagdo. Os capitalismos atrasados se diferenciam do origindrio também porque a implantagao da industria téxtil seria incapaz, por si s6, de desencadear a industrializagao (a necessidade de importar maquinas ¢ insumos resttingia a expansio da demanda interna), tendo sido exigido um esforgo maior para internalizar a indtistria de bens de produgao, tinica forma de garantir a criagio de um mercado interno capitalista e alavancar a acumulacdo industrial. Outra diferenga é que o capitalismo atrasado representava um grande salto qualitativo da estrutura produtiva, ou seja, verificavam-se insuficiéncias técnicas e financeiras, que requeriam uma atuacio mais decisiva do Estado nacional no sentido de centralizar recursos, criar infra-estrutura, gerar demandas ¢ viabilizar a industrializagao. Para um melhor entendimento, pode-se distinguir os processos de industrializagao do século XIX em duas “ondas”. As industrializagdes da Franga, EUA e Alemanha sao classificadas como da “primeira onda” (1840-1870), enquanto as da Riissia, Japao e Itdlia fazem parte da “segunda onda” (1870-1890). Durante a primeira onda, © salto para a industrializagao ocorre no auge do periodo de livre- cambismo, no qual predominava uma situagio de mercado internacional favordvel e um padrio tecnolégico consolidado. Jé, na segunda onda, o salto qualitativo & mais arduo ¢ complexo, posto que ocorre durante a Grande Depressio de 1873-96 (periodo de tendéncia a queda generalizada dos pregos internacionais) simultaneamente & emergéncia de novas matrizes tecnolégicas, o que aumentava o risco dos investimentos e exigia uma participacdo mais decisiva do Estado nas tomadas de decisao e na superagao do atraso técnico e financeiro. Mas o fato de se classificar o desenvolvimento capitalista em paises como EUA, Alemanha, Russia e Japio sob 0 mesmo conceito/padrao (capitalismo atrasado) nao significa que © processo de industrializagdo e as lutas politicas e sociais tenham seguido um curso tinico. Cada uma dessas experiéncias nacionais guarda caracterfsticas préprias, cabendo aqui fazer uma répida digressio para R. paran. Desenv., Curitiba, n.92, set./dez, 1997, p.3-32 B O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expanséo do Capitalismo destacar algumas das particularidades que ilustram a diversidade de contextos que marcam tais processos de industrializago (OLIVEIRA, 1985, parte 2, cap. 2). Os EUA foram o nico pais de passado colonial a se industrializar no século XIX. A colonizago norte-americana havia resultado em dois modelos econémicos distintos: no sul, colénias de exploragao, onde predominava a grande produgio escravista; no norte, colénias de povoamento, predominando a pequena produgao independente. As colénias de povoamento eram estruturalmente semelhantes & antiga Inglaterra (a sociedade inglesa que se conformara apés a dissolugdo do feudalismo) e, sob a tolerdncia da metrépole, conseguiram desenvolver relagées comerciais com o Caribe e como norte da Africa e estimular uma produgdo manufatureira incipiente. Findo 0 processo de independéncia (1776), e sem os entraves politicos Al acumulago que retardavam a maioria dos pafses europeus, os EUA puderam prosperar se beneficiar da expansio do mereado mundial (inclusive da neutralidade de sua bandeira durante as guerras napole6nicas). Com a prosperidade veio a grande industria. Depois, entre 1840 ¢ 1860, os estados nortistas internalizaram a produgao de diversos bens industriais. Contudo, as tensdes entre a economia capitalista do norte e a economia escravista do sul se tornariam jinsustentdveis, desembocando numa guerra civil (1861-1865) que terminaria com a vit6ria das forgas progressistas ¢ o fim do trabalho escravo. A partir daf, estava aberta a possibilidade de expansdo para © oeste, baseada na pequena propriedade rural na construgdo de estradas de ferro, o que, juntamente com a reconstrugao do sul, propiciou um impulso fantastico ao mercado interno e & acumulag’o de capital nos EUA. A peculiaridade do caso alemao € que a integragio ‘econémica e o surto industrializante precedem a plena constituigao do Império Alemio (1870). Na verdade, a tardia unificago politica e territorial da Alemanha foi um processo longo, iniciado por volta de 1815, As sucessivas derrotas politicas da burguesia implicaram que a condugao das reformas estruturais ficasse nas maos da nobreza. No inicio do século passado, os estados alemies ainda apresentavam tragos feudais. O fim dos lagos servis ainda levaria décadas em algumas regiées, mas os camponeses foram lentamente sendo proletarizados ou convertidos em pequenos produtores. Nas cidades, a organizacio gremial, tradicionalmente muito forte, foi se enfraquecendo com o surgimento do putting out ¢ da manufatura. Sob a lideranga da Prussia — 0 Estado economicamente mais u R. paran, Desenv., Curitiba, n.92, setdez. 1997, p. 3-32 Marcelo Weishaupt Pront desenvolvido do Império —, obteve-se a integragao dos mercados (unio aduaneira). A partir de 1840, foram realizados investimentos pesados em infra-estrutura (especialmente em ferrovias), o que deu vigoroso impulso & industrializagdo. E 0 que era um mosaico de pequenos governos auténomos, marcado pelo atraso econdmico, social ¢ politico, em poucas décadas converteu-se numa das principais poténcias indusiriais da Europa caso da industrializagao japonesa assemelha-se ao dos paises curopeus na medida em que a crise do feudalismo japonés conduziu a uma estrutura econémica muito parecida, criando os pré- requisitos para a constituigdo do capitalism, Mas 0 processo de desenvolvimento capitalista japonés guarda particularidades que devem ser observadas. Em primeiro lugar, o fato histérico que detonou a. adogdio de uma politica deliberada de industrializacao pelo governo japonés, j4 ao final de 1860, foi a agressao militar dos EUA, que forgou a abertura do Japio ao comércio internacional (e particularmente aos produtos norte-americanos). A conscientizagao de que o desenvolvimento econémico era essencial para a manutengao da soberania nacional levou 0 governo japonés, ento sob a restaurago Meiji, a desencadear uma série de reformas estruturais e a instituir uma nova ordem juridica. O financiamento da industrializagao supunha uma ago direta do Estado, o que foi obtido através de uma brutal tributagiio sobre 0 campesinato. Reorganizou-se a produgao no campo e acelerou-se a proletarizago de camponeses € artesdos. ‘As exportagGes agricolas, por sua vez, viabilizaram as importagdes de méquinas e equipamentos. O governo providenciou tanto a construgo da infra-estrutura necessdria 4 modemnizagio do pafs (estradas de ferro, portos, ete.) quanto a instalagao de plantas industriais (transferidas depois para o setor privado) e a configuragao de um sistema bancério moderno. Ao final do século, a economia japonesa j& era dominada pelos zaibatisu, organizagao empresarial que integrava indistrias, bancos ¢ atividades comerciais em varios ramos econdmicos. Na Rissia, também a questo da seguranga nacional foi um fator-chave na decisio governamental de acelerar as reformas estruturais ¢ industrializar o pais. A semelhanga do caso japonés, a classe camponesa financiou grande parte dos gastos piiblicos, e a agricultura sustentou a importaco da maquinaria, A burguesia russa era politica e economicamente débil, cabendo ao Estado mobilizar capitais e promover a industrializacao (particularmente a instalagio da indiistria bélica). Deve-se apontar, ainda, que na Riissia foi macica R paran. Desenv., Curitiba, n.92, set/dez, 1997, p.3-32 5 O IMPERIO DA CONCORRENCIA:Uma Perspectiva Historica das Origens ¢ Expansio do Capitalismo a entrada de capital estrangeiro, tanto na construgao ferrovidria e na implantagao de segmentos industriais como na forma de empréstimos a0 governo e a bancos privados. Pode-se dizer que o Estado russo garantiu a valorizaco do capital estrangeiro; mas, em tiltima instancia, a exportagaio de capitais para paises em rapida industrializagao, numa conjuntura econ6mica internacional depressiva, fazia parte da l6gica de acumulagéo dos capitalismos briténico e francés. E importante considerar que, por volta de 1867, quando Karl Marx publicou os primeiros volumes de © Capital, 0 capitalismo inglés ainda era a referéncia principal para a compreensao das leis gerais de funcionamento da economia, Mas, a medida que a primeira onda de industrializaggo retardatéria se completava, 0 capitalismo entrava numa etapa de profundas transformacées. E 0 que se examinard a seguir. CAPITALISMO MONOPOLISTA E IMPERIALISMO Entre 1830 e 1890, o capitalismo britanico imprimiu 0 tom do padrio de acumulagdo das relagées internacionais. Predominavam relagdes econdmicas internacionais baseadas no livre- cambismo ¢ consolidavam-se estruturas produtivas nas quais se encontravam diversas empresas operando em cada ramo econémico, com plantas industriais de dimensdes modestas ¢ tecnologias simples (comparativamente ao que viria a seguir). Nesse perfodo, ainda nao havia mecanismos de protegdo A propriedade das inovagées, ¢ os avangos tecnolégicos difundiam-se com relativa facilidade pelo aparelho produtivo, tendendo a equiparar o nivel de produtividade entre as empresas. Ao mesmo tempo, predominava a empresa organizada familiarmente, que dispunha de crédito fécil e barato no sistema bancario. Dessa forma, principalmente na Inglaterra, 0 padrao de concorréncia capitalista permitia o surgimento “espontaneo” de novos capitais industriais. A esse padrio de acumulagiio baseado no livre funcionamento das forgas do mercado, e que teria sua vigéncia hist6rica circunscrita ao perfodo inicial de difusdo e consolida¢ao das relagGes capitalistas, a esse sistema dinamico, no qual ciclos de crescimento e depressio decorrem da competigio e da mobilidade de capitais individuais, pode-se chamar capitalismo concorrencial (OLIVEIRA, 1985, cap. 3). Ao longo do tiltimo quarto do século passado, contudo, aceleraram-se certas transformagées que acabariam por desarticular a ordem econémica internacional fundada pelo capitalismo inglés. A 16 R. paran. Desenv,, Curitiba, n.92, setSdez, 1997, p. 3-32 Marcelo Weishaupt Proni partir de 1870, conforme a Inglaterra ia petdendo 0 monopélio da produgao industrial e o livre comércio dava lugar ao protecionismo, intensificou-se 0 processo de centralizagdo e de concentracao de capitais, com a fusdo de empresas ¢ a unio de bancos ¢ indiistrias. Simultaneamente, foram sendo gestados um novo padrao tecnolégico ¢ uma outra racionalidade empresarial, com novos produtos e revoluciondrios métodos de gestio da produgao ¢ do trabalho (0 “taylorismo””), caracterizando a emergéncia de uma Segunda Revolugdo Industrial®, Dessa forma, o acirramento da concorréncia intercapitalista (expresso pelo aparecimento dos trustes ¢ cartéis) ¢ a revolucdo da estrutura produtiva propiciaram as condigdes para 0 surgimento de um novo padrao de acumulacao, que define um novo estddio de desenvolvimento capitalista, 0 capitalismo monopolista. Durante a Grande Depressio do século passado, muitos capitais individuais foram absorvidos, muitas empresas menores desapareceram, e poucas e gigantescas empresas passaram a controlar fatias importantes dos mercados. A tendéncia prolongada & reducao dos pregos internacionais (e da rentabilidade esperada dos negécios) acelerou mudangas na dinfmica da concorréncia intercapitalista. Para entrar no jogo do mercado, apresentavam-se duas condicées bisicas: a) aumentar a produtividade ¢ baratear os custos unitédrios, 0 que implicava enormes plantas industriais (“economias de escala”); b) obter acesso facil ao crédito para financiar a maturagio dos investimentos e a comercializagao dos produtos, o que implicava uma relago mais estreita entre indiistrias e bancos. Mas a forma como a crise do mercado mundial atingiu as economias nacionais e a resposta destas & alteragdo nas regras do jogo foram significativamente distintas, especialmente quando se compara a Inglaterra com os EUA ea Alemanha. A retragiio dos mercados externas ¢ as novas condi¢des da concorréncia exigiam que a economia britdnica se reestraturasse. Contudo, o peso da velha riqueza produtiva ~ cristalizada no parque industrial que se tornava obsoleto ~ ¢ o carter conservador da riqueza financeira, de um lado, ¢ a inércia das instituiges liberais, de outro, retardavam uma solugio mais efetiva para a progressiva perda de competitividade da economia inglesa. No momento em que o protecionismo tornou-se uma ferramenta corrente das politicas econémicas, apenas a Inglaterra nao se preocupou em proteger sua inddstria e sua agricultura, mantendo-se fiel & ideologia liberal. Na verdade, os interesses que determinavam a politica britanica e que reforgavam o liberalismo econdmico eram os interesses da City e dos R. paran. Desenx, Curitiba, n.92, set/dez. 1997, p.3-32 v7 Os novos métodos de gestto da produgéo ¢ de organizagio do processo de trabalho, introduzides por Taylor nos EUA, sigaficaram uma potencializacdo da pprodutividade ds eustas de ‘maior desqualifcagéo,

Você também pode gostar