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ee el eee eae DIREGAOQ DE ARTE Oo TEXTO Nao estranhe este capitulo. Saiba que nao fiquei maluco. Vou falar so- bre o texto escrito, ndo o texto como arte, Portanto, abordarei um assunto que interessa exclusivamente aos redatores, certo? Errado. Interessa a vocé, e muito. Em meus mais de vinte anos como diretor de arte, confesso que so conheci outro profissional neste ramo além de mim que escrevesse. De ouvir falar, sei que devem existir mais uns quatro ou cinco. Veja, nao estou falando do diretor de arte que faz titulo, estes ha aos montes. Falo do diretor de arte que é tio apaixonado pelo texto quanto pela arte, que dao mesmo tratamen to e importancia ao texto quanto ao layout que ele cria. Falo do diretor de arte que, se preciso, redija 0 texto inteiro de um catalogo. De quebra, se ele quiser, também pode escrever um livro, ou varios. E desse diretor de arte que estou falando. Como minha intencAo é ajudar a formar diretores de arte mais cons cientes da importancia do texto, este capitulo é indispensavel. E sabe qual a primeira coisa que vocé, leitor, deve fazer a respeito? Ler. Revistas, gibis, livros, bula de remédio, embalagens de comida, sabéo em pé, vale ler qual quer coisa. Ler é 0 alimento do escritor, do redator e do diretor de arte. Evite a todo custo ser um diretor de arte mediano, desinteressado. Tem diretor cle arte que nem lé 0 texto que esta diagramando, acredite. Nao faca isso, nunca. Trabalhos perfeitos dependem de profissionais perfeitos, lembre-se disso. Vamos escrever? Seja para um escritor de romances, poesia, crénicas ou para o reda tor publicitario escrever é cortar palavras. Afora a técnica da persuasao, dv envolvimento e da propria gramatica, o que determina um bom texto, ei primeiro lugar, éa leitura. Quanto mais vocé ler, mais sera capaz de escrever Objetividade ¢ outro aspecto fundamental. Sem objetividade nado ha texlo que resista. Com informagées claras e precisas, 0 texto flui melhor, E ques saber se um texto esta redondinho? Leia-o em voz alta. E um macete impo! tante pois, em voz alta, o que nao estiver bom no texto vaisoar esquisito, vai parecer “gritante”, desafinado mesmo. Ha um ditado que diz: “uma imagem vale mais do que mil palavras”. Em propaganda, as vezes, isso é verdade, outras nao. Até porque, se vocé pensar em colocar mil palavras num antncio 0 risco de ele nao ser lido é absoluto. Ao escrever para um antincio, tenha em mente o conceito. E sempre melhor definir o conceito da peca antes de sair escrevendo ou fazendo a dire- cao de arte. Isto posto, comece pelo titulo. Faca um, dois, dez, cem. Quanto mais se aventurar, quanto mais leite de pedra vocé conseguir tirar, mais titu- los bons aparecerdo. Nao esta habituado a fazer titulos? Habitue-se. A mente é capaz de Fazer coisas que vocé nem imagina. E para ajuda-lo nessa aventura da escrita, considere alguns fatores na nora de fazer um titulo. JA falei disso em meu livro Midia Impressa, mas vou etir: 1. Ointeresse Desperte o interesse do leitor, titulo serve para isso. Mas tome cuida- com as gracinhas e com os superlativos desnecessdrios. O bom humor na iblicidade sempre foi hem-vindo. O exagero e a impertinéncia, nao. Se ne- ario, faca um, dois ou cem titulos até chegar ao ideal, como eu ja disse. 2. Os beneficios Além de atrair a atencdo, o titulo precisa vender o beneficio principal. Se nada vale um titulo que nao deixa claro do que trata o anuncio. Lembre- ==: com excecao dos classificados, a maioria dos leitores que esta folhean- =o um jornal ou uma revista ndo o faz como objetivo principal de procurar incios. Entretanto, se um deles for surpreendido com um beneficio claro = direto, certamente ira parar ¢ ler. Newton Cesar Primeiros Segredos da Direcio de Arte 3. Os titulos longos O segredo de um titulo ndo esta em quantas palavras ele cont=—= sim, na mensagem que ele transmite. E certo que o publico brasileir= 1é. Contudo, se o titulo despertar interesse, sera lido. Existe uma s de atragdo num anincio. Em primeiro lugar, o consumidor é atraido sual, depois pelo titulo, em terceiro, pelo texto. Mas isso nao é regr. anuncios geniais em que o maior ponto de atra¢ao é 0 titulo, 4. Titulos negativos Evite. Palavras negativas e de pessimismo nao sio bem-vin lhor dizer para o leitor “faca” do que dizer “nao deixe de fazer”. M quebrar a regra A busca de mais forca na mensagem, tudo bem. Ali slogans fantasticos usando a palavra “nao”. “Brastemp, ndo tem comparacao”. “Folha, néio da pra nao ler”. “Nao esqueca a minha Caloi”. 5. Aauséncia do titulo So raros os casos, mas que existem, existem. E o tipico exemple que uma imagem vale mais do que mil palavras. Se um dia vocé achar deve fazer um antincio sé com imagem, nado tenha medo. Se a imagem 3 pertinente, direta, se passar tudo o que é necessario, porque usar tite = texto? 6. Objetividade Nao seja prolixo num titulo, nunca. Como eu disse no inicio, cor lavras. Seja criativo, mas seja claro, direto. Uma boa dica é sempre fazer == titulo como se fosse para um outdoor ou para a Internet: obrigatoriame=s= tera de ser curto. 7. Ousadia Seja ousado. E o mais importante: nao tenha medo de tentar. Se sair besteira, saiu. Mas vai que, de repente, vocé, diretor de arte, faz um daqueles titulos inesqueciveis! Proponho um pequeno exercicio: no titulo seguinte, que ¢ para a fa- chada de uma peixaria, corte tudo o que vocé achar necessario. “Aqui nesta peixaria vende-se peixe fresco” O resultado esta no final do livro, mas nao leia antes de fazer sua su- gestao, combinado? Rabisque o titulo. Corte o que nao precisaria estar ai e depois compare com o resultado. Agora vamos para 0 texto? Texto é argumento. E o momento em que o “vendedor’” esta defronte do consumidor em forma de palavras. Depois do titulo, é 0 texto que con- vencerd o leitor de que 0 oferecido é realmente tudo 0 que ele esperava. Mas, assim como no titulo, todo cuidado é pouco na hora de fazer um texto. 1. Averdade Nunca, jamais diga em seu texto algo que nao seja verdadeiro. Além de correr o risco de ser processado por propaganda enganosa, a credibilidade de seu produto ou marca caird por terra. 2. Adequacéo O texto deve ser simples, que nao quer dizer mal escrito. Cada palavra tem importancia tinica. Se uma palavra for colocada errada ou de maneira pouco conveniente, toda a mensagem pode ser prejudicada. Além disso, 0 texto deve ser adequado ao publico e ao mercado. Textos para um publico jo- vem tém apelos diferentes se comparados aos textos para 0 publico adulto. Newton Cesar } rimeiros Segredos da Diregao de Arte 3. Argumentacdo O principal de um texto é que ele diga as coisas claramente. Os aryii mentos nao devem ser obscuros. Frases rebuscadas e sem propésito devel) ser substituidas por fatos, Promessas vazias devem ser substituidas por | neficios concretos. Na maioria dos casos, vale ser imperativo. Pedir pari «1 consumidor ligar e comprar ajuda, fazendo com que ele tome a iniciativa. ‘ii nao fa¢a isso fora das normas padrées do Conar, drg4o regulamentado «i propaganda. Pelo Conar, antncios para criancas nao podem ser imperativy. Vocé nao pode pedir para a crian¢a convencer a mae a comprar esse ou aqui'li’ produto ©. 4. Aproximagao. Qualquer consumidor gosta de receber um tratamento diferenciady Faga o mesmo com seu texto. Na medida do possivel, aproxime-o do const! midor. Seja racional mas, ao mesmo tempo, seja humano. Trabalhe com 11 emoc4o. Trate-o como “vocé”. Faga o consumidor entender que vocé, além clo conhecer muito bem o que esta vendendo, conhece profundamente 0 que cle, consumidor, esta precisando ou quer. Fale com ele como se fosse seu amigo, afinal, os amigos escutam os amigos. 5. Os textos longos Sempre que possivel, o ideal é evitar textos longos. Mas para toda a regra ha excecdo. Nao sera problema optar por textos longos desde que se- jam pertinentes e, por mais palavras que tenham, digam absolutamente o necessdario. Se para dizer o necessdrio for preciso usar dez linhas, use. Se o necessario exigir apenas uma linha, nao alongue. E, ainda, se o necessario for no escrever linha alguma, deixe sé 0 titulo. 15 A informacao refere-se ao ano de 2007.Vale dar uma olhada nas normas anualmente para ver se algo mudou. Se um texto longo for acompanhado de um bom argumento, que pren- da o leitor, ele lera 0 texto. Quer um exemplo? No livro Criagdo sem pisto- lao, de Carlos Domingues, ele também fala sobre 0 texto longo e mostra um antncio feito pela W/Brasil. E muito, muito bom. Por isso mesmo resolvi também reproduzi-lo aqui. Tem gente achando que vocé é analfabeto, e vocé nem desconfia Semana passada eu recebi um convite para fazer um antincio para vocé. Na verdade, nds: eu (meu nome é Ruy) e o diretor de arte Javier Talavera, também da W/Brasil. Ai, colocamos os pés em cima da mesa, pois é assim que se faz nas agéncias de propaganda quando é preciso pensar num assunto muito importante. O tema era livre, podertamos anunciar qualquer coisa que quiséssemos, jd que o es- pago tinha sido cedido pelo jornal Valor Econémico para estimular a criatividade no mercado publicitdrio. Nos nem tinhamos comegado o trabalho e uma coisa ja parecia resolvida: hbastavam um titulo intrigante, um visual interessante, duas linhas de texto, e 0 anuncio estava pronto. Pois é exatamente isso que algumas pessoas imaginam que vocé espera de um antincio. E essas pessoas sao as mesmas que tém falado algumas coisas hem desagradaveis sobre vocé nas salas de reunido. Eu tenho escutado que vocé nao gosta muito de ler, que tem preguica com textos longos, que jamais perde- ria seu tempo lendo propaganda. Por incrivel que pareca, quem tem falado isso é gente bem-intencionada, sao gerentes de marketing, donos de empresas, pessoas que garantem conhecer vocé como ninguém, que fizeram pesquisas, falaram com seus amigos, conhecem sua mulher, seus hdbitos em detalhes, Séo profissionais sérios, gente que decide propaganda, o que vai ver um antincio, o que vai ler e também o que ndo vai ler. Eu confesso que, nessas ocasiées, tenho discutido muito, insistido em dizer que, além de ler jornal todos os dias, vocé também gosta de ler noticias do produto que vai comprar. Newton Cesar ‘Tem gente achando que vove € analfabeto, © vocé nem desconfia. sp tent propa sogeemtesteauneting ‘revibraidcom be talacentianlcombe Aniincio criado pela W/Brasil. Redator: Rui Lindenberg Diretor de arte: Javier Talavera Diregdo criagéo: Rui Lindenberg Primeiros Segredos da Direrao de Arte Embora eu ndo tenha instituto de pesquisa, néo conheca vocé pessoalmente, ndo saiba sua idade, nem mesmo se vocé é homem ou mulher, de uma coisa eu tenho certeza: vocé é uma pessoa sensivel, interessante e, principalmente, alfabetizada. Tenho garantido aos clientes que vocé aprecia o humor, gosta e precisa de informa- ¢Go, adora ler, e é justamente por isso que assina ou compra jornal. Tenho lutado para que os aniincios ndo saiam das salas de reunido frios, burocrdticos, chatos, sem graca nem emocio. Agora, confesso que varias vezes tenho sido derrotado nes- sas discussées, levando como lic¢do de casa a tarefa de diminuir o texto para duas ou trés linhas e aumentar o logotipo do cliente em quatro ou cinco vezes. Por isso, o Javier e eu decidimos ndo fazer um anuncio nesta pagina ven- dendo alguma coisa, mas resolvermos aproveitar este espaco para contar tudo isso para vocé, para mostrar o que andam falando e pensando de vocé. E néio existe espaco melhor do que isso do que as pdginas de um jornal. Por isso, se vocé leu este antncio até aqui, para nos é uma grande vitoria. Temos certeza que, se estivésse- mos falando de um produto interessante para uma pessoa interessada como vocé, ele teria sido lido mesmo que 0 texto fosse tao longo quanto este. Por isso, obrigado por vocé ler confirmando que nés estévamos certos, E se quiser aproveitar a opor- tunidade para reforcar o seu ponto de vista, mande um e-mail para a gente, pois, na préxima vez que um cliente falar que vocé néio lé, nés vamos mostrar para ele o seu depoimento. Vamos provar que tem gente inteligente lendo antincios, sim, se- nhor, gente que gosta de ouvir uma boa argumentacéo, gente que adora dar risada diante de um anuincio divertido, gente que quer se emocionar, gente que, antes de ser classe B1, do sexo masculino, com rendimento de dez saldrios e idade entre 25 e55 anos, é gente. Gente que nao quer ser tratada como analfabeta nem desligada sé porque o mundo esta cada vez mais rapido, mais visual e mais instanténeo. Mande seu e-mail. Talvez assim nés tenhamos aniincios melhores e consumidores mais bem informados. Como vocé, por exemplo. Este antincio, segundo o Carlos Domingos, recebeu mais de 400 e- mails. Uma vitoria espetacular sobre a indiferenca de alguns clientes. Agora, que tal fazer um exercicio para desenvolver seu texto? Esco- lla um antincio de revista, qualquer um. Reescreva o texto desse antincio. O ileal é fazer pelo menos trés textos diferentes sobre o mesmo tema. Muito? (ue nada! E muito simples, na verdade. Basta vocé ler, ler e ler varias vezes 0 texto da revista para, s6 depois, escrever a sua versao. Mas leia com aten¢ao, viitica. Concentre-se no macro e depois no micro. Isto é: entenda o texto ‘oro um todo e depois leia as palavras. Qual vocé mudaria? Outra coisa: 0 lato de vocé ler o texto mais de uma vez, ajudara a fixd-lo em sua mente e vocé vai prestar atenc4o em pequenos detalhes, coisas que talvez vocé mu- ilasse se fosse o redator da pega. Pois bem, vocé n&o é o diretor de arte da peca, 60 redator. Mude o texto. Bom, no fim das contas, se achar que o texto do antincio da revista que vocé escolheu esta perfeito e nao precisa ser mudado, das duas, uma: ou vocé ao acreditou no seu potencial, ou o texto é bom pra cacete. Antes de fazer seu exercicio, veja como um texto pode ser melhorado. Exemplo de texto 1 JB é um scot raro. Destilado e armazenado sob alto controle de qualidade. |! dense, encorpado, E desce suave toda vez que vocé for apreciar. E uma bebida ‘upaz de mudar o seu estilo de vida. Capaz de transformar momentos simples em Homentos raros. Newton Cesar Ptrimeires Segredos da Diregao de Arte Texto 2 - O original publicado Receita. Ingredientes: Dois ovos. Sal. JB. Gelo. Modo de fazer: Antes dele chegar, tire o gelo, arrume os copos, abra o JB. Quando ele chegar, sirva o JB. Gelo & vontade. Se ele nao quiser sair para jantar, frite os ovos. O texto original, publicado, é infinitamente melhor. O argumento é pessoal. Hé aproximag4o com o consumidor e uma situagao gostosa da vida. O texto é tao irresistivel quanto 0 Uisque. Antincio criado pela DPZ. Redator: Luiz Toledo. Diretor de arte: Marcelo Serpa. Dieragéio de criagéo: Francesc Petit/ Paulo Ghirotti.

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